Revista Viração - Edição Nº 67 - Dezembro/2010

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a r i V a z a f m e Veja qu

Sexo e Saúde

pelo Brasil

Associação Imagem Comunitária Belo Horizonte (MG)

Centro Cultural Bájò Ayò João Pessoa (PB)

Universidade Popular Belém (PA)

Rede Sou de Atitude Maranhão São Luís (MA)

Casa da Juventude Pe. Burnier Goiânia (GO)

Avalanche Missões Urbanas Underground Vitória (ES)

Ciranda – Curitiba (PR) Central de Notícias dos Direitos da Infância e Adolescência

Catavento Comunicação e Educação Fortaleza (CE)

Cipó Comunicação Interativa Salvador (BA)

Centro de Refererência Integral de Adolescentes Salvador (BA)

Instituto de Estudos Socioeconômicos Brasília (DF)

Centro Cultural Escrava Anastácia Florianópolis (SC)

Gira Solidário Campo Grande (MS)

Projeto Juventude, Educação e Comunicação Alternativa Maceió (AL)

União da Juventude Socialista Rio Branco (AC)

Agência Fototec Natal (RN)

Bemfam - Recife (PE)

Movimento de Intercâmbio de Adolescentes de Lavras Lavras (MG)

Grupo Makunaima Protagonismo Juvenil (RR)

Jornal O Cidadão Rio de Janeiro (RJ)

Grupo Cultural Entreface (Diversidade Juvenil, Comunicação e Cidadania) Belo Horizonte (MG) Taba - Campinas (SP)


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. . . é a l o c s E

ios, só de préd ão se trata n / s , o é ig la am / Esco nde se faz nceitos... ra, se ‘O lugar o rários, co o h s, a ue se aleg m /progra estuda / q s e ro u d q professor a , u a q , lh salas, e traba é gente o u r q o d te a n n e e g rd cada vez O coo , gente / scola será é gente / e r sobretudo a to e E ir / d . ./O gente , irmão. / se estima cionário é ga, amigo n le fu o c a d o a conhece, c m o as rte c gente / iver com se compo o aluno é a de conv ada um / d c é gente / a e N u mo o / q ’. c s m e de ser o os lado na medida m / nada or todos é p u g te in n melhor / n e g ó a s ade a de oé tem amiz escola nã lha cercad rtante na / que não Nada de ‘i o r p ri b Im o biente de / c s . m e ó a , frio, s é criar depois d / te e n e s d re a a e o iz if s d s pe e / in ola assim s de am a a pared numa esc criar laço / rm . m fo .. é o b e u ic m q g ta é .’ , é ló tijolo abalhar / la’! / Ora / ser feliz ão é só tr marrar ne ducar-se e ‘a , e s s o o é ig m estudar, n r, m o zer a onvive a ver c gem / é c rescer / fa tem tudo a c , d a r, ir ra o a V a lh a m o a a c b c sobre m ão para ar, tra e inspiraç il / estud r conosco d c ti n e fá ra fl r g re e , s e a i ir cê va Fre idamos vo a de Paulo édio. Conv M Esse poem o n as vidas. si tes n ss E o n ecial: o as diferen nte em sp a e rt e o p st e im d ens sobre o g a tã rt tema o o d p o re rí pe os a lhor esse ma de um rsa, trazem tornar me stado o te ssa conve e re p r a m n e 8, io 0 o 0 rc d 2 o va em l, pegan Para prop o no Brasi ão Educati ã ç ç A a c G u N A d O e da loga na pela realidades os à soció senvolvida im e d d e a P is ”. u s o sq pe rem que nos importante io que que ento, para nsino Méd m E ta O n “ a a v d le a cham enou o ionadas utas relac que coord a i, p rt is o a C ip la c Pau s prin pensar na Virajovens! ajudasse a Ana! Valeu , u le a V . a ao tem ! Boa leitura

Conteúdo

Quem somos A

Viração é um uma organização não governamental (ONG), de educomunicação, sem fins lucrativos, criada em março de 2003. Recebe apoio institucional do Fundo das Nações Unidas para a Infância (UNICEF), da Organização das Nações Unidas para a Educação, a Ciência e a Cultura (UNESCO), do Núcleo de Comunicação e Educação da Universidade de São Paulo e da Agência de Notícias dos Direitos da Infância (Andi). Além de produzir a revista, oferece cursos e oficinas de capacitação em comunicação popular feita para jovens, por jovens e com jovens em escolas, grupos e comunidades em todo o Brasil. Para a produção da revista impressa e eletrônica (www.viracao.org),contamos com a participação dos conselhos editoriais jovens de 22 Estados, que reúnem representantes de escolas públicas e particulares, projetos e movimentos sociais. Entre os prêmios conquistados nesses seis anos, estão Prêmio Don Mario Pasini Comunicatore, em Roma (Itália), o Prêmio Cidadania Mundial, concedido pela Comunidade Bahá'í. E mais: no ranking da Andi, a Viração é a primeira entre as revistas voltadas para jovens. Participe você também desse projeto. Veja, ao lado, nossos contatos nos Estados. Paulo Pereira de lima Coordenador Executivo da Viração – MTB 27.300

Copie sem moderação! Você pode: • Copiar e distribuir • Criar obras derivadas Basta dar o crédito para a Vira!

Apoio Institucional

Conheça os Virajovens em 22 Estados brasileiros e no distrito Federal Belém (PA) - pa@viracao.org Belo Horizonte (MG) - mg@viracao.org Boa Vista (RR) - rr@viracao.org Brasília (DF) - df@viracao.org Campinas (SP) - sp@viracao.org Campo Grande (MS) - ms@viracao.org Curitiba (PR) - pr@viracao.org Florianópolis (SC) - sc@viracao.org Fortaleza (CE) - ce@viracao.org Goiânia (GO) - go@viracao.org João Pessoa (PB) - pb@viracao.org Lavras (MG) - mg@viracao.org Maceió (AL) - al@viracao.org Manaus (AM) - am@viracao.org Natal (RN) - rn@viracao.org Porto Velho (RO) - ro@viracao.org Recife (PE) - pe@viracao.org Rio Branco (AC) - ac@viracao.org Rio de Janeiro (RJ) - rj@viracao.org Sabará (MG) - mg@viracao.org Salvador (BA) - ba@viracao.org S. Gabriel da Cachoeira - am@viracao.org São Luís (MA) - ma@viracao.org São Paulo (SP) - sp@viracao.org Serra do Navio (AP) - ap@viracao.org Teresina (PI) - pi@viracao.org Vitória (ES) – es@viracao.org

A Revista Viração é publicada mensalmente em São Paulo (SP) pela ONG Viração Educomunicação, filiada ao Sindicato das Empresas Proprietárias de Jornais e Revistas de São Paulo (Sindjore); CNPJ: 11.228.471/0001-78; Inscrição Municipal: 3.975.955-5

atendimento ao leitor Rua Augusta, 1239 - conj. 11 - Consolação 01305-100 - São Paulo - SP Tel./Fax: (11) 3237-4091 / 3567-8687 HoRáRio dE atEndimEnto Das 9h às 13h e das 14h às 18h E-mail da REdação E assinatuRa redacao@viracao.org assinatura@viracao.org

Revista Viração • Ano 8 • Edição 67 03


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Nova legislação

É de lei: Ensino Médio agora é obrigatório. Antes, obrigaç ão do governo se estendia somente até o Ensino Fundam ental

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Apostila polêmica

Caderno do Aluno, apostila proposta pelo governo de São Paulo como complementar ao ensino, gera insatisfação entre estudantes

Para todos, não para algun

s Acessibilidade não é opção; escolas buscam adaptar suas dependências para torn á-las acessíveis para todos, alunos com e sem deficiência

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Escola educomunicativa

ão e mobilização jovem Viração forma núcleos de comunicaç e Ceará Pará , Paulo São em escolas públicas de

18 Inovação na escola

Projeto do governo federal incentiva Estados a reformular a educação, baseando-se nas escolhas e autonomia dos estudantes

Sempre na Vira

Manda Vê. . . . . . . . . . . . . . 06 De Olho no ECA . . . . . . . . . 10 PCU (Plataforma dos Centros Urbanos)28 Que Figura! . . . . . . . . . . . . 32 No Escurinho . . . . . . . . . . . 33 Parada Social . . . . . . . . . . . 34 Rap Dez . . . . . . . . . . . . . . . 35

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Jovens especialistas

Ensino técnico dá bases para quem quer aprender uma profissão; estudantes discutem prós e contras

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Bullying em vídeo Iniciativa da ONG mineira Entreface, vídeo produzido por adolescentes e jovens traz opiniões sobre ofensas físicas e verbais nas escolas

Formação integral

Além das matérias pre vistas no currículo, esc olas trabalham temas consid erados “transversais”, como sexualidade, meio ambie nte e ética

Democratizando o ensino

A socióloga Helena Singer falou sobre experiências relacionadas à educação democrática. Aproveitamos e batemos um papo também com o português José Pacheco, da Escola da Ponte. Confira!

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Tradição em sala de aula

Encontro em Mato Grosso do Sul aborda uma educação indígena que promova aprendizado sobre cultura e costumes do povo guarani

RG VÁLIDO EM TODO TERRITÓRIO NACIONAL Conselho Editorial

Direção Executiva

Eugênio Bucci, Ismar de Oliveira, Izabel Leão, Immaculada Lopez, João Pedro Baresi, Mara Luquet e Valdênia Paulino

Paulo Lima e Lilian Romão

Conselho Fiscal Everaldo Oliveira, Renata Rosa e Rodrigo Bandeira

Conselho Consultivo

Equipe Ana Paula Marques, Carol Lemos, Elisangela Nunes, Eric Silva, Gisella Hiche, Luciano de Sálua, Manuela Ribeiro, Maria Rehder, Rafael Lira, Rafael Stemberg, Sâmia Pereira, Sonia Regina, Vânia Correia e Vivian Ragazzi

Douglas Lima, Isabel Santos, Ismar de Oliveira e Izabel Leão

Administração/Assinaturas

Presidente

Mobilizadores da Vira

Juliana Rocha Barroso

Acre (Leonardo Nora), Alagoas (Jhonathan Pino), Amapá (Camilo de Almeida Mota), Amazonas (Cláudia Ferraz e Délio Alves), Bahia (Nilton Lopes), Ceará (Amanda Nogueira e Rones Maciel), Distrito Federal (Ionara Silva), Espírito Santo (Filipe Borges, Jéssica Delcarro, Leandra Barros e Wanderson Araújo), Goiás (Érika Pereira e Sheila Manço), Maranhão (Sidnei Costa), Mato Grosso

Vice-Presidente Cristina Paloschi Uchôa

Primeiro-Secretário Eduardo Peterle Nascimento

Douglas Ramos e Norma Cinara Lemos

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do Sul (Fernanda Pereira), Minas Gerais (Maria de Fátima Ribeiro e Pablo Abranches), Pará (Alex Pamplona), Paraíba (Niedja Ribeiro), Paraná (Juliana Cordeiro), Pernambuco (Maria Camila Florêncio), Piauí (Anderson Ramos da Luz), Rio de Janeiro (Gizele Martins), Rio Grande do Norte (Alessandro Muniz), Rondônia (Luciano Henrique da Costa), Roraima (Cleidionice Gonçalves), Santa Catarina (Celina Sales e Ciro Tavares) e São Paulo (Damiso Faustino, Luciano de Sálua, Sâmia Pereira, Simone Nascimento e Virgílio Paulo).

Projeto Gráfico Ana Paula Marques e Cristina Sayuri

Jornalista Responsável Paulo Pereira Lima – MTB 27.300

Divulgação Equipe Viração

E-mail Redação e Assinatura redacao@viracao.org assinatura@viracao.org

Colaboradores Ana Paula Corti, Antônio Martins, Diego Pereira dos Santos, Emilia Merlini, Heloísa Sato, Lentini, Karina Lakerbai, Márcio Baraldi, Natália Forcat, Novaes e Sérgio Rizzo.

Consultor de Marketing Thomas Steward

Preço da assinatura anual Assinatura Nova Renovação De colaboração Exterior

R$ 58,00 R$ 48,00 R$ 70,00 US$ 75,00


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A Vira pela igualdade. Diga lá. Todas e todos Mudança, Atitude e Ousadia jovem.

Fale com a gente!

Diga lá

@marcelolirio, via Twitter @viracao Eu quero fazer parte! Como faço?

