Kalango 27

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Kalango #27 - Ano 12 - Maio de 2021

Rumo à Marte o Qual futuro nos aguarda?


Kalango #27 • Maio de 2021

Boa viagem!

Revista Kalango. Edição #27. ANO 11. Maio de 2021. Editor: Osni Tadeu Dias MTb21.511. A Kalango é uma publicação independente, não tem vínculos políticos, econômicos, nem religiosos. A Kalango está no ar desde 2010. Sua equipe é formada por professores, poetas, artistas plásticos, fotógrafos, jornalistas profissionais, ilustradores, publicitários, filósofos, escritores e um extraterrestre. Quer nos apoiar? Ajude uma mídia independente. Anuncie. Quer ser colaborador? Escreva para osni.dias.faat@ gmail.com. Edição concluída em 3/6/2021, dia de Corpus Christi.


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Um mundo inóspito –

M

Vermelho”. arte é conhecido como o “O Planeta mas um dia Sua bandeira jamais será vermelha, ano, pegar você vai querer deitar no solo marci ecido desde no colo e chamar de seu. Ele é conh m de Nergal (A Estrela ava am ch o ios ôn bil ba Os e. ad uid a antig m Marte como sendo uma ara fic nti ide s go gre os Já ). rte Mo da E os troianos gostavam de das cinco estrelas errantes do céu. mo fazem alguns imbecis. cavalo, não sei se mais do gente, co go, percebeu que Marte O astrônomo Hiparco, que era gre je humanos bilionários ho o, iss r po z ve tal e, o ári ntr co ao rodava acha que isso é novidade, em qu Pra lá. pra ir to tan am eir qu viar a primeira sonda à em 1960 os russos já tentavam en es espaciais. Em 1971, eles Marte, inaugurando a era das missõ 3. A primeira teve pane lançaram as sondas Marte 2 e Marte da foi surpreendida por un seg A ta. ne pla o m co -se ou oc e ch uma selfie 20 segundos ou nd ma e ia are de de sta pe tem a um o construído pelo homem antes de falhar. Foi o segundo objet do que foi o Tio Sam, fala a tocar o solo marciano. E você achan Esforços visando uma . 20 20 até es ssõ mi 46 ram Fo . de a verda tados desde os anos 50. cu exe o sid têm rte Ma a da ula trip o missã Space Exploration (EUA) e for ion Vis a da cia un an foi 04 20 Em tripulada para Marte lá em uma lei permitiu, assim, uma missão es tripuladas a Marte em 2030. Para a NASA, a hipótese de missõ s. No mesmo ano, a nte de ce pre sem e el iáv inv e a-s str 2030 mo r uma missão humana via en de ten pre eia rop Eu al aci Esp cia Agên ma Aurora. Ahhhh Aurora, à Marte como parte do seu Progra to com porteiro, elevador como seria bom um lindo apartamen or em Marte! Uma ótima e um ar refrigerado para os dias de cal leitura!

Papo de quarente na quarente na J

Carlos Eduardo Carneiro Página 5

Delta9 -

uli Manz i Página 6

Página 8

Marte dos bilhões, por Marino Maradei Página 9

Velhos amigos , por Céllus

Página 17

Rei por u m triz Gilberto Sant’Ann a Página 1 0

Transições

Marcelino Lima Página 19

GPS

(( LOCALIZE-SE ))

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Rapha C ruz e a musica c ab verdean oa

Página 2 0


IMAGEM Alline Nakamura


PALAVRA

N

Um mundo inóspito Carlos Eduardo Carneiro

os anos 70 anunciaram a descoberta de gelo em Marte e Raul Seixas cantou: “no entanto não há galinha em meu quintal”. Hoje, apesar do frisson de explorar Marte, o número de brasileiros sem galinha no quintal é avassalador. Muitos já não tem nem quintal porque o banco expropriou. Alguns têm galinha no quintal, mas não podem comprar gás. Os petroleiros em greve mostraram que é possível vender o gás de cozinha a quarenta reais. Não foi a tecnoburocracia que demonstrou essa possibilidade ao povo com o seu pedante economês, na verdade foram os trabalhadores da Petrobrás através da luta de classes. Por falar em tecnoburocracia, o filósofo francês Henri Lefebvre em seu ensaio Contra os Tecnocratas afirmou que a ideologia capitalista justifica qualquer avanço tecnológico ou missões espaciais por si mesmas. O fato de enviarmos robôs para Marte se justifica porque, afinal de contas, enviamos robôs a Marte. O complexo industrialmilitar lucra e mata com a ingenuidade dos que criticam o progresso e, ao mesmo tempo, se deixam levar por

ficções científicas. Guerra nas estrelas é só nome de filme, pois a guerra real é aqui mesmo na Terra. Nove décimos da população não gozam dos avanços tecnológicos disponíveis. Há muitas casas sem geladeira, sem energia elétrica…muitas com fogão, mas sem o gás. Em 1969, a sociedade do espetáculo cunhou a famosa frase Um pequeno passo para um homem, um grande passo para a humanidade. Igual ao tal “Mercado” que amanhece nervoso ou confiante, essa tal “Humanidade” também parece uma entidade não abstrata. A humanidade que pregam não existe porque exclui as periferias e as classes trabalhadoras. É só um sentimento difuso que nos ilude enquanto voltamos a cozinhar com lenha, voltamos a morrer de sarampo, continuamos a morrer em chacinas, morremos de fome e depressão… mas quem se importa com esses pobres terráqueos pobres? Há um ambiente inóspito, árido e hostil ao desenvolvimento da vida e que precisamos pesquisar: o capitalismo.


