Cobaia #150 | 2017

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Imagem: Divulgação Psicodália

O mundo de

Psicodália festival que acontece em fazenda no interior de rio negrinho virou refúgio tradicional no carnaval brasileiro. shows musicais, peças de teatro, oficinas e contato com outras culturas atraEM Visitantes dos mais variados lugares do país e do mundo. Este ano, passaram por lá mais de 5 mil pessoas que viram atrações como liniker, ney matogrosso e erasmo carlos

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cultura inaugurada na década de 60, a casa de cinema Cinerama delatorre marcou época em balneário camboriú e influenciou a cultura visual da região. salas foram fechadas em 1995 e agora espaço vai ser transformado em museu

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Adoção

Itajaí, Março de 2017 | Edição 150 DISTRIBUIÇÃO GRATUITA

No Brasil, há cerca de 7 mil crianças à espera de um lar. Segundo dados do Cadastro Nacional de Adoção (CNA), elas têm de zero a 17 anos. Apesar do alto número, a fila para quem tem a intenção de adotar é bem longa

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Editorial A edição deste mês do Cobaia é especial por dois motivos. O primeiro é que o jornal atinge com este exemplar o expressivo número de 150 edições veiculadas. Este dado mostra o quanto foi importante o trabalho realizado pelos profissionais e estudantes que passaram pelas páginas do Cobaia desde a sua fundação e o tamanho da responsabilidade que a atual equipe do jornal tem em mãos. A experiência de escrever para um jornal impresso é, e continuará sendo, um diferencial na vida acadêmica dos estudantes de jornalismo da Univali. Que venham as próximas 150... Contamos com a ajuda de alunos e professores! O segundo motivo é que esta edição sai no momento em que discutimos mais uma vez o papel das mulheres na sociedade. No

EXPEDIENTE

dia 8 de março foi comemorado o Dia Internacional da Mulher. Em Itajaí, manifestações no centro da cidade, que tiveram a participação de estudantes da Univali, marcaram a data e lembraram a luta das mulheres por mais igualdade social e política. Apesar de estarmos em 2017 e termos evoluído em alguns temas, a luta feminina por direitos iguais continua. Há ainda quem acredite que lugar de mulher é dentro de casa, a turma das belas, recatadas e do lar. O próprio presidente Michel Temer falou em cerimônia no Palácio do Planalto “o quanto a mulher faz pela casa, o quanto faz pelo lar, o quanto faz pelos filhos”. E ainda ressaltou o importante papel delas no controle do orçamento familiar. Inacreditável! É por isso que a luta delas precisa continuar e os

homens devem se juntar à causa para acabar com as diferenças de salários e a estigmatização do papel feminino na sociedade. Pesquisa divulgada nesta semana pelo Instituto de Pesquisas Econômicas Aplicadas - IPEA mostra que apesar de trabalharem mais e possuírem uma taxa de escolaridade maior que a dos homens, as mulheres ganham menos. Nas últimas duas décadas, mais de 90% das mulheres declararam realizar atividades domésticas, enquanto a proporção de homens ficou em torno de 50%. Os dados mostram o quanto ainda precisamos avançar enquanto sociedade, isso sem falar das violências físicas e psicológicas que elas sofrem diariamente. Avante, mulheres! Estamos juntos nessa luta.

Agência Integrada de Comunicação

Opinião

UNIVALI - Universidade do Vale do Itajaí

Quem dera o machismo fosse realmente um delírio feminista A cada 11 minutos uma mulher é estuprada no Brasil. A cada 90 minutos, uma mulher é morta apenas por ser mulher. Os números são do 9º Anuário Brasileiro da Segurança Pública, do Fórum Brasileiro de Segurança Pública. Como apenas de 30% a 35% dos casos são registrados, é possível que a relação seja de um estupro a cada minuto. Ainda que os números apontem um cenário machista e misógino, alguns ainda vão dizer que as feministas são todas chatas e que é tudo “falta de rola” mesmo. Mas é claro, deve ser muito difícil entender igualdade de gênero quando você passou a vida toda acreditando que as mulheres existem para servir. E é nesse contexto que surge a cultura do estupro. A cultura do estupro é a cultura que normaliza a violência sexual. Através da objetificação do corpo feminino, da banalização do assédio e do tratamento da mulher como propriedade.

Consentimento é um conceito-chave para compreendermos e admitirmos que existe uma diferença entre sexo e estupro. Sexo é consensual, e se for adiante sem consentimento, deixa de ser sexo e passa a ser estupro. Estupro é prática não consensual do sexo, seja por ameaças ou violência de qualquer natureza. Seja qual for a situação, qualquer que seja a roupa que a pessoa esteja vestindo ou o quanto interessada ela pareça estar, o “não” é sempre “não”. A cultura do estupro é visível nas imagens publicitárias, nos livros, filmes, novelas e seriados que romantizam o perseguidor. Um exemplo recente é a campanha de carnaval “Esqueci o ‘não’ em casa”, da Skol. Mensagem que vai diretamente na contramão do que as mulheres têm tentado reforçar há anos, de que quando uma mulher diz “não”, ela quer dizer “não” mesmo. Nada de “talvez”, ou “quem sabe”, ou até “sim”.

A cultura do estupro acontece no momento que aceitamos como normal recomendar às meninas e mulheres que não saiam de casa à noite ou sozinhas, ou que usem roupas recatadas. Um típico argumento de culpabilização da vítima, que se revela em comentários como “se ela estivesse estudando isso não aconteceria”, “se ela estivesse trabalhando isso não aconteceria” ou “se ela fosse mais família isso não aconteceria”. Todas essas ações revelam o que chamamos de cultura de estupro, porque todas expressam que a responsabilidade pelo estupro é da vítima. Não é. O protagonista do estupro é o estuprador. Sempre.

CENTRO DE CIÊNCIAS SOCIAIS APLICADAS COMUNICAÇÃO, TURISMO E LAZER Diretor: Renato Büchele Rodrigues CURSO DE JORNALISMO DA UNIVALI Rua Uruguai, 458 - Bloco C3 Sala 306 | Centro, Itajaí - SC - CEP: 88302-202 Coordenador: Carlos Roberto Praxedes JORNAL LABORATÓRIO DO CURSO DE JORNALISMO DA UNIVALI Edição: Gustavo Paulo Zonta Reg. Prof. Mtb/SC 3428 JP Tiragem: 2 mil exemplares Distribuição Nacional Projeto Gráfico: Vinicius Batista Gustavo Zonta Diagramação: Tatiane Decker Colaboração: Helena Moreira

Karol Braga 5º período de Jornalismo

Todas as edições do Jornal Cobaia estão disponíveis online. Acesse: issuu.com/cobaia! Você tem alguma sugestão para fazer, ou alguma matéria que gostaria de ver

Agenda Intercâmbio de alunos Estão abertas até o dia 27 de março as inscrições para o processo de seleção de acadêmicos para o Programa de Intercâmbio de Alunos (PIA), da Universidade do Vale do Itajaí (Univali). São ofertadas 100 vagas, com possibilidade de estudar em 25 universidades de 11 países da Europa, durante seis meses ou um ano. O PIA concederá bolsas, da seguinte forma: sete para a Alemanha, duas para Áustria, 10 para Bélgica, 35 para Espanha, sete para França, uma para Holanda, nove para Itália, 24 para Portugal, duas para República Tcheca, uma para Suécia, e duas para Suíça. Mais informações em www.univali.br/intercambio

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publicada? Conte com a gente! cobaia@univali.br Educação musical Capacitar os professores da educação básica de Itajaí para atuação pedagógica dos conteúdos relativos à prática, produção e socialização do conhecimento musical. Este é o objetivo do Projeto Música na Educação, da Universidade do Vale do Itajaí (Univali), que está com inscrições abertas para oficinas gratuitas até o dia 20 de março. As vagas são limitadas.

