Revista UBC #46

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PA RA LA MAS

As cinco razões que fazem desta banda uma das mais importantes da nossa música

PELO PAÍS O reivindicativo e original rap indígena

MERCADO Em busca da classe média musical

E MAIS Paulinho da Viola, Glória Groove, Luedji Luna, Mario Zan


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Mais uma vez, os direitos de compositores, intérpretes e músicos estão sob ameaça. Diga não ao PL 3.968/97!

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Com formato 100% virtual, o Prêmio UBC 2020 homenageou Herbert Vianna. ubc.vc/ documentarioherbert

Com enorme abrangência, o rádio ainda é um veículo fundamental para a música. ubc.vc/diaradio

TOPO DAS PARADAS 1º 14/08/2020 Câmara aprova regime de urgência do PL que prejudica a classe artística ubc.vc/urgenciapl

2° 14/09/2020 Estratégias para profissionais da música nas plataformas online ubc.vc/estrategiasredes

3° 01/10/2020 Prêmio UBC 2020 tem programação musical com curadoria de Liminha ubc.vc/programacaopremio


#46

NOVEMBRO 2020

RE VIS TA

A REVISTA UBC É UMA PUBLICAÇÃO DA UNIÃO BRASILEIRA DE COMPOSITORES, UMA SOCIEDADE SEM FINS LUCRATIVOS QUE TEM COMO OBJETIVOS A DEFESA E A DISTRIBUIÇÃO DOS RENDIMENTOS DE DIREITOS AUTORAIS E O DESENVOLVIMENTO CULTURAL.

Diretor executivo Marcelo Castello Branco Coordenação editorial Vanessa Schütt Projeto gráfico e diagramação Crama design estratégico Editor Alessandro Soler (MTB 26293) Textos Alessandro Soler (Madri), Eduardo Lemos (Londres), Fabiane Pereira (Rio de Janeiro), Kamille Viola (Rio de Janeiro), Ricardo Silva (São Paulo) Capa Mauricio Valladares Fotos Imagens cedidas pelos artistas. Créditos nas respectivas páginas, ao longo da edição. Rua do Rosário, 1/13º andar, Centro Rio de Janeiro - RJ, CEP: 20041-003 Tel.: (21) 2223-3233 atendimento@ubc.org.br

por_ Liminha

A sabedoria dessa turma é um verdadeiro case. Os Paralamas do Sucesso começaram num festival de rock. Nasceram turbinados, afiados, afinados, autenticados, autorais e com o radar ligado a mil — tudo que um artista precisa para deslanchar e fazer uma longa carreira.

EDITORIAL

Diretoria Paulo Sérgio Valle (Presidente) Antonio Cicero Erasmo Carlos Geraldo Vianna Manno Goes Marcelo Falcão Paula Lima

O encontro desses notáveis músicos, Herbert Vianna, João Barone e Bi Ribeiro, com o amigo e futuro empresário José Fortes resultou numa alquimia perfeita. A demo de uma música foi parar na playlist da lendária Rádio Fluminense e fez muito sucesso. Resultado: o faro fino de Jorge Davidson, diretor artístico da EMI, o fez botar a caneta para funcionar, contratando-os imediatamente. Gol! Com o faminto foguete pronto na plataforma, e mais algumas músicas de dois LPs bombando, o Rock in Rio, acertadamente, os recrutou em sua primeiríssima edição. Foi um divisor de águas, e os três leões pingados pisaram com a faca entre os dentes naquele fabuloso palco. Mostraram que seu som minimalista, na verdade, era gigante, muito maior do que se imaginava. E que não estavam lá de brincadeira. Não deu outra: arrebataram os corações de quem teve a sorte de vê-los naquele dia. Assim como o homem fincou uma bandeira na Lua, os Paralamas fincaram uma no Rock. É muito comum jovens formarem bandas. Mas, muitas vezes, afetados pelos egos e com pouca noção do patrimônio que pode estar suas mãos, acabam se desentendendo e se dissolvendo. Foi muito diferente com o Paralamas, uma banda de gente generosa, inteligente e sensível. Tá aí: uma carreira longeva, rica, bonita, criativa e cercada de prestígio. Há quase quatro décadas, esse gigantesco transatlântico cruza os mares da música, transportando energia, alegria, amor, paixões, reflexões, inspirações… Pelo jeito, tão cedo, este baile não vai parar.


PELO PAÍS: Rap indígena

22 34 38

30

42 DÚVIDA DO ASSOCIADO

Rádio

ARRECADAÇÃO E DISTRIBUIÇÃO:

33

MERCADO: Pesquisa ESPM/UBC

32

MERCADO: Classe média na música

30

FIQUE DE OLHO

22

NOTÍCIAS INTERNACIONAIS

NOVIDADES NACIONAIS

16

MEMÓRIA: Mario Zan

12

CAPA: Paralamas do Sucesso/Prêmio UBC

6

ENTREVISTA: Fernanda Abreu

5

JOGO RÁPIDO: Jonathan Ferr

ÍN DI CE 12 16

1 46

44

34


JOGO RÁPIDO

REVISTA UBC

5

Dois dedos de prosa sobre presente e futuro com o pianista de urban jazz, que assinou com gravadora ‘major’ e começa a trilhar um inesperado caminho pop por_ Alessandro Soler

de_ Madri

foto_ Caio Rosa

JONATHAN FERR

( ) Pianista de urban jazz com pegada afrofuturista. ( ) Representante da música preta produzida nas favelas. ( ) Artista contratado por grande gravadora que vai trilhando o caminho do mainstream pop. (x) Tudo isso junto. Num ano em que nada foi igual, Jonathan Ferr experimentou um salto na sua carreira e na sua projeção. Com single e clipe lançados, projetos para álbum e tempo e energia dedicados a um bonito trabalho social, ele comenta o que passou e o que espera de 2021, em entrevista à UBC por telefone. 2020 foi um ano de... Conexões internas profundas, principalmente. Fomos obrigados a nos conectar com a nossa essência. Para quem conseguiu perceber e fazer isso, acho que obteve uma evolução pessoal muito grande. Foi um ano para entender o que vale e o que não vale a pena, separar o joio do trigo. Do que mais se orgulha de ter feito? Participar do projeto Bora Espalhar Amor, ao lado da minha empresária, a Tânia Artur. Eu queria muito ajudar a comunidade da Congonha (Rio), onde nasci e cresci. As pessoas, durante a pandemia, estavam e estão em vulnerabilidade financeira total. Com a Tânia, levantei dinheiro para ajudar 34 famílias com cestas alimentícias muito robustas. Um presente para mim. E artisticamente? Assinar com a Som Livre. É um feito importante para um artista de música experimental, que faz uma variante de jazz muito improvável e fora da curva.

