Jornal Cobaia 112

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Jornal

Cobaia

Disputa pelo bem do mar

JORNAL LABORATÓRIO DO CURSO DE JORNALISMO DA UNIVALI Itajaí, abril de 2012 Edição 112 Gratuito

Tradição, cultura e sustentabilidade marcam a história de Bombinhas, antiga vila de pescadores no litoral catarinense

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Ieda Funari

Categoria Batom

Memória

Pingue-pongue Fernando Castellon Filho

Morgana Bressiani

Wagner Heinzen

Sônia Moroso

Itaipava preserva história do trem

Jovens em pistas de velocross

“Tenho a impressão de que aceitar a felicidade como ela é, e ter coragem para assumir essa postura, causa mais inveja do que preconceito”

Documentos sobre a linha férrea, que partia de Itajaí e subia o Vale, estão reunidos no Museu Etno-Arqueológico da Estação Vereza

Uma vez ao mês, elas se reúnem para conversar, rir e correr, em meio à poeira e à lama, sobre motores de duas rodas

Ombudsman

08 e 09

10 e 11

Aquele que procura e a difícil tarefa de apreender o mundo

04 e 05

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Ombudsman

Editorial

De cara nova em 2012

Jane Cardozo da Silveira*

Vera Sommer*

E

is, finalmente, a primeira edição do jornal laboratório em 2012. Ele chega às mãos de você, caro leitor, com inúmeras mudanças. Uma das mais evidentes diz respeito ao projeto gráfico, sob a responsabilidade da estagiária Raquel da Cruz e minha coordenação. E conta com a ajuda da equipe de professores e alunos da IN – Agência Integrada de Comunicação. Este Cobaia circula com matérias sobre a vida na Univali e fora dela, enfocando questões de interesse das comunidades local e regional no Vale do Itajaí. Em comemoração ao Dia Internacional da Mulher, dia 8 de março, esta edição traz uma entrevista, em formato pinguepongue (pergunta-resposta), com a juíza Sônia Moroso, da 1ª Vara Criminal da Comarca de Itajaí. Personalidade feminina de destaque tanto no combate à violência e aos maus tratos

cometidos contra a mulher e a criança quanto na luta pelo direito de qualquer ser humano à felicidade. Outra reportagem especial reflete sobre a realidade da mulher catarinense no século

Fica esperto!

Ele chega às mãos

de você com inúmeras mudanças no projeto gráfico

Homenagem da Imprensa à jornalista Mônica Waldvogel

A oitava edição do Troféu Mulher Imprensa destaca Miriam Leitão, do jornal O Globo, como recordista de premiações, superando a marca de Lucia Hippolito, cinco vezes vencedora na categoria ‘Comentarista/Colunista de Rádio’. Destacamse também Monalisa Perrone e Tatiana Vasconcellos, que mantêm, respectivamente, a liderança nas categorias ‘Repórter de Telejornal’ e ‘Âncora de Rádio’ desde a sexta edição do prêmio. Daniela Pinheiro conquista o título de bicampeã, também vencedora da quarta edição, na categoria ‘Repórter de Jornal ou Revista’. Já a jornalista Mônica Waldvogel recebe homenagem especial com o Troféu Mulher Imprensa de Contribuição ao Jornalismo, pelo trabalho desenvolvido ao longo de sua carreira. Aliás, ela é a principal entrevistada da revista Imprensa de março de 2012, em que conta, por exemplo, para a gerente de jornalismo Thaís Naldoni e a Denise Bonfim, que: “Se não tiver aquele caderninho na frente, tenho a sensação de nudez, de estar despreparada. Acho que essa é a sensação de foca que se recusa a morrer dentro de mim”.

Campanha na Univali conscientiza sobre a violência contra a mulher

Quem circula pelos blocos da Comunicação, da Univali, aprende uma conjugação diferente do verbo amar: “Eu cuido, tu cuidas, ele cuida... Todos cuidam”. A ideia, divulgada na forma de cartazes, faz parte de uma campanha interdisciplinar sobre a violência contra a mulher. Iniciativa de um grupo de alunos dos cursos de Relações Públicas, Jornalismo e Publicidade e Propaganda. Para Isadora Dutra, uma das envolvidas no projeto, “apesar das inúmeras iniciativas nesse sentido, a violência sofrida pelas mulheres ainda é muito grande”. O número para fazer denúncias é 181.

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XXI: branca, urbana e assalariada na busca por oportunidade profissional e realização pessoal. Este Cobaia também apresenta a Volvo Ocean Race, etapa latina da maior regata do mundo, que movimenta a economia e o turismo na cidade até 22 de abril; e destaca o Festival de Música, que estreia no dia 12 com show gratuito do Paralamas do Sucesso, e segue até dia 19 com a presença de vários artistas locais e nacionais. Além disso, na coluna Agenda, informa sobre outros espetáculos culturais na região. Boa leitura, caro leitor, e até a próxima edição!

*Editora Reg. Prof. 5054 MTb/RS

Prêmio ACIF de Jornalismo Jornalistas profissionais interessados em participar da segunda edição do Prêmio ACIF de Jornalismo têm até o dia 6 de abril para se inscreverem. Este Prêmio vai destacar as melhores matérias sobre Negócios e Associativismo e Participação em Florianópolis. Para concorrer, devem acessar o novo portal da entidade, www.acif.org.br, realizar a inscrição e, conforme orientação, cadastrar as matérias – no máximo duas de sua autoria. Os originais devem ser enviados pelos Correios ou entregues na sede da ACIF, até a data final para inscrições. Só poderão participar profissionais com registro e as matérias em todas as categorias devem ter sido veiculadas no período entre 28 de novembro de 2011 a 6 de abril de 2012. Os vencedores vão ganhar laptops e o Prêmio Especial levará R$ 5 mil em dinheiro. Todos os finalistas também irão receber assinatura semestral da Revista Líder Capital, publicação institucional da entidade. O Prêmio ACIF de Jornalismo tem apoio da Associação Catarinense de Imprensa (ACI), do Núcleo de Mídia Regional da ACIF, da Associação Catarinense de Emissoras de Rádio e Televisão (Acaert), da Associação dos Diários do Interior (ADI) e da Associação dos Jornais do Interior (Adjori).

Seminário de Propaganda em SC A Univali é uma das oito instituições que confirmaram sua contribuição ao Seminário Catarinense de Propaganda a ser realizado em novembro próximo, em Florianópolis. Univali, Anhanguera/Uniban, Assesc, Estácio de Sá, Furb, Uniasselvi, Unidavi e Unisul apoiam a iniciativa divulgando o evento junto aos alunos e indicando de professores para avaliação dos trabalhos selecionados. O professor Marcelo Juchem representa a Univali, enquanto os professores Rafael José Bona e Elói Simões, respectivamente, a Furb e a Unisul. O grupo de revisores será definido até o final de abril, e os trabalhos poderão ser inscritos até agosto.

JORNAL COBAIA

Aquele que procura e a difícil tarefa de apreender o mundo

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ada é mais desconhecido que o tempo presente. O passado é o já visto e, portanto, têm-se elementos para avaliá-lo, virá-lo pelo avesso, entendê-lo. O futuro é o presumível: pretendido ou temido, admite-se ignorá-lo. Agora, o presente, este é o que nos interroga em busca de respostas imediatas. Quer-se dar a conhecer e é nossa obrigação – a dos jornalistas – atendê-lo em sua urgência. Aí reside o problema de narrar o que se desenrola: temos de fazê-lo no calor do acontecimento, tentando seguir o curso das coisas, enquanto a poeira nos vela os olhos e cuida para manter indefinidos os contornos. Pensando sob esse prisma, fica mais fácil entender por que nós jornalistas erramos tanto. Ou, para fazer justiça à categoria, melhor dizer: por que acabamos sendo acusados de tantos erros. Ora, somos obrigados a trabalhar com uma realidade complexa, cheia de nuances e entrelinhas, filigranas, detalhes, elos frágeis da corrente de sentidos que precisamos tecer, mas que de repente se rompem. E lá vamos nós, entre erros e acertos, tropeços e saltos, contando histórias sobre as quais se espera que lancemos luzes. Mais que isso, exige-se que nós transformemos um emaranhado de fatos em narrativas compreensíveis. Diante de tão complexa empreitada, é natural irmos buscar apoio entre os pares. Foi com essa intenção que se criou a figura do ombudsman. O termo é um estrangeirismo que remete ao “homem que procura”, ou aquele que analisa e avalia as matérias acolhendo elogios e críticas e encaminhando sugestões de melhoria à equipe do jornal. É isso que a coluna passará a fazer a partir da próxima edição do Cobaia. Muito embora nesses tempos pós-modernos não é obrigatório nem necessário que a procura seja feita por um homem. A exemplo do que acreditava Bertrand, espera-se que o trabalho motive nossos acadêmicos a apurar as técnicas, afinar os sentidos, apreender o mundo.

*Jane Cardozo da Silveira é jornalista. Formada há 28 anos, está no Curso de Jornalismo da Univali desde 1994.

