Revista Viração - Edição 112 - Jul/Dez 2017

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QUEM FAZ A

vira PELO BRASIL

Conheça os Virajovens em 20 Estados brasileiros e no Distrito Federal: Aracaju (SE) Belém (PA) Boa Vista (RR) Boituva (SP) Brasília (DF) Campo Grande (MS) Curitiba (PR) Fortaleza (CE) João Pessoa (PB) Lavras (MG) Lima Duarte (MG) Macapá (AP) Maceió (AL) Manaus (AM) Natal (RN) Picuí (PB) Pinheiros (ES) Porto Alegre (RS) Recife (PE) Rio Branco (AC) Rio de Janeiro (RJ) Salvador (BA) S. Gabriel da Cachoeira (AM) São Luís (MA) São Paulo (SP) Sud Mennucci (SP) Vitória (ES)

Auçuba Comunicação e Educomunicação – Recife (PE) • Avalanche Missões Urbanas Underground – Vitória (ES) • Buxé Fixe - Amadora (Portugal) • Casa Peque Davi – João Pessoa (PB) • Cipó Comunicação Iterativa – Salvador (BA) • Coletivo Jovem – Movimento Nossa São Luís – São Luís (MA) • Gira Solidário – Campo Grande (MS) • Grupo Conectados de Comunicação Alternativa GCCA – Fortaleza (CE) • Grupo Makunaima Protagonismo Juvenil – Boa Vista (RR) • IACEP – Instituto Amazônico de Comunicação e Educação Popular (AM) • Instituto de Desenvolvimento, Educação e Cultura da Amazônia – Manaus (AM) • Instituto Universidade Popular – Belém (PA) • Mídia Periférica – Salvador (BA) • Instituto Candeia de Cidadania – Lima Duarte (MG) • Jornal O Cidadão – Rio de Janeiro (RJ) • Lunos – Boituva (SP) • Movimento de Intercâmbio de Adolescentes de Lavras – Lavras (MG) • Oi Kabum – Rio de Janeiro (RJ) • Parafuso Educomunicação – Curitiba (PR) • Projeto de Extensão Vir-a-Vila (UFRN) - Natal (RN) • Projeto Juventude, Educação e Comunicação Alternativa – Maceió (AL)


Copie sem moderação! Você pode: • Copiar e distribuir • Criar obras derivadas Basta dar o crédito para a Vira!

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JUVENTUDE E TRABALHO

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QUEM SOMOS

N

as últimas décadas, o ideal do trabalho se tornou extremamente incerto para os mais jovens. Marcado pela precariedade da instabilidade, está entre os temas que mais preocupam e mobilizam as juventudes. Com significados que extrapolam a dimensão financeira, se apresenta também como uma experiência de inserção social, de formação e de realização pessoal. No entanto, parte significativa dos jovens brasileiros têm dificuldades em ingressarem no mercado de trabalho, sobretudo em momentos de crise. Além disso, muitos têm uma inserção precária, comprometendo sua qualidade de vida e trajetória profissional. Diante disso, esta edição da Revista Viração procura discutir as questões relacionadas ao mundo do trabalho e juventude, e as diversas percepções de adolescentes e jovens acerca de suas experiências. Proporciona também maior entendimento sobre a conjuntura atual, as políticas públicas e as demais iniciativas que afetam o sistema educacional e trabalhista do Brasil, que influenciam diretamente a vida de jovens.

ós somos uma organização da sociedade civil e atuamos com comunicação, educação e mobilização social entre adolescentes, jovens e educadores. O nosso objetivo é mobilizar essa galera para a promoção e a defesa dos direitos de adolescentes e jovens, possibilitando a construção de uma sociedade justa, participativa e plural. Como a gente faz isso? Através da educomunicação e da educação entre pares! A educomunicação é o nosso jeitinho de se comunicar educando e educar se comunicando, contribuindo para a construção de um verdadeiro diálogo e uma real participação. Para a produção da revista impressa e eletrônica, contamos com a participação dos conselhos editoriais jovens de 20 Estados, que reúnem representantes de escolas públicas e particulares, projetos e movimentos sociais. Entre os prêmios conquistados nesses quatorze anos, estão Prêmio Don Mario Pasini Comunicatore, em Roma (Itália), o Prêmio Cidadania Mundial, concedido pela Comunidade Bahá’í. E mais: no ranking da ANDI, a Viração é a primeira entre as revistas voltadas para jovens. Participe você também desse projeto.

Paulo Pereira Lima Diretor Executivo da Viração – MTB 27.300

Apoio institucional


MAPA DA

mina 08

EU PARTICIPO, TU PARTICIPAS, NÓS PARTICIPAMOS

PRECISAMOS FALAR SOBRE A REFORMA DO ENSINO MÉDIO!

Sem diálogo com a comunidade escolar, a Reforma vai contra a promoção do direito à representação juvenil e à participação social.

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JUVENTUDE QUE APOSTA NA EDUCAÇÃO

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SAIR DO CAMPO, NÃO SENHOR!

Jovens cearenses enxergam oportunidades de desenvolvimento profissional no meio rural.

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TRABALHO POSITIVO

Mesmo contemplados pelos direitos trabalhistas, pessoas com HIV ainda sofrem preconceito e discriminação no trabalho.

VICE-PRESIDENTE

Rafael Alves da Silva

PRIMEIRA-SECRETÁRIA

Áurea Lopes

CONSELHO EDITORIAL

Paulo Lima

CONSELHO FISCAL

Rodrigo Bandeira, Vanessa Camargo, Marilda Santos CONSELHO PEDAGÓGICO

Alexsandro Santos, Aparecida Jurado, Isabel Santos, Leandro Nonato e Vera Lion PRESIDENTA

Cristina Uchôa

PRECISAMOS FALAR SOBRE DESEMPREGO

O acesso ao trabalho é direito de todo jovem, o desafio é garanti-lo em um cenário marcado pelo autoritarismo e flexibilização das leis trabalhistas.

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TRABALHO: PERSPECTIVA E REALIDADE DE UM JOVEM DA SOCIOEDUCAÇÃO

Invisibilizados pelo Estado, jovens internados na socioeducação são privados de reais oportunidades de educação e trabalho.

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REVISTA VIRAÇÃO - ISSN 2236-6806

Eugênio Bucci, Ismar de Oliveira, Izabel Leão, Immaculada Lopez, João Pedro Baresi, Maria Luquet e Valdênia Paulino

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A flexibilização das relações de trabalho, o desemprego e a discriminação distanciam os jovens da perifa do mercado formal.

Conciliar os estudos, o trabalho, o lazer e a vida familiar pode ser difícil, mas não é impossível. Como a galera dá conta?

semPre na vira Manda Vê ___ 06 Galera Reportér ___ 26 No Escurinho ___ 29 Imagens que viram ___ 32 Rap Dez ___ 35

A PERIFA TEM VEZ NO MERCADO DE TRABALHO FORMAL?

NOSSO LUGAR NÃO É FOGO OU NO FOGÃO

O sistema capitalista patriarcal ainda impõe dificuldades à luta por equidade de gênero no mercado de trabalho.

Apesar dos desafios, aumenta o número de jovens que empreendem em negócios sociais de educação.

ESTUDAR E TRABALHAR É POSSÍVEL?

rg da vira:

CONHEÇA OS SEUS DIREITOS

Trabalhar na adolescência pode, mas se liga nos direitos que garantem proteção para a galera nova que está no mercado.

Conheça os principais marcos do movimento estudantil na história do Brasil.

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DIRETOR EXECUTIVO COORDENAÇÃO

Vania Correia

EDIÇÃO E REDAÇÃO

Paula Bonfatti e Jefferson Rozeno EQUIPE

Ana Hindrikson Saran, Bruno Sabino, Cleide Agostinho, Daniel Fagundes, Daniele Rabelo, Elisangela Nunes, Jefferson Rozeno, Marcela Varconte e Thaís Santos MOBILIZADORES DA VIRA

Acre (Leonardo Nora), Alagoas (Alan

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A OCASIÃO FAZ O CIFRÃO

Saiba como a educação financeira pode te ajudar a economizar, juntar dinheiro e até investir.

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Fagner Ferreira), Amapá (Alessandro Brandão), Amazonas (Jhony Abreu, Claudia Maria Ferraz e Sebastian Roa), Bahia (Emilae Sena e Mariana Sebastião), Ceará (Alcindo Costa e Rones Maciel), Distrito Federal (Webert da Cruz), Espírito Santo (Jéssica Delcarro, Izabela Silva e Leandra Barros), Maranhão (Nikolas Martins, Maria do Socorro Costa e Maurício Vieira), Mato Grosso do Sul (Fernanda Pereira), Minas Gerais (Emília Merlini, Reynaldo Gosmão e Silmara Aparecida dos Santos), Pará (Diego Souza Teofilo), Paraíba (José Carlos Santos e Manassés de Oliveira), Paraná (Juliana Cordeiro e Diego Henrique Silva), Pernambuco (Edneusa Lopes e Luiz Felipe Bessa), Rio de Janeiro (Gizele Martins), Rio Grande do Norte (Alessandro Muniz), Rio Grande do Sul (Evelin Haslinger e Joaquim Moura), Roraima (Graciele

SUCESSO É FAZER O QUE NOS FAZ FELIZ

Conheça uma galera que decidiu dar um novo sentido à palavra “sucesso”.

Oliveira dos Santos), Sergipe (Elvacir Luiz) e São Paulo (Igor Bueno e Luciano Frontelle). COLABORADORES

Márcio Baraldi, Novaes e Sérgio Rizzo ARTE

Manuela Ribeiro JORNALISTA RESPONSÁVEL

Paulo Pereira Lima – MTb 27.300 DIVULGAÇÃO

Equipe Viração E-MAIL DA REDAÇÃO

redacao@viracao.org APOIE

www.viracao.org/apoie


o qUe é edUcomUnicAção?

DIGA

lÁ APOIE A VIRAÇÃO Desde 2014, a Revista Viração não trabalha mais com assinatura. Ao invés disso, pedimos o apoio de vocês para a manutenção das nossas atividades, que inclui não apenas a produção de conteúdo por e para jovens, mas também atividades de formação e mobilização social. Nosso trabalho está sustentado no entendimento de que o adolescente é um sujeito de direitos. A partir da educomunicação e da educação entre pares, impactamos as vidas de milhares de adolescentes e jovens Brasil a fora, considerando suas condições únicas de desenvolvimento. Para apoiar, é só acessar o site www.viracao.org/apoie e seguir as instruções. É tudo online e bem rapidinho! :) Apoie a Viração na promoção de direitos, no fortalecimento da participação de adolescentes e jovens e na construção de uma comunicação democrática.

perdeU AlgUmA edição dA virA? não esqUenTA!

virAção edUcomUnicAção

É comum, nas edições da Vira, encontrar a palavra “educomunicação” ou o termo “educomunicativo”. A educomunicação é um campo de intervenção que surge da inter-relação comunicação/ educação para a transformação social. Dizemos que um projeto ou prática é educomunicativa quando adota em seus processos, especialmente do jovem, o caráter comunicacional, como o diálogo, a horizontalidade de relações e o incentivo à participação, fazendo com que os sujeitos exerçam plenamente o direito humano à expressão e à comunicação, em diferentes âmbitos e contextos. A Viração promove ações educomunicativas por meio da produção midiática, incentivando que adolescentes e jovens produzam reportagens coletivas em diferentes linguagens.

como virAr Um virAJovem? Virajovens são os integrantes dos conselhos editoriais jovens da Viração, que produzem conteúdos em suas cidades. O conselho pode ser um coletivo autônomo de jovens ou um grupo ligado a uma entidade, organização, movimento social, escola pública ou privada, que dará apoio para que os virajovens produzam conteúdos. A parceria entre a Vira e entidade é oficializada com um termo de compromisso e com a publicação do logotipo da organização na revista. Quer saber mais? Entre em contato com a gente: redacao@viracao.org.

