Cobaia #157

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Foto: Laura Testoni

Itajaí, Abril de 2018 | Edição 157 DISTRIBUIÇÃO GRATUITA

Feminismo Em busca de igualdade, mulheres se unem para enfrentar agressões e lutar por mais direitos

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Perfil Muito além do B.I.X.A: Francisco Weiss é músico, compositor, artista e usa seu talento para protestar Pág. 7

Uma vila chamada Miséria A esperança é o que move os moradores da localidade que fica na periferia de Itajaí

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Educação Bullying transforma escola em um verdadeiro castigo e deixa sequelas nas vítimas deste tipo de violência

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Resenha Série The Good Place aborda a morte de forma original e se diferencia das outras comédias pela ousadia

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Editorial Enquanto as brigas políticas parecem se intensificar neste período pré-eleitoral, um dado bastante importante sobre o país passou despercebido por muitos no mar de informações que recebemos diariamente: o número de brasileiros vivendo na extrema pobreza aumentou em 2017. Segundo dados divulgados pelo IBGE no início de abril, a quantidade de pessoas que vivem nessa condição passou de 13,34 milhões em 2016 para 14,83 milhões no ano passado. Um aumento de 1,49 milhões de pessoas, variação de 11,2%. Isso quer dizer que mais de 7% da população brasileira vive com uma renda de até R$ 136 mensais.

EXPEDIENTE

Essa linha de corte é adotada pelo Banco Mundial para países de desenvolvimento médio-alto, como o Brasil. Essa realidade, que às vezes parece distante e presente apenas em grandes centros urbanos, pode ser encontrada também nas cidades de nossa região. Em Itajaí, um dos lugares que abriga uma comunidade que sofre com a falta de renda é a Vila da Miséria, localidade que fica no bairro da Murta, periferia do município. A história de algumas pessoas que vivem na vila está nas próximas páginas desta edição do Cobaia, que também dedica a capa para o tema. As alunas Laura Testoni e Lyandra Machado (30 perí-

odo do curso de Jornalismo) encararam o desafio de conhecer de perto essa difícil realidade e viram o quanto essa população sofre com a falta de políticas públicas. A vila existe há mais de 20 anos e a condição de vida dos moradores praticamente não evoluiu. Segundo os economistas, uma das principais causas desse aumento da pobreza no país é o avanço do desemprego. Diante dessa realidade, muitos buscam ocupação na informalidade, sem carteira assinada e com rendimentos bem abaixo dos pisos salariais. Na Vila da Miséria, moradores fazem coleta de lixo e vendem para a reciclagem em busca de uma fonte de renda.

Opinião

Agência Integrada de Comunicação

De pai para filho UNIVALI - Universidade do Vale do Itajaí

A alegria começava no momento em que meus pais diziam que iriamos visitar meus avós. Quatro horas e meia de viagem não era nada perto da alegria que sentíamos ao chegar lá. Tenho certeza que minha paixão pelo esporte começou quando percebi o motivo pelo qual meu avô estava sempre em frente à TV ou com a orelha grudada no rádio. Era período de férias e poder dormir até tarde era motivo de alegria. Mas na cozinha, meu avô ouvia o rádio no último volume logo cedo - a perda auditiva fazia com que ele precisasse ouvir tudo em alto e bom som. De longe, percebia que era futebol, só podia ser. Com a cuia de chimarrão, ele ria sozinho, conversava com os locutores e até discordava. Ao levantar e me deparar com aquela cena, não tinha mau humor que permanecesse. Ele era a pessoa mais bem-humorada que conheci em toda a vida. Já meu pai, sempre teve atitudes parecidas. Afinal, a fruta não cai longe do pé. Assim como meu

avô, ele adora futebol, mas tinha também uma queda pela Fórmula 1. Cansei de acordar no meio da noite e ouvi-lo na sala assistindo corrida. Meu único questionamento, ainda que meio sonolenta era: Quem em sã consciência coloca despertador para acordar no meio da noite e assistir diversos carros em alta velocidade? Depois de um tempo, entendi que isso significava apreciar o esporte, a qualquer hora e a qualquer momento. Ao reunir minhas duas maiores referências e mais alguns tios e primos, a festa era garantida, principalmente aos domingos. Todos em frente à TV vibrando pelo Palmeiras, pelo Corinthians ou pelo Vasco. No meio da confusão, eu fazia competição de embaixadinha nos fundos da casa com meu irmão. Não tinha como ser diferente. Meus álbuns de infância mostram que minhas primeiras roupas foram uma mini camisa do Palmeiras e um short branquinho para combinar com o meião. Na

escola adorava educação física, até participei de grandes competições como o Moleque Bom de Bola e o Jogos Escolares de Santa Catarina. Até cheguei a sonhar em um dia jogar vôlei profissionalmente, mas a falta de altura me fez desistir dessa história e trocar a bola por um microfone. Apreciar um esporte seja como telespectador ou como atleta é dose garantida de prazer, vibração e paixão. E cabe aos pais serem os incentivadores de tal ação. Hoje, não sou fanática pelo Verdão, mas adoro bater uma bolinha com as amigas no sábado à tarde e colocar em atividade minha chuteira florescente da Kappa, que até então estava pendurada. Paixão que passou de geração para geração e se intensifica a cada reencontro familiar.

ESCOLA DE ARTES, COMUNICAÇÃO E HOSPITALIDADE Diretora: Bianka Capucci Frisoni CURSO DE JORNALISMO DA UNIVALI Rua Uruguai, 458 - Bloco C3 Sala 306 | Centro, Itajaí - SC - CEP: 88302-202 Coordenador: Carlos Roberto Praxedes JORNAL LABORATÓRIO DO CURSO DE JORNALISMO DA UNIVALI Edição: Gustavo Paulo Zonta Reg. Prof. Mtb/SC 3428 JP Tiragem: 1 mil exemplares Distribuição Nacional Projeto Gráfico: Vinicius Batista Gustavo Zonta Diagramação: Gustavo Zonta

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Katyanne Krull 7º período de Jornalismo

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Agenda

cobaia@univali.br

Congresso Jurídico

Exposição internacional

Entre os dias 7 e 11 de maio, acontece no campus Tijucas a 23ª edição do Congresso Jurídico. As palestras são dirigidas a alunos, professores e comunidade. O valor da inscrição antecipada é de R$ 40 e no dia do evento R$50. Os participantes receberão certificado de 20h ao final do congresso e no final de cada palestra serão sorteados brindes.

O campus Florianópolis da Univali sedia, até o dia 14 de maio, a primeira exposição de Ara Güler no Brasil. A mostra “Testemunho de um Século – Istambul, civilizações da Anatólia e retratos de celebridades” está aberta à visitação de forma gratuita. Güler é fotojornalista reconhecido como principal figura de uma geração de fotógrafos da Turquia.