LEIA MAIS O clipe de “Te Assistir Sorrir”, canção de Ferr com a participação de quase 40 intérpretes ubc.vc/JFerr

2021 vai ser um ano de… Caminhos abertos, quebra de paradigmas, reconstrução. Tendo e quero achar que as pessoas começarão uma nova década e uma nova era pósCovid com novos hábitos, mais liberdade e menos amarras.


NOVIDADES NACIONAIS 6

por_ Kamille Viola

do_ Rio

SONHO DE

PAULINHO

GROOVE Gloria Groove lançou a faixa “A Tua Voz”, primeiro single de seu próximo trabalho, o EP audiovisual “Affair”, que terá cinco canções e um clipe para cada. A música é uma parceria da artista com o trio Dogs (Pablo Bispo, Sérgio Santos e Ruxell), autores de outros sucessos dela. “As cinco faixas representam, para mim, as cinco fases da paixão, e cada uma foi para um braço da sonoridade do R&B. O EP é mais sobre a relação com a minha própria cabeça e minha persona do que necessariamente sobre um relacionamento. Apesar de as músicas terem cunho romântico, passional, elas têm altos e baixos. Há músicas mais tóxicas, outras mais apaixonadas ou mais envolventes”, contou Gloria. VEJA MAIS O clipe de “A Tua Voz” ubc.vc/GloriaVoz

VEJA MAIS O ‘lyric video’ de “Ela Sabe Quem Eu Sou” ubc.vc/Paulinho

foto_ Marco Froner

5 FASES DE

Gravado ao vivo no Teatro Fecap (SP), entre outubro e novembro de 2006, e lançado só agora, “Sempre Se Pode Sonhar” reúne êxitos da longa e prolífica carreira de Paulinho da Viola, além de uma inédita, “Ela Sabe Quem Eu Sou”. Com direção musical do próprio Paulinho e direção geral de Homero Ferreira, o show de onde se extraíram as 22 canções que compõem o álbum foi um reencontro do mestre do samba com a capital paulista, depois de uma longa ausência. “Os anos se passaram e as transformações estruturais no mercado fonográfico colocaram em modo pause as carreiras discográficas de diversos nomes da música brasileira. Diante deste quadro, incerto, Paulinho manteve-se na estrada, com sua agenda de shows, observando a nova ordem se desenhar. Porém, o desejo de ver lançadas as gravações do Teatro da Fecap, pelas quais tinha tanto apreço, não deixou de existir”, escreveu o músico Charles Gavin, que assina o material de divulgação do disco, lançado agora em novembro, mesmo mês em que Paulinho comemora 78 anos de vida.


REVISTA UBC

7

ROGER DEFF: foto_ Clélia Miranda

NOVO COMBATE Em 2015, o rapper mineiro Roger Deff lançou a música “Pro Combate”, sua primeira música solo, depois de anos como integrante da banda Julgamento. Cinco anos e várias canções depois, ele solta a versão remix da faixa. Mais suingada, ela ganhou participação do DJ Hamilton Jr., produção do Poliphonicos e lyric video com animação de Dokttor Bhu. “Quis remixar essa faixa em versão soul justamente para reforçar a mensagem da luta antirracista. Inclusive o lyric video traz imagens de celebridades emblemáticas nessa questão racial (como Mano Brown, Leci Brandão, Ângela Davis e Toni Tornado)”, explica, lembrando que a versão original não está em plataformas de streaming. Deff prepara álbum para 2021, com o nome provisório de “Alegoria da Paisagem”. OUÇA MAIS As 12 faixas do álbum ubc.vc/Wado VEJA MAIS O clipe de “Pro Combate” ubc.vc/Combate

WADO,

Prestes a completar 20 anos de carreira solo, o cantor e compositor Wado, um catarinense radicado há décadas em Maceió, lança seu mais novo álbum, “A Beleza que Deriva do Mundo, Mas a Ele Escapa”. O trabalho traz 12 faixas, sendo que 11 delas contam com participações de outros artistas, com nomes como Otto (“Nanã”), Zeca Baleiro e Patrícia Ahmaral (“Depois do Fim“) e Cris Braun (“Para Anthony Bourdain”). “É um disco que tem um conceito radical de não ter instrumentos de ritmo, o que o deixa com essa aparência de vazios e espaços, mas muita coisa acontece sutilmente. A grande quantidade de autores e intérpretes soma a essa delicadeza, o disco seria menor sem essas pessoas. Adoro o encontro e sou fã de todos os que estão no álbum”, ele diz.

foto_ Maria Navarro

RITMO PRÓPRIO


NOVIDADES NACIONAIS 8

LUEDJI LUNA:

ÁFRICA-BAHIA Luedji Luna lançou “Bom Mesmo É Estar Debaixo D’Água”, seu segundo álbum. Com 12 músicas inéditas, o trabalho foi produzido pelo queniano Kato Change. Ela viajou para gravar no Quênia, depois foi para a Bahia rodar o filme que acompanha o disco, dirigido por Joyce Prado, que traz a narrativa visual de cinco faixas. A sonoridade é diferente do anterior, o bem-sucedido “Um Corpo no Mundo” (2017). Nas canções, as complexidades de viver a afetividade enquanto mulher negra. “A lógica do racismo é destituir nossa humanidade. Falar do amor enquanto mulher negra é reconstituir essa humanidade e também construir uma narrativa e um imaginário que é sistematicamente apagado”, disse Luedji ao site Universa. VEJA MAIS A versão visual do álbum, gravada na Bahia ubc.vc/Luedji

CHORARE

“Acabou Chorare” (1972), clássico álbum dos Novos Baianos, ganhou releitura com artistas de novas gerações pelo projeto Replay, lançado pela Som Livre. A série promete outras versões de discos antológicos da música brasileira. Nomes como Céu, João Cavalcanti, Letrux, Marcelo Jeneci, Maria Gadú, Xênia França e Francisco El Hombre participam. “É uma banda que é muito formadora de quem eu sou, como artista, como intérprete, como compositor, como um artista que pensa a relação entre uma música universal e a brasilidade”, comenta João Cavalcanti, que canta “Besta é Tu”. “Quando eu a gravei, o Moraes estava vivo, e ele se foi subitamente. Então, para todo mundo havia, no estúdio, esse impacto de saber que deveria estar ali. E isso foi sempre muito presente no processo todo”, conta.