Espaço do Leitor Tem algum assunto que você gostaria de ler nas próximas edições? Conte-nos! E-mail: cobaia@univali.br

Expediente JORNAL LABORATÓRIO DO CURSO DE JORNALISMO DA UNIVALI Itajaí, março de 2012. Distribuição gratuita IN - Agência Integrada de Comunicação EDIÇÃO Vera Sommer Reg. Prof. 5054 MTb/RS FOTO PRINCIPAL DE CAPA Ieda Funari PROJETO GRÁFICO Raquel da Cruz DIAGRAMAÇÃO Raquel da Cruz GRÁFICA Grafinorte TIRAGEM 2 mil exemplares DISTRIBUIÇÃO Nacional

Itajaí, abril de 2012


Volvo Ocean Race

Sucesso de público na Vila da Regata Parada em Itajaí da Volvo Ocean Race agita a economia e o turismo da cidade e região

Da redação*

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ais de oito mil pessoas visitaram a Vila da Regata na tarde desse domingo de Páscoa. Uma mostra do sucesso da etapa sul-americana da Volvo Ocean Race (VOR), que movimenta a economia e o turismo de Itajaí e região. De acordo com organizadores do evento, já na Sexta Santa, 35 mil pessoas recepcionaram os barcos Puma e Telefónica, que chegaram da Nova Zelândia. Essa é considerada a segunda maior marca de público aguardando as embarcações em toda a história. A melhor foi no mês passado, em Auckland, a chamada Cidade das Velas, onde registraram a presença de 47 mil visitantes. São 18 dias com diversas atrações gratuitas para moradores da Itajaí, turistas e participantes de regata. Para abrigar o evento, que começou no dia 4 de abril e seguirá até o dia 22, uma estrutura especial foi montada por mil funcionários. Este contingente asfaltou a área, construiu o píer, o auditório e ainda trabalhou na acústica do Centreventos, preparando o paisagismo, a iluminação e a eletricidade na Vila, que comporta a estrutura padrão da Regata Internacional feita de contêineres. A Prefeitura e o

Porto ficaram responsáveis pela colocação de placas de direcionamento, novas calçadas e iluminação, dando à cidade uma cara nova e moderna. Realizada a cada três anos, a VOR conta com velejadores de diversos lugares do mundo que aceitam o desafio de competir no mar durante quase nove meses, até o destino final, Galway, na Irlanda, em 8 de julho de 2012. A regata passa por 10 países diferentes e em sua equipe há ex-velejadores, operários, voluntários, e expositores. Rota pelo mundo: a competição mais longa do mundo tem um total de 39.270 milhas náuticas, que correspondem a 72.728 quilômetros. Os velejadores cruzam os quatro oceanos (Atlântico, Pacífico, Índico e Antártico), passando por cinco continentes (Europa, Ásia, África, América do Sul e Oceania): Alicante (Espanha) - Cidade do Cabo (África do Sul) - Abu Dhabi (Emirados Árabes Unidos) - Sanya (China) - Auckland (Nova Zelândia) - Itajaí (Brasil) - Miami (Estados Unidos) - Lisboa (Portugal) - Lorient (França) - Galway (Irlanda). Fique ligado: o evento oferece à população atividades gratuitas: shows nacionais, cinema 3D,

Festival de Música na onda da Volvo Ocean Race

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Itajaí, abril de 2012

Público recorde, de 35 mil pessoas, recepcionou os primeiros barcos da etapa em Itajaí apresentação de festas locais, palestras com convidados especiais, Náutica Show, orquestra sinfônica, visitas monitoradas e

muito mais. A Vila da Regata e o Centreventos recepcionam todas as atividades. Mais informações: http://

Programação completa: Dia 12 – Paralamas do Sucesso Abertura Festival de Música Local: Vila da Regata – 20h30 Entrada franca

Maria Isabel Schauffert* Fundação Cultural, em parceria com o Conservatório de Música Popular, inova este ano e produz o Festival de Música em paralelo à regata Volvo Ocean Race. Considerado o maior evento de gênero musical do estado e um dos maiores no país, acontece agora em abril justamente para se projetar internacionalmente. A 15ª edição oferece 36 opções de oficinas, com 800 vagas para aperfeiçoamento musical. Há 14 anos, as oficinas focavam apenas no vocal e instrumental dos músicos, mas agora estão mais amplas e abrangem a parte empre-

Divulgação

sarial. Permitem, por exemplo, que os interessados aprendam a comercializar suas músicas. Haverá também cinco shows nacionais, com a abertura e o encerramento com entrada franca na Vila da Regata. As outras apresentações estão programadas no Teatro Municipal de Itajaí, com ingressos a R$30,00 (inteira) e R$15,00 (meia). Para fazer inscrição nas oficinas e obter mais informação, basta acessar o site http://festivaldemusica.itajai.sc.gov.br.

Dia 13 – Nando Reis e Os Infernais Local: Vila da Regata – 20h30 Entrada franca Dia 14 – Cidade Negra Local: Vila da Regata – 20h30 Entrada franca Dia 15 – Família Caymmi Local: Vila da Regata – 19h Entrada franca Dia 16 – Alessando Penezzi & Alexandre Ribeiro Festival de Música Abertura: PERCUSAX Quinteto Local: Teatro Municipal de Itajaí – 21h R$ 30,00 (inteira) e R$ 15,00 (meia)

www.volvooceanraceitajai.com/ programacao. *Colaboração de Maiara Moura, Relações Públicas, 7º período

Dia 17 – Azymuth & Hélio Delmiro Festival de Música Abertura: Ricardo Capraro e Grupo Local: Teatro Municipal de Itajaí – 21h R$ 30,00 (inteira) e R$ 15,00 (meia) Dia 18 – Kleiton & Kledir (Festival de Música) Abertura: Semba Trio Local: Teatro Municipal de Itajaí – 21h R$ 30,00 (inteira) e R$ 15,00 (meia) Dia 19 – Mart’nália Encerramento do Festival de Música Local: Vila da Regata – 20h30 Entrada franca Dia 20 – Jorge Aragão Local: Vila da Regata – 20h30 Entrada franca Dia 21 – Dudu Nobre Local: Vila da Regata – 20h30 Entrada franca Dia 22 – Olodum Local: Praia do Atalaia/ Molhe – 11 horas Entrada franca

*Jornalismo, 2º período

JORNAL COBAIA

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Categoria Batom

Jovens encontram adrenalina e prazer em pistas de velocross

Morgana Bressiani

Elas reúnem-se, uma vez ao mês, para conversar, rir e correr em meio à poeira e à lama, sobre motores de duas rodas Morgana Bressiani*

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alto alto, maquiagem, joias, produtos de beleza. Nada disso tem lugar entre as coisas das meninas que competem a Copa Serra Litoral de Velocross. Ainda enlameadas, resultado do último treino da tarde, elas se reúnem na barraca de uma das corredoras para conversar, jogar baralho, trocar dicas sobre a corrida do dia seguinte. Essas mulheres estão mais interessadas na velocidade de suas motos ou em melhorar o tempo do percurso, do que em novelas e revistas. São mães, filhas, estudantes, trabalhadoras de diversas áreas que, durante um final de semana por

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mês esquecem tudo e se tornam pilotos da categoria Batom, categoria dedicada só para elas. No grande acampamento que se forma em torno da pista, onde se reúnem os mais de 270 corredores do campeonato e suas famílias, não há espaço para luxos como água quente, televisão, ar condicionado, ou camas confortáveis. Ninguém se importa muito com isso. O Campeonato que está em sua terceira edição, é feito de grandes amigos. Os corredores percorrem as barracas como se não houvessem barreiras ou adversários. Caminham de lá para cá, desejando sorte, ajudan-

do a consertar uma moto aqui e ali, dando e recebendo conselhos de como fazer uma boa corrida. As corredoras, em sua maioria, antes acompanhavam pais, namorados, maridos e acabaram se apaixonando pelas pistas também. Como toda regra tem sua exceção, em alguns casos, é a corredora que move a família até a corrida. Esse é o caso de Julia Polmann. Caçula de dois irmãos, por mais bonecas que ganhasse nunca se interessava por elas. Queria estar sempre junto do irmão mais velho, Braian, subindo em árvores, fazendo trilhas no mato, acampando. Era sempre

uma vitória quando a mãe a deixava jogar bola na rua até tarde. O amor pelas motos veio aos 13 anos, quando os irmãos ganharam motos de corrida de Natal. Para sua infelicidade, ganhou um computador. Dali em diante, passou a ajudar os irmãos a consertar as motos, depois de disputar corridas que faziam entre si. E, se alguém perguntasse, se ela queria dar uma volta, ela estava sempre pronta. “Eu nunca quis tanto uma coisa quanto aquelas motos. Fazia qualquer coisa para que um dos meus irmãos me deixasse dar uma volta.” A insistência com os

As corredoras, em sua maioria, eram apenas acompanhantes de pais, namorados e maridos, antes delas se apaixonarem também pelo esporte

JORNAL COBAIA

irmãos não passou batido aos olhos do pai, Junior Polmann, que, além de presenteá-la com uma moto, passou a incentivá-la a treinar e participar de torneios pequenos, em Urubici, onde moravam na época. Um ano depois, em sua primeira corrida, Julia competiu contra 20 homens adultos, não profissionais, mas com alguma experiência, largando na 16ª posição e chegando em primeiro lugar. A ideia de correr em um campeonato maior só veio quando o grupo, que corria na cidade, não aceitou mais as inscrições dela. Alegaram que a menina era boa demais para correr com amadores, o que não dava chance para outra pessoa vencer. Aos 15 anos, Julia participou da primeira Copa Serra Litoral, e logo se tornou a preferida nas categorias Batom, para meninas, e Junior, para qualquer piloto menor de 17 anos. “A primeira corrida que ganhei foi mágica. Eu percebi que não poderia fazer outra coisa na minha vida, que eu tinha nascido para passar pela chegada.” Renata Vandresen, a assistente social, amiga de Julia e também corredora, está acostumada com o terceiro lugar. Para ela, o velocross é uma distração para a correria do dia a dia. “É como uma válvula de escape. Uma vez por mês, eu venho até as pistas e esqueço de todo o resto. Só eu, a moto e a pista... E as outras corredoras, claro”. As meninas do velocross, tan-

Itajaí, abril de 2012


Categoria Batom Jovens encontram adrenalina e prazer... to as que sonham em, um dia, serem corredoras profissionais ,quanto as que participam apenas porque gostam, enfrentam a mesma dificuldade: encontrar patrocínio. Francis Schweitzer, organizador da Copa Serra Litoral e ex-piloto, garante que, para mulheres, mesmo com grande talento, é muito mais difícil conseguir patrocinadores. “É sempre minha corrida preferida, a categoria Batom. Elas são amigas, uma ajuda a outra. São guerreiras, porque, mesmo sem a experiência de um homem para consertar as motos ou um bom patrocinador para manter os melhores equipamentos, sempre fazem uma ótima corrida.” Essa é a maior dificuldade que Julia vem enfrentando desde que começou a correr. Apesar das frequentes vitórias nas corridas, e de, no ano passado, ter vencido o campeonato, ela ainda não conta com um patrocinador. No domingo, primeiro de abril, ela disputou a segunda etapa desta terceira edição da Copa Serra Litoral, e, ainda este ano, compete no campeonato estadual de velocross. “É um passo enorme para quem não tem patrocinador ou qualquer outra ajuda, mas é isso que fazem os grandes vencedores: vencem os obstáculos.” Com a convicção de que, cedo ou tarde, estará entre os grandes, Julia Polmann continua se dedicando ao máximo à carreira que está só começando. Entre treinos, corridas e acampamentos, ela promete a si mesma que, um dia, será exemplo para outras mulheres. “Algumas pessoas são boas com números, outras em construir coisas. Eu sou boa em pilotar motos, em correr. Por isso tenho que lutar para chegar aonde quero. Todos deviam lutar para alcançar seus sonhos”.