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CIDADANIA

No final da Vila da Miséria, existe uma porta para o céu Comunidade existe há mais de 20 anos e segue à espera de condições melhores para viver Fotos: Laura Testoni e Lyandra Machado

Laura Testoni e Lyandra Machado 3º período de Jornalismo

Um muro alto separa duas realidades. De um lado, uma empresa de ponta; do outro, sacões de lixos, carroças e uma luta diária pela sobrevivência. O forte calor faz o cheiro forte da vala, de quase um quilômetro, tomar conta do ar. Há muitos cachorros e crianças. Uma única estrada de chão nos leva a inúmeras famílias com a esperança de dias melhores. O sol parece queimar bem mais na Vila da Miséria, no bairro da Murta, na periferia de Itajaí. Sentado em um tijolo, o pedreiro Gilson Gil da Silva, de 37 anos, começa a manhã observando o pequeno movimento da rua da Vila. Gil não mede palavras para falar sobre o precário saneamento da área em que ele mora há mais de 10 anos. O pedreiro usa uma única

palavra para definir a situação: crítica. A indignação com as autoridades é nítida. “Vieram com promessa de fazer galeria nessa vala e não cumpriram. Promessa de tubulação e até agora nada. Esqueceram a população e só lembram daqui quando é eleição, pra pedir votos”. Os casos de doenças por conta do estado em que vivem são comuns. Gilson e inúmeros outros moradores já sofreram por conta da leptospirose. Ao lado do vizinho e amigo, Alex Machado também tem sede de mudança. Pausa seu café da manhã para mostrar a revolta com a precariedade do lugar. Alex fica chateado com o fato da Vila da Miséria não ter nem ao menos localização nos mapas da cidade. A casa onde ele mora está prestes a cair. Todas as autorizações necessárias para a obra de reconstrução da casa estão prontas, mas a família não têm condições de comprar o material e iniciar as mudanças.

O pedreiro Gilson Gil da Silva mora na Vila há mais de 10 anos

Dona Kátia, de 54 anos, mãe de Alex, demonstra tristeza em não poder ajudar na reconstrução da casa do filho. Maior ainda é sua indignação com o abandono que a comunidade vem sofrendo ao longo dos anos. Antes de se mudarem para a Vila da Miséria, o terreno em que moravam foi comprado pela prefeitura. O prefeito da época doou – de boca, sem nenhum documento – o terreno que agora Kátia vive com sua família. A senhora e seu marido foram os primeiros moradores da Vila. Ela mora há mais de 20 anos na comunidade e conta que a vala a céu aberto nunca foi fechada e o saneamento sempre foi precário. Em todos esses anos, as mudanças foram mínimas. A maior revolta de dona Kátia está na falta de transporte adequado e na segurança das crianças que moram na Vila. O ônibus que leva os pequenos para a aula para muito longe das casas. E não é por falta ABRIL | 2018

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de espaço, não. Os caminhões de lixo conseguem, tranquilamente, chegar perto das casas para fazer a coleta. A senhora se preocupa mesmo é quando as crianças voltam da aula, quando está escuro e chovendo. Eles têm de percorrer um longo trajeto até chegarem às casas. “Isso aqui enche tudo em dia de chuva. Em dia de chuva, não dá pra entrar aqui. Só descalço ou de bota”. Na casa que fica aos fundos da moradia de dona Kátia, Rafaela da Silva, de 29 anos, amamenta o pequeno Pedro, de apenas 6 meses. Além de Pedro e Rafaela, moram no lugar também seu outro filho, seu enteado e seu marido. A casa, reconstruída após uma maré alta de julho e rodeada de lixo, fica ao lado de uma segunda vala. No terreno, gatos, cachorros e galinhas garantem segurança e alimento. Pela falta de tratamento d’água, as crianças, e até mesmo os adultos, ficam constantemente doentes. Tudo é muito longe para eles, que se locomovem de carroça ou a pé. Principalmente, os postos de saúde. Rafaela foi vítima de abuso no seu primeiro casamento. Seu ex-marido era usuário de drogas e alcoólatra, e a obrigava a fumar crack junto com ele. Grávida, a moça se viu viciada no dia seguinte a sua primeira experiência. A jovem sofria abusos constantes, até que decidiu revidar uma das agressões. Ao ver o estado do marido, Rafa-

Fotos: Laura Testoni e Lyandra Machado

Valas com esgoto a céu aberto estão por toda a parte e colocam a saúde dos moradores em risco

ela não pensou duas vezes em pegar um pedaço de madeira e atacá-lo. Sua primeira tentativa falhou assim que ela viu a madeira se quebrar nas costas do homem. Caída após ser atacada com um soco, a jovem se levantou, pegou outro pedaço de madeira e voltou a atacar o marido. Mas Rafaela não viu que havia um prego na ponta. Só percebeu quando foi puxar a madeira de volta e não conseguiu. O prego fez a madeira ficar presa às costas do homem. Desesperada e com medo da reação do abusador, Rafaela a puxou para baixo, deixando seu ex-marido gravemente ferido. Depois desse episódio, Rafaela não teve dúvidas: saiu da casa onde vivia com ele, em Criciúma, deixou o marido e, grávida, procurou uma casa de reabilitação. Lá, a jovem ficou um ano e meio até que decidiu vir para Itajaí. Sua mãe adotiva morava na cidade. Foi quando conheceu sua irmã biológica, Su-Ellen. Sua mãe adotiva marcou um encontro, sem que Rafaela soubesse, em seu restaurante. Quando viu uma mulher muito parecida com ela, a jovem não teve dúvidas de que era sua irmã biológica. A mãe delas morreu uma semana após Rafaela reencontrá-la e aceitar o pedido de desculpas pelo abandono. Sua história na Vila da Miséria começou há dois anos, quando foi morar com sua

Rafaela tem 29 anos e mora na Vila há dois anos. Na foto, ela está ao lado do marido, seus dois filhos, um tem apenas 6 meses, e o enteado

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Fotos: Laura Testoni e Lyandra Machado

A maioria dos moradores da Vila da Miséria vive da venda de materiais recicláveis: um quilo de material reciclável rende de R$ 0,60 a R$ 0,70

irmã, Su-Ellen. Depois de conhecer seu atual marido, mudou-se de casa, mas continuou vizinha de sua irmã na Vila. A casa é muito simples, construída com madeira e feita numa altura elevada para que as marés não a atinjam tão facilmente. Não há separação de cômodos. Enquanto o marido sai para trabalhar na reciclagem, Rafaela fica cuidando da casa e das três crianças. Às vezes, ajuda seu marido na reciclagem, para tentar agilizar o processo e produzir mais ‘bags’ – blocos de materiais recicláveis como papelão, metal e plástico. O trabalho de um dia inteiro rende muito pouco: um quilo de material reciclável é vendido pelo valor de R$ 0,60 a R$ 0,70. Esse dinheiro é utilizado para sustentar toda a família, cinco pessoas, incluindo um bebê que precisa de fraldas. Com lágrimas nos olhos, Rafaela conta que certa vez seu filho ficou doente e pediu bolachas para a mãe. Sem dinheiro para comprar, ela teve que negar ao filho. Não pensou duas vezes: vendeu o celular que havia ganho há pouco tempo do marido por R$ 150, valor muito abaixo do que eles estavam pagando, e foi comprar bolacha para o menino. Saiu à noite, num mercado longe de sua casa e comprou as bolachas. Quando seu filho acordou e pediu novamente, ela finalmente tinha o que ele havia lhe pedido. ‘’Já passei fome. Eu sei o que é passar por isso, mas meu filho não. Meu filho não vai saber”. A irmã de Rafaela, Su-Ellen, morava no bairro Promorar, em Itajaí, antes de se mudar para a Vila, há sete anos e meio. Hoje, Su-Ellen ajuda o marido na reciclagem, em sociedade com um casal de vizinhos. Mas nem sempre foi assim. Su-Ellen já trabalhou de carteira assina-

Dona Kátia mora na Vila há mais de 20 anos e lamenta a falta de melhorias na comunidade