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Foto: Arquivo pessoal

O pioneirismo do cinema em Balneário Cinerama Delatorre: Inaugurada na década de 1960, a casa de cinema marcou Balneário Camboriú e o cenário estadual

Thiago Julio

8º período de Jornalismo

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história de um fazendeiro ucraniano em exercício durante a primeira Guerra Mundial e o retorno dele à terra natal. Dirigido por Yuliya Solntseva, A Epopéia dos Anos de Fogo, drama russo da antiga União Soviética, não só premiou o diretor no Festival de Cannes, em 1961, como foi o filme escolhido para inaugurar o Cinerama Delatorre, em Balneário Camboriú, na noite de 5 de setembro de 1967. Com sessão iniciada às 20h30, numa terça-feira, a exibição recebeu moradores de mais de dez municípios vizinhos e deu início à era de ouro do cinema em Santa Catarina.

Cortina dourada, aberta e fechada automaticamente da cabine de projeção; poltronas na cor vermelha, produzidas em Jaraguá do Sul; pisos e paredes de madeira, cor canela; paredes laterais feitas com lambril, no mesmo tom do chão, com espaço de 1 cm entre uma peça e outra; fundo revestido com material acústico. Inaugurado por Eduardo Delatorre, o Cinerama, localizado na Avenida Brasil, tinha apenas uma sala de exibição, com telão principal e 1200 acentos, o que abarcava 12% da população balneocamboriuense da época, e uma de espera, na frente, que comportava exatamente a mesma quantidade de pessoas em pé.

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CULTURA Foto: Thiago Julio

Exposição marcada pela presença de inúmeros projetores

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Gaúcho, natural de Viadu- vou” (1940), “A Pantera Cortos, Eduardo sempre morou -de-Rosa” (1963) e “A Noite em Tangará, município do dos Generais” (1963). Drama Oeste catarinense. Lá, antes que, por sinal, resultou em um de mudar para o litoral, inau- dos acontecimentos mais margurou, em 1949, seu primeiro cantes da casa. cinema. A sala pequena, com – Naquela noite, um sábaprojetor de 16mm, desses “ca- do, nós tivemos que pôr pesseiros”, servia para exibir al- soas para o lado de dentro para guns filmes. Em 1958, optou segurar os vidros de tanta genem se mudar para Balneário te que se acumulou na calçada Camboriú com a família – es- da Avenida Brasil para assistir posa e três filhos, já que o ca- ao filme. Isso me deixou imçula nasceu após a transição. pressionado. Nós estávamos Já como morador fixo, foi ve- até com receio que quebrasreador, contador e construiu sem os vidros, pela quantidao primeiro prédio de aparta- de da aglomeração de pessoas mentos da cidade, que, diga- – relembra Fernando. -se de passagem, tem o nome No entanto, não só de bons da filha Arlene. No entanto, o momentos viveu o Cinerama empreendedor queria mais e, Delatorre. Fernando comenta assim, surgiu o Cinerama. que viu o pai enfrentar fases Fernando Humberto De- ruins, principalmente para latorre, 70 anos, acompanhou acertar locações de filmes intoda a história da casa. Ao lado ternacionais. do pai desde o início, sempre – Problemas com as comcom a falta de algum funcio- panhias distribuidoras de nário, os substituía. Quando filmes. A maioria, filmes de jovem, atuou na bilheteria, grande bilheteria, de grande como lanterninha e bombo- nome, que davam muito moniére, recepcionava convida- vimento, era de companhias dos e projetava filmes quando americanas. Eu o acompanhao operador não va até São Paulo, aparecia. Curitiba e Porto Já senhor de Alegre, sedes das idade, também distribuidoras. fã da sétima arte, Lá eu via enfrenlembra com carias maiores diNão era só tar nho do quão otificuldades, semmista e emociona hora de um cinema, pre nado o pai ficou contratar os filcom a inaugurames. Ele sempre tinha algo ção. me dizia “olha Ponto de enFernando, não dá a mais contro da alta nem pra ler esse sociedade, o Cicontrato deles. nerama recebia Olha o tamanho eventos políticos das letras, não até de âmbito naposso modificar cional. Com sessões de cine- nada”. Eram impostas as cláuma às sextas-feiras, sábados e sulas do contrato e você não domingos, o que mudara após tinha direito de reclamar de 1970, a casa também recebeu nada, senão eles não faziam a presença do ex-presidente contratos e não mandavam os João Figueiredo, ainda em filmes. Filmes como “A Noite exercício, e da atriz Vera Fis- dos Generais”, “O Vento Lecher, foi palco de eventos re- vou”, normalmente o aluguel ligiosos, musicais, e sede de não era fixo. Era uma percenreuniões da Câmara de Vere- tagem sob a renda de bilheteadores – principalmente en- ria, sob o valor dos ingressos quanto Fernando assumia tal vendidos. Dependendo do filcargo. me, eles cobravam 50, 60%, e – Não era só um cinema, nós ficávamos com 40% e mais tinha algo a mais. O Cinerama as despesas. foi ponto de encontro de autoOutro problema era a cenridades, governantes, cargos sura. Para exibição, todos os políticos. Não é como hoje em cartazes tinham que ter carimdia – pontua Denise Delatorre, bo do Departamento de Cenneta de Eduardo, filha de Fer- sura da Polícia Federal. nando, uma das responsáveis – Se aparecessem e não por auxiliar na conservação da tivesse carimbo, eles mandahistória da família. vam fechar. Com o estouro do CineraCom a queda do público ma, Eduardo abriu em 1973 o em decorrência do avanço Autocine, um drive-in, na Ave- tecnológico (surgimento da nida do Estado. O pátio abriga- televisão e do videocassete), va cerca de 400 automóveis e o Cinerama precisou fechar os presentes assistiam aos fil- as portas. Em março de 1995, mes de dentro dos carros – a Eduardo encerrou as ativimoda estadunidense da época. dades do lugar e a edificação Exatos 11 anos depois, o em- passou a ser de responsabilipresário lançou o Cine Itália, dade da construção civil. Os na Avenida Central, que tinha outros dois empreendimencapacidade para 700 pessoas. tos tiveram fins similares: o Dentre os filmes com AutoCine foi fechado no mesmaior público estão “Dr. Jiva- mo mês e, oito anos depois, o go” (1966), “...E o Vento Le- Cine Itália.


Fachada feita com chapas de metal, estrutura de ferro indicando uma possível reforma. Do banco público, dividido por dois vasos redondos, é possível ver o primeiro jogo de degraus: seis para ser mais específico. Na entrada, dois ares-condicionados em cada parte da porta e dois grandes, provavelmente de 60 mil btus, refrescam o ambiente. Após os degraus, um estande. Óculos de sol, chapéus, bijuterias. Duas lojas de jogo de cozinha, uma em cada lado da estrutura central. Enfeites, panos, toalhas de mesa. Aparentemente os dois comércios vendem produtos similares. Mais um jogo de degraus: onze dessa vez. No piso principal, uma loja de eletrônicos e concerto de celulares, um café com o mesmo nome da estrutura, e quatro lojas de malhas que dão início a corredores compridos, enfeitados com guirlandas e vaquinhas de pelúcia. O acesso ao andar superior é proibido, mas toda a estrutura têm resquícios de uma sala de cinema e, se olhada minunciosamente, remete a imaginação à exibição de uma comédia do Chaplin, cheirinho de pipoca e algum chato falando sem parar três fileiras à frente. O que era um marco para a história de Balneário Camboriú, hoje, 26 anos depois, dá espaço a um camelódromo. Rafael José Bona, doutor em Comunicação e Lingua-

gens pela Universidade Tuiuti, do Paraná, com enfoque em pesquisas sobre cinema e produção audiovisual, acredita que, apesar de fechado há mais de duas décadas, o Cinerama, bem como a família Delatorre, influenciaram diretamente a cultura de Balneário Camboriú. – Eles passaram a sua trajetória tentando entreter as pessoas com a magia da sétima arte. O trabalho do falecido senhor Delatorre fica marcado na história de Balneário Camboriú. Mesmo que o município não tenha essa vocação para o cinema, vamos dizer assim, no passado, antes de ser sufocada por prédios, as pessoas costumavam ir. Tanto o Cinerama, quanto aquele cinema aberto, o AutoCine, ajudaram a contribuir para a cultura audiovisual da cidade – reitera Bona. O Museu é iniciativa da Fundação Delatorre e já deveria estar aberto. Entretanto, Fernando e os familiares cuidam de cada detalhe e, por isso, estimam que a inauguração aconteça só em 20 de julho deste ano, aniversário do município. Quanto a gastos, o senhor não sabe estipular o que já investiu no empreendimento – Não tenho ideia. Hoje temos uma imobiliária. Quando sobra uma quantidade boa, investimos no museu. Mas, nem penso nisso.