Pequena veloz

Morgana Bressiani

Eu percebi que não poderia fazer outra coisa na minha vida, que eu tinha nascido para passar pela chegada Não é preciso ser muito observador para notar a diferença dos pilotos da categoria 50 cilindradas. Cercados por seu grupo, seus fãs, pai, mãe, avós são todos muitos especiais. O uniforme de corrida, diferente dos outros corredores, é colorido e animado. No meio dos oito participantes, destaca-se a única menina, Maria Eduarda Bylaardt, com macacão preto de bolinhas cor

de rosa, e capacete enfeitado de inúmeras formas. A mãe e o pai são só sorrisos para a filha de apenas sete anos. Dada a largada, Maria Eduarda sorri para uma última foto antes de acelerar a moto, quase grande demais para que os pés alcancem o chão. E, então, vai. Lança-se na pista atrás de outros corredores mirins. Filha de amantes de velo-

cross, ela cresceu em cima das motos, de acampamento em acampamento, de corrida em corrida. Parece conhecer cada curva da pista. A postura é de quem nasceu para correr. Precisa apenas de duas voltas para chegar ao primeiro lugar, quando passa a faixa da chegada, levanta as mãos, sorri para as câmeras e faz pose de vencedora. Maria Eduarda Bylaardt, sete

anos de idade, tem lama dos pés à cabeça. À vista apenas os olhos verdes e o sorriso enorme. Ainda não sabe exatamente o que vai ser quando crescer, mas sabe o que vai ter: muitos troféus de todas as corridas que ainda pretende ganhar.

*Jornalismo, 7º período

Morgana Bressiani

Falta de patrocínio é a maior dificuldade enfrentada pelas meninas que amam o velocross

Itajaí, abril de 2012

JORNAL COBAIA

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Superpoderosa

Mulher catarinense divide-se entre família, casa e trabalho Ela é branca, urbana e assalariada. Apesar da tripla jornada, pretende se aperfeiçoar e abrir seu próprio negócio Raquel da Cruz*

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evanta às seis da manhã, toma café, faz uma breve arrumação na casa e se despede do marido Narciso e do filho Djoni. Já são sete horas. Pega o material de trabalho e vai até o ponto de ônibus, bairro Machados, em Navegantes. Após alguns minutos, chega ao ferry boat, e faz a travessia até a Rua Hercílio Luz, em Itajaí. É ali, no calçadão, que começa a jornada, vendendo cartões de loteria estadual. Divide-se entre o lar e o trabalho, de segunda a sábado. Chega em casa sempre depois das 19 horas. Aos domingos, vai à igreja, onde participa de cultos e retiros. Além de exercitar o lado espiritual, sua maior distração é assistir ao trabalho de Djoni, que é músico. “Saio daqui [do calçadão], chego em casa, tomo banho e prestigio meu filho. É meu jeito de demonstrar carinho, já que não posso passar o dia com ele”. Essa é a rotina de Sílvia Lígia Vilvert, de 44 anos, mas poderia ser a de tantas outras catarinenses que trabalham fora e cuidam da casa e dos filhos. O último censo oficial realizado pelo Instituto Brasileiro de Geografia e Estatísticas (IBGE), em 2010,

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informa que 22,39% das mulheres, no estado, estão à frente da família. Para o professor Sérgio Saturnino Januário, do Instituto de Pesquisas Sociais (IPS), da Univali, esse número teve um avanço extraordinário. “Nos anos 80, elas eram apenas 5%, hoje são quase um terço do total”. Apesar do crescimento, o número não acompanha a proporção entre homens e mulheres no mercado de trabalho, respectivamente de 55% e 45%. Sílvia, como a maioria das mulheres que vivem em Santa Catarina, é branca, mora na área urbana e tem baixa renda. O que o perfil traçado pelo IBGE não revela são os seus desafios e projetos. Com apenas o primeiro ano do colegial completo e o marido com problemas de saúde, ela quer se qualificar profissionalmente e ter um emprego registrado. “Só não arranjei tempo ainda, mas quero voltar a estudar. Quem sabe, um dia, possa até abrir o meu próprio negócio”. Esse acúmulo de funções assumidas pela mulher dificulta sua ascensão profissional. Quem explica é a professora Antônia Egídia de Souza, que estuda a si-

tuação feminina no mercado há 10 anos e, recentemente, coordenou um estudo sobre o retrato da mulher em empreendimentos sociais. “A empresa que precisa escolher entre um homem e uma mulher, vai contratar o homem, porque sabe que a mulher precisa sair no horário certo para buscar o filho na escola. E se a criança fica doente, é a mãe quem a leva ao hospital. Fora a licença de seis meses, caso ela engravide”. Já, para o professor Sérgio, as mudanças na cultura estão acontecendo de tal forma, que este tipo de situação tende a não acontecer mais ao longo dos anos. “Podemos até mudar o nome de licença maternidade para criacionista, pois não apenas a mãe tem essa função agora”. Para ele, a própria criança não enxerga mais essas atribuições próprias da figura materna. Hoje os papéis entre os pais se completam. No início de março deste ano, o Senado aprovou projeto de lei que prevê multa às empresas que pagarem menos às mulheres, quando ocuparem a mesma função que a dos homens. Para que a lei entre em vigor, basta

a sanção da presidente Dilma Rousseff. Isso, segundo Sérgio, é um grande avanço, porque não se trata de uma lei feminista, mas uma lei de gênero. “As pessoas vão ser remuneradas pela função que exercerem. Tanto o homem quanto a mulher vão poder cobrar”. O professor reconhece que haverá problemas de fisca-

Quem vai fiscalizar [a lei contra a diferença salarial]? O Estado já não dá conta do que tem.

lização para seu cumprimento, mas acredita que, aos poucos, essa democracia de gênero será incorporada de forma natural. Em contrapartida, a professora Antônia acredita que a lei

reconhece o problema, mas não a vê como solução. “Quem vai fiscalizar isso? O Estado já não dá conta do que tem [fiscalizar]. E a mulher, enquanto estiver na empresa, não vai denunciar, por medo de represália”. A pesquisadora avalia que isso não acontecerá nos próximos anos, pois o Brasil está crescendo. Aliás, ela entende que poderá dificultar ainda mais essa situação. “Em momentos de desemprego, vão contratar homens”.

Divisão de tarefas

Seja como empregada, com renda de até um salário mínimo, ou como dona de algum negócio, uma coisa é certa, a mulher atual se difere em muitos aspectos daquela de alguns anos atrás. É o caso de Juliana Régis Spricigo que, aos 31 anos, é formada em Turismo e Hotelaria, sócia em um restaurante, casada e mãe de três filhos, respectivamente com 11 anos, três anos e um bebê de quatro meses. “Entro no restaurante às 8 da manhã, sem hora para sair. Chego em casa tarde, cansada. Mas é o único momento, durante a semana, que posso estar com meus filhos. Por isso, sento para

Raquel da Cruz

Só não arranjei tempo ainda, mas quero voltar a estudar. Quem sabe, um dia, possa até abrir o meu próprio negócio

Sílvia Vilvert trabalha de segunda a sábado, oferecendo cartões de loterias para as pessoas que passam pelo calçadão da Rua Hercílio Luz, em Itajaí

JORNAL COBAIA

Itajaí, abril de 2012


Superpoderosa Mulher catarinense divide-se entre família... brincar com eles e ajudar nas tarefas da escola”. Juliana tem empregada em sua casa e confessa que, se precisasse se dedicar aos afazeres domésticos, não conseguiria conciliar as tarefas. “Às vezes, até minha mãe precisa me ajudar, ficando com as crianças, no início da noite”. Apesar dos horários apertados, Juliana considera importante ter um tempo para cuidar

[A mulher] vive um dilema entre o fast food e o padrão, entre o sabor e a beleza

de si. Faz academia três vezes na semana e vai à manicure toda sexta-feira. O professor Sérgio vê esse comportamento como uma das preocupações da mulher do século 21, em que ela tenta seguir um padrão de beleza que não condiz com seu dia a dia. “Ela [a mulher] vive um dilema entre o fast food e o padrão, entre o sabor e a beleza”.

Itajaí, abril de 2012

O marido de Juliana e os filhos dizem compreender sua rotina e aproveitam os finais de semana para estarem juntos. E ela justifica que apenas com a renda do marido, não dá para ter uma vida tão confortável. “Por isso, eu trabalho, mas procuramos nos curtir ao máximo agora, porque esse tempo da infância deles [dos filhos] passa muito rápido”. Para a psicóloga Jussara Eberhardt Vieira, esse tipo de situação exige mais participação do pai, melhorando a relação familiar e a educação dos filhos: “Antes, o pai só entrava nas questões de disciplina e autoridade”. Ela acredita que as crianças se sentem mais protegidas se receberem atenção do pai e da mãe, mesmo em menor tempo. “O importante é a intensidade, mesmo que sejam poucas horas. Por isso, é preciso ter flexibilidade e não culpa”. Seguindo essa ideia, a empreendedora Juliana quer cursar Nutrição, área de que gosta e por que se interessa. “Quando comecei o curso, fiquei grávida do Dudu e tive que trancar. Agora, estou só esperando ele crescer mais um pouquinho para poder voltar”. A sócia de Juliana no restaurante, Leonor Bagatolli, 45 anos, também é mãe e enfrenta os mesmos dilemas. “O que acontece é que as mulheres só acumularam funções. A diferença é que agora não há mais tanto machismo, a família já encara essa rotina como uma coisa natural”. Leonor tem dois filhos e trabalha fora o dia inteiro.

