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Kalango #22 - Ano VI - Julho de 2015

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GPS (( LOCALIZE-SE )) 5 Editorial (Osni Dias). Imagem: Nestor Lampros 6 Tempo, velocidade, possibilidades - Por Osni Dias Guarani 7 Tempo de dentro e o de fora - Por William Araújo 8 O suicídio do co-piloto - Por Leonardo Boff 9 Associações Midiáticas - Por Sonia Mara Ruiz Brown 10 Contesxto - Por Maurício Andrade 11 Pressa em tudo - Por Orivaldo Leme Biagi 12 Um segundo a mais - Por Haisem Abaki 14 Tem sentido - Por Por Delta9 16 Un café s’il vous plaît - Por Andrea Albergaria 17 Pare e respire - Por Dan Devjacque 18 LUNA - Por Yndiara Lampros 19 Em Portugal, um banco diferente - Por Osni Dias 20 IMAGEM - Por Alline Nakamura 22 Uma terapia chamada culinária - Por Luciana Carpinelli 24 Todo dia é dia de índio? Por Osni Dias 26 Vamos brincar de índio - Por Osni Dias 33 IMAGEM - Por Nestor Lampros 34 Baseado em fatos reais - Por Jean Takada 36 Milhares celebram o aniversário de Atibaia - Por Diego Lima 46 Marcha da Maconha em Atibaia - Por Coletivo Alterando a Consciência

Boa viagem!

Revista Kalango. Edição #22. ANO VI. Julho de 2015. Editor: Osni Tadeu Dias MTb21.511. A Kalango é uma publicação independente, não tem vínculos políticos, econômicos, nem religiosos. A Kalango está no ar desde 2010. Quer anunciar? Quer ser colaborador? Ajude uma mídia independente. Escreva para osnidias@gmail.com. Concluída em julho de 2015.

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Editorial

Kalango #22 • Julho de 2015

Com a edição #22 da Kalango completamos 5 anos de existência. E persistência, embora estejamos sujeitos ao vendaval de mudanças promovido pela globalização, que desrespeita culturas, tradições, idiomas e crenças. Discussão recorrente e que, por esse motivo, trataremos na presente edição: a velocidade e as exigências do nosso tempo. O filósofo Paul Virilio sugere que vivemos numa bomba-relógio - e que a velocidade pode nos levar à catástrofes cada vez maiores, como o acidente do voo 4U-9525, da Germanwings, cujo avião foi derrubado de forma deliberada matando 149 pessoas. Nas páginas seguintes, abordamos rapidamente o assunto e esperamos que você tenha tempo para degustar tranquilamente cada página. Falamos do tempo sob vários aspectos e trazemos também saídas que nossos colaboradores querem compartilhar com você. Além disso, falamos sobre a situação atual dos índios brasileiro e publicamos uma experiência diferente vivida por jovens acadêmicos de Artes Visuais em Atibaia, que comemora 350 anos. Outro assunto é a Marcha da Maconha, que reuniu mais de 150 pessoas em junho e, por falar nisso, trouxemos novo clipe do EMICIDA, no texto “Baseado em fatos reais”, de Jean Takada. Desejamos a você uma ótima leitura nessa Santa Loucura! Osni Dias Guarani

NESTOR LAMPROS

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Tempo, velocidade, possibilidades Por Osni Dias Guarani Desde os anos 80 vivemos e convivemos com as mudanças impostas pela globalização econômica. Segundo Octavio Ianni, “terminou estrondosamente toda uma época e começou outra, não só diferente, mas muito diferente, surpreendente”. O mundo dos negócios e da cultura agilizou-se, desestruturando coisas, gentes e ideias. Depois disso, nada mais será como antes. A história entrou em movimento transformando geopolíticas, blocos e alianças, polarizações ideológicas e científicas, com a queda do Muro e das cercas que separavam as economias e ideologias. Hoje, não há mais trincheiras. Tudo é mais rápido. Para ontem, como costumamos dizer. Estamos na era do fast-tudo. E do faz-de-conta. Uma das características do mundo em que estamos é o que David Harvey chama de “compressão espaço-tempo”: a aceleração dos processos globais. Sentimos que o mundo é menor e as distâncias são mais curtas, que os eventos em um determinado lugar têm um impacto imediato sobre pessoas e lugares situados a uma grande distância. A padronização avassaladora toma de assalto as telas, os corações e as mentes, formando uma geração de clones prontos para o Deus Mercado. Há quase meio século Guy Debord já afirmava que “o espetáculo é o capital em tal grau de acumulação que se converteu em imagem”. Tudo em nome do progresso. E da alienação. O filósofo francês Paul Virilio aponta que progresso e catás-

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trofe são faces da mesma moeda. Segundo ele, o progresso e o culto à velocidade têm um viés obscuro e catastrófico, com o perigo nuclear, a fadiga da informação, a política refém dos mercados e a globalização dos afetos. A crise econômica que se manifesta intensamente nos Estados Unidos e na Europa redireciona somas gigantescas para “salvar” instituições financeiras envolvidas numa verdadeira orgia especulativa, provocando um abalo significativo não só em países com economia frágil, mas também no neoliberalismo e no pensamento único. A loucura pelos ganhos excedentes chegou no seu clímax na última década, mas o fenômeno não é recente. A aceleração da história é um produto do dogma do tempo real e da obsessão com o feedback instantâneo, estética criada pela CNN e pelos videoclipes da MTV. A transmissão do ataque às Torres Gêmeas do WTC, em tempo real, inaugurou um admirável Novo Mundo. Nele, o mundo real se dissolveu. Sem embargo, a mesma globalização que fabrica desigualdades cria a necessidade da diferenciação, da diversidade, da convergência e a emergência por uma cidadania global. Jovens e trabalhadores que aspiram a uma cidadania mundial, unem-se em movimentos de rebeldia a partir da tomada de consciência de que são sujeitos da história, reis de si mesmo. Nesse jogo de confrontos, apesar de frágeis, somos fortes e poderosos o suficiente quando estamos juntos e certos daquilo que desejamos. Um Mundo Novo é possível. E é pra hoje. Sem perder a ternura. Por que quem sabe faz a hora. O resto você já sabe. > Baixe a edição e acesse os links - que estarão em toda a revista - em vermelho.


PALAVRA

Tempo de dentro e o de fora Por William Araújo

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tempo, na contemporaneidade, geralmente é interpretado como espaço que precisa ser preenchido de algo para fazer sentido. Curiosamente, Aurelius Augustinus, que viveu de modo intenso em sua época, após esgotamento dos prazeres, passa a questionar sobre o tempo de Deus. Nisso, sem ócio, estando tudo previsto e planejado passou a existir em seu devido momento e não simultaneamente como algo eterno. Estudos contemporâneos certificam existir o tempo externo, bem como o interno (do indivíduo). Atualmente, poucos se interessam em estudá-lo ou mesmo acioná-lo. Notadamente, pois exige de cada um um caminho para dentro de si e não para fora. Nisso reside a complexidade relacionada À religiosidade e à devoção, bem como ao rigor dos estudos científicos vinculados à psicologia, psicanálise, entre outros. Em outras palavras, um tempo

ainda a ser ativado. Na medida em que o tempo exterior é destinado à medição e ao registro dos fatos, seu oposto é o que procura dominá-lo. Os valores não se diluem ou estilhaçam. Pelo contrário fortalecem valores caracterizados na moral, na ética, em dons matizados pelo respeito, caridade, compreensão, pacificação, entendimento, controle das ansiedades e transformação que passam a ser reproduzidas em hábitos ainda pouco adotados nesse estágio da vida. Esse raciocínio na contemporaneidade não atrai a atenção dos leitores, e para muitos beira o absurdo. Isso se sustenta no projeto de modernidade, que não admite a existência de um Deus. Em vez disso, o indivíduo busca o futuro, e este, difícil de ser alcançado ou de ser percebido como algo dominado, permite que os seres dele se apropriem em/aos pedaços. Em outra palavras, a correria pelos fragmentos

do cotidiano dão a cada um a suave sensação de conquista de um futuro próximo e nisso reside o domínio da história naquilo que ela permite compor: retalhos de uma obra que nunca termina. Interessante observar que se uns sinalizaram isso (os teóricos) os demais agem dentro desta matriz por adoção de um modelo que vem sendo adotado há pelo menos três séculos. A pós-modernidade tornouse morbidade móbile em muitas falácias validadas no consumo daquilo que é (re) novo. Um alimento reprocessado reina no mundo. Poucos aprenderam a fazer a dieta das ideias e conhecimentos amontoados, em nome de uma educação do que há de bom no seu ser interior. Isso talvez explique os modelos em falências múltiplas, e quem sabe no futuro (sem previsão) faça surgir os que vão ensinar/mostrar o resultado do que é/há de bom no interior de cada um. Quem quiser viver, verá.