LETRA

Papo de quarentena Juli Manzi

Eu to ligada na sua E to na mesma faz tempo Vamo tomando uma surra, mulher No coração aqui dentro Louca pra sair de casa Eu mal consigo dormir Só imagina minha brasa, menina To que nem Sapucaí

M

inha parceria com Eristhal começou há uns dez anos. Eu estava fazendo shows de lançamento do álbum Ponto Cego e fui tocar numa casa da Vila Madalena onde ele era técnico de som. Tinha um momento free desse show onde todos os músicos da banda improvisavam. Na passagem de som o convidei a participar desse momento improvisando com recursos da mesa de áudio. Lembro bem quando chegou a hora do improviso, ele mexia em todos os botões da mesa enquanto gritava coisas do tipo “atonalismo” e “dodecafonia”. Logo percebi que o cara era uma figuraça. Quando vi ele tocando alguns meses depois, não restou dúvida de que era um músico muito talentoso e fora do comum. Além de compositor, o Eri já acompanhou como instrumentista a metade da cena alternativa de Sampa, além de uns figurões do mainstream como Marcelo Camelo, Mallu Magalhães, Otto e Maria Gadú.

Tanta notícia falsa Ódio no gabinete Enquanto o jato vaza Bozo vira presidente Tive a alegria de dividir palcos com ele em várias ocasiões, com destaque para um show onde tocamos só Jorge Mautner. Há um ano atrás, uma semana depois da morte do Aldir Blanc, o Eri me convidou para colocar letra num samba dele. Junto com a linda melodia que me enviou, vinham algumas sugestões de versos como “eu tô levando uma surra, mulher / no coração aqui dentro”, entre outras coisas. Vinculei imediatamente aquilo ao contexto da pandemia e do isolamento que, quem diria, estava apenas começando. A letra retrata um diálogo entre duas amigas que falam de quarentena, malhar em casa, download de apps, fakenews, gabinete do ódio, lives, curtidas, compartilhamentos... Enfim, é um retrato do momento tão marcante e inesperado pelo qual passamos. Juli Manzi (Giuliano Tosin) é poeta, compositor, pesquisador e professor

Eu já nem sei o que faço Baixei um aplicativo Quando acabar a quarentena, amor Eu te explico o motivo Eu vi você outro dia Em lives e transmissões Foi um milhão de sorrisos E um monte de corações Eu to malhando de dia Triatlo no apartamento Comprei um biquíni novo Chega a qualquer momento Quero botar na rede Quero arrebentar Matar a minha sede Curtir, compartilhar E um dia sair de novo Pra ver o sol brilhar E no calor do povo Voltar ao meu lugar

Pra ver o sol brilhar, toque aqui https://bit.ly/3g8ASEr


LETRA

A verdade é um prisma

Ana Procopiak

Giovana Fernandes

Enquanto lunáticos desejam alcançar paragens longínquas Eu canto a infinitude do chão. ‘A lembrar Manoel de Barros’

Vários lados, mas com o mesmo brilho para quem vê. Essa é a verdade com a qual trabalhamos em nosso dia-a-dia. Na política, na vida, no trabalho. O mesmo lado que eu vejo não é o que o outro enxerga, e por isso há sempre um debate – natural – sobre a visão de tudo. Este artigo, inclusive, pode brilhar de uma forma para mim e de outra para você. E ainda assim ele continuará existindo. Mas até que ponto poderia relê-lo de maneira a convencer cada um que esbarrar com ele? Não raro vemos um mesmo fato ganhar várias versões. Da mais honesta e fiel até as famigeradas fake news. Alimentadas por um inequívoco interesse pessoal, um fato é torcido até que todos os lados do prisma se multipliquem e se transformem em muitos outros fragmentos do mesmo brilho, cegando os olhos daqueles que fracamente se esforçam para enxergar além do que realmente se vê, embora a narrativa não tenha a força e a naturalidade do que é real. É difícil lutar contra esta onda poderosa, pois as inverdades possuem uma facilidade para quem dissemina e para quem ouve: ela tem um poder instantâneo de “veracidade”. A crença em algo que

agrada individualmente o leitor que anseia por justamente aquilo tem o domínio destrutivo de proliferar-se e contaminar a visão sobre a verdade que ronda aquele fato ou notícia. Desmistificar ou desmentir as fake news é um ato intimidador, seja para quem solta a informação ou para quem a recebe por lhe ser plausível, por um motivo muito claro: desmascara o que se acreditava ser a verdade. E é por este motivo que, todos os dias, é necessário lutar contra o contágio das inverdades. Brigar de forma justa e equilibrada, civilizadamente, para se defender a força da verdade e da informação tem sido uma das muitas lutas árduas da atual sociedade. É inacreditável presenciar a simplicidade com que as pessoas abraçam toda e qualquer notícia, como se aquela fosse a única verdade, absoluta e verdadeira, e todo o resto tornasse-se indigesto e mentiroso. A necessidade de lutar pela manutenção da verdade é a única coisa que salva este mundo – já tão virado – das garras das fake news. Afinal, distorcer a verdade pode ampliar o brilho imediato do prisma que tanto buscam, mas ele se ofusca com a verdade na mesma velocidade de um eclipse, pois não é real.