Lara Dee, por e-mail, de São Paulo (SP) Oi jovens da Viração!

Eêêê! O beijo foi encaminhado, Lara! Também curtimos muito ter feito essa entrevista.

Aqui é Lara Dee, do Instituto Beleza & Cidadania. Recebi a revista de setembro (nº 65) e quero dar um beijo enorme em todos que fizeram a minha entrevista (Galera Repórter). Adoreiiiiiiiiiiiiiiiiiiiiii! Continuem assim! @bolaearte, via Twitter Iniciativa muito importante!! Divulguem!!! http://digi.to/tY5tE Dia Nacional de Luta Contra a Elitização do Futebol Brasileiro

Mande um e-mail para redacao@viracao.org... Por lá explicaremos como você pode fazer parte dessa turma!

Está dado o recado!

Rodolfo, Maria Cláudia e Mariana, por e-mail, de São Paulo (SP) Nós do CEU Caminho do Mar gostaríamos de agradecer imensamente a matéria sobre o Projeto "Balaio Cultural" (edição nº 65). Muito nos honrou ser pauta da série de reportagens feitas pelos adolescentes da PCU. Gostaríamos de sugerir também um outro projeto para vocês conhecerem, o "Sarau Literário", criado por um morador daqui da comunidade do Jabaquara (SP), e que reúne desde grandes poetas e escritores até jovens talentos da arte literária, sempre no último domingo de cada mês.

Legal! Fica a dica para os nossos leitores colocarem na agenda do final de semana.

Abraços e mais uma vez obrigado.

Ponto G

no Twitter! Siga a Vira rfil é Nosso pe ao r.com/virac http://twitte

Para garantir a igualdade entre os gêneros na linguagem da Vira, onde se lê “o jovem” ou “os jovens”, leia-se também “a jovem” ou “as jovens”, assim como outros substantivos com variação de masculino e feminino.

Mande seus comentários sobre a Vira, dizendo o que achou de nossas reportagens e seções. Suas sugestões são bem-vindas! Escreva para nosso endereço: Rua Augusta, 1239 - Conj. 11 Consolação - 0135-100 - São Paulo (SP) ou para o e-mail: redacao@viracao.org Aguardamos sua colaboração!

Esta edição da Vira contou com um atrativo "especial". Todos os desenhos que você confere ao longo das 36 páginas foram feitos por Manuela Ribeiro, nossa super estagiária de Arte. Ela contou com Ana Paula Marques, designer da revista, pra criar os cenários fofos por onde passeiam os personagens. Esperamos que vocês gostem. Obrigado, meninas! =)

Parceiros de Conteúdo


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Manda Vê Mayara Mantovani, do Virajovem Campinas (SP)*, e Érika Pereira, do Virajovem Goiânia (GO)*

Qual a receita para tornar a escola um espaço mais agradável entre os que a frequentam? Essa resposta, com certeza, todos (estudantes, educadores, governos e sociedade civil) gostariam de tê-la. Em todo o mundo, é consenso que a educação é uma questão fundamental para o desenvolvimento de uma sociedade. Mas infelizmente, alcançar um nível educacional de qualidade tem sido uma tarefa difícil para os governos e gestores de educação. Principalmente no que diz respeito ao Ensino Médio, fase escolar que pode ser compreendida de diferentes maneiras. Alguns o tem como a ponte para a entrada na universidade e, consequentemente, a conquista de um bom cargo profissional no futuro. Essa visão faz com que escolas,

públicas e privadas, preparem o aluno para apenas um fim específico: passar nos vestibulares mais concorridos do País. E tentam, a todo custo, garantir o máximo de seus alunos entre os primeiros na lista de egressos de cursos como Medicina e Engenharia. Já outras pessoas encaram o Ensino Médio como a oportunidade de ampliar a formação cidadã do estudante, valorizando suas habilidades e incentivando a busca pela descoberta do novo. Mas esses são apenas dois formatos de ensino no qual o jovem precisará escolher ao avançar a educação Fundamental. E para entender melhor o que a moçada pensa sobre o Ensino Médio, os Conselhos Jovens da Vira Campinas (SP) e Goiânia (GO) foram ouvir a opinião de alguns estudantes sobre o assunto, que você confere a seguir.

Qual o Ensino Médio que você deseja? João Paulo Pucinellei, 20 anos, Caldas Novas (GO) “Acredito que o Ensino Médio tem que ser um lugar que dá conta de garantir aos jovens uma leitura do mundo, apontando horizontes e potencializando a elaboração de projeto de vida”.

Izabella Mantovani, 16 anos, Campinas (SP) “Professores mais competentes. Uma melhor qualidade na educação, tanto na escola (estrutura) quanto nos livros didáticos”.

Janis de Oliveira, 18 anos, Campinas (SP) “Queria que tivesse um preparo mais forte para o vestibular e para o Enem (Exame Nacional do Ensino Médio). E que o esporte estivesse mais presente nas escolas”.

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Luana Gonçalves, 17 anos, Campinas, (SP) “Melhores professores, que dão mais atenção aos alunos, e salas adequadas”.

* Integrantes de Conselhos Jovens da Vira presentes em 22 Estados e no Distrito Federal (go@viracao.org e sp@viracao.org)


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Vanilson Farias, 16 anos, Senador Canedo (GO)

Raissa Katia Rodrigues, 19 anos, Campinas (SP)

“Quero um Ensino Médio que aproxima o aluno da escola, com aulas menos chatas, divertidas, usando ferramentas como a música para deixá-las mais alegres e interessantes”.

“Professores que ensinem com mais dedicação e que respeitem mais os alunos”.

Michelly Bezerra Guedes, 15 anos, Goiânia (GO) “O Ensino Médio que quero deveria ser aquele que nos ajuda a ter uma base para a vida profissional”.

Thais Pereira dos Santos, 17 anos, Goiânia (GO) “Eu quero um Ensino Médio que me prepare para a universidade pública. E que não haja discriminação entre os alunos de ensino público e privado”.

Wellington Fernandes, 17 anos, Campinas (SP) “Que os professores se interessem em dar matéria e que sejam mais focados no assunto”.

Que Ensino Médio Queremos? (vários autores) Ação Educativa Essa publicação foi o relatório final do projeto Jovens Agentes pelo Direito à Educação (Jade) e traz os planos de ações para as políticas públicas de educação em escolas do Ensino Médio, a partir de uma pesquisa realizada entre estudantes, professores e funcionários de escolas públicas, integrantes da comunidade, agentes governamentais e da sociedade civil. Dividido em duas partes, a primeira apresenta um perfil dos 880 alunos que participaram da pesquisa de opinião, mostrando suas visões e perspectivas sobre o Ensino Médio. Na etapa seguinte, a comunidade escolar de cinco instituições públicas de ensino de São Paulo (SP) foram convidadas para discutir o Ensino Médio ideal. O livro pode ser baixado gratuitamente no site da Ação Educativa: http://tinyurl.com/27z2qrb

Faz Parte

Baixa qualidade

Divulgado no início de novembro de 2010, o relatório do Índice de Desenvolvimento Humano (IDH) para 2010 coloca o Brasil na 73ª posição, em um total de 169 países. Realizado pelo Programa das Nações Unidas para o Desenvolvimento (PNUD), o documento aponta a educação de baixa qualidade como um dos principais problemas do País. Segundo o IDH, a escolaridade média do brasileiro é de 7,2 anos de estudo, e a expectativa de vida escolar é de 13,8 anos. Como neste ano o PNUD adotou novos critérios de avaliação, não é possível fazer uma comparação com os anos anteriores. Na nova metodologia, por exemplo, não basta apenas as crianças e os jovens estarem matriculados na escola, mas eles precisam estar nas séries adequadas às suas idades. Apesar disso, o Brasil ainda configura entre os países de alto desenvolvimento humano, como em 2009.


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Agora é lei aprovada em 2009 Governo tem que garantir educação gratuita até o Ensino Médio; proposta foi Fernanda Garcia e Jefferson Baicere, do Virajovem Campo Grande (MS)*

E

ste ano vai ficar marcado por muitas mudanças importantes na educação brasileira. Foi o ano de aprovação da Proposta de Emenda Constitucional (PEC) que prevê responsabilidade para o governo em oferecer instituições de ensino gratuitas até o término do Ensino Médio. Antes, essa obrigação se estendia somente até o Ensino Fundamental. O Senado Federal aprovou a proposta (Lei 12.061/09) por unanimidade e garante, inclusive, a oferta gratuita para todos os que não tiveram acesso ao ensino na idade apropriada. Ou seja, agora o governo tem a obrigação de fornecer educação de qualidade para os adolescentes até os 17 anos. O prazo segue até 2016, nos termos do Plano Nacional de Educação, com apoio técnico e financeiro da União, mas espera-se que as autoridades políticas comecem a trabalhar logo. Após essa alteração, meninos e meninas devem ter garantido o direito de se matricular aos quatro anos de idade e permanecerem na escola até os 17 anos, pelo menos. Conforme dados do Ministério da

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Educação, cerca de 10 milhões de adolescentes estão com idade entre 15 e 17 anos, porém só a metade está cursando o Ensino Médio. Os outros saíram da escola ou continuam no Ensino Fundamental. A ampliação dos anos de escolaridade está em sintonia com as metas do movimento Todos Pela Educação. De acordo com a proposta, a distribuição dos recursos públicos tem como prioridade o atendimento das necessidades do ensino obrigatório. Sendo assim, estão inclusas a universalização, garantia de padrão de qualidade e equidade, nos termos do Plano Nacional de Educação.

Investir na Educação para o futuro O Instituto Nacional de Estudos e Pesquisas Educacionais Anísio Teixeira (Inep) revela que uma criança com acesso à pré-escola tem 32% mais chances de concluir o Ensino Médio. Dirigentes educacionais, governo e as escolas devem ficar atentos à Lei de Diretrizes Básicas (LDB) e nas Diretrizes Curriculares Nacionais do Ensino Médio, para criarem grades curriculares que causem interesse e estimulem os jovens. As finalidades do Ensino Médio estão previstas no artigo 35 da LDB. Os estudos devem ser voltados para consolidar e aprofundar os conhecimentos adquiridos no Ensino Fundamental, possibilitando o prosseguimento de estudos; fornecer preparação básica para o trabalho e a cidadania; aprimorar o estudante como pessoa, incluindo a formação ética e o desenvolvimento da autonomia intelectual e do pensamento crítico; preparar o aluno para compreender os fundamentos científico-tecnológicos dos processos produtivos, relacionando a teoria com a prática. V

Integrantes de Conselhos Jovens da Vira presentes em 22 Estados do País e no Distrito Federal (ms@viracao.org)


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Ivo S sa ou

A C E o n o De olh

Onde está o Ensino Médio no ECA? O que o ECA menciona sobre o Ensino Médio e quais são suas reflexões acerca desse período educacional? Pedro Couto, do Virajovem Brasília (DF)*

E

squeceram-se do Ensino Médio no Estatuto da Criança e do Adolescente (ECA)? Há quem se pergunte isso. Apesar de o termo "Ensino Médio" aparecer uma única vez no texto do Estatuto, isto não quer dizer que tal período da educação seja desconsiderado, ou mesmo deixado de lado pela legislação. Em todo o Estatuto, a exclusiva referência ao EM consta do capítulo IV, que, entre outras coisas, dispõe sobre o direito à educação. "Art. 54. É dever do Estado assegurar à criança e ao adolescente: (...) II - progressiva extensão da obrigatoriedade e gratuidade ao Ensino Médio; (...)". A aparição do EM na lei é importante na medida em que debate uma questão fundamental: a obrigatoriedade e gratuidade do EM. É indiscutível confirmar a relevância de um pequenino inciso que, progressivamente, propõe-se a estender a escolaridade dos adolescentes brasileiros. Melhor ainda é saber que o que já figurava no ECA foi ampliado por uma Emenda Constitucional (EC) ano passado. A EC nº 59/2009 definiu, de fato, a obrigatoriedade da educação básica (que é a soma da Educação Infantil, Ensino Fundamental e Médio). Agora, o Ensino Médio também é obrigatório. Apesar disso tudo (e olha que é muita coisa), é possível que a relação principal do EM com o ECA resida em uma autêntica potencialidade de protagonismo. O EM é um espaço privilegiado para se pensar o protagonismo juvenil e, portanto, o próprio paradigma de crianças e adolescentes enquanto sujeitos de direitos (somado, também, à proteção integral). É nas escolas de EM que,

geralmente, consolida-se o exercício de participação e protagonismo: seja na formação de grêmios estudantis ou mesmo nas inquietações dos adolescentes no universo da escola ou da própria comunidade; seja nas insatisfações com um sistema educacional que geralmente é dado de antemão, sem lugar para a conversa com os jovens. Muitas vezes é no EM que os adolescentes se organizam para exigir a prioridade na formulação e execução de políticas públicas (e, naturalmente, investimentos no orçamento público) que lhes é de direito. Há certamente uma qualidade de diálogo no Estatuto que é, sem dúvida, um desafio no universo escolar brasileiro. Para uma pedagogia dialógica, é indispensável que os estudantes se identifiquem enquanto sujeitos protagonistas e ativos de suas próprias vidas. O diálogo deve ser priorizado nas relações entre os adolescentes e os membros de suas escolas e comunidade (e não apenas aí) — mesmo que aquele gere tensões e conflitos. Mesmo que perturbe e incomode, o diálogo deve ser promovido. À criança e ao adolescente foi reservado um autêntico papel de protagonismo. E no EM, esse protagonismo pode se maximizar e atingir significativa potencialidade. Deixemos ressoar os ecos do ECA: o diálogo e o paradigma de que os adolescentes vivam suas vidas com liberdade e conscientes de sua condição de sujeitos de direitos. Não é porque o EM é citado apenas uma vez no Estatuto que ele não seja considerado apropriadamente. O EM está lá no ECA, singelamente, entretanto, permeando toda uma filosofia de protagonismo e participação. V

