Revista Cibernética - Edição de Fevereiro

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Volume 1 | Edição 2

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Bel Neto A Po e t i s a C a r i s m á t i c a

Que culpa tenho eu De ser a negra dos teus olhos De lábios carnudos rosados De seios redondos ousados?”

Edição de Fevereiro

E N T R E V I S TA

Eu pessoalmente não vou votar para não legitimar a forma de eleições que foi arquitectado José Patrocínio


Juntos teclando para a mudança revista

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15.FEV.2012 revista

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TÓPICOS

Regulares 04 - CARTA DO EDITOR Num ano de eleições, quo vadis jornalismo angolano? Por Pedrowski Teca 05 - COLUNA: << CRÓNICA DO FAZ DE CONTAS>> Por Ermelinda Freitas

António Cascais Isabel Jussara Neto

POETAS DO FACEBOOK 06 - Poesias: Negra Dia dos namorados Psicose Por Isabel Jussara Neto (Bel Neto)

José Patrocínio

Entrevista

Análises 10 - ENTREVISTA: Não vou votar para não legitimar a forma de eleições que foi arquitectado Por Pedrowski Teca

08 - ANÁLISE: Luanda, 436 anos: cidade velha sempre nova! Por Maurílio Luiele

Ermelinda Freitas Revista Cibernética

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Director & Editor: Pedrowski Teca Colaboradores: Maurílio Luiele Ermelinda Freitas Isabel Jussara Neto José Patrocínio Paginação & Design: Pedrowski Teca Contactos: revistacibernetica@gmail.com Publicidade e Marketing: Vaga Grande Repórter: Vaga © Copyrights 2012 - Pedro Teca *** As opiniões expressas pelos colaboradores e colunistas da Revista Cibernética não engajam a revista.

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A Revista Cibernética é uma publicação electrónica Angolana que surgiu como um contributo na diversificação de plataformas cibernéticas de informação, debates, educação e entretenimento no seio da comunidade Angolana e da comunidade de expressão da língua portuguesa com interesses em assuntos concernentes à Angola. ***

CartadoEditor Num ano de eleições, quo vadis jornalismo angolano?

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aro leitor, antes de me expressar sobre o tópico à cima, gostaria de mencionar que mesmo aos impurrões, como se tem dito na gíria: “a travar na jante”, mais uma vez a Revista Cibernética conseguiu ver a luz do dia com a publicação da sua segunda edição. Nesta edição do mês dos namorados, demos ênfase à poesia, particularmente às poesias escritas pela jovem poetisa, Isabel Neto, e tivemos uma colaboração especial da Activista Cívica, “tia” Ermelinda Freitas, com a interessante “Crónica do Faz de Contas” onde inicialmente aborda sobre o relacionamento de um casal de amigos de infância, enquanto sensibiliza os leitores com alguns aspectos sócio-económicos da sociedade angolana. Também contamos com a colaboração infalível do nosso kota, Maurilio Luiele, a partir do Brazil, e o elemento jornalístico fez-se presente pela entrevista exclusiva concedida pelo Director da Associação Omunga, José Patrocínio, correspondendo a partir da Província de Benguela, em Angola. Em retrospectiva, após a publicação da nossa primeiríssima edição aos 15 de Janeiro de 2012, aos 27 de Janeiro a Policia Nacional deteu alguns jovens no Município do Cacuaco em Luanda por reivindicarem água e energia e, cerca de 17 jovens também foram detidos no dia 3 de Fevereiro enquanto manifestavam-se pedindo a liberdade dos seus companheiros e algumas fontes

indicavam que houve severos casos de brutalidade policial. Outro assunto marcante, é sobre a divergência pela nomeação da Suzana Inglês como cabeça da Comissão Nacional Eleitoral (CNE), mas que alegadamente a sua nomeação não cumpriu com os requisitos. Nos últimos dias, circulou rumores de que Suzana Inglês esteve em crise de saúde e fora internada num hospital em Luanda. Os partidos da oposição, UNITA e o PRS, já exigiram a suspensão da eficácia do acto administrativo de Suzana Inglês na CNE. A permanência ou a retirada da Suzana Inglês ainda é uma incógnita a se revelar. Em notícia publicada pela Voz de América (VOA), aos 10 de Fevereiro de 2012, o MPLA adiou pela terceira vez a apresentação das listas dos seus deputados às eleições de Setempbro deste ano. O adiamento foi feito durante a IV Sessão Ordinária do Comité Central do MPLA. O Comité Central ficou a debater “os princípios e critérios a adoptar” na elaboração da lista dos deputados às eleições, que anteriormente, o Presidente José Eduardo Dos Santos tinha afirmado que a lista sairia em Janeiro deste ano. A notícia que mexeu o país e a diáspora angolana, foi a da saída do humorista e apresentador da Rádio Despertar, António Manuel Júnior da Silva, mais conhecido por “Jojó”. O aparecimento de Jojó na mídia pública angolana atribuindo a sua retirada da radio privada à razões de baixa remune-

ração, levantou suspeitas por partes de muitos angolanos. Em comunicado de imprensa, a Direcção da Rádio Despertar desmentiu as alegações de Jojó, e tudo aparentemente esclareceu-se quando Club-K noticiou que uma nova emissora comercial, a ser chamada “Rádio Kwanza”, está a ser apresentada em Angola, como o novo projecto empresarial de José Filomeno dos Santos “Zenu”, e deverá ter um programa de humor, que será conduzido por António Manuel “Jojó” a quem foi oferecido uma viatura e uma casa num projecto na zona de Luanda Sul, como condição inicial para deixar a Rádio Despertar, onde o mesmo fazia um programa de críticas e sátiras sociais aos sábados de manha. Desta última notícia, surge a pergunta: “num ano de eleições, quo vadis jornalismo angolano?” O que será da neutralidade e imparcialidade do jornalismo angolano neste ano de eleições? Quem será o próximo à vender os seus princípios a bajulação? A Revista Cibernética estará de olhos bem abertos, teclando para a mudança.