BRISA

SASSEVA SÀ ATNETNI EUQ TE O Delta9* ACAMAR AFAMAR ARAMAR EXUMAR ACALMAR ARRUMAR ESPUMAR VITIMAR CONSUMAR DESALMAR ESFUMAR SUBLIMAR PROCLAMAR TRANSFORMAR DESARRUMAR PLASMAR AMAR BLASFEMAR SOFISMAR PERFUMAR INFLAMAR DESARMAR

Viajar pelo espaço infinito sem entender teus finitos espaços, fará que tú te vejas, humanidade? Espaçar tuas viagens pelo entendimento de teus pensares esparsos te humanizará, viajante? Navegar é preciso. Navegar é preciso. Navegar-te é ter-te e ter-te é uma arte. Navegar-te é uma arte marcial ET...

TE

* Delta9 é extraterrestre, publicitário e atua no Judiciário.


LETRA

Marte dos bilhões Marino Maradei Jr.

Cansado de ser um humilde aprendiz, Mickey, furtivamente, vestiu o chapéu do feiticeiro e tomou-lhe o condão encantado. Então, transformou seu desejo recalcado em utilidade prática: ou seja, livrar-se do trabalho braçal. Como? Dando vida a uma vassoura serviçal, que se multiplicou em dezenas de outras vassouras alopradas. Era Walt Disney, galhofo, antecipando a era dos robôs domésticos no filme “Fantasia”, de 1940. Em nossos dias, aquela vertigem futurista espelha à perfeição toda a volúpia sonhática do sul-africano Elon Reeve Musk, personagem que parece ter brotado dos comics, mas que é, sim, de carne e osso. Bacharel em física, self-made man e filantropo, detém apenas o segundo lugar na lista dos maiores bilionários do planeta, conforme a Revista “Forbes”. O que ele faz dos seus 151 bilhões de dólares? Escudado neles, comanda empresas de cujas usinas nascem carros elétricos, minissubmarinos, laboratórios de inteligência artificial, placas de energia solar e foguetes espaciais. Um deles, imagina, conduzirá, em 2024, uma nave levando civis bilionários (Bill Gates? / US$ 124 bilhões; Homem de Ferro (Tony

Stark)? / US$ 12,4 bilhões; jamais Tio Patinhas / US$ 65,4 bilhões), que serão os colonizadores pioneiros de Marte – pois autômatos já o habitam (mapeando o terreno para recebê-los?). Encontram-se lá Perseverance (EUA) e Zhurong (chinês), aturando-se, sem brigas. Até agora. Foi para transmitir tal desígnio pacífico e, ao mesmo tempo, para buscar inspiração, que Musk pousou com sua aeronave no quintal da casa dos Simpsons, em Springfield; conquistou Lisa e Bart, filhos do patético Homer, salvando-o, até, da perseguição do mau patrão Montgomery Burns (US$ 2,6 bilhões), dono do complexo nuclear da região. Ao despedir-se, de volta ao espaço – emulando ET –, Musk chamou a bordo o Homer holográfico. Springfield contaminara Musk. De saudade e solidão. O episódio “The Musk Who Fell to Earth” é mesmo só ficção? * Jornalista, professor e um dos mais respeitados profissionais do rádio e da imprensa paulista.


PALAVRA

Rei por um triz Gilberto Sant’Anna tintas de prosopopeia. Aconteceu que o cavaleiro-soberano ajoelhou-se diante da imagem de Cristo, em contrição ao 25 de dezembro. Benzeu-se da testa aos ombros, no limiar da Santa Cruz. Em meio ao fervor suplicou ajuda para o bom termo das tarefas de rei da Cavalhada. Os ofícios paramentados e o papo fiados com os

Depois de lhe descoberto o paradeiro, o infante desfilou montado num fogoso cavalo, o Fulgor

A

festa da Cavalhada comemora-se em dezembro, imediatamente após o Natal. É singela. Os participantes emplumam-se pelas malhas citadinas, exibindo montarias de passos marchados. O corte-jo reparte-se em duas colunas ou mais. A culminância do folguedo consiste em encontrar o rei, que se esconde no derredor das comemorações. A façanha do achado significa deter o cetro e as pra-xes do ano vindouro. No desenrolar dos misteres de 1946, entreouviu-se uma eriçada conversa entre o soberano e o Tião Bueno, para espanto de tantos quantos coadjuvantes. O assunto remoía os poderes de assombração do cavalo Fulgor. É bom lembrar que falácias desse tipo eram comuns ao imaginário provinciano , porém, sem tantas ladainhas e exageros. Contadas ao arrepio, os fatos enredaram-se em

amigos só terminaram depois de alta noite, retardando o retorno para casa, distante dali 12 quilômetros. O sacolejo da charrete fazia-se num percurso de estrada batida a pedregulho, escura e deserta, até se chegasse no sítio São Judas Tadeu. Em cumprimento ao centenário ritual, antes

do amanhecer, o rei já restava em lugar incerto e não sabido. Puseram-se no seu encalço marechais, comandantes, majores, capitães e peões diversos. Depois de lhe descoberto o paradeiro, o infante desfilou montado num fogoso cavalo, o Fulgor, em-prestado da fazenda São Felipe. Deu-se tudo nos conformes, mas nem tanto. O Tião Bueno localizou o homiziado festeiro e de prêmio lhe fez escolta até os convivas frustrados pelas buscas inglórias. Contudo, algo desassossegado aconteceu. O rei mostrava-se tão nervoso que mal podia falar. Mesmo aturdido pela balbúrdia das calçadas, deitou falação e trejeitos trêmulos: - Tião, ocê num sabe! Virge Maria Santa. Ontem vinha vortando da sagrada igreja , no breu da madrugada... - Viva o rei! Gritava o Povo. - Viva!