*Um dos Conselhos Jovens da Vira presentes em 22 Estados e no Distrito Federal (df@viracao.org)

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VIRARTE

o Ensino Médio pra mim C

omo representar o Ensino Médio? O que ele lembra pra você? Pedimos aos adolescentes e jovens de projetos da Viração que colocassem suas opiniões e sentimentos no papel sobre esta importante etapa educacional, baseando-se em suas experiências pessoais. O resultado foi um poema e os dois desenhos que você confere a seguir.

Agatha Morais, de 16 anos, estudante de São Paulo (SP)

Soluções?

Bruna Constância Nascimento, de 15 anos, adolescente comunicadora da Plataforma dos Centros Urbanos (PCU), em São Paulo (SP) Ayrton Rodrigues de Souza, de 16 anos, adolescente comunicador da Plataforma dos Centros Urbanos (PCU), de Itaquaquecetuba (SP)

“O ensino médio não é fácil mesmo assim temos que encarar se os alunos não se esforçarem não vão conseguir conquistar. Na escola existem muitos problemas e os professores conhecem esse dilema. Os alunos não respeitam o professor e isso pode causar terror. A educação não está muito boa porque falta muito professor. A melhor coisa a fazer é estudar para valer.”

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Caderno da discórdia dernos do Aluno” é fraco e que Estudantes reclamam que conteúdo de “Ca los professores não estão capacitados para usá-

Vivian Ragazzi, da Redação

A

ssim que chegaram na rede estadual de ensino de São Paulo, em 2008, os “cadernos do aluno” geraram curiosidade por parte de estudantes e professores. Com quatro edições por ano (uma por bimestre) e divididos por matérias, eles trazem textos, gráficos e exercícios do 5º ano do ensino fundamental ao 3º ano do ensino médio. Mas rapidamente a curiosidade que a novidade gerou virou motivo de reclamações. Fazendo uma breve pesquisa no Google, dá para achar diversas comunidades e blogs criticando a iniciativa. O caderno do aluno surgiu um ano depois do lançamento do “caderno do professor”, criado em 2008, com sugestões de metodologias e abordagens em sala de aula. “Quando vi pela primeira vez, achei o máximo, que ia dar um 'up' nas aulas”, conta Marina Lenk Baltazar, de 17 anos, da zona norte de São Paulo. “Pareciam aquelas apostilas de escola particular”, lembra a estudante. Mas a alegria durou pouco. “Logo em seguida, vi que não era o que eu pensava, porque não melhorou a qualidade das aulas, continuava tudo 'relaxado'. Alguns professores nem corrigem o que a gente faz no caderno”, comenta Marina. Ela sentiu isso na pele quando a professora pediu aos estudantes para preencherem um caderno inteiro de Geografia em apenas uma semana. Para dar conta da missão, pediu ajuda para a mãe, que acabou fazendo duas páginas da apostila para a filha. A letra materna, bem diferente da de Marina, não chamou a atenção da professora, que simplesmente “deu um visto” no caderno e 1 ponto a mais na média final da estudante. Para o vestibulando em História Victor Aquino, de 17 anos, a obrigatoriedade de unificar o currículo e garantir que todos os estudantes de escolas estaduais tenham o mesmo acesso aos conteúdos faz com que os professores “corram” para finalizar os cadernos, muitas vezes passando as matérias rapidamente, fazendo com que os alunos tenham dificuldade para fazer os exercícios. Por isso, dificilmente sobra tempo para aprofundar certos tópicos. “Pedi para um professor explicar um conteúdo de Matemática muito importante para o vestibular, mas que não estava no caderno do aluno. Ele disse que não poderia dar, pois estava fora do programa”, lamenta Victor, que diz achar que os cadernos foram feitos às pressas, sem muito planejamento. Enquanto alguns acham as apostilas fracas, outros encontram dificuldade para acompanhar os conteúdos. É o caso

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de Michel Ribeiro, de 17 anos. Ele e outros colegas de escola acham algumas matérias muito difíceis de entender. “Não aprendemos um monte de coisas que estão nos cadernos, então fica complicado recuperar matérias que ficaram para atrás em anos anteriores”, argumenta. Gutierrez de Jesus Silva concorda, mas compreende a origem do problema. “Se tivéssemos estudado com os cadernos do aluno desde a 5ª série, provavelmente estaríamos melhor preparados”. Para os entrevistados, os professores não estão preparados para usar os cadernos. “Tem coisas lá que os professores nem conhecem”, opina Nayara Lima, de 18 anos. Outro desafio apontado pelos estudantes é a demora para a chegada dos cadernos no início dos bimestres. Só no fim de novembro a escola de Michel recebeu os cadernos do 4º bimestre. “Já estamos com as notas fechadas, o que vai adiantar agora?”, pergunta. Segundo informações divulgadas pela Secretaria de Estado da Educação, o “Caderno do Aluno“ é um material complementar que não substitui o material didático, que deve


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ser utilizado em conjunto com os materiais destinados aos professores. A Secretaria destacou, em entrevista à Vira, que os professores estão sim preparados para utilizar os cadernos, pois contam com uma apostila paralela à do aluno, o “caderno do professor”. Além disso, o órgão ressalta que “todos os professores aprovados no último concurso estão participando do Curso de Formação Específica, oferecido pela Escola Paulista de Formação de Professores”, com o objetivo de oferecer melhor formação aos professores da rede estadual, e consequentemente, um ensino de melhor qualidade aos alunos. Sobre a demora na chegada das apostilas, a Secretaria disse que precisa apurar para verificar a veracidade da denúncia, e a partir daí, tomar as medidas cabíveis. s Santos

Proposta aceita

Fotos: Miche

l Ribeiro do

Em junho de 2010, a estudante Bruna Sevilhano Silva, de 16 anos, de Guainazes, zona leste de São Paulo, foi delegada na Conferência Municipal de Educação. Na ocasião, foi desenvolvido o plano decenal de educação, e Bruna apresentou uma proposta de fim do caderno do aluno. “Essas apostilas não têm conteúdo e os professores não estão preparados para usá-los”, destaca. Segundo Bruna, a proposta foi aceita na Conferência, com a redação que ela e outros adolescentes propuseram. “Até os professores da minha escola apoiaram”, diz. O Plano Municipal de Educação deve ser um documento orientador de políticas públicas, definindo, com força de lei, as prioridades do setor no prazo de dez anos. Como forma de acompanhar a proposta de fim do caderno do aluno, Bruna e outros adolescentes que participaram da redação da proposta se reúnem bimestralmente, para discutir sobre o tema e pensar em encaminhamentos. “A apostila não tem lógica! Ninguém entende porque os professores e nós somos obrigados a usar o caderno do aluno. Todo mundo copia as respostas da internet e aí passa de ano. Mas e para entrar na faculdade? O ECA (Estatuto da Criança e do Adolescente) nos garante educação de qualidade. Cadê ela?”, desabafa.

V

Dois Paraguais Em 2009, o caderno do aluno de Geografia ficou conhecido nacionalmente por trazer duas vezes o Paraguai no mapa da América do Sul e por inverter a localização do Paraguai e do Uruguai. Outro erro encontrado foi a não-inclusão do Equador num dos mapas. Na época, a secretaria responsabilizou a incorreção à Fundação Vanzolini, que “elaborou os mapas e o projeto gráfico”, que se defendeu dizendo que o material é produzido por professores indicados pela secretaria.

Estudantes reclamam que cadernos chegam atrasados às escolas. Em outras, estoques ocupam salas inteiras

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Escola inclusiva já! éfica para todos

Integração em sala de aula é ben

Ana Luíza Vastag e Luciano de Sálua, do Virajovem São Paulo (SP), e Jéssica Delcarro, do Virajovem Pinheiros (ES)*

O

Estado de São Paulo prevê, em legislação, garantia de alunos com deficiência serem matriculados em escolas comuns. E para que isso aconteça, a Secretaria de Educação criou, em algumas escolas da rede estadual, o Serviço de Apoio Pedagógico Especializado (Sape), em que diariamente o aluno recebe acompanhamento dos conteúdos desenvolvidos em sala de aula, uma espécie de complemento didático. Mas caso essa inclusão não consiga fazer o aluno se adaptar ao ensino regular, a lei abre a exceção de se montar uma classe especial, com demandas específicas, em que o aluno somente é aceito com a apresentação de laudo médico e havendo professores capacitados para tal ensino. Um exemplo disso é a Escola Estadual Professora Zenaide Vilalva de Araújo, na zona oeste de São Paulo (SP), estruturada com acessibilidade e materiais didáticos diferenciados para a recepção de alunos com deficiência intelectual. A instituição de ensino mantém, há três anos, uma classe especial para alunos de Ensino Fundamental II, com quinze estudantes, entre 15 e 22 anos. Professora de classe especial, Deise Cazarine conta que além das disciplinas comuns, como Português e Matemática, os estudantes desenvolvem, durante as quatro horas e meia de aula, trabalhos manuais como artesanato e desenhos. Por meio de projetos que trabalhem ao mesmo tempo o individual e o coletivo em sala de aula, Deise também explora o conhecimento e a solidariedade dos estudantes, valorizando o desenvolvimento de conteúdos atitudinais. A alfabetização é feita da forma tradicional, em que os estudantes passam inicialmente pelo processo de cópia das letras, entendimento do seu significado e, então, formação das palavras. “Eu tenho quatro alunos que são alfabetizados, os outros (11) não são. Eles só conhecem 'A, B, C' e '1,2,3,4'. Eles distinguem a letra do número, mas fora isso, não. Muitos escrevem o nome de memória”, conta a educadora. Nessa classe especial, cada pessoa tem uma síndrome diferente, porém todos possuem deficiência intelectual. A diretora da escola, Sirlene Manoel, alega que essa diversidade é um ponto

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positivo, pois os estudantes aprende a aceitar as diferenças uns dos outros, e passam a se considerar como iguais. “Cria-se um sentimento de solidariedade, em que um pode ajudar o outro na sua deficiência. Os alunos se descobrem, além de úteis, pertencentes”, fala. Aplicando o conceito de escola inclusiva, os estudantes são avaliados um a um e, conforme o progresso que apresentam, deixam a sala especial e passam a frequentar a sala regular. Mas quando a situação exige, pela inadequação etária ao ambiente escolar, é oferecida a terminalidade de estudos. Coordenadora da E.E. Zenaide, Iracema Pereira afirma que a dificuldade é justamente a falta de um grupo que acompanhe mais de perto o desenvolvimento e implementação do projeto, e mostre aos educadores da classe regular como aplicar os conceitos de inclusão propostos no capítulo 5 da Lei de Diretrizes e Bases da Educação (LDB). “Nós temos algumas palestras e materiais de estudo, mas no dia a dia é complicado. Nós ainda não conseguimos lidar muito bem com a inclusão, porque envolve não só questões acadêmicas, mas emocionais e de adaptação. A sala especial surge pela dificuldade da escola em lidar com alunos com deficiência”, ressalta Iracema. À Vira, alguns estudantes relataram considerar positiva a integração entre estudantes que a escola oferece, pois quase todos se ajudam mutuamente e aceitam as diferenças uns dos outros. Caio de Carvalho, de 18 anos, lembra que nas outras escolas onde estudou os professores não lhe ensinavam a matéria. “Eles não tinham muita paciência comigo, e diziam que não tinham tempo pra me ensinar porque eles tinham de ensinar o resto da sala. Mandavam eu pedir ajuda para outra pessoa”. Em outra escola da capital paulista, a coisa é um pouco diferente.“Na minha escola há uma estudante com Síndrome de Down. Quando iniciou os estudos, todos os alunos a receberam, mas ainda possuem receios de se aproximar dela por conta da sua deficiência”, diz a jovem Isabela Andrade Vaz. Especialista em educação diferenciada, a pedagoga Agda Felipe Gonçalves, que atua no Espírito Santo, acredita que todo