“CRÓNICA DO FAZ DE CONTAS” Por: “Tia” Ermelinda Freitas

Nascemos com um sexo, masculino ou feminino. Uma realidade animal. Agarramo-nos à xuxa da mãe e mamamos até fartar, crescemos e desenvolvemos. Em meia dúzia de anos chegamos à escola pela mão da mãe ou talvez da avó... Ele e ela se reconhecem: - “Tu és o Mingo, do Bairro Cazenga...?” - “Sou e tu...espera! Já sei, és a Tchissola! fómos vizinhos!” - “Sim as nossas mães eram amigas”. A cena volta a repetir-se no Liceu. A conversa aqui, é mais acesa. Os dois já olham para o “espelho”, e cada um faz questão em dar-se pelo nome: Mingo e Tchissola. As conversas já resvalam com alguma seriedade e alguma objectividade. Com alguma sorte ou coincidência apenas, a cena volta a repetir-se, em outra instituição de ensino, aliás único Liceu da terra! Por momentos a saudação habitual. Tchissola é de alguma forma espontânea: “Oi Mingo! tudo bem? Ya, tudo fixe! Estás um borrachinho,” diz com um sorriso “malandro”. As conversas fluem naturalmente. Mingo muito timidamente, retroquiu: “eu ia dizer o mesmo de ti, tiraste-me as palavras da boca, estás uma gata, bonitona mesmo. Como estás?” “Estou bem, na corrida para conseguir entrar na Faculdade,” respondeu Tchissola. Mingo com um sorriso malandro, rematou: “nota-se, repetindo-se: “nota-se...” “Ah! Mingo são os teus olhos...” disse ela. Parecia que a conversa não atava nem desatava. Tomando a iniciativa e na intenção de ir mais longe, Mingo convida

Tchissola para no intervalo das aulas, voltarem a encontrar-se para falarem sobre eles. Tchissola aceita, pois tinha ficado impressionada com os olhos grandes e amendoados de Mingo! “Ok, vamos encontrar-nos na cantina,” respondeu Tchissola. “Fantástico! vamos recordar a nossa meninice, é sempre bom recordar...” disse ele. Passados dois dias desta conversa, voltam a encontrar-se. Tchissola gritou o Mingo: “fiquei a tua espera não apareceste!” “Tchissola,” respondeu com ar maroto, “desculpa, não tive como... mas vamos conversar hoje”. A hora marcada encontram-se finalmente e a conversa começa... “Mingo, ouvi dizer que tens andado a fazer manifestações com um grupo de jovens!” exclamou. “Sim, é verdade, o nosso País não está bem, temos dificuldades em pagar as propinas, os pais já estão separados, porque o meu pai perdeu o emprego!” Mingo responde. “Então este tempo que estive na europa as coisas não mudaram nada! Sabes que tenho vontade de me juntar a vocês? tens de me explicar melhor como essas coisas funcionam!” disse Tchissola. “Sabes Mingo que o meu pai é Diplomata e que não me falta nada, mas olhando para alguns dos nossos colegas, nota-se bem a diferença,” acrescentou. “É perigoso ainda mais sendo filha de quem és!!” disse Mingo, “Bem vamos mudar de assunto, depois falamos mais a sério sobre este assunto”. “Ok.” respondeu Tchissola, “mas não penses que me vou esquecer... ficas a dever-me esta (sorriu!)”. “Sabes que nunca me esqueci de ti?” Revista Cibernética

disse Mingo. “Sempre me lembrava de quando dividias as tuas coisas comigo... sempre viveste melhor que eu,” concluiu. “Mas para mim,” responde Tchissola, “eras o meu amigo e eramos iguais, assim como sómos hoje! E também me perguntava por onde andavas, mas aqui estamos de novo juntos, agora já vemos a vida de maneira diferente, crescemos! estamos a estudar e isto é muito bom”. “Tchissola, qual é o curso que vais tirar?” Mingo perguntou. “Direito, quero ser Advogada,” respondeu, “o meu sonho é ajudar as pessoas mais necessitadas, como... As Mãos Livres. E tu?” “Engraçado que também estou no curso de direito! Acho que vamos ser muito úteis ao nosso País,” disse Mingo. “Vou andando Mingo, o carro já está a minha espera, amanhã continuamos a nossa conversa, e não te esqueças que quero saber mais daquele assunto!” disse Tchissola. “Esta miúda é mais doida do que eu pensava,” pensou o Mingo!!

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Análises

Negra Que culpa tenho eu? De ser a negra dos teus olhos De lábios carnudos rosados De seios redondos ousados Que culpa tenho eu? De mexer contigo Que ao passar te atropelo Com o meu andar selvagem Que culpa tenho eu? De ser esta mulher linda Tímida e atrevida Que atiça teus sentidos Que com olhares te penetra Que alveja teus poros Buscando gemidos Que culpa tenho eu? De ser negra genuína De ser a mulher que te fascina Que te aquece e arrefece Que te engrandece e arruína Que te faz perder os sentidos Que acaba com os teus medos Desvenda teus segredos Que culpa tenho eu De ser negra?