Debruçada na janela, uma jovem morena arremessava flores vermelhas ao léu, fingindo-se imune às flechadas cupidas lançadas pelos olhares famintos dos rapazes casadoiros. -Desembucha fio de Deus. Que-ca-acunteceu? Pinche pra fora, seu! - Escuita só! Adepois da estação de Caetetuba, ouvi um tropé vindo de encontro. Cavalos desembestados partiram pra cima de eu. Sartei de banda. Carcule o quar comandava a tropa? Credo-em-cruis! Aqui o Fulgor...Sim sinhô! Dezenas de cavaleiros juntaram-se e se separaram em leque a percorrer a Rua de Baixo, o largo da Matriz, o largo do Grupo Escolar e a rua Direita. - Mai adianti, pertico do sítio, avistei o Mané Tripeiro, injuriado, que malemá boquejava. Me avisô da correria do Fulgor. Respondi: Eta! Então num vi? Galopiaram na minha fuça. A Cavalhada parou diante da igreja de Nossa Senhora do Rosário dos Homens Pretos. O rei cava-leiro apeou. Meteuse porta adentro. Rezou fervorosamente, pedindo à Santa Madre lhe

permitisse esclarecer os assombramentos da vida, principalmente no assunto presente envolvendo o Fulgor. Lá fora, a banda de música e os rojões anunciavam a presença do rei festeiro. As filas de cavaleiros recompunham-se, em prontidão de pachorras. Tião Bueno agoniado: - Tamo aqui, corpo presente. Que-qui-si-passô, creatura? Largue mão de Deus-me-acuda... - Desaprumei de susto. Poi bem, hoje é o dia da Cavaiada. Eu o rei. Concederam o mais mió dos cavalo. E o danado carpiu no pé diante dos meus óios, que a terra há de comê, levando os otros animar consigo. Não quis saber dos arranjos e arregos do dono. Sem a montaria, o rei, esta pes-soa, por pouco não comparecia pra mor das honras. Não vinha não sinhô. Pela primeira véis na his-tória a coroa ia estrebuchá no desdouro! - Não sei o que ocê fala! Puxa vida! Explique-se home majestade! Ocê ta qui. O Fulgor ta qui. Tudo lavrado em demasiada boniteza... - Não sei explicá adereito, não sinhô. Danei-me pra casa. Não é que num careceu campiá o lazaren-

to? O Fulgor tava lá quetinho, roncando nas patas, no nada acontecido. Os otros animar nos devidos lugá. Não era possíver. Vi a cambada no tropé. Agora tavam ali como se não tivresse o assussedi-do. Passada a secura da boca, o rei prosseguiu: - Senti um calafrio no espinhaço, minha nossa! Óia aqui, o Fulgor tem parte, perdão da má palavra, com o demônio... Ah! isso tem...Não pode tá em dois lugá iguarmente... O rei da Cavalhada saiu da igreja, retornando às aleluias da multidão. Beijou os mastros de São Benedito e de Nossa Senhora do Rosário. Desfilou pelo centro da cidade e meteu-se pro São Ju-das Tadeu, tendo o Tião Bueno no rastro. Todo o tempo fez-se silêncio. Dias depois, combinaram revelar o assombramento ao cônego Feliciano, em busca dos aclaros da Santa Igreja Católica. Consta que o religioso não despendeu bênçãos ao caso, apesar da misericordiosa conivência do compadrio crédulo e beato. Na missa não se disse o conto.


PALAVRA

O tempo

na fronteira do espaço Mauricio Andrade Tempo, um luxo que não temos. Um mistério que tentamos desvelar com os mecanismos que nos fazem entender o transcorrer ao longo de um minuto, um segundo, uma hora, dias, meses e anos. O tempo instiga a mente humana desde os primórdios, e tem sido medido pelos astrônomos e sacerdotes da antiguidade, que estabeleceram uma relação entre o tempo e as estrelas. Os equinócios e solstícios que determinavam datas especiais e sagradas, onde colheitas, ritos de passagem e mudanças de eras eram estabelecidas. Hoje, o tempo se transformou em mais do que uma ciência. Sabemos de sua existência, contamos, não mais com solstícios ou equinócios, e a tecnologia nos propiciou equipamentos para determina que o seu fluxo é uma dimensão adicional as três dimensões que vivemos. Medir esse tão misterioso “elemento” que não pode ser aprisionado em um invólucro, nem se sentir seu cheiro, gosto, peso ou sequer detectar sua presença, apenas sentir e

observar as mudanças que ele provoca ao nosso redor, em nós mesmos, em nossa mente, nossa memória e capacidade de detectar os fatos, é um salto evolutivo. O tempo é um elemento tão importante, que profecias são baseadas nele, e suas mudanças, mesmo a maturidade de um ser também, como tudo que existe ao nosso redor depende do tempo. Conhecemos pouco sobre ele, em vista de suas possíveis variáveis medidas por relógios atômicos, sincronizados ao redor do mundo, e guardados em cofres. Parece existir, ao menos nos relógios atômicos, uma variação considerável com o transcorrer do mesmo, isso pode se dar em vista da variação da gravidade, oscilações eletromagnéticas ou perturbações sísmicas. Mas, o tempo medido na Terra, é o mesmo tempo medido no espaço? Ou seja, o espaço tem uma idade? A referência temporal do relógio biológico humano, é uma das chaves, pois se percebe mudanças nos ritmos, em experiências de

