Cobaia | #130 | 2014

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Cobaia

JORNAL LABORATÓRIO DO CURSO DE JORNALISMO DA UNIVALI Itajaí, julho/agosto de 2014 Edição 130 Distribuição gratuita

Reprodução Facebook

Muitos caminhos levam à cerveja

Edson Carvalho se aventura neles de Sul a Norte do Brasil

08 e 09

Comunidades

Cultura

Perfil

Quando ir à praia era chique!

A arte dos movimentos

Sentimento que transforma

Memórias de uma Cabeçudas que o tempo levou, mas permanecem na história

Trabalhando corpo e mente, grupo de dança mantém-se em Itajaí há mais de 17 anos

A trajetória do Frei que descobriu um novo amor e teve coragem para assumi-lo

Dois anos na Nova Zelândia em 7.889 caracteres

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Andrieli Maria Minatti

Arquivo Pessoal Millennium Cia de Dança

clubedosentasitajai.blogspot.com.br

Crônica

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Editorial

Conto

Outros prismas

A Garota do Violino Fernando Moraes

Jane Cardozo da Silveira* Encerramos o primeiro semestre falando em liberdade de criação e iniciamos o segundo publicando reportagens que fazem valer esse princípio. Nesta edição, a orientação do nosso grupo de professores, aliada à inspiração dos acadêmicos, rendeu reportagens criativas que nos estimulam a seguir na tarefa de produzir este jornal-laboratório. Produzidos principalmente para a disciplina Jornalismo Literário, os textos que ocupam nossas páginas revelam a preocupação dos autores com o detalhe, a minúcia, a descrição mais elaborada. Nascem de uma aproximação cuidadosa entre repórteres e personagens, estes postos no lugar de destaque que merecem. Afinal, ao compartilhar conosco suas histórias, nossos entrevistados expressam impressões, rememoram fatos, reveem momentos, confiam-nos parte preciosa das trajetórias que empreenderam. Sem medo de julgamentos ou reprovações. Exemplo de desprendimento e de confiança da fonte no bom jornalismo estampa-se no perfil de Marcos Jaboski, assinado pela acadêmica

...ao compartilhar conosco suas

histórias, nossos entrevistados expressam

impressões,

rememoram fatos, reveem momentos, confiam-nos parte preciosa das trajetórias que empreenderam

Andrieli Minatti. Marcos e a mulher dele, Mauren, desvelam aspectos de um relacionamento amoroso que nasceu proibido e, ao adotar essa postura aberta, ajudam a questionar normas e a quebrar preconceitos. Assim também o fazem outros protagonistas das próximas páginas. Eles respondem pelos mais variados nomes Manoel, Magda, Andrea - e desempenham diversificados papeis - um combate a pedofilia; a outra cultiva a arte; esta última exige respeito às mulheres. Têm os que ousam virar a mesa e largar tudo em nome de um sonho, como o mestre cervejeiro que é destaque em nossa capa. Assim, tão diferentes e tão iguais, eles formam, todos, um ‘bando’ de seres iluminados. Embora sem se conhecer, entoam a mesma sinfonia; dançam, cada um a sua maneira, a um mesmo ritmo. Não são famosos, nem costumam aparecer em páginas de jornal. E por isso é importante que estejam aqui, focalizados pelos nossos aprendizes, a quem incentivamos a buscar outros recortes, a olhar por outros prismas para o que chamamos de realidade. Boa leitura! Jane Cardozo da Silveira *Editora - Reg. Prof. SC 00187/JP

Fica esperto! 50 olhares sobre o conhecimento

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Espaço do Leitor Errata

Tem algum assunto que você gostaria de ler nas próximas edições? Conte-nos! E-mail: cobaia@univali.br

• Na edição 129, página 16, nos créditos das fotos, onde se lê Tayna Lentz, leia-se Thayna Lentz.

Expediente Banco de Imagens

Dentre as várias iniciativas em comemoração aos 50 anos de fundação da Univali, foi lançado o concurso “50 olhares sobre o conhecimento”. As inscrições estão abertas até 26 de setembro para a comunidade dos municípios nos quais a Universidade possui campi, além de alunos, professores, ex-alunos e funcionários. Cada participante pode concorrer com até três fotografias que retratem a vida cotidiana dentro da Univali. As fotografias terão como objeto, obrigatoriamente, a universidade, em qualquer de seus campi. A premiação, a ser entregue em outubro, é de R$ 2.000,00 para o primeiro colocado, R$ 1.000,00 para o segundo e R$ 500,00 para o terceiro. Além das três primeiras colocações, as imagens mais bem avaliadas farão parte de uma exposição permanente que será fixada no muro externo do Campus Itajaí. O concurso faz parte da programação do 10º Festival Cultural Univali, que oferece atrações culturais e artísticas entre 9 e 26 de setembro. Para o concurso fotográfico, as imagens devem ser remetidas exclusivamente pela internet, no endereço www.univali. br/festivalcultural, mesmo endereço do regulamento completo do concurso.

“Encontrado corpo da menina...” Todos os dias foram assim. Quando passava em frente daquela casa, o garoto ouvia o som do violino tocando Dust In The Wind. Da rua, ele observava a janela lá no alto, pensando, quem poderia estar tocando aquela música? No dia seguinte, foi surpreendido por uma garota admirando o belo dia de sol – cabelos longos, escuros e trançados. Ela até lhe acenou, um pouco tímida, quando passou. Como é linda, sussurrou, mas seus olhos pareciam tristes – Poeira no Vento, ele se lembrou da música que ouviu outro dia. Chegou em casa empolgado, só pelo fato de ver a garota. Sua mãe lhe perguntou o que o fazia chegar tão contente – e ela sabia que não era o colégio. No terceiro dia, saiu correndo ao bater do sinal para ouvir a garota tocar o violino. Sentou-se na calçada do outro lado da rua, sob a sombra de uma árvore. Ficou lá por um bom tempo. No quinto dia, estava decidido em chamá-la para conversar, nem que fosse para perguntar seu nome, e contar para todos os amigos do colégio que conhecera uma linda garota que tocava violino. O dia nasceu claro, mas, no fim da manhã, nuvens cinzas o escureceram. O violino não estava sendo tocado, então, para chamar a atenção, catou uma pedra e a jogou próximo da janela. Uma mulher apareceu assustada e olhou firme em sua direção. - O que você quer? Ele pensou em correr, mas havia aprendido a não fugir de uma encrenca. - Quero falar com a garota, ela é sua filha? Minutos depois, a mulher surgiu andando até o portão, para tirar satisfações. - O que você quer aqui, rapazinho? - Queria conversar com a sua filha, gosto de ouvi-la tocar o violino. - Isso é alguma brincadeira? Seus pais não lhe ensinaram a não fazer esse tipo de coisa? O garoto olhou de relance para a janela, sem entender o que estava acontecendo. - Olhe aqui... faz uma semana que perdi minha filha, então vá embora antes que eu chame seus pais. O jovem saiu correndo, até chegar em casa. Ofegante, passou pela cozinha e sem dizer nada subiu para o quarto, ligou o computador e fez uma busca na internet, até achar algo que o deixou pálido. Ele viu a foto e leu a notícia.

JORNAL LABORATÓRIO DO CURSO DE JORNALISMO DA UNIVALI IN - Agência Integrada de Comunicação Itajaí, novembro e dezembro de 2013. Distribuição gratuita EDIÇÃO Jane Cardozo da Silveira Reg. Prof. SC 00187/JP PROJETO GRÁFICO Raquel Cruz DIAGRAMAÇÃO Estagiária Bárbara Porto Marcelino TIRAGEM 2 mil exemplares DISTRIBUIÇÃO Nacional

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Itajaí, julho/agosto de 2014


Crônica

Da Califórnia à Suíça A misteriosa Nova Zelândia na visão de quem sonhou com um país de contrastes e cenários perfeitos Luciano Pinheiro da Silva Neto

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sobe e desce do trajeto que o táxi percorria entre o aeroporto de Auckland até o bairro de Browns Bay, na costa norte da cidade, acentuava o mal estar de quem acabara de passar treze horas sobrevoando o Oceano Pacífico em um avião sucateado da Aerolíneas Argentinas. O fato de estar sentado no banco esquerdo do carro que, no Brasil, é o do motorista, me dava a sensação de que eu devia ajudar o taxista a dirigir. Era o primeiro grande voo da minha vida e, de fato, só a obstinação por estar naquele país, que há tanto tempo sonhava em conhecer, me deu forças para suportar a viagem em que cada minuto me passava como horas. Ao pôr os pés fora do táxi, já na casa da família neozelandesa que me esperava, senti que, de fato, o sonho estava consumado. Eu acabava de alcançar, naquele momento, o lugar que já me fizera duvidar de sua existência devido à perfeição que tantos lhe atribuíam: eu estava, enfim, na misteriosa Nova Zelândia. E os choques começaram desde os primeiros minutos. Ao perceber a palidez e o desconforto com que eu havia chegado, a dona da casa me ofereceu algo que pôs toda a segurança de quem supostamente dominava a língua inglesa em xeque. A pergunta era simples: “Would you like some water?”. A oferta de água seria compreendida por qualquer iniciante do idioma se a pronúncia da última palavra não tivesse sido “distorcida” de “uórêr”, como eu conhecia, para “uóta”. Foram alguns segundos de intensa atividade mental até que eu consegui associar a pronúncia típica kiwi - como os neozelandeses gostam de ser chamados

– com a norte-americana a qual meus ouvidos hollywoodianos estavam acostumados. O dia seguinte me fez atentar para um fato que eu, em tese, tinha me preparado para enfrentar: ao cruzar o Pacífico num voo que saiu de Buenos Aires com destino a Auckland, eu cruzei a linha internacional da data e, portanto, um dia fora engolido da minha história. Decolei de solo argentino numa sexta-feira e, após treze horas no avião, aterrissei num domingo. Estava, assim, quinze horas na frente do Brasil, no primeiro fuso horário do mundo. Ao chegar à primeira aula e relatar que havia chegado do Brasil no dia anterior e, por isso, estava desconcertado pelo fuso, a professora, uma senhora kiwi de semblante tipicamente inglês, me contou que um de seus alunos havia passado pela mesma experiência. Isso lhe fizera sentir como se seu corpo estivesse na Nova Zelândia enquanto sua mente tivesse permanecido no país de origem. Bom, era exatamente assim que eu me sentia. Na parte da tarde daquele segundo dia, eu decidi que precisava ver de perto tudo que eu há tanto tempo contemplava pelas fotos: peguei um ônibus por 5,70 dólares - o motorista pergunta qual seu destino e assim calcula a passagem – para o centro de Auckland, a maior cidade neozelandesa com cerca de um milhão de habitantes. Desci bem próximo da rua principal, a Queen Street, e lá me senti, pela primeira vez, como um ser interplanetário. Comecei a caminhar timidamente no meio daquela multidão em que sobressaíam chineses, muçulmanos e indianos. Uma mistura sonora de muitos idiomas se somava em meus ouvidos. Como qualquer es-

trangeiro em sua primeira vez no exterior, tudo o que não queria era chamar a atenção de ninguém. As lojas, cafés, prédios, enchiam-me os olhos pela beleza, organização e opulência. O sistema de transporte era, como havia ouvido, de fato, perfeito. Uma linha gratuita circulava pelo centro para mostrar a cidade aos turistas. Em cada esquina, se acumulavam artistas de rua de diversas nacionalidades que ganhavam moedas das pessoas que caminhavam a passos apressados ao local de trabalho. O esporte e paixão nacional, Rugby, fazia-se presente na maioria das lojas com acessórios estilizados com a marca do All Blacks, a seleção do país. A poucos passos do centro, estava a Sky Tower, a torre mais alta do hemisfério sul, na qual pagam-se 25 dólares para se chegar ao topo e, de lá, vislumbrar a cidade em 360 graus. Auckland era, sem dúvidas, deslumbrante. Mas tinha um problema: não era a cidade dos Kiwis. Era a terra de estrangeiros, em sua maioria, asiáticos. E eu que queria conhecer o real kiwi lifestyle resolvi começar a viajar pelo país para mergulhar na cultura local. Há 415 quilômetros de Auckland, no nordeste da ilha norte, está a paradisíaca e quase tropical Hawkes Bay. A principal cidade da região é Napier, cuja arquitetura ao melhor estilo inglês encanta os visitantes. A rua principal fica bem à beira-mar, onde se percebe claramente pela infraestrutura que se está no primeiro mundo. A praia é ocupada por parques infantis, que além de gratuitos, surpreendem pela organização e manutenção impecáveis. Em volta, há jardins cinematográficos que parecem ter sido tirados de um frame de Hollywood e se mate-