Isabel Jussara Neto (Bel Neto) Luanda - Angola


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No dia dos namorados No dia dos namorados Peguei com carinho em suas mãos Percorri seus dedos em direcção ao meu coração Pra fazê-la sentir o quanto ele bate Por amá-la tanto

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Psicose Estou grávida e louca para te contar euforica saio da clínica com ânsia de te encontrar abro a porta bem devagar para não estragar a surpresa e ao entrar me deparo com a minha tristeza Ao ver peças de roupas atiradas no chão blusa,lingerie,cinto e calção e com fraquezas fiquei sem saber o que fazer os meus passos medrosos Dirigiram-me ao quarto que vos acolheu com prazer

No dia dos namorados Levei flores pra ela E sem procurar muito falei aos seus ouvidos Palavras que a façam sorrir e admitir Que a faço feliz

Encima da nossa cama dois corpos entrelaçados meu coração abandonou o corpo e fugiu despedaçado mil perguntas na minha cabeça foram surgindo e no fundo sei que nada fiz para merecer o sucedido

No dia dos namorados Vesti um terno vermelho Perfumado e apaixonado Pra ela pus-me belo

desesperada abandonei aquele lugar com mil motivos de querer me matar fecho os olhos para raciocinar um pouco e num momento fiz um aborto psicológico

No dia dos namorados Reservei um jantar à luz de velas Com uma vista às estrelas E ao som da guitarra declamei pra ela Aquela poesia tão minha e tão bela ...Isabela!

matei o meu filho mesmo antes de nascer sou criminosa podem me prender depois de tantas psicoses encarei a realidade no meu impasse ouço uma voz dizendo sentir saudade

No dia dos namorados Fiz um retrato dos momentos já vividos Desfazendo as mágoas e lamentações Resgatamos a paz dos nossos corações Pra que este dia se repita em todos os anos Revista Cibernética

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sem reacção e com lágrimas na alma imagino-me outra vez com um punhal na mão penetrando a tua insensatez matei o meu amor sou criminosa diante dos olhos do mundo sou uma mulher perigosa e vos pergunto o que fariam diante desta crise enquanto não respondem sofro sozinha com a minha psicose 13


opiniões & Análises

Luanda, 436 anos: cidade velha sempre nova! •

Maurílio Luiele

Rio de Janeiro, Brazil - A capital da República de Angola completou no pretérito dia 25 de Janeiro 436 anos de sua existência. Fundada por Paulo Dias de Novais e nascida São Paulo de Assumpção de Loanda a cidade é hoje um verdadeiro depositário da história de Angola dos últimos quinhentos anos. Cada recanto, cada esquina, cada beco, cada edifício, enfim cada bem material ou imaterial que a constitui representa um somatório de estórias que fazem a história desta Nação gigante, mas sofrida que é Angola. Na verdade Luanda guarda e mantém vivas as marcas dos diferentes processos, alguns bastante dolorosos que conformam a história de Angola: a colonização portuguesa, a ocupação holandesa, o comércio de escravos, a guerra anti-colonial, a independência nacional e o entusiasmo revolucionário que a envolveu 8

e, enfim, os anos de chumbo socialista e a guerra concomitante como não podia deixar de ser. Desde a sua fundação, entretanto, Luanda conheceu um desenvolvimento lento e preguiçoso. Foi, sobretudo, nos anos sessenta, após o eclodir da guerra de libertação nacional (que levou Salazar a proclamar o lema “para Angola já e com força!”) que Luanda, à semelhança de outras cidades de Angola, conheceu um verdadeiro boom que fez dela uma das mais belas cidades da costa atlântica africana. Mesmo assim, a cidade cresceu com grandes problemas estruturais que espelhavam, na verdade, as diferenças sociais que separavam os seus habitantes: de um lado a minoria de origem européia ocupando a área urbanizada da cidade e, de outro lado, a grande maioria dos angolanos jogados para áreas suburbanas com infraRevista Cibernética

estrutura e serviços básicos precários. Era nítida a linha de demarcação entre o casco urbano e os musseques que alojavam a maioria dos angolanos explorados. A cidade vistosa e florida contrastava com a miséria que campeava nos musseques. Com o advento da independência e as circunstâncias conturbadas que cercaram a descolonização de Angola ocorreu uma ruptura intempestiva desta ordem e a cidade sentiu no âmago esse abalo. Os prédios residenciais em muitos casos foram ocupados por antigos moradores do subúrbio que transportaram para a urbe hábitos nem sempre compatíveis com o uso adequado e manutenção preventiva do diversificado equipamento social. O novo poder público instituído guiado eminentemente por uma lógica comunista e populista se revelou omisso em muitos casos o que, agravado pelo êxodo de quadros ligados a administração


colonial levou a uma deterioração profunda da qualidade dos serviços públicos básicos o que se reflectiu de imediato na qualidade de vida dos novos ocupantes da cidade. A guerra que sobreveio levou à ampliação do processo de degradação que a urbe conheceu e instalou definitivamente o caos. Logo as construções anárquicas se tornaram no modelo para enfrentar o déficit habitacional prevalecente fazendo emergir verdadeiros conglomerados habitacionais irregulares com precária infraestrutura cujos exemplos candentes são, entre outros, o Palanca, a Petrangol e o Morro Bento. A incapacidade em solucionar o problema de transporte fez surgir uma rede paralela e, da mesma forma floresceu assustadoramente o comércio informal com a emergência de majestosos mercados informais dos quais o mais emblemático foi sem dúvida o Roque Santeiro. Diante da imensidão de problemas estruturais as autoridades responderam sempre com improvisações, isto é, jamais se concebeu um plano global, enfim, um verdadeiro projecto que pudesse estancar a degradação de Luanda de forma orientada e sustentada. Como conseqüência a cidade continuou a experimentar profundas deformações estruturais que tornaram a vida dos citadinos muito mais difícil. Bairros tradicionais como o Cazenga, Sambizanga e Rangel conheceram níveis de deterioração insuportáveis, o fornecimento de luz irregular tornou Luanda refém do ruído ensurdecedor de geradores; o abastecimento