longa permanência dentro de cavernas, onde os indivíduos não sabem se é noite ou dia, mesmo no espaço onde não há amanhecer como na Terra, é preciso condicionar o corpo a entender qual seu ritmo ao longo de uma jornada longa fora da gravidade terrestre. Se desejamos nos aventurar no espaço profundo, precisamos antes adaptar a consciência à vacuidade espacial, ou ciclos siderais. Parece que o tempo além das mudanças cíclicas que temos como referência, como noite e dia e a lei da entropia sobre a matéria, obedece a outra ordem mais profunda relacionada à própria mente ou, os próprios dispositivos que se encontram no relógio biológico. O tempo pode ser uma massa atemporal condicionada pelo estado de nossa mente em relação à dimensão que habitamos, ou seja, cada raça sobre a terra está condicionada ao tempo e sua percepção dentro de uma identidade mental. Assim, cada raça estaria, digamos, codificada com sua própria percepção de tempo em seus cromossomos. Isso pode ser exemplificado pela capacidade de armazenamento de informação, maturação sexual, identificação da

consciência e capacidade de aprendizado. Isso, porém, nada tem a ver com a limitação genética de um indivíduo, mas com a codificação de toda raça humana. Nossos corpos não foram feitos para viver no espaço, mas as mudanças do sistema solar, em relação à galáxia, podem estar “empurrando” o ser humano, a uma evolução. Há experiências documentadas de pessoas que tiveram uma expansão da mente em função de um estado de êxtase, onde aparentemente, o tempo em relação a percepção dessas pessoas, pôde literalmente parar, ou dilatar-se, estender-se ao futuro, assim, como experienciar o passado simultaneamente. Se o nosso futuro, for o espaço, teremos de vivenciar tempos simultâneos, em estranhas jornadas de dobras espaciais. Além do estado de entropia da matéria, a mente como dispositivo regulador do tempo, pode agir como catalisadora dessa massa atemporal que pode também, além de determinar as relações conhecidas de passado, presente e futuro, fazer outras combinações como; passado do passado, passado do presente, passado do futuro, presente do presente, presente

do passado, presente do futuro e futuro do passado, futuro do presente e futuro do futuro. Parece um tanto estranho, pois não conseguimos conceber essas relações além daquelas usuais que entendemos como sendo nosso tempo linear. Mesmo agora, algumas teorias estão sendo formuladas a respeito da frequência do planeta Terra, ou do tipo de vibração que o planeta pulsa em relação a sua rotação e translação. Se considerarmos o planeta, como na teoria de Gaia, como um ser vivo, poderíamos considerar também que esta formulação tem a ver com os batimentos cardíacos da mãe Terra, o que provavelmente também teria uma relação com o tempo conhecido, em função da matéria, mas não necessariamente em função da mente e as flutuações sensoriais, daquela massa atemporal, pois ela não estaria restrita a matéria, mas seria um elemento universal, presente em todo o cosmos. Todas essas implicações fantásticas, talvez estejam apontando para o grande mistério desse elemento invisível que preenche grande parte de nossos pensamentos. A pergunta que se faz, que gira em torno de quando o tempo

se iniciou em nosso universo, nossa dimensão ou nossa mente, pode agora ser explorada com conceitos mais avançados, além da simplicidade do hoje ou do amanhã, mas com conceitos que vão em direção a função do tempo, em relação à existência material, fisiológica, psicológica, mental e espiritual. O que, pode demonstrar como essas funções podem estar anos luz de diferença uma das outras. Nossos espíritos podem ser atemporais, mas nossos corpos temporais, e nossa função psicológica limitada por conceitos lineares, mas nossa mente pode permear vários tempos e espaços, e dimensões simultaneamente, na Terra ou no espaço. O universo aguarda o despertar de nossas consciências, que nossas percepções se alinhem com o processo criador, que sejamos parte consciente do eterno mecanismo de criação que se inicia, mais uma vez, em cada um, no universo que existe no ilimitado do nosso ser. O Ponto de partida é perceber que não há tempo a perder, mas tempo a se usar com sabedoria e discernimento, os reflexos do verdadeiro aprendizado neste tempo e no espaço que nos aguarda.