Foto: Thiago Julio

Réplica exata do Herbie, do filme “Se Meu Fusca Falasse...”, a ser exibido no MIS

Foto: Acervo pessoal

Acervo Com o fechamento das três casas de cinema, bem como a morte de Eduardo Delatorre, em junho de 2003, Fernando começou um acervo pessoal com objetos utilizados nos estabelecimentos e passou a adquirir novos: parte majoritária originais, vindos do exterior. Rádios antigos, vitrolas estereofônicas ou a corda, máquinas fotográficas lambe-lambe, moviolas, tipos de selos emitidos pelos correios, discos em aço, papelão e vinil. São cerca de 650 peças que recriam a história da produção audiovisual e que serão expostas nos seis andares de edificação do Museu de Imagem e Som (MIS), localizado na R. 700, nº 44 – esquina com a Avenida Central. Dividido por andar, o MIS ainda conta com o projetor usado no Cinerama, um Super Zenith 450 trazido da Itália, construído no fim do século 19, que funcionava a carvão; setores de homenagem à Charles Chaplin, ao Academy Awards (Oscar, no bom português), ao filme “Se Meu Fusca Falasse...” (1968) e aos irmãos Lumiere; o fonógrafo de Thomas Edson; e lanternas mágicas, utilizadas no séc. XIII.

Fachada do cinema no período em que foi inaugurado em Balneário Camboriú Foto: Thiago Julio

Foto: Thiago Julio

Poltronas vermelhas originais do Cinerama

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CIDADANIA

Retrato da adoção no Brasil Apesar do alto número de crianças aguardando para serem adotadas, a fila de espera é bastante longa Foto: Banco de imagens

Caroline de Borba e Paula Dagostin

6º período de Jornalismo

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riadas em orfanatos e abrigos infantis, no Brasil há cerca de 7 mil crianças a espera de um lar. Segundo dados do Cadastro Nacional de Adoção (CNA), são crianças de zero a 17 anos, distribuídas por todo o território nacional. Com 43% das crianças cadastradas, a região sudeste concentra a maior quantidade de propensos a adoção. No estado de Santa Catarina, são 217 crianças, totalizando 3% da média nacional. Por outro lado, existem cerca de 40 mil pessoas cadastradas na fila de espera da adoção. Segundo uma pesquisa realizada em 2006 pelas psicológicas, Elza Dutra e Ana Andréa Barbosa Maux, a infertilidade é a principal motivadora da adoção. Outras razões que inspiram é a vontade de ajudar o próximo e até mesmo, para suprir a perda de um filho. A dona de casa, Rute Estabelini, ressalta que após adotar a filha Brenda, sua vida se transformou. “Foi um processo de três anos, entre espera, reuniões e visitas. Ela trouxe tudo de bom para nós. É a alegria da nossa casa. Mudou o relacionamento, a convivên- A adoção pode mudar a vida e o destino de quem recebe um novo lar cia, tudo”, afirma a adotante. Existem, no entanto, algumas questões que impossibi- as pessoas para mudar este por um momento de luto. Ela irá Scheila Nascimento, adotada litam a adoção e são respon- perfil. A maioria quer bebê, descontruir esse vínculo com há 24 anos atrás, acredita que sáveis pela discrepância dos de zero a três anos. É o sonho a família biológica, e depois de sua vida teria seguido um rumo números de adotante/adotá- da maioria, pois acham que a um tempo ela estará preparada bem diferente, caso não houvel. Entre elas estão a falta de criança vai se integrar melhor, para aceitar uma nova família. vesse sido acolhida. “A minha disponibilidade para adotar ir- pegar a maneira da família”, Então, os adotantes precisam experiência é maravilhosa. Eu estar bem preparados para lidar fui adotada por uma família mãos, questão racial e princi- concluiu Deolinda. palmente a restrição de idade. Segundo o Cadastro Na- com os traumas e dores que a amorosa, que nunca fez distinSegundo reporcional de Crian- criança carrega com ela”, ressal- ção comigo. Se eu não tivesse sido adotada, possivelmente tagem publicada ças Acolhidas ta Deolinda. Em entrevista concedi- eu seria uma moça de rua, drono site do Sena(CNCA), atualdo, apenas 25% mente 88% das da ao site JusBrasil, o juiz da gada. Eu pretendo, no futuro, dos adotantes crianças que vi- Vara da Infância e da Juven- adotar para dar amor e carinho está disponível a vem em abrigos tude, Protetiva e Cível da Co- assim como eu recebi”. Para adotar, existem algurealizar a adoção A infertilidade se enquadram marca de Guarulhos, Iberê de tardia, ou seja, de na adoção tardia. Castro Dias, disse que para a mas medidas que o adotante é a principal Uma das razões adoção tardia não há fila. In- necessita cumprir. Obrigatocrianças maiores de quatro anos de para os futuros felizmente, segundo relatou riamente deverá ser maior de idade. motivadora pais preferirem o juiz, os futuros pais não 18 anos. O estado civil, neste Para a assisadotar crianças têm interesse em crianças caso, é irrelevante. O futuro tente social da da adoção menores de um maiores de três anos. E elas pai ou mãe precisará também Vara da Família, ano, é a recorda- são maioria. Já ao contrário ter uma diferença mínima de Infância e Juvenção de traumas da adoção tardia, a espera 16 anos do adotado. A famítude da cidade sofridos. Para De- para adotar crianças do gêne- lia adotante deve passar por de Balneário olinda Raiser, a ro feminino, brancas e com um preparo, que visa discutir Camboriú, Deadoção tardia pre- menos de um ano, o desejo os aspectos sociais, jurídicos, olinda Raiser, esta exigência cisa de maior dedicação, por da maior parte dos pais, pode culturais, educativos e refletir sobre os preconceitos que é resultado da crença de que isso é uma opção rejeitada pela demorar até 10 anos. A adoção pode mudar a existem no ambiente social. A quanto mais nova a criança, maior parte dos adotantes. melhor será a adaptação. “Tem “Quando a criança é destitu- vida e o destino de quem rece- preparação busca auxiliar os que começar a trabalhar com ída do poder familiar, ela passa be um novo lar. A empresária pais nas questões processuais,

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na espera, no acolhimento e trabalhar com as motivações para que o ambiente familiar esteja bem organizado para receber um novo membro. Segundo o Conselho Nacional de Justiça (CNJ), a adoção no Brasil leva cerca de um ano. São em torno de dez passos até a finalização do processo. Entre eles, a decisão de adotar, cursos e avaliações, traçar o perfil desejado, conhecer o futuro filho e finalmente, receber a sentença do juiz determinando a lavratura do novo registro de nascimento da criança.