Leia ouvindo uma boa música: https://www.youtube.com/watch?v=jHTcEj_Am2E Kalango#22 •

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PALAVRA

O suicído do co-piloto: expressão do niilismo da cultura pós-moderna?

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suicídio premeditado do co-piloto Andreas Lubitz daGermanwings levando consigo 149 pessoas, suscita várias interpretações. Havia seguramente um componente psicológico de depressão, associado ao medo de perder o posto de trabalho. Mas para chegar a esta solução desesperada de, ao voluntariamente pôr fim a sua vida, levando consigo outros 149, implica em algo muito profundo e misterioso que precisamos de alguma forma tentar decifrar. Atualmente este medo de perder o emprego e viver sob uma grave frustração por não poder nunca mais realizar o seu sonho, leva a não poucas pessoas à angústia, da angústia, à perda do sentido de vida, e esta perda, à vontade de morrer. A crise da geosociedade está fazendo surgir uma espécie de “mal-estar na globalização” replicando o “Mal-estar na cultura de Freud. Por causa da crise, as empresas e seus gestores levam a competitividade até a um limite extremo, estipulam metas quase inalcançáveis, infundindo nos trabalhadores, angústias, medo e, não raro, síndrome de pânico. Cobra-se tudo deles: entrega incondicional e plena disponibilidade, dilacerando sua subjetividade e destruindo as relações familiares. Estima-se que no Brasil cerca de 15 milhões de pessoas sofram este tipo de de-

pressão, ligada às sobrecargas do trabalho. A pesquisadora Margarida Barreto, médica especialista em saúde do trabalho, observou que no ano de 2010 numa pesquisa ouvindo 400 pessoas, cerca de um quarto delas teve ideias suicidas por causa da excessiva cobrança no trabalho. Continua ela: “é preciso ver a tentativa de tirar a própria vida como uma grande denúncia às condições de trabalho impostas pelo neoliberalismo nas últimas décadas”. Especialmente são afetados os bancários do setor financeiro, altamente especulativo e orientado para a maximalização dos lucros.

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Heidegger vai mais longe ao afirmar, creio que de forma exagerada, que todo o Ocidente é niilista porque esqueceu o Ser em favor do ente

motivos das greves de outubro na França, se achava também o protesto contra o acelerado ritmo de trabalho imposto pelas fábricas causando nervosismo, irritabilidade e ansiedade. Relançou-se a frase de 1968 que rezava: “metrô, trabalho, cama”, atualizando-a agora como “metrô, trabalho, túmulo”. Quer dizer, doenças letais ou o suicídio como efeito da superexploração do processo produtivo no estilo ultra acelerado norte-americano, introduzido na França. Estimo que, no fundo de tudo, estamos face à aterradoras dimensões niilistas de nossa cultura pós-moderna. O termo, niilismo, surgiu em 1793 durante a Revolução Francesa por Anacharsis Cloots, um alemão-francês e foi divulgado pelos anarquistas russos a partir de 1830 que diziam: “tudo está errado, por isso tudo tem que ser destruído e temos que recomeçar do zero”. Depois Nietzsche retoma o tema do niilismo, aplicando-o ao cristianismo que, segundo ele, se opõe ao mundo da vida. No após guerra, em seu seminário sobre Nietzsche, Heidegger vai mais longe ao afirmar, creio que de forma exagerada, que todo o Ocidente é niilista porque esqueceu o Ser em favor do ente. O ente, sempre finito, não pode preencher a busca de sentido do ser humano. Alexandre Marques Cabral dedicou dois volumes ao tema:”Niilismo e Hirofania: Nietzsche e Heidegger’(2015) e Clodovis Boff três volumes sobre a questão do Sentido e do Niilismo.

Por Leonardo Boff

Uma pesquisa de 2009 feita pelo professor Marcelo Augusto Finazzi Santos, da Universidade de Brasília, apurou que entre 1996 a 2005, a cada 20 dias, um bancário se suicidava, por causa das pressões por metas, excesso de tarefas e pavor do desemprego. A Organização Mundial de Saúde estima que cerca de três mil pessoas se suicidam diariamente, muitas delas por causa da abusiva pressão do trabalho. O Le Monde Diplomatique de novembro de 2011 denunciou que entre os


Em setores da pós-modernidade, o niilismo se transformou na doença difusa de nosso tempo, quer dizer, tudo é relativo e, no fundo, na vale a pena; a vida é absurda, as grandes narrativas de sentido perderam seu valor, as relações sociais se liquidificaram e vigora um assustador vazio existencial. Neste contexto, se retomam tradições niilistas da filosofia ocidental como o mito, citado por Aristóteles no seu Eudemo, do fauno Sileno que diz:”não nascer é melhor que nascer e uma vez nascido, é melhor morrer o mais cedo possível”. Na própria Bíblia ressoam expressões niilitas que nascem da percepção das tragédias da vida. Assim diz o Eclesiastes:”mais feliz é quem nem chegou a existir e não viu a iniquidade que se comete sob o sol”(4,3-4). O nosso Antero de Quental (+1860) num poema afirma:”Que sempre o mai pior é ter nascido”. Suspeito que esse mal-estar generalizado na nossa cultura, contaminou a alma do co-piloto Lubitz. Também pessoas que entram nas escolas e matam dezenas de estudantes em vários países e até entre nós em 2011 no Rio na escola Tasso da Silveira quando um jovem matou mais de umaz dezena de alunos, revelam o mesmo espírito niilista. Medo difuso, decepções e frustrações destruíram em Lubitz o horizonte de sentido da vida. Quis encontrar na morte o sentido que lhe foi negado na vida. Escolheu tragicamente o caminho do suicídio. O suicído pertence à tragédia humana que sempre nos acompanha. Por isso, cabe respeitar o caráter misterioso do suicídio. Talvez seja a busca desesperada de uma saída num mundo sem saída pessoal. Diante do mistério calamos, pasmados e reverentes, por mais desastrosas que possam ser as consequências. Recomendo o livro de Clodovis Boff O livro do sentido, vol I de três, Paulus 2014.

Associações Midiáticas Sonia Mara Ruiz Brown Constantemente somos abordados pelas mais diferentes informações. Algumas delas nos são indiferentes, há outras que nos divertem, nos fazem sonhar, nos preocupam e as que nos levam à reflexão. Recentemente uma reportagem e, na sequência, uma publicidade me levaram, no seu conjunto, a ponderar. A reportagem noticiava a existência de crianças de 8 a 14 anos, entoando canções funk com letras maliciosas, nomes feios e em figurações insinuantes. Elas se apresentam em casas noturnas, matinês e têm buscas estrondosas na internet. A publicidade, por sua vez, dirigida ao Dia das Mães, mostrava um formato de coração constituído de sacolas de compras. Se a publicidade entende que o Dia das Mães, ao invés de ser um marco de reverência e amor, pode ser aproveitado como mero estímulo de consumo, não seria de se estranhar que as relações familiares, dentro desse escopo, fossem igualmente tão insensíveis e irresponsáveis quanto o exposto na reportagem, em que pais não se preocupam em ensinar aos seus filhos o que é respeitoso e correto na convivência em sociedade. Perdem o controle da educação e ainda se deixam ser sustentados pelo sucesso imoral dos filhos. Situação vergonhosa e preocupante dessas famílias, mas elas não têm consciência disso, pois estão fascinadas pelo encanto transitório e fugaz das compras, do sucesso, sem perceber o que as espera mais adiante. Paralelos contraditórios como esse exposto são tão comuns que já nem chamam atenção. Sonia Mara Ruiz Brown é doutora em Língua Portuguesa/USP.