ARTE


LETRA

Antígona 2077 Dan Devjacque

Ela olhou pra mim e começou a contar a importância de se estar lá. Eu lembro até hoje era uma terça-feira perto do começo de abril. Eu entendia! Eu também via notícias e sabia que era importante mas havia muita coisa, havia a casa, os bichos, tanta coisa! Eu queria ir, mas tinha medo e não queria admitir isto, parecer fraco nesse momento seria o fim pra mim, pra nós dois, pois eu sabia o quanto isto era importante pra ela, que eu fosse forte, que eu fosse. Gritei! Falei que aquilo era loucura, arriscar tudo que tínhamos construído, era sem noção! Depois um silêncio… ela divagou e olhou pra janela, como se fosse pra bem longe dali. Voltouse pra mim e disse que eu tinha medo. Sabe, o problema não foi ela ter dito que eu tinha medo, mas a convicção que ela trouxe na voz, como se eu nunca tivesse deixado de ter medo a minha vida toda. Aquela precisão, o seu olhar, entregava pra mim, a verdade crua, recém-abatida ainda sangrando. Eu tive que engolir. Ela voltou-se pra janela novamente e suspendeu-se daquele momento constrangedor. Eu engasguei… tentei responder, mas calei. Talvez você que seja muito corajosa, eu falei, talvez você esteja no limiar entre coragem e estupidez. Ela riu. Então falou que, se em vida nós nunca descobríssemos estes limites, as mudanças mais importantes nunca aconteceriam. Dessa vez quem riu fui eu. Eu não posso deixála ir, é perigoso de mais lá fora, se algo acontecer a ela... eu ri de desespero, ela estava convencida, eu e meu medo não tínhamos a menor chance! Me recostei no sofá, e a noite foi chegando devagar, a luminosidade misteriosa daquele intervalo entre dia e noite transformou o rosto dela em uma estátua. O olhar convicto agora repousava sobre mim e tinha o peso de um milhão de gritos de guerra, mas ainda um olhar terno e afetivo. Parada ali como uma deusa da vitória, nunca deixou de estar no limiar do instante da vida, da coragem, da embriaguês redentora, aquela que é única para quem possui a convicção não só de sua luta, mas da luta do povo. Eu quero ir, mas não posso, sou fraco e tenho medo. O silêncio perpetuou-se, a escuridão tomou conta do ambiente e acabei adormecendo. Quando acordei, estava sozinho. O medo também faz limite com a estupidez. Naquela noite recebi a informação que todo mundo que foi tinha desaparecido, que era melhor eu sair da casa: eles estavam vindo. Por medo, com ela não fui, mas agora com medo, tenho que fugir. E ela não está mais aqui.


A cidade é de quem?

As torres. Olham pra gente. Na praça. O tempo todo. Não pode. Pretos. Os homens. Enquadra.

Essas músicas não. Não aqui. Na praça não. Quem é essa gente? A gente não é assim.

No dia 20 pode. Maracatu. Cortejo. Matadouro. Não pode. Enquadra.

A praça tem nome de princesa. O rosário é dos pretos. Homens. Das pretas. Mulheres. Não a praça.

Praça com o nome do poeta. Negro. Retinto. Tinha que ter uma estátua. Pra todo mundo saber que é preto. O poeta. Os versos. O pai, a mãe, o filho. Tudo preto.

Pra que falar disso? Isso não existe, todo mundo é igual. É coisa da sua cabeça. Corta o cabelo.

Da igreja, só o nome. Ou nem isso. Ninguém lembra.

Na praça não pode. Não é pra você. Tá fazendo o que aqui? Enquadra.

Rosário. Dos homens pretos. E das mulheres pretas.

As torres. Nos olham da cidade toda. De qualquer lugar, ela está lá. É só olhar.

Na contramão. No farol. Atrapalhando o trânsito. Atrapalhando o tráfego.

Tijolo, bloco, concreto. Construção. Demolição.

Aquela fresta, aquele ângulo. Aquele enquadramento. Enquadra.

Shel Almeida

Enquadramento


http://hutukara.org/

Victor Moriyama/ISA


LETRA

Velhos amigos Cellus*


E

m 1967, o poeta americano Ezra Pound visitou o túmulo do escritor irlandês James Joyce no cemitério de Fluntern, em Zurique. Joyce morreu nesta cidade em 1941. Sua viúva, Nora Barnacle, solicitou que o escritor fosse enterrado na Irlanda, mas as autoridades irlandesas negaram o pedido - Joyce era persona non grata em seu país por conta de seus escritos. O momento foi registrado pelo alemão Horst Tappe, notório pelas fotografias de pintores e escritores, é de uma beleza ímpar. Pelo registro histórico: um gigante da literatura próximo de seu crepúsculo - Pound morreria em 1972 - observando um de seus pares, outro gigante já circunscrito na eternidade histórica, morto 26 anos antes; e pela poética da imagem: a distância entre as figuras torna a cena uma alegoria sutil: um caminhante notadamente cansado observa outra figura descansada, contemplativa da experiência humana a partir de um estado eterno, pétreo, perene. A bela estátua de Joyce é de autoria do escultor americano Milton Hebald, falecido em 2015. Um dos grandes poetas do sec. XX, Pound foi um dos primeiros e grandes incentivadores da obra de Joyce. Mantiveram contato pela vida toda através de extensa correspondência, já reunida em livro. Pound foi para Londres em 1908, onde conheceu William Butler Yeats, poeta irlandês de quem foi secretário, e a primeira pessoa a lhe falar de Joyce. Pound

teve contato com a obra de Joyce em 1913 e resolveu publicá-la na sua antologia de poetas do Imagismo - movimento de vanguarda que privilegiava uma poesia coloquial, sem preocupação métrica e com um uso ostensivo de imagens. Por sua influência junto a várias revistas literárias nos EUA, Pound conseguiu que Joyce fizesse suas suas primeiras publicações dos contos de “Dublinenses” e dos primeiros capítulos de “Retrato do artista quando jovem”, como também dos primeiros e escandalosos excertos de “Ulisses”. Foi Pound também o responsável por Joyce ter conhecido sua grande mecenas, a milionária americana e editora, Harriet Shaw Weaver, dona da revista The Egoist, a primeira a publicar a obra de Joyce. Posteriormente, Harriet S. Weaver ajudou financeiramente Joyce - inicialmente de forma anônima permitindo que ele parasse de dar aulas de inglês e se dedicasse integralmente à literatura. Graças a essa ajuda, que se estendeu por anos e custou uma parte considerável da fortuna de Weaver, Joyce conseguiu concluir “Ulisses”, que lhe tomou 7 anos de trabalho, e a posterior criação de sua obra-prima, “Finnegans Wake”, que levou longos 16 anos. Segundo o próprio Joyce, “Finnegans Wake” é “uma série de túneis escavados em uma montanha” por quase duas décadas, um “maldito livro que pretende contar a história do mundo”. Céllus é cartunista e ilustrador. http://www.cellus.com.br