@virAcAo

Você pode acessar, de graça, as edições anteriores da revista na internet: www.issuu.com/viracao

Para garantir a igualdade entre os gêneros na linguagem da Vira, onde se lê “o jovem” ou “os jovens”, leia-se também “a jovem” ou “as jovens”, assim como outros substantivos com variação de masculino e feminino.

Mande seus comentários sobre a Vira, dizendo o que achou de nossas reportagens e seções. Suas sugestões são bem-vindas! Escreva para Rua Bitencourt Rodrigues, 88, cj. 102 - CEP: 01017-010 - São Paulo (SP) ou para o e-mail: redacao@viracao.org - Aguardamos sua colaboração!

Parceiros de Conteúdo


MANDA

Edda Ribeiro, Virajovem do Rio de Janeiro (RJ); Vitória Soares e Jefferson Rozeno, Virajovens de São Paulo (SP); Hadassa Nunes, Virajovem de Vitória (ES) e Rodri Nazca, Virajovem de Natal (RN).

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trabalho é uma parte importante na vida dos jovens. Seja para a conquista da independência financeira, por necessidade ou para complementar a renda familiar, sabemos que meninos e meninas trabalham, formal ou informalmente. A pergunta é: em quais condições? Todo jovem brasileiro, independente da etnia, cor da pele, cultura, origem, orientação sexual, religião, opinião, condição social ou econômica, tem direito à profissionalização, ao trabalho e à

renda, desde que este seja seguro, saudável e dentro das leis trabalhistas. O documento que assegura esse direito é o Estatuto da Juventude, criado em 2013 e até hoje pouco conhecido. Mas e o direito de sonhar? Viajar pelo mundo, trabalhar em causas sociais, fotografia, artes, trabalhar com direitos garantidos, com saúde e segurança. Qual é o trabalho dos seus sonhos?

como seria o trabalho dos seus sonhos? Karol Melo 22 anos | Vitória (ES)

João Lucas 18 anos | Belém (PA) Eu tenho o sonho de ser promotor de justiça desde os meus 14, 15 anos. Quero ser promotor de justiça para garantir mais direitos às crianças e adolescentes do meu bairro e da minha cidade, que muitas vezes não têm condições nem acesso a esses direitos.

Meu sonho é trabalhar em uma instituição como ONG ou orfanato, algo relacionado a crianças, integrando o que realmente amo fazer, com o jornalismo. Nesses locais poderia trabalhar como assessora de comunicação ou profissional de marketing.


Joyce Serafim 13 anos | São Paulo (SP) O trabalho dos sonhos seria aquele em que eu fosse avaliada, julgada e respeitada pela minha competência e não pela cor da minha pele.

Bruno Magalhães 16 anos | Rio de Janeiro (RJ) Pra mim, o trabalho dos sonhos seria como psicólogo, porque já há alguns anos me interesso pela psicologia e por estudar a mente humana, sempre foi algo que me atraiu muito.

Arthur Sousa 16 anos | Niterói (RJ) Acho que ter um trabalho, ter seu dinheiro, sua carteira assinada, já é um grande sonho. Mas pensando em algo maior, um sonho meu seria viajar pelo mundo. Ainda mais eu, que sou jovem negro de bairro pobre. Viajar pelo mundo fazendo trabalhos sociais: esse seria o trabalho dos sonhos! Algo que não fosse pra me beneficiar, e sim pra beneficiar outras pessoas, conhecendo lugares novos e explorando o desconhecido.

NÃO É DE HOJE A Lei da Aprendizagem foi criada para garantir as condições adequadas de desenvolvimento aos adolescentes que compõem o universo do trabalho. A partir do dia 19 de dezembro do ano 2000, adolescentes com idade entre 14 e 18 anos incompletos passam a poder trabalhar na condição de aprendizes. Ser aprendiz é também uma forma de proteger o adolescente de condições insalubres e exploratórias de trabalho. Você encontra mais sobre este tema nas próximas páginas desta edição!

Giuliana Oliveira 16 anos | Vitória (ES) Meu emprego dos sonhos é poder trabalhar com fotografia e me tornar uma boa fotógrafa, ser dona do meu próprio trabalho. Adoraria fazer o que eu amo e ainda ganhar bem com isso. Além de poder registrar momentos como paisagens, eventos e ensaios.

PARA LER NO BUSÃO A personagem de histórias em quadrinhos mais popular da Argentina, Mafalda, traz reflexões importantes sobre a sociedade burguesa, o capitalismo, a globalização, o estímulo ao consumo e a propriedade privada. A menina questionadora, esperta e de língua afiada, foi criada pelo quadrinista Quino em 1964. No livro Assim vai o mundo, Mafalda investiga temas sociais, ecológicos e políticos de sua maneira: com ingenuidade, graça e muita indignação.

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eu ParticiPo, tu ParticiPas, nÓs ParticiPamos Caroline Musskopf e Evelin Haslinger, Virajovens de Porto Alegre (RS)

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Estatuto da Juventude diz que todo jovem tem o direito à participação social e política, e na formulação, execução e avaliação das políticas públicas de juventude. Sendo assim, todo o jovem tem direito à participação cidadã, sendo ela autônoma ou por meio da atuação em movimentos. Como exemplo dessa participação, temos o movimento estudantil. E a conjuntura atual do Brasil, marcada pela perda de uma série de direitos conquistados com muita luta ao longo da história, faz com que busquemos, em nossa memória, momentos significativos de uma juventude estudantil participativa. Afinal, o movimento estudantil, em suas diferentes frentes, contribui com mudanças importantes para o contexto social e político do nosso país. Para avançar essas discussões, lutar pela garantia dos direitos das juventudes e exigir políticas públicas direcionadas para as nossas necessidades, seja no âmbito do trabalho, da saúde ou da educação, é necessário entender a estrutura do movimento estudantil e a sua história. Isso porque, além das manifestações espontâneas e representações independentes, o movimento possui várias organizações representativas: os DCEs (Diretórios Centrais Estudantis), as UEEs (Uniões Estaduais dos Estudantes), a UNE (União Nacional dos Estudantes), a UBES (União Brasileira dos Estudantes Secundaristas), entre outras. Ter consciência do que já aconteceu nesses diferentes espaços e voltar o olhar para o passado, pode ajudar a traçar novos caminhos.

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LINHA DO TEMPO

1901 Federação dos estudantes do Brasil

1902 Primeiro Grêmio Estudantil (São Paulo)

1910 I Congresso Nacional de Estudantes

1984 Mobilização para as Diretas Já

1990 Aprovação do Estatuto da Criança e do Adolescente

2011 Criação da Agenda de Trabalho Decente para a Juventude

2013

1930

Aprovação do Estatuto da Juventude; participação nas manifestações de junho

Participação na Revolução de 1930

2015 a 2016

1937

Ocupação de Escolas e Universidades Públicas

Fundação da União Nacional dos Estudantes (UNE)

1949 Fundação da União Brasileira dos Estudantes Secundaristas (UBES)

1964 a 1985 Resistência ao Regime Militar (Ditadura)

TÁ NA MÃO Saiba mais sobre a história do movimento estudantil secundarista: http://ubes.org.br/ memoria/historia/

Confira o link sugerido pelo QR Code!

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Precisamos falar sobre a reforma do ensino médio!   Em meio a falta de diálogo e espaços de participação nas escolas, a reforma_   do ensino médio deve ser discutida entre alunos, professores e gestores_ Letícia Vidinha, Virajovem de São Paulo (SP) il Rovena Rosa/Agência Bras

com que professores e funcionários trabalhem ainda mais, sem um aumento significativo do piso salarial. Isso tudo pode tornar os déficits da educação atual ainda mais evidentes e problemáticos. Vamos então conversar sobre algumas questões polêmicas dessa reforma? A primeira é que ela não foi discutida com a comunidade escolar, que envolve pais, alunos, professores e gestores. Isso não é democrático, portanto, nos foi imposto! Sem diálogo com a sociedade civil, a proposta é uma medida ditatorial por parte dos governantes. É o que explica Fernando Penna, professor e membro do Movimento Liberdade para Educar, em entrevista à Fundação Oswaldo Cruz. “Ela [a Reforma] foi imposta como medida provisória e aprovada muito rapidamente, com brechas gravíssimas.” A mudança na obrigatoriedade das matérias é um dos pontos que mais divergem opiniões neste debate. Uns acreditam que ela aumentará o interesse dos alunos pelos estudos e pela escola, já que parte da grade seria flexível de acordo com a área de interesse individual. No entanto, outros acreditam que esse tipo de decisão é uma responsabilidade muito grande para um jovem de 14 ou 15 anos, que busca experiência e autonomia. É o caso do secundarista Wesley Matos, de 17 anos. “Acho muito complicado escolher uma área de interesse nessa idade. Tenho 17 anos e ainda não escolhi, pois acho

Manifestação contra a reforma    do ensino médio em São Paulo

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Reforma do Ensino médio, aprovada em fevereiro deste ano, traz muitos desconfortos. A sociedade tem se questionado se esta seria uma boa alternativa para a educação e alunos, professores e especialistas ressaltam as implicações na vida profissional futura dos estudantes. A Reforma propõe autorizar a contratação de professores sem diploma específico e flexibilizar o conteúdo a ser ensinado, mudando a distribuição das disciplinas tradicionais. Sugere também a mudança na carga horária das escolas, que será integral, fazendo

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Wilson Dias/A gência Brasil

que sou muito novo e preciso me testar e experimentar várias coisas.” Um dos argumentos centrais do atual governo, a favor da proposta, é que a Reforma seria uma medida combativa para a evasão escolar. No entanto, as opiniões quanto à efetividade dessa estratégia são divergentes. A evasão escolar se dá por diversos motivos, que vêm de dentro e de fora das escolas, e devem ser olhadas com a individualidade que merecem. Um caso nunca será igual ao outro, uma reforma nacional e universal só iria homogeneizar os problemas dos evasores, e não tratar as causas reais e específicas que os levam ao abandono escolar. O ensino precisa sim ser modernizado e mais atrativo, porque os discursos dentro de sala de aula, na maioria das vezes, são os mesmos que eram na época dos nossos pais. Isso não pode ser admitido, claro, depois de tantas mudanças nas formas de ver o mundo e nas tecnologias pedagógicas e científicas, mas essa atualização não deve se dar de maneira impositiva, como foi iniciada. Para isso, a promoção da participação no debate sobre as mudanças é essencial! Como mudar algo sem consultar aqueles que serão diretamente impactados pela mudança? “Não estamos negando a necessidade de uma reforma, mas a grande pergunta é: era esta a reforma que queríamos ou precisávamos?”, questiona Penna. “Nunca saberemos porque não tivemos um debate amplo. Como movimento, queremos participar dos processos de construção de políticas públicas e exigir que as mudanças na educação aconteçam de uma maneira democrática.” Wesley reforça a importância da participação das juventudes neste processo. “Talvez essa reforma não me atinja diretamente, mas afetará minha irmã mais nova, meus primos, e toda essa nova geração que crescerá. Portanto, minha posição em relação a esse assunto é totalmente contra. Precisamos sim de mudanças, mas mudanças significativas, não reformas mal pensadas.”