irregular de água gera muitas dores de cabeça e a ausência de soluções pensadas para os transportes ditou a emergência do caos rodoviário. Luanda tornou-se assim um oceano de problemas estruturais clamando por soluções urgentes e emergenciais para as quais o improviso é apenas paliativo e nunca solução definitiva. Hoje com o advento da paz e o crescimento econômico que o país vem conhecendo abriu-se uma janela de oportunidade para enfrentar de forma racional e sustentada os dantescos problemas estruturais de Luanda. A paisagem que Luanda nos oferece hoje já é muito diferente daquela de há dez anos atrás. Novos edifícios emergem todos os dias e a zona sul da cidade desponta mesmo como uma cidade nova. As novas centralidades são já uma realidade insofismável aos nossos olhos. Mas, todo esse esplendor e exuberância são incapazes de esconder velhos problemas que quotidianamente atormentam os luandenses: água, luz, caos no transito e precariedade nos serviços públicos incluindo os transportes. Para os moradores de muitos bairros como Cazenga, Sambizanga, Bairro Popular a via crucis parece não ter fim. Os diferentes projectos e programas parecem desgarrados, não consolidados num plano director que trace os eixos de desenvolvimento sustentado de Luanda. A dimensão dos problemas de Luanda clama

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opiniões & Análises

por soluções ousadas, mas, tecnicamente suportáveis e ecologicamente sustentáveis. Estas soluções não devem ignorar realidades locais que na verdade significam em muitos casos soluções técnicas enraizadas numa cultura bastante consolidada. O planeamento territorial adequado pode prevenir problemas futuros como as remoções cirúrgicas e demolições que hoje assistimos com custos sociais elevadíssimos. O diálogo ampliado com técnicos, sociólogos e população deve ser a plataforma a partir da qual se devem procurar estas soluções. A nova divisão administrativa de Luanda já revela uma preocupação das autoridades com os problemas candentes de Luanda, mas é necessário ir muito mais além convocando a participação dos acadêmicos, dos líderes de opinião, da sociedade civil para numa frente comum se caminhar em direcção à fundação da nova Luanda que todos almejamos. Luanda é a cidade que a todos nos encanta, mesmo com todos os seus problemas ela nos atrai e nos fascina, é mesmo uma cidade encoberta pela magia da Kianda. Ela merece o carinho de todos nós. O dia 25 de Janeiro deve ser assumido definitivamente como tolerância de ponto para Luanda até porque os seus habitantes devem celebrar o seu aniversário. Este ano mais uma vez as autoridades subtraíram aos luandenses esse direito o que é incompreensível.

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Entrevista

Não vou votar para não eleições que fo • Pedrowski Teca WINDHOEK, NAMIBIA - Numa entrevista perfil, a Revista Cibernética conversou com o líder da Associação OMUNGA, José António Martins Patrocínio, a partir da Província de Benguela em Angola. Na entrevista exclusiva, José Patrocínio revelou, sem pápas na língua, informações acerca da sua vida, educação, crenças e o seu parecer sobre a actual situação política, social e económica de Angola. Patrocínio também revelou que não irá votar nas eleições gerais deste ano porque acredita que se votar, estará a legitimar a viginte forma de eleições em Angola. Confira na íntegra, a entrevista extensiva de José Patrocínio, feita pelo jornalista Pedrowski Teca:

José Patrocínio

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Quem é o José Patrocínio? Nasci na cidade do Lobito há cerca de 50 anos, no antigo Sindicato. Actualmente é a maternidade do Lobito mas,

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segundo corre boca, estas instalações já têm dono. Está localizada na Restinga perto do Hotel Términos e onde uma série de outras infra-estruturas já foram demolidas nesta área para a ampliação do referido hotel. Se calhar seria interessante conhecerem-se os proprietários deste hotel que, desde que nasci, sempre o conheci como o Hotel do CFB, Caminhos de Ferro de Benguela. Será que ainda é? Passei a minha infância no Lobito, especialmente no bairro da Luz onde iniciei a escola. Depois do 25 de Abril, fui pioneiro. Foi na OPA que aprendi a lidar com as armas de pau. Esta foi a primeira vez que tive que aprender a lidar com grandes perdas. Foi uma fase bastante estranha. Todos os meus amigos foram-se embora. Foi uma altura em que durante dias e noites só se ouvia o barulho dos martelos a encaixotar as coisas que o pessoal pretendia levar. O meu bairro ficou vazio e silencioso depois disso. Foi também nessa altura que aprendi a ter que fugir de casa em casa. O meu pai na altura, estava ligado ao MPLA e era sindicalista da Inter Sindical. Era uma pessoa marcada e portanto perseguida quer pela UNITA quer pela FNLA. A minha mãe já tinha umas malas preparadas e sempre prontas para a fuga. Cada noite dormíamos numa casa diferente. Sempre que alguém chegava e dizia que o meu pai já tinha sido localizado, mudávamos de casa. Não podia sair de casa nem sequer ir à janela. Foi também nessa altura que vi o meu irmão, com 16 anos, a sair de casa e ir para o CIR das FAPLA. Comecei a lidar com a guerra e as armas. O meu irmão foi para frente do Balombo. Quando os Sul-africanos entraram em Benguela, de madrugada, a minha mãe estava de guarda à ponte da Catumbela. Foi o comandante Monty que avisou que tinha-se que fugir. Foi tudo muito estranho pra mim. Era de madrugada e eram dezenas de carros em fuga em direcção primeiro Sumbe, depois Porto Amboim e finalmente Luanda.