rializado na frente dos olhos como uma ilusão. A água do mar remete a praias californianas e devido à superpopulação de tubarões não se permitem banhistas. De dezembro a março, verão no país, as temperaturas giram em torno dos 32 graus, o que se torna um convite irrecusável para se afastar do centro da cidade e banhar-se nas praias de águas limpas e próprias para mergulho de Hawkes Bay. À toda essa beleza, adicione uma estrutura especialmente pensada para atender os visitantes. A região deve assim figurar no topo da lista de lugares a se conhecer fora do Brasil. Após um ano no país, chegou-me a hora de atravessar para a ilha Sul da Nova Zelândia. O percurso só pode ser feito de carro por um dos dois ferry-boats que ligam as duas ilhas. A passagem custa em torno de 90 dólares e a viagem dura três horas e meia. O trajeto vale a pena pelas paisagens intocadas que se contemplam durante a travessia. Aportando-se em Picton, berço de entrada na ilha sul, e seguindo 130 quilômetros em sentido oeste, chega-se ao Parque Nacional Abel Tasman. O lugar é como uma pequena vila que abriga apenas turistas e os trabalhadores de restaurantes e hospedagens que os servem. É, portanto, um lugar pronto para ser desbravado com morosidade. As principais paisagens só podem ser apreciadas depois de uma trilha de duas horas e meia a pé. Após a caminhada, desprovido de fôlego, pude avistar praias desertas cobertas por uma fina camada de areia branca na frente de um mar cujo tom, dependendo da distância que se olha e dos raios do sol, vão do transparente a um

verde clarinho. As placas convidam a aproveitar a paisagem sem moderação, o que é levado à risca pelas europeias que se sentem à vontade para fazer top-less tal qual estivessem no velho mundo. Seguindo para a região mais austral da ilha Sul, chega-se a Queenstown, a chamada Meca dos esportes radicais. A cidade, com ares suíços, tem oito mil quilômetros quadrados e concentra neste espaço geográfico toda sorte de aventuras esportivas como o skydive, bungee-jump, snowboard, mergulho, entre outros. Por atrair aventureiros do mundo inteiro, tudo na cidade é mais caro que nas outras regiões, portanto, é bom manter a mão no bolso ao chegar lá. Outra atração que não se pode deixar de lado são os bondinhos que, por 21 dólares, levam os turistas ao alto de um morro coberto de neve, de onde se contempla uma visão panorâmica de Queenstown, incluindo o Lago Wakatipu cuja água azul turquesa é considerada mais limpa que a engarrafada. Depois de dois anos na Nova Zelândia, cheguei à conclusão de que o país é, apesar dos problemas, realmente encantador. Quem se propuser a permanecer um tempo mais longo e desenvolver atividades além do turismo ou estudos por lá, é bom saber que o país também tem entraves típicos de nações em que muitos estrangeiros tentam se estabelecer. A orientação principal é que se faça uma pesquisa profunda antes de fazer as malas para que, quando pisar em solo kiwi, se possa aproveitar ao máximo um lugar em que, se eu não tivesse morado tanto tempo, continuaria a achar que só existia nas ficções hollywoodianas de Senhor dos Anéis e Hobbit.

Fotos: Banco de Imagens

Na Queen Street acontecem vários eventos políticos, culturais e desportivos

Itajaí, julho/agosto de 2014

O Wakatipu é conhecido por ser o lago mais extenso da Nova Zelândia Cobaia

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Saúde

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As cirurgias cardiovasculares e seus avanços Como a medicina trata de um dos órgãos mais importantes do corpo humano Aline Gabrielle Pukall, Bárbara Werner, Mayara Wergenes e Pricila Baade

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do sangue do paciente para um coração-pulmão artificial. O coração então ficou vazio e foi possível pará-lo e reparar o defeito que o órgão tinha. Este fato foi o que permitiu o grande desenvolvimento das cirurgias cardiovasculares. Estudos afirmam que no início, muitas cirurgias cardiovasculares foram feitas experimentalmente. Em um dos exemplos de experiências cirúrgicas pioneiras, conectava-se a criança que seria operada com a circulação da mãe, através de tubos, mas era cirurgia de alta mortalidade e em muitos casos perdia-se o paciente e a mãe. Outra técnica utilizada foi o congelamento da circulação, em que anestesiavam e esfriavam a temperatura corporal ao máximo até que a circulação parasse, reparavam o defeito do coração e reaqueciam o paciente.

Diminuição dos riscos Os avanços que ocorreram nos recursos para a execução das cirurgias do coração permitiram que o risco para os pacientes diminuísse consideravelmente. “Com a evolução da medicina e com medicações mais adequadas, atualmente apenas pacientes mais graves têm indicação de cirurgia e desta maneira as técnicas foram aprimoradas para atender casos mais complicados, com muitas doenças associadas e idade avançada”, explica o cirurgião cardiovascular Décio Abuchaim. Ainda segundo o cirurgião Abuchaim, os avanços tecnológicos permitiram que cirurgiões cardiovasculares contem com exames laboratoriais mais precisos, como a ressonância magnética de coração, em que lesões pequenas são identificadas sem uso de radiação ou contraste, trazendo maior segurança ao paciente. Atualmente as cirurgias são muito precisas. Para se implantar uma ponte de safena, por exemplo, utilizamse fios mais finos que um fio de cabelo. As próteses artificiais têm durabilidade e estoque ilimitado para substituir uma válvula cardíaca defeituosa. Nas cirurgias congênitas, feitas em recém nascidos, são utilizados circuitos em miniatura e materiais especiais. Com os avanços, a medicina conta com marca-passos “inteligentes” que permitem a recuperação da força do coração e tratam arritmias graves e podem até identificar um infarto. Outra novidade na técnica

cirúrgica cardiovascular são as incisões pequenas que diminuem a aparente cicatriz, ou seja, em vez de uma incisão de 20 centímetros, é feita uma incisão pequena, de quatro a seis centímetros. “A cirurgia é um pouco mais longa e não serve para tudo, então tem que haver certo cuidado. No mundo ainda a cirurgia chamada clássica tem uma posição muito firme, porque o risco é muito baixo e o resultado é muito consistente em longo prazo”, afirma o médico Faraco. O cirurgião Djalma Faraco atua há 37 anos na área de cirurgia cardiovascular e afirma que quando começou nunca imaginou que o nível de segurança deste tipo de cirurgia seria equivalente ao de qualquer outra. “Quando se iniciaram as cirurgias de coração, nos anos 50 e 60, havia risco de o equipamento trazer grande dano e quebrar no meio da cirurgia, recentemente isso é mínimo. O risco do método é bem pequeno. Nos casos convencionais, em que o paciente vem andando ao consultório, marca a cirurgia de maneira eletiva e não tem outras doenças, o risco da operação dar errado é próximo a 1%”. De acordo com o cirurgião Décio Abuchaim, com os avanços, os riscos são menores, porém a população atendida está ficando mais velha e com muitas doenças associadas. “A tecnologia compensa até certo ponto. Cada pessoa tem que ser avaliada individualmente, não existe um modelo padrão, mas algumas avaliações feitas no consultório para verificar o nível de risco podem ajudar”. O risco é proveniente da doença de que o paciente é portador e não do método em si, complementa Faraco. Ele ressalva que existem segmentos da cirurgia cardiovascular que precisam melhorar. Tanto as operações feitas em recém nascidos como em ido-

sos precisam de evolução. “Já estão progredindo, mas sempre têm que evoluir mais”.

Tecnologia para ensino

Para tornar-se um cirurgião cardiovascular é preciso primeiro formar-se em medicina, depois como cirurgião geral, para em seguida fazer uma especialização em cirurgia cardíaca, que engloba todas as intervenções cirúrgicas. “Porém já temos uma separação entre as especializações para cirurgias em bebês, chamada cirurgia cardíaca congênita e as cirurgias em pessoas acima de 90 anos. Existe principalmente na área infantil uma grande especialização, porque hoje se operam recém nascidos com menos de um quilo e inicia-se também o trabalho de cirurgia intraútero, que é quando o bebê ainda está no ventre da mãe”, afirma Djalma Faraco. Faraco, que já foi professor na Universidade Federal do Paraná, conta que na especialização em cirurgia cardiovascular, sempre se trabalha num sistema de mestre-aprendiz, que é a transmissão direta de conhecimento. “Hoje, porém, os recursos são muito grandes, porque existem laboratórios e simuladores, que ajudam na hora de ensinar aos cirurgiões os métodos.” Para o médico Décio Abuchaim, no atual aprendizado de médicos recém formados que fazem especialização em cirurgia cardiovascular, a utilização de robôs pode ajudar na realização de procedimentos menos complexos. “Os ensinamentos de procedimentos cirúrgicos mudaram muito, e é preciso participar sempre de congressos e atualizações, para melhorar o sistema de cirurgias do coração”, conclui o médico. O cirurgião Djalma Faraco afirma que o ensino da medicina não está ideal, por questões sociais e que é preciso haver uma reforma no ensino das especializações de cirurgia car-

diovascular “Não é necessário que um cirurgião perca doentes para ele aprender a operar, existem centros de treinamento, mas eles precisam ser qualificados”.

Cirurgias feitas há séculos Salas esterilizadas, equipamentos de última geração, médicos com anos de estudos e experiência na área, anestesia, cuidados e precauções. Nada disso fazia parte das cirurgias até metade do século XIX. Na Idade Média, na maioria das vezes, os responsáveis pelas cirurgias eram os monges, afirma a historiadora Elena Shizuno, já que estes eram os únicos que tinham acesso à literatura sobre medicina. Mas, após muitos erros trágicos, em 1215 o Papa proibiu que eles fizessem esse trabalho. Então, os fazendeiros decidiram realizar algumas cirurgias já que tinham experiência com o tratamento dos animais. Neste período, foram realizadas operações de bexiga, catarata e hemorroida, mesmo sem anestesia. Ainda que alguns casos obtivessem sucesso, muitos pacientes morriam em decorrência de infecções geradas pela falta de higienização. Segundo uma pesquisa realizada pelo jornalista da BBC, Richard Hollingham, uma das cirurgias mais perigosas já feitas foi a chamada “Circulação Cruzada”: a técnica tinha como objetivo fazer operações cardíacas. Para que o órgão lesionado pudesse ser tratado sem que a circulação no paciente fosse interrompida, o médico americano Walton Lilehei conectava as veias do paciente no coração de outra pessoa saudável. Mas, apesar de parecer loucura, esta e outras técnicas eram adotadas em último caso, não eram consideradas parte de um tratamento como atualmente, mas sim a única esperança de um paciente já fadado à morte. Banco de Imagens

ma dor no peito sentida por Horst Baumgarten foi o sinal de um infarto que o levou a fazer uma cirurgia de urgência, em 1995, para desentupir a artéria do coração. O mesmo aconteceu com Mailde de Souza Silva, que já passou por três cirurgias cardiovasculares, e há algum tempo voltou ao médico com a mesma dor que Horst sentiu. Em 2005, Baumgarten teve que retornar à sala cirúrgica para desentupir a mesma artéria que antes o levou ao infarto, hoje ele vive com cateter no coração. Fonte: IMCC Cardio Inicialmente foi necessária a implantação de uma válvula biológica em Mailde, a mais recomendada a pacientes jovens. Porém, a válvula apresentava algumas desvantagens, como a curta durabilidade. Aos 39 anos, Mailde passou por outro processo cirúrgico, desta vez para realizar a troca da válvula mitral biológica por uma mecânica. Esta, já mais moderna, não precisa de substituição, porém gerava risco de formação de coágulos. Foi o que aconteceu dez anos após a implantação, quando Mailde teve que se submeter novamente a um procedimento cirúrgico, desta vez para a retirada do coágulo. Tanto Mailde de Souza Silva quanto Horst Baumgarten foram submetidos a cirurgias cardiovasculares. Este tipo de intervenção cirúrgica é considerado uma das atividades médicas mais recentes da história. De acordo com o Presidente da Sociedade Sul-Brasileira e Catarinense de Cirurgia Cardíaca, o médico Djalma Luiz Faraco, por muitos anos, o coração foi considerado um órgão intocável. Em 1881, o médico austríaco Theodor Billroth, pioneiro da cirurgia abdominal, declarou que mexer no coração significava um ato de futilidade e que o cirurgião que fizesse isso deveria perder o respeito dos seus colegas. Segundo o cirurgião cardiovascular Faraco, o avanço das cirurgias do coração sempre dependeu totalmente de tecnologia. Foi preciso esperar o desenvolvimento de plásticos, metais e da Física. Além disso, sempre foi necessário ter um coração-pulmão artificial, um equipamento eletromecânico que consegue promover uma circulação sanguínea extracorpórea, que permite paralisar o coração do paciente e corrigir a falha do órgão enquanto o equipamento substitui sua função. Em maio de 1953 se fez a primeira cirurgia com desvio