No final da rua que corta a Vila, há uma igreja evangélica pentecostal: a porta do céu

da como auxiliar de serviços gerais meio período, em uma empresa que acabou falindo devido à má administração. A mulher, apesar da jovem aparência, tem problemas de saúde não compatíveis com sua idade. Ela acaba rendendo menos no trabalho devido à artrite, à artrose e às fortes crises de enxaqueca que o sol provoca. Su-Ellen é casada há 14 anos e tem três filhos: Ariadna, Benjamin e Marcela, que com 17 anos já constrói uma vida ao lado de seu marido. O “sonho de consumo” da família é voltar para o Promorar, mas a falta de segurança do antigo bairro a assusta. “Lá é assim ó: mercado é perto, postinho é perto, farmácia. E também é mais perto do centro”. O problema é encarar os problemas que vêm com a chuva. Desde a enchente de 2008, os moradores da Vila possuem um abrigo, em uma igreja que fica perto da localidade. Antes mesmo de a maré tomar conta das casas, os moradores se organizam para saírem do local. Com tantas dificuldades, a esperança é o que move os moradores da Vila da Miséria. Todos os anos, especialmente no Natal, as crianças fazem seus pedidos para o “Papai Noel” em cartinhas. Os pais, quando saem para coletar material para a reciclagem, vão distribuindo os pedidos ao longo do caminho. Ong’s e instituições ajudam muito os moradores com alimentos, brinquedos, roupas e esperança. Apesar de todas as dificuldades, a comunidade se tornou uma família. Nos momentos mais difíceis, se apegam à fé e vão até a igreja que fica no fim da rua que corta a vila. No letreiro escrito em caixa alta na cor azul: Igreja Evangélica Pentecostal A Porta Do Céu.

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FEMINISMO

A busca por igualdade A luta diária de algumas mulheres em busca de direitos nos mostra que é possível ter esperança Lyandra Machado, Tainara Luchtemberg e Wesley Alexandre 3º período de Jornalismo

Entre 1980 e 2010, quase 92 mil mulheres foram assassinadas no Brasil. A maior parte delas foi morta dentro da própria casa. O ódio, desprezo ou preconceito contra mulheres é chamado de misoginia, muitas vezes seguido de violência física, verbal ou psicológica. Mulheres convivem diariamente com o medo de tornarem-se mais um número para as estatísticas, como a da Organização Mundial de Saúde (OMS), que hoje mostra o Brasil como 7º colocado no ranking dos países que mais assassinam mulheres no mundo. Bruna Merenneito, 18 anos, conheceu esse ódio de perto. Um relacionamento abusivo com um homem deixou traumas profundos. Ela decidiu lutar contra eles usando a arte como principal aliada para enfrentar o atual cenário de opressão das mulheres. A arte se tornou sua melhor amiga, assim como todas as outras lutadoras que encontrou durante a caminhada no feminismo e a ajudaram a achar a cura e a liberdade. Durante 26 dias, Bruna ficou internada em um hospital psiquiátrico. E foi nesse período que escreveu seu livro-poesia, Cura-tivo. A obra conta um pouco sobre as angústias que passou durante quase um mês, além de falar sobre seus sentimentos no relacionamento em que sofreu abuso. Através de sua história, outras meninas podem se identificar e se sentir confortadas de alguma forma. Após sair do hospital, tatuou a palavra Fighter (lutadora) no braço. Sua luta pelo feminismo sempre existiu. Mas só em 2014 conheceu o termo e adotou como estilo de vida e posição política. “A busca pela igualdade já fazia parte de mim. Quando eu descobri que tinha outras pessoas lutando por isso, eu me libertei. Encontrar um termo, uma posição política, foi muito importante, foi uma liberdade incrível’’. A luta de Bruna é diária e o objetivo é para que as mulheres não se sintam culpadas

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Dados: Datafolha/Fórum Brasileiro de Segurança Pública

após sofrer algum abuso ou assédio, como ela ficou, e por isso a discussão é importante. A luta é para que elas não tenham que passar pelo o que ela passou. André Soltau, especialista em cultura contemporânea e professor em diversos cursos na Univali, acredita que há um condicionamento desde criança no processo educacional de estímulo-resposta. Esse comportamento é moldado em casa, na escola e entre outras instituições que passamos ao longo da vida. Esse condicionamento chama-se Behaviorismo, criado pelo fisiologista russo Pavlov, que modulou o comportamento animal depois de repetidas tentativas de ensinar o que é certo. Assim acontece com crianças que, principalmente na família, são condicionadas a como portar-se em público, o que se deve fazer ou não fazer e até o lugar do gênero sexual em vida em comunidade. Quando um brinquedo é escolhido em razão do gênero, por exemplo. Meninos com

bolas e ferramentas. Meninas com panelas e objetos que remetem ao trabalho de dona de casa. “A criança aprende que quando acerta o comportamento, terá uma recompensa. Se erra, é punida”, explica Soltau.

O Brasil é o 7o colocado no ranking dos países que mais assassinam mulheres no mundo

Natália Garcia, 19 anos, também passou por situações de abuso e inferioridade em um relacionamento. “Me envolvi com uma mulher bem controladora e machista, que me condicionava e moldava

a ser o que ela queria. Teve agressão, ameaça. Foi quando eu vi que violência contra a mulher não era só física, mas sim tudo que inferioriza, abala o psicológico. Então, comecei a me envolver com os coletivos e lutar pelo que acredito”, conta Natália. Como sempre teve um ar militante, se envolveu em diversas causas e projetos a favor de igualdade para as mulheres. Nesse contexto, conheceu e pôde compartilhar sua história com muitas pessoas e ajudá-las com a experiência que havia passado. “De fora, eu via que tudo que envolvia a mulher era extremamente relativizado, ou seja, condicionado a uma ação que deveria vir de nós. Mas a problemática disso está justamente numa construção social enraizada, que condiciona a mulher numa sistemática patriarcal e torna tudo ‘normal’. Essa é a importância da luta feminista: mostrar que não é normal”, defende Natália. Nesse mesmo meio de militância e luta pelos ideais,

encontra-se Estela Santos, 22 anos. Como as outras meninas, também se esforça e vai à luta para ter voz e direitos iguais. “Já estive em espaços em que a minha fala foi completamente ignorada pelo simples fato de ser mulher e, portanto, não ser boa o suficiente para contribuir em decisões, apenas em trabalhos manuais e administrativos (ou fazer café – sim, já ouvi isso)”, relata Estela. Por isso sua luta foi constante e ainda é. Como ela diz, às vezes não conseguimos mudar o mundo no tempo de uma vida, mas se conseguirmos mudar a nossa realidade, e a realidade de mulheres próximas, estaremos no caminho certo. As situações de abordagem às mulheres com o uso de palavras obscenas no cotidiano são a prova de que a violência se manifesta além dos casos de agressão física, Adriana Maria Gomes de Souza Spengler, professora no curso de Direito da Univali e doutoranda em Ciências Criminais, define a violência moral como a base para as demais hostilidades: “A violência é um ciclo que começa na violência moral. O feminicídio é a forma final e mais cruel das formas de violência doméstica e familiar contra a mulher e de forma paralela, quando não envolve violência doméstica é a mais pura demonstração de misoginia, eis que deriva única e exclusivamente da condição de ser mulher. Sem motivação passional”. O crime contra a mulher, seja ele fora ou não do ambiente doméstico, é referência negativa no Brasil. Conforme dados da ONU (Organização das Nações Unidas) o país tem a quinta maior taxa no mundo deste tipo de crime, a proporção é de 4,8 para 100 mil mulheres. Entidade das Nações Unidas pela Igualdade de Gênero e o Empoderamento das Mulheres, a ONU Mulheres trabalha junto aos governos e à sociedade civil para políticas que promovam a igualdade de gênero. Segundo estudos promovidos pelo órgão, os motivos que resultam nos ataques contra a população feminina são o sentimento de posse sobre a mulher; controle sobre seu corpo, desejo e autonomia; limitação da sua emancipação profissional, econômica, social ou intelectual; tratamento como objeto sexual; e manifestações de desprezo e ódio.