Leonardo Boff é colunista do JBonline, teólogo, filóaofo e escritor. www.leonardoboff.wordpress.com Kalango#22 •

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LETRA

CONTESXTO Por Maurício Andrade Nobre alma maltrapilha negra mestiça d’outro mundo príncipe de coração transplantado no casebre palácio alugado no morro que mora sem herança de raça do sangue derramado todo dia nos lixos reciclados do trânsito urbano nos campos das praças lotadas do povo cheio de vazias represas hidrelétricas em terra de índios sem terra nas ruas repletas de poucos menores reduzidos a maiores de ruas cheias de raivas tatuadas nos jovens de tribos de índios queimados nos bancos tão ricos de classes in glórias de povos tão nobres brancos tecidos de bandeiras coloridas matas devastadas inocências juvenis e precoce ansiolítico em tarja negra na mídia regulada dieta da moda transgênicas plantas dos pés transgenérico em cruzes benditas em bênçãos franciscas do arauto budista lama pisada na terra do povo sem medo de amar.

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Pressa em tudo! Por Ph. D. Orivaldo Leme Biagi

O tema proposto para a presente edição da Kalango, vem bem a calhar com os tempos atuais – tudo era para ontem! O ritmo da vida atual é tão intenso que as atuais palavras já estão velhas – e as novas também!!! Será que o ser humano está pronto para tal ritmo de vida? Computadores, eletrônica e outras modernidades são maravilhosos instrumentos para a vida – mas também cobram bastante para a sua excelência. A pressa em que vivemos é consequência direita de tal cobrança. A pressa é tão constante que estou escrevendo o presente artigo com muita pressa! Por quê? Porque o editor, com tantas coisas para fazer, avisou-me do tema ontem e deu prazo de hoje para escrever o que vocês estão lendo!!! Quer mais pressa do que isso?

Trilha: https://www.youtube.com/watch?v=FfvXafsDcws

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PALAVRA

Um segundo

a mais Por Haisem Abaki

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edução da maioridade penal? Delação premiada? A popularidade da presidente em queda? Dilma e Obama cheios de love pra dar? A tragédia grega? A goleada do Palmeiras sobre o São Paulo? Sim, estes foram assuntos muito comentados na semana. Mas a vida e a profissão ensinam que nem sempre o que o jornalista acha mais relevante é o que realmente interessa ao cidadão. Pois tudo isso ficou pra trás quando fizemos “a grande descoberta”: a terça-feira, 30 de junho, teria um segundo a mais. Coisa de cientista pra sincronizar os relógios do mundo com a rotação da Terra. Algo que parece bem bobo, mas que segundo especialistas tem muita importância. É o seguinte, vou explicar. É que… Não, não vale a pena perder preciosos segundos com um tema tão complicado para um cara (eu, eu mesmo) que sempre foi um zero à esquerda na Matemática, uma tabela periódica de desculpas esfarrapadas pra não estudar Química e a distância mais curta entre a ignorância e a falta de esforço pra entender a Física. O fato é que esse um segundo adicional, que já nos foi dado de presente 26 vezes desde 1972 (26 segundos!), se transformou no assunto preferido pelos ouvintes. Mensagens aos montes chegando, cada um dizendo o que faria com o “tempo extra”. Tinha de tudo… De romântico a dorminhoco, trabalhador a baladeiro, passando também pelo politicamente correto e incorreto. Alienação? Não! Apenas uma demonstração de que as pessoas estão

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Leia o artigo ouvindo SKANK https://www.youtube.com/watch?v=tGHcDJz9s-Y

de saco cheio da mesmice, da cara-de-pau e das mentiras “deslavadas a jato” repetidas por aqueeeles personagens, que somos obrigados a despejar sobre elas todos os dias. Depois de tamanha repercussão do bizarro horário de 23 horas, 59 minutos e 60 segundos antes da virada para 1º de julho, me vi tomado pelo toc-toc do pensamento incessante sobre o que faria com o tal “segundo plus”. Martelou na volta pra casa, martelou quando fiz a habitual corrida, martelou debaixo do chuveiro, martelou até no travesseiro… A primeira imagem foi o nascimento da minha filha. Aqueles olhos grandes arregalados pra mim. Tadinha, fui a primeira pessoa que ela viu. Ficaria ainda mais feliz se aquele momento se estendesse por mais um segundo. A cena se repetiu quatro anos depois, com o irmão dela. Os mesmos olhos me encarando, mas além do olhar foquei no penduricalho (zinho) dele. Como seria bom ter um segundo a mais para uma ida e vinda entre os olhos e o… E o que mais? Um segundo extra pra ver as primeiras engatinhadas, os primeiros passos e os primeiros tombos. E para ouvir os primeiros sons, depois palavras e principalmente trocas de sílabas. Também queria um segundo a mais pra corrigir algumas bobagens. Claro que seria suficiente! E pra dizer a alguém especial que sua importância será eterna, mesmo quando parecer que o tempo se esgotou. E vai outro segundinho de sobra pra visualizar os olhos doces e carinhosos de quem me socorreu nos piores momentos de depressão. Um simples olhar pra agradecer por algo que também é para sempre.

E como a vida renasce e segue, por favor, reserva aí mais um segundo pra mim. Só pra dizer a alguém que aquilo que eu disse não é bem o que eu disse. Na verdade, é muito mais do que eu disse, com o perdão da redundância e das repetições. Com um segundo a mais, também teria dado um último abraço mais apertado no meu pai naquele dia em que eu não sabia que seria a despedida. Ainda aproveitaria o tempinho estendido pra não sentir vergonha de ter “suor nos olhos” por alguém que mereça uma lágrima. E, sem querer abusar, mais um segundo pra um alô especial a ouvintes de tanto tempo. E pra um bom dia menos apressado pro morador de rua que cata latinhas na rodoviária e me cumprimenta quando corro pra pegar o ônibus de madrugada. Ah, claro, um chorinho no tempo pra mais um cafuné na minha cachorra ou nos “cãopanheiros” dela que vejo largados na rua. Putz, a lista tá grande… Só um segundo pra dizer “Porco, Porco” e reviver a sensação do Maaaarrrrcoooos pegando aqueeele pênalti. Por favor, corintianos, não fiquem bravos. Mas se rolar uma raiva que seja apenas por um segundo. E vamos em frente… O alarme do celular tocou às 3h40 “damadru”, como sempre. Fiquei sem saber direito se foi pensamento ou sonho. Ou tudo junto e misturado. Mas valeu ter passado a eternidade das 23 horas, 59 minutos e 60 segundos dormindo. Não quero mais ter tempo de dizer que não tenho tempo… Haisem Abaki é jornalista do Grupo Estado.