Site Para mais informações sobre o processo de adoção e os orfanatos existentes, acesse: www.padrinhonota10. com.br/


Foto: Erickson Stocker

Erickson Stocker

7º período de Jornalismo

Psicodália MARÇO | 2017

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Carnaval a No palco

Fora do pal

Foto: Erickson Stocker

Todos os shows musicais começavam às 14h e terminavam na madrugada “Um orgasmo inenarrável” Erasmo Carlos (show do dia 27/02)

A vigésima edição do festival Psicodália veio para ficar, e bem fundo, na memória de cada um dos cinco mil participantes do festival. Viajantes dos mais variados lugares do Brasil e do mundo (até norueguês perdido por lá). Solteiros, casais, famílias com ou sem cachorro, com ou sem carro, com ou sem noção do que iriam encontrar nos cinco dias de festival. Shows musicais, peças teatrais, números de dança, cinema, oficinas educativas, recreações adultas e infantis.... Enfim, foi difícil traçar um roteiro de atividades que pudesse comtemplar tudo o que o “Dália” tem a oferecer. Mas como a missão era descobrir o que, afinal, a “Dália Psicodélica” representa, eu tive de dar meu jeito, e corri, bastante, pelos cerca de 500m² de fazenda, localizada no interior do município de Rio Negrinho, na região Nordeste de Santa Catarina. Cheguei no sábado de manhã, dia 25 de fevereiro. De-

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pois de montar a barraca e encher o colchão estava pronto para curtir e cobrir as atrações do carnaval alternativo mais frequentado do país. Com uma câmera na mão e um bloco de notas no bolso, parti meio sem direção, para onde os olhos e ouvidos me levassem. Os dias no festival são programados de maneira padronizada, criando uma espécie de rotina. As atividades culturais como oficinas, peças de teatro e cinema, tem início simultaneamente as 10h, terminando às 19h da noite. Menos o cinema, que ficava até a madrugada, com sessões de filmes internacionais. Palco do Sol, Lunar e Guerreiros

Os shows musicais começavam às 14h e terminavam também na madrugada. Dois palcos eram revezados em trocas rápidas entre bandas, facilitando a vida dos músicos e dos espectadores. A atração principal de cada noite era agendada para o horário das 22h, reunindo quase todos os participantes. Alguns sempre ficavam perambulando entre

os bares espalhados pela área central, nos pontos de alimentação e entre as barracas, distribuídas pelas cinco áreas de camping oferecidas pela organização. Muitas bandas boas tocaram, várias desconhecidas, ao menos para mim. Mas tiveram as aguardadas, que todos sabiam cantar ao menos uma música. Artistas como Liniker, a cantora travesti que está despontando no cenário nacional, com um ‘soul’ marcante e envolvente, ela busca propagar uma mensagem de resistência ao machismo e racismo, ainda presentes na cultura brasileira. O show mais aguardado, porém, foi o de Ney Matogrosso. Que já na passagem de som, perto das 14h de domingo, reuniu uma multidão para cantar as músicas e ver de perto um dos nomes mais importantes da música brasileira. Foi um show à moda antiga, com referências as performances dos tempos áureos de Secos & Molhados, mas com a maturidade dos atuais 43 anos de carreira. No sorriso largo, entre uma música e outra, ficava evidente que estava gos-

tando da recepção do público, que reagia a cada passo, cada gesto, cada olhar, do cantor de 75 anos, com gingado de dar inveja a meninos de 20. Além de Ney, outra grande atração puxou o público para cantar junto. Era a vez de Erasmo Carlos, o Tremendão. Cantando sucessos da carreira, Erasmo proporcionou nostalgia aos espectadores mais velhos e diversão aos mais novos. Com sua jaqueta de couro e guitarra nas mãos, mostrou que os 75 anos de idade pouco importam quando o assunto é tocar o bom e velho rock’n roll. Das bandas pouco conhecidas no cenário popular, mas que agitaram como poucas o festival, está a Confraria da Costa. Uma espécie de banda formada por piratas, tocando músicas de piratas, em um palco feito de navio e uma multidão de pessoas feitas de mar. Tinha até um trampolim onde os corajosos da plateia subiam e se lançavam no mar de gente, nadando até onde podiam. Rolou até a famosa “rodinha punk” que mais parecia um redemoinho sugando tudo que estava por perto.

Deixando os shows um pouco de lado, partimos para as atividades recreativas e culturais. Participei de algumas, observei outras e perdi várias, devido ao quesito tempo e distância entre uma e outra. Das que pude conferir, posso comentar as que mais curti. Como a tirolesa, com cerca de 400 metros de distância e que percorre quase toda a área do evento. Pude gravar um vídeo da descida, que no início deu aquele frio na barriga, mas no fim bateu aquela vontade de descer outra vez. Coragem de verdade era a de uma garotinha com cerca de 9 anos, que ao ser questionada como desceria, se era de “superman” ou sentada, ela responde “de ponta cabeça”. Sem radicalidade, mas muito interessantes, foram as oficinas, com variados temas e propostas. Desde as que ensinavam a tocar algum instrumento musical até as que mostravam como se faz uma cachaça artesanal. Teve yoga para os dispostos a acordar cedo, meditação para os mais pacientes e até mesmo competições de quem fazia a melhor caipirinha, em que todos queriam fazer parte da mesa julgadora, afinal, beber caipirinha de graça é o sonho de qualquer um ali presente. Mas não foram apenas os adultos que tiveram momentos de lazer. As crianças também puderam aproveitar atividades programadas durante o dia. Com supervisores contratados e muito tempo disponível, os pais puderam se tranquilizar e aproveitar o festival sem se preocupar tanto com os filhos. Assisti a algumas peças teatrais, e na maioria das vezes,

por gan que seus palh gum tos, peç de faze com

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Sustentabilidade

Até sexta-feira (03/03) foram cole latinhas, com expectativa de chega para aterro (em breve temos o peso Valor adquirido com a reciclagem d

Ficou curioso para saber mais sob ção? Então acesse o site do festival psicodalia.com.br Para conferir mais fotos que tirei n Facebook, no QR code ao lado.


alternativo

lco

r coincidência, acabei chendo no teatro em sessões e estavam palhaços a fazer s números. O público dos haços era formado por almas crianças e vários adul, para minha surpresa. As ças uniam drama e humor maneira inteligente, desendo a visão do palhaço mo personagem infantil.

ngos Mil

Como nem só de bebida e ta vive o homem, a parte mentar do Dália atende aos adares mais variados. Concom comércio de pratos ontos, buffet a quilo e lanes. Na praça de alimentação cê podia escolher desde a pizza tradicional, até os tos veganos, bastante resitados nesse tipo de evenalternativo. Já para os que curtem faa própria comida ou preem economizar, havia uma zinha comunitária, com foo e lenha disponíveis, além duas pias para a lavagem louças. Foi ali que acebei ndo meu fogareiro a álcomuito prático para se fazer miojo, ou ferver a água a o café. Havia também uma mercea, onde podia-se encontrar ita coisa útil. Desde saco de o, para quem quisesse traa bebida de casa, até comipara ser feita na tal cozinha munitária. E os preços eram m camaradas, por sinal. Mas o mais interessannessa parte de alimentos ndidos por lá, foi a genial ia de um suco feito ao pear uma bicicleta. Isso mes, haviam bicicletas fixas e aptadas para que ao pedaum liquidificador acopla-

Foto: Erickson Stocker

do em uma base pudesse girar e misturar os ingredientes do seu suco. Não era o único jeito, mas tinha essa opção para os mais atléticos.