Valva mitral – impede o retorno do sangue oxigenado vindo do pulmão Cobaia

Itajaí, julho/agosto de 2014


Comportamento

Meu corpo não é público Vivemos uma era em que ainda prevalecem ideias e comportamentos hostis em relação às mulheres Adrielle Demarchi e Bruna Hasckel

Nossa… princesa!”, ‘‘Gostosa!’’, “Que é isso!”, “Vem cá, novinha!”, “Se eu te pego…”, “Te lambia toda”. Se você for mulher, provavelmente já ouviu algumas dessas cantadas na rua. O assédio muitas vezes só é considerado algo grave quando se torna físico, mas poucos sabem que o assédio verbal tem muito mais poder do que aparenta. O assédio não tem idade, classe social e muito menos cor, tanto para a vítima quanto para o criminoso. Ainda mais quando uma agressão verbal vem acompanhada de toques físicos, e acaba se tornando um “terrorismo sexual”. As mulheres ainda se sentem agredidas e com medo do que pode acontecer em uma simples ida até a padaria. Segundo uma pesquisa realizada pelo blog Think Olga, 83% das mulheres afirmaram não gostar de ouvir cantadas e 81% já deixaram de ir a algum lugar com medo do assédio. E em uma sociedade onde as mulheres já tiveram várias conquistas, 90% delas já trocaram de roupa com medo do assédio nas ruas. Andréa Benetti, pedagoga do sul de Minas, educadora sexual com adolescentes, e moderadora da página “Moça, você é Machista”, no Facebook , sabe do que estamos falando. “Eu passei e acredito que a grande maioria das

mulheres tenha passado. Já tomei passada de mão na rua, meninos com os quais estava ficando já tentaram me forçar a fazer sexo sem que eu tivesse intenção naquele momento. Sofro agressões por trabalhar com consciência de liberdade sexual todos os dias, pessoas entram aqui e nos chamam de vadias, putas enrustidas, isso é muito comum...Acho que o interesse em outra pessoa não é confundido com assédio pelo simples fato de que o assédio é uma invasão, um desrespeito ao corpo ou ao espaço do outro, ainda que um assédio falado... As cantadas de rua, por exemplo, são assédios e não elogios e eu sempre cito que há “cantadas” que reproduzem fortemente nossa cultura do estupro. Por exemplo: “Se eu te pego, eu te arrebento”... isso é de violência de gênero... ou então: “Cavala”... são apenas exemplos do que alguns homens se acham no direito de nos dizer nas ruas e, não, ninguém tem direito de dizer palavras de cunho sexual para alguém desconhecido na rua, sem estar certo de que o interesse é recíproco. A meu ver, a sociedade está acordando agora para o assédio à medida que aumenta o direito das mulheres pela autonomia e liberdade sobre seus próprios corpos... isso sem dúvida é um processo de educação social, re-

alizado também pelas páginas de internet...”. Não é difícil perceber em uma conversa com mulheres de diferentes idades que todas haviam passado pelo menos uma vez por uma ocasião de assédio, agressão ou estupro.Para muitas mulheres, ainda é um exagero considerar uma simples abordagem nas ruas com o princípio da chamada “cultura do estupro”. Não há cartilha inventada sobre como as mulheres devem se comportar para serem consideradas exemplos? Se ela sente-se à vontade usando uma saia mais curta já se diz que provavelmente ela “saiu para caçar” ou que ela “não se dá ao respeito”. As pesquisas do Think Olga mostram que as mulheres do século XXI ainda acreditam que o seu comportamento pode ocasionar um assédio ou estupro. Em vários depoimentos de mulheres para a pesquisa, muitas afirmaram que, depois do crime, autoridades e até mesmo membros da família acabaram criticando a vítima, afirmando que o seu comportamento incitou ao crime. Assim como a advogada britânica Barbara Hewson, defensora dos direitos civis e humanos afirmou ao Daily Mail que muitas se colocam propensas a tornarem-se vítimas. Barbara ainda disse que “a vítima não é totalmente inocente e o vitimizador não é totalmente culpado”.

Mas se a solução para este problema fosse esconder as mulheres e seus corpos, não teríamos um número alto de estupros em culturas como a muçulmana, em que as mulheres se escondem por trás de véus. Em março deste ano, um tribunal de Dubai condenou à prisão uma norueguesa de 24 anos que afirmou ter sido estuprada no país. A jovem foi condenada a 16 meses de reclusão por ingerir bebida alcoólica, fazer sexo fora do casamento e atentar contra a decência. Depois da pressão feita pelo governo norueguês e pelas redes sociais, o governo de Dubai pediu perdão à jovem. No Brasil, em 2009, uma nova lei retirou o crime de estupro da seção de crime contra os costumes, para enquadrá-lo nos crimes contra a liberdade sexual. O crime de estupro também foi alterado de forma a reconhecer que se trata de uma relação de poder, inclusive considerando que tanto mulheres quanto homens podem ser vítimas de estupro. Existem mais de 80 projetos de leis e dispositivos de proteção trabalhista em elaboração sobre assédio moral. Já na visão da psicóloga formada pela Univali, TaisaTrombetta Demarco, professora na Unoesc e especialista em assédio moral, “o assédio pode ocorrer tanto na estrutura familiar, como nas escolas e no trabalho. É tão antigo quanto

o próprio trabalho, mas somente na década de 1990 é que foi identificado como fenômeno destruidor do ambiente. Diminui a produtividade e favorece a ausência, devido aos desgastes psicológicos que provoca. Não existe uma única definição para assédio moral entre os profissionais, pois esse fenômeno pode ser abordado de muitas maneiras dentre as várias áreas profissionais e as diferentes culturas”. Tendo lançado recentemente um livro abordando o assunto, chamado “ Características do Assédio Moral”, a autora reforça que é relevante as pessoas buscarem respostas a este problema preocupante e verificarem características do assédio moral em locais de trabalho e nas ruas. O assédio é tão poderoso que pode acabar produzindo consequência para a própria saúde, pois além de se sentir culpada pelo ocorrido, a vítima também vai perdendo a motivação de viver e passa a se tornar muito mais ansiosa e insegura, perdendo parte de sua autoestima, assim desencadeando o que se pode chamar, nas próximas décadas, de “mal-estar da globalização”, segundo a Organização Internacional do Trabalho (OIT) e a Organização Mundial da Saúde (OMS).

Os múltiplos olhares da Educação Inclusiva Professora, fonoaudióloga, colega de turma e mãe apresentam seus olhares a respeito da educação inclusiva Natália Rocha

H

á 10 anos a inclusão escolar vem se tornando realidade, e a cada dia novos desafios são propostos e superados para que todos tenham direito à educação. Palavras como “defeituoso”, “estranho” e “incapaz” hoje soam terrivelmente preconceituosas quando alguém se refere a uma pessoa com necessidades especiais. Antigamente elas eram usadas sem nenhum problema em textos, revistas, e até mesmo em leis. Com o avanço dos estudos sobre as deficiências e como lidar com elas, chegou- se a uma nomenclatura aceita pela maioria, recomendada por especialistas e que passou a ser usada por órgãos governamentais: o termo é “pessoa com deficiência”. Introduzir essas pessoas no ambiente escolar ainda crianças é lei. Se não cumprida, tanto por parte dos responsáveis, quanto por parte da escola, deve-se avisar o Conselho Tutelar e até, em último caso, o Ministério Público, pois a matrícula desses alunos é obrigatória. Com essa lei, é cada vez mais

comum as escolas receberem alunos com vários tipos de deficiência, e com eles vêm a necessidade de ter uma professora de atendimento educacional especializado (AEE). Para dar apoio a esse trabalho, existe a Secretaria de Educação Continuada, Alfabetização, Diversidade e Inclusão, que tem por objetivo apoiar a organização e a oferta desse tipo de atendimento. A experiência de 10 anos da professora Dalva Terezinha Rocha, formada em Pedagogia e pósgraduada em Educação Especial e Inclusão, que atualmente trabalha nos Núcleos de Educação Infantil Iate Clube e Anjo da Guarda, ambos em Balneário Camboriú (SC), mostra que a inclusão é feita da parceria entre o governo e as escolas, pois é dele que vem alguns dos materiais necessários para atender as crianças com deficiência. Um dos modos que a Secretaria que assiste esses profissionais encontrou para ajudá-los é o Programa Implantação de Salas de Recursos Multifuncionais. O Programa disponibiliza às esco-

Itajaí, julho/agosto de 2014

las municipais de ensino regular, equipamentos de informática, mobiliários, materiais pedagógicos e de acessibilidade para a organização do espaço de atendimento educacional especializado. “Esse atendimento é feito no contraturno escolar e atende cada aluno em sua especificidade”, explica a professora. Dalva esclarece que o trabalho da professora do AEE é feito em conjunto com a professora regente de sala de aula. Seu papel é orientar, dar suporte, mostrar o melhor caminho e estratégia para que os conteúdos trabalhados sejam os mesmos para a criança necessitada e que apenas os recursos mudem para melhor ensiná-la. Além das duas professoras, o suporte de um profissional da saúde também é extremamente importante. O seu olhar inclusivo, dentro da medicina, é fundamental para orientar os pais e alunos. A fonoaudióloga DelaineTravasso, que trabalha no CIEP Rodesindo Pavan, em Balneário Camboriú, conta que a sua atuação não é clínica dentro da escola, mas que não deixa de Cobaia

ser importante, pois ela monitora os alunos - tanto os com alguma dificuldade já identificada ou não -através de campanhas preventivas sobre a fala, audição, motricidade... Sua ocupação também está diretamente ligada com a professora do AEE, principalmente no atendimento às crianças com deficiência auditiva. Neste caso, a fonoaudióloga trata da oralização e leitura labial. O esforço de todos gera resultados. Gustavo Ribeiro Peper, de 3 anos, tem paralisia cerebral e sofre também de deficiência auditiva, ele é aluno de Dalva no NEI Anjo da Guarda. A professora conta com entusiasmo que ele interage muito bem com as outras crianças e já consegue ficar em pé sem a ajuda das professoras. “Além do conhecimento, tem que ter amor”, assinala Dalva. E é mesmo com amor e dedicação ao próximo que as barreiras são ultrapassadas. O aluno Natã de Moraes, do 9º ano do Centro Educacional Municipal Jardim Iate Clube, em Balneário Camboriú, estuda com Camila de Oliveira,

de 18 anos, que tem Síndrome de Down. Dentro de sala, ele conta que todos a auxiliam quando precisa e que Camila é vista como uma pessoa que tem dificuldades como qualquer outra. A mãe de Camila, Joziane de Oliveira Dominguez, confirma as palavras de Natã e diz ainda que a filha também tem o acompanhamento de uma professora de atendimento educacional especializado e que os conteúdos são adaptados às necessidades dela. Quando Camila era pequena, frequentou a APAE, a Associação de Pais e Amigos dos Excepcionais, dos 2 meses até os 3 anos de idade. Joziane lembra que lá recebeu todas as orientações para lidar com a filha. Um projeto de lei que tramita no Congresso Nacional pode fechar todas as APAES, isso porque em 2016 o governo federal pretende reduzir os recursos repassados à Associação. Quando se lembra de toda dificuldade que passou por ter um bebê Down, a mãe de Camila diz que torce para que isso não aconteça, pois uma criança nessas condições precisa do estímulo que é encontrado lá.