DE NOVO

OUÇA MAIS “Replay Acabou Chorare” na íntegra ubc.vc/Chorare


REVISTA UBC

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AGORA, SIM,

foto_Sergio Zalis

OUÇA MAIS “As oito faixas de “Elisa” ubc.vc/ElisaF

ELISA

Depois de oito anos de shows pelo Rio de Janeiro e com alguns singles na bagagem, a cantora e compositora Elisa Fernandes lança seu álbum de estreia, “Elisa”. O álbum conta com oito faixas com produção musical, arranjos, bandolim e violões de Mário Wamser (exceto “Voltei”, com violão de Matheus Prevot, coautor da música, que também divide os vocais com Elisa nela), violoncelos de Federico Puppi e bateria de Gabriel Barreto. “Quando comecei a me apresentar, não imaginava entrar em estúdio e gravar um disco. Com o tempo, muita gente começou a questionar quando eu faria um, só que eu estava me descobrindo compositora, me entendendo como cantora, tinha pressa para viver todas as experiências possíveis, mas não exatamente a de gravar um disco. Hoje, tenho mais confiança no meu trabalho, sei as histórias que quero contar e os caminhos que quero trilhar”, diz.

GUILHERME ISNARD,

Guilherme Isnard, da banda Zero, lançou o single “Quando Esse Mal Passar”. Parceria com Elísio Neto, guitarrista do grupo, a música foi composta durante a pandemia. “A circunstância do confinamento foi uma experiência de pausa. A vida estava muito corrida, e, de repente, o mundo parou. Todos fomos forçados à internalização, o que é especialmente importante para os artistas. Tenho a convicção de que uma grande explosão criativa sobrevirá ao momento de introspecção”, afirma. Ele conta ainda que compôs diversas canções após seu divórcio, em 2018 – “Acumulei um baú que renderia um álbum triplo”, diz – e que pretende lançar no mercado europeu um trabalho voltado para o samba-canção, com cinco novas músicas feitas em parceria com Rildo Hora.

DE DENTRO PARA FORA

OUÇA MAIS O single “Quando Esse Mal Passar”ubc.vc/QEMP


NOVIDADES NACIONAIS 10

PRIMEIRA

J. VELLOSO,

Nascida no Rio de Janeiro e criada em Maceió, a cantora e compositora Flora lança seu primeiro álbum, “A Emocionante Fraqueza dos Fortes”. São nove composições próprias produzidas por Wado, além de uma releitura (“Sua Estupidez”, de Roberto Carlos, com produção de Dinho Zampier). “É um disco híbrido, que foi se construindo ao longo dos anos. Um processo bastante autobiográfico. Tinha uma vontade muito grande de usar a música como minha principal expressão artística e fui coletando coisas que eu havia escrito para transformar em canções”, comenta à UBC a cantora, que é filha dos artistas plásticos Delson Uchôa e Eva Le Campion, cresceu num ateliê de pintura, estudou teatro e cursa História da Arte.

O projeto J. Velloso e Recôncavo Experimental, que une o compositor, cantor e produtor e a banda, ambos de Santo Amaro (BA), soltou o terceiro single, “Iê, Saudade”. No trabalho, eles combinam elementos da música contemporânea e o samba chula (também conhecido como samba de roda), típico da região. “Sempre admirei a proposta do Recôncavo Experimental. Este projeto com eles propõe falar da tradição da minha terra de forma contextualizada, e isso muito me instiga. Nunca imaginei estar lidando com a tradição dessa forma tão particular como estamos fazendo, sem ferir a oralidade. É uma felicidade imensa falar sobre as coisas da nossa terra, através do som deles, tão visceral e atual”, comenta Velloso.

FLORADA

EXPERIMENTAL

OUÇA MAIS As dez faixas do disco ubc.vc/Flora

VEJA MAIS O lyric video de “Iê, Saudade” ubc.vc/Ie


REVISTA UBC

11

BIA FERREIRA,

FUTURISTA

JUBA:

ETHOS E TRADIÇÃO O cantor e compositor pernambucano Juba lança em 13 de novembro seu primeiro álbum solo, “Ethos”. “É o conjunto do que ando fazendo durante os anos em que venho trabalhando com música. São 11 faixas que apresentam lados doces, ácidos, angustiados e alegres. ‘Ethos’ é para ser escutado com calma, é um disco para ser saboreado sem a pressa do relógio”, comenta o artista, filho de Alceu Valença, cujo trabalho é um amálgama de gêneros do Nordeste. O primeiro single, “Coco das Flores”, com participação de Viola Luz, mestre do coco de Olinda, e do guitarrista Paulo Rafael (Alceu Valença e Ave Sangria), já saiu. “A música conta com um naipe de cordas, violas sertanejas e a linha melódica que faz esses cantos de aboio, típicos do Nordeste. É uma mistura de muitas coisas”, define Juba.

VEJA MAIS O clipe de “Coco das Flores” ubc.vc/Juba

Em comemoração ao primeiro aniversário do álbum “Igreja Lesbiteriana: o Chamado”, a cantora, compositora e multi-instrumentista Bia Ferreira lançou o clipe de “Boto Fé”, sua primeira faixa gravada em estúdio. O vídeo, de inspiração afrofuturista, mostra um futuro distópico em que os recursos naturais se esgotaram, e a Terra, que é comandada por robôs, foi tomada por lixo eletrônico. “Resolvi lançar o clipe dessa música neste momento porque foi só agora que eu tive condições financeiras para produzi-lo”, explica a cantora. “E acho que, neste momento do avanço do conservadorismo, dessa opressão religiosa, da teocracia, a gente precisa falar que a fé que a gente precisa ter é no ser humano, é na coletividade”, diz.

VEJA MAIS O clipe de “Boto Fé” ubc.vc/BiaF


PELO PAÍS

Kaê Guajajara

foto_Abimael Salinas

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REVISTA UBC

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RAP INDÍGENA

Povos originários se apropriam do som negro para denunciar racismo, genocídio, destruição da natureza e o apagamento da sua história por_ Kamille Viola

do_ Rio

Recorde de desmatamento na Amazônia e de queimadas no Pantanal, destruição do pouco que resta na Mata Atlântica, terras indígenas crescentemente ameaçadas. Vivendo em aldeias tradicionais ou em cidades, cada vez mais rappers indígenas abraçam o gênero musical que é uma principais expressões da cultura negra hoje no mundo, denunciando o racismo sofrido, o genocídio dos povos originários, os ataques à natureza e o apagamento da sua história. Nascida em Mirinzal (MA), Kaê Guajajara vivia com a família em terras não demarcadas, e, ainda na infância dela, por conta de conflitos com madeireiros, eles se mudaram para a Maré (Rio de Janeiro). Segundo o IBGE, 36,2% dos indígenas vivem longe das aldeias onde nasceram. Foi na favela carioca que ela teve contato com o gênero musical e integrou um coletivo de rap, Crônicos, que tinha negros angolanos e brasileiros em sua formação. “Na Maré, eu tinha muitas referências no rap, os meus amigos me levavam a rodas de rima, de dança, as várias culturas que se juntavam no hip hop”, lembra ela, que hoje vive com a filha e o companheiro na comunidade.