Ocupação de escola pública em Brasília

OLHA PRA GENTE! OLHA PRA CÁ, OLHA PRA OCUPAÇÃO ESTAMOS GRITANDO MAS NÃO TEMOS OS OUVIDOS DA NAÇÃO!… OLHA PRA CÁ, OLHA PRA OCUPAÇÃO TOMAMOS O QUE É NOSSO E NINGUÉM VAI NOS ROUBAR A MENOS QUE PASSEM POR CIMA DOS NOSSOS DESTROÇOS QUEREM TIRAR O POUCO DE QUEM NÃO TEM NADA AFINAL PRIORIDADE NUNCA FOI ESSA MOLECADA EM TEMPOS DE CRISE SOMOS OS PRIMEIROS A SOFRER PARA ASSEGURAR A TRANQUILIDADE DOS HOMENS DE TERNO QUE DETÊM O PODER, QUE NÃO QUEREM TEMER QUE SÓ SE IMPORTAM EM TER OLHEM PRA CÁ, PRA LÁ, OLHEM PARA AS OCUPAÇÕES NÃO FINJA QUE NÃO HÁ PROBLEMA SÓ PORQUE SOMOS NÓS QUE LOTAMOS OS BUSÕES O SEU PROTESTO NA ZONA SUL É MAIS LEGÍTIMO QUE O MEU NA PERIFERIA?! POR QUE OUVEM OS MURMÚRIOS DO BRANCO DE OLHO AZUL E IGNORAM OS GRITOS DA MINHA MISTURA DE MINORIAS? OLHEM PRA CÁ, OLHEM PRA OCUPAÇÃO NÃO TIREM A NOSSA ÁGUA E NOSSO PÃO SÓ PRA ADICIONAR CAVIAR NA MESA DE QUEM JÁ COME SALMÃO.

Paulo Ricardo, ex-aluno do Colégio Estadual Bangu, no Rio de Janeiro (RJ)

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Estudar e trabalhar é possível?   Como conciliar trabalho, estudo e vida    familiar e ainda ter tempo pro rolê  Vitória Soares, Virajovem de São Paulo (SP)

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ma pesquisa feita pelo Ministério da Educação aponta que quase 60% dos alunos entre 15 e 29 anos, em algum momento de suas vidas, conciliaram trabalho com estudo, seja no ensino médio ou na modalidade de Educação de Jovens e Adultos (EJA). Esse número mostra que, apesar das dificuldades em manter o emprego, a vida familiar e os estudos em dia, a galera está determinada a crescer, se qualificar e entrar no mundo do trabalho. Por outro lado, apenas 41,3% dos jovens brasileiros se dedicam exclusivamente aos estudos. Será, então, que o trabalho pode afetar a permanência de meninos e meninas na escola? Segundo Gabriel Di Pierro, psicólogo e Supervisor da Area de Juventude da Ação Educativa, o trabalho não é o único motivo pelo qual jovens têm abandonado os estudos. “Há mais jovens fora da escola que buscam trabalho ou estão trabalhando do que aqueles matriculados, mas não podemos afirmar que esse abandono foi causado pela busca por trabalho. Não é uma resposta simples e é preciso considerar que a combinação de diversos fatores é que levam à evasão escolar”, explica. Pesquisa “Juventudes na escola, sentidos e buscas: por que frequentam?”, feita em 2015 pelo Ministério da Educação (MEC), Organização dos Estados Interamericanos (OEI) e Faculdade Latino-Americana de Ciências Sociais (Flacso)

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14 anos, estava disputando uma vaga com pessoas cursando a faculdade, com experiência profissional e um currículo muito mais interessante.” Essa competividade é reforçada pela ideia de que o sucesso no mercado de trabalho é fruto do esforço individual. Ou seja, de acordo com essa linha de pensamento, se hoje a cada quatro jovens um está desempregado, é porque esse jovem “não se esforçou o bastante”. Para Gabriel, esse discurso de mérito acaba empurrando aos jovens a responsabilidade pelas dificuldades ou para a superação delas. “Essa carga toda se volta ao jovem, que em geral não conta com muito apoio externo, a bomba explode no seu colo”, explica.

Vitória Soares

A pesquisa aponta ainda que 32,2% dos entrevistados conciliam os estudos com o trabalho e 10,1% fazem bicos regulares. Entre os que só estudam, 10,1% já vivenciaram a jornada de trabalho-escola. É o caso do estudante de Jornalismo Leonardo Mastelini, de 21 anos. “Eu trabalho desde o meu quarto mês de faculdade. Ficar desempregado ou ter períodos sabáticos não eram alternativas. Me mantenho sozinho em São Paulo, pagando desde o aluguel a qualquer lanche que eu coma durante a tarde”, conta Leonardo que, apesar de reconhecer a necessidade de trabalhar, acha difícil conciliar o trabalho e a graduação. “Hoje, infelizmente, tenho duas matérias trancadas devido ao conflito de horário (...). Isso é algo que eu não gostaria de ter deixado acontecer, mas a necessidade de um emprego falou mais alto”, confessa.

Trabalho, a matéria que ninguém aprende na escola A realidade entre jovens do Ensino Médio é um pouco diferente: 45,3% dos estudantes só frequentam a escola, 9,7% realizam bicos e estudam, 16,1% já conciliaram as duas atividades em algum momento de suas vidas, e 28,9% estudam e trabalham. Como relatou Leonardo, conciliar os estudos e o trabalho pode afetar a dedicação e o rendimento escolar, e as escolas públicas muitas vezes não conseguem responder de forma adequada às demandas dos estudantes por informação e reflexão sobre escolha, formação e inserção profissional. “[A escola] não lida satisfatoriamente com a questão da trajetória além da educação básica. Outra coisa é um problema ligado à gestão das políticas educacionais. O ensino noturno, para o qual vai boa parte dos estudantes que trabalham, é historicamente um ‘puxadinho’, uma forma precarizada de oferta de ensino”, conta Gabriel. Laura Miron Panciarelli, de 15 anos, trabalha no Serviço Social do Comércio desde outubro de 2016 e estuda no período noturno da rede pública. “Comecei a trabalhar visando o crescimento pessoal, me considerava uma pessoa acomodada, tímida, e passei a enxergar que pra me qualificar para o futuro, precisava fazer algo logo”, conta Laura, que sentiu na pele a competitividade entre jovens que disputam colocação no mercado de trabalho. “Eu, com apenas

Laura Miron Panciarelli, aluna do    Ensino Médio e aprendiz no Serviço    Social do Comércio

Apesar do desânimo durante o processo seletivo, hoje Laura acredita que a experiência de trabalho agrega à sua formação. “Sei que dessa experiência não carregarei apenas a formação técnica e um registro na carteira, levarei uma nova mulher, uma nova pessoa.” Apesar das dificuldades em conciliar a dupla jornada, o trabalho é central para nós, jovens, que buscamos a experimentação e a autonomia, seja por meio do trabalho, dos estudos, ou de outras atividades. Assim, é preciso que as oportunidades oferecidas aos jovens sejam compatíveis com as demais dimensões das nossas vidas, como o estudo, a vida familiar e o lazer.

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Juventude Que emPreende em educação Jovens criam iniciativas para mudar a cara da educação

no país

Diego Henrique da Silva e Paula Nishizima, Virajovens de Curitiba (PR)

o mApA Não foi fácil encontrar dados sistematizados sobre negócios sociais na área da educação, mas o 1º Mapa de Negócios de Impacto Social + Ambiental 2017 foi uma mão na roda! A pesquisa mapeou 579 negócios sociais, ajudando a compreender as áreas em que atuam, seus modelos de negócio, como fazem o acompanhamento do impacto e quais são as causas mais urgentes. Desses empreendimentos, 70% já estão formalizados. O levantamento foi realizado pela Pipe Social, uma plataforma mantida por três mulheres, para que as startups sejam vistas e também se reconheçam dentro do universo de possibilidades que esse ecossistema oferece hoje.

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Fotos: Diego Silva / Parafuso

Educom

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artindo da premissa de que todos devemos nos preocupar com a educação e incentivá-la, podemos dizer que o poder público, as organizações sociais, a iniciativa privada e a sociedade como um todo devem caminhar juntos, a favor de uma educação de qualidade. As iniciativas de jovens empreendedores em negócios sociais educativos são algumas das alternativas nesse sentido, visando a integração entre os setores! De acordo com o 1º Mapa de Negócios de Impacto Social + Ambiental 2017, 38% de um total de 579 negócios sociais mapeados atuam diretamente na educação, sendo que 50% acreditam que seu negócio pode revolucionar a área - ainda que não trabalhem diretamente com ela. Bom, antes de mais nada é importante que você saiba o que são negócios sociais: Negócios Sociais são empresas que têm a única missão de solucionar um problema social, são autossustentáveis financeiramente e não distribuem dividendos. Para o Sebrae – Serviço Brasileiro de Apoio às Micro e Pequenas Empresas, há duas linhas de pensamento em relação a este conceito, que divergem, sobretudo, na hora de compreender se a iniciativa deve ou não gerar lucro.

O programa Pense Grande foi criado em 2013; neste ano, jovens participaram de uma imersão em São Roque (SP)

#girlpoWer A participação feminina no mundo do empreendedorismo social já é representativa, mas pode ganhar ainda mais força. Ao todo, as mulheres estão presentes em 42% de todos os negócios mapeados, sendo que, deste percentual, 20% têm apenas mulheres como fundadoras e 22% são de equipes mistas. Os negócios que têm apenas homens como fundadores representam 58%. “Até 2017, as mulheres brasileiras ocupavam o 7º lugar no ranking mundial entre as mais empreendedoras do mundo. E hoje, segundo pesquisa da Global Entrepreneurship Monitor 2016, a presença feminina jovem - entre 18 e 34 anos - nos empreendimentos em estágio inicial é igual à masculina”, comentam as empreendedoras sociais Maria Elena Soczek, de 30 anos, e Lina Bennemann, de 29 anos. Elas buscam consolidar a Casulo, consultoria especializada em criar e disseminar boas práticas no campo da educação, em Curitiba (PR).


incUbAção e AcelerAção

Lina e Elena querem difundir boas práticas de ensino por meio de consultoria especializada

Uma das formas de alavancar negócios sociais, não só na educação mas em diferentes áreas, é por meio de programas de aceleração e apoio a empreendedores. Marina Egg é coordenadora do Programa de Incubação Pense Grande, dentro da Aliança Empreendedora, organização parceira da realizadora Fundação Telefônica. O programa auxilia quem quer resolver necessidades sociais por meio das tecnologias digitais. “Esse tipo de processo auxilia muito no desenvolvimento dos jovens empreendedores. Normalmente se inicia um primeiro empreendimento nessa fase da vida, sem experiência ainda, e esses processos apoiam trazendo informações, reflexões, contatos e motivação que agilizam os aprendizados e o desenvolvimento desses empreendimentos. É como se você tivesse um boom de experiência, que de outra forma, levaria muito mais tempo para adquirir”, explica Marina. Neste ano, mais de 500 empreendimentos se inscreveram no programa Pense Grande e 15 iniciativas foram selecionadas. Quase metade dessas iniciativas tem ligação direta com educação.