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Comunidade

O curso oferecido pelo Pronatec em parceria com o Senac proporciona oportunidades de emprego Gerusa Florencio

lunos são preparados para o mercado profissional da beleza no Centro de Treinamento Comunitário das Nações (CTC) em Balneário Camboriú, por meio do curso de Maquiador Profissional, oferecido gratuitamente pelo Programa Nacional de Acesso ao Ensino Técnico e Emprego (Pronatec), ministrado em parceria com o Serviço Nacional de Aprendizagem Comercial (Senac). O curso teve início no dia 27 de fevereiro, uma semana após o término das inscrições para o Pronatec, e seguirá até o dia 15 de outubro. As aulas são ministradas todas as terças e quintas no período vespertino, no CTC. A carga horária corresponde a 180 horas/aula. No total, 10 alunos estão obtendo conhecimento profissional na área e receberão certificado para trabalhar no mercado da beleza, que é promissor em Balneário Camboriú. A ministrante do curso, Giovanna Tamburo, explica que há um plano de ensino a seguir onde todas as propostas são devidamente cumpridas no curso. Além disso, ela ressalta a importância do aprendizado no município. “O curso especializa pessoas como maquiadores profissionais, o que possibilita que entrem para o mercado de trabalho ou possam até

empreender”, aponta. Aos alunos são ministradas aulas teóricas e práticas. No início, aprenderam sobre modelagem de sobrancelhas, paralelo a isso, teve a teoria e técnicas e, em seguida, aprenderam aplicação de maquiagem em vários níveis. Nesta etapa, já estão fazendo maquiagem em nível artístico. A professora Giovanna explica que todas as terças-feiras trabalham com maquiagem artística e nas quintas com aplicação de maquiagem. “Acredito que a maquiagem artística quebra paradigmas dos alunos, os ajuda a desenvolver a criatividade, a se acostumar com as cores, trabalhando com elas de forma harmoniosa”, salienta. Segundo ela, saber trabalhar com as cores pode ser um grande diferencial no mercado. Na aulas de maquiagem artística, os alunos buscam inspiração em imagens encontradas na internet, por exemplo, para reproduzi-las nos colegas. Em algumas aulas eles contam com modelos para aplicar a arte. O tema utilizado na aula retratada por nossa reportagem foi caveira mexicana. Os alunos soltaram a criatividade para desenvolver o trabalho. “Eles são pró-ativos e realmente gostam do que estão fazendo, estão trilhando

No curso, os alunos recebem conteúdo teórico e prático

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Fotos: Gerusa Florencio

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Aulas de maquiagem artística atraem alunos

Para quem trabalha na área de beleza, aperfeiçoamento é um diferencial e pode abrir novos caminhos

o caminho certo para se tornarem bons profissionais”, destaca Giovanna. O aluno André Gasperi gosta muito de maquiagem artística e avalia o conhecimento adquirido como importante para a sua vida profissional. André também faz curso de cabeleireiro e buscou a maquiagem para elevar o conhecimento e expandir a

sua prática na área da beleza. “Como já atuo na área, escolhi o curso de maquiagem para adicionar conhecimento, o que é importante no início da carreira e para os clientes”, explica. A aluna Sabrina Rúbia Kniss em breve abrirá um salão de beleza e julgou necessário aprender a maquiar. “Como vou trabalhar na área é essencial

Para um bom resultado, a criatividade é fundamental

Cobaia

obter o conhecimento sobre maquiagem e o curso está correspondendo às minhas expectativas”, salienta.

Informações

O curso é ministrado às terças e quintas-feiras, das 14h às 17h, na Rua Itália, n° 1059, Bairro das Nações. Mais informações pelo telefone: (47) 3367-8345

Maquiagens que fogem do tradicional fazem sucesso

Itajaí, julho/agosto de 2014


Comunidade

Não é Deus, mas é pai de muitos José Manoel Mafra preside entidade que combate o uso de drogas e a pedofilia em Camboriú Rafaela Dalago

É

uma garagem, improvisada para atender os que o procuram. Duas mesas abarrotadas de panfletos e livros sobre violência sexual e drogas. Uma penumbra, a lâmpada não permite que se chame o local de iluminado. A porta de ferro, daquelas de comércio que se alojam na parte superior, depois de anunciar sua abertura com rangido, estava totalmente aberta, um ar acolhedor. Em um canto, um quadro, com várias bonecas feitas de um material emborrachado, todas sem boca, sem voz, cada uma marcando uma idade diferente. É a contagem das vítimas de abuso sexual deste ano. Parece um ato desumano, mas não é, é um fato com o qual José Manoel Mafra, de 43 anos, lida todos os dias no município de Camboriú. Manoel, como todos o conhecem na cidade inteira, literalmente inteira, é o responsável pelo Núcleo de Prevenção e Combate às Drogas e Pedofilia. A vida profissional começou cedo, aos nove anos vendia picolé na praia, e conta isso com orgulho. De família humilde, Manoel não se envergonha do seu passado,

fala dele com brilho nos olhos. Já foi vendedor, servidor municipal de Balneário Camboriú, já foi policial militar, conselheiro tutelar, e hoje, é um pai para muitos adolescentes. Camboriú é a típica cidade pequena, onde figuras como ele não conseguem se desvincular do seu bom trabalho ou de sua árvore genealógica. Ou é o filho de fulano e cicrano, ou é o cara do núcleo das drogas. A pergunta é clássica, mas necessária, é possível separar as emoções do trabalho e vida pessoal? Diz ele que sim, o que surpreende, já que falar de Manoel é falar de ajuda, compaixão e paciência. Mesmo assim, ele conta que nem sempre o trabalho sai dele quando está em casa. O último caso de rede nacional em que atuou envolveu um pedófilo e cerca de 40 vítimas, meninas na faixa etária dos 12 anos. Chocante, não? Compreensível não conseguir se desligar quando está com a mulher e o filho. Falar dessa investigação de três semanas fez sua aparência ficar séria, o olhar frio, e o coração falar “era difícil descansar, eu sabia que a cada segundo que eu estava em casa, ele estava ali,

na internet, provavelmente fazendo mais uma vítima, e eu não sabia quem ele era”. O trabalho, até o momento feito somente em Camboriú, ganhou espaço desde que foi criado. Hoje, Manoel e a equipe de Conselheiros Tutelares da cidade, que operam em conjunto, saem por Santa Catarina para dar palestras. É o resultado de um trabalho bem feito e necessário. Ele afirma: “Deveria ser feito em toda cidade”. Quando o telefone toca, e alguém com vontade de fazer o bem fala do outro lado pedindo uma visita ou ajuda, ele embarca no carro e vai feliz, com aquela empolgação de um menino ganhando seu primeiro carrinho de brinquedo. A felicidade não é por ser conhecido, e sim por saber que em cada lugar onde ele prestar testemunho do que faz, mais de um jovem será auxiliado, e muitas vidas recuperadas. Difícil classificar um crime e um caso como o pior de todos quando se lida com isso diariamente. No crime, Manoel diz que todo ato feito contra uma criança indefesa é bárbaro, mas o principal é o abuso sexual, que marca uma vida e deixa lembran-

ças eternas. Os tantos casos são divididos em uma carreira de polícia, conselho tutelar e o núcleo. Mesmo assim, é possível sentir o tom de voz mudar quando pensa e cita o caso de um menino que recusou a ajuda e, dias depois, teve o corpo encontrado em uma construção, abandonado e queimado. É ao falar das pessoas que não querem ajuda que ele passa para uma expressão de inconformismo. Conta que algumas vezes, durante o programa “Acolher e Encaminhar”, ao bater na porta de uma família durante a madrugada para devolver um filho, teve que ouvir “vão prender bandido, o filho é meu, eu cuido”. A ingratidão não o abala, ele confessa que fica sentido, mas fala que não pode ajudar quem não quer ser ajudado, por isso volta para o carro e segue firme. Tem os lados ruins, é claro, tudo tem, mas tem a parte boa, que com certeza não é a financeira. Foi um sorriso, daqueles de orelha a orelha, que me contou sobre os adolescentes que hoje ele encontra nas ruas e lhe agradecem por ter mudado sua vida. O menino de dez anos internado em um centro de recuperação

para dependentes químicos, por exemplo, é comovente. Hoje Manoel o encontra com frequência, alegre e feliz, geralmente jogando uma bola com os amigos. Essa é apenas uma de tantas vidas que foram mudadas a partir da ação humanitária. Segundo ele, não é possível mudar o mundo, mas é fundamental que cada um faça sua parte no lugar em que esteja, pois juntos há uma esperança. José Manoel Mafra, um cidadão camboriuense, que com 1,65m, não se intimida pelas dificuldades e cresce perante elas. Testemunha de Jeová, realiza um trabalho voluntário na congregação e durante a conversa cita alguns versículos da bíblia. “Há mais prazer em dar do que receber”; ou “A fala quando branda recua o furor”, referindo-se ao mérito de nunca ter sido ameaçado, afinal não se poder apagar o fato de que há dois anos Camboriú foi eleita a cidade mais violenta de Santa Catarina. E com o mesmo sorriso e ânimo com o qual me recebeu, o vejo se despedir e ir para casa, encontrar a família para o almoço, depois de muito cumprimentar os que chamam seu nome pelo caminho.

Histórias de um bairro à beira mar

Lembranças de quem viveu em uma Cabeçudas bem diferente da atual e estranha as mudanças Maria Isabel F. Schauffert

P

edacinho do céu. Praia de areia branca e solta como talco, mar limpo e de ondas vezes calmas, outras de ressaca, e ruas em que mal se ouvia barulho. Era comum os jovens se reunirem no terraço do Hotel Cabeçudas, para escutar música, dançar e namorar. O hotel chegou ao balneário em 1929, pelo alemão José Zwolfer. Pioneiro no turismo de Cabeçudas e também ao trazer a tradicional culinária alemã, que lhe angariou fama principalmente por conta de pratos à base de frutos do mar, como a tainha defumada. A praia ainda era uma vila de pescadores quando o velho Zwolfer (como era conhecido) chegou para transformar a casa de saúde que estava sendo construída em um dos hotéis mais emblemáticos na história de Itajaí. Embora já não exista mais a construção, que hoje deu lugar ao restaurante Brasileirinho. A filha, Maria Helena Zwolfer Fóes ainda reside no bairro depois de 73 anos, e relembra os tempos áureos do balneário, que de uma vila de pescadores foi se tornando local de veraneio para muitas famílias e enfim endereço residencial, como é até hoje. Difícil falar do pequeno balneário sem referenciar as famílias que fizeram a história local e hoje dão nome a boa parte das ruas Itajaí, julho/agosto de

no bairro. Ou mesmo de uma das avenidas mais importantes de Itajaí, como a Marcos Konder, cujo patrono viveu por muitos anos no Hotel Cabeçudas e foi quem plantou as árvores frondosas na orla da praia. A falta de vida própria do bairro dificultava o dia a dia de quem morava por lá. Foi o caso de Maria Helena, ao ir para Blumenau continuar os estudos devido às más condições da estrada que ligava Cabeçudas aos outros bairros de Itajaí, e também à falta de mobilidade urbana que atrapalhavam sua ida ao Colégio São José, no centro da cidade. Muitos nomes da história do bairro fazem parte também da história política catarinense, como os Konder, os Bornhausen e a família Lins. Grandes conclaves políticos nasceram em encontros nas casas deles, que abrigavam os poucos moradores de Cabeçudas na época. Marieta Konder é recordada por todos pela bondade e como a responsável pelo resgate e construção da pequena Capela de Santa Terezinha, recorda Maura Souza, moradora do bairro desde a infância. A história da capela se iniciou nos anos 1920, endossada por três irmãs que a construíram em alvenaria. Anos depois, quando Irineu Bornhausen e a esposa Ma-

rieta Konder residiam em Cabeçudas, fizeram doações para que um dos maiores símbolos da localidade fosse construído com materiais mais resistentes. E a capela está em pé até hoje, após diversas reformas para resguardá-la. Os veranistas, boa parte de Brusque e Blumenau, que passavam a estação no balneário, aproveitavam a temporada para rever as pessoas que não viam durante o ano. Era um ponto de encontro para muitos que vinham de outras cidades e local onde amizades e casamentos surgiram. Ainda tinham as musas como Victória Schauffert, que permaneceu na memória de Maria Helena Foés como a primeira mulher a usar biquíni na praia. A história de Victória com Cabeçudas começou em 1949, quando os tios a convidaram para passar o verão na casa do amigo e inesquecível Juvêncio Tavares do Amaral, hoje o nome da rua principal do bairro, uma homenagem ao português bem humorado recordado por todos que o conheciam. Cabeçudas permitiu a Victória o primeiro contato com ondas, pois até então convivera apenas com mares de águas calmas, tendo nascido na Ilha de Santa Catarina. Sua maior recordação sempre foi o mar, muito mais do que