PELO PAÍS 14

Em suas músicas, Kaê fala sobre situações vividas por indígenas em contexto urbano, entre outros temas. Já em carreira solo, em agosto de 2019, lançou seu primeiro EP, “Hapohu”. No início do ano, foi a vez do EP “Uzaw”. Em setembro, ela soltou o terceiro da trilogia: “Wiramiri”. Em suas músicas, mistura o português à sua língua materna, o Ze’egete. “A identificação de indígenas com o rap vem por ser um movimento de um grupo que precisa se expressar, contando as suas lutas do dia a dia, falando das suas vivências, sejam na aldeia ou na favela”, analisa. Werá Jeguaka Mirim, o Kunumi MC, cresceu na aldeia Krukutu, no bairro rural de Parelheiros, em São Paulo, com cerca de 500 habitantes, onde ainda vive com a mulher e o filho. Seu nome artístico é a palavra em guarani que deu origem a “curumim” em português. Filho de um dos primeiros escritores indígenas a publicar um livro, Olívio Jekupé, ainda criança começou a escrever e tem dois livros publicados: “Kunumi Guarani” e “Contos dos Curumins Guaranis” (que assina com o irmão, Tupã Mirim). Gravou dois discos, “My Blood is Red” (2017) e “Todo Dia é Dia de Índio” (2018). Ao lado de Criolo, gravou “Terra, Ar, Mar”, em 2019. Em maio passado, lançou o vídeo “Xondaro Ka’aguy Reguá (Forest Warrior)”. “Já é difícil ser um índio no Brasil, em todo lugar. Mais difícil quando se é um artista indígena”, diz Kunumi. “Mas o importante para nós é levar aos poucos a nossa mensagem ao mundo todo, falar que a gente tem direito de ser ouvido, que a gente sofre e que está lutando por uma causa que vale para todos: preservar a natureza.”

Embora sua música tenha influência do rap e do funk, que cresceu ouvindo, em seu EP mais recente Kae trouxe uma sonoridade mais pop. Ela diz que não gosta de se prender a rótulos e que ainda está em busca de uma sonoridade única. “Já passei por tantos estilos que nem tenho como definir. Para 2021, pretendo lançar um álbum que vai falar bastante sobre a Kaê como artista na música”, adianta ela, que elogia os trabalhos dos rappers Brisa Flow e Wescritor, com quem fez um feat em seu EP mais recente, na faixa “Vênus em Câncer”, ao lado de Nelson D.

Cantando em guarani e em português, ele combina elementos como reggaeton e violino indígena com o rap. Conta que foi o irmão quem lhe apresentou o estilo musical. “O povo negro criou o rap, que usa para se defender, e a gente pegou emprestado para fazer da mesma forma: se defender, lutar espirutalmente contra o sistema. O rap é um sentimento, é um desabafo que a gente faz também. Fico muito feliz por ter essa união”, comemora.

ANO DIFÍCIL PARA A CAUSA Até aqui, 2020 tem sido um ano muito difícil para a causa indígena e a natureza no Brasil. Em abril, uma mudança na Funai derivou na permissão de ocupação e até de venda de mais de 200 terras indígenas pendentes de homologação. Em julho, houve um crescimento de 76% no número de incêndios ilegais em territórios indígenas em relação ao ano passado. A área desmatada na Amazônia Legal foi de 10.129 km² (o equivalente a metade do Estado de Sergipe) entre agosto de 2018 e julho de 2019, de acordo com dados oficiais do Inpe. O Pantanal também sofre, com 20 mil dos 194 mil focos de incêndio registrados no Brasil de janeiro a outubro. Segundo o Ibama, mais de 90% dos incêndios na região foram ilegais.

OUÇA MAIS As seis canções de “Wiramiri”, de Kaê Guajajara ubc.vc/KaeG

VEJA MAIS O clipe de “Xondaro Ka’aguy Reguá (Forest Warrior)”, de Kunumi MC ubc.vc/KMC


REVISTA UBC

foto_Aruan Viola

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Kunumi MC


ENTREVISTA 16

FER NAN DA


REVISTA UBC

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Aos 30 anos de carreira solo – e 30 de filiação à Ehendist descium estrumenit dolupta nimpore ex et et oditatquia UBC –, cantora e compositora revisita obra, faz quo quiberore quunt, optaernatus ab inusape suntsua eiusam velibusda quias planos para a retomada do mercadoviduscid musical eeumquati fala doluptatem volore perum estruptat.utem ulparias rectatiis sit quiamendicta sim alibus, ut omnim sitatur sima sobre criação e gestão de carreira quia cum hicae verspere velloreces nobissit, sapid qui reiunt int ulparit por_ Alessandro Soler

de_ Madri

iberis ad min consed maximolorem aut quibus exerchillab iliquidest, fotos_ Alexandre Calladinni

Fernanda Abreu começou 2020 com energia de festa. Supunha que seria um período de celebração por seus 30 anos de carreira solo. Em 1990, “SLA Radical Dance Disco Club” marcou o início de uma trajetória que inclui sete álbuns de estúdio, vários de

sequamuEptatio. Nam sitiore mais struntem reflexivas.vollatur Apesar ad de ma que,nullecere de um ponto el il ipsunt escimusciet praturerore nonet optis nobit licietoaut de vista exclusivamente pessoal, que rolou dolorporatet auda enectomesmo voluptaeped quas non nos veriorrovit foi umaeatem enorme aceleração. Eu tenho iuntiunt escimusciet pratureunt escimusciet praturebus. trabalhado muito mais, da hora em que acordo até as 2h da manhã”, diz. Cab iunditestion eserum volescilles at facerum, que di berisquos endel ilis nonsed quae nimusci ium ducit et officidisaium que pratio blaut re Novas composições, (esperada) retomada mini dolorrovidit re, sus, de officaborrum. 2021, reflexões sobre criação e carreira aparecem na conversa com a compositora e cantora, cujo ano de filiação à UBC, como consta da ficha de inscrição, coincide com sua estreia na aventura solo: 1990. “A celebração foi só adiada, não cancelada”, ela promete.