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profissional da área de educação deveria ter conhecimentos básicos sobre como lidar com pessoas com deficiência. “A escola além de ser um espaço de apropriação do conhecimento também se torna um local de encontros e amizades, favorecendo o desenvolvimento do aluno com deficiência e propiciando uma maior interação social. Sabemos que há preconceito por parte de alguns alunos ditos 'normais', mas podemos afirmar que a presença da pessoa com deficiência dentro da escola e na sala de aula comum tem possibilitado um outro olhar em relação à deficiência”. Mas além da boa formação dos professores, a escola deve assegurar estrutura física adequada para receber qualquer aluno. Em todo o Brasil, instituições públicas não conseguem recursos financeiros para investir na reforma de seus prédios, como conta a coordenadora pedagógica Hilda Cristina. “Este tipo de reforma nas escolas, para torná-las acessíveis, é muito complicada, pois não depende da escola e sim dos órgãos do governo”. A reportagem enviou perguntas para o Ministério da Educação para falar sobre a distribuição de recursos destinados à educação e se existem recomendações para a construção de escolas acessíveis no Brasil. Mas até o fechamento desta edição não houve resposta. “O aluno com deficiência é um cidadão de direitos e, dentre esses direitos, está o direto à educação de qualidade no espaço escolar. Precisamos pensar em uma escola que acolha a todos sem preconceito ou discriminação. A pessoa com deficiência tem potencial para alcançar pleno conhecimento em todas as áreas”, finaliza Agda Gonçalves. V

*Um dos Conselhos Jovens da Vira presentes em 22 Estados e no Distrito Federal (sp@viracao.org e es@viracao.org)

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´ A midia dentro da sala de aula formação em mídias sociais, Projeto Formação nas Escolas traz ntes de escolas públicas mobilização e articulação para estuda

Luciano de Sálua, da Redação

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entro das instituições de ensino público, os estudantes vivem diversas realidades em todo o País. Porém, uma realidade comum a todos é a falta de disciplinas na grade curricular que proporcionem maior entendimento sobre o papel dos meios de comunicação e uma leitura crítica desses espaços de informação. Michael Vinicius Nascimento, 17 anos, estudante de São Paulo, reclama dessa ausência: “Na minha escola não tem nenhuma matéria que fale sobre a imprensa. Seria muito importante ter algo do tipo, afinal precisamos saber quais e que tipos existem e como podemos utilizá-las”. Pensando nisso, a Viração Educomunicação, em parceria com as ONGs Instituto Universidade Popular (Unipop), do Pará, e a Catavento Comunicação e Educação, do Ceará, iniciaram a criação de núcleos de comunicação e mobilização jovem em escolas públicas. O projeto “Formação nas Escolas”, que começou em março deste ano, escolheu seis escolas públicas

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para receberem as formações nessa etapa piloto do projeto. São duas instituições públicas em São Paulo, duas no Pará e outras duas no Ceará. E as regiões escolhidas não foram por acaso, pois a ideia era contemplar diferentes biomas: uma região de grande centro urbano, uma região amazônica e outra no semiárido brasileiro. O objetivo das oficinas é criar espaços de participação juvenil, por meio da utilização da comunicação no cotidiano da escola. Além dos debates, os participantes discutem linguagem e técnicas jornalísticas, ética na comunicação, jornalismo social, novas tecnologias, redes sociais, entre outros assuntos. Em São Paulo, as escolas participantes são a E.E. Ana Siqueira e a E.E. Valdir Pinto, ambas localizadas na capital. “As oficinas nos trazem diversas informações. Aprendemos várias características de rede para mobilização, e isso é muito legal!”, disse a estudante Pâmela Alves de Jesus, da escola Ana Siqueira,


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ao término da oficina sobre redes (participação coletiva). Já na Escola Valdir Pinto, o estudante Jackson de Araújo Silva afirma que as formações que têm recebido ajudarão na forma como enxerga a mídia. “Daqui pra frente vou poder me comunicar melhor! Vou entender melhor os meios de comunicação e saber como posso participar deles”. No Ceará, o projeto realizado pela ONG Catavento acontece em três cidades diferentes. Em Fortaleza, na Escola Marvin, em Osébio, na E.E. Ana Bizerra, e em Paramoti, na E.E. Tomé Gomes. A educadora Clarissa Diógenes é quem conta um pouco sobre como tem sido a experiência por lá. “A ideia é que, ao término das formações, o projeto não acabe, que eles possam alimentar o site da Agência de Notícias

utilizando torpedos SMS. Ao todo, participam 300 pessoas, entre funcionários, professores, estudantes e moradores das comunidades onde estão inseridas as escolas”. Clarissa diz que mesmo sendo de regiões próximas, cada escola possui uma realidade diferente da outra, mas que isso não impede a realização das oficinas. “Já vemos os sinais de que tem dado certo as formações, pois (os alunos) já conseguem diferir o que é uma reportagem, fazem produção de conteúdo e avaliam criticamente as diferentes mídias”. A primeira etapa do projeto termina neste ano, mas a partir de 2011 os participantes das oficinas vão iniciar a produção de conteúdo para diversas mídias com temáticas trazidas por eles mesmos, ocupando o espaço com suas vozes! V

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Estudantes recebem formação em educomunicação no Pará, São Paulo e Ceará

Movimento

Virajovem

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Acompanhe no blog do projeto como tem sido as oficinas realizadas nas escolas: http://movimentovirajovem.blogspot.com

E a galera que integra as formações já está colocando em prática tudo o que estão aprendendo nas oficinas. No dia 22 de setembro, na E.E. Ana Siqueira, em São Paulo, foi realizada uma festa para o Dia Nacional da Juventude, que foi planejada pelos adolescentes e jovens do projeto. Eles se reuniram e escreveram o projeto do evento, que logo foi aceito pelos professores e funcionários da escola. Em seguida, fizeram a mobilização pela escola falando sobre a importância de comemorar a data. A festa, que durou todo o dia, contou com uma baladinha com direito a DJ e gincanas para os estudantes, além de uma roda de samba para fechar a noite.

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Capa

Um ensino diferente todo o Brasil, tando o Ensino Médio em en qu fre s en jov de es lhõ Com mais de oito mi e ação inovadora e atraent desafio é criar uma educ

Vinícius Gallon, do Virajovem Curitiba (PR), Caroline Brito, do Virajovem Fortaleza (CE), Sâmia Pereira, do Virajovem São Paulo (SP)*, e Rafael Stemberg, da Redação

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om a proposta de incentivar as redes estaduais de educação a diversificar os currículos escolares e tornar a escola um espaço mais atraente para os alunos, o Ministério da Educação (MEC) criou o projeto Ensino Médio Inovador. Pela proposta, as instituições de ensino participantes podem incluir, na grade de aulas, atividades que integrem educação escolar e formação cidadã. Iniciada neste ano, participam dessa primeira etapa do projeto 357 escolas em todo o Brasil, totalizando mais de 296.312 mil alunos matriculados. O Paraná é o Estado com maior número de escolas participantes, com 84 instituições, seguido do Pará, que possui 34. O MEC convidou todos os Estados, mas apenas 17, e o Distrito Federal, toparam aderir ao novo modelo de Ensino Médio, que somou recursos de R$ 22,6 milhões, destinados pelo governo federal. No Ensino Médio Inovador, uma das mudanças sugeridas pelo MEC é o aumento da carga horária de aulas, que passa das atuais 2400 horas para 3 000 horas ao final dos três anos letivos. Outra mudança é a possibilidade de deixar o aluno escolher, pelo menos, 20% da grade curricular que irá estudar, dentro das atividades que a escola oferece. Também faz parte da proposta incluir aulas em laboratórios, valorizar a leitura e garantir formação cultural. Ilka Madeira Basto, que está na coordenação de Ensino Médio do Ministério da Educação explica que o programa tem alguns indicativos a serem seguidos, que garantem as disciplinas básicas, como Língua Portuguesa e Matemática. “Quando falamos de 'inovador', esperamos que a escola tenha a oportunidade de adequar e pensar a educação de acordo com a sua realidade local, tendo os eixos trabalho, ciência, tecnologia e cultura”, fala Ilka. Entre as atividades oferecidas pelas escolas estão oficinas de hip hop, rádio escola, banda fanfarra e instalação de cineclubes. No Amapá, oito escolas foram contempladas com o projeto, quatro em Macapá e quatro em Santana, cidade a 20 quilômetros da capital. O projeto foi inicialmente implantado em conjunto com avaliações anteriores do Ensino Médio da região. A carga horária da escola foi ampliada para 3600 horas e cada unidade trabalha de forma diferente com o projeto, de acordo com a realidade de cada localidade.“O maior avanço diz respeito à evasão escolar, que diminuiu consideravelmente.

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Uma grande conquista também é a o aumento de participações em olimpíadas (de Matemática e Português) e nos índices do ENEM. Além disso, acreditamos que o projeto trabalha o aluno enquanto cidadão e membro de uma comunidade”, conta o gerente do Núcleo do Ensino Médio de Macapá e Região (AP), Antônio Carlos Favacho. As ações realizadas nas escolas do Amapá incluem aulas de teatro, implantação de salas específicas para o uso de diversas mídias (midiatecas) e exibição de filmes, além de permitir que a escola fique aberta à comunidade nos finais de semana. “Além disso, fornecemos treinamento específico para os professores. Acreditamos que o Ensino Médio Inovador contempla tanto alunos quanto professores”, diz Antônio. Pelo Brasil, além do Ensino Médio Inovador, outras propostas de “revolucionar” a educação acontecem. A seguir, você confere duas iniciativas, feitas no Paraná e Ceará, com a intenção de ter um espaço educativo construído por alunos e professores.


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Transformando experiência em conhecimento Em Curitiba (PR), materiais didáticos são criados a partir das experiências vivenciadas nas salas de aulas Ainda hoje, salvo raras exceções, o modelo vigente de educação no Brasil carrega heranças do período medieval, em que a Igreja era detentora de todo o conhecimento e transmitia as orientações que julgava necessárias para o povo. A escola atual parece ignorar as evoluções tecnológicas e da sociedade ao insistir em educar seus alunos como se eles mesmos já não fossem capazes de fazer isso, por meio de instrumentos como a internet e a televisão. A perda de interesse nas aulas e a evasão escolar são apenas alguns dos resultados de um currículo que nada ou pouco dialoga com a realidade. Na contrapartida desse modelo tradicional de educação, um programa realizado no Paraná tem gerado ótimas experiências e resultados para os alunos, professores e estudiosos da educação. Trata-se do “Projeto Folhas”, criado a partir da necessidade de produzir materiais didáticos que fossem frutos das experiências vivenciadas nas salas de aulas por professores atuantes na educação básica e pública do Estado. “Acredito que por serem registros de suas experiências cotidianas, em sala de aula, as publicações refletem, ao mesmo tempo, as dificuldades enfrentadas no ensino de determinados conteúdos e as alternativas metodológicas criativas encontradas pelos professores. Esse processo é então registrado no 'Folhas' e socializado com outros professores que diariamente passam por situações semelhantes e encontram nesses textos um suporte pedagógico que os auxilie também”, relata um dos coordenadores do projeto, o professor Marcelo Cabarrão.