Arte em tempos de pandemia

LETRA

Sed fugit interea fugit irreparabile tempus Carlos Cordeiro* As pessoas empreendem um novo desafio voluntário. Afinal ninguém as chamou nem as está chamando para o espaço sideral. Mas elas irão assim mesmo. Talvez procurando satisfazer suas dúvidas sobre suas origens; sobre as origens de seu planeta; sobre sua própria ignorância. É uma espécie de redundância histórica. Nos anos 1960 a busca era pela Lua, em 2020 é por Marte. Porém, ao nos depararmos com “empreendimentos imobiliários promissores” (em Marte!) e com “turismo estratosférico”, percebemos que outros valores embalam seus sonhos. Não seria muito mais importante para as pessoas vencerem aqueles desafios que lhes foram impostos involuntariamente? Por que tanta necessidade de sair? Seria possível traçar um paralelo entre a “fuga” que elas empenham para o espaço exterior e a “fuga” que elas empreendem de seu espaço interior? Fascínios tecnológicos e arrogâncias econômicas à parte, esse monumental esforço em procurar chegar a Marte e planificar sua colonização, não seria menor que corrigir todos os graves erros que as pessoas cometeram em sua própria evolução tecnológica? Não seria menor que admitir seus extraordinários desvios de conduta? Quando as pessoas estiverem em Marte e olharem para esse nosso distante ponto azul, estarão olhando para seu passado ou para seu futuro? Qual futuro as aguarda?

Avião - livro Sérgio Monteiro de Almeida

(“Mas ele foge: irreversivelmente o tempo foge”, Publio VIRGILIO Marconis, em Geórgicas, que fala da terra e agricultura.) * Carlos Cordeiro, pai, filho e espírito inquieto, estreia sua participação na Kalango.


PALAVRA

Traduções Marcelino Lima

N

o ano passado sobrevivi, mas apesar de umas verrugas que estão nascendo em meus sovacos, neste ano eu não morro. Aliás, com um pouco mais de disciplina, corro. Apesar de tanta gente assim, enlouquecida, que vai passando no mundo sem chance de se salvar, alheias, tenho tido muitas coisas nestes dias de modorro. Até mesmo aquela que diz chegar lá de fora em um segundo! Nestes dias outonos, enrolo cigarros que colho entre os canteiros e assim, acalmo meu silêncio. Então, de repente, ela me pega a cantar, leve, fugindo como o fumo entre os meus dedos que tamborilam versos e devaneios. Assim vou esvaziando pensamentos à toa, acreditando no pulsar de minhas veias. E como é que a gente voa quando consegue este santo socorro, traz à tona a parte de nós que está no fundo sem fundo, traduz em arte aquela parte que se espanta, nunca pesa, pondera antes delira, troca os pés pelas mãos, o almoço pela janta! Então, seja vertigem ou linguagem, já não é mais questão de vida e morte. Sejam crisântemos ou papoulas, roxos, de todas as cores, flores na paisagem defloram. E mais fluido, como uma brisa que pela estrada refresca a multidão (mesmo que só quem possa me seguir seja eu), arrepiado todinho, decorro...

A imagem que ilustra o texto é de Claudia Andujar (nascida Claudine Haas). Nascida em Neuchâtel, Suíça, a 12 de junho de 1931, Andujar é uma fotógrafa e ativista naturalizada brasileira. Desde a década de 1970 se dedica à defesa dos índios Yanomami. Saiba mais aqui.


MÚSICA

Sororidade

cabo-verdiana

Assim como os Tubarões, a eterna Cesária Évora (ao loado) não pode escapar da nossa mente. Conhecida como rainha da morna, sua música nos lembra tardes alegres de domingo em casa de vó. Uma figura de renome que surge como marco inicial da difusão da música de Cabo Verde para o mundo.

Rapha Cruz Posso não ser muito alegre,mas triste também não sou. A alegria e a tristeza são vizinhas. Não sou de vestir máscaras,nem nada disso, mas gosto de ver as pessoas dançando. (Cesária Evóra)

C

abo Verde, situado no meio do Atlântico, entre a beleza rara de ilhotas esparsas no azul do oceano, é um dos pontos geográficos de destaque entre a América e Europa. O país insular africano, que se estende de Cabo Branco às Ilhas Bigajós, é um arquipélago de origem vulcânica constituído por dez ilhas, localizadas a oeste de Senegal e próximas de outros vizinhos como Mauritânia e Guiné Bissau, todos, países da faixa costeira ocidental da África. Dentro da cena artística e da riqueza cultural que o país apresenta é possível perceber um novo direcionamento em relação à arte cabo verdiana, sobretudo a sua música em vigência. Escutar a música da ilha é sentir a mistura do Kriolu com a leveza ressonante da língua portuguesa, onde a miscigenação destaca o charme deste povo. A cena sonora é um dos grandes atrativos do país onde se destacam ritmos como: a morna, quizomba, funaná e a coladeira.