Foto: coletivovuparles

Chico Weiss muito além do B.I.X.A Francisco Weiss, 22 anos, não é apenas um estudante de psicologia, ou um cantor de rap ou até artista. Ele é uma junção disso tudo e muito mais. Sempre caminhou no meio das artes, mas foi nas composições que encontrou uma forma de expor os sentimentos, de expressar o que sente independentemente do que os outros vão pensar. Pela sua atitude, pelo seu estilo, seu cabelo azul, muitos acham que ele é apenas um personagem, que faz para chamar atenção, mas engana-se quem pensa assim. “Cá estou eu sendo eu mesmo e expressando isso para as pessoas”, diz Chico, assumindo uma autenticidade que muitas vezes tem um preço a pagar.

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CULTURA

COLETIVO FOTOGRÁFICO Acadêmicos: Beatriz Leal, Lídia Sievers, Patrick Pedon, Rachel Schneider e Thayná Costa

coletivovuparles.wordpress.com

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Ele sabe como é arriscado e difícil ser autêntico, ser você mesmo, pois, nem sempre é o que as pessoas esperam, o que elas querem que você seja. Diariamente, ele enfrenta situações em que parece não pertencer aquele espaço por ser diferente e não tentar esconder isso, e sim aceitar. “Intimidado sim, mas é uma luta interna para se fortalecer e pensar: desculpa se sou fabuloso, é o meu jeitinho, né?! ”. Mesmo com esse pensamento positivo, não quer dizer que já não tenha pensado em deixar de assumir essa postura, pelo medo, pela rejeição. Mas, entende, hoje, que essa dor que ele sente por causa de toda essa intimidação não é maior que a dor de tentar ser o que não é. Então, como ele mesmo diz, prefere continuar assim. Sobre se assumir, Chico conta que em 2013 foi um ano importante, foi quando começou a se reconhecer gay. Antes disso, conta que era um hétero normativo. Acreditava que o único jeito gay de ser era aquele visual camisa de marca, calça jeans colada no corpo, cabelo liso militar e por aí vai... Dois anos depois, em 2015, assumiu a homossexualidade oficialmente para os outros. Ao falar sobre isso, lembra que não foi fácil. Muitos pensam que a família dá bastante apoio pelo fato dele dar a cara a tapa. Mas, infelizmente, não é bem assim. Teve sorte de sempre poder contar com o apoio dos amigos e de apenas precisar se assumir para a mãe. Os pais são divorciados e ao falar sobre o pai diz não ter contato. “E acho ótimo. Tenho certeza que ele ia me bater pra caramba até virar homem”,

pensamento este que não é difícil de ser encontrado por aí. Em relação à mãe, Chico diz que ela ainda não aceita muito bem, mas que dentro das limitações ela busca respeitar. “Estamos na luta por respeito”. A música B.I.X.A, que lançou recentemente, fala sobre a dor do preconceito, da homofobia, e expor essa dor é reviver todo esse processo e transformar em algo forte, em arte. Ele cita uma frase da atriz Carrie Fisher: “Pega a dor e transforma em arte”. É isso que ele busca fazer. E foi assim que surgiu a música. “Porque é pegar uma lâmpada e quebrá-la no meio e dizer: está aqui o que eu faço com o seu preconceito”. Ainda comentando sobre a construção da música, revela que foi um longo trabalho, com várias inseguranças e medo de não passar a mensagem, de achar que era radical demais até perceber que ele não estava sendo radical e sim corajoso. Como artista, uma das suas principais inspirações é a rapper Karol Conka, na familiaridade de usar a arte para enfrentar e superar problemas como a depressão. Ao entrar neste assunto, Chico disse que evita falar sobre isso, mas que estava se sentindo à vontade com o coletivo e resolveu contar. Nesse ano (2017), ele se deparou com a depressão também. “Nesse processo doloroso, a música se transformou em um meio curativo”, afirma Chico. Ainda sobre a rapper, ele a acha uma influência maravilhosa por ela também não ter medo de ser a diferentona, enfrentando todas a críticas sobre o que ela faz não ser rap, sobre o fato dela ser


Fotos: coletivovuparles

primeiramente mulher e negra e por afirmar que beija homem e mulher. E, com tudo isso, é impossível não falar sobre todo o preconceito que ainda se vê hoje em dia. Chico é enfático: “Não é coisa da nossa cabeça, não é mimimi, ele existe e precisa ser combatido e não é uma coisa que só os LGBTs têm que se empoderar e se posicionar”. E é taxativo: “Não existe neutralidade em uma situação de preconceito, neutralidade é se posicionar a favor do opressor”. Para ele, se posicionar é fundamental, independentemente da raça, da identidade de gênero, da opção sexual. Não dá mais para ver uma atitude de preconceito e não fazer nada, no mínimo, como ele próprio disse, chegar e falar: “Ei, não foi legal o que você falou”. Para quem não sabe, Chico também tem um canal sobre a realidade da bixa Chico, como ele mesmo diz. Mas, a ideia é ter capítulos falando sobre depressão, sobre a relação com a mãe dele… Atualmente, tem um vídeo Diário de uma Bixa, para o lançamento da música B.I.X.A e também vídeo dele explicando o início da carreira, o clip da música Hora do Recreio e os looks que usa, afirmando ser a maioria emprestado ou de brechós, mostrando uma realidade que as pessoas não imaginam. Francisco, Chico, estudante, músico, compositor, artista, é um ser humano sem medo, com medo, mas ainda assim encarando e peitando todas as barreiras que encontra. Agora que encontrou a sua forma de protestar, não há ninguém que vá segurar!

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EDUCAÇÃO

A escola que vira castigo A cada 10 pessoas, pelo menos 4 já sofreram bullying no Brasil. Violência deixa sequelas nas vítimas Bárbara Benetti, Giselli D’Isep e Camila Gomes 3º período de Jornalismo

Bully significa valentão, brigão, alguém que ameaça, oprime ou intimida uma pessoa. Essa expressão esteve presente na vida de Jaqueline Moreira Airoso, 27 anos, na primeira metade dos anos 90. Ela sofreu por causa da cor de sua pele. Recebeu apelidos pejorativos e agressões físicas. “Eu era agredida por um garoto. Numa tentativa de pedir ajuda à mãe dele, inacreditavelmente, sofri violência da parte dela também”. Jaqueline tentou buscar o suporte da escola e foi ignorada por professores, que diziam que as agressões eram objeto de sua imaginação. Assim, durante todo o ensino fundamental, não recebeu nenhuma ajuda para lidar com a violência dos colegas. Segundo o Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística (IBGE), 68,1% dos alunos do último ano do ensino fundamental de Santa Catarina sofreram agressões físicas e morais de outros estudantes. Apelidos como “neguinha”, ”Bombril” e “Assolan” geraram consequências graves na saúde de Jaqueline. Ela desenvolveu doenças psicossomáticas, um processo de depressão e até tentou suicídio. A orientadora da escola Maria Rita Flor, em Bombinhas, Regina Mafra, explica que entre as dificuldades para combater o bullying estão o bloqueio dos alunos em falar sobre as ocorrências e a falta de percepção dos professores. Por isso, a escola não consegue combater o problema de forma eficiente. Matheus Brukiewa Rodrigues, 20 anos, nunca conversou com ninguém sobre esse assunto, nem mesmo com sua psicóloga. Apesar de tratar síndrome de pânico e ansiedade, nunca soube a causa deles. “Achava que falar era 10 vezes pior do que guardar para mim”. O motivo do bullying com Matheus era sua aparência e o fato de estudar com alunos bem mais velhos. Enquanto ele estava na quinta série, os mesmos colegas autores da violência tinham quase 15 anos. Ele sofreu agressões

