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Trilha para o mundo

As experiências de artistas e empresários que vivem uma nova onda de internacionalização da música brasileira

por_ Ricardo Silva ■ de_ São Paulo

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Far From Alaska: banda paulistana canta em inglês e vai fazendo seu nome no mundo

Far From Alaska: banda paulistana canta em inglês e vai fazendo seu nome no mundo

São óbvios os encantos de um mercado musical como o nosso, oitavo do mundo e com um público consumidor que se conta às dezenas de milhões. Mas a grama do(s) vizinho(s) também pode ser bem verde... de uma tonalidade, assim, verde dólar. E um número crescente de artistas brasileiros tem se dado conta disso. A superestrela Anitta é só o símbolo mais visível de um novo salto da música nacional em direção à internacionalização. E os esforços disciplinados e profissionais dela deixam claro: não basta querer, é preciso dar os passos certos para trilhar a estrada de um mercado planetário que, só no ano passado, movimentou nada menos que US$ 15,7 bilhões.

Claro que a primeira coisa é ter algo relevante para mostrar.”

Thiago Endrigo, empresário

“É o caminho natural. A música boa é universal, e as coisas feitas aqui têm garantido seu espaço mundo afora há bastante tempo porque nossos artistas têm qualidade”, diz Anitta.

Ela é consciente de que esse fluxo não é algo que ocorre sem esforço. Assim como Thiago Endrigo, advogado especialista em direito autoral e direito de entretenimento e sócio da Elemess, empresa que atua no gerenciamento de carreira de artistas e projetos de música e marca. Ele cuida das carreiras — e da projeção internacional — de bandas como Far From Alaska e Ego Kill Talent.

“Não é automático. Depende de esforço e bastante trabalho. Houve um momento em que a música brasileira se vendia como algo exótico, etiquetada como 'world music'. Hoje, as bandas que eu represento e nomes como a Anitta e o DJ Alok, só para citar alguns que estão fazendo seu caminho lá fora, têm apostado em outra tática: uma música tipo exportação, por acaso feita aqui, mas com cara e sonoridade globais”, Endrigo afirma.

Também se inserem nessa nova lógica bandas que, já há alguns anos, têm rompido barreiras e feito barulho em diferentes países: Cansei de Ser Sexy, Boogarins, Bonde do Rolê são alguns dos exemplos. “Claro que a primeira coisa é ter algo relevante e bom para mostrar”, Endrigo esclarece.

André Bourgeois, empresário da cantora Céu, do cantor Chico César e da banda Bixiga 70, faz coro: “A música tem que ser boa e autêntica. Tem gente que se comunica para além da língua, só com a voz, como se fosse um instrumento. A Céu é assim. O Cansei de Ser Sexy e o Sepultura também foram lá brigar lá fora mas com brasilidade, com um sotaque daqui, o que é ótimo. Fazer trabalho ‘para gringo’ não é boa tática. Tem que fazer sentido aqui também.”

Fazer trabalho para gringo não é boa tática.”

André Bourgeois, empresário

Três nomes, três pegadas lá fora: a partir do alto, Anitta, DJ Alok e Céu.

Três nomes, três pegadas lá fora: a partir do alto, Anitta, DJ Alok e Céu.

A divulgação de Céu lá fora contou, no disco de estreia, em 2005, até com promoção da cadeia de cafeterias Starbucks nos EUA. Vale qualquer expediente, qualquer rede, para pescar o exigente público estrangeiro. “O grande desafio é construir parcerias internacionais. A grande ilusão do mundo hoje é pensar que um russo vai acessar o meu Facebook e eu vou estourar. É possível. Coisas podem acontecer. Mas não é o caminho normal”, diz Bourgeois.

Endrigo elenca alguns passos práticos na hora de se jogar no mundo: estudar os mercados onde se quer investir, saber que tipo de música pega mais por lá, quais as principais casas de shows, os selos e até os blogs de divulgação. Depois, é hora de frequentar feiras de música e se aproximar das delegações dos países onde se quer atuar, vender-se a agentes locais que possam mediar a entrada por lá.

O contato artista a artista, que funcionou, e muito, para o Autoramas fazer sua primeira turnê internacional, é um dos pontos altos. “O Far From Alaska fez parceria com o Dot Legacy, uma banda indie de Paris, que abriu as portas para a gente por lá. Como resultado, acabei trazendo-os para cá também, num caminho inverso. Os festivais e as feiras são ótimas oportunidades de fazer esse tipo de contato”, ensina Endrigo.

No caso do Autoramas, tudo fluiu positivamente. Eles conheceram num festival a banda japonesa Guitar Wolf, que bancou integralmente a turnê dos cariocas em terras nipônicas. “Foi muita sorte. Os caras abriram o mercado para a gente, ajudaram a agendar shows, shows de abertura”, explicou Gabriel Thomaz, um dos líderes da banda.

Paula Abreu, gerente de programação do SummerStage, festival que acontece nos EUA e que já deu chance a bandas nacionais, chancela a tática deles: “Participe de encontros para fazer contatos, tenha relação com pessoas da área, faça parceria com alguma banda local mais conhecida”, pontua.

É um caminho difícil, acidentado e cheio de incertezas. Portanto, é fundamental saber se é isso mesmo que se quer. “O mercado brasileiro é enorme, autossuficiente, o segundo mais fechado do mundo, se formos pensar na quantidade de coisas locais consumidas, só atrás do americano. É sedutor ficar por aqui mesmo”, pondera Endrigo. “Mas, se a ideia é partir para fora, as delícias são maiores que as dores. É um mercado enorme, global, não tão sujeito às chuvas e trovoadas que temos com frequência por aqui. Vai valer a pena.”

VEJA MAIS! Thiago Endrigo, David McLoughlin e Genildo Fonseca debatem estratégias de internacionalização durante a SIM São Paulo. ubc.vc/LiveSIM