TENHO TRABALHADO DA HORA EM QUE ACORDO ATÉ AS 2H DA MANHÃ.”

remixes, mais de 20 singles, um sem-número Ehendist descium estrumenit dolupta nimpore ex et et oditatquia de parcerias e um lugar desunt destaque eiusamna velibusda quo quiberore quunt, optaernatus ab inusape história da música de pista feita no Brasil. viduscid quias eumquati doluptatem volore perum estruptat.utem “Preparei uma série de ações. Em março, ulparias rectatiis sit quiamendicta sim alibus, ut omnim sitatur sima Lasdae dent id ut esum single lancei ‘Do Bem’, quecum fiz com Pedro quia hicae verspere velloreces nobissit, sapid qui reiunt int ulparit paritatioam re sum cum Luís, uma homenagem ao (Jorge) Ben Jor. iberis ad min consed maximolorem aut quibus exerchillab iliquidest, aut laut dendandus qdui quamend anihil Depois, na sequência, viriam a turnê dos 30Nam sitiore struntem vollatur ad ma nullecere sequamuEptatio. ra inllllarnpudigni anos, mais projetos dançantes, exposição... el il ipsunt escimusciet praturerore nonet optis nobit liciet aut scipsam, volorep taectata Tivemos que abortar ela conta, em dolorporatet auda enecto voluptaeped eatem quas non nos veriorrovit comniatist, si ut excerum a missão”, utempore nemq.Vent entrevista à UBC por meio de um aplicativo iuntunt escimusntde escimusciet pratureunt escimusciet pratureibus. verovid quisinc iment. videorreuniões. uoditinum quidelessequat. id euempore nempore. Cab iunditestion eserum volescilles at facerum, que di berisquos endel Longe de paralisar por completo seusquae planos, ilis nonsed nimusci ium ducit et officidis ium que pratio blaut re a pandemia lhe aportou insights. O momento mini dolorrovidit re, sus, officaborrum. mais ensimesmado a levou a revisitar a própria obra com uma pegada igualmente contemplativa. Assim, veio “Slow Dance”, no qual apresenta 17 baladas que lançou nestas três décadas. “É um projeto que foi pensado para esse período em que as pessoas estão


ENTREVISTA 18

Como o confinamento provocado pela pandemia afetou os planos para as comemorações? No mesmo dia em que começou o confinamento, sexta-feira, 13 de março, eu teria a gravação do DVD do show “Amor Geral” no Imperator (Zona Norte do Rio). Seria uma das coisas que programei para este ano. O público teve que voltar da porta, não pôde entrar. Foi bem chato. Mas já tínhamos todo o circo armado, tudo produzido. Mantivemos o show, de portas fechadas, e foi o embrião de uma live também. Batizei de “Amor Geral A(Live)”. O material ficou maravilhoso e serve como o registro de um ano tão peculiar. Em 2050 ou 2100, 2020 será lembrado como o “ano da pandemia”, como 1918 até hoje é associado à gripe espanhola. Além disso, eu queria muito homenagear a cena em que estourei em carreira solo. Então, agora, chamei o Memê, que é meu amigo, e fizemos este álbum, que está pronto, com a participação do Gui Boratto, do Tropkillaz, do Ruxell... Tem Emicida, tem Projota, Dennis DJ... São 13 remixes inéditos. A ideia é esperar um pouco. Primeiro vem o DVD, talvez no iniciozinho de dezembro, e deixamos o “30 anos” para o verão, com, tomara, algo já aberto, outro clima, uma retomada mesmo. A ideia é lançar uma por semana, às sextas, numa pegada alto-astral. Há novas composições nos planos? Tenho bases, batidas que me mandam, textos escritos, algumas letras... Com tanta coisa, não tenho

tido tempo para focar na produção de um álbum de inéditas. Mas quero fazer. Não quero fazer só singles. Outro projeto que está engatilhado, e que não quero abortar, é um álbum chamado “Garotas Sangue Bom”, de parcerias minhas com mulheres incríveis e talentosas. Pegaríamos alguns tópicos, alguns temas de canções minhas, e faríamos coisas novas. Falei com Anitta, Ludmilla, Jade Baraldo, Letrux, Alice Caymmi, Duda Brack, Céu, Karol Conka... Senti uma grande abertura, um carinho, da parte delas para fazer esse projeto comigo.

DECIDI, JÁ HÁ ALGUM TEMPO, SER A GESTORA DA MINHA CARREIRA.” Quem pensa esses projetos todos? Você gere tudo, administra tudo? Eu tenho uma equipe, mas decidi, já há algum tempo, ser a gestora da minha carreira. Eu tenho um selo, o Garota Sangue Bom, com o qual tenho lançado meus últimos projetos. Agora fizemos um acordo de distribuição com a Universal, mas são projetos meus, pensados por mim. Tem uma coisa que sempre me ajudou muito, que foi o balé. Te dá uma disciplina fenomenal. É preciso ter muita humildade diante da arte. Quando eu vivi todo aquele sucesso da Blitz, era claro na minha cabeça que eu estava tendo uma oportunidade e deveria aproveitá-la para mostrar o


REVISTA UBC

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meu trabalho. O Evandro (Mesquita) foi muito generoso, ele pôs a Márcia (Bulcão) e a mim na linha de frente. Quando aquilo acabou, as pessoas insistiam: “Fernanda, aproveite este momento, lance logo algo, não deixe as pessoas esquecerem você.” E eu não quis. Por quê? Eu não tinha repertório. Que Fernanda é essa que eu mostraria? Fui buscar quem eu realmente era: a menina que ficava em frente ao espelho imitando Toni Tornado, Michael Jackson... Demorei três anos para maturar a minha persona. Tive calma para encarar a minha carreira solo. E, se tenho um conselho para dar a quem quer se mostrar, é esse: construa uma carreira consistente. O resultado é que estou celebrando 30 anos de carreira solo no pop.


ENTREVISTA

REVISTA UBC

Fernanda em diferentes momentos da sua carreira: símbolo da música de pista nos anos 90 e 2000

foto_Flávio Colker

E o que significa essa marca para você? Uma sensação prazerosa de conquista. Sou zero ligada a bens materiais. Me refiro a uma conquista afetiva, de dever cumprido, de realização. Não me envergonho de nada, de nenhum disco, de nenhum single, de nenhuma entrevista. Estou ok comigo mesma em relação aos erros e acertos. Celebrar estes 30 anos também serve para mostrar às novas gerações, sobretudo de meninas maravilhosas que estão produzindo agora, que há fôlego para ter uma carreira longeva. Basta estar sempre aberta a se reinventar e pronta para se desafiar.

foto_Marcos Issa/Argosfoto

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foto_Murilo Alvesso

foto_Alexandre Calladinni

ESTOU OK COMIGO MESMA EM RELAÇÃO AOS ERROS E ACERTOS.”

OUÇA MAIS As canções de ‘Slow Dance’ ubc.vc/FAbreu


PELO PAÍS

REVISTA UBC

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“TUDO QUE EU VEJO, TOCO, SINTO, FALO E PENSO É MÚSICA” Edi Rock, um dos fundadores do Racionais MC’s, lança seu quarto disco solo, em que volta às suas origens e mergulha no rap em suas várias vertentes por_ Kamille Viola

do_ Rio

foto_ Leonardo Muniz

Política, racismo, situações autobiográficas: são muitas os temas que orbitam o universo de Edi Rock, um dos fundadores do Racionais MC’s e que lança seu quarto disco solo, “Origens Parte 2 — Ontem, Hoje e Amanhã”. Em 15 faixas, com participações de Jorge Du Peixe, Nação Zumbi, Thiaguinho, MV Bill, Daniel Quirino, MC Sombra, Flacko e vários outros, ele retoma suas origens, depois do passeio por diferentes gêneros em trabalhos anteriores. Agora, quem domina são o rap e suas várias vertentes. “A de ontem, a de hoje e a que as pessoas ainda vão entender”, define, em entrevista à UBC. “Tudo que eu vejo, toco, sinto, falo e penso é música. Então, tudo me inspira. Tudo, desde quando eu acordo até a hora em que vou dormir.” No melhor espírito do rapper cronista que leva experiências suas e alheias para a arte, ele presta atenção a tudo ao redor e sintetiza suas impressões nas letras. “Além disso, e eu estou sempre ouvindo música. Ela é meio que um diário, é uma crônica do dia a dia.”