*Jornalismo, 3º período

JORNAL COBAIA


Pingue-pongue

SÔNIA MOROSO Fernando Castellon Filho*

U

m livro sobre a lei de combate à violência contra a mulher, a Lei Maria da Penha, chama atenção em meio às pastas de processo que ocupam, organizadamente, parte da mesa da juíza Sônia Maria Mazzetto Moroso. Vasos de flores dão um toque feminino e acolhedor à sala da primeira Vara Criminal de Itajaí, onde ela recebeu a reportagem do jornal Cobaia para um bate-papo sobre a mulher do século XXI. Além de juíza, Sônia é madrinha da Oscip Estrela de Isabel, uma entidade sem fins lucrativos, com ações na área da infância e juventude, do idoso e de combate à violência doméstica, especialmente contra as mulheres. Para compartilhar um pouco do seu dia a dia, das experiências de vida e de sua luta social, o Cobaia escolheu-a como entrevistada especial para esta edição de março, em homenagem à mulher. Fernando Castellon Filho

Cobaia - A juíza é reconhecida nacionalmente pelo trabalho em prol de causas sociais, que, aliás, será tratado nessa entrevista, bem como pelo trabalho como magistrada no fórum. Mas, afinal, quem é a mulher Sônia Moroso?

Sônia Moroso - Um ser humano como todos os demais que passa por esta vida, realizando algumas obras sociais.

Tenho a impressão de que aceitar a felicidade como ela é, e ter coragem para assumir essa postura, causa mais inveja do que preconceito

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Cobaia - Como surgiu a motivação, e qual o caminho trilhado até chegar a juíza?

Sônia Moroso - Desde pequena, sempre tive um sentimento de inconformismo com relação às injustiças, e desejei ter conhecimento da lei para poder me posicionar nas mais variadas situações. Durante a faculdade, então, consolidouse esse desejo de trabalhar na Magistratura. Sou juíza por vocação.

Cobaia - Li que você se tornou juíza muita nova. Como era a aceitação dos colegas de trabalho e da própria sociedade?

Sônia Moroso - Em alguns poucos momentos, bem no início de minha carreira, percebia que as pessoas se sentiam inseguras ao se depararem com uma mulher-juíza e, ainda mais, com pouca idade. Os filmes americanos trazem sempre um homem-juiz e mais velho, o que explica esse sentimento. No entanto, com o desenvolvimento do trabalho, as pessoas acabavam percebendo que não havia nenhum problema e o receio era infundado. Um receio, aliás, originado no preconceito de que a juventude não está aliada à competência.

Cobaia - Sua família a apoiou?

Sônia Moroso - Sempre fui apoiada pela família em rela-

ção ao meu trabalho, tanto por meus pais e irmãos, como pelos amigos e, agora, incondicionalmente, por minha companheira.

Cobaia - Como é seu dia a dia na profissão?

Sônia Moroso - Trabalho muito nas questões jurídicas junto à 1ª Vara Criminal, da qual sou titular. Além disso, tenho família para cuidar e, me dedico, em minhas horas vagas, à Estrela de Isabel, instituição que auxiliei a fundar.

Cobaia - A senhora já atuou na vara cível, família e criminal. Quais as decisões mais difíceis de serem tomadas?

Sônia Moroso - Sem qualquer dúvida é a decisão que declara a perda do poder familiar dos pais em relação aos seus filhos, por questões de negligência, maus tratos, além de outras violências. Reconhecer que a entidade familiar faliu e não há mais vínculo afetivo é muito triste por conta dos envolvidos e, também, por conta do Estado, o qual, em algum momento, deixou sua marca de incompetência. Reconheço, porém, que, em muitas situações, nas quais o Estado fez a sua parte, a falência da entidade familiar ainda predomina.

Cobaia - Ser uma pessoa tão visada, certamente, lhe exige JORNAL COBAIA

alguns sacrifícios com relação a sua vida e a de sua família. Como é essa relação, família versus trabalho?

Sônia Moroso - Tranquila. Alguns cuidados são necessários, mas nada que não se possa administrar.

Cobaia - No imaginário social, um juiz representa força, autoridade e decisão. Como mulher, em casa, você é pulso firme?

Sônia Moroso - Para tudo o que se faz, é necessário bom senso e tranqüilidade. Mesmo com autoridade, a sensibilidade pode conciliar.

Cobaia - Muito se fala na luta por ‘nivelamento’ entre mulher e homem. Você considera que a mulher vem conquistando mais espaço, não só no campo profissional, como social e cultural?

Sônia Moroso - A equiparação de direitos se deve a todo ser humano, independentemente de sexo, credo, cor... É só ler um pouco os noticiários e perceber o quanto estamos longe disso. Veja uma simples definição que retrata o preconceito: VADIA: piranha - mulher que, sem ser necessariamente meretriz, leva vida licenciosa; piranhuda, pistoleira. VADIO: que não tem ocupação, ou que não faz nada; ocioso, desocupado, próprio de gente ociosa. Está no dicionário o preconceito da sociedade. Então, temos

muito a trilhar...

Cobaia - O que falta para se chegar a esse nivelamento? Algum dia, alcançaremos esse objetivo?

Sônia Moroso - É importante sempre cultivarmos o sentimento de fé e esperança. Caso contrário, para que tanto trabalho? Perceba na história quantas conquistas e quanta evolução do ser humano. Havia escravidão, a mulher não votava, não trabalhava fora... O mundo é dinâmico e as pessoas continuam em evolução.

Cobaia - Você é reconhecida pela luta contra a violência, especialmente contra as crianças e mulheres. Esse é ainda um grande desafio para a sociedade atual?

Sônia Moroso - Sempre será enquanto não houver respeito, dignidade, fé, amor e paz. Enquanto as pessoas perceberem a violência e “lavarem suas mãos”, dizendo que nada podem fazer... Enquanto as pessoas avistarem outro ser caído, dormindo ao relento e não se importarem.... Enquanto o sentimento de indignação estiver adormecido, dando margem para o conformismo... Enquanto pretensos pais se candidatarem para adoção somente de crianças brancas, bonitas e sem problemas de saúde... Enquanto

Itajaí, abril de 2012


aceitarmos a corrupção e o preconceito e tantas outras condutas humanas... Enquanto a conduta humana for pautada por valores distorcidos, o desafio permanece latente e as estratégias de enfrentamento à violência serão intermináveis.

Cobaia – Mas, além de punir, é preciso educar para prevenir... Na sua opinião, há um esforço do Estado, do terceiro poder, da mídia e da sociedade em geral nesse sentido? Ou ainda continuamos apenas punindo, mas não tratando a real causa do problema?

Sônia Moroso - O discurso é bonito, mas, em que lugar estão as ações para a educação direcionada? Muitas existem, mas desconexas e isoladas. As escolas fazem o que podem. A própria Polícia Militar tem o programa denominado PROERD... Mas o que mais está em execução de forma contínua e efetiva? Menciono isso em relação às drogas, porque a violência está diretamente ligada à dependência química de drogas lícitas ou ilícitas. É claro que são muitas as motivações para a violência. A droga e o alcool são apenas algumas delas. Entendo que o Estado ainda não faz a sua parte, dando margem ao terceiro setor para a complementação. Na verdade, penso que a sociedade também é responsável pelas demandas sociais. Não é, e nem pode, ser um dever exclusivo do Estado.

O que impede muitas pessoas de aceitarem esses fatos são razões preconceituosas. O mais importante é o caráter e a conduta de cada um, não sua opção sexual

Cobaia - A Lei Maria da Penha foi uma vitória para as mulheres de todo país. Especialmente em Itajaí, como você vê a aceitação e os resultados da lei perante a sociedade?

Sônia Moroso - Penso que há um crescimento, pois já podemos contar com o programa de atendimento e um abrigo para as mulheres que não tem para onde ir, por ocasião da violência. Atualmente, a Univali e a Estrela de Isabel representam um ponto de apoio fundamental, porque o agressor também recebe tratamento. Em termos de medidas protetivas, ainda estamos caminhando. Hoje precisamos ter um Juizado específico para a área e uma Delegacia mais estruturada, com equipamentos físicos, e pessoal qualificado com os quais a Autoridade Policial possa contar.

Cobaia - Há problemas na efetivação da lei? Como, por exemplo, a falta de abrigos para acolher a vítima? Há uma mobilização da sociedade e da mídia no sentido de pressionar o Estado para implementar melhorias?

Sônia Moroso - Como mencionei antes, já avançamos. Temos um programa de tratamento, num convênio com a Univali; a casa-abrigo, em parceria com a Associação Nova Lurdes; e, além des-

sas conquistas, há o CRAS e o CREAS, órgãos municipais que atuam nessa área.

Cobaia - Você é a madrinha da Oscip Estrela de Isabel. Como surgiu a ideia? Sônia Moroso - A concepção da ideia foi minha e de minha companheira Lilian, com o auxílio de amigos, funcionários do Fórum, advogados e colegas do curso de Mestrado em Gestão de Políticas Públicas. A ideia justificou-se exatamente na ausência de programas ligados à área da violência doméstica e familiar. No caminho, foram surgindo outras possibilidades de execução de programas face à existência de demandas nas áreas da infância e juventude e, agora, quanto ao idoso.

Cobaia - Como funciona o trabalho da Oscip?

Sônia Moroso - É uma entidade sem finalidade lucrativa, que executa três programas na área da infância e juventude. Um programa voltado à violência doméstica e familiar e outro que está sendo implementado agora, para residência inclusiva do idoso, com ou sem deficiência. Conta com apoio técnico e financeiro da Prefeitura Municipal, com aprovação dos Conselhos Municipais, tanto

Enquanto a conduta humana for pautada por valores distorcidos, o desafio permanece latente e as estratégias de enfrentamento à violência serão intermináveis

Itajaí, abril de 2012

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da Criança e do Adolescente como da Assistência Social. A Câmara de Vereadores também compreendeu a proposta e aprovou todos os programas. Além disso, diversos empresários são parceiros de Estrela de Isabel e inúmeros voluntários, o que comprova a tese de que a sociedade, quando devidamente mobilizada, faz a sua parte.

Cobaia - Em 2010, no dia nacional da adoção, em Brasília, você deu uma declaração a uma agência de notícia, em que refletia sobre o que é família nos tempos atuais e a adoção de crianças por casais homoafetivos. De lá pra cá, muita coisa mudou e o casamento homoafetivo é juridicamente reconhecido no país. Na sua opinião, o país está evoluindo a passos largos para acabar com o preconceito contra o homossexual?