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ão legitimar a forma de oi arquitectado Para fugirmos muitas das pessoas tiveram que ir ao porto e retirar os carros que estavam lá para ser embarcados. Teve-se que arrombar as bombas de gasolina para se conseguir o combustível. Em Luanda, nos primeiros dias, ficámos hospedados no hotel Kate Kero, no largo Serpa Pinto. Depois conseguimos ficar numa clínica de recuperação neuropsicológica que estava abandonada no Miramar. Ali perto de onde é hoje a embaixada dos Estados Unidos. Era no fim de contas uma psiquiatria para gente rica que estava abandonada. O ambiente e o local era muito estranho. Ficamos aí cerca de uma dezena de famílias. Como vê, quando era criança, fiz parte dos primeiros deslocados em Angola. A vida em Luanda nessa altura não era nada fácil. As bichas para se conseguir qualquer coisa, principalmente produtos da tropa portuguesa, no Jumbo, eram enormes. Comia-se muito arroz e peixe-espada, famoso “cinturão das FAPLA”. Passei a independência em Luanda ao barulho dos abuses que arrebentavam a norte e ao sul da capital. Depois dos Sul-africanos e a UNITA saírem do Lobito, nós regressámos. Era de noite e a cidade estava calma e vazia. Ao contrário de Luanda, encontrámos as lojas ainda cheias e a funcionar. Mas foi sol de pouca dura. Passado pouco tempo já a história era diferente. Começaram as Lojas do povo e os cartões de abastecimento. O meu irmão morre durante a guerra, em 1980, como piloto de helicópteros MI 8 da FAPA. Sou filho de portugueses. A minha mãe é de Lisboa e o meu pai é de Reguengos de Monsaraz, no Alentejo. Tenho muito orgulho da minha ascendência e tenho muito orgulho do lugar onde nasci. Faço parte portanto de um grupo minoritário em Angola e por isso me preocupo bastante com estas questões de descriminação e racismo e ultimamente afecta-me muito o que temos acompanhado

em relação ao tratamento que se tem dado Só para dar um exemplo, o meu pai era a emigrantes e imigrantes em Angola e no amigo do Kundy Paiama, que foi Comissário mundo. provincial de Benguela. O Kundy Paiama Sou solteiro e tenho um filho. chegava mesmo a fazer referências ao meu pai em comícios. Mostrando-o como um Formação académica (Ensino de base, bom exemplo de cidadão. Nós não podíamos médio e superior? falar mal do Kundy Paiama em casa. Se eu Fiz todos os meus estudos em escolas chegasse a casa a dizer que os meus amipúblicas. Fiz a primária no bairro da Luz, o gos rastas tinham sido presos pela tropa ciclo preparatório e o liceu no B.º do Com- do kundy Paiama e ficado com as cabeças pão. Durante o tempo que estive como deslo- rapadas, ou que as minhas amigas tinham cado em Luanda fiz o curso de recuperação sido presas por causa de estarem de bikini no liceu Mutu ya Kevela. Fiz o PUNIV curto já na praia, o meu pai ficava muito zangado. no Huambo porque fui daqueles estudantes Dizia que era mentira. Que isso eram manoque serviu de cobaia na altura da primeira bras do inimigo. Que era provocação do immudança do ensino. Assim saí do antigo li- perialismo, etc. Acredito que se o meu pai ceu para o PUNIV e depois de um ano entrei hoje pudesse ressuscitar e ver o seu amigo para a faculdade. Isto já no Huambo. Saí do como proprietário de casinos preferiria volHuambo em 1987. tar a morrer. Acredito nos valores da solidariedade e Pessoalmente, crês em que ideologia não acredito no capitalismo como sistema política, sócio-económica? E és religio- que traga as soluções, antes pelo contrário, so? acredito na possibilidade de sistemas mais Pessoalmente acredito que um mundo sociais e cooperativos e de respeito e integdiferente é possível. Para isso acredito que ração ao ambiente. uma democracia diferente é possível. Não me preocupo em acreditar ou não acredi- Conte-nos o seu percurso profissional e tar em ideologias. Tento ser coerente é com como chegaste a ser o cabeça da Assoos valores em que eu admito que devo ac- ciação Omunga? reditar. Tenho uma concepção da vida e do Quando acabei o meu curso e formei-me mundo mas não professo nenhuma religião. como engenheiro agrónomo, eu já tinha coAcredito no processo da vida e dou-me sen- locação. O meu pai era amigo do Hermínio tido ao facto de eu acreditar que existo. Escórcio e então eu fui para Luanda, para Os meus pais ajudaram-me muito na con- a Sonangol. Na realidade iria para um prostrução do meu eu. Fui sempre educado nos jecto no Sul. Conforme diziam ia adquirir valores da honestidade e do respeito. Como experiência com o Fernando Borges. se pode ver pelo meu passado, absorvi muito Desisti da ideia e decidi voltar ao Lobito. Aí os valores de justiça e a nossa aproximação encontrei o meu antigo colega de faculdade, ao MPLA baseava-se muito nisso. Acreditá- o Isaac dos Anjos que era o então director vamos verdadeiramente nos ideais do MPLA. do Gabinete de Desenvolvimento do Vale do Teríamos uma independência onde se im- Cavaco (GDVC). Fiquei aí a trabalhar em replantasse a justiça. Onde os trabalhadores sposta ao seu convite. Uma das coisas que teriam o seu verdadeiro respeito e o seu me fez imediatamente aceitar trabalhar no grande papel na construção do país. Hoje Cavaco foi o facto de também ter conseguinão é isso que acontece. Ainda acredito na do arranjar casa nessa altura no Lobito. aliança operário-camponesa! Havia muitas dificuldades em se desenvolvRevista Cibernética