a areia ou outra qualquer marca do lugar. Foi onde conheceu quem se tornaria seu marido, além de muitos amigos com quem repartiu longos banhos e diversões. O mar era não só local de banho e lazer, mas também para colocar os assuntos em dia por horas seguidas onde os pés já não tocavam o chão. Victória lembra-se de observar Marieta Konder conversando com duas amigas por longo tempo dentro da água. A alegria fazia parte do grupo que andava sempre junto no auge da juventude. Alguns casamentos, que foram história para a cidade de Itajaí, surgiram ali. Exemplo disso é Victória e Osny, que se conheceram na praia e combinaram o primeiro encontro no Cine Rex, em Itajaí, e acabaram não se reconhecendo ao trocar os trajes de banho pelos de passeio. Memórias doces e irônicas de tempos antigos em um pedacinho de céu, carinhosamente relembrado por Victória. Casados e afastados de Itajaí, morando fora por alguns anos, retornaram a Cabeçudas. Para surpresa deles, o número de pessoas residindo no bairro aumentara, mas muitos de antigamente continuavam morando lá, como o tio Juvêncio e seu bom humor memorável. Um hábito da família, amantes da praia, eram os banhos

ao meio dia, quando Osny voltava para o almoço, a esposa e os filhos já estavam prontos e iam juntos aproveitar as horas disponíveis no mar antes que ele voltasse ao trabalho. A tranquilidade de viver em Cabeçudas é também uma lembrança marcante. Cabeçudas era um balneário restrito. Só frequentado por seus moradores ou veranistas. O frequentar a praia como opção de lazer era um hábito apenas das pessoas de status. Um dos possíveis motivos, Victória aponta, era a falta de interesse pela cultura “praiana” (trajes, natação, sol). Moradores pioneiros, como a audaciosa entrevistada que inaugurou no lugar a era do biquíni, estranham o comportamento dos muitos frequentadores de todas as classes que hoje povoam a orla. Remanescentes de uma época em que não se comia na praia, nem se ostentava som a todo volume em carros, eles criticam o que consideram “deturpação do convívio dos que estão em volta e falta de boas maneiras”. Por conta desse choque cultural, os nativos preferem não frequentar a praia aos fins de semana e na alta temporada. Só quando o movimento diminui eles retornam para reencontrar os que ali residem. Uma nova geração que continua fazendo história.

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Aventura

Publicitário mudou sua vida percorrendo o Brasil em busca dos melhores lugares para beber cerveja Maria Isabel F. Schauffert

enda seus pertences, demita-se do seu trabalho, coloque uma mochila nas costas e saia em busca dos melhores lugares para tomar uma boa cerveja, percorrendo do Sul ao Norte do país. Parece algo muito corajoso de se fazer, mas foi exatamente o que Edson Carvalho, 34 anos, decidiu encarar como um novo trabalho. Antes,o Viajante Cervejeiro como é conhecido na internet - formou-se pela Associação de Sommeliers de São Paulo. Munido de coragem, amor e interesse pelo mundo das bebidas, particularmente pela cerveja, ele acabou por criar esse projeto audacioso. Enquanto passava por Itajaí, Edson foi até a Cervejaria Itajahy para conhecer a produção da empresa, e estivemos por lá para saber mais sobre a história dele. “Tudo que eu tenho hoje é uma mochila, também não tenho mais casa.” O foco do projeto, iniciado em maio deste ano, é criar um guia dos melhores lugares para apreciar uma boa cerveja por todo o Brasil, ou seja, privilegiados serão os consumidores. Para ir de um lado a outro, Edson pega caronas, dispondo das redes sociais - hoje já tem em torno de cinco mil seguidores - que o ajudam a chegar ao próximo destino. Sempre indicado em sua página, pela qual procura alguém que possa leválo pelos muitos caminhos. Viajante experiente e com uma postura positiva, garante que tem sido mais fácil do que imaginou de início.

A hospedagem funciona da mesma maneira: por meio de pessoas solícitas e dispostas a recebê-lo. Se não conseguir algum local, recorre ao couchsurfing – uma rede internacional de pessoas conectadas para disponibilizar um local em sua casa aos viajantes. E como última solução, tem a barraca, presa na in-

Fotos: Reprodução Facebook

V

A jornada do viajante cervejeiro

Tudo é questão

de postura, atitude e o jeito de lidar com as pessoas

separável mochila. Os cursos ministrados durante a viagem sobre cultura da cerveja ou degustação da bebida o ajudam a manter os custos do projeto, mas também procura por apoiadores, parceiros ou patrocinadores, assim poderá dar continuidade e finalizar a viagem até o Norte do país. Para os surpresos quanto à aventura de Edson, ele afirma: “Tudo é questão de postura, atitude e o jeito de lidar com as pessoas”. A parte mais difícil para ele foi decidir, depois de ter colocado o pé

Edson quer montar um guia dos lugares com as melhores cervejas do Brasil, ao fim da aventura

na estrada e iniciado sua grande viagem, foi e tem sido bem mais fácil do que os quatro meses planejando para iniciar a jornada. Embora já tivesse pensado neste projeto

há alguns anos, foi preciso uma forcinha do seu antigo trabalho: o escritório em Curitiba solicitou sua presença integral na cidade, mas morando em Florianópolis Edson não queria voltar para o lugar em que já havia vivido por sete anos. Foi o momento de realizar o sonho de trabalhar com algo que envolvesse suas paixões. Sempre que chega ao próximo destino e há alguém para recebê-lo, sua agenda permanece livre para conhecer seu anfitrião e a cidade. Já chegou a trabalhar com uns, sair para fotografar com outros e até a vender cerveja em um desses locais. A parte mais rica de sua aventura é se permitir conhecer de perto as pessoas e os lugares, sem perder a oportunidade de conviver com novas culturas, mesmo que viajando dentro do Brasil. Esta não é a primeira vez que Edson coloca o pé na estrada. O viajante cervejeiro começou suas aventuras em

2006. Enquanto passeava pelas ruas de Barcelona (ele morou lá algum tempo), deparou-se com a loja e bar La Cerveteca e ali se iniciou sua paixão pela bebida, aprendendo o que pôde sobre cerveja. Em 2011, colocou a mochila nas costas de novo, desta vez mais direcionado à cultura cervejeira, buscando os lugares pelo mundo onde poderia apreciar da melhor maneira sua bebida preferida. Hoje já são 22 países visitados em quatro continentes. No momento, Edson passa por Santa Catarina, estado que pela rica cultura cervejeira tem feito sua permanência mais longa, comparada a sua passagem pelo Rio Grande do Sul. Ele acredita que em um ano deva finalizar a rota do Sul ao Norte, mas ainda pretende fazer a volta para “casa” passando pelos países vizinhos. O objetivo será o mesmo, de passar pelos lugares com cultura e bares cervejeiros. A permanência em cada local depende do quanto

Caronas e ajuda de quem o segue nas redes sociais garantem a continuidade dessa saborosa viagem

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será explorado em cada lugar, podendo variar muito de uma cidade a outra. Para quem pensa em enfrentar uma aventura parecida, o viajante aconselha: planeje! Ele também conta que se preocupar menos e pensar que tudo dará certo sempre o ajudou, ou seja, pensamento positivo e muita calma para enfrentar a estra-

Tudo que eu

tenho hoje é uma mochila, também não tenho mais casa

da. Mas como consequência, Edson ficou avesso às rotinas e estagnações e haverá sempre um comichão em seus pés para a próxima aventura. Enquanto isso, de Sul a Norte do Brasil, haverá uma visita desse cervejeiro viajado.

Do sufoco à lição Ainda no Rio Grande do Sul, quando tentava ir de

Antônio Prado a Joaçaba, Edson passou por dois dias complicados, mais provas de que permaneceria nesta caminhada pra valer. A única carona que conseguiu ia até a cidade de Lagoa Vermelha, município consideravelmente pequeno e um dos poucos em que não foi tão bem recebido. Sem dinheiro na mão, apenas com o cartão de crédito, ficou difícil achar um lugar que o acolhesse, levando horas até encontrar um hotel com máquina para o cartão. No dia seguinte, foi ao posto em busca de alguma carona, e, embora felizmente tenha conseguido, por volta das 20h do mesmo dia a gasolina do caminhão que lhe dava carona acabou. Conseguindo ajuda na estrada, foi até o posto de gasolina mais próximo e lá descolou a tão precisada carona até a cidade de Joaçaba. Edson conta a história com bom humor, e diz que se lembrava a todo momento que estava passando por aquilo por sua própria escolha, por isso manteve a calma ao máximo, buscando soluções pra que enfim chegasse ao seu destino. Levou consigo um aprendizado e, assim, segue sua viagem. Conheça mais e acompanhe esta longa jornada: viajantecervejeiro.com.br facebook.com/ViajanteCervejeiro

Ele pretende finalizar a rota de Sul a Norte em um ano, e na volta quer passar pelos países vizinhos

ta o R a erveja d C E aí, gostou da ideia e quer viver sua própria aventura em busca das melhores cervejas? Saiba que é aqui, no Vale do Itajaí, que está localizado o maior número de fábricas de cervejas do Estado de Santa Catarina. Que sorte! A presença forte das tradições germânicas coloca a região em destaque nacional e é um diferencial quando se trata de produção de cervejas artesanais. Só em Blumenau são mais de 10 micro cervejarias, algumas premiadas internacionalmente, como a cervejaria Eisenbahn e a Bierland. É em Blumenau também que está localizado o Museu da Cerveja, desde 1996, e na cidade se faz a maior festa alemã das Américas, a Oktoberfest. Então aí vão algumas dicas para começar a sua rota da cerveja: Em Blumenau • Museu da Cerveja Endereço: Rua XV de Novembro, 160 – Praça Hercílio Luz Tel: (47) 3326-6791 • Cervejaria Bierland Endereço: Rua Gustavo Zimmermann, 5361 – Itoupava Central Tel: (47) 3337-3100 • Cervejaria Eisenbahn Endereço: Rua Bahia, 5181 – Salto Weissbach Tel: (47) 3488-7307 • Cervejaria Wunder Bier Endereço: Rua Fritz Spernau, 155 – Fortaleza Tel: (47) 3339-0001 Em Itajaí • Cervejaria Itajahy Endereço: Rua Uruguai, 1314 Tel: (47) 3348-8484 Em Brusque • Cervejaria Zehn Bier Endereço: Rua Benjamin Constant, 26 – Bairro São Luiz Tel: (47) 3351-6685

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Em Canoinhas • Cervejaria Canoinhense Endereço: Rua 3 de maio, 154, Centro Tel: (47) 3622-0358 Em Forquilhinha • Cervejaria Saint Bier Endereço: Av. 25 de Julho, 1303 – Vila Lourdes Tel: (48) 3463-3400 Em Gaspar • Cervejaria Das Bier Endereço: Rua Bonifácio Haendchen, 5311 – Belchior Alto Tel: (47) 3397-8600 Em Joinville • Cervejaria Opa Bier Endereço: Rua Dona Francisca, 11.560 – Pirabeiraba Tel: (47) 3467-0090 Em Pomerode • Cervejaria Schornstein Endereço: Rua Hermann Weege, 60 (ao lado do Zoo) Tel. (47) 9171-9359/3387-6655

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Esporte

Coragem, ousadia e vitória Camboriú Futebol Clube e os 11 anos do time que teve origem em um sonho de fanáticos por futebol Eliza Doré e Rafaela Dalago