#FicAdicA Francisco quer ajudar pessoas que têm dificuldade em química, física e matemática

empreendedorismo sociAl por Todo o pAÍs! A diversidade regional é outro gargalo: 63% de todos os empreendimentos sociais levantados pela Pipe estão na Região Sudeste, 20% na Região Sul, seguidos pelo Nordeste (9%), Centro-Oeste e Norte (ambos com 3%), sendo que 2% não responderam de onde são. Apesar desses dados abrangerem a totalidade dos empreendimentos, a estatística reflete também na área da educação. “Já existem alguns empreendimentos voltados à educação nas regiões norte e nordeste, porém, são poucos e ainda não conseguem gerar forte impacto social”, avalia Francisco Alcântara, de 21 anos, de Fortaleza (CE). Junto a sua equipe, ele quer desenvolver a Schoolls, empreendimento que ajuda pessoas a compreenderem, de um jeito didático e acessível, as ciências exatas como física, química e matemática.

Você pode buscar informações sobre programas de incubação e aceleração na internet, como um meio de conseguir apoio para desenvolver o seu negócio, além de editais públicos e privados de fomento a projetos sociais, via Prosas (prosas.com.br), e as listas de links para programas de financiamento e de fomento a negócios do Ministério de Ciência e Tecnologia (www.portalinovacao. mct.gov.br).

TÁ NA MÃO Leia a versão completa dessa matéria no site da Agência Jovem de Notícias, o portal de notícias online da Viração: www. agenciajovemdenoticias.org.

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Adolescente pode trabalhar?   Entenda quais são as leis trabalhistas que garantem oportunidades    de trabalho saudáveis e seguras para adolescentes e jovens no Brasil  Ethel Rudnitzki, Virajovem de São Paulo (SP)

“C

riança não trabalha, criança dá trabalho”, já dizia a música do Palavra Cantada. Mas e adolescente, pode? A legislação brasileira permite que jovens a partir dos 16 anos trabalhem formalmente, e a partir dos 14 anos como aprendiz, seguindo certas especificidades. O trabalho de menores de 18 anos é regulamentado por três leis principais:

Consolidação das Leis do Trabalho Em todos os casos de contratação para menores de 18 anos, seja por meio de estágio, programa Aprendiz Legal ou mesmo CLT, algumas regras devem ser seguidas, segundo as leis trabalhistas. • Adolescentes não podem trabalhar no período noturno (entre 22h e 5h); • Não podem trabalhar em condições insalubres ou perigosas, que comprometam sua saúde e segurança; • Têm direito a 30 dias de férias, após 12 meses de trabalho, que podem coincidir com suas férias escolares sob sua demanda; • Devem receber, no mínimo, o salário mínimo federal (R$ 937,00 para 8h diárias) proporcional ao número de horas trabalhadas; • Têm direito a todas as horas necessárias para ter frequência às aulas, caso esteja estudando ou queira retomar os estudos. A contratação tradicional é feita com carteira de trabalho assinada, e pode ser feita para adolescentes a partir dos 16 anos, seguindo as regras acima além dos outros direitos comuns para trabalhadores maiores de 18 anos.

Aprendiz Legal Outra forma de contratação é no modelo de aprendiz. A partir do ano 2000, empresas passaram a poder contratar funcionários de 14 a 24 anos como aprendizes. Nesse caso, o contratante deve promover formação técnico-profissional aos jovens, que, por sua vez, devem 16

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cumprir as tarefas que lhe forem designadas dentro das seguintes condições: • Não podem trabalhar mais que 6h por dia e 30h por semana, ou 8h por dia caso o aprendiz já tenha completado o ensino fundamental e esse horário inclua as horas utilizadas para formação na empresa; • Devem estar matriculados na escola e manter frequência mínima enquanto estiverem trabalhando - sendo que o contratante deve conceder o tempo necessário de estudo demandado pelo adolescente;

Lei do Estágio Estudantes que estiverem frequentando cursos de nível superior (graduação em faculdade ou universidade), profissionalizante de 2º grau, ou escolas de educação especial, podem ser contratados como estagiários em suas áreas de conhecimento. O estágio, contudo, não estabelece vínculo empregatício, mas de aprendizado. Por isso, ele deve ser firmado em concordância com a instituição empregadora, o contratado e a instituição de ensino. Algumas escolas e faculdades, inclusive, consideram o estágio uma etapa obrigatória para a conclusão do curso, sendo que as horas trabalhadas valem como horas de aula. Uma das principais conquistas da Lei do Estágio é a carga horária de trabalho reduzida em período de provas. Assim como a carga horária do aprendiz, o estágio não pode ultrapassar 30 horas semanais para estudantes do ensino superior, da educação profissional nível médio, e do ensino médio regular; e 20 horas semanais para estudantes de educação especial e dos anos finais do ensino fundamental, na modalidade profissional de educação de jovens e adultos. A remuneração fica a critério do contratante, que deve respeitar as exigências sindicais de salário base para estagiários. O valor não pode ser menor do que o salário mínimo nacional proporcional às horas de trabalho. Agora você já sabe! Se for adolescente e estiver trabalhando ou em busca de trabalho, consulte, reivindique e abuse dos seus direitos.


Ethel Rudnitzki, Virajovem de São Paulo (SP)

as”, Conhecida como “terror das patro Laudelina viveu toda a sua vida lutando pelos direitos das trabalhadoras domésticas

N

eta de escravos, negra e pobre, Dona Nina nasceu no dia 12 de outubro de 1904, em Poços de Caldas, Minas Gerais. Começou a trabalhar antes de completar oito anos de idade, já como empregada doméstica, mesma profissão de sua mãe. Aos 16 anos, Laudelina se junta ao Clube 13 de maio, associação que promovia encontros e atividades entre negros de sua cidade, tornando-se presidenta do grupo. Em 1922, ela se muda para São Paulo e depois para Santos, litoral paulista, em 1924, onde passa a integrar o grupo político Frente Negra, ligado ao Partido Comunista Brasileiro (PCB). Essas influências levaram Laudelina a fundar, em 1936 a primeira Associação de Empregados Domésticos no Brasil. 25 anos depois, ela cria a Associação Profissional Beneficente das Empregadas Domésticas em Campinas, interior de São Paulo. A associação atuava principalmente contra a discriminação racial sofrida pelas trabalhadoras domésticas negras, preteridas às trabalhadoras brancas tanto pelos patrões quanto pelos anúncios de jornal. Para lutar contra esse preconceito, Laudelina promovia ações voltadas para a alfabetização das trabalhadoras e para o estímulo de solidariedade entre elas, para assim, articulá-las a lutarem por seus direitos.

Novaes

terror das Patroas

Laudelina também participou de movimentos culturais negros em Campinas, fazendo parte do Teatro Experimental do Negro (TEN) e fundando um curso de balé e música para jovens negros na cidade. A atuação de Laudelina foi fundamental para a conquista do direito à carteira de trabalho para trabalhadores domésticos na década de 1970 e inspirou a criação de outras associações de trabalhadores domésticos pelo Brasil, como a fundação do Sindicato de Trabalhadores Domésticos em 1988. Dona Nina morreu em 12 de maio de 1991, em Campinas, mas sua história continua representando milhares de mulheres negras pelo Brasil. Segundo a Fenatrad (Federação Nacional das Empregadas Domésticas) há mais de 7 milhões de trabalhadores e trabalhadoras domésticas no Brasil. Desse número, 92% são mulheres e 62% delas são negras, sendo que 14% das brasileiras ocupadas trabalham como domésticas. Em julho de 2016, foi criada a página “Eu, empregada doméstica” no Facebook para denúncias de abusos e violências sofridos por essas trabalhadoras. A página recebeu mais de 5 mil relatos de humilhação, segregação e racismo, em menos de um mês. Com tamanha repercussão, o que começou nas redes sociais, se expandiu para a criação de encontros presenciais entre domésticas e o lançamento de um guia de direitos para essas trabalhadoras. “A siTUAção dA empregAdA domésTicA erA mUiTo rUim, A mAioriA dAqUelAs AnTigAs TrAbAlhArAm 23 Anos e morriA nA rUA pedindo esmolAs. erA Um resÍdUo dA escrAvidão, porqUe erA TUdo descendenTe de escrAvos”

Laudelina de Campos

TÁ NA MÃO Conheça a organização Casa Laudelina, única no Brasil que tem o trabalho doméstico remunerado como carro chefe das lutas: http://www.casalaudelina.org.br/ Revista Viração • Ano 14 • Edição 112

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Fotos: Marcelo Horn-GERG 06/2013

A perifa tem vez no mercado de trabalho formal? Diego Teófilo, Virajovem de Belém (PA)

A   Com a flexibilização das relações    de trabalho, a discrimimação e o alto    índice de desemprego entre jovens,    meninos e meninas da perifa se    distanciam do mercado formal

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população jovem no Brasil está crescendo. Em 2010, cerca de 51 milhões de jovens de 15 a 29 anos viviam no país, o que possibilitou a consolidação de um espaço de debate e reflexão sobre as juventudes. Assim, nos últimos anos, ampliou-se a discussão de políticas públicas voltadas para este público, como o acesso à educação de qualidade e o direito à inclusão e inserção no mercado de trabalho. Essas conquistas se deram a partir de intensos processos de mobilização e luta, visando a garantia do espaço de participação e representatividade de adolescentes e jovens. Um exemplo é o Estatuto da Juventude, aprovado em 2013, que garante a todo jovem, entre outros direitos, o acesso à profissionalização, ao trabalho e à renda. Mas será que esses direitos contemplam todos os jovens brasileiros? E a perifa, tem vez? Rodrigo Reis da Silva, de 17 anos, é estudante do segundo ano do ensino médio e vive uma realidade bastante comum nas periferias brasileiras: a atuação no mercado informal. Ele trabalha na feira do bairro onde mora, na periferia da cidade de Belém (PA), e faz parte dos 10% de jovens do Ensino Médio que estudam e “fazem bicos” no Brasil, segundo pesquisa realizada pelo Ministério da Educação, em 2015.