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Arte: Patrick Cassimiro/Nova Escola

dos 11 aos 14 anos. Naquela época, o termo bullying não era discutido como hoje em dia – ouviu ele pela primeira vez quando estava na sétima série. A orientadora Regina trabalha há muitos anos na mesma escola e fala que após a expressão começar a ser discutida, apesar do diálogo e da postura profissional terem ajudado, as escolas do litoral sofrem um grande problema pela demanda de alunos. Como muitos se mudam atrás de melhores condições e outros vão embora, ela afirma que quando finalmente o aluno está encaminhado e fazendo laços, eles recebem outros, mas também perdem muitos. A desestrutura familiar é grande. Os alunos com mais problemas, segundo Regina, são os com pais “mandões”, que, com seu orgulho masculino, não escutam os filhos. “Nos ambientes familiares vira uma somatória de problemas e os filhos jogam tudo no subconsciente e daqui a pouco se revela em depressão, sofrimento e é por isso a dificuldade”. As ações adotadas pela escola estadual Maria Rita Flor para casos como esses são quatro e estão no Projeto Político e Pedagógico (PPP) da escola. São eles: saber da verdade da situação e conversar com os dois lados; se continuar, os pais dos alunos são chamado; se mesmo assim ainda persistir é solicitado um terceiro apoio; o professor que eles mais têm afinidade. Se for necessário, o caso é levado até a psicóloga do Conselho Tutelar e, com isso, receber auxílio para atendimento específico do serviço municipal de saúde. Segundo Regina, este processo é complexo pois a fila de espera é muito grande e são poucos psicólogos para uma procura muito grande. “O ideal seria cada escola ter um psicólogo, ser um cargo específico criado pelo governo” Em outra escola estadual de Bombinhas, Leopoldo José Guerreiro, os métodos para enfrentar os casos de bullying também se baseiam em conversas com os estudantes, advertências e reunião com pais. Porém, muitas das vezes não há necessidade de chamar os responsáveis. Na própria conversa com os alunos, conseguem solucionar os pro-


Arte: Patrick Cassimiro/Nova Escola

blemas. Nunca houve a necessidade de encaminhar casos para a Assistência Social do município. Já em Porto Belo, na Escola de Ensino Básico Tiradentes, a orientadora Ana Alzira dos Passos Neves relata nunca ter precisado acionar o Conselho Tutelar. Seus passos são resgatar no aluno o respeito que ele traz de casa. “Meu conhecimento como orientadora é que o respeito e a educação o aluno traz de casa, essa é a base, aqui ele vem aprimorar e relembrar esses conceitos”. E a atitude mais comum é a conversa. Raramente se chama os pais, só se o caso partir para violência física. Outro problema gerador de divergência entre as crianças e adolescentes da Costa Esmeralda, segundo a orientadora do Maria Rita Flor e a assessora de direção do Leopoldo José Guerreiro, Maria Cristina Spies Uhry, é a resistência inicial com pessoas “de fora” e de outros bairros. Essa realidade é consequência de rixas históricas que foram criadas entre os moradores de diferentes localidades da região.

Sequelas

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As consequências psicológicas do bullying vão muito além do tempo em que a pessoa sofre as agressões. As sequelas aparecem no decorrer da vida. A psicóloga Carolina Casagrande, 33 anos, trabalhou em casos de agressores e conta quais são as consequências tanto para eles quanto para as vítimas. Carolina afirma que as crianças que praticam o bullying tem perfis de vulnerabilidade social e sofrem algum tipo de agressão em casa. Por isso, praticam o mesmo na escola. Há adolescentes que chegam a virar menores infratores e até se envolverem com traficantes. “Quando encaminhado para o Conselho Tutelar, as medidas não são devidamente tomadas, por esse motivo eles continuam nessa situação e muitos acabam tendo esse desfecho de chegar a ser preso e outros até assassinados pelos próprios traficantes” Muitas vítimas, quando na vida adulta, sofrem de ansiedade, depressão, tentativa de suicídio e baixa autoestima. Por não conseguirem ter uma vida mais saudável, entram numa depressão mais profunda. Guilherme Melo, 18 anos, conta que as agressões foram as maiores causas de sua antissocialidade. “Não ter reação foi uma tortura psicológica por anos. Tentei conversar com meus pais sobre, mas impedi que minha mãe fizesse algo como conversar com o diretor, pois temia além da retaliação, rótulos como ‘cagueta’ ou ‘chorão’”.

Segundo Regina Mafra, muitos se acostumam com as agressões e aceitam o bullying. Ela presenciou um caso assim. O aluno sofria muito e aceitava, pois achava que ia ser para sempre daquela forma. “Ele também se colocava na posição de ‘ah se eu ficar contra tudo e todos eu não vou ter amigos’. Mas tudo isso vai ficando neles”. A psicóloga conta que há casos em tratamento na vida adulta, de pessoas que vivem depressões profundas, mas muitas vezes não conseguem reconhecer o motivo, e quando analisada a história escolar, identifica-se o bullying. Aceitar a violência como algo comum gera outros problemas. “Eles procuram pessoas que muitas vezes continuam a agredi-los em sua vida adulta, como os seus companheiros, porque ao mesmo tempo que uma pessoa viveu aquela agressão ela pensa que aquilo é algo comum na vida dela, que de repente ela não é merecedora de tudo que ela pensa”, explica a psicóloga. Na vida profissional, uma auto cobrança é gerada pela vítima do bullying, pois se sente inferior a seus colegas de trabalho. A baixa autoestima, e situações como a de não garantir seu próprio espaço em sua área, muitas vezes por não acreditar em seu potencial, faz com que muitos desistam de sua posição, e coloquem em risco seus futuros profissionais. ABRIL | 2018

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ARTESANATO

A expressão da alma Feiras de artesanato são boas oportunidades para valorizar e incentivar o trabalho dos artesãos Foto: Lídia Lobe