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Entrevista er os projectos no GDVC. Então, o meu pai

através do seu amigo que era embaixador de Angola em Cuba, não me recordo o nome, conseguiu uma audiência com o Faustino Muteka que era o Ministro da Agricultura na altura. O Isaac teve esse encontro. Passado algum tempo o Isaac foi nomeado Vice-ministro da Agricultura. Acreditei muito que com a subida do Isaac dos Anjos para Vice-ministro as coisas mudassem. Mas não foi isso que aconteceu. As nossas condições de trabalho pioraram. Foi então que decidi dirigir uma exposição ao então Ministro da Agricultura, Faustino Muteka. Nessa apresentava uma série de opiniões que tinha sobre a perspectiva da agricultura quer a nível de Benguela como a nível de política agrária nacional. Questionava também uma série de situações sociais. Lembro-me que uma delas tinha a ver com o facto de eu ter uma quantidade de cartões de abastecimento, incluindo o do Abastecimento Complementar. Só para fazer recordar eu estou a falar de uma época de que precisávamos de ter um cartão para podermos fazer as compras. Cada cartão era de uma loja diferente. O abastecimento complementar representava um luxo. Eu tinha direito a cerca de 3000,00 Kz por mês e podia comprar produtos de luxo, como bebidas alcoólicas importadas e electrodomésticos. Significa dizer que eu podia comprar 10 grades de cerveja importada por mês. Cá fora vendia as cervejas e com o dinheiro de uma grade eu comprava um bilhete de passagem para Lisboa. Podemos dizer que eu tinha direito a 10 bilhetes de passagem para Lisboa em cerveja, por mês. Entretanto os meus colegas que não tinham esse tipo de cartão, tinham que roubar os cachos de banana verde que tínhamos nos bananais do centro de estudos do GDVC. Isso era incompreensível para mim. Sentia como se me estivessem a corromper com grades de cerveja. Disse na exposição que um intelectual não se vende, muito menos por cerveja. O Isaac dos Anjos foi quem me respondeu à exposição. Até hoje não sei mesmo se o Muteka teve acesso à mesma, mas também já não importa. O Isaac dos Anjos ficou apenas em dizer que certas questões cabiam à direcção do partido e do governo decidir e quem não estava de acordo era convi-

dado a demitir-se. Foi o que fiz. Fui parar ao desemprego. Acho que ele continua com este espírito de que só os iluminados, como ele, podem decidir. É só ver as barbaridades das demolições no Lubango!

apareceu o Fernando Pacheco, da ADRA, preocupado com a situação dos deslocados que se encontravam no CRM. Maioria proveniente da Ganda. A ADRA pretendia que o governo cedesse alguns terrenos da antiga açucareira do Dombe Grande para que os pudessem instalar lá e desenvolver projectos agrícolas. O governo não cedia os terrenos. Ele chegou a fazer a seguinte proposta: se eu conseguisse esses terrenos ele conseguiria financiamento para um projecto de emergência em qualquer município que considerasse importante. Aceitei o desafio. Consegui que o governo disponibilizasse os tais terrenos e ele conseguiu um financiamento da ASDI para um projecto de emergência no Caimbambo.

Acreditei muito que com a subida do Isaac dos Anjos para Vice-ministro as coisas mudassem. Mas não foi isso que aconteceu. As nossas condições de trabalho pioraram.

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Algum tempo depois o Paulo Jorge, que era o governador provincial de Benguela, convidou-me para ir trabalhar pró governo provincial. Fiquei a colaborar no Gabinete do plano. Mais tarde o Vice-governador para a área social Reis Esteves convidou-me para trabalhar directamente com ele e foi assim que criei a Unidade Técnica de Apoio aos Deslocados. Para tentar encurtar a história, mais tarde Revista Cibernética


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da cultura como forma de resistência e de auto-estima. Durante várias vezes participámos na feira da LAC levando pessoas do Caimbambo e do Chongori. Era emocionante ver como aquelas pessoas ficavam quando começávamos a entrar em Luanda. Ver o movimento dos carros, ver os prédios altos, ver também como as pessoas se concentravam em torno do nosso espaço para admirar as exposições ou os dançarinos e o tambor. Agradeço aqui à Luísa Françony pelo facto de ter sempre reservado de forma gratuita um espaço para nós. A outra coisa, foi a nossa intervenção no processo da construção da Paz. Começámos no Caimbambo. Durante as noites e madrugadas iniciámos encontros com os sobas que vinham das zonas da UNITA. Eram encontros feitos no escondido do meu quarto. Nem todos os colegas sabiam desses encontros. Nada podia transpirar para fora. Durante a madrugada, muitas vezes ia com o meu colega Paulo de bicicleta para as áreas da UNITA para recolher as informações da população e ver como iam os avanços na recuperação da estrada para que pudéssemos depois convencer o PAM a apoiar. Infelizmente não conseguimos que se concretizasse esse apoio a nível do Caimbambo mas conseguimos que acontecesse a nível do Chongoroi. Depois o OKUTIUKA-APAV mudou os seus escritórios para o Lobito. Por razões estratégicas. É aqui que surge o projecto OMUNGA. Começámos a trabalhar com as crianças e adolescentes em situação de rua. Um grupo A situação do Caibambo e do Chongoroi era interesses. Foi aí que tomei a decisão de invisível. E por ser invisível, sem voz, sem calamitosa. Nenhum desses municípios fazia deixar o governo e ficar definitivamente rosto, discriminado e vítima de muita violênparte da intervenção nem das agências das com a ADRA. cia. Os primeiros apoios foram da Save the Nações Unidas, nem do Comité Internacional Como o projecto era de emergência e de Children (UK). da Cruz Vermelha nem qualquer outra ONG apenas 6 meses, decidimos dar continuidade Tal como o OKUTIUKA foi parido da ADRA, a internacional. Eram zonas consideradas de à nossa intervenção transformando esse OMUNGA foi parida do OKUTIUKA. Hoje é uma alto risco por questões de segurança. Foi projecto numa associação que se passou associação autónoma, da qual sou fundador assim que depois da ADRA ter esse finan- a chamar OKUTIUKA – Acção Para a Vida. A e seu coordenador. ciamento, ele deparou-se com o problema nossa intervenção tinha desde sempre uma de não conseguir recrutar a equipa para o visão de desenvolvimento. A Associação Omunga foi uma das primeiprojecto já que ninguém queria ir trabalhar Foi uma experiência muito importante ras organizações cívicas a organizar para uma zona de guerra. Aceitei o desafio. na minha estruturação enquanto pessoa. manifestações em Angola, cita a manifesDurante algum tempo acumulava o cargo de Foram várias coisas importantes que me en- tação em 2010 contra as demolições de coordenador da UT e era coordenador do volveu, como iniciativas piloto. Uma delas foi casas e o projecto: “Não Partam a Minha projecto da ADRA. Isto tinha vantagens, mas a criação do primeiro grupo de voluntários. Casa”. O que significa o nome Omunga? também tinha desvantagens. As vantagens é Chamávamos os Voluntários da Paz. Eram 3 Qual é o historial da Omunga? Quais são que tinha acesso directo aos meios do gov- ou 4 jovens que ficaram connosco de forma os seus principais objectivos? Quem fierno como os helicópteros e também a min- voluntária e de clara manifestação contra a nancia a Omunga? E que tipo de afiliação ha ligação directa com o Vice-governador guerra. Realço aqui a Sónia Ferreira, actual tem com a britânica Christian Aid? ajudava nas decisões rápidas, etc. Por outro coordenadora do OKUTIUKA no Huambo. OMUNGA é uma palavra Umbundo que a lado eu estava preso, se assim pudemos Há ainda duas coisas que me marcam interpretamos como mensagem e união. Na dizer, já que tinha dificuldades de tomar muito e que não posso deixar de as frisar nossa interpretação, esta relação entre os posições independentes. Havia choques de aqui. A primeira foi a luta pela manutenção seus sentidos, traduz-se em solidariedade e Revista Cibernética