O medo de sobrar

“Não é bom, mas foi a única opção que tive e precisei agarrar. É um trabalho muito esgotante, não aconselho jovens a trabalharem em feira (...), somos expostos a muitas coisas, perigo, brigas, assaltos, mortes, doenças. Jovens nesses espaços ficam mais sujeitos a conhecerem drogas, tráfico, prostituição”, conta. Rodrigo relata ainda que não teve a chance de ingressar no mercado formal, e que algumas vezes se sentiu discriminado por morar em um bairro periférico e por ser negro. Com sua idade, ele poderia participar de algum programa de aprendizagem e adquirir experiência para tentar ingresso no mercado, mas o trabalho para sobrevivência é prioridade. Assim, Rodrigo segue na informalidade. Segundo dados do IBGE, em 2013 a taxa de informalidade entre os jovens de 16 a 24 anos era de 44,8%. Apesar de ser proibido por lei, o trabalho entre adolescentes com menos de 16 anos também é uma realidade: de acordo com relatório publicado em 2012 pela Organização Internacional do Trabalho (OIT), há mais de um milhão de adolescentes entre 14 e 15 anos trabalhando, desses, apenas 1,6% na condição de Aprendiz. Para grande parte das juventudes, o trabalho está muito conectado com o acesso ao consumo, que se torna prática dominante para as novas gerações. Assim, o acesso ao lazer e ao universo chamado “cultura” ganha espaço no imaginário juvenil. O consumo, o desejo de “ser alguém” e de “pertencer”, somados a essa dificuldade de acesso ao emprego - que inclui, entre outros fatores, a distância da cidade e o concílio entre estudos, lazer e vida familiar - é impactante na vida de adolescentes e jovens.

A concepção moderna de juventude tem a escola como etapa fundamental, mas sabemos que ela não se dá de forma homogênea. Na prática, a grande maioria dos jovens, sobretudo os de baixa renda e jovens das periferias, começa a trabalhar antes da fase adulta, como vimos na matéria “Estudar e trabalhar é possível?” desta edição. Para a socióloga Regina Novaes, os avanços tecnológicos, a globalização e a dinamicidade do mercado de trabalho fazem com que jovens sintam-se inseguros. “O medo do futuro é quase um sinônimo de ‘sobrar’ e está muito relacionado ao mundo do trabalho. São muitos os medos nesta área: ‘medo de não estudar e não conseguir um emprego’, ‘medo de estudar e não conseguir um emprego’, ‘medo de conseguir emprego e depois perder’, ‘medo de ficar desempregado’”, escreveu Regina em artigo para o livro Culturas Jovens: Novos mapas do afeto. Outro fator que marca as experiências das juventudes brasileiras, segundo a socióloga, é o medo de morrer, e a morte é uma realidade muito próxima nas periferias. Segundo o Mapa da Violência 2014, mais da metade dos homicídios no Brasil tem como alvo jovens entre 15 e 29 anos, destes, 77% são negros. Do ponto de vista prático, temos o trabalho como elemento central na vida das juventudes periféricas, que precisam viver e conviver com diversos dilemas, entre eles concluir os estudos e depois trabalhar, se dividir entre estudo e trabalho, ou largar os estudos e ter algo imediato. Vivemos o tempo das urgências que, aliado à falta de condições dos pais ou familiares, faz com que a necessidade da entrada no mercado seja imediata. Enquanto políticas públicas de profissionalização e trabalho para as juventudes não são efetivadas, criam-se as mais diversas formas de sobrevivência. Entre os medos apontados por Regina, há sonhos que crescem e outros que adormecem, em diferentes momentos da vida. O mercado de trabalho não está distante desses sonhos. É necessário problematizar e cobrar do poder público a criação de oportunidades para essa juventude, que existe e resiste diariamente nas periferias brasileiras.

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Nosso lugar não é fogo ou no fogão A nossa chama é o fogo da revolução s no Brasil e no mundo,    Apesar das conquistas dos movimentos feministas e tran nta desafios    a luta das mulheres por direitos trabalhistas ainda enfre Verônica Mendonça da Silva, Virajovem de São Paulo (SP)

A

s reivindicações das trabalhadoras por melhores salários e condições de vida não é uma luta recente: no século XIX, da Rússia aos Estados Unidos, mulheres protestaram para garantir condições de trabalho dignas e igualitárias e, apesar de tantos anos terem se passado, nós, no século XXI, ainda lutamos pelas mesmas razões. Mas pelo que lutamos quando lutamos por igualdade? A igualdade salarial, por exemplo, ainda é um ponto de muito debate. No Brasil, mesmo com melhor performance na vida acadêmica e mais tempo de estudo, as mulheres ganham 30% a menos, em média, que os homens. A diferença se agrava conforme mais alto for o cargo: para os cargos de consultoria, por exemplo, a diferença chega até a 62%1. Esses números fazem do Brasil o país com maior desigualdade salarial entre homens e mulheres na América Latina. Por isso, o Banco Interamericano de Desenvolvimento recomenda, entre outras medidas, expandir o número de creches e distribuir as tarefas domésticas entre homens e mulheres de forma igualitária. Caso contrário, somente em 100 anos será possível alcançar a equidade salarial no país, segundo o Fórum Econômico Mundial. A maternidade é outro tabu quando o assunto é mercado de trabalho. Tudo começa no processo seletivo, quando mulheres são questionadas sobre a pretensão de engravidar. Se engravidam, muitas se deparam com demissões logo após o período da licença maternidade e têm dificuldade na recolocação. Bruna Parolin, de 26 anos, foi mãe aos 23 e conta que “ser mãe, ser mulher, trabalhar e estudar é difícil, por milhões de motivos. Manter a rotina de trabalho e estudos já é intenso. Agora, acrescente acordar muito mais cedo para preparar seu filho pra escola. Depois, volte pra casa com seu filho te esperando e

1  Pesquisa Salarial do Grupo Catho, 2007

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dependendo de você... E você faz tudo isso com olhares e comentários alheios de muitos que parecem estar esperando você desistir”. Ela também percebeu a diferença de tratamento dado à ela e ao marido, que recebeu uma promoção por passar a ser, então, considerado um “pai de família”. “Ele mesmo me disse sentir diferença após o nascimento de nossa filha [...] e quando ele comentou que a esposa também trabalhava, respondiam com uma risadinha irônica ‘mas elas não levam a sério, né?’”, disse. Para além da desigualdade salarial e da pressão em combinar vida profissional e maternidade, existem outras questões que atingem algumas mulheres, especificamente. Mulheres negras sofrem frequentemente com racismo institucional, sendo muitas vezes coagidas a cederem a pressões estéticas, ou sendo subestimadas intelectualmente. Quantas mulheres negras você já viu em posições de chefia? Imagino que poucas. No entanto, é comum perceber que o espaço reservado à elas é o papel de auxiliar. Novamente, é a falta de oportunidade fruto do racismo praticado pelas empresas E por mais que existam políticas de ingresso para pessoas negras em cargos públicos, a esfera privada ainda está muito atrás. Segundo a Pesquisa Nacional por Amostra de Domicílios (PNAD), em 2014 apenas 10,8% das vagas em cargos diretivos nas empresas eram preenchidos por mulheres negras. O mercado de trabalho não é diferente para mulheres trans e travestis, que enfrentam dificuldades para conseguir ingressar em espaços formais de estudo e, quando conseguem a qualificação, as empresas não estão dispostas a contratá-las. “Nós só ganharíamos de fato mais espaço [no mercado], se tudo isso fosse natural e assim elas [mulheres trans] pudessem ir pra esquina se quisessem, e não por necessidade. Que o mercado de trabalho fosse uma forma de socializá-las efetivamente”, disse Paloma Castro, atuante no Instituto Nice, organização voltada à reinserção social, profissional e à promoção da cidadania de pessoas trans e travestis. Para Paloma, a transfobia institucional é uma das grandes causas de não existirem mais mulheres trans no mercado. Ela ainda ressaltou a importância de uma lei que garanta cotas para pessoas trans nas empresas.

Machismo no trabalho O machismo ainda tem impactos profundos no mercado de trabalho de inúmeras outras formas. Já parou pra pensar por que que existem poucos homens enfermeiros? Por que a carreira de professoras é tão desvalorizada? Ou, ainda, por que mulheres são pouco

incentivadas a seguir carreira na área de exatas? Não é possível ignorar a correlação entre a valorização ou desvalorização dessas profissões e os estereótipos que elas carregam. Sabe quando um Bruna Shinohara, de 23 homem fica horas anos, comentou que ser explicando algo óbvio mulher na área de exatas, para uma mulher, pra ela, é ter de se esforçar de forma didática, muito para se mostrar como se ela não fosse competente. “Qualquer erro capaz de entender? te faz parecer inferior”, disse. Isso é mansplaining, “Algumas consequências uma junção de disso é perceber que as “man” (homem) e colegas mulheres têm “explaining” (explicar). tendência a perguntar menos nas aulas, suponho que por medo de errar e sofrer esse julgamento todo, e conviver com Sabe quando mansplaining, bropriation e um homem se silenciação, principalmente apropria da ideia em trabalhos em grupos”. de uma mulher? Bruna ressaltou ainda o Isso é bropriation, assédio, moral e sexual, uma junção de sofrido no meio acadêmico, “bro” (cara, brother) vindo dos próprios e “appropriation” professores. (apropriação). O assédio é um outro assunto que atinge, de forma geral, muito mais as mulheres que os homens. Enquanto entre os casos de assédio moral, homens (48%) e mulheres (52%) têm ocorrências próximas, o assédio sexual é muito mais comum entre mulheres (80%), de acordo com pesquisa feita pelo site Vagas, empresa especializada em divulgação de vagas no mercado de trabalho brasileiro. Muitas de nós ainda têm dificuldade em denunciar essas situações por falta de apoio, pela vergonha, por medo de represálias ou até mesmo de perder o emprego. Assim sendo, para que todo esse cenário de assédio, diferença salarial, racismo, transfobia, sexismo e preconceito com as mães trabalhadoras mude, é preciso, além de uma mudança estrutural nas políticas públicas, que haja uma mudança cultural , na qual não somente as mulheres sejam tidas como as responsáveis pelas filhas e pelo lar, mas também que o empoderamento de meninas e mulheres seja visto como uma das chaves para o crescimento econômico das sociedades. A luta pela igualdade para mulheres no mercado de trabalho, assim, significa a melhoria da qualidade de vida de todas: crianças, adolescentes, mulheres e homens.

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Sair do campo, não senhor!   Jovens rurais do Ceará buscam novas formas    de empreender e gerar renda no campo  Rones Maciel, Virajovem de Fortaleza (CE)

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mpreendedorismo pode até soar familiar apenas para os jovens urbanos, do mesmo jeito que agricultura pode parecer sinônimo de juventude rural. Mas não se avexe não, existe uma juventude no campo que vem transformando a realidade no nordeste brasileiro, vítima da seca já há seis anos. No Ceará, grupos formados por jovens, com a apropriação de novas tecnologias e linhas de produção, estão ampliando e melhorando a qualidade de vida e convivência com o Semiárido. Por meio do empreendedorismo e da agroecologia, abrem-se para novas oportunidades. Nessa nova fase de produção e consumo, um fator importante é a formação, que instrui jovens rurais a

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produzirem e gerarem renda sem que precisem sair do campo, ou produzirem nos formatos tradicionais, como a agricultura e a criação de animais. Foi em busca de formas alternativas de produção e gereção de renda que quatro jovens empreendedores participaram, no início deste ano, da Jornada Vai Que Dá, uma iniciativa da Secretaria do Desenvolvimento Agrário do Ceará (SDA) e da Associação Nacional por uma Economia de Comunhão (Anpecom), realizada pela Aliança Empreendedora. Um desses jovens é o José Diógenes, de 17 anos, que vive no Assentamento Curupati Irrigação, no município de Jaguaribara (CE), a 291km da capital


Juventude no campo

Acervo pessoal de Micael Araújo

O Censo Demográfico 2010 dá indícios de que ocorreu, ao longo dos anos 2000, um aumento da permanência no campo. Foi justamente nessa década que importantes transformações econômicas e sociais ocorreram nas áreas rurais, através de políticas públicas conquistadas pelo povo e por movimentos sociais organizados. Hoje, 8 milhões de jovens vivem no campo! No entanto, é preciso criar mecanismos e ampliar as estratégias de atuação de instituições e políticas que permitam a permanência desses jovens no campo. A garantia de renda, apesar de fundamental, não é o único fator influente na decisão de ficar ou sair do campo. Questões como inclusão digital, acesso à educação, à cultura, ao esporte e à saúde, condições básicas de cidadania e qualidade de vida, também são consideradas.