Sônia Moroso - Não há nada que impeça que o casal homoafetivo exerça as funções de paternagem ou maternagem, conforme o perfil de cada um e, ainda mais que constituam família. O que impede muitas pessoas de aceitarem esses fatos são razões preconceituosas. O mais importante é o caráter e a conduta de cada um e não sua opção sexual. Se fizerem um levantamento nos abrigos em todo o Brasil, perceberão que as crianças, que ali estão, são oriundas de relações heterossexuais, o mesmo acontecendo com crianças e adolescentes vítimas de violência doméstica e familiar. A compreensão do ser humano é fundamental para o crescimento do País, e, nessa compreensão, deve imperar o respeito.

Cobaia - Você foi a primeira magistrada a ter um casamento homoafetivo em Santa Catarina. Como foi a reação no seu ambiente de trabalho? Houve preconceito por parte de colegas? Sônia Moroso - Na verda-

de, fui a primeira no Brasil e recebi muitos cumprimentos. Tenho a impressão de que aceitar a felicidade como ela é, e ter coragem para assumir essa postura, causa mais inveja do que preconceito (risos).

Cobaia - Como seu filho reagiu com essa nova família? Ele sofreu ou sofre algum bullying na escola? Afinal, você é uma juíza reconhecida pela sociedade.

Sônia Moroso - Meu filho foi e continua sendo nosso alicerce e nunca apresentou problema na escola. Minha companheira exerce um papel fundamental na educação de meu filho e ele é “apaixonado” por sua Mamuska.

Cobaia - Por fim, Sônia, você é um exemplo de superação para as mulheres. Atingiu seu sonho profissional, teve coragem para assumir seu sentimento por outra mulher, e é um ícone na nossa cidade em relação às lutas sociais. Você tem algum conselho para nossas leitoras?

Sônia Moroso - Se puder contribuir... Entendo que é preciso, em primeiro lugar, conhecer a si mesma, buscando, em seu interior, o que a faz feliz, o que a realiza. Conhecendo essa motivação, não deve medir esforços para sua realização pessoal. O ser humano veio ao mundo para ser feliz e não para atender a demanda alheia, os desejos dos outros, e, sim, seu próprio desejo. Lute pelo respeito e pela dignidade e, mais do que tudo, não tenha medo de ser feliz. Ouse.

Cobaia - Obrigado pela atenção. A equipe do Jornal Cobaia sente-se lisonjeada por poder expor, em suas páginas, as vivências, as lutas, as opiniões e os sonhos de uma mulher com você. Agradecemos sua participação. *Jornalismo, 7º período


Memória

Itaipava preserva história do trem Documentos sobre a linha férrea, que partia de Itajaí e subia o Vale, estão reunidos no Museu Etno-Arqueológico da Estação Vereza Wagner Heinzen*

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afé com pão/ Café com pão/ Café com pão/ Virgem Maria que foi isso maquinista?/ Agora sim/ Café com pão/ Agora sim/ Voa, fumaça/ Corre, cerca/ Ai seu foguista/ Bota fogo/ Na fornalha/ Que eu preciso/ Muita força”. Enquanto parte da poesia ‘Trem de ferro’ de Manuel Bandeira inspira o desejo da aventura, aqueles primeiros anos dos 1900 tornavam o meio de transporte ferroviário a revolução do ir e vir. E a carroça era superada. A economia brasileira crescia em 1909, quando o Vale do Itajaí colocou em atividade sua primeira estrada de ferro, no entroncamento Blumenau a Indaial – Warnow. No final de 1954, estavam somados 47,460 quilômetros de linha para que a cidade da Marejada alcance a da Oktoberfest. Na

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continuação, Subida, quilômetro 110, o tronco ganhou ramal na direção de Ibirama. Finalmente, em 1958, a viagem de Itajaí à Trombudo Central - quilômetro 165 - se tornava possível como aponta o Guia das Estradas de Ferro e o Mapa da 14ª. divisão. As inaugurações de estações aconteceram nos anos de 1909, 1919, 1929, 1933, 1934 e 1937. Um dos primeiros bairros de Itajaí, Itaipava – com registros de colonização em 1820 - ganhou sua parada de trem em 1948. A Estação Ferroviária Engenheiro Vereza – nome dado em homenagem ao chefe da obra da Estrada de Ferro Santa Catarina (EFSC) - foi iniciada na década de 1920 e inaugurada em 1954. Era o quilômetro 9,690, a partir do ponto zero, no bairro Fazenda, onde ficava a estação e o grande pátio

de manobras – hoje no local estão a loja Havan e o supermercado Xande. Testemunha é Seu Waldyr Coelho, aposentado de 83 anos, que nasceu em Itaipava, estudou na escola local e participou ativamente de duas fases da Estação Vereza. A primeira, de construção do prédio, já que morava perto, em uma localidade do bairro conhecida como Tatu. Na segunda, de manutenção da linha férrea, onde trabalhou por aproximadamente cinco anos, de 1953 em diante: - Não podia haver desnível, pois o trem corria risco de tombar. Cada barra de trilho tinha 14 metros e pesava 280 quilos. Sua função era conferir as condições do caminho, dos trilhos e dos dormentes – vigas de madeira que sustentavam as bar-

Acervo Pessoal/Família Rogge

ras de ferro que eram fixadas por pregos-cravos. Para isso, percorria a linha diariamente. No lado esquerdo da Estação, funcionava o setor de passageiros, com entrada e sala de espera, embarque e desembarque. No lado direito, com cobertura estendida, tanto na frente, quando nos fundos, o setor de cargas, onde eram depositados produtos a serem embarcados. O trem parava nos fundos, rente a rampa

que estava no nível do vagão. Quando Seu Waldyr foi morar no bairro Cordeiros, a bicicleta era sua companheira para chegar em Itaipava e visitar seu antigo posto de trabalho. Ali ficava com seus pensamentos: - Gosto de lembrar os amigos que tinha aqui. A população da região, formada principalmente por agricultores, também usava a Estação pelos serviços de telefone e telé-

http://vfco.brazilla.jor.br/

Wagner Heinzen

A água sob o pontilhão, próximo ao trevo de Brusque, foi registrada num dos momentos de maior altura da enchente, que atingiu Itajaí em setembro de 2010

A antiga estrada de ferro percorria as cidades em torno do Rio Itajaí-açú, de Trombudo Central a Itajaí

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Itajaí, abril de 2012


Memória Itaipava preserva história do trem grafo, como confirma a Fundação Municipal Genésio Miranda Lins, de objetivos culturais. Nas proximidades do ponto do trem, Hilda Pascoal, aposentada de 78 anos, morou em várias casas. A família grande - sete irmãos homens e três irmãs mulheres - trabalhava na agricultura. Depois, tiveram engenho de farinha e alambique de cana, onde produziam cachaça, açúcar e melado. A plantação de café é lembrada com um puxado suspiro: - Cafézinho gostoso, né, o torradinho em casa! Dona Ida, como é mais conhecida, lembra de um pontilhão da estrada de ferro: - Os rapazi (homens da família) iam pescar lá. Hoje, um dos trechos mais visíveis da linha férrea, com aterro de dois metros e outro pontilhão praticamente intocado, pode ser visto no quilômetro ‘um’ da Rodovia Antônio Heill, próximo ao trevo de Itajaí com Brusque, no lado direito. Depois de 41 anos, uma modesta mata cresceu entre a terra forrada de pedras cinzentas e cortantes. Nada suficiente para esconder a beleza do trabalho engenhoso. Depois de casar e ter seu primeiro filho, Dona Ida foi morar em Blumenau. A viagem foi de trem. E as idas e vindas pra visitar a família também: - A gente ia de litorina. - Litorina? O que é isso? Pergunta o repórter. - Litorina é como um trem, mas sem aquele que puxa na frente (locomotiva a vapor). Era uns quatro vagões, com bancos igual ônibus – conta Dona Ida. “Andei bastante de litorina”, revela Erotides Cunha, 59 anos, funcionária da Biblioteca Pública Municipal Silveira Júnior, de

Wagner Heinzen

Não podia haver desnível, pois o trem corria risco de tombar. Cada barra de trilho tinha 14 metros e pesava 280 quilos

Itajaí: - Ela saía às horas 5 da manhã de Itajaí e chegava ao meio dia em Subida. A gente chegava morta de fome. A velocidade variava entre 20 e 30 quilômetros por hora. “A litorina era mais cara que o trem e separada por classes”, diz Maria Teresa Roslindo, 69 anos, colega de trabalho de Erotides, que aos 12 viajou de Maria Fumaça pela primeira vez. A experiência foi ainda maior com a colisão de um caminhão no trem. No comboio de vagões de carga era transportado gado, madeira e areia – baldeada de caminhão para vagão, no braço. Assim, os produtos do Vale seguiam para exportação e os importados ganhavam distribuição. Em 1971, a concorrência com rodovias deu fim à malha ferroviária do Vale. Mas grupos, como a Associação Brasileira de Preservação Ferroviária, surgiram para defender a memória férrea. Ralph Mennucci Giesbrecht, 60 anos, é um dos sócios da ABPF: - Já viajei por boa parte do Estado de São Paulo e também do Paraná, Minas Gerais, Rio de Janeiro e Santa Catarina fotografando quase mil estações ou locais em que um dia elas estiveram, conversando com inúmeras pessoas, além de manter contatos constantes com diversos “correspondentes” pelo Brasil afora. Autor de livros como ‘Um dia o trem passou por aqui’ e criador do site estaçõesferroviárias.com. br - com informações específicas sobre paragens de todo país - ele apresenta resultados de pesquisas, dúvidas e indignações que cercam a história ferroviária. A intenção é ampliar os registros existentes. *Jornalismo, 8º período

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Seu Waldyr conta suas experiências para alunos de uma escola municipal na Estação Vereza, que, após restaurada, abriga o Museu Etno-Arqueológico de Itajaí

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O prego-cravo foi encontrado por moradores da Rua Edmundo Wippel, em Itaipava, bairro onde passava a estrada de ferro, que mantém seu traçado original, apesar da urbanização

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Cinema

Premiados do Oscar saem de cartaz e viram atração nas locadoras Amantes da sétima arte disputam as cópias, em DVD, de filmes como A Árvore da Vida e Meia-Noite em Paris Rodrigo Ramos*