Uma das chaves para o sucesso desse tipo de evento, que conta com cerca de cinco mil pessoas, está na boa administração dos recursos usados. Rio Negrinho, onde o Biodália festival é realizado, tem pouco mais de 40 mil habitantes, Como o festival preza pela e o festival reúne pessoas que boa relação do homem com a tomam banho, fazem comida, natureza, ele conta com um lavam louça e usam o banheiprojeto interno de coleta sele- ro. Para que a falta de água tiva dos materiais produzidos não ocorra, se faz necessária nos 5 dias de evento. Intitu- uma logística afinada e muito lado Biodália, o serviço teve bem planejada. início em 2012, e hoje conta Outra ferramenta utilizacom a junção entre os setores: da na redução do volume de de limpeza (com 200 colabo- lixo está na adoção de copos radores), setor de monitoria ecológicos personalizados. (16 integrantes) e ainda o se- São copos reutilizáveis, tem tor de resíduos, que cuida da maior durabilidade que os parte dos dejetos orgânicos. convencionais e são fabricaCom 200 lixeiras distribuí- dos com menos plástico. A das, os responsáveis pela ideia redução é de 80% no volume pretendem mide material conimizar a quanletado nas lixeitidade de lixo ras. descartado. Hoje Ao fim do O festival o festival conta festival, seguncom 70% de reJéssica Pertipreza pela do aproveitamento le, coordenadodos resíduos, mas do Biodália, boa relação ra o objetivo é cheos banheiros do gar próximo dos produdo homem evento 100%. Para que zem uma média isso seja alcançade duas tonelacom a do, medidas são das de dejetos, tomadas a parque juntamente natureza tir de experiêncom sobras de cias com edições alimentos, são passadas. Como enviadas para é o caso do “banheiro seco” áreas de compostagem, fixa(só cocô), nome dado aos va- das na própria fazenda que sos montados e colocados em é alugada para o Psicodália. pontos estratégicos, com o ob- Posteriormente é feito o trajetivo de reduzir o consumo de balho de reaproveitamenágua, e consequentemente dar to desse material, servindo um uso as fezes humanas. Mic- como adubo em plantações tórios femininos são instalados futuras. Ainda precisa meem outros locais. Com isso, a lhorar o sistema de coleta água utilizada na descarga dos e depósito desses insumos, banheiros é reduzida quase mas já se avançou muito nesque pela metade. ses 6 anos de projeto.

etados, prensados e comercializados mais de 1.500kg de ar a 2 toneladas. Foram 6 caçambas de resíduos rejeitos o), 2 toneladas de garrafas de vidro. do material coletado no festival em 2016 = R$10.000,00

bre o Psicodália ou pretende participar da próxima edil e fique por dentro das novidades. Segue o link: www.

nos dias que estive por lá, acesse meu álbum especial no O festival contava com diversas atrações além dos shows MARÇO | 2017

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CIDADANIA

Vivências, laços e uma tatuagem Foto: Tenente Coronel Yatabe

Como foi participar do Projeto Rondon... 10

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Fotos: Arquivo pessoal

Thiago Furtado

4º período de Jornalismo

V

oltamos da Operação Tocantins afetados por um problema que denominamos síndrome do “foi massa”. É que não conseguimos dizer muito mais do que isso quando alguém pergunta sobre a experiência que tivemos. Porque as palavras são limitadas e é difícil exprimir através delas a carga intensa de vivências e aprendizados que trouxemos do Tocantins. Este texto também não vai ser suficiente, tenha certeza. Mas estamos adiantando as coisas. Comecemos do início. Nosso grupo foi selecionado para atuar no Conjunto C da Operação Tocantins, responsável por toda a cobertura jornalística e midiática da Operação. Era nossa responsabilidade administrar todas as redes sociais do Projeto Rondon, produzir cobertura fotográfica e audiovisual de cada dia da Operação, produzir programetes diários de um minuto para o SBT-TO, produzir matérias jornalísticas para o site do Ministério da Defesa, divulgar o Projeto Rondon na imprensa e produzir o vídeo final da Operação. Viajamos para o Tocantins um dia antes das demais

universidades. Fomos extre- o cerrado brasileiro ali, bem as cidades e outro ficava no mamente bem recebidos no no centro geográfico do país. batalhão, onde podia traba22º Batalhão de Infantaria do No fim do dia, retornáva- lhar em tarefas que exigiam Exército Brasileiro, em Pal- mos a Palmas, onde começava computadores e internet. Isso mas, onde ficamos alojados a segunda parte da jornada: também ajudou a dar a todos durante toda a Operação. A produzir conteúdo com o ma- a oportunidade de trabalhar partir daí, começamos a co- terial coletado durante o dia. E em diferentes funções ao lonbertura da chegada das uni- logo no começo percebemos: go da Operação. Assim, um versidades, cerimônias leque muito grande de de boas-vindas e de aprendizados se abria abertura da Operação para cada um. e deslocamento das Atuar pelo Conjunequipes para as cidato C tem suas vantades em que atuariam gens e desvantagens. durante as duas semaPercebemos que não nas seguintes. criamos laços profunA partir da instados com as comunilação dos rondonistas dades atendidas pelo nas cidades, começaProjeto, porque não mos uma verdadeira passamos semanas em maratona. Diariamencontato diário e intente, cumprindo nosso so com elas, como os cronograma, viajávaoutros grupos. A exmos a duas cidades periência deste conpara cobrir as ações tato nos era relatada, que estavam sendo através das falas dos desenvolvidas. Saíarondonistas que enmos por volta das 6h, trevistamos e com que cobríamos uma cidade conversamos. Isso não pela manhã e corríaexcluiu por completo, mos pra cobrir outra, porém, o contato com à tarde. Viajamos cenrealidades extremaArte da tatuagem em tupiguarani feita pelos tenas de quilômetros mente diferentes das rondonistas de comunicação da Univali: “Sol que nasce para todos” todos os dias em um que estamos habitumicro-ônibus que foi ados. Vimos o cerne disponibilizado para o nosso “galera, meia noite é o horário do Brasil: a simplicidade dos grupo. Ao todo, visitamos 16 padrão...”. Trabalharíamos até lugares, a ausência de sercidades do Tocantins. Duran- mais tarde em alguns dias. viços básicos, a vida em aste essas viagens, pudemos ver Para que pudéssemos pro- sentamentos, a conversa dos as paisagens, tão diferentes duzir nossos materiais com senhores nas ruas de cidadedas que estamos acostuma- eficiência e qualidade, cria- zinhas minúsculas, em que a dos: planícies e planaltos sem mos um revezamento. A cada vida se desenrola em outro fim, lindos paredões de rocha, dia, um grupo viajava para ritmo.

Esse distanciamento que tínhamos em relação às ações diretamente com as comunidades, no entanto, nos permitiu criar uma visão mais abrangente e crítica. Pudemos diferenciar com mais clareza quais ações eram realmente alinhadas aos propósitos do Projeto, quais tinham um viés mais assistencialista, de que maneira as coisas poderiam funcionar melhor. Para nossa área de atuação, consideramos fundamental ter essa visão crítica. Passar vinte dias com outras nove pessoas, meio desconhecidas, é um processo intenso. A relação que estabelecemos transcende a de uma amizade muito forte. Viramos uma família. Hoje, sentimos falta da rotina que criamos lá, em que tudo era feito com o maior entusiasmo. As conversas, as risadas e a sinceridade que mantivemos como premissa fazem falta no nosso cotidiano “normal”. Para eternizar essa família, boa parte do grupo tatuou o lema do Tocantins, Co Yvy Ore Retama, (Essa terra é nossa, em Tupi). Alguns estão devendo, mas tudo bem... Quando dizem que o Projeto Rondon transforma as pessoas, acredite: é verdade. Nosso maior desejo, conforme conversamos, é que as mudanças pelas quais passamos ecoem em nós pelo maior tempo possível.