Fotos: Rafaela Dalago

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O campo do Estádio Robertão, no centro de Camboriú, onde se realizam os treinos e estimulam-se novos talentos

undado em 11 de abril de 2003, o verde, laranja e branco do Camboriú Futebol Clube (CFC), antes conhecido como Sociedade Desportiva Camboriuense, é o resultado do sonho de amigos apaixonados pelo esporte e pela pequena cidade de Camboriú. A ideia nasceu em encontros de amigos no Clube Brejeiros, em meio a jogos de cartas, bate bola e conversas animadas. Foram muitos dizendo que não daria certo, mas o grupo não se deixou abater, e ousou mais ainda: colocou uma mulher como a primeira treinadora. Os jogadores eram amadores, ninguém podia negar, mas o sucesso do primeiro ano de equipe alcançou a rede nacional, e o sonho começou a criar fama, forma e títulos. A mídia se interessava pela iniciativa e a marca, com certeza não pelos resultados em campo. A ousadia foi destacada já no ano de 2004, quando o então Camboriuense se aventurou em excursão pela Europa, com a equipe sub-23, que mesmo amadora, conquistou a partida contra o Galatasaray da Turquia, por 2x1. Rodolfo Testoni é natural de Camboriú, e começou a jogar no time em 2004, com apenas 15 anos. Testoni se considera mais que um ex-jogador, ele é um dos diversos fanáticos pelo CFC. Grato por ter-se tornado profissional graças ao time, o craque lembra com emoção o jogo de acesso à primeira divisão do Catarinense e à elite do estado, em 2011. Entre idas e vindas, integrou a equipe por cerca de seis anos. Rodolfo acompanha os resultados fielmente e afirma que o momento mais triste foi o rebaixamento para a segunda divisão. Ele, que hoje está parado por uma contusão, diz sonhar ainda em voltar a vestir a camisa e representar mais uma vez sua cidade com orgulho. Neste ano, o CFC recebeu o título de Clube Formador de Atletas. O certificado é concedido pela Confederação Brasileira de Futebol (CBF) aos clubes que atendem aos quesitos da formação de atleta/ cidadão. Dos 800 clubes brasileiros, o Camboriú é o 43º a obter o certificado, válido por um ano. José Henrique Coppi fez parte da formação do time e é o atual presidente. Para ele, o documento é de extrema importância, já que o Camboriú sempre priorizou as categorias de base e continuará sendo assim, pois ser um clube formador é uma de suas missões. O Tricolor já revelou nomes como Roberson, ex-Grêmio e Seleção Brasileira de base, Diouzer, hoje no exterior, Diego Jardel e Neris, do Avaí, e Rodrigo Moledo, exInter e atual Metalist. Os treinos são feitos no estádio do Robertão, localizado no centro da cidade. É por ali que o barulho começa nos domingos de jogos, é o coração de Camboriú se animando logo depois do almoço. Bem em frente está o famoso Bar do Hélio, pequeno e acolhedor, quase uma concentração de torcedores e amadores. Em meio a mistura de tantos sentimentos é visível que a ideia daquele grupo de amigos se tornou vital para o município. Altamir Montibeller, que hoje comanda a Fundação Municipal de Esportes, foi o primeiro presidente do CFC. Ouvi-lo narrar a trajetória do time é pedir para se apaixonar ainda mais pela camisa. É com amor e orgulho que Montibeller fala de todas as dificuldades, prós, contras e conquistas. O financeiro é a barreira para muitos sonhos e é por isso que sua gratidão se estende até hoje àqueles que acreditaram na bandeira. Segundo ele, a alteração do nome foi no início uma tentativa de fazer a cidade crescer e, por coincidência ou não, deu sorte ao time. “Hoje nos encontramos na segunda de novo, a luta continua, é o ciclo do futebol que retrata bem a vida, não podemos parar e nem desistir nunca, e com seriedade e muita credibilidade, conquistada nestes 11 anos, continuaremos a lutar para trazer a nossa torcida muita alegria”, finaliza Montibeller, em um misto de certeza e esperança.

Estrutura que serve ao time principal é motivo de satisfação para a comunidade, que reconhece o valor da equipe

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Esporte

Slackline, a arte do equilíbrio A história, as características e os desafios do esporte que vem agregando cada vez mais adeptos Andrieli Minatti e Elaíse Cidral

Fotos: Andrieli Minatti

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Um dos pontos positivos do esporte é a ampla lista de lugares em que se pode praticá-lo

As modalidades variam e há adeptos que preferem o slackline em grandes alturas e até na água

ntre gramados e montanhas, sobre as águas ou na areia da praia. Equilibrados em exercícios de concentração ou saltitando em manobras radicais. A 30 centímetro do chão ou a vários metros de altura e distância. Depende da coragem de quem pratica. Slackline, um esporte que une o equilíbrio mental e físico. A modalidade surgiu nos anos 80, nos Estados Unidos da América, quando escaladores utilizavam a fita para passear de um lado para o outro das montanhas. Desde então, o que era apenas um passatempo, ou uma forma de locomoção, foi se profissionalizando e ganhando espaço em todo o mundo, chegando até a se organizar campeonatos envolvendo competidores de diversos países. No ano de 2012, o carioca Igor Zambelli, de 21 anos, tornou-se o primeiro campeão brasileiro em uma competição realizada na Áustria, deixando para trás o americano Alex Mason. Mas, não é preciso ir tão longe para encontrar praticantes do slackline. Na cidade de Itajaí, há pouco mais de um ano, já é possível assistir à prática da modalidade que exige concentração, preparo físico e, acima de tudo, equilíbrio. Com dreads retirados há pouco tempo, os cabelos ao vento fazem parte do estilo. Porém, durante as manobras, a faixa na cabeça é o auxiliar para que o estilo não interfira na performance. Com apenas 18 anos, Francisco Vanzuita já conquistou o primeiro lugar em uma competição regional, a primeira de sua vida. Para ele, o foco do esporte é se superar sempre e tentar vencer os próprios desafios. Para Vithor Correa Maziero, 18 anos, praticar o esporte ao ar livre não é apenas uma atividade física, mas sim, uma diversão e também modalidade de competição, “quero ver até onde vai”. Outro jovem de apenas 18 anos e apaixonado pelo slackline é Guilherme Furlan, que conheceu a modalidade na Bahia e ao mudar-se para Santa Catarina fez amizades com outros praticantes e agora vê o esporte como um ponto de encontro com os amigos. Mas, quem pensa que apenas jovens encaram a fita, está enganado. Com a arte em sua essência, Ana Vanzuita, professora de dança, apoia a dedicação do filho Francisco à prática e também se arrisca sobre a fita. Ela acredita na importância da propagação do esporte na cidade e garante que é apaixonante. O fisioterapeuta Rodrigo Voltolini aprova a prática e afirma que os praticantes passam a ter mais qualidade de vida através do exercício que exige grande esforço físico. Voltolini diz ainda que o slackline pode ser usado no tratamento de recuperação de pacientes, mas destaca: “Deve-se sempre ficar atento, pois os diagnósticos são sempre distintos”. Seja sobre as águas na modalidade “waterline”; na adrenalina de grandes alturas “highline”; a apenas 30 centímetro do chão, mas em grandes performances “trickline”, ou ainda sobre longas fitas com distâncias a partir dos 40 metros na modalidade “longline”. Na praia para o lazer ou no Centro de Treinamento de Slackline, em Goiânia, o primeiro da América Latina, são diversas as formas da prática, e se você se inspirou, estique sua fita e comece já!

Aí vão algumas dicas para quem quer praticar Slackline: •A ajuda de um colega facilita a iniciação, principalmente se esse apoiar a pessoa que está em deslocamento segurando-a levemente pelo antebraço. •A posição dos pés deve ser alinhada com a fita para aumentar a área de apoio, a distribuição do peso e a percepção do apoio na fita. •Os braços devem estar estendidos com abdução do ombro, como se carregasse uma grande bola sobre a cabeça. Essa posição facilita a recuperação do equilíbrio. •Deve-se manter a postura ereta do tronco e da cabeça, com o olhar fixo no final da fita. •Os joelhos devem estar semiflexionados para aumentar a tensão muscular. •A prática descalça auxilia a sentir o pé na fita.

Equilíbrio e concentração são fundamentais para se manter em pé mais tempo em cima da fita

Itajaí, julho/agosto de 2014

Cobaia

Dados retirados do artigo: Primeiros passos no slackline. Trabalho desenvolvido pelos alunos Dimitri Wuo Pereira e João Marcelo Maschião, da Universidade Nove de Julho, de SP.

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Em Blumenau, herança dos colonizadores alemães alimenta sonho olímpico nas novas gerações Aline Pukall e PricilaBaade

Fotos: Aline Pukall

Cultura

Um tiro certeiro para manter a tradição

Luísa já começou a se preparar para as Olimpíadas de 2016, mesmo com sua incerta convocação

O

ano é 1983. Uma jovem de 15 anos mira o alvo. Olhos verdes fixos no pontinho preto que marca a pontuação máxima. Ela atira. A bala acerta próximo ao centro do ponto e Roseli Schwantz recebe a faixa de Rainha do Tiro. Vinte e cinco anos depois a cena se repete, mas desta vez é outra jovem de cabelos loiros e olhos claros que

mira o alvo. Não são só as semelhanças físicas que Karla Schwantz herdou de Roseli. A primogênita da família mostrou ser tão boa de mira quanto a mãe e recebeu a faixa de Rainha do Tiro, também aos 15 anos. O primeiro Clube de Caça e Tiro criado em Blumenau foi o Schützenverein, em 1859. A construção se ergueu em um terreno

doado por Otto Blumenau, fundador da cidade. O presidente da Associação local dos Clubes de Caça e Tiro, Moacyr Flor, conta que o tiro foi utilizado pelos colonizadores alemães para defender as terras de invasores e também como forma de sustento, já que na época caçar ajudava a alimentar a família. Mas logo que perdeu esta função, o tiro se tornou apenas

Blumenau é a cidade com a maior concentração de clubes de caça e tiro do mundo

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uma atividade recreativa e esportiva. Em 2014, Blumenau é reconhecida como a cidade com a maior concentração de Clubes de Caça e Tiro do mundo. Ao todo, são 40 clubes, destes, dez tem mais de 100 anos de existência. A tradição se mantém principalmente por causa do costume de pais, filhos e netos frequentar juntos esses locais.Um exemplo é Guilherme Zimmer, que leva a família toda para participar das festas do clube. A filha de sete anos já demonstra interesse pela modalidade do pássaro ao alvo. Para a Coordenadora do Museu dos Clubes de Caça e Tiro de Blumenau, Raquel da Silva Lindner, a tradição ainda é forte na cidade, apesar de que se estima que apenas 10% dos blumenauenses ainda sejam sócios de algum clube de tiro. Como forma de transmitir esta cultura para as novas gerações, o museu promove nas escolas da cidade a festa dos reis e rainhas do caça e tiro. Por meio de competições de pássaro ao alvo, os alunos têm a oportunidade de conhecer um pouco mais das memórias dos colonizadores de Blumenau.

Olimpíadas É hora de trocar de roupa. Veste calça, casaco, bota, luva, amarra o cabelo, põe viseira e tapa olho. Pronto. A rotina de Luísa Schreiber é a prova de que a cultura dos clubes está, e muito, ligada à formação de uma atleta. Tetraneta do fundador do Caça e Tiro Concórdia Velha, a jovem começou a atirar aos 12 anos,

em uma das brincadeiras de mira aberta realizada na Oktoberfest. Depois disso, a paixão só aumentou e foi impossível não ir atrás de novos desafios no esporte. No início, o que era só uma forma de expressar a cultura herdada em família, se tornou, três anos depois de testar todas as modalidades, um esporte sério. Perdendo o medo que tinha do tranco que a arma dava, Luísa começou a praticar a modalidade de carabina de aro olímpico, usada para competições, e que traz uma tecnologia diferente, utilizando cilindro de ar e chumbinho. Em uma das competições locais, a atleta conheceu um treinador de Joinville, que na época se esforçava para montar um time para participar do campeonato brasileiro de Juniores – modalidade até 20 anos. Logo na primeira etapa, Luísa conquistou a melhor posição de mira aberta, e a terceira na carabina olímpica. Alguns meses após ter conquistado o título, a jovem foi convocada para o Sul Americano de Tiro. No campeonato, Luísa ficou fora da competição por equipes, mas conquistou o terceiro lugar individual. Mesmo após ter sido desclassificada do campeonato mundial, Luísa não desistiu do sonho, e com o apoio e patrocínio do pai, continuou com os treinamentos três vezes por semana, durante três horas. Em 2012 e 2013 conquistou o título de melhor atiradora nacional na categoria de juniores. Com a aproximação das competições olímpicas, que serão realizadas no Brasil em 2016, Luísa já começou a preparação para sua ainda incerta convocação.