Micael tem o próprio salão e está fazendo    um curso de especialização de barbeiro  l Foto: Rones Macie

Fortaleza. José encontrou na produção de bolos decorados uma oportunidade e um talento. “Desde 13, 14 anos de idade já gostava de fazer bolo. Mas foi o curso de empreendedorismo que fez com que eu despertasse para empreender no meu negócio. Foi no curso que aprendi a inovar, calcular preço para os produtos e serviços. E eu não faço só bolos, mas também tudo que envolve a realização de eventos, como aniversário e casamento”, conta. Essa qualificação não se limita somente ao José. Na comunidade de Mucambo, no município de Morrinhos, região norte do Ceará, vive outro jovem, o Micael Araújo de Oliveira, de 22 anos. Ele encontrou nas tesouras a oportunidade de crescer profissionalmente sem precisar deixar o campo, e abriu a sua própria barbearia. “Aos 19 anos comecei a trabalhar como pedreiro, logo depois tive a oportunidade de fazer um curso de cabeleireiro. Foi então que descobri mais uma vocação e tive um amor por esta profissão, e agora estou me especializando como barbeiro”, conta Micael, que viu no curso de empreendedorismo uma oportunidade de melhorar o seu negócio. “Aprendi como tratar bem meu cliente e organizar a parte financeira. Hoje, minha barbearia está bastante movimentada, com vários clientes”. Já no município de Itapipoca, jovens encontraram no beneficiamento da casca do coco, fruto abundante na terra dos três climas - praia, serra e sertão -, a oportunidade de viver no campo e gerar renda. Por meio da agroecologia, os jovens extraem da própria comunidade a matéria prima para a produção de produtos como o óleo extra virgem, azeite, bolos, biscoitos e coco ralado, comercializados em feiras da região e na capital cearense. Os jovens de Itapipoca passaram por uma formação em manuseio de maquinários, oferecida pelo Centro de Estudos do Trabalho e de Assessoria ao Trabalhador (CETRA). Assim, podem fazer o processamento do coco no próprio Assentamento Maceió, que é composto por 12 comunidades. O grupo produz ainda farinha, por meio da casa de farinha e da mandioca cultivada pelas famílias da comunidade. Deu pra ver que os desafios da juventude do campo não estão muito distantes dos jovens que vivem nas cidades. Todos buscam formas de se profissionalizar e gerar renda, mas o que esses jovens têm em comum é o desejo de realizar seus sonhos, com dignidade, segurança e perspectiva.

Formação em manuseio de maquinários para o    processamento do coco, no Assentamento Maceió

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AgroecologiA: o qUe é isso?

ESCORRE A TERRA BRUTA ENTRE OS DEDOS RUDES DO CAMPONÊS/ARTISTA DESLIZAM AS SEMENTES SOPRANDO VIDA NO ANTIGO LATIFÚNDIO IMPRODUTIVO COMO O ESCULTOR SEU BLOCO DE PEDRA SUAS MÃOS FECUNDAM O RELEVO DA TERRA

José Diógenes Acervo pessoal de

A agroecologia é o estudo da agricultura a partir de uma perspectiva ecológica. Esqueça a lógica do agronegócio, que além de ser nociva ao meio ambiente, coloca o agricultor submisso à indústria. A agroecologia prioriza a utilização dos recursos naturais com consciência, respeitando e mantendo o que a natureza oferece ao longo de todo o processo produtivo.

José Diógenes, aos 17 anos, tem sua própria confeitaria

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TORNAM A MATÉRIA A ARTE MILAGROSA DO ALIMENTO ESSE PEDAÇO DE PEDRA DE TERRA EM BREVE SERÁ PÃO SERÁ SUSTENTO ESCULTURA DA TERRA LAPIDADA A PARTIR DE UMA SEMENTE.

Poema 7 dos “19 Poemas sem Terra”, de Carlos Pronzato


o trabalho Positivo Apesar de protegidos por lei, portadores de HIV/aids enfrentam preconceito e discriminação no mercado de trabalho Moisés Maciel, Virajovem de São Paulo (SP)

V

ocê já pensou como é viver com HIV/aids e com todo o estigma que essa doença ainda carrega? Pois é, em pleno século XXI ainda existe preconceito e discriminação contra pessoas que vivem com HIV! Grande parte da população não tem informações sobre o vírus, não sabe a diferença entre HIV e Aids e acha que a prevenção se dá somente pelo uso do preservativo, descartando as novas tecnologias como PREP (profilaxia pré-exposição ao HIV) e PEP (profilaxia pós-exposição ao HIV). Por anos, pouco se soube sobre a doença. Sabia-se, no entanto, que o HIV se concentrava entre a população LGBT, o que resultou na estigmatização e discriminação de um grupo já marginalizado. Nas décadas de 80 e 90, por exemplo, a Aids era conhecida como a “doença dos gays” ou a “ira de Deus”, e antes da chegada dos primeiros antirretrovirais (coquetel), em 1996, a epidemia tirou a vida de milhares de pessoas. Como resultado de toda essa desinformação e estigmatização, as pessoas que vivem com o vírus não se sentem confortáveis para falar abertamente sobre a sorologia. No trabalho, por exemplo, portadores do vírus têm medo de serem expostos ou até demitidos. “São pouquíssimas pessoas que têm coragem de falar, chegar aos colegas, no chefe e dizer ‘eu sou soropositivo’. A gente sabe que têm pessoas que possuem sua sorologia aberta e são demitidas por um motivo ou outro, porque acham que essa pessoa tá mais suscetível a adoecer, ou pensam que ela vai ter que faltar mais porque vai ter que ir numa consulta”, conta o jovem Tiago, que é portador do vírus. O que poucos sabem, é que existem leis que protegem as pessoas com HIV. Sim! Elas têm o direito de manter o sigilo sobre sua condição sorológica em exames admissionais ou demissionais, no local de trabalho, e até mesmo em relações afetivas.

FUi conTrATAdo e, pArA ser AdmiTido e conTinUAr nA empresA, soliciTArAm eXAme de hiv. devo FAzer? No conceito de dignidade trabalhista e em respeito aos direitos humanos, não deve existir discriminação de trabalhadores, estudantes e pessoas com sorologia suposta ou confirmada para o HIV, visto que a discriminação e a estigmatização inibem todos os esforços para a promoção da saúde sexual e prevenção contra o vírus, reforçando assim o estigma social sobre o tema. Se o exame de HIV for solicitado pelo empregador, a pessoa tem duas opções: fazer ou não fazer. Para tomar essa decisão, é importante saber que a solicitação da sorologia para o HIV, por parte do empregador, é ilegal. A exigência do exame, seja para admissão, demissão ou permanência no trabalho ou cargo, é ilegal e constitui ato de discriminação, garantido pela Portaria 1.246/2010 do Ministério do Trabalho e Emprego. Qualquer vítima de discriminação deve ir até a delegacia do trabalho mais próxima e fazer uma denúncia. Para Tiago, o preconceito ainda é um dos principais fatores que dificulta a inserção de pessoas com HIV no mercado. “Talvez eu perdesse uma vaga de emprego, não porque eu estivesse desqualificado para a vaga, mas devido ao meu empregador solicitar a sorologia para o HIV, mesmo a lei me protegendo”, explica Tiago. “Nessa situação, eu poderia perder a vaga por conta dessa relação, sabe, é uma situação delicada que infelizmente é duradoura e presente.” É muito importante, portanto, que no âmbito do trabalho, da educação e do desenvolvimento social, as informações sejam difundidas e o estigma que circunda o HIV seja superado. Nós vivemos em uma sociedade interdependente e isso significa que vamos precisar um do outro de vez em quando. O HIV talvez não tenha tornado nossas vidas melhores ou especiais, tenho certeza disso. Mas tenho certeza de que o HIV nos fez perceber que os direitos humanos são essenciais e nos fez entender que a saúde não é o problema do outro, e sim do coletivo, de todos nós. Revista Viração • Ano 14 • Edição 112

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GALERA

rePÓr ter

cenÁrio Político, Juventudes e trabalho Entenda a relação das juventudes com o mercado de trabalho Karen Santos, Kauanne Santos e Paulo Tankian, Virajovens de São Paulo (SP)

C

omeçar a trabalhar é um marco importante na vida dos jovens brasileiros. No entanto, a perda de conquistas do passado, a vivência do presente e as incertezas do futuro, mostram um cenário em que o poder de participação da juventude é colocado à prova. A Revista Viração conversou com a cientista social, Maria Carla Corrochano, professora da Universidade Federal de São Carlos e pesquisadora de Sociologia da Juventude e do Trabalho. Durante a entrevista, Maria conta sobre a sua trajetória com as juventudes e a relação estrutural dos jovens com o mercado de trabalho. Ela atuou como assessora do programa Juventude, na Ação Educativa, e como consultora da Organização Internacional do Trabalho para a elaboração da Agenda Nacional do Trabalho Decente para a Juventude.

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Um dos grandes medos da juventude, segundo a socióloga Regina Novaes, é o medo de sobrar - principalmente em relação ao trabalho. Como você enxerga isso nas juventudes contemporâneas? Esse medo de sobrar, de ficar desempregado, tem a ver com uma leitura que os jovens fazem do atual cenário político e econômico do país, que apresenta sinais de instabilidade. O desemprego entre jovens é maior em relação aos adultos, por esse motivo é possível compreender esse medo em relação ao desemprego, esse ‘medo de sobrar’, porque tem uma conjuntura que desfavorece muito a população juvenil em relação ao trabalho.


Os direitos trabalhistas são suficientes para garantir estabilidade às juventudes brasileiras? Acho que temos muito o que avançar nesse sentido. Existem uma série de direitos garantidos constitucionalmente que na prática não são efetivados, o que atinge a juventude de maneira significativa. Esse grupo ainda possui dificuldades de acessar esses direitos! É preciso pensar nas desigualdades no interior da própria juventude. De maneira geral, jovens têm mais dificuldades de acessar o mercado de trabalho, mas quem tem mais dificuldade ainda são os jovens das camadas periféricas, mulheres e negros, grupos que são marginalizados. No quesito trabalho, isso se dá de forma mais agravante. Você acredita que o trabalho informal está mais relacionado às juventudes do que outros grupos etários? Pensando no trabalho formal, os jovens são os mais atingidos pela dificuldade de formalização do trabalho. Exatamente por estarem em um momento específico da vida, jovens são atingidos pelo trabalho informal e estão mais sujeitos às taxas de informalidade, precarização do trabalho e jornadas flexíveis. Isso afeta principalmente a saúde e a segurança do trabalho. A Reforma da Previdência, articulada pelo governo Temer, pode afetar os direitos trabalhistas das juventudes brasileiras? Muito. A gente pensa que a Reforma só atingirá os mais velhos, mas na verdade os jovens serão afetados diretamente. Os jovens deverão ficar muito mais tempo nos seus postos, sendo assim, terão mais dificuldades de acessar esses direitos de aposentadoria e, quando acessarem, será em condições imprevistas. Quando você aumenta as idades de aposentadoria você aumenta o desemprego entre jovens, pois as pessoas mais velhas demorarão mais tempo para saírem de seus postos de trabalho e os novos jovens perderão este possível acesso ao emprego. Os jovens terão muito mais dificuldades, haverá mais competitividade por vagas de trabalho. Efeitos da falta de diálogo nesta articulação.