Lidia Sievers Lobe 5º período de Jornalismo

Quando se fala em arte é comum logo atribuirmos esta palavra para um viés mais “refinado”. Lembramos logo de artistas famosos, ou que até mesmo já morreram. Temos o costume de atribuir maior valor à arte que nos parece mais distante ao invés de valorizar e reconhecer o trabalho de quem está perto de nós. Muitos artesãos vivem exclusivamente do seu artesanato, e estes são os que mais precisam de reconhecimento e valorização. Apesar disso, muitas destas pessoas não possuem um bom incentivo, o que acaba por deixar que este belo trabalho passe despercebido por todos. As feiras de artesanato são boas oportunidades para valorizar e incentivar o trabalho dos artesãos. Na Univali, por exemplo, ocorre mensalmente a feira EcoSolidária, onde artesãos locais podem expor seus trabalhos. Em Blumenau, ocorre mensalmente a Feirinha da Servidão Wollstein, que ocupa as ruas Floriano Peixoto e Curt Hering e reúne pequenos empreendedores locais. Na rua XV de novembro, também em Blumenau, está localizada a Associação da Feira de Artes e Artesanato (Afeart), onde vários artesãos se reúnem para expor seus trabalhos em diversas bancas. A artesã Sueli Venturini, 66 anos, trabalha na Afeart há catorze anos. Ela confecciona toalhas bordadas com a técnica do ponto cruz. Segundo ela, esta é a arte com a qual ela mais se identifica, apesar de realizar outros tipos de artesanato. Sueli trabalha com artesanato desde 1985, quando realizava seus trabalhos junto a um clube de mães. Para Sueli, o artesanato é um trabalho prazeroso. “Para mim, representa uma coisa que eu gosto de fazer. Vale a pena também, sabe? Quando você gosta do que faz, vale a pena fazer o trabalho”, comenta. Também na Afeart, na banca ao lado, mãe e filha trabalham juntas. Neusa Rodrigues, de 66 anos, e Alessandra Vidal, de 39, confeccionam artigos para festas infantis. Neusa conta que o gosto por trabalhos manuais existe desde criança. Ela se formou em

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Artesã Sueli Venturini trabalha na confecção de toalhas bordadas com a técnica do ponto cruz

artes e tornou-se professora na área. Após sua aposentadoria, Neusa começou a se dedicar exclusivamente ao artesanato. A filha Alessandra já ajudava a mãe em casa e, quando Neusa decidiu trabalhar na feira, acabou indo junto. Além da feira, Neusa e Alessandra expõem seus trabalhos nas redes sociais e em grupos de aplicativos de mensagens. Fazer a arte com carinho, ver os trabalhos finalizado são fatores que as inspiram e trazem alegria. A satisfação do cliente é outro ponto de muita importância para o trabalho delas, é o que as deixa orgulhosas. “A gente tem orgulho daquilo que a gente faz, eles (os clientes) olham e ficam encantados, e a gente fica mais orgulhosa ainda”, relata Alessandra. Para elas, a maior dificuldade até então foi a crise. Por conta dela, o movimento na feira diminuiu consideravelmente e, mesmo com inovação e investimento, o trabalho acabava por não trazer o resultado esperado. Mesmo que hoje em dia a situação pareça melhor, elas se queixam da falta de investimento, incentivo e valorização deste trabalho. Apesar disso, elas

não desanimam e continuam que eu escolhi para a minha realizando o trabalho com vida”. muito amor de dedicação. “É Fabiana possui um estiuma coisa agradável de fazer, lo de vida totalmente ligado nós gostamos de estar aqui”. à natureza. Seu artesanato No Litoral Norte do esta- é, portanto, trabalhado com do, em Balneário Camboriú, a cores, pedras e cristais. “Ao artesã Fabiana Vieira, 50 anos, contrário do que todo mundo faz colares e acessórios à mão, pensa, que todo artesão tem utilizando pea vida fácil, não dras e cristais. precisa fazer Fabiana cursava nada, eu trapedagogia e era balho muito”, professora das comenta. Ela classes da pri- “Eu e o artesanato dedica cerca de meira à quarta cinco a oito hosomos uma série. Aos vinras por dia para te e cinco anos, coisa só, não tem realizar os arquando chegou tesanatos e, aos como separar em Balneário, fins de semana, ela conheceu os participa das a Fabiana do artesãos locais feiras e eventos. e se encantou No tempo livre, artesanato” com o estilo de ela busca o convida livre que tato com a natueles levavam, o reza, pois é de que a fez decionde vem a sua dir que jamais pisaria em uma inspiração. sala de aula de novo pois, seNo momento, Fabiana gundo ela, sempre foi contra possui um empreendimento o sistema e às regras, além de chamado Pedra da Terra, que não gostar de receber ordens. existe há um ano. Durante “Então, optei por essa filoso- vinte e três anos, ela trabafia de vida onde eu posso me lhou exclusivamente como sustentar de um trabalho que vendedora ambulante nas eu faço sem dar satisfação praias. Ela nunca fez trabapara os outros e sem depen- lho por atacado, pois acredita der de um patrão. Isso foi o que seu artesanato possui a

sua energia, e outras pessoas não saberão vender da mesma forma que ela ou explicar para o cliente a propriedade da pedra que está sendo adquirida. Portanto, seu trabalho é vendido apenas por ela ou pelo seu marido. Há dois anos, Fabiana ingressou para a economia solidária e desde então vem se dedicando a participar de feiras e eventos da região. Além disso, há cinco meses ela adquiriu uma Kombi chamada Jade. Ela e o marido planejam percorrer com a Jade todo o litoral brasileiro até o Maranhão, para expor seus artesanatos por diversos estados. O amor de Fabiana por sua arte, assim como o de todos os artesãos, fica evidente em cada palavra. “Eu e o artesanato somos uma coisa só, não tem como separar a Fabiana do artesanato, eu amo, eu faço com todo o amor do mundo”, comenta Fabiana. Para ela, a arte em geral representa vida, liberdade e expressão. Ela diz que quem se alimenta de arte possui uma maior sensibilidade para compreender o mundo. “É a expressão da alma, não tem nem explicação isso, é a minha vida”, conclui.


ESPORTE

Mulheres no tatame Lutadoras superam o preconceito e envolvimento feminino com as artes marciais só cresce Bianca Ávila Müller e Sarah Emilly Pereira 5º período de Jornalismo

O envolvimento das mulheres com as artes marciais começou há muito tempo atrás, no final do século XIX, em Londres, quando um grupo de mulheres inglesas protagonizou uma luta mundial pelo direito ao voto. Isso mesmo, as Suffragettes (sufragistas), como são popularmente conhecidas, foram as primeiras mulheres a se capacitar nas artes marciais, especificamente o jiu-jitsu. Incentivadas por Edith Garrud, uma grande personagem deste movimento, as inglesas conseguiram vencer uma guerra civil sem usar uma arma sequer, apenas com a força e determinação que elas obtinham, marcaram a história e conquistaram um direito primordial das mulheres. Atualmente, essa representatividade não vem se mostrando de forma diferente, as mulheres continuam a frequentar os tatames e, desta vez, uma nova conquista foi realizada: a luta contra o preconceito das mulheres que praticam artes marciais vem dando resultado. A estudante Natália Jacques Kappel, 22 anos, tem Síndrome de Down e pratica Jiu Jitsu há 9 meses. Além do Jiu Jitsu, Natália já fez aulas de Surfe e faz Pilates. A luta e os golpes que são ensinados nas aulas, a disciplina e os amigos são os principais motivos que fizeram a menina se cativar por esse esporte. “Não sinto preconceito por ser menina. Às vezes as pessoas se surpreendem, mas acham legal.”, relata Natália que diz se sentir feliz com a torcida das pessoas. Sem dúvida, o apoio da família é uma das grandes “chaves” para Natália se superar e desenvolver diversas atividades como os esportes. A mãe dela, a publicitária Marileisa Jacques Kappel, 59 anos, acredita que após o Jiu Jitsu sua filha desenvolveu ainda mais o sentido de grupo, responsabilidade com suas atividades e autoconfiança. As competições dessa arte marcial são separadas por idade, peso, faixa e gênero. Cada participante luta dentro de sua categoria estabelecida de acordo com os critérios. Atualmente, o Jiu Jitsu não é considerado um esporte Olímpico, a arte marcial ainda enfrenta muitas