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BRISA

Tem sentido Por Delta9* Dentre minhas inexoráveis viagens espaciais, numa delas (ou duas a mais, quem sabe) deparei-me estarrecido com sonoridades. Por esses sons que vi pela idades, sonorizouminh’almagentil letras, falas, cantos, ritmos e olhares firmes empurrando o horizonte. Hoje, nos mesmos lugares me estiro e já não os ouço mais. Foram com as viagens. Penso, enquanto exito: será que eles nunca existiram? * Delta9 é extraterrestre, publicitário e atua no Judiciário. http://www.youtube.com/watch?v=KO1GGDZbXj

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America Latina ©2014-2015 ROSENFELDTOWN Publicada originalmente na revista Reconciliando Mundos n° 19

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Un café s’il vous plaît Por Andrea Albergaria

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ntão estou a renovar documentos, num poupa tempo qualquer, espécie de oásis no caos burocrático, salva vidas na praia lotada de mar revolto , quando ao meu lado uma menina de casaco verde oliva chega com o pai, para fazer seu registro geral, famoso RG que nos acompanha em forma de sombra numérica ao longo da vida e dos balcões, e soletra seu nome para atendente, que distante da Grécia antiga, repete e indaga simultaneamente: Moira? Sim, penso eu com alegria: Moira, agradável coincidência aparecer junto com meus novos papéis para ingressar num novo ciclo; sim, Moiras, três irmãs mitológicas gregas, que regem a humanidade e os deuses, criando o fio de suas vidas. Uma o tece, outra define sua medida e a última o corta. Moiras girando o tear, num movimento contínuo, que hora

nos põe em cima, e outras lá embaixo. Penso também com carinho nos deuses hindus que me acompanham nos últimos vinte anos: a tríade Brahma, Vishnu e Shiva, que cria, mantém e destrói, respectivamente (serão eles também regidos por elas?). Penso na menina, na atendente, em mim (corpo, mente e espírito no mesmo invólucro), na chuva fina que cai lá fora, na agenda da semana seguinte, no que não fiz ontem e nem vou fazer hoje, e não interfiro na conversa paralela da menina mitológica e da atendente impecável, de coluna reta e seriedade intransponível. Nós três com a mesma expressão de nada, momento efeito Kuleshov deste roteiro sempre a escrever, feito de surrealismo fantástico e suspiros noir. Preencho cada dia/página/centímetro de fio de tear com tudo que possa parecer útil, agradável, prazeroso, belo e perfumado. Procuro também outros novos desafios, depois de conquistas suadas, fortes e intensas como o aroma de café feito na hora, bebida estimulante da qual sou agradecida pelo apoio extra nesta corrida insana, cuja apreciação faz com que artigos possam ser finalizados, amizades mantidas e Moiras contemporâneas surjam na madrugada. Amanhã é novo dia.

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Pare e respire Por Dan Devjacque

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are e respire. As nossas praticas diárias estão ligadas ao que somos e como reagimos com o mundo a nossa volta. Nos definimos a partir de inúmeras praticas sutis, e certos detalhes muito importantes que, por vezes, acabam passando despercebidos na correria do dia a dia. Por exemplo, o simples ato de parar e respirar conscientemente. Sentir por um momento o ato maravilhoso do ar circulando pelos pulmões, em um processo que é automático para nós. Nossa respiração muda de acordo com nosso estado emocional e a respiração bem cadenciada e calma é muito importante para que possamos nos conectar com nós mesmos e equilibrar nosso humor, emoções e controlar atitudes impulsivas. Tudo que fazemos, aplicamos nossa energia. Nossas ações, palavras e pensamentos são resultados de energia aplicada de acordo com nossa intenção. Não podemos deixar que esta energia se esgote, porém, muitas vezes nos encontramos com a bateria muito fraca. Quando isto acontece é comum nos depararmos com estados emocionais pesados e um constante mal humor. E é notável que certos problemas acabam por tomar proporções maiores do que são realmente... No geral, viver com a bateria fraca se tornou algo comum nas cidades. Todos buscam recuperar suas energias em seus tempos de folga, mas o problema é que se não mudarmos certas práticas diárias, viveremos sempre esgotados. Podemos viver de uma maneira que nossa energia nunca se esgote e o segredo está bem de baixo de nosso nariz.

O ato de parar e respirar conscientemente te desprende do seu estado automático e te coloca no centro de si; te devolve ao controle e possibilita uma visão mais ampla dos altos e baixos que passamos. Aqui notamos que nos tempos de stress e de correria que se vive hoje, não se trata mais do que se deve fazer para recuperar suas energias, mas ao contrário, de perceber o momento que devemos simplesmente parar e não ser arrastado pelo fluxo.

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LUNA Por Yndiara Lampros - Lá vai a louca. Era assim que as pessoas se referiam à Luna, quando ela passava. Logicamente, falavam em voz baixa, pelas costas, que todo mundo quer parecer politicamente correto, principalmente os políticos que parecem, mas não praticam a correção. Depois da passagem da Luna, começavam os cochichos: - Essa aí é doida de pedra. - Quase matou o pai. Seis tiros. À queima roupa. - O pai e a mãe. Ouvi dizer que foi à faca. Dezessete golpes. - Não. Tentou sufocação. Com o travesseiro. Os velhos estavam dormindo... Cada um tinha uma teoria. Umas escabrosas, outras risíveis. Nenhuma verdadeira. Luna era de fases, mas nunca tentara matar ninguém, muito menos os pais. Ela nascera redonda, o rostinho circular. Branco. Chamaram-lhe Luna e a menina cresceu cheia de mistério. Ensimesmada. Vivia para dentro, casmurra, solitária. O segredo de Luna era simples para quem tivesse olhos de ver e ouvidos de ouvir. No entanto, desvendá-lo requeria sensibilidade e o mistério de Luna permanecia insondável. Debaixo da superfície árida e rarefeita, porém, havia um coração pleno. Mar de sentimentos.

Luna era sensível à musica, à poesia, à pintura. Seus aguçados sentidos a tudo captavam ávidos e atentos. Mas, num mundo de bundas e boquinhas da garrafa, de entretenimento para digestão rápida, a alma de Luna teve azia. A quem declamar suas poesias inspiradas em noturnos de Chopin? A quem mostrar suas telas cheias de vida e compostas como canções? Com quem conversar sobre Lispector, Meireles, Pessoa, Garcia Marques? Como expressar-se sobre arte entre gente para quem Picasso significa um membro grande? De ânsia em ânsia, a alma de Luna adoeceu. Diagnosticaram como Esquizofrenia. Num mundo insensível, ao portador da sensibilidade não é atribuído bom senso. Luna foi internada, amarrada, drogada. Deram-lhe drogas para cessarem as alucinações. Quando pensavam que já lhe haviam domado os sentidos, soltaram-na no mundo dito real. Sentidos, no entanto, não se aprisionam, como não se aprisiona o ar, como não se aprisionou Luna. Ela apenas aprendeu a mentir sobre o que via e aí ficou mais fácil para os realistas concordarem em chamá-la de artista. Afinal, todo artista é louco, dizem. Luna, no entanto, persiste, satélite de uma terra que ainda é plana e não descobriu que sem Lunas não há equilíbrio. A terra fica árida e seca. Por isso, Luna persevera. Carente, minguante de que lhes desvendem, crescente e cheia do sentir. Grávida permanente do poético.

Trilha - Pato Fu: https://www.youtube.com/watch?v=aaZlIDXNzKg

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Em Portugal, um banco diferente Por Osni Dias Portugal tem um banco diferente do que nós conhecemos no Brasil. Ele não trabalha com dinheiro, mas com ações - um sistema de troca de ações solidárias, ou melhor, ele atua para que as pessoas possam fazer serviços umas para as outras. Cada membro que vai em busca do banco oferece e recebe um serviço. Um professor pode oferecer uma aula de inglês a quem não tem condições de pagar pelo serviço e, depois,

recebe um serviço em troca, de outro membro associado. O que está em jogo são os relacionamentos, a solidariedade e a colaboração. Por m eio do banco, as pessoas compartilham suas habilidades, seus talentos, facilitando o acesso a pessoas que dele precisam. O sítio da instituição diz que “o Banco de Tempo suscita questionamentos e incentiva mudanças no modo como vivemos em sociedade”. Você

deve estar se perguntando como acontecem as negociações. Como pagar, ou receber, pelo banco? O serviço é pago com um “cheque do tempo”. Quem prestou o serviço deposita o cheque, que é creditado em sua conta, e pode a partir daí obter serviços oferecidos pelos outros membros do banco. As horas têm o mesmo valor, independente do serviço oferecido, em qualquer das 28 agências espalhadas pelo país.