E

m território brasileiro virou costume levar meses para que um filme desembarque por aqui. Os blockbusters, também conhecido como arrasa-quarteirões, geralmente levam menos tempo. Em alguns casos, como o ainda inédito Os Vingadores, o longa-metragem chega até mesmo antes. No Brasil, o longa chega às telas dia 27 de abril, enquanto, nos Estados Unidos, o mesmo começa a carreira uma semana depois, em maio. No entanto, filmes menores são colocados de lado e não têm a preferência das distribuidoras. Os filmes indicados ao Oscar, por exemplo, são aqueles que sofrem com isso. No Brasil, é de praxe lançar possíveis nomeados

mais perto da maior premiação do cinema, nos meses de janeiro e fevereiro. É uma maneira de vender melhor o próprio peixe, é claro. Colocar no cartaz em letras garrafais douradas e em fonte 50 “vencedor do Globo de Ouro” e “indicado a xx Oscars” chama a atenção, mas incomoda aquele que acompanha o cinema com frequência e quer ver o mais breve possível películas premiadas e de grandes diretores. O Oscar ocorreu. Os nove indicados à categoria de melhor filme encontram-se no circuito brasileiro ou, até mesmo, foram exibidos e saíram de cartaz. A Árvore da Vida e Meia-Noite em Paris, por exemplo, estão atualmente disponíveis para locação. O primeiro,

dirigido pelo mítico diretor Terrence Malick (ele fez apenas cinco filmes em mais de 40 anos de carreira) tem Brad Pitt e Jessica Chestain como protagonistas. A película tenta conciliar a criação do mundo e a infância do personagem vivido por Sean Penn na fase adulta. Com uma montagem que pouco faz sentido, incluindo aí takes do big bang e dinossauros, A Árvore da Vida é um filme mais sensorial, experimental, do que um longa cheio de profundidade como Malick gostaria que fosse. Enquanto isso, Meia-Noite em Paris consegue agradar bem mais o espectador. Dirigido por Woody Allen, o longa levou pra casa o prêmio de melhor roteiro original. Allen, três vezes vencedor do Oscar,

não apareceu na festa mais uma vez. Mas tudo bem. O que conta é a história doce e os momentos deliciosos que esta obra nos proporciona. Nela, Gil (Owen Wilson), escritor americano, amante de Paris e prestes a casar, viaja à capital francesa com a família de sua noiva (Rachel McAdams). Durante seus passeios noturnos, ele acaba sendo transportado à meia-noite para a Paris dos anos 20, onde encontra vários nomes da arte como F. Scott Fitzgerald, Gertrude Stein, Ernest Hemingway, Cole Porter, entre outros. Um verdadeiro sonho para quem é fascinado tanto pela cidade parisiense quanto a nostalgia da época em que não vivemos. Os demais indicados chega-

ram ao país somente neste ano. O primeiro deles foi Cavalo de Guerra, dia 6 de janeiro. Dirigido por Steven Spielberg, o longa-metragem sobre o cavalo que sobreviveu à Primeira Guerra Mundial inteira, passando por diversos países, donos e conflitos, é uma verdadeira megalomania, recheada de clichês, sentimentalismo excessivo e falta de brutalidade. Como se trata de uma guerra, Spielberg poderia utilizar seus conhecimentos demonstrados em O Resgate do Soldado Ryan. No entanto, ele parte para o dramalhão, cenas edificantes, lições de moral, superação, pieguice, um pouco de sofrimento e uma trilha sonora que tenta comover o espectador a todo custo, mas falha. Rodrigo Ramos

A Invenção de Hugo Cabret e O Artista voltam no tempo e fazem justas homenagens aos gênios da ilusão nas telonas

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Cinema Premiados do Oscar saem de cartaz e viram atração... Ao longo de janeiro tivemos outras estréias. Os Descendentes, vencedor do Oscar de melhor roteiro adaptado, é aquele representante simpático do cinema independente, meio indie, e que todo mundo gosta. George Clooney encabeça o elenco onde é um homem que encontra dificuldades na vida a partir do momento em que sua esposa sofre um grave acidente e ele precisa cuidar das duas filhas, enquanto descobre que foi traído. É agradável, redondinho, mas nada demais. Tão Forte e Tão Perto é o pior dos indicados, massacrado pela crítica mundo afora e que marcou presença na lista porque o diretor Stephen Daldry (de O Leitor e As Horas) é queridinho da Academia. No longa, um menino de 10 anos começa uma caça ao tesouro pela cidade de Nova York depois de achar uma chave dentro de um vaso de seu pai, falecido recentemente no atentado ao World Trade Center. Em fevereiro, Histórias Cruzadas, vencedor do Oscar de melhor atriz coadjuvante (Octavia Spencer), mostrou que é possível fazer um filme sobre preconceito e uma das fases mais vergonhosas da história dos Estados Unidos pegando leve e sem mostrar toda a crueldade da época. Lançado em terras estadunidenses em setembro, o longa dirigido por Tate Taylor acompanha a trajetória de uma aspirante a repórter (Emma Stone) branca registrando a vida de duas empregadas negras no estado de Jackson nos anos 60. Há clichês e momentos leves até demais numa sessão onde é melhor agradar o público do que ser franco e contar as

atrocidades feitas naquela época. No entanto, o longa se salva pelas atuações acima da média de Spencer, Jessica Chestain e Viola Davis. Enquanto isso, O Homem Que Mudou o Jogo vale a pena ser assistido não apenas pelas boas atuações de Brad Pitt e Jonah Hill, mas também por ser um filme sobre beisebol que não é apenas sobre esporte, indo muito além disso. No dia 10 de fevereiro, apesar de circuito restrito, entrou em cartaz O Artista, o grande vencedor deste Oscar (incluindo melhor filme, direção e ator). Por ser mudo, preto e branco, o longa só estreou no país por causa do favoritismo à premiação. O filme francês, dirigido por Michel Hazanavicius, volta no tempo lá no final da década de 20 para contar sobre o declínio de um ator (Jean Dujardin), representando a era do cinema mudo, e a ascensão de uma atriz (Bérenicé Bejo) na era do cinema falado. Uma bela homenagem ao passado, sem dúvida. Em contrapartida, Martin Scorsese não homenageia apenas o passado, mas também aponta para o futuro com suas técnicas impecáveis e o 3D muito bem empregado. Em A Invenção de Hugo Cabret, o diretor conhecido por suas cenas antológicas de violência crua e nua, cria uma obra delicada, cheia de sentimento e com fortes emoções. Voltando à Paris dos anos 30, a película acompanha Hugo (Asa Butterfield), um menino órfão que cuida dos relógios de uma estação de trem na capital francesa e busca consertar um robô deixado pelo pai. Nessa empreitada, ele acaba conhecendo

Georges (Ben Kingsley), um velhinho amargurado, dono de uma loja de brinquedos na estação. Num apanhado geral, há três títulos aqui que têm uma coisa em comum: a paixão pela arte. A Invenção de Hugo Cabret, O Artista e Meia-Noite em Paris voltam no tempo para as décadas de 20 e 30 para nos relembrar coisas que não vivemos. A parcela dos que viveram a juventude nos anos de 1920 não é muito expressiva, afinal. Os longas-metragens contêm em si declarações de amor à arte e ao cinema. MeiaNoite em Paris homenageia tanto Paris, quanto a música, a literatura e o cinema. O Artista resgata os tempos áureos do cinema mudo e lembra clássicos como Cantando na Chuva e Crepúsculo dos Deuses. A Invenção de Hugo Cabret consegue despertar a paixão pela sétima arte em quem não a tinha ainda e reforça o amor que pessoas como eu já possuíam. Scorsese emociona ao exibir a obra de Georges Méliès, o primeiro cineasta da História, e mostra do que o cinema é feito. Além disso, Paris continua fascinante e poética aqui. O saudosismo do que não se viveu é uma forte marca destas três obras. Buscar inspiração no passado para criar novos trabalhos não é má ideia. O ar nostálgico presente nos longas é de um charme irresistível, tornando impossível não ficar fascinado com o que se vê. Tudo isso é prova de que o cinema pode viver do simples, desde que tenha qualidade e coração, além de ser tratado como a bela arte que é. *Jornalismo, 5º período Rodrigo Ramos

Crônica

Você toma conhecimento que [...] seu vizinho, casado há 20 anos com uma mulher, tem um amante Thayse Gioppo*

Respeito é bom e todo mundo gosta

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vida inteira você aprende uma série de regras sociais. Ensinaram a você, também, uma gama de coisas que não poderia fazer e, por vezes, nem pensar. Um exemplo clássico seriam os 10 mandamentos. Eles são a união de uma receita que funciona há muitos (muitos) anos. Ali está o poder da palavra bíblica e de um deus inquestionável. Não dizer o nome de Deus em vão, não cobiçar a casa, a mulher, nem servo, nem serva, nem boi, nem nada do próximo, e segue. A partir daí, por consequência, vem o pecado e inúmeras outras questões que não cabem aqui. A maioria aprende os mandamentos na catequese. São quatro anos de aprendizado, pelo menos, na Igreja Católica, sobre os feitos divinos e apostólicos, sobre como ajudar o próximo e ir à missa toda semana. A intenção passa longe de uma generalização, mas, salvo algumas exceções, não houve espaço durante anos de vida para questionar. Seja na catequese ou na escola. Se aquilo era correto ou não. Portanto, a religião só serve como um exemplo daquilo que pode ser verdade, ou não. No entanto, para uns mais cedo, para outros mais tarde, ou para alguns que nunca vão pensar, chega a hora de se perguntar. E, então, vem a Internet com recursos infindáveis, que a, todo segundo, aparece com uma novidade e que, em um instante, num clique, pode destruir um conceito de uma vida inteira. Nesse momento, vem um monte de perguntas. Será isso mesmo? Você toma conhecimento que há pessoas que não acreditam em Deus. Que seus pais são pessoas como você. Que as pessoas mentem, roubam, cobiçam e que o seu vizinho, casado há 20 anos com uma mulher, tem um amante. Como dito anteriormente, cedo ou tarde, pode ser com 10, 15, 20 anos, mas alguns vão pensar nisso. Uns vão continuar como antes, seguindo na linha, sendo “normais”. Os outros vão se virar contra o sistema e viver ao contrário do “normal”. Por anos ou pela vida toda, ser contra é motivo de orgulho. Alguns se sentem superiores e fazem questão de anunciar. “Oi, meu nome é fulano e eu não acredito em Deus”; “Oi, meu nome é cicrano e reprovo toda a cultura de massa”. Torna-se até divertido contestar a tudo e a todos, gerar discussões, fazer com que os outros façam para si as mesmas perguntas que você fez. O desejo é de mudar o pensamento de cada um que se opõe, porque, na sua cabeça, o correto é o pensamento contestador. Isso não é um erro. Isso é bom. Não aceitar tudo de maneira fácil. Avaliar o que é bom e o que ruim. Só que chega uma etapa em que sua diferença é igual a de tantos outros, que a anunciação se torna sem graça, pois o que você descobriu de novo já é velho pra muita gente. Um verbo deveria começar a fazer parte de sua vida: respeitar. “Ah! Respeito, óbvio, tenho por cada um”. Mas tem quem vai passar a vida toda buscando alguém que considere inferior para despejar sua “diferença”, enquanto o ouvinte deve estar apenas respeitando.