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ESPORTE

Destaque no automobilismo Christian Fittipaldi é um dos principais nomes do endurance nos EUA e busca o terceiro título Fotos: Divulgação Action Express

Christian estará a bordo do novo Cadillac DPi da equipe Action Express na série em 2017

Fernando Rhenius

4º período de Jornalismo

O

nome Fittipaldi virou sinônimo de velocidade nos anos 70. Wilson e Emerson foram desbravadores quando o assunto é automobilismo. Tiveram uma importante participação na Fórmula 1 nos anos 70 e começo dos 80. Os dois irmãos fundaram a mítica equipe Copersucar Fittipaldi. Antes, Emerson foi bicampeão pela Lotus e McLaren. Foi neste meio que nasceu Christian. Seguindo os passos

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do pai Wilson e do tio Emerson, começou nas categorias de base, chegando a Fórmula 1 em 1991. Competiu pela Minardi e Arrows e disputou 43 provas. Ao final de 1994, se mudou para os Estados Unidos. Competiu na NASCAR e na Indy, mas foi no endurance que Christian se sentiu em casa. Venceu as 24 horas de Daytona em 2004, com um protótipo Doran. Após a união da American Le Mans Series com a Grand-Am, em 2014, no que resultou na United SportsCar Championship, o brasileiro voltou ao primeiro lugar no tradicional circuito americano. Além do triunfo em Daytona, Christian venceu as 12 ho-

ras de Sebring em 2015. Ao lado do português João Barbosa, foi campeão da IMSA em 2014 e 2015. Também conquistou o NAEC (Tequila Patron Endurance Cup) minicampeonato que engloba as provas longas da IMSA (24 horas de Daytona, 12 horas de Sebring, 6 horas de Watkins Glen e Petit Le Mans) três vezes (2014, 2015 e 2016). Todas as vitórias e títulos foram conquistadas com o Corvette DP da equipe Action Express. Em entrevista, Christian fala da final polêmica das 24 horas de Daytona deste ano, sobre o balanço de performance e, é claro, as 24 horas de Le Mans.

P: Christian, a edição 2017 das 24 horas de Daytona terminou de forma polêmica. Ricky Taylor, da Wayne Taylor Racing, forçou em cima do seu companheiro Filipe Albuquerque, custando uma possível vitória. Em seu entendimento, Ricky se precipitou? Foi um lance de corrida? Faltou uma punição por parte da IMSA? O fato do Filipe ter aberto um pouquinho naquele momento foi para fazer melhor a tomada da curva, ele não deixou a ‘porta aberta’, mas isso gerou uma oportunidade para o Ricky, que na minha opinião foi muito agressivo e

acabou rodando o nosso carro. Se foi uma manobra limpa? Não, não foi, mas foi do jeito que foi. Rodamos e levamos a pior. Quanto à penalização, acredito que o IMSA até pensou sobre isso, mas a história por trás do carro 10 era muito boa para eles penalizarem a cinco minutos do final da prova. Claro que as decisões não são tomadas baseadas em fatos como estes, mas acho que o fato do Gordon estar no carro, deles terem chegado em segundo lugar nas três últimas 24 Horas de Daytona, por ser a última corrida do Angelelli. Isso tudo jogou a favor do carro 10. Se estivéssemos numa situação parecida, talvez isso


também tivesse ‘jogado’ a nosso favor. Mas, com certeza, não foi uma ultrapassagem limpa na pista.

no geral. No meu caso, se houvesse uma oportunidade numa equipe competitiva, eu com certeza voltaria.

P: Você competiu tanto na Europa, quanto nos EUA. Uma das principais reclamações por parte dos fãs são as intermináveis bandeiras amarelas, procedimento que existe no velho continente, mas de uma forma mais dinâmica. Esses longos períodos atrás do Safety Car são realmente necessários?

P: Um dos maiores desafios que um chefe de equipe tem é equalizar seus pilotos. Estilo de pilotagem, conhecimento do carro e bom relacionamento. Você tem uma ótima parceria com João Barbosa, estão competindo juntos desde 2011. Esta estabilidade dada pela equipe é um dos motivos para tantas vitórias e títulos?

Na verdade, a bandeira amarela existe por causa das corridas do automobilismo norte-americano. A Europa e, eu mesmo, aprendi isso com os Estados Unidos, porque lá você só tem a bandeira amarela local. Mas eu enxergo a bandeira amarela de forma oposta. Ela é acionada por motivo de segurança e, como piloto, tem dia que você gosta, porque ela te ajuda, e tem dia que não gosta. Em Daytona mesmo, teve uma bandeira amarela a 15 minutos do final, quando estávamos com oito segundos de vantagem. O carro 10 estava rápido, mas não teria conseguido nos alcançar se não houvesse a bandeira. Então, ela não ‘jogou a nosso favor’. Mas se eu estivesse em segundo lugar, estaria rezando para que ela acontecesse. P: Daytona também viu uma nova geração de protótipos, os DPi, em 2016, as equipes estavam preocupadas com custos. Após a primeira prova, é seguro afirmar que a troca por um modelo mais moderno e seguro valeu a pena? Como foi a adaptação?

Com certeza. Acredito que a chave do nosso sucesso se deve a essa continuidade. Quando eu renovei o meu contrato de 2013 para 2014 com a equipe, sabia que não éramos a melhor equipe da categoria. Hoje em dia, se eu pudesse escolher qualquer equipe para defender, eu nunca pensaria em sair de onde estou. Somos a melhor equipe e a gente ralou muito para transformar a equipe no que ela é, todo mundo trabalhou e se esforçou muito. Foi muita dedicação e trabalho e isso fez a diferença. P: Assim como você, outros pilotos brasileiros descobriram os encantos do endurance. O que falta para as novas gerações entenderam que podem ter carreiras vencedoras, sem tratar outras categorias além da F1 como menos importantes? Falta eles deixarem de ser contaminados pela ‘febre’ da

Fórmula 1. Desde que você nasce, no Brasil, com 3 ou 4 anos, você assiste corridas ao lado do seu pai, ouvindo um narrador cativante como o Galvão Bueno, e isso te condiciona de que só existe a Fórmula 1 na vida. E eu mesmo achava isso. Mas com o tempo você percebe que existe mais vida em outras categorias. Claro que ela é o topo do automobilismo, mas se você não chegar lá, você pode se profissionalizar, guiar e se divertir em muitas outras categorias.

to. Uma coisa que ele não te passa é o que você sente nas costas, a vibração, não passa a mesma sensação. É muito parecido, mas não é a mesma coisa.

P: Uma das discussões é o BoP (balanço de performance). Até que ponto ele é válido? Ele não acaba nivelando a equipe que investe menos?

P: A próxima etapa do Weathertech, serão as 12 horas de Sebring. O traçado é conhecido por ter um asfalto misturado com concreto e muitas imperfeições. Em relação as outras etapas, os carros passam por algum tipo de reforço estrutural?

P: Além dos testes em pistas. Você utiliza simuladores?

Não. O carro não tem nenhuma alteração com relação ao carro que corremos em Daytona, é exatamente o mesmo. Talvez, se em alguma curva o fundo estiver raspando um pouco mais, podemos colocar algum reforço, mas nada grande, só detalhes mesmo.

Como piloto participante do IMSA, eu diria que ele é importante para dar chance a todas as equipes e pilotos. Mas como competidor eu acho que não tem o menor contrassenso. Como diz o ditado: Quem pode mais, chora menos. Eu mesmo já estive dos dois lados da moeda e, mesmo assim, acho o BoP uma loucura para os competidores. Acho importante para os donos de equipes, atrai montadoras. Mas os carros nunca serão exatamente iguais, dentro de cada carro há muitas variáveis.

Não. Fui criado em outra época e, sinceramente, acho que os simuladores que realmente fazem a diferença estão na Europa. E acredito nos simuladores até um certo pon-

Endurance O Campeonato Mundial de Endurance da FIA, (em inglês: FIA World Endurance Championship), é uma competição automobilística internacional organizado pela Federação Internacional de Automobilismo e pelo Automobile Club de l’Ouest. O WEC, como também é conhecida, é destinada aos protótipos esportivos e carros de turismo. Sua temporada inaugural ocorreu em 2012. A mesma designação já havia sido utilizada pela FIA entre 1981 e 1985. Existem 4 categorias: LMP1 e LMP2, reservadas a protótipos, e corridas de GT divididas entre equipas com apenas pilotos profissionais (GTE-Pro) e equipas com pilotos amadores e profissionais (GTE-Am). O Mundial de Endurance segue o padrão adotado pela FIA, baseado na Fórmula 1, com a única diferença de que na categoria principal da FIA, somente até o 10º colocado recebe pontuação. A pontuação das 24 Horas de Le Mans é dobrada. O início do campeonato está marcado para Silverstone, em 16 de abril. O encerramento segue no Bahrein, marcado para 18 de novembro. A principal prova do calendário da categoria e uma das maiores do mundo, as 24 Horas de Le Mans acontecem entre os dias 17 e 18 de junho, um mês após a etapa em Spa-Francorchamps e um mês antes da prova em Nürburgring.