Conheça o trabalho do Banco do Tempo: https://www.youtube.com/watch?v=MDq9Swx_69o Kalango#22 •

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IMAGEM Alline Nakamura

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Uma terapia chamada culinária Por Luciana Carpinelli “Cozinhar é um modo de amar os outros.” Mia Couto, no livro O Fio das Missangas

Quanto tempo é necessário para cozinhar um ovo? A resposta pode variar entre três e quinze minutos, mas o quanto demora vai depender do resultado que se deseja. Por outro lado, há um ditado italiano que diz que o risoto não espera nem o rei, precisa ser servido imediatamente após ficar pronto. E assim também é na vida: não importa quanta tecnologia seja desenvolvida, para certas coisas não há nada capaz de adiantar ou atrasar o processo. E no meio da euforia que domina nossa vida atual, a culinária transforma-se em uma terapia barata (e gostosa!) que nos ensina que para tudo há um tempo certo e provoca muitas outras reflexões. Qual foi a última vez em que você acendeu o fogão para preparar uma refeição? Pode ter sido ontem mesmo, mas meu convite vai além de abrir embalagens e esquentar seu conteúdo. Assim como é necessário organizar-se para conseguir exercer todas as atividades do dia, o mise em place [http://www. cozinhandopara2ou1.com.br/truques-e-dicas/aimportancia-da-pre-preparacao-mise-enplace/] é o ponto inicial de uma receita: quais ingredientes e utensílios serão usados? Escolha alimentos frescos, coloridos e o menos processados que puder. Cozinhar vai muito além de gostar, faz parte de uma conscientização sobre o que se come e o porquê. Açúcar refinado, sal, gorduras e outros elementos químicos também ajudam a elevar o estresse, você sabia?

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Higienize, descasque, corte os ingredientes e acrescente a eles uma caprichada pitada de amor. Compartilhe a cozinha com as pessoas que ama e o resultado será ainda mais gostoso do que um belo prato de comida.

Sugestões para experiências gostosas e fáceis na cozinha: Mini suflês ou omeletes de forno http://www.cozinhandopara2ou1.com.br/2015/04/09/mini-sufles-ou-omeletes-de-forno Sopa de legumes superprática http://www.cozinhandopara2ou1.com.br/2014/10/21/sopa-de-legumes-superpratica/ Tiras de mignon com molho de tomate http://www.cozinhandopara2ou1.com.br/2014/05/29/video-tiras-de-mignon-com-molho-de-tomate/ Maçã assada com canela e frozen yogurt caseiro http://www.cozinhandopara2ou1.com.br/2015/02/19/maca-assada-com-canela-e-frozen-yogurt-caseiro/ Luciana é jornalista e criadora do site Cozinhando para 2 ou 1

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TODO DIA

é dia de índio?

O Brasil tem quase 900 mil índios de 305 etnias e 274 idiomas. Apesar disso, poucos conhecem a realidade desses povos. Nessa edição, tentamos trazer à luz os últimos acontecimentos em torno das questões indígenas no Brasil.

Por Osni Dias

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á dois anos, com o propósito de comemorar o Dia do Índio, a Fundação Nacional do Índio (Funai) e o Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística (IBGE) lançaram a publicação, “O Brasil Indígena”, com a divulgação de dados demográficos da população sistematizados pelo censo de 2010. A pesquisa contabilizou 896 mil pessoas que se declaram ou se consideram indígenas. De acordo com o documento, o Brasil tem 896,9 mil indígenas em todo o território nacional, somando a população residente tanto em terras indígenas (63,8%) quanto em cidades (36,2%). Pela primeira vez se investigou o número de etnias indígenas, encontrando 305 etnias: 250 dentro das terras indígenas, 300 fora delas. Também foram identificadas 274 línguas, sendo a Tikúna a mais falada (34,1 mil pessoas). Dos 786,7 mil indígenas de 5 anos ou mais, 37,4% falam uma língua indígena e 76,9% falam português. Essas e outras informações podem ser vistas na publicação Censo 2010: Características Gerais dos Indígenas – Resultados do Universo. Apesar dos esforços da FUNAI e do IBGE, a imensa maioria dos brasileiros ignora os dados apresentados pelo Censo. E o pior: o preconceito e o ódio tem gerado muitas mortes no campo. Em junho foi lançado o Relatório Violência Contra os Povos Indígenas no Brasil, publicado pelo Conselho Indigenista Missionário (Cimi). Ele relata um severo aumento da violência praticada contra os povos indígenas no Brasil em 2014. Foram registrados 138 homicídios, 135 suicídios, 785 mortes de crianças de zero a cinco anos, 19 conflitos territoriais, 84 invasões possessórias para exploração ilegal de recursos naturais e danos diversos ao patrimônio, 118 casos de omissão e morosidade na regulamentação de terras. O Relatório pode ser baixado aqui:

www.cimi.org.br/pub/Arquivos/Relat.pdf No mesmo mês, a Articulação dos Povos Indígenas do Brasil (Apib) acusou a presidente Dilma Rousseff, o ministro da Justiça, José Eduardo Cardozo, e o advogado geral da União, Luís Inácio Adams, de serem responsáveis por aquilo que classifica como “genocídio de povos indígenas em curso no Brasil”. O texto afirma que “além de não cumprir com sua responsabilidade constitucional de demarcar nossas terras, José Eduardo tenta legitimar sua omissão sugerindo que se ele demarcasse essas http://migre.me/qKo9O terras estaria provocando os fazendeiros a cometerem mais violência do que já cometem. Em vez de enfrentar e prender os assassinos de nossas lideranças, o governo brasileiro se curva às suas ameaças e chantagens”. O Relatório Figueiredo é um documento http://migre.me/qKnRT que revela as atrocidades pelos quais passaram os indígenas durante o regime militar. Ele é um dos inúmeros documentos que as entidades que atuam na defesa dos povos indígenas dispõem. E também pode ser baixado em sua versão resumida (68 páginas). http://pt.scribd.com/doc/142787746/Relatorio-Figueiredo

Só para completar, O ISA (Instituto Socioambiental) publicou o dossiê “Belo Monte – Não há condições para a Licença de Operação” também no final de junho. O documento aponta as principais consequências do desrespeito às condicionantes socioambientais da hidrelétrica que está sendo construída na região de Altamira (PA), no momento em que o Ibama avalia a autorização da operação da usina. As informações contidas aqui são apenas uma parte daquilo que você, leitor, pode encontrar nas redes sociais ou em blogs que atuam em defesa dos indígenas, dos quilombolas e do meio ambiente. Ainda que tudo pareça impossivel ou distante, seu apoio é muito valioso nessa luta pela vida.

http://migre.me/qKof4

http://migre.me/qKocs

CENSO 2010: http://www.ibge.gov.br/home/estatistica/populacao/censo2010/caracteristicas_gerais_indigenas/default_caracteristicas_gerais_indigenas.shtm

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VAMOS

FOTOS: ALEX NATAL

brincar de índio

Preocupados com as condições de vida dos parentes em todo o país, convidamos estudantes de Artes Visuais para participar de uma experiência diferente: a “customização” de bonequinhos - com características indígenas. O resultado você vê nas páginas seguintes. Por Osni Dias 26 • Kalango#22


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epois do Censo 2010, o Brasil “descobriu” os índios brasileiros. Sabemos agora que existem quase 900 mil habitantes no século 21 e que estão a crescer, apesar das atrapalhadas governamentais nas últimas décadas e do avanço do desmatamento, da seca e do avanço do agronegócio em todo o território nacional (inclusive na Amazônia). Em abril de 2015, a reportagem da Revista Kalango procurou acadêmicos de Artes Visuais para desenvolver um trabalho inusitado: transformar bonequinhos plásticos em peças artesanais que representassem as diversas etinias indígenas do país. Para isso, entregou para cada artista dois bonecos para que fossem “customizados”, em duas etapas. A primeira, como desejassem, sem um parâmtro definido pela revista. Já o segundo, deveria ser escolhido entre as diversas etnias disponibilizadas pelo estudo apresentado pelo Instituto Socioambiental em sua página Povos Indígenas no Brasil. Assim, durante duas semanas, os acadêmicos se mobilizaram para encarar o desafio da melhor maneira possível, sob a ótica de cada um, individualmente. Depois, lhes foi apresentado o endereço do Instituto Socioambiental para que escolhessem uma etnia a fim de produzir o segundo modelo. Procuramos manter os depoimentos na íntegra, para que os relatos não sofram quaisquer alterações em seu sentido. Agradecemos imensamente a disponibilidade dos jovens acadêmicos, que se dispuseram a participar desse trabalho. Agradecemos também ao jovem diretor de teatro e também, acadêmico Durval Montovanini, que reuniu os colegas de turma para ajudarem nesse experimento e nessa matéria. O que vocês verão a seguir não tem nenhuma ambição de se constituir em um trabalho científico, mas serve de motivação para que os leitores busquem cada vez mais o conhecimento sobre os povos indígenas do Brasil.