*Jornalismo, 7º período

Você escreve crônicas e quer participar deste espaço? Entre em contato com a gente! E-mail: cobaia@univali.br Rodrigo Ramos

Itajaí, abril de 2012

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Em pauta

As aventuras do mané Darci e surf music Guitarrista da banda Dazaranha, Moriel Costa participa do programa Pirão Catarina Bianca Escrich* Emily Kelle do Prado

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alvez você não conheça muito bem Moriel Costa, mas o trabalho dele tem merecido atenção no universo da música. Ele é guitarrista solo da banda Dazaranha, referência no cenário do rock catarinense, que está perto de completar 20 anos de estrada, tem cinco discos lançados e está com o sexto em produção num dos estúdios mais conceituados da região – o R3. Paralelamente, Moriel, em seu próprio estúdio, finaliza a gravação, a mixagem e a produção de seu primeiro disco solo “Pra começar”. Mostrando suas composições e tocando em uma levada surf music, ele não está sozinho nessa. Parceiros antigos e companheiros da banda Dazaranha participam do CD, além de convidados especiais, tais como o cantor Armandinho e o surfista-músico Teco

Padaratz. Moriel Costa não para por aí. Também tem uma gravadora, a Muruca Records, que apoia artistas catarinenses. Provavelmente, você conheça “Darci e suas aventuras”, manezinho de Florianópolis bem conhecido na região e que anda fazendo sucesso pelo Estado. O alter ego de Moriel é um caricato do morador da ilha, com linguagem e sotaque bem manezeis, cheio de causos bastante irreverentes para contar ao público. A fala rápida e, às vezes, incompreensível retrata um cotidiano quase fiel à realidade de quem vive no litoral catarinense. “As pessoas se identificam e sabem do que estou falando. Por isso, torna-se tão engraçado. Esse personagem não ofende, apenas mostra a cultura regional e faz as pessoas felizes. Eu gosto de fazer as pessoas fe-

lizes, cantando, tocando ou mesmo sendo o Darci”. Moriel apresentou as aventuras de Darci recentemente no Teatro Municipal de Itajaí, onde faltou cadeira para tanta gente que queria ver de perto essa figura. Interagindo com o público, mostrou que tem um trabalho notável também como ator, com excelente domínio de palco, timing e técnica vocal, mesmo nunca tendo tido outras passagens pelo teatro. “Nunca fiz teatro. O Darci começou como spot na Rádio Atlântida e nunca mais parou. As pessoas queriam conhecer ele. Daí, surgiu a ideia do meu produtor, Hildo Rocha, de começar a fazer um stand up, e deu certo.” E como deu né nego!

*Jornalismo, 7ª período

Mais espaço na TV Univali para os acadêmicos da Comunicação Social Da redação

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ois programas exibidos atualmente na TV Univali são produzidos pelo Núcleo de TV dos Cursos de Comunicação Social da Univali (Jornalismo, Publicidade e Relações Públicas). O Casulo, mais voltado às questões sociais, trabalha com temas nas áreas de Educação, Cidadania e Meio Ambiente, enquanto o Olhares Múltiplos foca nas tendências dos setores de Moda, Comportamento, Mundo virtual, entre outros. A proposta é expor o que há de novo na chamada sociedade pós-moderna. Olhares Múltiplos e Casulo vivem momentos diferentes. O Olhares está numa fase de consolidação. “É uma revista de variedades que procura entreter e dar informação numa linguagem jovem”, explica o professor Carlos Golembiewski, integrante do grupo de professores do Núcleo. “Nossas pautas sempre buscam o novo, o diferente”, exalta a professora Cristiane Riffel, coordenadora geral do Núcleo. No momento, o programa é apresentado pelos estudantes Laís Lara (Publicidade e Propaganda) e Thiago Avi (Relações Públicas). Para Laís, 20 anos, que está no 5º período de PP, trabalhar no programa está sendo uma experiência acima do esperado: “Aqui aprendi a fazer reportagem e a editar”. Já o programa Casulo será apresentado na rua, de preferência, em locações que se identificam com os temas das reportagens. Nessa nova fase, será apresentado pelos acadêmicos Henrique Flores e Letícia Dias, ambos do Curso de Jornalismo da Univali. “No Casulo, eu entro em contato com as fontes e desenvolvo meu espírito crítico, algo fundamental na carreira de jornalista”, observa Letícia Dias, 20 anos. O programa de estreia será sobre o Meio Ambiente, com três reportagens e uma entrevista. Um delas abordará as pesquisas científicas feitas pelos professores da própria Univali. Para produzir os dois programas semanais, o Núcleo de TV conta com seis bolsistas, sendo dois de cada curso, além de alunos voluntários selecionados para trabalhar. O calouro de PP Lucas Batista, 18 anos, está há duas semanas no Núcleo: “Tá bem legal. Comecei a trabalhar sem perder tempo. Eu estou na área de que gosto”. Pricilla Vargas, 18 anos, diz que está sendo ótima a experiência: “O olhar sustentável me ampliou a visão fechada que tinha do Jornalismo.” A professora Ediene Ferreira afirma que os dois programas permitem aos alunos experimentarem novas linguagens televisivas. O Casulo e o Olhares Múltiplos vão ao ar na TV Univali, canal 26 da Via Cabo TV em Itajaí, aos domingos, respectivamente, às 20h e às 20h30. Carlos Golembiewski

Viva Voz Opinião estreia na programação da Rádio e TV Univali Camila Maurer*

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Viva Voz, programa de entrevistas diário da Rádio e TV Univali, agora conta com uma novidade: o Viva Voz Opinião. Toda quinta-feira, um time de especialistas na área das Ciências Sociais opina sobre os assuntos que foram destaque no noticiário durante a semana. No programa de estreia da nova proposta, os professores Flávio Ramos, Osmundo Saraiva Jr. e Sérgio Saturnino Januário deram o tom da conversa. Na semana seguinte, foi a vez das professoras Ediene do Amaral Ferreira, Laura

Seligman e Vera Sommer comentarem os assuntos do momento. No ar desde 2007, o Viva Voz atingiu, em março, a marca de 800 edições. Já são quase cinco anos de história e mais de 400 horas no ar. O programa, que vai ao ar diariamente pela Rádio e TV Univali, é produzido pelos acadêmicos do curso de Jornalismo, sob a supervisão do professor Carlos Praxedes. No Viva Voz, os estudantes têm a oportunidade de aprender, na prática, como funciona a produção de um programa jor-

nalístico de rádio. A elaboração das pautas, a seleção de fontes, a produção de roteiros, a apresentação do programa e até mesmo a operação técnica ficam a cargo dos acadêmicos, que podem ingressar no projeto em qualquer período do curso. O Viva Voz vai ao ar diariamente, às 13h30, pela Univali FM 94,9 MHz e pela TV Univali, canal 26 da TV a cabo em Itajaí. Na TV Univali, o programa é reapresentado às 20h30. *Jornalismo, 7º período

Canais de comunicação do VV: Blog | vivavozunivali.wordpress.com Twitter | @vivavozunivali Facebook | facebook.com/vivavozunivali E-mail | vivavozunivali@hotmail.com

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Os estagiários Lucas Batista, Henrique Flores, Thiago Avi e Caroline Milani realizam suas tarefas

JORNAL COBAIA

Itajaí, abril de 2012


Olhares Múltiplos AGENDA João Paulo Cavalcanti profere palestra na Univali O publicitário da Agência BOX 1824 confirma presença nesta edição do evento Divulgação

Da redação*

Ingressos de Maca em Floripa empresas e fundações do cenário brasileiro, aplica palestras para grandes corporações como a Câmara de Deputados, Rede Globo, VIVO, entre outras. Christian Barbosa, maior especialista no tema Produtividade e Gerenciamento de tempo, fará sua apresentação Jovens de Resultado – Gestão de Tempo. Olhares Múltiplos é destinado a alunos, docentes e comunidade em geral da Univali que desejem participar das palestras e das arenas que serão distribuídas ao longo dos três dias do evento. As arenas serão divididas em temas como: Social, Tecnologia, Criatividade, Tendência e Mercado. Para obter mais informações sobre o evento, acesse: www. olharesmultiplos.com.br ou email para olharesmultiplos@ univali.br. Confira a programação e selecione os temas que mais lhe interessam para se inscrever.

Música

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Divulgação

delli implementa mídias sociais, economia colaborativa e gestão do conhecimento em grandes

*Colaboração de Paula Wendt, Publicidade e Propaganda, 7º período

Evento

publicitário João Paulo Cavalcanti, um dos sócios fundadores da agência BOX 1824, está confirmado como palestrante de Olhares Múltiplos, a ser realizado no final de maio próximo, nos campi de Itajaí, Balneário Camboriú e Ilha (Florianópolis) da Univali. Verdadeiro visionário, ele analisa tendências e possíveis mercados inexplorados, procurando detectar o que as pessoas pensam e desejam ao redor do mundo. Atende clientes como Nike, Pepsi, Nokia e Itaú e desenvolve pesquisas sobre o que será novo antes de se tornar realidade. Olhares Múltiplos 2012 acontecerá nos dias 29, 30 e 31 de maio, e contará com a presença de Martha Gabriel, professora de marketing mais influente na rede social Twitter. Considerada uma das 10 profissionais mais inovadoras, trará ao evento seu conhecimento sobre marketing digital, após ter publicado três livros sobre o assunto, tendo recebido o prêmio de melhor palestra em congressos internacionais. Outra atração é o CEO da agência Gaia Creative. Gil Girar-

Estão praticamente esgotados os ingressos para o show de Paul McCartney On The Run a ser realizado no dia 25 de abril na Ressacada, em Florianópolis. Interessados em mais informações a respeito podem acessar o site www.diario.com.br/paulemfloripa, atualizado por um grupo de jornalistas do Diário Catarinense. O hotsite foi criado especialmente para o evento e conta com reportagens, vídeos, fotos, infográficos e tudo sobre o show (venda de ingressos, dicas de segurança e de como chegar ao local), incluindo a vida e a obra do beatle. O evento é uma promoção do Grupo RBS.