Em vigor desde 2004, apenas com professores do Ensino Médio, incluindo em 2007 as 14 disciplinas da Educação Básica (séries finais do Ensino Fundamental e Ensino Médio), o “Folhas” tem atraído cada vez mais profissionais da educação. “Diariamente novos 'Folhas' são inscritos no processo de validação. Temos uma grande procura por parte de estudantes, já que este tipo de texto é escrito tendo como leitor primeiro o aluno, e também por professores, principalmente daquelas disciplinas carentes de oferta de materiais didático-pedagógicos, como é o caso de Arte, Filosofia, Educação Física e Sociologia, por exemplo”, conta Marcelo. A escrita do texto “Folhas” é marcada pela pesquisa bibliográfica ou de campo, num processo em que o autor necessita de "validadores", ou seja, orientadores para seu texto. Esses validadores são os próprios professores de sua disciplina e da disciplina de relação interdisciplinar, que o auxiliarão na escrita e revisão de conceitos de seu texto. Depois disso, é encaminhado a uma equipe para validação e orientação no Departamento de Educação Básica na Secretaria de Estado da Educação do Paraná. Portanto, durante todo o processo de escritura, diferentes leitores irão ponderar, comentar, criticar, analisar e sugerir sobre sua produção e, com isso, o texto é aprimorado gradativamente até sua publicação no portal educacional do Paraná, ficando disponível a todos os professores interessados. Dessa forma, a formação continuada e aprofundamentos teóricos acontecem, não somente para

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Capa o autor, mas para todos os envolvidos neste processo. A professora de Artes Silviane Stolker de Lima acredita que quem participa da concepção de um “Folhas” cresce muito com a experiência. “É muito estimulante poder contribuir com a educação a partir das vivências positivas da sala de aula. Sei de professores de artes que têm muita dificuldade em trabalhar com a música, pois imaginam que precisam tocar algum instrumento. Isso não é verdade, já trabalhei com música inúmeras vezes e tive resultados muito interessantes com meus alunos. Essas vivências estão todas relatadas num “Folhas” que escrevi e podem ajudar professores, não só de Artes, mas os que queiram trabalhar a música de diferentes formas”, relata. Silviane conta que o principal objetivo é despertar o interesse e a curiosidade dos alunos. “Nesse texto que a gente prepara, procuramos colocar uma linguagem para o aluno, como numa conversa. Existem várias formas de se fazer isso, uma delas é abrindo os capítulos com um problema para motivar a curiosidade do aluno, para que ele se interesse em responder essa questão”. Outra forma de abordagem, segundo Silviane, é a possibilidade de trabalhar

Acesse o "Projeto Folhas" http://migre.me/2CPG2

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os conteúdos de forma interdisciplinar. “Assim, alunos que têm dificuldade ou não gostam de Física, mas que adoram arte e música possam, numa aula sobre acústica, por exemplo, aplicar os dois conhecimentos e desmistificar a ideia de que teoria não tem prática, e quem sabe, passem a enxergar a física de outra forma”. Livro aberto Na esteira do projeto “Folhas”, foi produzido, publicado e distribuído a todos os professores e alunos do Ensino Médio do Paraná o Livro Didático Público, que é uma forma de política pública educacional que faz coincidir com o professor a figura do escritor. Trata-se de um material produzido por profissionais da rede pública estadual paranaense, envolvendo as disciplinas de tradição curricular no Ensino Médio, como Língua Portuguesa, Matemática e Biologia. Caracteriza-se como material de apoio para estudantes e professores do Ensino Médio das escolas públicas estaduais de todo o Estado do Paraná. As publicações podem ser acessadas no site http://tinyurl.com/livrospr


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Conhecimento técnico Em Fortaleza (CE), escola prepara estudantes para o mercado de trabalho Foi-se o tempo em que os estudantes preocupavamse apenas com as provas e trabalhos da escola. Na rotina das instituições de ensino profissionalizantes, os alunos buscam além do aprendizado tradicional, conhecimentos que possam orientá-los para o mercado de trabalho. Na escola de ensino profissionalizante Marwin, localizada no Bairro Pirambu, em Fortaleza (CE), essa é a realidade dos estudantes de Ensino Médio. No Marwin, os alunos estudam em dois turnos (manhã e tarde) e têm aulas tradicionais aliadas ao conhecimento de um curso técnico que escolhem no ato da matrícula. No total são nove aulas todos os dias. A instituição oferece os cursos de Enfermagem, Informática e Turismo desde março de 2009. Este ano, os alunos também puderam escolher entre Modelagem e Vestuário ou Hospedagem. A grade curricular dispõe que os estudantes vejam as disciplinas do Ensino Técnico juntamente com as disciplinas tradicionais de forma integrada. Dessa forma, durante a manhã os alunos podem estudar Matemática e depois uma disciplina de Informática, por exemplo. No último ano, os alunos fazem um estágio supervisionado organizado pela escola, que os encaminha a uma determinada instituição. As aulas de campo reforçam o aprendizado, já que os alunos têm a possibilidade de conhecer empresas de sua área de atuação.

Caroline

A estudante de Vestuário Paula Franciar, de 15 anos, diz que o curso profissionalizante é uma oportunidade única para garantir um futuro melhor para ela, pois as possibilidades de entrar logo no mercado de trabalho são maiores com os conhecimentos adquiridos no curso. A infraestrutura da escola também é alterada a fim de complementar o aprendizado dos estudantes. A biblioteca, por exemplo, além dos livros de literatura e de disciplinas tradicionais, possuem livros específicos dos cursos profissionalizantes. Além disso, a escola fornece apostilas para cada turma. A instituição possui dois laboratórios específicos. O terceiro, que será uma agência de turismo, ainda está em construção. A coordenadora Maria do Socorro do Amaral aponta que a escola possibilita um amadurecimento aos alunos e uma preparação melhor para o ingresso na universidade. “O aluno fica mais preparado para enfrentar os desafios do cotidiano”, diz. A coordenadora comenta que um dos destaques da escola Marwin é o projeto Diretor de Turma, no qual cada professor é responsável por uma sala de aula. Assim, cada docente acompanha o rendimento dos alunos e entra em contato com a família para informá-los do resultado dos estudantes. A coordenadora informa ainda que o projeto é eficaz, pois os docentes têm tempo de se dedicar a ele já que também estão na escola em tempo integral. V

Brito Arquivo ABr

Por todo o Brasil escolas reinventam a educação no ensino médio

* Um dos Conselhos Jovens da Vira espalhados em 22 Estados mais o Distrito Federal (pr@viracao.org, ce@viracao.org e sp@viracao.org)

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Além do currículo nos temas atuais é uma Inserir disciplinas com foco sse do estudante pela aula ere int o ar ert sp de ra pa va alternati

Maria Camila Florêncio, do Virajovem Recife (PE)*

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rovavelmente você já deve ter visto ou ouvido alguém falar sobre uma aula, palestra ou oficina na escola sobre prevenção de dst/aids, bullying, ética, meio ambiente, entre outros temas. Não, não são disciplinas novas inseridas na grade curricular. São os chamados “temas transversais”, inseridos nos Parâmetros Curriculares Nacionais da Educação, em 1996. Os Parâmetros Curriculares Nacionais (PCNs) constituem um referencial para fomentar a reflexão sobre os currículos estaduais e municipais do Ensino Fundamental e Médio. A função deles é orientar e garantir a coerência das políticas de melhoria da qualidade de ensino. Nesse sentido, é necessário que existam parâmetros a partir dos quais o sistema educacional do País esteja organizado, para garantir que, para além das diversidades culturais, regionais, étnicas, religiosas e políticas que atravessam uma sociedade múltipla e complexa, estejam também garantidos os princípios democráticos que definem a cidadania. E por isso foram incorporados nas disciplinas já existentes os temas transversais Ética, Pluralidade Cultural, Meio Ambiente, Saúde e Orientação Sexual. O problema é que a inserção desses temas é algo que não tem sido implementado na maioria das escolas, principalmente as da rede pública de ensino. Isso se dá principalmente por dois motivos: primeiro, porque alguns professores não se sentem capacitados para trabalhar com o tema – principalmente os relativos às questões da sexualidade e livre orientação sexual, que mexem com a criação e valores das pessoas; e segundo, porque mesmo aqueles com muita boa vontade, que procuram essa formação e se sentem hábeis para isso, não encontram estrutura ou materiais para tal. É pensando nesses problemas que organizações da sociedade civil desenvolvem projetos para trabalhar com esses temas em

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escolas, o que tem tornado mais comum o debate e aprendizado, como acontece em projetos como “Trilha dos Direitos – Uma reflexão de gênero e saúde e direitos sexuais e reprodutivos”, do Coletivo de Jovens Feministas em Pernambuco (CJF-PE), apoiado pelo Fundo SAAP (Serviço de Análise e Assessoria a Projetos) da organização Fase Solidariedade e Educação. A intenção do projeto, relata a integrante do CJF-PE, Mariana Karilena, de 24 anos, “é mais do que pautar o tema, é estimular os alunos e as alunas a buscar mais informações nas temáticas e fornecer materiais para eles e os professores seguirem com os debates nas escolas. Por isso, ao final das oficinas que facilitamos, deixamos um kit com filmes, apostila com sugestão de atividades e textos, entre outros materiais.” Segundo ela, os alunos têm bastante interesse pelos temas e as dinâmicas desenvolvidas pelo grupo por terem abordagens que aproximam mais das práticas nos cotidianos destes, diferente da abordagem das disciplinas que eles possuem na escola. Também com esse propósito de inserir os temas nas escolas, é que surge o Programa Saúde e Prevenção nas Escolas [figurinha conhecida entre nós], que há pouco tempo foi recepcionado pelo Programa Saúde na Escola (PSE). Este, ao contrário da maioria das iniciativas na área, não é um projeto de organizações da sociedade civil e sim do governo, por meio da Área Técnica de Saúde do Adolescente e Jovem do Ministério da Saúde. Mas mesmo este possuindo financiamento próprio, também encontra obstáculos e limitações para sua efetivação mesmo em escolas nas principais capitais brasileiras. Boas práticas existem, não faltam exemplos. Mas faltam decisões políticas por parte do executivo inserindo essas questões na pauta das prioridades das políticas públicas para efetivar o que já vem sendo garantido em dezenas de marcos legais. V

* Um dos Conselhos Jovens da Vira presentes em 22 Estados e no Distrito Federal (pe@viracao.org)


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Outro método romper com a educação Escolas técnicas tentam ensino prático tradicional e apostam no

Sâmia Pereira, do Virajovem São Paulo (SP)*

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s chamadas escolas técnicas, ou Etecs, são instituições de ensino que oferecem, além do Ensino Médio regular, a opção do aluno realizar cursos de capacitação profissional em áreas como agropecuária, eletrônica e metalurgia. Iniciadas na década de 1960, quando o capital estrangeiro passou a entrar no País de forma expressiva, as escolas técnicas acompanharam o desenvolvimento de São Paulo, quando houve a criação de diversas profissões. Desse modo, o governo do Estado criou instituições que atendessem ao acompanhamento profissional e à expansão industrial de São Paulo. Em 1969, foi criada a primeira instituição voltada apenas para a Educação Tecnológica na região, o Centro Paula Souza. Para ingressar em uma dessas escolas, é necessário fazer uma prova de seleção, o vestibulinho, que contém uma média de 50 questões interdisciplinares. Em todo o Estado, existem mais de 90 opções de cursos técnicos, que variam de acordo com o mercado de trabalho de cada localidade onde a escola está funcionando. Segundo o último ranking do Exame Nacional do Ensino Médio (Enem) de melhores escolas do Brasil, as escolas técnicas de São Paulo alcançaram boas colocações. No entanto, apesar desse resultado positivo, as Etecs apresentam os mesmos problemas de uma escola pública: falta de professores, de materiais para uso pedagógico e, por vezes, infraestrutura para acomodar todos os alunos. Tainá Holanda, de 15 anos, estuda o 1º ano do Ensino Médio em uma escola técnica e diz ter se decepcionado com a escola. “Eu esperava, no mínimo, ter aulas sempre. O Centro Paula Souza não pensa nos alunos como indivíduos, e sim como massa. Esse é um problema que abrange a maior parte das escolas, sejam elas particulares ou públicas”.