OUÇA MAIS As 15 músicas do álbum ubc.vc/EdiRock

O isolamento da pandemia também aportou para a elaboração do disco. “Eu consegui me concentrar. Tenho que levantar as mãos para o céu, porque não foi fácil para os músicos trabalharem, vários não conseguiram. Eu tive sorte, fui abençoado. Então é isso, tem que aproveitar a inspiração, e eu fui para cima. O tempo passa rápido, e eu tenho que trabalhar, colocar a obra na rua.”


CAPA 22

‘


REVISTA UBC

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POP REGGAE ROCK

A banda que, de tão especial no contexto musical brasileiro, é quase um gênero em si mesma se aproxima dos 40 anos com uma interminável lista de hits e seu líder, Herbert Vianna, homenageado com o Prêmio UBC 2020 por_ Eduardo Lemos

PA RA LA MAS

de_ Londres

Em 4 de fevereiro de 2001, Herbert Vianna sofreu um acidente que o deixou paraplégico e vitimou sua esposa, Lucy. Naquele momento, à incerteza sobre como seria a sua recuperação, somava-se a dúvida de se os Paralamas poderiam retomar a carreira. As respostas foram positivas nos dois sentidos: Herbert conseguiu tocar a vida adiante apesar das sequelas que o acidente lhe trouxe, e a banda subiu aos palcos menos de dois anos depois.

fotos_ Mauricio Valladares

Há quase 40 anos nascia uma parceria longeva que marcaria a história recente da música brasileira. Integrado por Herbert Vianna — Prêmio UBC 2020 pelo conjunto da sua obra —, Bi Ribeiro e João Barone, o grupo Os Paralamas do Sucesso rapidamente mexeu com a cena rock que dominava o Brasil de 1982. Distanciando-se das amarras do gênero, eles partiram em busca de seu próprio sotaque sonoro e poético e, assim, modernizaram e ampliaram a ideia do que é ser uma banda no Brasil. Em sua discografia, os Paralamas alternam momentos de experimentação — como se escuta em “Selvagem?” (1986), “Os Grãos” (1991) e “Severino” (1994) — e trabalhos de perfeita construção pop, casos de “O Passo do Lui” (1984) e “Nove Luas” (1996). São também marcantes a conquista da América Latina nos anos 90 e a continuidade da carreira mesmo após o acidente de Herbert, em 2001. Ao se falar de arte, os critérios de avaliação podem ser subjetivos. Mas, especialmente na música, é possível observar que os nomes que causaram grande impacto têm, pelo menos, cinco pontos em comum: popularidade, potência, inventividade, capacidade de influenciar e longevidade. E todos eles se verificam facilmente na obra dos Paralamas.


CAPA 24

1. PO PULA RIDADE “Vital e sua Moto”, “Cinema Mudo”, “Óculos”, “Meu Erro”, “Fui Eu”, “Romance Ideal”, “Ska”, “Mensagem de Amor”, “Me Liga”, “Assaltaram a Gramática”, “Alagados”, “A Novidade”, “Melô do Marinheiro”, “Selvagem”, “O Beco”, “Uns Dias”, “Quase um Segundo”, “Perplexo”, “Lanterna dos Afogados”, “Caleidoscópio”, “Tendo a Lua”, “Trac-Trac”, “Vamo Batê Lata”, “Uma Brasileira”, “Saber Amar”, “Luiz Inácio”, “Lourinha Bombril”, “La Bella Luna”, “Busca Vida”, “O Amor Não Sabe Esperar”, “Ela Disse Adeus”, “Aonde Quer Que Eu Vá”, “O Calibre”, “Seguindo Estrelas”, “Cuide Bem do Seu Amor”, “Na Pista”, “De Perto”, “Meu Sonho”, “Mormaço”, “Sinais do Sim”. Essas são 40 músicas que estouraram em interpretações dos Paralamas, a maioria composta por eles ou em parcerias com outros. Seja quando aborda temas políticos, seja quando reflete sobre a existência humana ou as relações amorosas, a obra da banda é, sobretudo, uma obra popular. “As músicas deles nunca serão datadas. Têm uma poesia muito inteligente e, ao mesmo tempo, muito comunicativa”, elogia a cantora e compositora Fernanda Abreu.


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Skank, O Rappa, Nação Zumbi, Pato Fu, Los Hermanos, Pitty, Maria Gadú, Lucas Santtana, Ana Cañas, Maglore, Vitrola Sintética… É longa a lista de artistas que vieram depois dos Paralamas e já assumiram a influência do grupo em suas produções. As razões são diversas: uns citam a mistura da música brasileira com outras sonoridades; outros mencionam a capacidade de Herbert de compor canções atemporais; e há os que se inspiram no respeito ao público e na perseverança do grupo em continuar fazendo música juntos mesmo depois de 38 anos.

2. PO TÊN CIA Uma das marcas do trabalho dos Paralamas é a qualidade do material apresentado, em qualquer fase destes quase 40 anos de carreira. Pegue-se, por exemplo, a primeira música (“Vital e Sua Moto”) do primeiro disco (“Cinema Mudo”, de 1983). A história de um sonho juvenil (e dos percalços para atingi-lo) é contada com leveza e embalada em um arranjo entusiasmante. O cantor e compositor carioca Rubel, um dos nomes mais populares da chamada nova MPB, só nasceria na década seguinte, em 1991. “Vital” lhe chegou aos ouvidos na adolescência e abriu a sua cabeça. “Eu lembro de escutar essa música e pensar: mas pode fazer isso? Uma música sobre um cara chamado Vital? E a moto dele? E ainda por cima chamar a música de ‘Vital e sua Moto’? É tudo tão simples e direto e certeiro e divertido e sagaz e popular ao mesmo tempo”.