Fotos: Divulgação Action Express

Financeiramente não valeu a pena, vai valer no final do ano, na temporada que vem, mas foi um investimento muito grande. Além do carro, você também tem de lembrar que as equipes também ‘perderam’ todas as peças reservas que elas tinham, tiveram de jogar no lixo, comprar tudo novo e isso também tem um custo muito alto. Mas é algo que vai valer a pena ao longo do tempo. A primeira corrida foi um show, todo mundo ficou emocionado com os carros, então era uma mudança que tinha de ser feita e que vai refletir muito no futuro da categoria. P: Você é bicampeã da IMSA em 2014-2015 e vice em 2016. É um dos nossos melhores pilotos em atividade. Sua primeira participação em Le Mans, foi a bordo de um Saleen em 2006. Voltou em 2007 e 2008 com Aston Martin. Quando teremos um retorno? Faltou uma equipe competitiva? A própria Action Express teria, no futuro, interesse em participar da prova? A Action Express até tem interesse, mas só se tivesse a oportunidade de ser campeã

O início do campeonato está marcado para Silverstone, em 16 de abril MARÇO | 2017

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ESPORTE

Noite histórica em Brusque Brusque faz festa e quase elimina o Corinthians na Copa do Brasil em partida no estádio Augusto Bauer Foto: Agência Corinthians

Do outro lado, o Timão mostrou sua qualidade e chegou bem perto de abrir o placar no fim do segundo tempo. Bem em frente aos alambrados e do lado oposto aos assentos descobertos, Jadson, Jô e Maycon perderam três oportunidades claras de gol e decretaram as penalidades no estádio Augusto Bauer. Doze cobranças

Partida acabou no 0x0 e foi decidida nos pênaltis

Bernardo Marucco

7º período de Jornalismo

A

os 86 anos de idade, o estádio Augusto Bauer recebeu o jogo mais importante da sua história em uma quarta-feira chuvosa. O dia 1 de março de 2017 reservou grandes surpresas aos torcedores que lotaram a casa do futebol brusquense para acompanhar o confronto do time da cidade contra um clube gigante. No fim, a classificação do Corinthians para a terceira fase da Copa do Brasil ficou em segundo plano, ofuscada pela valentia do Brusque e pela festa da sua apaixonada torcida. A chuva fina que caía aos poucos na cidade não afastou o público. Filas enormes se formavam nos arredores do Augusto Bauer, movimentação que deixava bem clara a importância da partida. E às 21h45, horário em que o árbitro Péricles Bassols deu o apito inicial para começar o jogo, 4.070 pagantes já se amontoavam nas arquiban-

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cadas e proximidades dos com Leílson e Boquita. Mais à alambrados no estádio brus- frente, Ricardo Lobo e Belusquense. so eram as esperanças de gol Todos eles queriam ver do Bruscão, como seu torcecomo o time comandado pelo dor carinhosamente gosta de treinador Pingo se portaria em chamar o clube do coração. campo, diante Toda a difedo Corinthians. rença na históE a formação ria dos dois cludo Brusque cobes ficou para meçou por um Em campo, fora das quatro grande goleiro, linhas. Em camcom o ex-marpo, Brusque e Brusque e cilista Rodolpho Corinthians meusando a camisa diram suas forCorinthians 1. Na defesa, os ças e o equilíbrio dois zagueiros dominou o comediram titulares também meço da partida. passaram pelo De um lado para suas forças Marinheiro. Neo outro, a bola gueti e Clayton percorria as infaziam o miolo termediárias e da zaga, recetinha poucos esbendo o apoio de João Carlos paços para chegar perto das e Carlos Alberto. No meio grandes áreas. E quando checampo, o volante Mineiro e gou, os goleiros mostraram o camisa 10 Eliomar também talento. já vestiram o uniforme do ruNa direita, o Timão chebro-anil itajaiense, e comple- gou primeiro com o meia Léo tavam a meiúca do Brusque Jabá, que chutou rasteiro pra

boa defesa de Rodolpho. Seguro, o goleiro do Brusque também rebateu uma pancada de falta, desferida pelo volante Fellipe Bastos. A resposta brusquense veio com o atacante Ricardo Lobo, que bateu de longe e viu o gigante Cássio cair certo para espalmar a bola. A oportunidade foi a penúltima do primeiro tempo e veio antes de Leílson cobrar falta em cima da barreira corinthiana, desperdiçando uma grande chance. Logo no início da segunda etapa, um lance polêmico atiçou as duas torcidas presentes do Augusto Bauer. Bem na frente da arquibancada descoberta, os visitantes corinthianos e os mandantes brusquenses viram Belusso entrar na área com a bola dominada e ser derrubado pelo carrinho do zagueiro Pablo. Pênalti claro, não marcado pelo árbitro Péricles Bassols, que matou a maior chance do Brusque no segundo tempo.

Passando das 23h40 da noite, a decisão pela vaga na terceira fase do maior torneio de mata-mata nacional seria resumida a uma simples disputa de pênaltis. De um lado, o campeão mundial Corinthians estava pressionado para passar pelo Brusque, time criado em 1989, que vivia o maior momento de sua história. A pressão sobre os corinthianos ficou ainda maior quando o meia Jadson, principal contratação da temporada, mandou sua cobrança para fora. A partir dele, todos os chutes seguintes entraram. Quando o atacante Ricardo Lobo acertou sua cobrança e deixou o placar parcial em 4 a 2 para o Brusque, a empolgação com a possível classificação tomou conta dos torcedores. “É agora que eu endoido, nós vamos passar!”, gritava o torcedor Marcos Guerra, de 23 anos. No entanto, depois que Lobo converteu o seu pênalti, os laterais João Carlos e Carlos Alberto não tiveram a mesma competência. Por fim, a cobrança correta do atacante Romero deixou o placar em 5 a 4 pro Corinthians, que avançou na Copa do Brasil. O momento seguinte ao gol que decretou o destino do confronto resume o sentimento do torcedor brusquense. Ao invés de vaias para os atletas derrotados dentro do estádio Augusto Bauer, uma salva de palmas. Gritos de “valeu” e “vocês fizeram história” também foram frequentes. Os mais de quatro mil fanáticos deixaram o estádio Augusto Bauer certos de que viram um momento único. A noite de 1 de março de 2017 vai ficar na memória de todos que enfrentaram a chuva fina e foram ver a valentia do Brusque sobre o gigante Corinthians.


ESPORTE

O sucesso pelo caráter Técnico da Seleção, Tite é exemplo de honestidade e tem uma legião de fãs Danilo Vieira

Espaço aberto para os textos da disciplina de Jornalismo Opinativo, do 3o período do curso de Jornalismo, sob coordenação do professor André Pinheiro.