Não faltam exemplos de boas opções musicais. Um dos primeiros grandes destaques surgiu na década de 70, os Tubarões, um groove malicioso da terra, com pitadas dos ritmos cabo-verdianos e que traz uma configuração estética própria e original. Ildo Lobo, um dos fundadores do grupo, também conhecido por seu trabalho solo, representa muito bem a ilha: ambos caminhando potencialmente entre a variabilidade e a suavidade.

http://www.youtube.com/ watch?v=gYL6YD9TPz4

http://www.youtube.com/ watch?v=ERYY8GJ-i0I E se Cesária está para a rainha da morna, o rei é o talentoso Bana, artista versátil (ao lado), que tem uma composição mais cadenciada e conhecida pelas nossas terras sul americanas como a famosa balada romântica. O cantor, um referencial do som no país e no mundo, foi carinhosamente apelidado como o “grande embaixador“ da música de cabo-verdiana. No meio do caminho entre jovens artistas e outros já consagrados, podem ser mencionados Tito Paris e Orlando Pantera. O primeiro despende uma voz potente com um swing peculiar, valendo o destaque para o álbum “Dança Ma Mi Criola”, em que a marca registrada do artista flui por meio de uma guitarra que faz um diálogo com suas composições, reforçando na melodia a sua virtuosidade. Já Orlando Pantera, morto precocemente aos 33 anos, foi uma das maiores revelações do país.

Além de compositor, Pantera (acima) traz consigo a marcante poesia do campo. Sua música faz uma combinação única entre a lírica rural e o uso de peculiares instrumentos de batuque como: pilon, pau de colêxa, búzios e shelafon. Clique na imagem. acima para ouvir.

http://www.youtube.com/ watch?v=WCI9aT643Qc A ilha parece ressoar em nossos ouvidos. A miscelânea estética é fascinante nos cantores cabo-verdianos.


O time é de primeira linha, na qual podem ser ainda escalados: Bilan, Mayra Andrade, Sara Tavares e Lura, que cada um de sua maneira, apresentam rara sintonia entre os ritmos africanos e outros gêneros, como o funk, jazz, bossa nova, blues e tango. Bilan é um artista inovador, residente no norte de Portugal, é bem conhecido entre os artistas locais e segue com um trabalho que promete para o ano de 2014. Com atuações em diferentes festivais de músicas do mundo, o cantor tem um trabalho singular cantado em kriolu, com uma poesia própria que se adequa com a realidade cosmopolita urbana. A particularidade vem de uma grande influência de Gilberto Gil, entretanto sempre reforçando sua própria criação e identidade. Realce para as músicas: Selva, Arrependimento e Dia d’ Manhã.

http://www.youtube.com/ watch?v=QkVWm60J-oI Mayra Andrade com sua voz rouca e levemente doce personifica uma viagem entre o simples e o melódico combinando cadências nativas como a funaná quizomba e o batuque, onde busca elementos do jazz e da bossa nova, proporcionando assim um trabalho diferenciado e suavemente agradável.

A artista, reconhecida internacionalmente, conta já com três álbuns de sucesso no currículo, com destaque para as músicas “Tununka, Dispidida e We used to call it love”, que conquistaram inúmeros ouvidos pelo mundo. (clique na foto para ouvir)

http://www.youtube.com/ watch?v=o18G0KvmMAc

http://www.youtube.com/watch?v=ygcBXebrNI Na representação do Funaná, Lura vem com uma pegada swingada que facilmente coloca o público para levantar e dançar. O ritmo e a tradição levam nosso corpo ao encontro de nossos ancestrais, lembrando cadências conhecidas dos tupiniquins como o calypso e a lambada. A cantora também procura através de outras referências, como o jazz e o tango, criar um diálogo entre a música nativa e a contemporânea. (clique na imagem)

Numa aproximação mais intimista Sara Tavares desfila sua voz elegantemente entre tons de graves e agudos em uma contagiante alegria que eleva a potência da alma. Sua música cria uma relação entre as influências da ilha e a música pop. Lura, Sara Tavares e Mayra Andrade podem ser consideradas filhas da terra caboverdiana, pois apesar de terem nascido em países distintos, carregam e representam a ilha com esplendor através de composições e músicas de sonoridade ímpar. A África através de Cabo Verde nos presenteia. Um dos cartões de visita é a nova arte cabo-verdiana que vem atraindo e mostrando uma elevada qualidade. Na Ilha entre o mar e sol há a boa música que é contada de uma maneira charmosa, elegante e vigorante. Para velhos e novos artistas o ritmo caboverdiana corre na veia, os olhos

http://www.youtube.com/ watch?v=RfSQ5E3a8MI

brilham, o corpo pede dança e o desejo de conhecer a ilha aumenta. Cabo Verde já não é uma epígrafe africana é uma realidade sonora mundial. A carta de uma nação se apresenta na letra da música de Lura: “Há uma morna que me encanta Tem sorriso e magia Cabo Verde tu és a manta que cobre a dor e dá alegria”


Sérgio Monteiro de Almeida

Deserto Luciano Delarth Não vide bula O meu coração. Se em meu passo traçado, impreciso caminho. Preciso viver Entre a dor e o desejo Liberdade farejo Em cada estação. Um grande ator de si mesmo Um ser em busca de paz Folha lançada ao relento Vento leve, leva e traz. E vou assim Fora de mim Tudo no mundo é incerto Se já fui rio. j á fui mar Só não quero estar deserto. Cada passo dessa triste cidade Posso ser feliz. Seja aqui, Goa, Lisboa São Paulo, Xapuri. Vou vago ao vento Pouso no ar Em Madri, Sana, Luanda ou Bogotá.


Revisitando Rembrabndt

Nestor Lampros


VOLTE SEMPRE


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