3. CAPA CIDADE DE INFLUEN CIAR


CAPA 26

4. INVEN TIVI DADE Artisticamente, Herbert e os Paralamas foram revolucionários em ao menos dois momentos: no primeiro, em 1986, eles deixaram de lado as influências do rock inglês e passaram a olhar para as produções jamaicana, africana e brasileira. Um desvio de rota — inesperado pelo mercado e até criticado por companheiros de geração — que culminaria no terceiro disco do grupo, “Selvagem?”, com o trio assumindo influências regionais, abrindo diálogo com expressões musicais do Terceiro Mundo e propondo uma nova estética para a música feita no Brasil. A presença de Gilberto Gil nos vocais de “Alagados” e na letra de “A Novidade” simboliza a queda do muro que separava o rock brasileiro da MPB. Aquele era o primeiro ano pós redemocratização do país, e esta história seria diferente se Herbert Vianna não percebesse o esgotamento dos temas juvenis e passasse a olhar para o que estava acontecendo ao seu lado. “Todos os dias, indo para a universidade, eu cruzava a Favela da Maré e via a batalha, o despertar, ou o não dormir, das pessoas. Quando li a biografia do Bob Marley, descobri que ele havia nascido numa favela da Jamaica chamada Trenchtown. O que eu tentei fazer foi deduzir como é o despertar das pessoas que vivem nestas condições e que têm tantas portas fechadas pela sociedade”, explica ele, sobre a letra de “Alagados”. A segunda revolução veio na virada da década de 80 para 90, quando os Paralamas empreenderam uma carreira de sucesso na América Latina, chegando a fazer mais shows fora do que no Brasil. Nenhuma banda brasileira, até ali, havia se inserido tão fortemente na cultura de países como Argentina, Chile e Venezuela.


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5. LON GEVI DADE Das bandas que surgiram nos anos 80 e continuam ativas, os Paralamas são a única que mantém a mesma formação. “O Herbert é um cara superdotado em matéria de música e composição. E ele sempre foi muito generoso no contexto da banda, confiando na gente para dar um caráter coletivo às composições. Talvez essa seja a grande mágica das bandas que duram tanto tempo e que funcionam bem”, diz João Barone. “Desde o acidente, só o ajudamos emprestando a nossa memória em coisas que, às vezes, ele confunde. Ou ajudando-o a descobrir qual é a atmosfera musical que a letra está inspirando. Passou a ser um desafio muito legal, algo que lembra o que já acontecia de uma maneira mais subliminar.” “O Herbert compõe letras sem parar, e a gente fica tentando dar forma a elas. Nós nos encontramos sem compromisso, e cada um leva o que pensou em casa, vai juntando, até chegar a alguma ideia que seja interessante para nós três”, descreveu Bi, em entrevista de 2013.

LEIA MAIS No site da UBC, todas as homenagens a Herbert pelo Prêmio UBC 2020 ubc.vc/PremioUBC2020

“O episódio da superação do acidente é uma coisa extraordinária, ver como a música se preservou completamente na pessoa e na personalidade dele. Herbert voltou com tudo intacto: o elã, o entusiasmo musical, tudo isso ficou nele. É um fenômeno muito impressionante”, observa Gilberto Gil, que tem uma relação mútua de admiração com o grupo.


CAPA

Edição totalmente virtual da premiação destaca obra ímpar do compositor e dos Paralamas do_ Rio

foto_ José Fortes


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LIVES, EXPOSIÇÃO DE FOTOS E DOCUMENTÁRIO NA HOMENAGEM A HERBERT

Num ano marcado por uma pandemia, o Prêmio UBC 2020 teve uma edição diferente e especial, com uma série de atividades on-line espalhadas por vários dias, uma homenagem não só ao ganhador do troféu deste ano pelo conjunto da sua obra, Herbert Vianna, mas também a todos os compositores. Uma série de lives especiais, com curadoria de Liminha e apresentação da VJ e apresentadora Sarah Oliveira, teve excelentes depoimentos de Fernanda Abreu, Aloysio Reis, Roberto Berliner, João Barone e do próprio Liminha. Tudo ainda disponível no perfil da UBC no Instagram. Além disso, o canal da UBC no YouTube teve a estreia de um documentário especial sobre Herbert, e, no nosso site, uma exposição de fotos da trajetória de Herbert e dos Paralamas, feitas por Maurício Valladares, ainda pode ser vista. Presidente da associação, Paulo Sérgio Valle elogia a entrega a Herbert Vianna do Prêmio UBC, que, desde a sua retomada, em 2017, já homenageou Gilberto Gil, Erasmo Carlos e Milton Nascimento. “O Prêmio UBC 2020 é, muito merecidamente, de Herbert Vianna, um compositor que todo o Brasil admira. Consegue ser sofisticado e popular ao mesmo tempo. Pelo conjunto de sua obra e cada música individualmente, faz jus ao prêmio deste ano.” Marcelo Castello Branco, diretor-executivo da associação, faz coro: “Herbert sempre foi um músico prodigioso, um autor que traduz as relações humanas de forma carinhosamente voraz, além de sempre retratar nossa realidade política com olhar atento e crítico. É uma honra para a UBC poder homenageá-lo.”

O artista recebe o troféu em casa: reconhecimento pelo conjunto de uma longa e frutífera carreira

VEJA MAIS No canal da UBC no YouTube, um documentário-homenagem a Herbert ubc.vc/DocHerbert

LEIA MAIS Grandes personagens da música nacional comentam a obra do compositor ubc.vc/Herbert


MEMÓRIA 30

O SÉCULO DE

MARIO


REVISTA UBC

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Nascido na Itália em 1920, mítico acordeonista que é um dos autores da música mais tocada nas Festas Juninas esteve presente em momentos-chave da indústria musical; agora, sua família sonha com um museu para ele por_ Ricardo Silva

de_ São Paulo

A história de Mario Zan não caberia nem num só livro; tarefa duríssima tentar resumi-la numa reportagem de revista. Nascido há cem anos, em 9 de outubro de 1920, no Norte da Itália, o mítico acordeonista e compositor, um dos autores da música mais executada no período junino – “Festa na Roça” –, do hino do Quarto Centenário de São Paulo e de outras mil composições, algumas gravadas em outros países, veio pequeno com os pais para o Brasil, onde desbravou o então imenso e quase inexplorado interior do Centro-Sul da década de 1930. Em suas andanças país afora, coincidiu com os irmãos indigenistas Villas-Bôas, foi próximo de um presidente paraguaio (Higinio Morínigo), foi o primeiro artista a se apresentar para os peões que construíam a futura capital, Brasília, participou da sedimentação da cena do rádio e da indústria fonográfica em São Paulo, fez carreira e fama no Cassino da Urca e ajudou a difundir no Rio sonoridades que seriam o embrião de um gênero dominante décadas depois: o sertanejo.