dificuldades em se popularizar e projetar grandes atletas. É perceptível a carência que esse esporte tem em ser representado nos grandes meios de comunicação, principalmente quando ele está relacionado à mulheres. O professor faixa preta de Jiu Jitsu, Jonas Avelino de Lima Thor, 32 anos, tem sua própria academia desde fevereiro de 2017, local em que oferece aulas de Jiu Jitsu, Muay Thai, Capoeira, Boxe, Boxe Chinês e Funcional. O intuito de sua academia é atender às famílias sem distinções, mantendo, hoje, um número de 28 mulheres praticando Jiu Jitsu. Os homens ainda são maioria, mas, para ele, não há preconceito e o número de mulheres que praticam esses esportes é muito relevante. “As mulheres vem representando muito bem tanto no jiu-Jitsu como em qualquer outra modalidade. Nos campeonatos, se vê muitas mulheres competindo e levando medalhas de ouro.” Esse é o relato da lutadora de Jiu Jitsu faixa Branca 3 grau, Aline de Oliveira. Com 26 anos, Aline é empresária e pratica o esporte há dois anos.

Foto: Luiz Antônio Kappel

Natália (à direita) foi segunda colocada no Campeonato Brasileiro de Jiu-Jitsu Kids que aconteceu em Balneário Camboriú

As artes marciais tem como seus principais benefícios a boa saúde, melhora no condicionamento físico, defesa pessoal e muita disciplina, tanto para mulheres quanto para homens. Apaixonada pela arte marcial, a maior luta de Aline é a conciliação do esporte em sua vida, seus dois filhos e as diversidades do dia a dia. Ela já participou do Campeonato Mundial da Confederação Brasileira de Jiu-Jitsu Esportivo (CBJJE) conquistando medalha de prata, e o Campeonato Copa Stance, garantindo a medalha de bronze. Para Marileisa, sua filha é um orgulho, pois além do jiu jitsu já fez outras atividades que muitos não têm coragem, como voar de parapente e surfar. Natália surpreende com sua coragem e alegria de viver tudo que lhe é oferecido. “A Síndrome de Down é apenas um cromossomo a mais, ela é bem maior que isso”, declara Marileisa, que considera de suma importância o desafio, para que a filha se sinta estimulada a conquistar seus sonhos e brilhar como qualquer outra pessoa. Foto: Patrick Formosinho

Aline (à direita) é faixa branca em jiu jitsu e tem se destacado em competições regionais e nacionais da modalidade

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AUTISMO

Na onda da inclusão Professor de surf promove campeonato para autistas na praia central de Balneário Camboriú Artur Bezerra, Marlon Lopes, Huélita Bandeira e Greicy Krauspenhar 3º período de Jornalismo

O Transtorno do Espectro Autista (TEA) afeta 1 a cada 160 crianças no mundo, segundo dados da Organização Mundial da Saúde. No Brasil, existem cerca de 2 milhões de casos, e mesmo assim ainda existe muito preconceito sobre o assunto. Afetando diretamente o sistema nervoso, com desordens no desenvolvimento do cérebro antes, durante ou logo após o nascimento, o autismo é uma condição permanente. Os sintomas são os mais variados, como alteração na capacidade de comunicação, interação social e comportamento da criança.

Os meninos são os mais atin- absoluto – que é a capacidagidos, numa proporção de 4 de de perceber e dar nome a 5 vezes a mais do que me- a cada uma das notas que ninas. chega a seu ouvido. Somente A falta de conhecimen- uma em cada 10 mil pessoas to muitas vezes tem essa habitraz olhares lidade. preconceituoAté hoje sos sobre os aunão foi destistas. Em pou- Intenção do evento coberta cura co tempo de para o TEA, c o n v i v ê n c i a é proporcionar um mas existem percebe-se que tratamentos alsão pessoas dia bem diferente ternativos para amáveis, extremaximizar as e com novas mamente cahabilidades sorinhosas e em sensações para ciais e comumuitos casos nicativas da são superdotacriança, fazenos autistas dos em habilido uso de fisiodades visuais, terapia, terapia musicais, artes ocupacional, e matemática. de linguagem e Também podem ter alguma até mesmo a prática de esforma de sensibilidade sen- portes. sorial aguçada, em um ou Atividades recreativas, mais sentidos, desenvolven- como o campeonato de surf do por exemplo o ouvido realizado em Balneário Cam-

boriú/SC, têm promovido a conscientização e a melhoria da qualidade de vida de pessoas autistas e seus familiares. O idealizador da competição foi o professor de surf Tulio Ferri (36), que procurou a coordenadoria do AMA Litoral - Associação de Pais e Amigos do Autista – e levou a ideia das aulas para os pacientes que frequentam a instituição. A intenção do evento é proporcionar um dia bem diferente e com novas sensações para as crianças com autismo. “Eu queria que eles se sentissem em uma competição, superassem seus medos e fossem recompensados por isso, ganhando uma medalha de primeiro lugar”, conta o professor. Já na sua terceira edição, a cada ano o número de participantes aumenta. O campeonato de 2017 contou Fotos: Divulgação

Atividades recreativas promovem a melhora na qualidade de vida de pessoas autistas e seus familiares

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com 70 participantes, sendo 40 do Estado de Santa Catarina, e o restante do Paraná, Rio Grande do Sul e até de São Paulo. Os pais veem o evento como uma oportunidade de lazer e distração para a criança com autismo, e aproveitam a oportunidade já que atividades de inserção como essa são raras. Além do professor, voluntários também organizam o evento, junto com a Fundação de Esportes de Balneário Camboriú. “Nós temos muito a agradecer as pessoas que aparecem no dia do evento como voluntárias e se doam por horas, tornando esse um dia inesquecível para as crianças. Isso nos dá confiança para organizarmos várias atrações para deficientes físicos”, pontua Tulio. Catia Franzoi (48) é pedagoga com especialização em Educação Especial, presidente-fundadora e atualmente coordenadora administrativa da AMA Litoral. Como mãe de autista, ela percebe no cotidiano de seu filho os benefícios do surf, não só como forma de lazer, mas parte do tratamento para o desenvolvimento da comunicação e da interação social. Seu filho Lino Carlos Franzoi Jr (27) adora participar das aulas e principalmente dos festivais de surf junto com seus colegas, como ele mesmo diz. A mãe explica que apesar de terem sofrido com preconceito inúmeras vezes, a família lida bem com a situação e tenta sempre que possível levar informação às pessoas. Ela avalia que a sociedade tem lançado menos olhares de preconceito, e está mais interessada em saber como as pessoas com autismo agem no seu dia a dia. “Isso é maravilhoso, pois as oportunidades vão surgindo e a qualidade de vida dos nossos autistas só tende a melhorar”. A psicóloga Patrícia Duarte conhece o projeto e confirma o benefício do esporte para crianças com TEA. Não somente por ser uma atividade que auxilia na interação social, mas também por tirar o autista do isolamento de suas manias, já que esta atividade muda suas rotinas, mexe com a água, o movimento das ondas e do próprio corpo.