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Entrevista participação. Juntos pra mudar e construir.

Como expliquei atrás, a OMUNGA vem de um processo de autonomização de um projecto do OKUTIUKA. Dentro do historial, gostaria de fazer referência ao caso do adolescente assassinado por um agente da polícia há anos atrás. Foi um processo triste. O adolescente

Watch, Front line, Cordaid, Trocair, Novib, etc, etc. Temos o estatuto de Observador da Comissão Africana dos Direitos do Homem e dos Povos desde Dezembro de 2008. Em relação à Christian Aid. É um dos nossos mais importantes parceiros. As nossas missões e visões se tocam em muito. Temos

O recurso ao diálogo tem sigo um dos elementos não existentes após várias manifestações em 2011 e 2012. Qual é o teu parecer nesta falta de diálogo? Já disse noutras entrevistas. Quem está no poder há dezenas de anos e sempre com a máscara da unanimidade, não está preparado para ver outros concidadãos a começarem a contestar e a mostrar os problemas graves da má governação. Um dos nossos propósitos com o QUINTAS DE DEBATE é precisamente promover estes uma verdadeira parceria. Intervimos juntos espaços de diálogo e de debate, numa perem várias campanhas. spectiva de participação ampla em todo o 5. Pelas informações da mídia, foste várias processo de construção do nosso país. Não vezes vitimizado pelo regime (ataques à sua apenas na vertente económica. casa, o carro prendido, etc). Qual é o segredo da tua coragem e persistência nesta No auge da chamada má-governação, luta? E qual é o parecer dos seus familiares pobreza, falta de liberdade de expressão, nesta situação? má-distribuição do erário público. Na tua Em primeiro lugar nunca apontei ter sof- óptica, qual é o maior problema em Anrido ataques em minha casa por causa da gola e qual pode ser a possível solução? minha intervenção. Fui sim atacado em casa Aproveito esta oportunidade para ser muito e assaltado várias vezes mas nunca liguei claro em relação àquilo que acho que é a isto à minha intervenção. E isto porque altura para o afirmar sem medo de errar. nunca consegui encontrar essa relação. Precisamos de ter garantias de que temos Na realidade a nossa viatura, a da OMUNGA, espaço de participação e vontade de muficou retida em Luanda na altura de uma das danças. A imagem do actual presidente da manifestações e aí sim, penso que teve esse república, o nosso concidadão José Eduardo propósito. Penso mesmo que pensaram que dos Santos, está demasiado desgastada, tínhamos muito material de propaganda den- quer a nível interno quer a nível internaciotro da viatura. Mas, se foi isso, enganaram- nal. Na minha opinião, ele próprio está a ser se. A nossa viatura foi aberta e demos conta um dos maiores entraves à mudança. Ele disso porque a placa do reprodutor do carro devia tomar a iniciativa de não mais entrar estava na mão de um dos responsáveis do na competição para o cargo de presidente. parque de retenção das viaturas localizado Acredito em várias questões neste mona Corimba. mento. Embora eu não esteja de acordo com Não sei se sou corajoso. Tenho medos como o actual formato de eleição, temos que estar qualquer ser humano. Tenho receios. Tenho seguros que haja transparência nele. Todos dúvidas. Tenho anseios. Persisto naquilo os cidadãos, militantes ou simpatizantes de que acredito que é o correcto. Se calhar qualquer que seja o partido, incluindo do se achasse que seria correcto aproveitar MPLA, têm que ter consciência que qualquer todas as benesses que a vida me foi propor- fraude afecta-nos a todos incluindo a eles. cionando, como falei atrás, teria seguido por Por outro lado, os partidos políticos deaí. vem demonstrar aos cidadãos que pretenEu apontei uma série de coisas de forma dem mesmo participar num processo de a percebermos como o sistema funciona. construção e não num mero processo de Inicialmente cheguei mesmo a pensar que conquista ou manutenção do poder e daí a era o correcto. Era preciso proteger o pes- conquista ou a manutenção dos interesses soal de confiança. O pessoal do “M” porque económicos. Quem está no poder tem tudo os outros eram o inimigo. Assim se estru- quem não está que se dane. turava o sistema. O pai de… que é amigo de… Então os partidos deveriam primeiro, não

A imagem do actual presidente da república, o nosso concidadão José Eduardo dos Santos, está demasiado desgastada, quer a nível interno quer a nível internacional. Na minha opinião, ele próprio está a ser um dos maiores entraves à mudança. Ele devia tomar a iniciativa de não mais entrar na competição para o cargo de presidente.