Foto: Reprodução

6º período de Jornalismo

Estereótipos e padrões por Heifara Nascimento

N

o quarto país mais corrupto do mundo, honestidade vira heroísmo. Não por menos e sem merecimento. A atitude correta e equilibrada de qualquer indivíduo, em qualquer setor, é algo digno de admiração numa sociedade desigual, que não dialoga e não se respeita. Tite é um desses caras. Unanimidade entre os brasileiros, ele quase não erra, pelo menos na frente das câmeras, dos holofotes e quando a exposição pode lhe tirar todas essas credenciais. Calmo quando tem que ser agitado quando necessita e coerente, o treinador arrebatou uma legião de fãs dentro do futebol, e por incrível que pareça, fora dele. Para a dona de casa, o lado família do treinador da Seleção Brasileira é motivo de admiração. Para o fã de futebol, o conhecimento técnico e tático de Adenor Leonardo Bachi, o Tite, é motivo de orgulho. Para quem não entende do esporte e que acompanha poucas vezes, Tite é um exemplo. Não se sabe muito bem o motivo, mas ele carrega consigo a marca da honestidade. Para explicar como iniciou essa trajetória vencedora, vamos usar o ano de 1970, data do nascimento de Tite, em Caxias do Sul, como exemplo. Ou melhor, devemos usar como maior exemplo, dona Ivone Mazochi e seu Genor Bachi, país de Tite e responsáveis pelo caráter do filho. Com Miro e Beatriz, seus irmãos, o pequeno Adenor não teve uma infância fácil, mas era feliz. Estudante do Colégio Estadual do Guarani, Tite já era apaixonado por futebol e pulava o muro dos colégios de freiras da cidade, pois em sua escola não existia uma quadra para rolar a bola. Ali, já dava sinais que seria atleta profissional. Tite, apenas para os amigos, tem o apelido de “Ade” dentro de casa. Dona Ivone, a mulher que mais torceu pelo sucesso do filho, talvez seja espelho do caráter do treinador da Seleção Brasileira. Simpática, com idade avançada e voz mansa, ela conta com alegria as malcriações de seus filhos, e fica com os olhos marejados quando fala de seu filho técnico de futebol. Não por menos. É aqui que a história retorna para a grande responsabilidade de seu país por todo seu sucesso. No inicio, quando Tite ainda tentava trilhar os caminhos pelos campos do

OPINATIVO

Com o desenvolvimento das sociedades, os estereótipos foram se criando e padronizando diversos aspectos relacionados ao ser humano e suas ações. Engraçado dizer desenvolvimento, né? Pois bem, essa padronização foi mãe dos clichês, que não pararam de se reproduzir até então. Padrões impessoais e ideias preconcebidas são os frutos dessa reprodução toda. Portanto, podemos dizer: o estranho só existe pela existência dos padrões. Ou melhor, o estranho só existe para quem enxerga somente o que está à sua frente.

Adenor Leonardo Bachi, Tite, ao lado da mãe, Dona Ivone

Brasil, a família Bacchi passou Em uma entrevista, Tite por dificuldades financeiras. exemplificou todo seu aprenDona Ivone teve de costurar dizado de vida e resumiu roupas para conseguir pagar como costuma lidar com as as despesas de casa, enquan- situações. “Trate com lealdato Seu Genor não parava de de e fale pela frente. É como incentivar Tite a não abando- eu trago e gosto como as pesnar seu sonho. Naquela época, soas falem comigo. Não gosto o atual treinador da Seleção de deixar no ar, de insinuação. Brasileira cogitou arrumar um As relações entre pessoas preemprego para ajudar nas con- cisam ser leais. Você pode até tas de casa. divergir, porém prevalece a leA carreira de Adenor co- aldade”. meçou cedo. Aos 14 anos ele No comando da Seleção já atuava no futebol de várzea Brasileira, Tite caminha para de Caxias. Meia exorcizar o 7 a 1 de habilidade sofrido pela Alefoi descoberto manha, em pleno por Luis Felipe Brasil, na Copa “As relações Scolari, técnico do Mundo de de uma equipe 2014. Com ele o adversária num entre as pessoas orgulho do brasidos campeonaleiro pela seleção precisam ser voltou e também tos amadores. Hoje pentacamamenizou um clileais. Você peão, Felipão, na ma tenso vivido época, gostou do pelo país em épopode até futebol de “Ade”, cas políticas tão mas errou seu fervorosas. nome e imortali- divergir, porém, O gaúcho prozou o apelido que va, que com muiAdenor carrega to trabalho, esprevalece a até hoje: Tite. tudo, humildade Responsável e caráter, as coilealdade” direto por descosas funcionam. brir Tite, Felipão Hoje, Adenor, é conseguiu que um ótimo exemele fosse contratado pelo Ca- plo para a política brasileira: a xias. Ali iniciou sua trajetória honestidade pode não vencer dentro do futebol. Forçado a sempre, mas quando vence é aposentar os gramados antes mais bonita. dos 30 anos por conta de uma Em 2016, 16 anos depois lesão grave no joelho, Tite vi- da sua primeira grande conrou professor de educação físi- quista, Tite acumula grandes ca, seguiu a carreira de técnico conquistas, virou ídolo do Coe no mesmo Caxias, em 2000, rinthians e chegou à Seleção conquistou talvez o mais sim- Brasileira. Vestindo a camisa bólico título de sua carreira: amarelinha, com apoio não só campeão Gaúcho. Seria nor- de sua família, mas de 210 mimal, não fosse com uma equi- lhões de brasileiros, Tite pode pe de pequeno porte derru- terminar o livro de sua vida bando gigantes como Grêmio com uma história pra lá de boa e Internacional. para contar.

A classificação concebida pelos estereótipos sempre foi uma linha tênue para o preconceito, ou, falando de uma forma, no mínimo, mais crua: pelo julgamento. Afinal, todo conceito que precisa do “pré” é, de fato, uma hipótese. Toda essa padronização faz parte dos efeitos colaterais de uma sociedade que só enxerga o que quer. Faço essa afirmação sem desrespeitar cultura alguma. Pelo contrário, o que quero debater é o quanto precisamos conhecer e aprender a respeitar os costumes alheios. Acredito que a educação é o remédio para descontruir esse conceito. Não me refiro à educação de exclusivamente conhecer, de tomar conhecimento, mas à educação que damos à nós mesmos. Pois a partir do momento em que precisamos descontruir algo, precisamos, mais do que nunca, olhar para dentro. A partir do momento em que temos consciência, estamos sendo hipócritas ao seguirmos no caminho do conformismo. Eis onde eu queria chegar: essa desconstrução já acontece diante de alguns olhos que se permitem enxergar. Os estereótipos não existem mais. Compareci a um evento que me fez refletir sobre o quanto podemos ser o que quisermos, sem precisarmos dar nomes para isso. A padronização tem se tornado, no mínimo, algo com menos impacto. Em uma das apresentações desse evento, vi pessoas dançando. Pessoas. Todas mexendo o corpo, não importando se aquele ritmo fazia ou não parte de sua rotina. Havia mães com bebês no colo, havia gente com pouca roupa, com quase nada de roupa, gente com saias longas, gente com mochilas nas costas – pois estavam de passagem, mas não ousaram parar para dançar. Todo mundo trouxe um pouco de si para a dança, e, naquele momento, percebi: são pessoas. A única definição que devo pensar ao olhar para os corpos dançantes. No fim, os rótulos estão todos destinados a ir para o lixo, não é mesmo? Que assim seja na metáfora também.

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COLETIVO FOTOGRÁFICO

Falta de preservação em Bombinhas Acadêmicos: Bruna Schiestl, Maicon Renan e Rodrigo Dalri

ciapunctum.wordpress.com

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uando se fala em Bombinhas, a primeira coisa que a maioria das pessoas normalmente pensa é nas belezas naturais que a cidade oferece. No município, há uma grande preocupação com as diversas e grandiosas áreas de preservação ambiental, o cuidado com as construções urbanas e a, ainda nova, taxa de preservação ambiental (dinheiro arrecadado dos visitantes em um tipo de “pedágio” para investimento no meio ambiente). Apesar disso, o que normalmente passa despercebido são as ações humanas, que

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propositalmente ou não, fazem toda a diferença na vida marinha e terrestre do local – uma pena que não para o bem. Mesmo assim, os órgãos governamentais e ambientais se esforçam para tentar melhorar pelo menos um pouquinho esse problema, presente em praticamente todas as praias da cidade. A única coisa que falta é a consciência individual de cada pessoa, afinal, o problema só será 100% resolvido quando todos respeitarem o espaço e fazerem o correto, principalmente com o lixo.


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