RESENHA

The Good Place Abordando a morte como tema, série se diferencia de outras comédias pela ousadia Foto: Divulgação

Mikael Melo 7º período de Jornalismo

Há realmente algo depois da morte? Muitas religiões tentam explicar esse processo que todos vamos passar um dia, mas não existe uma versão oficial e certeira. É nesse cenário que a série The Good Place ganha corpo. Logo em uma das primeiras cenas, inclusive, já é possível perceber que o roteiro não poupa piadas nem mesmo às ideologias religiosas. Esqueça tudo que você sabe sobre o tema, pois a comédia leva esse assunto para outro nível. Durante o primeiro ano, fomos inseridos em uma ambientação pós-morte divida entre o Lugar Bom e o Lugar Ruim. Olhando a nomenclatura dessa versão deturpada do céu e do inferno, fica fácil adivinhar qual o critério usado para destinar as pessoas. Aqui não há Deus nem o Diabo, mas sim re-

lações extremamente complexas e nada maniqueístas. Desde o primeiro segundo da nova temporada, os quatro personagens principais Eleanor Shellstrop (Kristen Bell), Chidi Anagonye (William Jackson Harper), Tahani Al-Jamil (Jameela Jamil) e Jason Mendoza (Manny Jacinto) passam a lidar com o plot twist avassalador que deixou todos os espectadores surpresos no final da primeira leva de episódios. O texto conduzido por Michael Schur (Parks and Recreation) é ousado e imprevisível como praticamente nenhum seriado de comédia consegue ser. Neste segundo ano, tivemos ainda mais certeza disso. As obras desse gênero, em sua maioria, não apresentam mudanças significativas na história, pelo menos não em curto prazo. As sitcoms costumam focar no potencial das piadas e não no desenvolvimento dos personagens, mas The Good Place

faz um bom balanço dessas características. As mudanças na história ganham maior velocidade ainda na segunda temporada, uma alegria para quem está acostumado com roteiros que levam os personagens do nada para lugar nenhum (não é mesmo The Walking Dead?). É preciso se acostumar e estar pronto para os próximos acontecidos. Esse roteiro primoroso não seria nada sem a presença de poderosos interpretes. Apesar de Kristen Bell e Ted Danson (Michael) serem os únicos rostos facilmente reconhecíveis, todos os atores do núcleo central incorporam com maestria as personalidades e trejeitos de cada personagem. Kristen, por exemplo, ficou famosa na TV com o seriado Veronica Mars (20042007), mas é com Eleanor que ela consegue demonstrar diferentes nuances de sua interpretação, indo da tristeza a felicidade com facilidade.

Se apegar a ela não é uma tarefa difícil, isso porque enquanto estava viva, Eleanor passava por situações que qualquer um de nós poderia lidar de forma igual. O seriado, muitas vezes, demonstra que a linha entre ser bom e mau é bastante tênue, o que a torna ainda mais crível. Até o momento, todo o processo da personagem foi deixar de ser anti-heroína para virar simplesmente uma heroína. Porém, como a produção insiste em afirmar, ser bom para ser recompensado é inútil, é realmente bondoso aquele que age sem nada em troca. Esse processo de amadurecimento é compartilhado por todos do grupo, inclusive os que não são humanos. Michael, excêntrico como sempre, nunca foi o mesmo depois de estudar ética com Chidi, mostrando cada vez mais afeto e empatia. É nos filósofos e sociólogos que a série se apoia para trabalhar as transformações dos personagens problemáticos.

Até mesmo Janet, um ser altamente inteligente que habita o vácuo, foi capaz de progredir e perder parte do tom robótico. D’Arcy Carden tem aqui o primeiro papel de destaque na carreira e já tem uma tarefa bem difícil, dar vida a uma personagem sem sentimentos, programada para fazer aquilo que os outros desejam. A qualidade da atuação da atriz é ainda mais perceptível quando temos a versão boa e a versão má de Janet em cena. Todas as piadas que envolvem a personagem são de longe as melhores. Depois de anos lutando para voltar a ter comédias de sucesso, a NBC finalmente encontrou um bom nicho com séries como The Good Place e Superstore. Além de conquistarem satisfatórios índices de audiência, ambas as tramas trouxeram um frescor para o gênero saturado com histórias de famílias ou amigos disfuncionais. ABRIL | 2018

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ENSAIO

Fotos: Monoculodigital

Dançando na cara da

REPRESSÃO Os movimentos necessários para superar o preconceito

COLETIVO FOTOGRÁFICO Acadêmicos: Beatriz Nunes, Bianca Ávila Müller, Sarah Emilly Pereira, Lilian da Silva e Dienifer Nunes

monoculodigitalblog.wordpress.com

A cultura do hip-hop chegou no Brasil na década de 80. Nessa época, ainda não existiam no país movimentos que retratassem o significado dessa cultura trazida dos guetos da América do Norte. Derivado da música negra norte-americana e inteiramente importada, essa cultura chegou no Brasil e tomou força nas periferias das cidades, criando forma como um movimento de resistência, sendo renegado e discriminado por muitos até determinado tempo. Por volta dos anos 2000, esse estilo de vida tomou força no país, se espalhando por diversos meios sociais, sendo inclusive adotado como representação de adoração em igrejas, que até então possuíam certo preconceito com a cultura Deve-se destacar as diferentes vertentes que o hip-hop possui, tendo como principais 4 subgrupos: DJing, o criador de sons para o RAP; B.Boying, representado pela dança (street-dance); MCing, representando o canto (com ou sem técnicas de improviso); e Writing, representando a arte plástica, expressão gráfica nas paredes utilizando o spray (grafiteiros). No Brasil, registros históricos evidenciam o aparecimento e fortalecimento do

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street-dance, ou popularmente conhecido como dança de rua, por volta do ano de 1991 na cidade de Santos-SP, através do coreógrafo Marcelo Cirino, também responsável pelo “abrasileiramento” dessa modalidade artística.

Presente no universo da dança há 15 anos, Amanda, 20 anos, já praticou diversos estilos de dança. Com apenas 5 anos de idade, a estudante de design já arriscava alguns passos no baby class. Depois, conheceu as danças de rua, gênero com

o qual ela mais se identificou. Amanda, chegou a tentar outros estilos, como ballet e jazz, mas seu grande amor sempre foram as danças contemporâneas. Por isso, escolheu esse estilo para se aprofundar. Atualmente, Amanda divide seu tempo entre os

estudos e as aulas que leciona em seu próprio estúdio, Union Dance Company, especializado em danças contemporâneas. Localizado em Itajaí o estúdio funciona há quase 3 anos, e já participou de diversos festivais de renome no Brasil, como o Festival Internacional de Hip hop (FIH2). Para Amanda, a presença da cultura da dança de rua na região do Vale do Itajaí é muito forte, principalmente em Itajaí, mas para ela ainda existe uma certa dificuldade no entendimento dessa cultura, principalmente na diferenciação dos termos hip-hop e danças urbanas. “Quando falamos hip-hop, não é apenas a dança, é uma cultura, ele engloba muita coisa. Tem os pilares do hip-hop, que é o RAP, que é a rima o MC, o DJ que também faz parte, o grafite que são artes plásticas, e tem o b boying que é a dança, o breaking. Tem outras coisas recentes também, como o beat box. Hoje em dia, o termo mais certo é danças urbanas”. A cultura do hip-hop não pertence apenas a um grupo étnico racial, a diversidade encontrada neste meio tem contribuído para o crescimento dessa cultura no país e no mundo. Deixando de ser vista apenas como música dos “guetos”.


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