foi assassinado à queima-roupa com um tiro na cabeça enquanto estava algemado. Depois foi atirado do 4.º andar pelo buraco do elevador. Tudo queria demonstrar que o jovem tivesse caído sozinho. Assim tentava demonstrar o processo. O agente da polícia estava em fuga. Esse caso foi muito forte emocionalmente já que também havia um outro adolescente que presenciou todo o crime. Até hoje apresenta alterações psicológicas e não vemos qualquer intervenção do Estado no seu acompanhamento. O polícia foi depois “capturado” (coloco as aspas propositadamente), julgado e condenado. Não é o resultado que eu acredito que fosse o mais justo. Acredito que deveríamos ter conseguido discutir o funcionamento da polícia. Analisar porque isto acontece, etc. se calhar o próprio comandante municipal da polícia na altura devesse ter ido a tribunal prestar declarações. Isto não se conseguiu. De acordo aos nossos estatutos, a nossa missão é o de promover, divulgar e monitorar em todo o território nacional, estratégias para a infância e juventude que garantam o exercício dos seus direitos e deveres. Neste momento o nosso enfoque estratégico é “que sejam garantidas políticas de Protecção Social (Habitação, Saúde e Educação) através do Acesso à Justiça e ao Direito, com enfoque para género e a criança, por meio da participação, da não-violência e da construção da Paz. Temos os mais diversos financiadores e parceiros. Não me parece muito útil essa informação. O importante talvez seja dizer que temos parcerias com outras organizações através da rede Novox. Mantemos relações com a Amnistia Internacional, Human Rigths 14

e por aí. Isso já não tem mais sentido. Já estamos independentes deste 75 e as armas na maior parte do território de Angola já se calaram há alguns anos. Precisamos de construir um país com a participação de todos. Somos todos donos deste espaço.

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colocar na sua lista de candidatos o nome do nosso concidadão e actual presidente da república, José Eduardo dos Santos, muito menos como cabeça de lista. Deveriam comprometer-se em iniciar um processo de revisão constitucional com a ampla participação dos cidadãos. Isto é importantíssimo. Depois é garantir que as eleições autárquicas se realizem urgentemente. No meu entender todo o processo eleitoral sempre deveria começar pelas autárquicas. A terceira questão, que eu acho que os partidos devem ter no seu programa é a vontade de avançar com um processo de auditoria da dívida pública com a participação popular. Vermos onde foram os nossos dinheiros. Depois há garantias que têm a ver muito com a nossa realidade bem actual. Que os partidos se comprometam a respeitar as manifestações incluindo reconhecê-las como um importante espaço de participação popular para o controlo e fiscalização do exercício do poder e a outra é o compromisso com o fim das demolições e desalojamentos forçados. Os partidos que se envolvessem nestes compromissos deveriam merecer a confiança popular. Os restantes deveriam ser rejeitados na altura do voto. Como prevês as Eleições Gerais de Setembro deste ano? Pela organização e constituição da CNE, serão justas e livres? Que possíveis benefícios trarão estas eleições para Angola? O processo todo não tem sido transparente.

Devemos recuar no tempo e regressarmos ao processo constituinte. Continuo a insistir que esta foi a grande oportunidade que tivemos de transição pacífica e de construção de uma Nação. Sinto-me, como cidadão e da forma como nos envolvemos, que fomos verdadeiramente traídos. As irregularidades actuais põem em causa a verdadeira vontade de construirmos um processo de todos. Parece-me mesmo que este braço de ferro a insistir-se na nomeação da Suzana Inglês para o cargo de Presidente da CNE é a tentativa de mostrar alguma arrogância, tentar forçar tudo e todos para ver como reage-se a isso. Quase como medir as forças da sociedade civil e dos partidos de oposição. Não precisa, nem o MPLA nem o Presidente da República em insistir nisto porque eles têm montes de outras pessoas da sua confiança e que cumprem com os pressupostos da lei. Pessoas da sua confiança. Porquê insistir na Suzana Inglês? Medir o quê? É este tipo de posicionamentos que nos retiram a confiança. Há intenções de nos distrair com este pormenor e outros? Mas porquê? Eu pessoalmente não vou votar porque acredito que votar é para mim legitimar a forma de eleições que foi arquitectado durante o processo constituinte. Mesmo acho que não estão criadas outras condições como a liberdade de imprensa, o respeito pela manifestação, só para realçar alguns aspectos. Mas vou monitorar e fiscalizar.

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Isso vou fazer incondicionalmente!

Finalmente, o que fazes nos teus tempos livres? Que actividades prevês para o teu Dia dos Namorados (14 de Fevereiro)? e qual é o teu kudurista favorito (se é que tens um)? Gosto mesmo muito de ficar com os meus amigos, em casa e conversar, beber uns copos e ouvir música. Gosto de ambientes restritos sem muita confusão e que possa interagir com todos que estejam presentes e ao meu redor. Não tenho planos para o dia dos namorados. Não tenho nenhum por enquanto!!!!!!! Em relação ao kudurista curti o Dog Murras. Não tanto pelo estilo de música mas porque o pude conhecer há bastante tempo quando ele esteve cá no Lobito, muito mais miúdo e ficou hospedado no hotel Turimar. Era mesmo ao lado dos nossos escritórios na altura. Toda a miudagem com que trabalhávamos estava em êxtase. Tínhamos na altura um pequeno boletim feito pelos miúdos que se chamava “Os Nossos Mambos”. Então eles conseguiram entrevistá-lo. Ele visitou o nosso espaço e pareceume um miúdo com mente bem aberta. Agora já não sei. O sistema faz tudo para destruir a beleza que temos dentro de nós e produzir-nos em simples resíduos. Mas adorei a forma como ele conversou com o pessoal e lhes transmitiu força. Estou a falar dos adolescentes que viviam em situação de rua aqui no Lobito.

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