Encontro de Mulheres Parlamentares em Itapema Estão abertas as inscrições para o 3º Encontro de Mulheres Parlamentares de Santa Catarina, que acontecerá nos dias 19 e 20 de abril, no Auditório da Câmara de Vereadores de Itapema. O curso terá carga horária de 20 horas e será ministrado por Selma Westphal e Leila Ferreira, com a participação de deputadas de Santa Catarina. O objetivo é discutir os desafios e as estratégicas de participação e atuação política feminina nos municípios de Santa Catarina. Este encontro está aberto para parlamentares, prefeitos e prefeitas, vice-prefeitos e vice-prefeitas, vereadores e vereadoras, servidores de câmaras, educadoras, pesquisadoras, agentes comunitárias, representantes de classes e demais cidadãos interessados. Vale lembrar que a entrada é franca, mas as vagas são limitadas. Informações e inscrições no site da Escola do Legislativo http://www.alesc.sc.gov.br/escola.

Concurso de rainha da 12ª Fenapi em Piçarras Começam os preparativos para a 12ª Feira de Negócios e Atrações de Balneário Piçarras, a Fenapi, que acontece em julho. E as candidatas a representantes do maior evento da cidade já podem se preparar para o concurso de rainha e princesas da festa programado para maio. A Secretaria de Turismo, Cultura e Esporte (Setuce) recebe as inscrições para o desfile pelo site www.fenapi.net ou na Casa do Turista, no trevo de acesso principal da cidade, na Avenida Getúlio Vargas. Para mais informações sobre o concurso de escolha da rainha da 12º Fenapi, as interessadas podem entrar em contato com a Setuce no telefone 47 3345 3603 ou e-mail setuce@picarras.sc.gov.br.

Divulgação

No ano passado, as oficinas do Olhares Múliplos chamaram a atenção das comunidades acadêmica e local

Itajaí, abril de 2012

JORNAL COBAIA

Teatro

Arquivo Univali

Bonecos de luva em Itajaí Para quem curte teatro experimental, o projeto Com a Mão na Luva faz várias apresentações gratuitas entre os dias 11 e 14 de abril aqui em Itajaí. O grupo encena uma coletânea de textos de Guaira Castilla, através do teatro de bonecos de luva. Mãos ao Alto – um assalto ao riso é o mais recente trabalho cênico dos manipuladores Alex de Souza, Carlos Valle, Caroline Holanda, Fernando Honorato, Ingrid Ferreira, Karin Romano, Laura Correa, Luana Pereira, Lucas Góis e Telja Rebelatto, com direção de Guilherme Peixoto; textos de Guaira Castilla; produção de Mônica Longo; arte gráfica de Mariana Baldaia; e sonoplastia de Bianca Ramos. As apresentações acontecem no dia 11 de abril, às 10h e 14h, na Escola João Paulo II; e às 20h, na Escola Pedro Rizzi; no dia 12 de abril, às 10h e às 16h, na Escola Antônio Barros; e às 20h, na Biblioteca Central da Univali; no dia 13 de abril, às 10h e às 13h, na Escola Pedro Baron; e às 18h, no Centro de Economia Solidária; e ainda no dia 14 de abril, às 20h, no Auditório da Prefeitura Municipal de Itajaí. Entrada fraca para o público.

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Tradição

Canoas de um pau só disputam a beleza do mar

Ieda Funari

Tradição, cultura e sustentabilidade marcam a história de Bombinhas, antiga vila de pescadores no litoral catarinense Márcia Cristina Ferreira*

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corrida de canoas de um pau só tem a intenção de preservar e difundir as embarcações feitas de tronco da árvore garapuvu, além de reunir as regiões que cultivam o hábito da pesca artesanal. Na mais recente competição, participam nove canoas de quatro remos, sete canoas de dois remos feminino, sete canoas de dois remos masculino, sendo uma canoa do Pântano do Sul, de Florianópolis, uma de Garopaba e outra de Itajaí. Também há dois caícos e dez caiaques. Essa tradição remonta às origens dos pescadores, e a preservação é essencial, de acordo com o prefeito Manoel Marcílio dos Santos, Seu Manéca. O pescador, hoteleiro e ex-prefeito Claudionor Pinheiro (Kanô) conta ser dono de uma canoa de garapuvu, a Aventureira, de aproximadamente 200 anos. Ela se encontra no rancho da família e vai para as águas translúcidas da Sepultura e do Retiro dos Padres a partir de maio. Explica que a maioria é centenária e carinhosamente cuidada por seus donos. E a dele, na realidade, pertence ao pai (Seu Naro - Carlos Adrião Pinheiro), de 87 anos, que, por sua vez, herdou do pai. É um grande amor e um capítulo à parte da vida do Seu Naro, o pescador da Praia da

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Sepultura. A pesca e a canoa dividem seu coração com Dona Lira (Maria Idia Mafra), sua esposa, que fala: “A gente vive muito enraizado aqui. As nossas raízes são profundas”. Apesar de os troncos da madeira garapuvu, cedro, peroba ou figueira serem frágeis ao tempo, nas canoas, perduram por gerações de pescadores. Normalmente, a canoa é repassada de pai para filho. Na região de Bombinhas, diferentemente da Lagoa da Conceição e do Pântano do Sul, em Florianópolis, não há sequer um artesão que preserva a arte de esculpir este tipo de canoa.

Festividades

O 7º Festival de Embarcações Catarinense e o 12º Municipal são realizados em comemoração ao aniversário de Bombinhas, que este ano completa 20 anos de existência. Uma corrida de canoas de um pau só, utilizadas na pesca da tainha nos meses de maio a julho. A competição tem três categorias: dois remos masculino, dois remos feminino e quatro remos masculino. Também é realizada a de caíco (bateira, pequena embarcação para duas pessoas feita de pranchas de madeira) e caiaque no adulto e infantil até

12 anos. Uma promoção conjunta entre a Fundação de Cultura e a iniciativa privada. Sentada na barraca da organização, Dona Tina (Leontina Crescêncio da Silva) de 84 anos, vem dos Ingleses para ver o neto Vinícius Pinheiro, remador da Bela Vista de Bombinhas, chegar três segundos atrás da Nossa Senhora Aparecida de Bombas. A Bela Vista é a antiga Afrodite, três vezes campeã na competição de dois remos. Neste ano, traz como patrão um personagem lendário da península, o Capela (José Bento) que, após superar sua guerra interna contra o alcoolismo, volta às origens. Além do patrão, a tripulação é composta de dois ou quatro remeiros, conforme a categoria da canoa. Na competição feminina, um homem ajuda em caso de emergência. Mas remar é responsabilidade das, nem um pouco, frágeis e incansáveis mulheres e filhas de pescadores envolvidas na disputa. A ganhadora na categoria feminina é Samaria de Zimbros (uma das praias de Bombinhas), com a patroa Marivone e as remeiras Alessandra e Durcelí, da família Serpa. Elmir Eupídio Correia (Seu Didi), remeiro do Pântano do Sul, vem todos os anos, mas, nes-

JORNAL COBAIA

te, a Osmarina não consegue premiação. Esteve acompanhado de Seu Arante e de Dona Osmarina (do bar do Arante do Pântano do Sul), prestigiando sua canoa, que saiu na sexta-feira e veio a remo de Florianópolis. Com os cabelos brancos ao vento, de bengala e um sorriso enorme no rosto, expressa uma pequena crítica ao evento. Ao contrário dos anos anteriores, as canoas saem do ponto de chegada para a largada na ponta esquerda da praia e, aí sim, iniciam a competição até o ponto de chegada: “Os remeiros cansam!”, exclama o velho Arante. A vitoriosa nos quatro remos é a Gislaine de Garopaba, comandada pelo patrão Adilson Silva Melo. Os pescadores de Garopaba são da comunidade do Siriú, remeiros tradicionais em seu município. Eles fazem questão de prestigiar a cultura viva dos pescadores.

Corujices

Na competição de caícos, ganham os remadores pai e filho Gilmar Pinheiro, de 46 anos, e Fabrício Pinheiro, 12 anos. No caiaque adulto, o campeão é o salvavidas de Quatro Ilhas (praia de Bombinhas) Max Moreira da Silva Júnior (Juninho) e, no infantil, sagra-se vencedor Gabriel

Escodelario Dusto de Itapema. Nesta etapa, há um diferencial, pois o mais jovem competidor é o pequeno Bernardo Espírito Santo, de 6 anos de idade, de Bombinhas. Apesar de mostrar força, chega na última colocação. O que não abala a mamãe Ketlin toda sorriso: “Ano que vem tem mais”. É fato que poderiam ter mais competidores, canoas de outras cidades, como Navegantes e São Francisco do Sul. A divulgação do festival ainda é precária e requer um maior planejamento por parte do executivo municipal e da Secretaria de Turismo estadual, já que faz parte do calendário de festivais catarinense. Todavia, a preservação das canoas de um pau só, que labutam na pesca da tainha de inverno a inverno, faz entender o patrimônio histórico e cultural vivos da região litorânea de Santa Catarina. E quando a dor de existir tentar abater? Ora, basta ir à praia com vento sul, lestada ou até mesmo nordestão no rosto cansado e nos cabelos soltos, e pronto. O mar e o vento levam tudo embora... E lá se vão 20 anos de existência “rapazi”, com sabedoria centenária. *Jornalismo, 3º período

Itajaí, abril de 2012


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