O que é arte para você? Cada povo tem um jeito único e diferente de produzir beleza e de se relacionar com os objetos, corpos, sons que manifestam o que é belo. Existem tantas artes indígenas quanto há povos indígenas! A criação artística está em toda a parte: na pintura corporal, na construção das casas, nas performances musicais, nos objetos usados para comer e guardar coisas. Descubra a diversidade das artes indígenas na nova seção do PIB Mirim! http://pibmirim.socioambiental.org/artes Na imagem, mulher Kayapó Mebengokre, da Terra Indígena Mekrãgnoti, em um evento do Instituto Menire. Foto: Beto Ricardo/ISA Fonte: Instituto SocioAmbiental Povos Indígenas no Brasil http://pib.socioambiental.org/pt

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O DESPERTAR Desde pequena tenho contato com a arte das mais diversas maneiras. Minha mãe como professora e suas amigas professoras também sempre proporcionaram momentos prazerosos e passeios à museus e exposições... Quando terminei o colegial, não tinha certeza de que curso eu iria fazer, mas tinha certeza de que deveria seguir a minha intuição e fazer algo realmente prazeroso, que fosse me alegrar, desse prazer de estudar e frequentar uma faculdade... Pois bem, tive certeza de que cursaria Artes, mas não sabia quando e nem como. Foi quando me deparei com o curso de Artes Visuais em Atibaia e me senti em casa, entregue ao destino e tive certeza que lá era o meu lugar... Hoje, no último ano, posso dizer com todas as letras que tomei a atitude certa no momento certo, sou muito grata por todas as pessoas que conheci através do curso e da instituição. Eles revelaramse verdadeiros amigos. Obtive e ainda obtenho valiosos ensinamentos... ARTE & CULTURA Trabalho com arte desde sempre. Como minha mãe sempre foi professora, estive envolvida ao meio, ajudando-a em exposições, fazendo meus próprios trabalhos e desenvolvendo meu “eu criativo”. Atualmente sou instrutora de Inglês, monitora do programa Mais Educação, trabalho com o Programa Horta e desenvolvo muitas atividades sustentáveis buscando o lado artístico e sensível de cada um. Desenvolvo também um trabalho muito significativo que tem o poder de transmutar energias ao redor através das mandalas, também conhecidas como “Olho de Deus”. O ANTES A experiência com os indiozinhos, a princípio, foi um pouco dolorosa, para ser sincera. Por se tratar de bonequinhos, foi um pouco difícil encontrar ferramentas delicadas para trabalhar, acertar os pigmentos para cor da pele e desenhos tribais... Mas depois que foi tomando forma, comecei a me tranquilizar e aceitar as proporções e as formas que tomaram por si só... Acredito que minha frustração inicial esteja relacionada ao que os índios estão passando, por tanto tempo, com invasões em suas terras, injustiças e culturas absurdas enfiadas “guela” abaixo...

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QUEM É Júlia Soldani

O DEPOIS Eu já tinha um conhecimento prévio. Na escola sempre estudamos a respeito do índio, valorizando sua cultura e demonstrando verdadeiro respeito. O CONTATO Esse trabalho trouxe um “insight” muito grande a respeito do Índio, quem é o índio, como eles agem, como deveríamos agir, como seria o Brasil e outros países se tivéssemos valorizado desde sempre a verdadeira cultura, valorização a natureza, respeito ao próximo, respeito ao curso natural da vida... A EXPERIÊNCIA Sinto que seria bem mais simples e a natureza estaria esplendorosa, muito grata de nós, mas infelizmente as coisas tomaram um rumo diferente e o que nos resta é tentar salvar o que ainda temos incentivando o verdadeiro significado dessa cultura, trabalhando com dedicação dentro das escolas e da comunidade, demonstrando a importância da cultura que fez e faz tanto por nós, lutando pela verdade.


O DESPERTAR Se eu falar que cresci num ambiente totalmente artístico, estarei mentindo, mas foi até certo ponto com a mesma magia e descoberta de como me vejo hoje. Gostava muito de desenhar, assistir filmes infantis no cinema na época de férias, pintar com tintas, sujar as mãos, roupas, casa, o mais lúdico possível.

QUEM É Caroline Pereira Zago

ARTE & CULTURA É necessidade, é obrigatório para a construção do ser humano, saber sobre nossos ancestrais, dos povos e culturas diferentes das nossas, adentrar a um novo mundo de percepções e ideais ao se identificar com o outro. O ANTES Foi uma boa experiência. A intenção era dar uma característica ao boneco, uma identidade a ele. O primeiro foi mais simples, sem pensar em algum povo indígena específico, talvez de um olhar mais infantil do que uma criança tenha sobre a imagem de um índio. Já no segundo, segui alguns parâmetros e características de um povo indígena existente. Nunca havia feito algo parecido com isso, mas gostei bastante. O DEPOIS No segundo, representei um Yanomami, que representa uma das maiores tribos relativamente isoladas na América do Sul. Eles vivem nas florestas e montanhas do norte do Brasil e sul da Venezuela. Representei fielmente em suas pinturas, a roupa utilizada, nas suas cores e formas. Entre o primeiro e o segundo, prefiro o segundo, pois gostei mais de fazê-lo e acho que ficou mais interessante e realmente bem parecido com o que desejava. O CONTATO Eu conhecia apenas a FUNAI (Fundação Nacional do Índio) e sua missão institucional de proteger e promover os direitos dos povos indígenas no Brasil. Com certeza tem muito mais a aprender, pois não fazia noção desse grande número de povos indígenas existentes, e um bem diferente do outro, onde o objetivo é sempre o mesmo, que é ter sua moradia no lugar de onde estão acostumados e que gostam e a conservação de suas terras, merecedores de respeito e paz para darem continuidade a novas gerações, em respeito a essa maravilhosa tradição e o real significado de Brasil.

A EXPERIÊNCIA Trouxe-me uma boa experiência e muito aprendizado sobre os povos indígenas e da importância de respeitar quem chegou aqui primeiro, quem invade e sempre invadiu seu território foi o não-índio, ou seja, nós que trouxemos guerra onde não devia existir conflitos. Conscientizar o não-índio é uma tarefa difícil, mas não impossível, pois engloba muito mais do que apenas respeito. Ainda há muito preconceito e descaso, uma frieza desprezível de desconsideração com a cultura indígena, e que dá uma certa vergonha de fazer parte desse povo. Existe uma frase acontecendo na internet, nas redes sociais em geral, parece brincadeira, mas vejo que faz todo o sentido, que diz: “O jeito é devolver o Brasil aos índios e pedir desculpas”. E talvez seja esse o caminho mesmo no bom sentido da frase, em meio a tanto desrespeito e indiferença, a vontade é de deixar essa nação, devolver a quem realmente lhe interessa e pedir perdão por todo o ocorrido e os males que lhe foram ocasionados. Fundo: Cesto xotó Yanomami - AM Kalango#22 •

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O DESPERTAR A miragem da Arte é o nome que simboliza minha infância. Viver em contato com a natureza, com os pés na terra molhada, plantar flores, correr atrás das galinhas e patos, selar o cavalo e cavalgar nas matas, sentindo o vento balançar meus cabelos, o sol em minha pele, ouvir o barulhos das águas da cachoeira junto aos pássaros cantantes foram os primeiros contatos com a arte. Pegava o lápis de cor, mesmo pequeno, riscava e pintava aqueles momentos tão profundos para eternizar pra sempre no papel. A arte é para aqueles que estão acordados, e com a alma sensível que capta verdades escondidas no éter. ARTE & CULTURA A cultura vem de encontro com esta premissa onde através dos vários meios de se fazer arte progride com sua forma especial, a música, o teatro, a dança, a poesia, as imagens na tela além da tecnologia hoje progridem, mas somente a essência verdadeira vai atingir a verdadeira criação. Desde criança desenvolvi a pintura, e na música gravei e cantei por todo Brasil e Paraguai o LP intitulado “Nasce uma Estrela”. Atuei como locutora de programa infantil, promovi muitas crianças e jovens - que hoje gravaram e estão atuando na área - em shows de talentos. Hoje trabalho com shows e eventos artísticos.