O primeiro clube de caça e tiro foi fundado na cidade em 1859, o Schützenverein

Cobaia

Itajaí, julho/agosto de 2014


Cultura

Exercícios e treinos aliados ao prazer que resulta da expressão corporal fazem bem para corpo e mente Francielle Mianes e Bruna Froehner

música instrumental é lenta e os movimentos seguem o ritmo. São vários ao mesmo tempo. Pernas, braços, cabeça. Cada passo exigindo total precisão para que saia em sincronia. E num dia como hoje, ainda mais. Este é o último ensaio antes da competição. Estão todos aflitos. O coração bate forte. E nem mesmo o condicionamento físico, ganho com muitos treinos, é suficiente para a exigência dele, que grita alto e em bom tom ao fundo: “-Vamos lá!”. Logo a música vai tomando forma. As batidas ficam mais fortes, o ritmo mais agitado e os movimentos mais ágeis. Agora o esforço vai além. Num piscar de olhos, um giro no ar. Se estivéssemos vendo em uma câmera lenta, era possível notar todo o esforço. Os joelhos se flexionando levemente para pegar impulso, as pernas alongadas e a cabeça, virada pra trás, levando o tronco – agora curvado no ar. E é quando está no alto, que os joelhos se aproximam do tronco, trazendo-o com ainda mais rapidez, para os pés, novamente, tocarem o chão. Ouvi dizer: “-Esse é o mortal”. Um movimento que exige muita força dos membros inferiores, um ganho graças aos treinos exaustivos de

segunda a segunda de Tiago Montalti. Com apenas 17 anos, esse jovem já esteve em grandes competições como “The Got Talent Brasil”. Um programa feito pela Rede Record em que grupos e solos apresentam seus talentos e podem ganhar até 200 mil reais. O talento de Tiago? Não, não é ginástica rítmica ou olímpica, o talento de Tiago é a dança. Dançarino desde os 11, entrou no meio pela paixão à arte e hoje é professor de dança em uma escola pública de Itajaí. Assim também outros tantos dançarinos têm a mesma oportunidade, graças ao empenho e à dedicação de Thurbo Braga, diretor e coreógrafo da Companhia de Danças Millennium. Um grupo de dança de rua que existe há 17 anos em Itajaí. Com 57 competições e 50 primeiros lugares, Thurbo vai além. Utiliza nas suas coreografias não só os fundamentos da dança de rua, mas também movimentos acrobáticos que chamam a atenção do público. Mas para que os dançarinos atendam às suas exigências, o treino é puxado. Ele, que quando novo treinava handebol, atletismo e futebol, aproveita hoje desse aprendizado para preparar seus dançarinos. Marcos Bublitz, de 19 anos, é

Fotos: Arquivo pessoal Millennium Cia de Dança

A

Muito além da arte

Manifestação cultural, dança faz bem para a saúde ao ajudar no combate a depressão e ansiedade

um dos dançarinos do grupo. Filho do ator global Dedé Santana, o jovem começou a dançar há seis anos, e desde então vem treinando muito para se destacar no meio. Um trabalho valorizado pelo pai, também artista. Ainda que tímido, o jovem exibe na dança todo o seu talento. Mostrando que, assim como em qualquer outro esporte, para que tudo saia como planejado, é necessário muito preparo físico, com

Muitos jovens e adultos procuram a dança para perder peso e definir o corpo com um exercício dinâmico

treinos tanto aeróbicos quanto anaeróbicos. E são os treinos exaustivos que deram um corpo esbelto para Keyt Jamile Ribeiro, de 28 anos. Quem a vê, de longe já observa os ombros largos, braços torneados, pernas fortes e a barriga “tanquinho”. Dançarina desde os 14, entrou na dança porque sempre amou a arte, mas hoje vê que se tornou algo muito além. “Hoje me sinto fisicamente preparada para fazer qualquer tipo de esporte com facilidade.” É por causa da busca desse corpo perfeito que muitos entram no grupo. Hoje, ainda mais do que antes. Pessoas com mais idade começam a dançar a fim de perder ou, até, manter peso de uma forma mais dinâmica e saudável. A esposa do coreógrafo Thurbo Braga, Mylla Braga, é um exemplo disso. Agora ela vê a dança como arte, mas não foi o que pensou quando tinha 16 anos. A intenção dela quando começou era trabalhar o físico. Hoje, aos 36 anos, inspira outras mulheres que entram no grupo com o mesmo propósito. “É um treino mais dinâmico. Ao invés da típica corrida, elas dançam. Tornase uma atividade mais atrativa do que as academias”.

Alegria e saúde

Movimentos que exigem força são realizados com sucesso graças aos treinos de segunda a segunda

Itajaí, julho/agosto de 2014

Cobaia

Em um pequeno espaço chamado de “Dança Café” a vi pela primeira vez. Ela se mexia rápido, guiada pelo seu parceiro, fazendo a saia de fios ter uma coreografia paralela. O clima lá fora pedia casacos, mas dentro daquele salão o calor fazia com que Carla passasse as mãos na testa para limpar o suor. Era a

dança que esquentava, não só o par de bailarinos que se exibia ao som de um samba, mas também de quem os admirava naquela noite. A alegria contagiava e mudava a energia do lugar. Mesmo aquele que “não gosta de samba e bom sujeito não é”, como na letra de João Gilberto, se sentia motivado a arriscar uns passos com a professora Carla. E não eram apenas os braços, tronco, pernas que entravam no ritmo, o rosto todo iluminado e os lábios vermelhos exercitavam o sorriso largo. Para lá e para cá a saia rodopiava e Carla não cansava.Unindo a dança a uma boa prática aeróbica, unindo a alegria à saúde. Carla Quadros é formada em Educação Física com pósgraduação em Dança e afirma que essa arte traz muitos benefícios, é quase uma terapia para a melhora no convívio social, utilizada até para o combate a depressão e crises de ansiedade. Melhora a autoestima, o humor e também a qualidade do sono. Para ela, o corpo só tem a ganhar com essa prática. Carla explica que a dança trabalha percepção corporal, postura, coordenação motora, e quando é feita em longa duração - acima de vinte minutos - é considerada atividade aeróbica. Traz melhorias no condicionamento cardiorrespiratório, controle de peso e colesterol e nos níveis de pressão arterial, sendo considerada atividade física. Ao dançar, o cérebro libera serotonina, substância que traz sensação de prazer. Por essa razão, a dança faz bem a mente e corpo. “Não tem regra, quem dança é mais saudável e mais feliz.”

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Alunos participam do projeto que começa nas salas e continua nas areias da Praia Central Gerusa Florencio

Fotos: Arquivo PMBC

Educação

Nossa Escola, Nossa Praia

Alunos das escolas municipais participam de torneios realizados nas areias da praia

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ntre os dias 15 e 19 de setembro, cerca de 1 mil alunos da rede municipal de Balneário Camboriú mobilizam-se em um grande evento esportivo. A iniciativa faz parte do projeto Oficinas de Ensino Complementar, da Secretaria de Educação do município, que oferece durante todo o ano escolar o Projeto Nossa Escola, Nossa Praia, em todos os Centros Educacionais Municipais (CEMs). Participam das atividades desenvolvidas em contraturno escolar estudantes do 1° ao 5° ano. A iniciativa foi lançada em setembro de 2011 e, desde então, vem integrando alunos das escolas municipais por meio de torneios realizados nas areias da Praia Central, na região do Pontal Norte e nas escolas. Os jogos se realizam três vezes por semana, na terça, quarta e sexta-feira, nos

turnos matutino e vespertino, com duas escolas participantes. Entre as modalidades trabalhadas estão futebol de areia, queimada, mini-tênis, frescobol e voleibol. As competições ocupam praticamente todos os meses do ano, divididas em quatro eventos: Jilart, realizado no mês de maio; Jicit, em junho; Jisama, em agosto e Jicig, em setembro. Ao fim do calendário esportivo, todas as crianças ganham medalha de participação. Em 2013, aproximadamente três mil alunos participaram do Projeto, totalizando oito mil atendimentos. De acordo com o coordenador do Nossa Escola, Nossa Praia, Jorge Luiz Tridapalli, os jogos têm o intuito de recreação e integração e não de instigar a competitividade. “Além das atividades oferecidas em contraturno escolar, que propiciam momentos diferentes para as crianças, o pro-

Em 2013, aproximadamente três mil alunos participaram do projeto

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As modalidades são futebol de areia, queimada, mini-tênis, frescobol e voleibol

jeto também promove a socialização das escolas, um dos principais objetivos”, ressalta. O ano letivo começa com o Jilart, que consiste nos Jogos de Integração dos CEMs Nova Esperança, Alfredo Domingos, Dona Lili, Dona Lila, Taquaras e Geovânia de Almeida. Em 2014, essa

[...] o projeto

também promove a socialização das escolas, um dos

principais objetivos

fase contou com a participação de 1208 crianças do 1° ao 5° ano. Entre as modalidades oferecidas estão futebol, xadrez, salto em distância, dentre outras. Em junho, teve início o Jicit, Jogos de Integração dos CEMs Caic Ayrton Senna da Silva, Tomaz Francisco Garcia e Governador Ivo Silveira. Mais de 1 mil alunos do 1° ao 5° ano das três escolas se envolveram no evento. Em agosto, foi a vez de o Jisama integrar os CEMs Vereador Santa, Antônio Lúcio, Presidente Médici e Ariribá. Nesta edição, participaram dos jogos 2200 alunos do 1° ao 5° ano. O Projeto encerra com o Jicig que integrará os CEMs Iate Clube, Centro Integrado de Educação Pública (Ciep) Rodesindo Pavan e Armando César Ghislandi. A programação indica que essa série do torneio será em setembro, entre os dias 15 e 19. Aproximadamente

900 alunos, também do 1° ao 5° ano, devem participar desta edição. Futebol de campo e salão, voleibol e mini-basquete estão entre as modalidades oferecidas. O coordenador, Jorge Luiz Tridapalli, comenta que visa à ampliação das atividades do Projeto, a ser realizado também na Barra Sul. “Pretendemos atingir as escolas agrestes estaduais e particulares, nas proximidades da Barra Sul, sem a utilização de transporte”, explica. A intenção é abrir um novo pólo com as mesmas atividades já oferecidas, no intuito de integrar mais crianças. “É gratificante utilizar o espaço que o município possui para a realização de atividades como essas, que integram as crianças e ocupam o tempo em que estão fora das escolas”, finaliza. Mais informações pelo telefone (47) 3264-7154.

Um dos principais objetivos da iniciativa é promover a socialização entre as escolas

Cobaia

Itajaí, julho/agosto de 2014


Perfil

“Mas, bah, padre também fala em rádio” Nas idas e vindas da vida, Marcos conheceu um novo amor que mudaria a trajetória dele para sempre Andrieli Maria Minatti

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Em uma festa da capela, após ter passado três dias em experiência no seminário, escondido da namorada, já tinha sua decisão. Após o almoço com os sogros, rompeu o relacionamento e avisou que na semana seguinte estaria no seminário. “Ela se desesperou, começou a chorar, o sogro queria me matar”. Saiu fugido da festa, perseguido por familiares da moça munidos de espetos de ferro, mato a fora.

O seminário – “Tínhamos muita liberdade” Marcos estava no terceiro ano do ensino médio quando entrou no seminário, dois anos atrasado no grupo, mas foi se adaptando aos poucos. “Fui considerado vocação adulta”. Por isso sua trajetória foi mais curta que a dos demais. Passou um ano no seminário, um no postulantado e um no noviciado. Tornou-se frei franciscano aos 20 anos. “Tínhamos muita liberdade”, ele e seus 37 colegas sempre frequentaram colégio público. De manhã, estudavam e à tarde, dividiam-se em equipes para limpar o seminário, plantar alimentos e cuidar dos animais. “Durante minha formação, nunca pensei em desistir”

A decisão – “eu nunca seria pai” Depois de atuar durante sete anos, o fato de jamais poder ser pai seguindo a vida religiosa, fez com que Marcos repensasse seu futuro. “Passei um ano com acompanhamento de psicólogo para pensar, refletir e me decidir. Eu estava preparado”. Durante uma formação na praia, presidida por ele mesmo, no último dia decidiu comunicar ao provincial. Foi surpreendido por uma proposta de estudar teologia em Jerusalém durante quatro anos, caso fosse uma paixão que o estivesse atrapalhando, mas, ele já tinha sua decisão. “Eu não o estava consultando, eu estava decidido”. Além de tomar a decisão, o segundo passo mais difícil foi comunicar aos pais. Ao ligar para casa, sua mãe atendeu ao telefone. “Ela nunca atendia, naquele dia foi ela, era para ser”. Contou sua decisão e percebeu o choro do outro lado da linha. A mãe passou o telefone ao pai que lhe disse: “Meu filho, tu és grande e sabes o que queres”- palavras sábias de pai que o tranquilizaram.

Outro fator – “foi nesse ano que conheci a Mauren” Foi durante o ano de acompanhamento psicológico

Itajaí, julho/agosto de 2014

junto a terapias que conheceu Mauren, sua esposa. Ela havia começado a trabalhar na mesma entidade que ele como estagiária de serviço social. A entidade era dos freis e oferecia formação a crianças carentes. Marcos trabalhava na coordenadoria como vice-diretor. “Conheci o Marcos debaixo de uma mesa”, diz Mauren. Na entidade havia uma sala onde todos os colaboradores descansavam após o almoço. Marcos tinha o hábito de deitar-se em um colchonete debaixo da mesa, “eu chegava, cumprimentava a todos e a ele também”. Mauren conta que nunca havia acontecido nada, até que certo dia pensou, “mas esse frei é tão bonitinho”. E a história seguiu com muita comédia, “ele vivia fugindo de mim, morria de medo que alguém visse alguma coisa”. Para conseguir aproximação, Mauren solicitava a ele que levasse materiais até a sala em que ela trabalhava, estrategicamente em momentos que sua coordenadora não estava, era a oportunidade de passarem alguns minutos sozinhos. Quando ele chegava ela trancava a porta e corria atrás dele para tentar beijá-lo, “ele fazia o maior escândalo pedindo para que eu abrisse a porta”. Aos poucos, um sentimento foi surgindo. Certo dia, irritado com os problemas do trabalho, disse que não sabia se casava ou se comprava uma geladeira, citando uma expressão popular, e ela respondeu “Geladeira eu tenho, se quiser casar comigo!” Mauren havia se tornado mais um fator para sua decisão.