Escolar do Estado de SP) passou a ser aplicado, desde 2009, também nas Etecs. Desde então, os alunos argumentam que a inclusão das escolas técnicas na avaliação foi apenas para aumentar os pontos do governo no cálculo do Índice de Desenvolvimento da Educação do Estado (Idesp). “O Saresp é uma forma de contabilizar a educação, e as escolas técnicas estavam sendo usadas porque sua pontuação se misturava com a das demais escolas, aumentando a média geral. É injusto, já que Etecs têm um método de ensino diferente, e o governo tem consciência disso”, fala Mayra Cyrne, de 17 anos, aluna de uma Etec. A jovem foi uma das participantes do protesto que aconteceu no dia do Saresp, em novembro de 2010, e que reuniu cerca de 200 estudantes em frente à sede do Centro Paula Souza, na região central de São Paulo. Em nota divulgada à imprensa, o Centro Paula Souza, que está vinculado à Secretaria de Desenvolvimento do Estado, diz que “as notas das Etecs não integram o cálculo do Índice de Desenvolvimento da Educação do Estado de São Paulo (Idesp), que inclui apenas as notas das escolas da rede da Secretaria de Educação do Estado”. Em novembro de 2009, cerca de seis mil alunos de 84 Etecs participaram pela primeira vez da avaliação do Saresp. Os alunos do 3º ano do Ensino Médio obtiveram média de 329,2 em língua portuguesa e de 340,7 em matemática, pontuação acima da média obtida pelos alunos das escolas particulares (324,7 em língua portuguesa e 324,8 em matemática) e os das escolas da rede estadual (274,6 em língua portuguesa e 269,4 em matemática). V

Saresp Exame criado para avaliar o domínio dos estudantes do Ensino Fundamental e Médio em disciplinas como Português e Matemática, o Saresp (Sistema de Avaliação de Rendimento

*Um dos Conselhos Jovens da Vira presentes em 22 Estados e no Distrito Federal (sp@viracao.org)

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Educação

com liberdade e autonomia a

A socióloga Helena Singer fala à Vira sobre educação democrátic

Alessandro Muniz, do Virajovem Natal (RN)*, Elizângela Nunes e Rafael Stemberg, da Redação

A

primeira escola democrática de que se tem notícia foi criada pelo escritor russo Leon Tolstói (Guerra e Paz). Chamava-se Yásnaia-Poliana e guiava-se pela liberdade, pois, para Tolstói, “a liberdade torna os sujeitos responsáveis por suas experiências e lhes permite um desenvolvimento global”. A afirmação é da educadora Helena Singer, pós-doutora em Educação pela Universidade de Campinas (Unicamp) em sua obra A República das Crianças: sobre experiências escolares de resistência, nossa entrevistada do mês no Galera Repórter. Especialista em educação democrática, Helena é diretora pedagógica da ONG Cidade Escola Aprendiz, sócia-fundadora do Instituto de Educação Democrática Politeia e uma das fundadoras da escola Lumiar, em São Paulo. Saiba mais sobre a educação democrática na entrevista que fizemos com ela! Viração: Fale-nos um pouco sobre o que o modelo tradicional de ensino, chamado de disciplinador, representa para a formação dos estudantes. Helena Singer: O modelo disciplinar baseia-se na hierarquia da gestão e do conhecimento. Em relação à gestão, o poder fica centrado, sobretudo na direção, que detém todas as informações e toma as decisões. Os professores participam precariamente dos processos decisórios da escola e exercem a autoridade absoluta na sala de aula. Em relação ao conhecimento, o modelo disciplinar

baseia-se na seriação, como se as pessoas pudessem acumular conhecimentos em ordem crescente, como se o conhecimento fosse quantificável a partir de exames cujos resultados atribuem notas, graus, àqueles que os respondem. Portanto, o impacto do modelo disciplinar é formar pessoas incapazes de tomar decisões e assumir a responsabilidade pelas organizações de que participam e também incapazes de estudar simplesmente por prazer, a partir de suas próprias perguntas e desejo de conhecer. Elas se tornam dependentes de alguém que lhes diga sempre o que estudar e lhes atribua uma nota que signifique o quanto aprenderam. E como funciona a educação democrática? A gestão é compartilhada entre estudantes, educadores, funcionários e gestores. Juntos, eles definem as regras de convivência, elaboram o planejamento pedagógico e discutem as situações em que alguém desrespeita o bem comum. Os estudantes se organizam em grupos de trabalho, a partir dos temas que lhes interessam. Os educadores são tutores, que conhecem os estudantes individualmente de modo a serem capazes de orientar itinerários de pesquisa a partir dos interesses dos estudantes e garantindo a eles oportunidades de ampliação de repertório e sistematização do conhecimento construído. A avaliação é um processo de reflexão sobre o próprio aprendizado.

Divulgação

Linha do Tempo A escola democrática mais antiga ainda em funcionamento fica em Summerhill, na Inglaterra.

Escola da Ponte é fundada em Portugal

Escolas livres passam a se popularizar pelo mundo

2003 1921 24 Revista Viração • Ano 8 • Edição 67

1970

2009

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Arquivo pess

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“É no exercício de pensar o futuro, de cuidar de si, de circular pela comunidade, de se conectar e de assumir a responsabilidade pelo coletivo, que as pessoas desenvolvem sua autonomia.” Helena Singer, educadora

Como se desenvolve a autonomia nas crianças, adolescentes e jovens? E como se lida com a questão dos que se aproveitam da liberdade garantida e não tomam as responsabilidades para si? A autonomia se relaciona com algumas habilidades específicas: reconhecimento da própria história e projeção no futuro; auto-conhecimento (reconhecimento dos desejos, talentos) e adoção de atitudes de auto-cuidado; reconhecimento da comunidade em que vive (aspectos históricos, sociais, culturais e políticos); apropriação do território (circulação, reconhecimento das organizações, conhecimento das políticas públicas); conexões sociais; atitudes responsáveis com o coletivo (alteridade, participação nas decisões, cuidados com o outro e o bemcomum). O desenvolvimento destas habilidades só pode acontecer no seu próprio exercício. É no exercício de pensar o futuro, de cuidar de si, de circular pela comunidade, de se conectar e de assumir a responsabilidade pelo coletivo, que as pessoas desenvolvem sua autonomia. Neste exercício, em determinados momentos, as pessoas podem se aproveitar das oportunidades sem assumir suas responsabilidades e, nestes casos, elas acabam sofrendo as consequências, seja do coletivo, que deixa de respeitá-las, seja delas próprias que, ao refletirem sobre seu percurso, num processo orientado de auto-avaliação, acabam por reconhecer que perderam tempo no caminho da conquista da autonomia.

eles também se iniciam num novo processo educativo, aprendendo a criar outros parâmetros para acompanhar o desenvolvimento de seus filhos, que não se expressa em lições de casa, notas e seriação. Como é a articulação internacional das escolas democráticas? Como essa rede atua no Brasil? Atualmente cerca de 500 organizações do mundo todo participam da rede internacional de educação democrática, por meio de fóruns virtuais, grupos de discussão e encontros que a cada ano acontecem em um continente diferente. No Brasil, o principal representante desta rede é a Politeia que, inclusive, organizou o encontro de 2007 em Mogi das Cruzes (SP), durante o Fórum Social Mundial. Há também um crescente número de escolas e outras organizações brasileiras que se inspiram na portuguesa Escola da Ponte. Mas o país em que a educação democrática conseguiu efetivamente tornar-se política pública é Israel.

E a família, como é inserida no processo educativo, como ela recebe essa educação tão diferente da tradicional? A família participa da escola compartilhando saberes e assumindo sua parte na rede sóciopedagógica integrada de que participam seus filhos. Para poder garantir o desenvolvimento integral dos jovens. A família, a escola e as demais agências educadoras da comunidade precisam dialogar. Mas, como os adultos não tiveram a experiência da educação democrática, quando matriculam seus filhos numa escola destas,

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Escola da ponte Criada nos anos 1970, a Escola da Ponte é referência mundial quando se fala em educação democrática. Localizada em Vila das Aves, no distrito do Porto, em Portugal, a escola é pública e conta com cerca de 175 estudantes entre 5 e 16 anos, que não estão divididos nem por turmas nem por anos de escolaridade. Não existem salas de aula, mas espaços de trabalho, sem lugares fixos. Conversamos com José Pacheco, idealizador e coordenador da Escola da Ponte, para saber mais sobre a filosofia da instituição. Confira! Viração: Como se organizam as responsabilidades e atividades na Escola da Ponte entre os estudantes, professores e demais funcionários? Não existe nenhuma hierarquia? José Pacheco: Existe um dispositivo chamado “grupo de responsabilidades”. Cada um desses grupos assegura o funcionamento de uma parcela de atividade, ou espaço da escola. Hierarquia, se existir, é mitigada. Na Ponte, somos todos diretores. Como é a articulação internacional das escolas democráticas? Como a Escola da Ponte se articula com os grupos, redes, movimentos que pensam a ideia da Escola Democrática? São múltiplos os conceitos de “escola democrática” e algumas das escolas como tal consideradas estarão longe de o ser... Nós mantemos alguns contatos colaborativos com escolas de inspiração libertária, com as quais partilhamos êxitos e fracassos. Qual é o panorama da Escola Democrática no Brasil? Esse panorama em nada difere das escolas de outros países. Embora seja no Brasil o lugar onde encontrei mais

escolas ditas democráticas, são raras aquelas que poderão reclamar essa designação. Tenho visto menos democracia do que importação de modismos. Qual é o papel da instituição escola na sociedade ocidental contemporânea? Na sociedade ocidental contemporânea, como em todos os lugares onde houver escolas, o papel dessa instituição parece ser o de reproduzir ignorância. As escolas que ainda temos assentam as suas práticas num tipo de organização de modelo único. Em todos os sistemas educativos, a aula dura 50 minutos. Como a Escola da Ponte envolve a família no processo educativo? Talvez haja quem considere que a família deve ser parceira da escola. Nós consideramos que a escola deverá ser uma das parceiras da família. A família no centro do processo educativo, a família que é comunidade, a “cidade educadora”, porque “é necessária uma tribo para educar uma criança”. Em centenas de reuniões, fomos apresentando e explicando aos pais sucessivas mudanças, acolhendo deles a permissão para realizá-las. Diante dos efeitos das mudanças, os pais se tornaram os maiores defensores do projeto. Quando o líder percebe que é necessária uma mudança, mas o grupo não concorda, como mediar essa situação? Talvez se deva tentar aceitar opiniões opostas, compreender atitudes consideradas anômalas, buscar possíveis consensos. Se nada disso resultar, talvez se deva substituir o líder. Ou mudar de grupo. V

Linha do Tempo Começa a acontecer, anualmente, o International Democratic Education Conference (IDEC), em um país diferente a cada ano

2003 1993 26 Revista Viração • Ano 8 • Edição 67

Surge o Instituto de Educação Democrática Politeia, em São Paulo

Escola Lumiar é fundada em São Paulo

2002

2009

2006

*Um dos Conselhos Jovens da Vira presentes em 22 Estados do País e no Distrito Federal (rn@viracao.org)


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Perigo na escola Agressões físicas ou verbais podem causar transtornos na vida escolar dos jovens Pablo Abranches, Virajovem Belo Horizonte (MG)*

T

odos nós sabemos que a escola merece especial atenção dentre várias outras áreas sociais, Já que para o Brasil se desenvolver é necessário que tenhamos educação de qualidade. No entanto, não dá pra estudar em um ambiente no qual não exista respeito entre todos os colegas, não é? Se os alunos não se sentirem intimidados no ambiente escolar, a tendência é que as notas comecem a cair ou, no pior dos casos, que esses adolescentes e jovens abandonem a escola. A explicação para esse comportamento intimidativo chamase bullying (palavra de origem inglesa), prática sistemática de agressão que pode ser física ou não, praticada de forma intencional e repetitiva com o objetivo de intimidar os colegas na escola. Estão inclusos neste comportamento apelidos pejorativos até agressões verbais, físicas, psicológicas e sexuais, sendo que essa última é menos frequente em escolas. É preciso ressaltar que o bullying também pode ocorrer em outros ambientes. Na internet, podemos encontrar jovens utilizando ferramentes tecnológicas para discriminar e difamar outras pessoas, comportamento que caracteriza o ciberbullying. Segundo o Conselho Nacional de Justiça, que recentemente lançou a cartilha “Justiça nas Escolas” para orientar pais e educadores, o fenômeno pode ser explicado por comportamentos violentos no ambiente escolar, praticados tanto por meninos quanto por meninas. Os atos de violência ocorrem geralmente com um ou mais alunos que se encontram impossibilitados de fazer frente às agressões sofridas. De alguma forma, é difícil encontrar quem nunca tenha sofrido bullying, principalmente se tiver alguma característica física marcante.