FOTO: MARTA ALVIM

QUEM É Samantha Brambilla

O ANTES Quando recebi o bonequinho para transformar em índio, estava com o tempo escasso, mas aceitei devido ser uma experiência significante. Por registrar toda a energia da natureza, os conhecimentos de escola primária, da cultura da tribo “Tupinambá” (a escravidão, os pajés...) e hoje “Caiçara” e população “Cabocla”. O DEPOIS Este processo criativo veio preencher o vazio que estava em mim, pois a pena, a roupa, a palha, as amarras, foram ferramentas que ofuscaram em mim um protesto contra as barbáries dentro do sistema político em que vivemos - e mostrar que devemos ter fé em nossa força interior. A EXPERIÊNCIA A conscientização do não-índio deve ser trabalhada, a fim de remeter o próximo a pensar que, em qualquer parte do mundo, todos têm o direito de viver a sua cultura, seus costumes, sua religião.

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IMAGEM: NÚCLEO TUKUM - DA ESCOLA ESTADUAL INDÍGENA TUPINAMBÁ DE OLIVENÇA (BA)


O DESPERTAR Desde muito pequeno eu desenho, sempre fui fascinado pela arte de desenhar e sempre procuro me aprimorar. Cresci em frente à televisão, assistindo desenhos animados e absorvendo os traços que via na tela e, assim, construí meu repertório visual.

QUEM É Tiago Donizete Leme

ARTE & CULTURA A arte e a cultura podem e devem andar de mãos dadas. A arte pode entreter e estimular a reflexão sobre o mundo e suas questões. Cultura é arte e arte é cultura. Profissionalmente trabalho com artes desde que ingressei no mercado de trabalho. Fiz trabalhos na área de publiciade, design e ilustração de livros didáticos e editoriais. O ANTES Foi bastante gratificante. Jamais havia feito algo neste sentido antes, mas gostei bastante. O primeiro indiozinho eu fiz de cabeça, sobre a indumentária dos índios kuikuros. Gostei bastante do resultado. O DEPOIS O segundo fiz sobre os índios Enawene-nawe, que também já tinha um conhecimento prévio. Como sempre admirei a cultura indígena já conhecia o site e tinha ciência da diversidade cultural indigena. A EXPERIÊNCIA Gostei bastante do exercício. Acho fundamental

o desenvolvimento de um trabalho para a conscientização do não-índio. A sociedade brasileira atualmente está passando por um periodo particularmente nefasto e misógeno. Quero crer que a arte pode ajudar, ao menos um pouco, a mudar esse quadro.

Terra Indígena Enawenê Nawê, Mato Grosso. Foto: Vincent Carelli, 2009

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O DESPERTAR Desde criança tenho me interessado pelas artes, não podia ver um lápis ou uma caneta que logo já saia rabiscando paredes, mesas e papeis. Depois que meus traços começaram a se firmar, percebi que eu conseguia construir os desenhos com mais perfeição e isso obtinha apoio de meus pais. O que me deixou mais surpreso é que eu conseguia fazer copias dos desenhos com muita perfeição, o que me tornou mais interessado e me “aprisionou” nas artes até os dias de hoje. Vivo rabiscando e formando novos desenhos. Nesse meio, o que mais me encantou foi a forma como eu conseguia - e consigo, até os dia de hoje - expressar no papel a forma que eu imaginava determinados desenhos. Onde haviam carros, sempre havia um desejo interior de criar modelos de carros e até mesmo caminhões diferentes, ou seja, mais estilosos como os carros equipados que temos nas ruas nos dias de hoje. ARTE & CULTURA A arte e a cultura no meu modo de ver têm se transformado, pois cada povo tem uma característica artística diferente e, quando há uma adaptação de uma cultura, ou há uma modificação dela, artisticamente falando, surge com isso um resultado inovador - tanto na cultura quando no meio artístico. - Como falei as artes tem me acompanhado desde de cedo, e além de desenhos sou músico e trabalho na maior parte do tempo nesta área musical, onde já participei de bandas não famosas e hoje sigo trabalhando nesse meio sozinho, mas esse isso é ao fins de semana com vários eventos como festas religiosas; O ANTES Eu nunca havia feito uma atividade desta antes, e quando aceitei fazer parte dessa atividades me deparei com duas situações (embora meus indiozinhos não tenha aguentado segurar a cor por causa da tinta utilizada): a primeira meu olhar sobre um índio e a segunda, como eu estava errado sobre as culturas e os povos. Foi para mim uma experiência muito agradável e experimental.

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QUEM É Lucas Alves dos Santos

O DEPOIS O antes foi meio sem noção, pois como não tinha um conhecimento geral da atividades, fiz o indiozinho da maneira que eu sempre o via e imaginava. Já ao segundo foi diferente. Como tive que pesquisar um povo, procurei analisar as características e traços que artisticamente dominavam essa tribo que escolhi. A EXPERIÊNCIA Não havia conhecimento nenhum em mim sobre a cultura indígena apresentada no ISA. Para mim, o site e tudo em si foi um conhecimento novo Esse exercício me ajudou a conhecer outros povos indígenas. Para mim não há possibilidade de realizar algum trabalho para conscientizar o não-índio, pois os povoados são muitos e os jeitos e costumes dos povos indígenas são totalmente diferentes dos povos que deixaram de ser indígenas, pois para mim os índios são joias raras que sobrevivem em nossa cultura.


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NESTOR LAMPROS


Baseado em fatos reais Por Jean Takada “O tempero do mar foi lágrima de preto”. 30 de junho, terça-feira, o rapper Emicida publica em seu canal do Youtube o clipe da sua nova música “Boa Esperança”. Como não podia deixar de ser, o trabalho retrata o preconceito racial e a luta de classes no país. Com uma letra ácida e um filme de prender a respiração o músico, desta vez, oferece o que muita gente gosta de classificar como um belo “soco no estômago da sociedade”. O enredo do vídeo se passa em uma mansão, onde a maioria dos empregados é negra e os patrões se divertem distribuindo violências como preconceito com penteados afros, assédios e intolerância religiosa. Tudo corre solto até que a uma das empregadas explode. Começa aí a rebelião (e o recado de Emicida). Dirigido por João Wainer, fotógrafo do documentário Junho e Kátia Lund, que assina Cidade de Deus, o roteiro é

fruto de pesquisa feita com moradoras da ocupação Mauá, no centro de São Paulo, que vivem na área invadida e trabalham como empregadas domésticas. Dois dias depois, sem que houvesse tempo para que sociólogos de plantão de rede social se juntassem para afirmar que o clipe é exagerado, Maria Júlia Coutinho, jornalista apresentadora da previsão do tempo do Jornal Nacional, da TV Globo, é vítima de racismo em dezenas de postagens na página do programa no Facebook dando início a mobilização nacional #somostodosmaju. No dia seguinte Maju, como é chamada pela equipe do JN mandou a mensagem ao vivo: “[...] a verdade que é que eu já lido com essa questão do preconceito desde que me entende por gente, é claro que fico indignada e triste [...]. Minha militância é com o meu trabalho. Os preconceituosos ladram e a Majuzinha passa!”. https://www.youtube.com/watch?v=g_BZvzE0Bdg

https://www.youtube.com/watch?v=AauVal4ODbE

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EVENTO

Milhares celebram o aniversário de Atibaia Por Diego Lima Atibaia completou, no mês de junho, 350 anos de história. Em comemoração a essa data tão especial, foram realizados diversos shows entre os dias 24 e 28. As festividades se concentraram na área externa do Centro de Convenções Victor Brecheret, no Parque das Águas.