Entre a Reforma da Previdência e a Reforma Trabalhistas, qual articulação apresenta maior impacto? Eu acho que as duas reformas de maneira geral limitam direitos duramente conquistadas pelos trabalhadores, e na medida que o trabalho é parte da experiência juvenil desde muito cedo, os dois prejudicam a juventude. Elas não são favoráveis e apresentam condições que podem prejudicar sobretudo as minorias sociais. Como os jovens podem reivindicar seus direitos neste cenário? Os jovens, muito mais que adultos, demonstram um conjunto muito positivo. Eles têm se manifestado bastante, considerando todas as manifestações e ocupações realizadas nos últimos anos, contra as várias reformas, em especial a reforma do Ensino Médio. Eles demonstram capacidade de mobilização, o que é importante, é necessário reaver isso. Além da participação e mobilização de adultos na mesma sintonia, existem ferramentas que podem ser positivas, como a parceria de sindicatos e instituições, para assim formar em conjunto um ambiente mais institucionalizado e mobilizado. Neste momento, temos pouco espaço de escuta, os canais que estavam abertos deixaram de funcionar. Quais são os maiores desafios quando pensamos em juventude e trabalho? Acredito que existem dois grandes desafios quando pensamos em juventude e trabalho. O primeiro, seria de ordem mais geral para o país: promover o crescimento econômico com distribuição de renda e diminuição das desigualdades, pois na medida em que o país cresce, aumenta a qualidade e a expectativa de vida. Outro fator que necessariamente não segue uma ordem de importância seria a valorização da diversidade, um fator importante, seja diversidade racial, de gênero ou território, que impactam na presença ou ausência do trabalho para esses jovens. Olhar para essas desigualdades e como elas se expressam é extremamente importante para poder agregar ao crescimento econômico.

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Precisamos falar sobre desemPrego! O alto índice de desemprego entre as juventudes no Brasil exige maior participação na luta pelo Direito à Profissionalização, ao Trabalho e à Renda Jefferson Rozeno, Virajovem de São Paulo (SP)

O

desemprego é uma realidade presente na vida de muitos brasileiros. No primeiro semestre de 2017, 13,6% da população estava em busca de emprego, um aumento de 3,6% quando comparado ao ano de 2016. O número é ainda mais alarmante entre jovens com menos de 25 anos: um a cada quatro está desempregado, somando 28,7% da população jovem no Brasil. O discurso relacionado à juventude e empregabilidade é antigo, e não está restrito ao nosso país. É o que conta a socióloga Livia de Tomassi. “O mercado de trabalho historicamente não apresenta oportunidade para os jovens. Eles são, em qualquer parte do mundo, o maior contingente de desempregados.” Além de lidar com os medos, descobertas e desafios da condição juvenil, as juventudes brasileiras precisam lidar também com os desafios da inserção no mercado de trabalho. Isso requer criatividade e ousadia. “Para os jovens, a única alternativa é inventar novos trabalhos. Por isso, a exigência de serem criativos e flexíveis. Existem oportunidades, mas não são para todo mundo”. O estudante Jabson Barbosa, de 19 anos, está desempregado há seis meses e acredita que a queda na qualidade de vida é um dos maiores desafios. “A falta de equilíbrio financeiro bloqueia muitas experiências na sua vida... a falta de oportunidade e a forte concorrência nos processos seletivos dificultam mais ainda a reinserção no mercado formal”, conta. O alto índice de desemprego entre jovens mostra que a efetivação do Estatuto da Juventude, por parte do Estado e da Sociedade Civil, ainda enfrenta desafios. O Estatuto é um instrumento legal - Lei 12.852/2013 - que determina quais são os direitos dos jovens que devem

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ser garantidos e promovidos pelo Estado brasileiro. O Estatuto prevê ao todo 11 direitos, entre eles o Direito à Profissionalização, ao Trabalho e à Renda.

direiTo À proFissionAlizAção, Ao TrAbAlho e À rendA Este direito garante que todo jovem possa ter acesso à profissionalização, ao trabalho e à renda, em condições de liberdade, equidade e segurança, adequadamente remunerado e com proteção social. Prevê também a promoção de formas coletivas de organização para o trabalho, de redes de economia solidária e da livre associação. Dada as condições especiais de jornada de trabalho, o Estatuto prevê a compatibilização entre horários de trabalho e de estudo.

Por mais difícil que seja enfrentar o desemprego, é preciso estar atento às oportunidades do mercado e buscar aprimoramento pessoal e profissional. Além disso, diante de um cenário marcado pela perda de direitos, principalmente trabalhistas, é fundamental que as juventudes participem na reivindicação de acesso ao trabalho justo e saudável.


escu rinho

eu, daniel blaKe

Divulgação

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Trecho do filme Eu, Daniel Blake

Sérgio Rizzo, jornalista e professor

U

m dos principais nomes do cinema de engajamento sociopolítico é o do diretor inglês Ken Loach, 81 anos. Seu parceiro constante, nas últimas duas décadas, é o roteirista escocês Paul Laverty. Juntos, eles fizeram “A Canção de Carla” (2006) “Ventos da Liberdade” (2006, Palma de Ouro de melhor filme no Festival de Cannes), “À Procura de Eric” (2009) e “A Parte dos Anjos” (2012). A mais recente colaboração entre eles foi “Eu, Daniel Blake” (2016), que também recebeu a Palma de Ouro em Cannes e veio a se tornar um ícone da resistência à escalada neoliberal na Europa e nos EUA. Interpretado pelo ator e comediante de stand up Dave Johns, o personagem do título é um carpinteiro. Prestes a completar 60 anos, ele sofre um ataque do coração e afasta-se temporariamente do trabalho. Quando termina a licença, ele fica sabendo que seu caso inspira cuidados e que seria melhor não trabalhar. Daniel Blake conhece então a burocracia tenebrosa do sistema de securidade social britânico. Enquanto se esforça para renovar a licença e manter a pensão, ele conhece uma jovem (Hayley Squires) que trabalha como prostituta. O lançamento de “Eu, Daniel Blake” no Brasil coincidiu com o encaminhamento, pelo governo Temer, da reforma trabalhista e da Previdência Social. É fácil entender por que, ao menos em São Paulo, muitas sessões terminavam com aplausos - a identificação de qualquer trabalhador com os personagens do filme é quase automática, e seu sofrimento pode ser sentido “na pele” - e, às vezes, também com gritos de “fora, Temer”. Cronista cinematográfico do pensamento socialista britânico, Ken Loach nasceu em Warwickshire, próxima a Stratford-upon-Avon (a cidade natal de William Shakespeare), a noroeste de Londres. Depois de formar-se em Direito pela Universidade de Oxford, viajou pelo Reino Unido com uma companhia teatral de repertório. Em 1962,

O neoliberalismo é um conjunto de ideias de caráter político e econômico que defende a utilização da estrutura privada como principal mantenedor no desenvolvimento social de um país, por meio de políticas de gestão privada e do distanciamento do estado na economia e nas políticas sociais.

O sistema de securidade social é o conjunto de ações de estruturação política que, por meio de ferramentas específicas, garante a promoção do bem estar social.

a BBC - rede pública britânica de rádio e TV - foi autorizada a operar, a partir de abril de 1964, um segundo canal de televisão, o BBC2. Profissionais de diversas áreas foram contratados para a nova demanda de trabalho. Loach conheceu muitos de seus futuros colaboradores no cinema durante o período inicial na BBC, em que sua primeira função foi dirigir episódios da série dramática “Teletale”. Eram telefilmes de 30 minutos de duração, com histórias completas que deveriam ser narradas com o máximo de economia e poder de síntese. Essa foi a sua escola estética, dando origem a um estilo despojado, ágil, muitas vezes semidocumental, com liberdade para alterar os procedimentos de acordo com os objetivos, privilegiando sempre a história a ser narrada -- diferentemente do rigor formal que orienta outra classe de cineastas, sempre fiéis aos mesmos padrões.

*www.sergiorizzo.com.br

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trabalho: PersPectiva e realidade de um Jovem da socioeducação Jovem de 19 anos, cumprindo medida socioeducativa em privação de liberdade, participante do projeto Vozes da Cidadania do ONDA – Adolescentes em movimento pelos direitos, no Distrito Federal

O

trabalho é a maneira pela qual cidadãs e cidadãos desempenham funções na sociedade. Sendo empregado ou autônomo, com a ideia de uma remuneração em conformidade com a atividade desenvolvida. A constituição de 1988 prevê o trabalho como um direito fundamental, que está muito ligado ao dinheiro, à independência e à autonomia. É uma forma de vida e envolve também ciclos de amizade. Dependendo do trabalho, até prestígio. Sob um olhar no sistema socioeducativo, no entanto, muitos dos adolescentes cumprindo medida socioeducativa em privação de liberdade não têm uma devida atenção ao exercício do trabalho. Uns não percebem a importância e outros não têm oportunidade de exercer uma profissão por conta do abandono do Estado. Falta um cuidado maior do Estado com a profissionalização de jovens que estão internados na socioeducação. Faltam cursos técnicos e profissionalizantes, palestras que informem o que podemos conseguir com o trabalho. Falta preparação para o mercado, como podemos nos ajudar a sair do contexto infracional e a entender outras alternativas de vida e não só o conflito com as leis?

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Com a estagnação do Estado no lidar com o sistema socioeducativo, bem como a alienação imposta aos jovens pelo mundo do crime, os socioeducandos se encontram a mercê de políticas ineficazes, dentro e fora das medidas socioeducativas, impossibilitados de sonhar com um futuro melhor através do trabalho justo. Para uma (res)socialização, é preciso ter a disposição oportunidades para essa mudança. Um jovem socializado é aquele que está em harmonia na sociedade: com a família, amigos e outras pessoas, estudando e trabalhando, e também em dia com as leis. Porém, infelizmente, muitos nunca viveram isso e outros só vivem o inverso dessa harmonia. É muito importante perguntar o que as pessoas querem, gostam e se sentem mais capacitadas para fazer. Pesquisas com o objetivo de descobrir sonhos, capacidades e aptidão dos jovens para o trabalho podem ser um meio de incentivo, além de evitar gasto do dinheiro público em cursos que não são interessantes para os adolescentes. Vivo em uma realidade impensável. Onde somente a vontade de estudar e trabalhar não é suficiente para cursar uma faculdade e conseguir um emprego.