O papel da escola O primeiro papel da escola é informar professores, pais e, sobretudo, alunos sobre a prática. Moradora de Ribeirão das Neves (MG), a professora de português Gisele Moreira trouxe o tema para a sala de aula com o objetivo de diminuir os apelidos grosseiros e a “zoação” rotineira dos alunos para com os colegas de classe. Ela afirma que os “alvos” preferidos para sofrerem com a prática são aqueles estudantes com perfil mais reservado, tímido e, por não conseguirem lidar com a situação, se excluem e até deixavam de frequentar as aulas. No bairro de Rosaneves, também em Ribeirão das Neves, jovens do projeto de educomunicação EntreMídias, realizado pelo Grupo Cultural Entreface, sentiram a necessidade de mobilizar a comunidade em relação ao tema. Eles decidiram fazer um vídeo sobre o assunto e realizar atividades de sensibilização nas escolas públicas do bairro. A jovem Graziele de Moura, uma das produtoras do vídeo, afirma que na escola onde estuda “as brigas são frequentes e geralmente começam com pequenas agressões e olhares de intimidação”. O importante também para prevenir o bullying nas escolas é que o corpo docente e a coordenação pedagógica identifiquem o agressor para que possam fazer o acompanhamento sistemático desse aluno. Geralmente, os agressores não se comportam assim somente na escola, mas também em casa e com os seus vizinhos. Por isso é importante que os pais estejam atentos também. V

Você pode baixar o PDF da cartilha “Justiça nas Escolas”, produzida pelo Conselho Nacional de Justiça: http://tinyurl.com/cartilha12 O vídeo educativo produzido pelos jovens do projeto EntreMídias pode ser visto no canal da Vira no YouTube: www.youtube.com.br/revistaviracao

* Um dos Conselhos Jovens da Vira presentes em 22 Estados e no Distrito Federal (mg@viracao.org)

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Parlamento jovem Estudantes brasileiros do Ensino Médio se reuniram em Brasília para a seleção nacional de participação do Parlamento Juvenil do Mercosul Alisson Rodrigues, adolescente comunicador da Plataforma dos Centros Urbanos*, Eric Silva e Maria Rehder, da Redação, em Brasília (DF)

Em setembro de 2010, cerca de cem estudantes do Ensino Viração: Como os dez milhões de jovens do Brasil podem ter Médio se reuniram em Brasília (DF) para a seleção nacional de voz ativa na rede do Mercosul? participação do Parlamento Juvenil do Mercosul, projeto que Carlos Artexes Simões: A democracia, que é uma conquista da tem como objetivo abrir espaços de participação e diálogo sociedade, está cada vez mais ganhando mais um caráter não só entre jovens de seis países da América do Sul (Argentina, de representação mas de participação. Precisamos ter pessoas que Bolívia, Brasil, Colômbia, Paraguai e Uruguai). representem democraticamente os interesses de A ideia do Parlamento um coletivo ou segmento para garantir que esta é discutir os problemas representação dialogue com as pessoas e ouça mais e as possíveis soluções para os jovens. melhorar o Ensino Médio nos Hoje quais são os desafios dos estudantes do países participantes. Ensino Médio no Brasil? Os estudos mostram que, A iniciativa do projeto é dos além das condições adversas, hoje 70% dos jovens Ministérios da Educação dos brasileiros de 15 a 17 anos têm a renda per capita Estados-membros do familiar menor que um salário mínimo, e quando Mercosul e conta com o apoio você pensa na diversidade de pessoas que ainda a à Vira st vi e tr n e da Organização dos Estados têm de trabalhar xes em Carlos Arte Americanos (OEA). obrigatoriamente para Nesse encontro, a proposta sobreviver, surge um foi escolher 27 representantes grande desafio e até uma brasileiros para participarem da primeira reunião do questão nova que mostra a Parlamento, que aconteceu em outubro em importância e significado Montevidéu, no Uruguai. Esse foi o primeiro encontro do Ensino Médio para o com os jovens dos países membros, que criaram um projeto de vida dos documento oficial com recomendações de melhoria adolescentes. para o Ensino Médio da América Latina. Tendo cinco É preciso que o Ensino eixos, como inclusão educativa, participação cidadã e Médio dialogue com essa gênero, a carta pode ser lida na internet realidade e seja capaz de (http://tinyurl.com/parlamentosul). responder a esta fase de desenvolvimento do jovem enquanto sujeito que vive na contemporaneidade. Eles não vivem mais a realidade do século Entrevista passado. Há estudos que mostram que hoje muitos jovens estão Durante o encontro sobre o Parlamento, o diretor de diretor de abandonando o Ensino Médio por falta de significados. Por isso é Concepções e Orientações Curriculares para Educação Básica no preciso oferecer a estes jovens uma escola mais contemporânea. MEC (Ministério da Educação), Carlos Artexes Simões, concedeu Uma escola que seja capaz de criar os bens de uma nova uma entrevista à reportagem da Vira, que viajou a convite do formatação, não só na formulação educacional, mas também o Fundo das Nações Unidas para a Infância (UNICEF). Na conversa, ele que os jovens trazem. fala sobre os desafios da educação dos jovens.

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Qual a importância de se pensar o Ensino Médio juntamente com os países do Mercosul, sendo que cada um possui cultura diferente? Na verdade, o Brasil tem uma diversidade étnica muito maior do que a gente sabe. São quase duzentos dialetos falados no País, além da língua portuguesa. E essa diversidade muito grande também nós encontramos nos outros países do Mercosul, que são extremamente significativos. Nós temos uma cultura de relação

educacional que precisamos trocar com esses países. Além disso, essa união será importante na luta pelos direitos humanos e fortalecimento da ideia de superar as desigualdade regionais e aprender diferentes maneiras de desenvolver políticas públicas voltadas à educação.

Inovando o ensino médio! Entre agosto e setembro deste ano, o Instituto Internacional para o Desenvolvimento da Cidadania (IIDAC) e o Fundo das Nações Unidas para a infância (UNICEF) promoveram atividades com cerca de 30 adolescentes, de 12 a 18 anos, com o objetivo de construir eixos inovadores para o Ensino Médio. As oficinas aconteceram no Rio de Janeiro, São Paulo, Aracaju e Belém. Para esquentar o debate e iniciar a aplicação da metodologia, os adolescentes participaram, anteriormente, de um chat na internet. A galera conversou sobre questões como: “De que forma veem o Ensino Médio?”, “O que poderia ser melhor?” e “Como fazer isso acontecer?” Abaixo, você confere o depoimento de Michel Ribeiro, adolescente comunicador da Plataforma dos Centros Urbanos, sobre a atividade. “No chat, a minha ideia era discutir, principalmente, a relação entre aluno e professor. Frequentemente eles se olham como inimigos e isso desestrutura a convivência escolar. Nós, alunos, consideramos que o professor não nos entende e eles, muitas vezes, veem os jovens como desinteressados. Temos que quebrar todos os estereótipos para mudar essa relação. No dia da oficina tivemos uma palestra com um professor super ‘gente fina’, o Diego Marinnelo. Ele tinha a missão importante de conversar e nos mostrar o seu trabalho. Ele é o tipo de professor ‘zoeira’, que todos na escola gostam e, claro, nós também nos apegamos a ele. Diego fez uma ponte com os adolescentes, depositou uma enorme confiança em nós. Durante a oficina pudemos perceber que não faltava adolescente com os mesmos problemas nas escolas, mas a ideia era apresentar propostas para melhorar o Ensino Médio, não ficar só reclamando. Tudo nesse dia foi bom, mas o que mais me chamou a atenção foi a confiança em nós adolescentes, o quanto mostrou que somos importantes na vida social e na transformação da escola. Minha vontade de mudar as coisas está ainda maior. Estou disposto a falar, agir, discutir, sem medo de errar.”

Tá Na Mão: Para ter mais informações sobre as ações do Parlamento Juvenil do Mercosul, acesse: www.emdialogo.uff.br/parlamento-juvenil

* A Plataforma dos Centros Urbanos (PCU) é uma iniciativa do Fundo das Nações Unidas (UNICEF), desenvolvida com diferentes parceiros, que tem como objetivo melhorar a qualidade de vida e garantir os direitos das crianças e dos adolescentes que vivem nas grandes cidades. A Plataforma está sendo implementada inicialmente nas cidades de São Paulo, Itaquaquecetuba (SP) e Rio de Janeiro (RJ), com duração prevista até 2011. Os chamados adolescentes comunicadores são membros das comunidades que integram a PCU e são responsáveis por auxiliar na mobilização comunitária para a conquistas das metas e comunicação de ações realizadas no âmbito de suas comunidades.

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Pela tradição Encontro de educadores no Mato Grosso do Sul discute educação indígena autônoma, diferenciada e de qualidade

Cleymenne Cerqueira e Egon Heck, em Eldorado (MS)*

“A

escola deve ser formadora de guerreiros... A educação deve reforçar nossa identidade e nos ensinar a lutar pelos nossos direitos... A escola deve estar a serviço da comunidade... a escola indígena deve ter autonomia, ser diferenciada, com ensino de qualidade”. Durante o XVI Encontro de Professores e Lideranças Guarani Kaiowá, que aconteceu em novembro de 2010, na aldeia Cerrito, município de Eldorado (MS), foi realizada uma avaliação do atual modelo de educação escolar indígena implementado nas comunidades Guarani do Estado. Atualmente, a situação está bem longe da ideal e percebe-se uma grande distância entre a escola que o povo precisa e as escolas que de fato têm. Embora ao longo da história do povo Guarani já se tenham conseguido importantes avanços no campo da educação escolar indígena, muitos desafios ainda se fazem presentes no dia-a-dia das comunidades. Em pouquíssimas aldeias é oferecido Ensino Fundamental e Médio diferenciados e de qualidade. A gestão da maioria das escolas também não está na mão dos indígenas, e muitos professores também não o são. Mesmo com todas as conquistas e políticas educacionais já em curso, nota-se que existe um ranço colonial nas escolas e nas secretarias de educação de grande parte dos municípios sul matogrossenses. Os marcos legais que garantem educação específica e diferenciada são muitos. No entanto, na prática ainda falta muito para se ter uma educação indígena voltada para a vida, cultura e história Guarani, dentro da dinâmica social de construção de um presente e futuro cada vez melhor para as mais de 40 mil pessoas deste povo que vive no Mato Grosso do Sul. O movimento de professores indígenas tem conseguido importantes avanços na luta por uma melhor educação. Mas o grupo tem enfrentado inúmeras dificuldades para avançar em novos patamares, principalmente no Estado, onde se concentram os maiores índices de discriminação, racismo e violência contra os indígenas. Existe uma paralisação ou até mesmo um retrocesso em vários aspectos da educação escolar nas aldeias. O que, de acordo com os educadores indígenas e também representantes do movimento indigenista, está intimamente ligado à luta pela terra e a postura anti-indígena do

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atual governo e das elites econômica e política da região. Na maioria das escolas não são permitidas discussões sobre a luta pela posse da terra tradicional. O que, de acordo com lideranças presentes no encontro, é algo inadmissível. “É um absurdo esse tipo de atitude, pois esse é justamente um de nossos principais temas de discussão. As ações em prol da comunidade e a procura pela posse do território tradicional é algo transmitido de geração em geração, faz parte da história do nosso povo. Dessas discussões e encaminhamentos dependem o futuro do povo Guarani”, disse um dos participantes. Outro problema enfrentado atualmente pelas comunidades tem sido o diálogo entre os professores indígenas e as lideranças tradicionais. Nem sempre isso tem acontecido de forma facilitada e continuada. Ambos exercem diferentes papéis junto ao seu povo e devem trabalhar em conjunto – sabedoria tradicional e conhecimento técnico – para reforçar a luta e traçar estratégias para a resolução dos problemas. Uma questão presente desde o início do processo de formação dos professores é a participação das lideranças


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políticas e tradicionais das comunidades nessas atividades. Só com um trabalho integrado entre essas lideranças e os educadores indígenas se conseguirá, de fato, definir uma estratégia de educação a partir, com e para a comunidade. Também por esta escolha a realização deste encontro em Cerrito, que uniu o XVI Encontro de Professores e Lideranças do Povo Guarani Kaiowá e a grande assembleia das lideranças tradicionais deste povo, a Aty Guassu. Nem sempre os professores têm conseguido implementar as políticas definidas pelo próprio movimento que integram. Estes não têm autonomia e instrumentos disponíveis para levar às salas de aula todo o planejado e discutido quando destes encontros. Para tanto é necessário que estes tenham mais autonomia e independência para realizar suas atividades. Como solução para muitos desses problemas, os próprios professores e lideranças apontam a gestão compartilhada dessas escolas, realização de cursos de Guarani e capacitação para os educadores, bem como a construção de um novo projeto pedagógico. Outra dificuldade apontada durante o encontro é a representação indígena nos espaços de debate e decisão das instituições acadêmicas, educacionais e organismos governamentais. Isso atropela e desrespeita os processos coletivos, próprios das comunidades indígenas.