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Kalango#22 • FOTOS: DIEGO LIMA


O tradicional Desfile Cívico no Paço Municipal deu início às comemorações e reuniu centenas de pessoas. Como de costume, diversas escolas e associações participaram da celebração que ainda contou com o encerramento da FAMA (Fanfarra Municipal de Atibaia). Ainda no dia 24, o musical Frozen e o grupo O Teatro Mágico agitaram o público na Arena do Centro de Convenções. O musical inspirado na animação infantil da Disney de mesmo nome, encantou crianças e adultos. Já o grupo O Teatro Mágico, trouxe ao palco seus sucessos, além de um show de acrobacias – marca registrada do grupo. Na segunda noite, a banda regional Versales e a lendária Banda Ira!, aqueceram os fãs de rock sem deixar nada a desejar. Grandes sucessos interpretados por ambas as bandas fizeram o público soltar a voz e lembrar do passado. A terceira noite de comemoração agradou a todos que gostam de pagode: o primeiro grupo a apresentar foi Um Novo Styllo da cidade de Bragança Paulista. Na sequência, o grupo Pixote, com mais de vinte anos de carreira, fechou a noite cantando seus grandes sucessos.

A quarta noite foi embalada ao som de Samba e MPB: a banda Água de Benzê animou o público interpretando diversos sucessos, além de fazer todos “caírem na roda” com uma energia tão boa que até os próprios integrantes desceram do palco para sambar. Fechando a noite, a cantora Maria Rita, filha de Elis Regina, enfrentou o frio para alegria dos fãs que foram até a arena prestigiar a cantora.

Na última noite de shows, o Centro de Convenções foi tomado por milhares de fãs da boa música sertaneja. O clima teve seu “esquenta” com Willian Marques e Rubinho que antecedeu o show da dupla Fernando e Sorocaba. A dupla Fernando e Sorocaba cantou seus grandes sucessos e também lembrou de músicas tradicionais, além de outros cantores desta nova geração do sertanejo. O último dos principais shows dos 350 anos de Atibaia foi encerrado com uma grande queima de fogos. As comemorações do aniversário de Atibaia continuam com festas nos bairros até o mês de agosto. Em entrevista à Agência Atenados, o prefeito de Atibaia, Saulo Pedroso de Souza, parabenizou a cidade e todo o povo atibaiense. “Parabéns ao povo de Atibaia, a todos aqueles que ajudaram a construir esses 350 anos de história! Que possamos fazer, ao longo do tempo, nossa cidade crescer e se desenvolver cada vez mais”.

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Na página anterior, abertura das apresentações musicais, com O Teatro Mágico. No alto, Pixote. Ao lado, Maria Rita e na página seguinte, o grupo IRA!


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Marcha d mais de 150

Por Cole

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da Maconha reúne 0 pessoas em Atibaia

etivo Alterando a Consciência

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KARINA LUMINA FOTOGRAFIE

Marcha da Maconha reuniu mais de 150 pessoas em Atibaia em 27 de junho de 2015. Essa foi a 5ª Marcha da Maconha realizada na cidade. Aconteceu sob um clima de paz, tranquilidade e uma sintonia muito boa entre todos os que estavam ali para se manifestar a favor da legalização da maconha no Brasil. A concentração começou, como de costume, às 16h20, no centro da cidade, exatamente na Praça da Matriz, espaço já consagrada para grandes acontecimentos. Esta edição contou com músicos do Rap da Região: Uquipega, Jeh Preto, R.E.I.S, Nostalgia Gang, Pezinho, Guerreiro e KPC Rima X, que representaram o tema da legalização transformando, em música e poesia, os impactos negativos da proibição - que afeta principalmente a periferia das cidades brasileiras. A marcha também contou

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com o apoio do Cordão da Bola Presa, que levou instrumentos e seus famosos Bonecões, representando personalidades conhecidas dentro do ativismo pela legalização: Cheech & Chong - os pioneiros a tratar sobre drogas em seus filmes e Ras Geraldinho, fundador da Primeira Igreja Rastafari do Brasil (Niubingui Etíope Coptic de Sião) e que está preso por defender a utilização da cannabis para fins religiosos. O trajeto começou na rua José Lucas, em direção a Igreja do Rosário. Passou pela rua adjacente a esta, Rua José Alvim, retornando pela Igreja matriz, para voltar até a Praça - onde aconteceram mais apresentações de Rap. Esta data foi escolhida com cuidado, pois é justamente a época em que se comemora o aniversário da cidade. O centro estava movimentado e, mais

uma vez, a Marcha da Maconha levou o questionamento da proibição para as ruas, tirando comerciantes e cidadãos de suas rotinas. Curiosos se reuniram nas calçadas enquanto a marcha passava em harmonia, com o som alto dos instrumentos do cordão e suas já conhecidas “palavras de protestos”. Muitos acenavam e saudavam os manifestantes, não somente jovens, mas também pessoas idosas. Ao retornar para a Praça da Matriz, a apresentação do Rap continuou até a noite. Essa não é uma ação isolada. A Marcha da Maconha é organizada por ativistas que não defendem apenas a legalização da maconha, mas de todas as drogas. A marcha é organizada de maneira coletiva e sempre conta com o apoio do Coletivo Antiproibicionista Alterando a Consciência. O Coletivo foi criado durante a segunda edição da marcha, para que os esforços em prol da legalização pudessem se estender para o resto do ano, com palestras e eventos que abordam o tema de maneira séria, auxiliando também na redução de danos aos usuários. A Marcha da maconha costuma acontecer em diversas cidades do Brasil durante o ano, principalmente durante o chamado “Maio Verde”. Este ano, o tema principal abordou as mortes causadas pela proibição, que afetam principalmente a juventude negra e pobre das periferias. Esta 5ª edição da marcha teve a presença de diversos outros coletivos e pessoas de cidades da região. Todos unidos contra a proibição, que se mostra cada vez mais ineficaz e retrógada.


RICARDO DE PAULA

Questões legais É importante ressaltar que “as marchas pela legalização” tem como objetivo ampliar a perspectiva crimonológica que se secundariza sob a temática do uso de drogas. Drogas sempre fizeram parte da história da humanidade, integrando dietas, cultos e vários aspectos do desenvolvimento humano. Sua proibição, entretanto, é recente, o que evidência que a lei proibitiva não tem apenas uma função, a coação imediata. Imediatamente encontramos fenômenos como a criminalização da pobreza enquanto fio condutor da política proibicionista, importada dos EUA. Quem determina quem é o traficante e quem é o usuário?

Segundo a própria Lei Nacional são as circunstâncias sociais em que o agente está inserido. Atualmente, 2 (duas) gramas de maconha com um pobre pode e geralmente o leva a cadeia, enquanto o “rico” se livra solto como usuário. O uso de classe dessa política penal, denominada de Direito Penal do inimigo, identifica no proletariado sua razão de existir, seu inimigo interno. Reivindicar a legalização não é só é um direito à livre manifestação, reconhecido pelo STF (Supremo Tribunal Federal), como também uma maneira de dizer não ao encarceramento massivo e a redução da maioridade penal. No alto, os bonecões representando Cheech & Chong - os pioneiros a tratar sobre drogas em seus filmes e Ras Geraldinho

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VOLTE SEMPRE


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