Somos cerceados diariamente em nossas tentativas de evoluir como pessoa. A exemplo disso, são as aulas irregulares e a não disponibilidade de cursos profissionalizantes que visem este fim. Nós, internos, carecemos de ajuda acadêmica eficiente, bem como profissionalização. No entanto, passam-se os anos e nada é feito no sentido de intervir neste problema, que não só viola o principio básico do conceito de ressocialização, mas também dificulta diretamente nossa socialização enquanto cidadãos. Felizmente, em raros casos, ainda surgem pessoas dispostas a nos ajudar durante o cumprimento da medida, facilitando o diálogo democrático e disponibilizando meios alternativos para alcançarmos nossos objetivos. Tanto o Estado quanto a sociedade precisam se conscientizar a respeito do sistema socioeducativo defasado e tomar providências urgentes. Somos seres humanos e temos direitos e obrigações. Porém, pensamos ter somente obrigações a cumprir. Dê mais importância ao tempo, use-o da maneira mais eficaz, pois tudo que eu queria hoje é um tempo abundante para poder estudar. Tempo esse que não tenho, apesar de estar cumprindo medida socioeducativa, porque aqui não se tem, evidentemente, privacidade.

a vida A VIDA NÃO É SÓ APRONTAR É SONHAR É AMAR QUERER FAZER! A VIDA É BELA MESMO CURTA DEMAIS COM A GENTE PORÉM HÁ UM SIGNIFICADO SIGNIFICA QUE APRENDEMOS MAS TAMBÉM ENSINAMOS COISAS BOAS COISAS RUINS APROVEITAR! A VIDA É UMA SÓ FAÇA O IMPOSSÍVEL APROVEITE QUANTO PODE VIVA MAIS SEJA FELIZ AGRADEÇA POR HOJE.

Poema de SS, adolescente cumprindo medida socioeducativa em privação de liberdade participante do projeto Vozes da Cidadania.

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IMAGENS QUE

viram

do caos ao calo Karen Santos, Kauanne Santos, Paulo Tankian e Gabriel Wagner, Virajovens de São Paulo (SP) De todos os pés que caminha pela cidade do caos Que sentem em seus calcanhares a dor do trabalho Que sabem quanto custa cada passo Dos calçados e desprezados Que andam mensalmente pelo salário mínimo Dos jovens pés que caminham pela imensa cidade do caos, em busca da sua aprisionante independência Que saem do “ganha pão” direto para o “ganha conhecimento” E de segunda a segunda aula vão ganhando sua ilusão de espaço conquistado Produzindo para o sistema que os desprezam, perdendo seus sonhos e caminhando para o seu tão sonhado caos.

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sucesso é fazer o Que nos faz feliz A opinião da família e dos amigos na hora de escolher a profissão é importante, mas devemos também escutar os nossos sonhos Pietra Carvalho, Wender Starlless e Ane Melo, Virajovens da Jornalismo Jr., empresa júnior da Escola de Comunicação e Artes da USP

A

preocupação com a profissão a ser seguida começa desde muito cedo. Por trás da pergunta “O que você quer ser quando crescer?”, existem anseios e projeções de pais, familiares e da sociedade. O verbo na pergunta deixa claro que o que você vai ser, depende do que você faz. Em um contexto em que a escolha profissional ainda está ligada à status e conhecimento, carreiras tradicionais como engenharia e medicina ainda são vistas como garantia de estabilidade e sucesso. Optar por abandonar um caminho já sacramentado para se aventurar nas atividades menos prestigiadas, é um desafio. Alguns talentos e hobbies acompanham uma pessoa por toda a sua infância e são postos de lado na hora da escolha profissional. Por uma tendência cultural de dissociar diversão do dever, uma escolha pode ser inconscientemente esquecida pela tendência a adequação. O tatuador Guilherme Diniz, que abandonou o curso de direito no terceiro ano, disse que apesar do desenho o acompanhar desde criança, a ideia de que isso pudesse ser um ofício foi tardia. “Decidi abandonar o curso de direito quando percebi que levava muito jeito para tatuar, e mais do que isso, pela primeira vez na minha carreira profissional, estava seguro de que precisava de algo que eu amasse, que me completasse!”.

A partir do momento em que a escolha alternativa se torna uma certeza, começa outro desafio, o da aceitação. A estudante Isabella Gonçalves trocou a engenharia pelas aulas de matemática e conta que muitos ainda encaram sua prioridade pela paixão em lecionar uma falta de visão. “Ir naquele churrasco de família e ouvir ‘Ah, você largou a Engenharia porque era difícil?’ Ainda parte bastante o meu coração! E ter que ouvir também ‘mas com tanto talento, vai fazer Matemática e dar aula’, magoa bastante. Acho que o prestígio está muito associado ao valor financeiro da sua atividade, e quando eu decidi que pra mim dinheiro não era sinônimo de prestígio, ficou bem claro que engenharia não era pra mim”, conta. A ideia de que o significado de sucesso é único faz parte dessa incompreensão, mas a satisfação pessoal pode vir de todas as vias e a estabilidade também. Se trata de oportunidade e trabalho contínuo, o que se torna mais fácil quando a atividade é aliada à vontade e ao prazer. Como acredita Guilherme, um trabalho feito com liberdade traz coisas boas: “porque não é o que você faz, e sim o amor que coloca naquilo, que vai dizer o quão grande você pode ser.”

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a ocasião faz o cifrão Como jovens podem criar uma relação saudável com o dinheiro? Maria Carolina Soares, Mariangela Castro e Júlia Mayumi, Virajovens da Jornalismo Jr., empresa júnior da Escola de Comunicação e Artes da USP Não é segredo pra ninguém: lidar com dinheiro pode ser perigoso, mas ao mesmo tempo, muito necessário. E para os jovens que estão entrando no mercado de trabalho, administrar o próprio dinheiro é complicado. A recente saída da casa dos pais, a busca pelo primeiro emprego e a luta pela independência financeira, são fatores que dificultam. Lidar com o mundo das finanças é uma tarefa que demanda tempo e conhecimento prévio, e muitos jovens não são preparados para isso durante a vida escolar. Segundo um estudo do Serviço de Proteção ao Crédito (SPC), 76,4% dos jovens tentam fazer o controle dos seus gastos de cabeça, e isso pode resultar em situações complicadas. Maurício Gonçalves, de 21 anos, trabalha há quatro anos e já se enrolou com o cartão de crédito. “Tenho muitas dúvidas sobre o funcionamento do mercado financeiro, em parte pela falta de educação financeira na escola”, diz. De acordo com o professor da Faculdade de Economia e Administração da USP, Rodrigo De Losso, o endividamento no cartão de crédito pode ser uma armadilha difícil de sair. “A dica que eu dou para todo mundo (...) é o hábito de fazer orçamento”, conta. Apesar desse déficit educacional, alguns jovens pesquisam sobre o assunto. A estudante de engenharia Natálya Correia , conta que teve disciplinas na área financeira durante a faculdade e sempre se interessou. “Acho que todo mundo deveria aprender um pouco de economia, juros e investimentos, é muito importante”. Além de gostar de estudar, Natálya começou a trabalhar, mas já pensa no futuro: “eu administro meu dinheiro através das minhas prioridades educacionais. Com o que me sobra, eu pago minha previdência privada e guardo na minha poupança”. E ela não é a única que segue esse caminho. De acordo com pesquisa do SPC, 74,1% dos jovens que investem seu dinheiro utilizam a poupança. Em contrapartida, apenas 13,8% aplicam na previdência privada, muitas vezes, por falta de informação sobre como funciona. 34

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Para combater a desinformação, algumas escolas estão incluindo em seu currículo aulas de educação econômica. Um exemplo é o Colégio Sepp, em JacareíSP, onde o professor Diego Coimbra dos Santos ministra a aula de educação financeira para crianças já no fundamental I. “Eles estão em fase de estabelecimento de valores e começando a criar personalidade e caráter, levando o que aprendem nessa faixa etária para o resto da vida”, diz. As aulas seguem os princípios de “diagnosticar, sonhar, orçar e poupar” a fim de treiná-los para o planejamento financeiro. “Se bem organizado e sonhado, tudo pode ser realizado”, completa Diego. Com a proposta de conscientização e mudança de comportamento, a Associação de Educação Financeira do Brasil (AEF) atua no desenvolvimento de projetos voltados para crianças, jovens e adultos, tendo como base o Plano Diretor da Estratégia Nacional de Educação Financeira (ENEF). Desde 2010, o Plano propõe o alinhamento da Educação Financeira e seus conteúdos formais ao currículo da Educação Básica. Assim, o plano incide também para que o ensino da educação financeira seja obrigatório nas escolas brasileiras. Uma das iniciativas da Associação é o Programa de Educação Financeira nas Escolas. “Nós acreditamos que a formação deve ser feita desde o início, com uma estratégia de mudança de comportamento e utilizando conceitos como planejamento, organização, sempre trabalhando com a realização de sonhos e execução de planos de forma positiva”, conta Thiago Godoy, Diretor de Mobilização de Recursos da AEF. A organização e controle das próprias finanças também é uma forma de empoderamento. A informação e orientação sobre o assunto permite que jovens e adultos tomem decisões de compra ou de investimento de forma consciente, tendo em vista as oportunidades e os riscos envolvidos.

qUer orgAnizAr melhor o seU dinheiro? se ligA nAs dicAs do economisTA rodrigo de losso: 1. 2. 3.

Reservar uma parte de seu salário em uma poupança - para comprar bens mais caros ou fazer frente a imprevistos. Aproveitar descontos e sempre negociar preços. Reduzir despesas – ficar ligado nas atualizações nos planos de TV a cabo e celular, por exemplo.



nA virAção, Temos horror A cheiro de nAFTAlinA. deTesTAmos AcionAr o piloTo AUTomáTico e bUscAmos sempre inovAr, renovAr. é A vidA qUe nos sUrpreende A cAdA diA, mÊs e Ano… e olhA qUAnTos Anos! em 2018 A virAção FAz 15 Anos e nÓs qUeremos chegAr lá de cArA novA, comemorAr À vonTAde, sem medo de “ser mAis” – como diziA nosso mesTre inspirAdor, pAUlo Freire. por isso, como vocÊ, leiTor, deve Ter noTAdo, mUdAmos nossA idenTidAde visUAl. A novA proposTA TrAnsmiTe ATiTUdes posiTivAs, e é AindA mAis AnTenAdA com o presenTe de UmA gAlerA qUe Tá FAzendo de TUdo pArA mUdAr o mUndo. o vermelho de ATiTUde e pAiXão conTinUA no conceiTo dA novA idenTidAde, qUe segUiU A linhA dAs noTiFicAçÕes dAs redes sociAis, Tão presenTes no nosso coTidiAno. A TipogrAFiA e os elemenTos com AspecTo de recorTe TAmbém Tem TUdo A ver com A genTe, remeTe À Algo pAlpável, consTrUÍdo e dinÂmico. AgorA de cArA novA e inspirAdos como nUncA, conTinUAmos A deFender e promover os direiTos e os espAços de pArTicipAção de AdolescenTes e Jovens, por meio de UmA relAção esTável, permAnenTe e FrUTUosA enTre edUcAção e comUnicAção: A edUcomUnicAção.


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