Vida nova – “eu tinha só um colchonete, a roupa do corpo e um rádio” Depois de informar o provincial de sua saída da congregação, ainda passou alguns dias na casa até se afastar. Marcos havia deixado de ser frei, mas, franciscano, segundo ele, nunca deixou de ser. Pertenceu à Ordem Franciscana dos Frades Menores, a que leva mais à risca os votos de pobreza. “Nunca nos faltou nada. Morávamos em periferia, mas tínhamos tudo”. O desapego aos bens materiais e a humildade são comportamentos próprios do carisma franciscano, Marcos seguia retamente. “Percebi o quanto eu era desapegado, no dia em que fui embora. Eu tinha só um colchonete, a roupa do corpo e um rádio”. “Foi assim que ele chegou em minha casa”, lembra Mauren. Marcos ainda não tinha onde ficar, então foi até a casa dela para pensar onde iria morar. No dia Cobaia

Andrieli Maria Minatti

em receio nem vergonha de contar a própria história, aceitou de imediato a proposta de ter a trajetória documentada em um perfil, “só preciso combinar com minha esposa o dia e o horário”. Fazia questão da presença dela. Pois, ela, mais do que ele mesmo, lembraria e contaria com riqueza de detalhes fragmentos de uma história que mudou a vida de ambos e as marcou para sempre. No dia combinado, sou recebida pela sogra, que estende roupas no varal, nos fundos da casa. A residência alugada tem marcas externas dos antigos moradores. Estrebarias e poleiros vazios, cenários de que ali já haviam sido criadas algumas cabeças de gado e alguns pares de galinhas. Realidade que não condiz com a atual família. Logo sou recebida pelo perfilado, que vem da sala de estar acompanhado pela esposa. A cuia do chimarrão e o tradicional sotaque não deixam mentir sua naturalidade. Gentilmente me convidam para entrar, passo pela cozinha e pela sala de jantar. Um cômodo grande forrado com piso de madeira extremamente brilhante, polido a cera. Chegamos à sala de estar, na qual sou convidada a sentar-me. A decoração e a mobília de cor clara tornam o local acolhedor. Oferecem-me chimarrão, como não aceito, a cuia é cheia novamente e passada à esposa. Enquanto a filha pinta seus desenhos no quarto ao lado, a sogra faz crochê com uma linha de lã rosa sentada em um “puff ” mais ao canto. Ele e a esposa se acomodam no sofá. Marcos Jaboski, 32 anos, é coordenador de sustentabilidade do Santuário Santa Paulina e com frequência é confundido com a figura de um padre. Tem semelhança e jeito de padre, mas, não é. Carrega dentro de si e na aparência marcas de um passado do qual não se arrepende. Foi frei franciscano durante sete anos. A pergunta inicial o faz mergulhar nas memórias e em instantes voltar a sua infância. “Desde a minha infância eu já percebia a vocação, mas meu sonho era ser locutor”. Marcos atuava como leigo em sua comunidade na capela perto de casa, e seu pai tinha o hábito de ouvir missas pelo rádio. Até que um dia se deu conta, “mas, bah, padre também fala em rádio”. Estava no ensino médio quando teve seu primeiro contato com o religioso que o incentivaria - Frei Gastão, “fui o único da escola a ir falar com ele”. Foi então convidado para viver uma experiência no seminário. “Na época eu namorava uma menina da escola”.

Mauren, Marcos e Marina: o trio surgido de uma virada do destino

seguinte, foi dividir apartamento com um amigo e lá viveu durante um ano. Graças a sua formação franciscana, a faculdade de filosofia com habilitação em psicologia, em teologia e em história, e com a indicação de um frei para um colega empresário, ficou apenas três dias desempregado. Se tornou coordenador de projeto de uma instituição de ajuda a crianças em situação de violência. Pouco tempo depois chegou a coordenador de sustentabilidade, um cargo importante ocupado durante seis anos. Até receber uma proposta de trabalho na cidade de Nova Trento, onde reside até hoje. Ocupando um cargo alto na instituição, Marcos se relacionava com diretores e executivos. “Mantive a minha simplicidade, andava de camiseta e sandália”, até que um dia o chefe o chamou para conversar e lhe disse que ele precisava se vestir melhor. “O Marcos não tinha noção de valores. Era muito difícil fazer ele comprar alguma coisa”, Mauren conta. Marcos precisou mudar a maneira de vestir. “O diretor até indicou uma loja para ele, era uma ‘Dudalina’ da vida”. Maurem diz que compraram tudo o que precisava, calças sociais, camisas, gravatas, ternos e sapatos. “Quando chegou a hora de pagar, o Marcos queria devolver tudo. Parcelamos e foi aí que ele começou a ter noção”. Mauren constata que hoje ele consegue ser menos avesso a compras, mas ainda é muito ‘seguro’. “Ainda assim se depender dele, ele não compra roupas, mas para a Marina ele é capaz de dar a própria roupa”. Marina é a filha que realizou em Marcos o sonho da paternidade. Quem o vê agora, enxerga um homem alto, poucos cabelos, óculos discretos sem armação. Bem vestido, sempre com roupa social.

Quem conhece a história dele percebe que muito da aparência vem de uma esposa dedicada e cuidadosa. Mulher determinada que conquistou o frei e esteve sempre ao seu lado, auxiliando-o na adaptação à vida de leigo. Quem percebe o jeito calmo, paciente e consciente de Marcos, reconhece nele uma pessoa bem instruída. Quem convive com ele, sabe que a essência é, e sempre será, franciscana, “ex-frei, mas franciscano para sempre”.

O desejo dela – “eu quero, mas ele não se decide” Embora bem decidido em relação a sua mudança de vida, uma questão ainda ficou pendente. Apesar de viverem juntos há mais de cinco anos, Marcos e Mauren não são casados na igreja. É um desejo dela e também um desejo da mãe dele. A sogra, que havia ficado no “puff” concentrada nos pontos de crochê durante toda a conversa, só se manifestou quando o assunto foi o casamento. “Eu não ia falar nada, mas a sua mãe me disse que é um sentimento dela de ter ver casando”. Entre uma conversa e outra, Mauren diz que sonha em casar de véu e grinalda. “A mãe dele nos deu um prazo de dois anos”. Marcos gargalha, desconfortado, e diz estar liberado para casar. A sogra encerra o assunto:“Só não casa porque não quer”.

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Vanguarda

MAWACA: o mundo todo dentro do Brasil Um grupo que canta músicas do mundo todo, com o jeitinho brasileiro Filipe Leandro Serpa e Elizabeth Figueredo

M

uito além do samba e do sertanejo. Um grupo totalmente brasileiro que representa as mais variadas culturas do mundo, através de musicais apresentadas por um conjunto. Do inglês ao mandarim; o repertório do MAWACA é diverso. Nada pode representar melhor o espírito deste projeto que o seu próprio nome. Magda Pucci, fundadora e diretora musical do Mawaca, foi a responsável pela escolha. Ela explica: “Quando a gente começou, queria um nome. Bom, ficamos dois anos sem. E aí, eu, procurando nos meus livros, nas minhas coisas, descobri esse nome mawaka, que significa cantores, na língua Hausa, que os cantores evocam espíritos, mas fiquei meio encanada, porque era uma coisa africana. Mas, depois, descobri, em outras línguas, como na japonesa, indígena, latino americanas, que significa: canto sagrado. E acho que foi uma coincidência muito boa.” Entretanto, não quiseram eles se limitar a apenas uma cultura com a escolha deste nome. Como mencionou Magda, Mawaca tem origem na língua Hausa e é, originalmente, escrito com k: Mawaka. O site oficial do grupo traz a explicação para a substituição da letra k pela c: “Diante de tantos significados e possibilidades linguísticas, o grupo troca o “k” pelo “c”, abrasileirando a grafia do termo, e firma seu nome definitivo MAWACA com o desejo de que todos esses sentidos inspirem sua música.” (Informação retirada do site www.mawaca.com.br).

Integrantes

Fotos: Arquivo Pessoal Grupo Mawaca

O projeto, fundado por Magda Pucci em São Paulo em 1995, se iniciou de maneira cautelosa. Uma formação que reunia apenas amigas. A ideia, com certeza, veio de Magda, que começou a juntar quem sabia cantar para formar um grupo. Com o tempo, as amigas foram se separando e o grupo deixando de existir. Alguns imprevistos aconteceram. Gravidez, viagens, objetivos diferentes, fizeram com que a formação inicial, bem como o grupo, fosse desfeito. A única que permaneceu foi a fundadora, Magda. Se vendo sozinha, mas com vontade de continuar o projeto, a cantora iniciou uma série de testes para a formação de uma nova equipe de músicos. Com os testes, entraram para o projeto Mawaca algumas pessoas, das quais, Cris, Zuzu e Sandra permanecem até hoje. Com o tempo, os integrantes foram sendo substituídos. Hoje, o grupo conta com sete cantoras e seis músicos. Cris, uma das participantes do projeto que entraram no primeiro teste e permanecem até hoje, tem uma história interessante. É moradora da cidade de Bombinhas e, como o grupo ensaia em São Paulo, tem que se desdobrar para poder continuar. Ela veio para Bombinhas em 2002 para fazer um curso e seu objetivo era permanecer por, no máximo, três meses. O planejamento se alterou. Foi aprovada e se efetivou como professora de Artes na cidade, onde reside até hoje. Mesmo parecendo difícil, Cris continuou no grupo. Ela nos contou como consegue conciliar a profissão de professora com a de música: “Muitas vezes os shows com o Mawaca acontecem nos finais de semana, o que facilita bastante. Quanto aos ensaios com o grupo, recebo tudo pela internet, o que virou um grande facilitador.”

DNA multicultural O projeto Mawaca contém apenas integrantes brasileiros. Mas o repertório é variado, eles não se encaixam em nenhum gênero musical nacional, como diz a própria fundadora. Mawaca é um exemplo explícito da cultura nacional, onde podemos ver um multiculturalismo. Suas músicas buscam sempre mesclar gêneros nacionais com internacionais, criando algo novo, algo impensado. Podemos ver este estilo musical próprio, nas letras de suas músicas. “Tavadurumindo Cangoma me chamou Disse levanta povo cativeiro já acabou Sanda Kroma Sansa Kroma Nena yokekekokomba SansaKroma Nena yokekekokomba” (Música Cangoma me chamou - Mawaca). O professor do Instituto Federal Catarinense – campus Camboriú, Lenildo Gomes, Mestre em Educação com especialidade em Música; Movimentos Sociais e Educação, avalia a importância do trabalho de um grupo como o Mawaca: “Pra mim, essa é a esperança de que a globalização que a gente vive tome um outro rumo e que os meios tecnológicos que estão aí, como a informática, por exemplo, que permitiram esse domínio do mundo pelo capitalismo, permitam, então, a existência de grupos como esse, que buscam outra forma de compreensão do mundo, através do multiculturalismo.” A música tem um papel fundamental na interação de grupos com diferentes realidades sociais. O projeto Mawaca traz, através de suas músicas, uma chance de que estes grupos possam se encontrar de alguma maneira. Suas apresentações correm o mundo todo e, principalmente, o Brasil, indiferentemente da cultura local. O grupo se apresenta por diversos lugares no mundo. Participam, na maioria das vezes, de eventos em que são convidados ou em que conseguem ser aprovados em testes de seleção No Brasil, exibem-se em teatros e em alguns eventos privados. Mesmo com uma integrante vivendo em Santa Catarina, o grupo nunca fez uma apresentação aqui. Magda revela ter grande interesse em fazer um show para os catarinenses, em breve: “Estamos estudando a hipótese de nos apresentar em Floripa há algum tempo. Assim que surgir uma oportunidade, estaremos aí.” Resta aguardar.

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Cobaia

Itajaí, julho/agosto de 2014


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