Atuação missionária Desde a década de 1980, o Conselho Indigenista Missionário (Cimi) regional Mato Grosso do Sul, iniciou um trabalho junto aos professores Guarani Kaiowá para definir o que de fato seria uma escola indígena, com formação diferenciada e específica e de qualidade. Esse trabalho, posteriormente, foi ampliado com a construção de diversos mecanismos e espaços, articulando tais atividades com instituições locais, regionais e até mesmo nacionais. Desta iniciativa surgiram duas importantes construções: o magistério indígena Ará Verá, que iniciou suas atividades em 1999, e o curso de licenciatura indígena Teko Arandu, implantado na Universidade Federal da Grande Dourados, em 2006. Essas foram importantes conquistas dentro do universo de mais de 500 estudantes universitários indígenas no Mato Grosso do Sul, que também devem ter seu conhecimento integrado na conjuntura de luta de seu povo. Dentro dos métodos e currículos da universidade também devem estar garantidos a busca do povo Guarani pela garantia de seus direitos fundamentais à vida, à saúde e educação, à terra, à identidade Guarani e à autonomia dentro de seus territórios. Educação, escola e luta pela terra devem ser um conjunto de ações e estratégias que se articulam e fortalecem mutuamente. V

Dialogando com o passado, construindo o futuro No trabalho em grupos, debates e exposições uma questão se sobressaiu: hoje a educação escolar indígena tem uma importância fundamental na consolidação de caminhos para o presente e futuro das comunidades Guarani Kaiowá. Consequentemente, a responsabilidade dos mais de 300 professores indígenas é cada vez maior, não apenas na transmissão de conhecimento, mas principalmente no diálogo, aprendizado e transmissão da sabedoria milenar Guarani. A transmissão da história, costumes e tradições do povo Guarani acontece, principalmente, na convivência familiar, nos rituais, na vivência espiritual nas oga pysy (casas de reza), nos roçados (prática ainda possível, embora grande parte viva nos confinamentos ou na beira de rodovias do Estado), na convivência com os sábios (os mais velhos, os ñanderu e ñandesi). Portanto, é preciso aproveitar esses espaços para repassar aos mais jovens os sentimentos de luta pela posse da terra, que não é mercadoria, fonte de renda, moeda de troca, mas vida para os Guarani Kaiowá. Uma das sugestões apontadas durante o encontro para se reforçar o diálogo e a luta pelos direitos é a construção de oga pysy junto às escolas. Esse seria o espaço em que os alunos teriam a transmissão de sabedoria e rituais pelos ñanderu. Seria uma atividade integrada dentro do currículo e projeto pedagógico das escolas. Porém, tudo isso certamente exigirá muito diálogo e compromisso das comunidades, hoje muito marcadas por interferências religiosas e políticas partidárias que se opõem a essa caminhada e muitas vezes divide as comunidades.

* Reportagem publicada originalmente no site do Conselho Indigenista Missionário (Cimi) em 15/11/2010. Saiba mais em: www.cimi.org.br

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Que Figura!

A diferença entre ensinar e fazer aprender ia de que o aluno Jean Piaget (1896-1980) trouxe a ide ção do conhecimento é o agente do processo de constru

O

suíço Jean William Fritz Piaget, um epistemólogo, ou seja, um estudioso do conhecimento, é uma das pessoas que hoje fazem parte do círculo de ídolos de muitos pedagogos e educadores, apesar de não ter sido exatamente um estudioso de pedagogia. Agradeça, estudante, se hoje você não sabe o que é a “pedagogia bancária” – aquele método de ensinar que pratica a repetição do mesmo conteúdo programático a cada ano, durante muitos anos, para diferentes turmas e gerações. Mas agradeça principalmente a Piaget, que trouxe uma virada essencial para o pensamento dos educadores: a ideia de que o aprendizado não é uma consequência pura e simples do contato com informações ou com qualquer prática de ensino. Aprender é um desafio muito maior. Ao concentrar-se em como o conhecimento se forma, a questão central para o trabalho dos educadores passou a ser como provocar a criança a aprender, e não mais como transferir conhecimento e informações acumuladas. Na prática, o que mudou depois das contribuições de Piaget foi o entendimento dos lugares que ocupam professor e aluno no processo de passagem e construção do conhecimento: o aluno é o agente do processo. A inteligência, segundo Piaget, é uma adaptação: o indivíduo desenvolve formas de agir e pensar para superar os desafios colocados pelos meios natural e social. Ao se deparar com uma novidade, um desafio, a pessoa é capaz de remanejar suas ideias e criar novas conclusões a partir delas, para resolver seu problema. “O pensamento se desenvolve a partir das ações sensoriais e motoras que antecedem o aparecimento da função simbólica, isto é, da capacidade de pensar”, explica a docente do curso de Psicologia da PUC-SP Maria Regina Maluf,

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presidente da Sociedade Interamericana de Psicologia e estudiosa de Piaget. Assim, cada novo conteúdo traz um “desequilíbrio” para o aluno, sendo que ele volta à situação de equilíbrio depois de assimilar esses novos conhecimentos. Ou seja, na escola e na vida, o cerne da questão é a problematização, fazer com que os alunos enfrentem os desafios e se sintam capazes de superá-los. O educador, porém, não é uma figura menos importante no sistema do aprendizado, lembra Maria Izabel Azevedo Noronha, professora de português e atual presidente do Sindicato dos Professores do Ensino Oficial do Estado de São Paulo (Apeoesp). “O professor é o grande provocador, é o que tem que reconhecer as condições dos alunos para traçar suas estratégias para fazer com que seja realizado o objetivo, que é o aprendizado”, reflete. Mais do que a responsabilidade de trazer todas as respostas, o educador faz com que o aluno tenha a iniciativa de buscar por si as informações e, assim, “construir”* seu conhecimento e suas próprias estruturas de desenvolvimento mental. V É por causa desse raciocínio de que as experiências constroem as estruturas mentais e lógicas para desenvolver o conhecimento que a linha pedagógica inspirada em Piaget leva o nome de construtivista. *Um dos Conselhos Jovens da Vira presentes em 22 Estados e no Distrito Federal (mg@revistaviracao.org.br)

Novaes

Cristina Uchôa, colaboradora da Vira em São Paulo (SP)


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No Escurinho

Fala, adolescÊncias

O

reduzido número de filmes para (e sobre) jovens costuma ser lembrado como uma das principais lacunas do cinema brasileiro. É preciso registrar, no entanto, que a situação começou a se alterar nos últimos anos. Três longas de ficção (As Melhores Coisas do Mundo, Os Famosos e os Duendes da Morte, Antes que o Mundo Acabe) e um documentário (Pro Dia Nascer Feliz) formam um pacote diversificado para debate do universo jovem e de características do Ensino Médio no País. As Melhores Coisas do Mundo destacase pelo amplo trabalho de pesquisa empreendido pela diretora Laís Bodanzky e pelo roteirista Luiz Bolognesi, que realizaram Bicho de Sete Cabeças (2001) e Chega de Saudade (2007). Originalmente, o projeto mantinha o nome da série de livros de Gilberto Dimenstein e Heloísa Prieto na qual se inspira, Mano. O título definitivo foi escolhido em concurso que integrou os esforços da equipe para se aproximar do público jovem, com o envolvimento de adolescentes, antes mesmo das filmagens, em ações ligadas aos personagens e à história. Filho de professores universitários, Hermano (Francisco Miguez) tem 15 anos e, como deveria ocorrer com todos de sua faixa etária, cursa o Ensino Médio. Tocar guitarra, andar de bicicleta e encontrar os amigos em festas são atividades que lhe dão prazer. Certo dia, uma notícia mexe com toda a família. Mano precisará lidar com ela, e com o episódio de "bullying" que provoca na escola, em paralelo aos dramas naturais de quem deixou de ser criança, mas ainda não virou adulto. Em Os Famosos e os Duendes da Morte, rodado no interior do Rio Grande do Sul, o diretor Esmir Filho (do curta Tapa na

Pantera, que fez sucesso na internet) adapta romance homônimo de Ismael Caneppele. O protagonista (Henrique Larré) tem 16 anos, vive com a mãe em cidade do interior e se mantém conectado ao mundo pela internet. Sua rotina em casa, na escola e com os amigos combina registro mais realista a passagens oníricas (associadas a lembranças, desejos e fantasias). Ainda inédito em DVD, Antes que o Mundo Acabe também foi rodado no Rio Grande do Sul. Dirigido por Ana Luiza Azevedo, opta por tratar de maneira mais leve pequenos dramas vividos por adolescentes. Já o documentário Pro Dia Nascer Feliz, de João Jardim (co-diretor de Janela da Alma), visita escolas de diversas regiões do País e recolhe dezenas de depoimentos. Alunos e professores falam uns dos outros, de si mesmos, do cotidiano escolar, dos papéis que desempenham nele e do que mais lhes vem à mente. A corrente verbal é especialmente feliz quando se distância das reclamações para se concentrar, de modo mais confessional, no que pensam e sentem os adolescentes. V

“Antes que o Mundo Acabe”: Divulgação Imagem Filmes / “As melhores coisas do mundo”: Warner

Sérgio Rizzo, crítico de cinema

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Meta do movimento Todos Pela Educaç ão é ter, em 2022, mais de 90% dos jovens brasileiros de 19 anos com o Ensino Médio completo Da Redação

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stá lá na Constituição Federal, no artigo 205: “A educação, direito de todos e dever do Estado e da família, será promovida e incentivada com a colaboração da sociedade, visando ao pleno desenvolvimento da pessoa, seu preparo para o exercício da cidadania e sua qualificação para o trabalho”. Mas mesmo assim, o Brasil é o sétimo país do mundo em número de analfabetos. São 18 milhões de pessoas que não sabem ler nem escrever. Entre os que passaram pela sala de aula, apenas 47,1% terminaram o Ensino Médio, segundo dados de 2008 do movimento Todos Pela Educação, organização financiada pela iniciativa privada, que se baseia em informações divulgadas pelo Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística (IBGE). Nesse grupo, o melhor resultado está na região Sudeste, que concentra 58,8% de pessoas concluintes desse ciclo escolar. O Nordeste, que aparece no final da lista, possui 30,8% dos jovens concluintes. Uma pesquisa (Que Ensino Médio Queremos? - 2008) feito pela ONG Ação Educativa em cinco escolas públicas de São Paulo (SP) mostra que o principal motivo dos alunos abandonarem o Ensino Médio é a dificuldade de conciliar trabalho e estudo.

Entre os entrevistados, 24% deram essa resposta como o principal motivo, seguida pela falta de vontade de estudar (15%). Para transformar essas estatísticas em números favoráveis para o Brasil, o movimento Todos Pela Educação, organização financiada pela iniciativa privada, estabeleceu como uma de suas cinco metas ter, até o ano de 2022, 90% ou mais dos jovens brasileiros de 19 anos com o Ensino Médio completo. Segundo a organização, o País está no caminho para alcançar essa taxa, já que em 2008 (último dado divulgado), os dados estavam acima da meta estabelecida para o ano, que foi de 47,1%, enquanto o esperado era de 43,9%. Neste mês, está programada a divulgação de dados atualizados. Segundo o Todos Pela Educação, o sucesso dessa meta dependerá, em alguma medida, do bom resultado e cumprimento das outras quatro metas, sendo uma delas ter crianças e jovens frequentando a escola na idade correta, aprendendo o que é adequado à sua série. Com isso, poderão concluir a educação básica na idade apropriada e ajudar a alcançar a meta do Ensino Médio. Objetivo audacioso, mas possível de realizá-lo se acontecer uma atuação conjunta entre governos e sociedade civil. V

Fique por dentro de algumas ações sobre o Ensino Médio: Ação Educativa: www.acaoeducativa.org Todos pela Educação: www.todospelaeducacao.org.br


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Herbert de Souza, o Betinho (1935-1997)

Novaes

“Cidadania é a prática de quem está ajudando a construir os valores democráticos.”

Sociólogo e ativista político, fundador do Instituto Brasileiro de Análises Sociais e Econômicas (Ibase) e da campanha Natal Sem Fome


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