Trata-se de uma saga que, relembrada por seus descendentes, torna Zan uma espécie de Forrest Gump da música nacional: um personagem que esteve presente em momentos-chave desta arte no século XX. Inclusive, na criação da UBC, à qual se filiou logo no início, contribuindo para o fortalecimento da gestão coletiva de direitos autorais no Brasil. “Foi um artista pioneiro ao montar a própria editora, em 1956, para representar seus interesses. Ele acreditava que os autores deveriam ter voz e poder de decisão”, descreve seu filho Osmar Zan, ele próprio um produtor e músico com longa trajetória em editoras e selos. Para celebrar o centenário de Zan, morto em 2006, a família trabalha pela criação de um museu sobre a obra dele. Seria a ampliação de uma casa de cultura que abriga parte do acervo do artista, na Vila Ipiranga, em São Paulo. “Meu avô tinha um dom social como poucos. As viagens que fez pelo país lhe permitiram conhecer muitos gêneros, que se refletiram nas criações deles, variadíssimas. Era um grande artista e, principalmente, uma grande pessoa”, diz o neto Marcelo.

Mario Zan em três momentos: ás da sanfona, foi também produtor, compositor prolífico e um grande estimulador de talentos da música, com selo próprio e interesse por diversos gêneros

VEJA MAIS Em vídeo, Mario Zan toca “Festa na Roça” ubc.vc/ZanRoça


NOTÍCIAS INTERNACIONAIS 32

REVISTA UBC

de_ Madri

MÚSICA ARRECADA € 8,9 BI EM DIREITOS AUTORAIS

LEIA MAIS Mais dados do levantamento e o relatório na íntegra ubc.vc/Cisac2020

A música arrecadou € 8,9 bilhões em direitos autorais em 2019, alta de 8,4% em relação a 2018. E o Brasil, mais uma vez, integrou o top 10 dos maiores mercados, com o equivalente a € 185 milhões arrecadados pelas sociedades de gestão coletiva locais. As informações são do “Relatório Sobre as Arrecadações 2020” da Cisac, que prevê: a crise da Covid-19 impactará seriamente as indústrias criativas em 2020 e 2021. São esperadas diminuições de 10% a 40% nos valores arrecadados e distribuídos aos titulares de direitos, a depender do país e do setor envolvido, com quedas de até 80% no caso das apresentações ao vivo.

EUA:

O POVO CONTRA A TWITCH Uma das plataformas digitais que mais crescem, a Twitch, propriedade da gigante Amazon, está na mira de players do mercado americano. Entidades como RIAA, Artists Rights Alliance, Music Managers Forums US e SoundExchange, entre outras, escreveram uma carta pública a Jeff Bezos, principal acionista da Amazon, queixando-se da contumaz violação de conteúdos musicais protegidos “estimulada pela Twitch”. A plataforma ainda não tem acordos de licenciamento e, recentemente, lançou uma ferramenta, Soundtrack, para que os usuários usem músicas nos seus vídeos. Como não há acordos para pagamento de direitos autorais pelo aplicativo, as entidades chamam a iniciativa de pirataria.

LEIA MAIS Estratégias para criadores de música na Twitch ubc.vc/Estrategias

SPOTIFY,

NA MIRA DOS AUTORES

Também nos EUA, a entidade de classe dos músicos e trabalhadores do setor UMAW lançou a iniciativa “Justice at Spotify” (Justiça no Spofity), uma campanha que, entre outras coisas, pede uma remuneração de pelo menos um centavo por stream, a revelação dos termos dos contratos da gigante do streaming com gravadoras e selos e mais transparência. Além disso, a UMAW denunciou a existência de jabá (músicas mais bem-posicionadas nas listas mediante pagamento por parte de produtores e gravadoras) e exigiu que a equipe técnica das faixas esteja nos créditos. O Spotify não respondeu.


FIQUE DE OLHO

REVISTA UBC

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do_ Rio

COVID IMPACTA

DISTRIBUIÇÃO A LONGO PRAZO A distribuição de outubro trouxe vários dados que refletem a esperada queda na arrecadação de direitos de execução pública por conta da pandemia. A queda mais elevada foi a de música ao vivo: -89,07% em relação ao que havia sido orçado a partir dos valores de anos anteriores. Foi distribuído pouco mais de R$ 1 milhão, contra os R$ 9,7 milhões previstos. Casas de festas e diversão (-75,74%, ou R$ 2,7 milhões) e shows (-71,79%, R$ 2,1 milhões, ante uma previsão de R$ 7,5 milhões) vieram em seguida.

PL QUE PREJUDICA ARTISTAS

RECURSOS DA LEI ALDIR BLANC

TRAMITA EM URGÊNCIA

EM MARCHA LENTA

Apesar do apelo da classe artística, a Câmara dos Deputados aprovou no dia 13 de agosto o regime de urgência para a tramitação do Projeto de Lei 3968/97, que suspende o pagamento de direito autorais para órgãos públicos e entidades filantrópicas e pode ser votado a qualquer momento.

A lei Aldir Blanc (14.017/20) continua longe de cumprir seu propósito, concebido pelo Congresso: ajudar a classe artística a enfrentar os efeitos daninhos da pandemia sobre a atividade econômica e produtiva. Um levantamento da UBC no final de setembro mostrou que só R$ 1,6 bilhão dos R$ 3 bilhões do Fundo Nacional de Cultura (FNC) havia sido repassado pela União a estados e municípios, responsáveis pela distribuição dos recursos. O prazo termina em 31 de dezembro.

A tendência é de que os próximos meses também sejam de fortes quedas, principalmente em shows.

LEIA MAIS No site da UBC, mais informações sobre a queda na distribuição ubc.vc/Queda

LEIA MAIS As perguntas e respostas sobre o projeto ubc.vc/PL3968

LEIA MAIS Quanto cada estado receberá segundo a lei ubc.vc/AtrasoAB


MERCADO 34

EXISTE

CLASSE MÉDIA NA MÚSICA? Dados de distribuição de direitos de execução pública mostram que minoria concentra a maior parte dos rendimentos; pesquisador e músico analisam a situação e debatem saídas por_ Fabiane Pereira

do_ Rio


REVISTA UBC

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Este ano ficará marcado como um dos períodos de maior redução nos rendimentos com execução pública musical. A paralisia dos shows e eventos ao vivo, além do impacto da pandemia sobre as receitas publicitárias de televisões, rádios e outros usuários, vão tirar muitos milhões de reais do bolso dos titulares. Independentemente desse cenário, a execução pública, apesar de ser reconhecidamente um terreno de sucesso internacional do Brasil, com um pujante sistema de gestão coletiva, é também uma área que reflete as desigualdades inerentes do negócio musical. Uma grande maioria de titulares recebe valores simbólicos, com o topo da pirâmide ocupado por poucos artistas. O que fazer para mudar este quadro? É o que fomos perguntar a um músico e um pesquisador muito envolvidos nesta questão, depois de analisar os números da base de dados da UBC sobre execução pública, que você confere no quadro a seguir:


MERCADO 36

67,03%

25,85%

dos mais de 20 mil titulares ativos da UBC tĂŞm rendimentos de entre um centavo e R$ 50 por mĂŞs.

recebem entre R$ 50 e R$ 1 mil.

4,84%

2,27%

tĂŞm rendimentos de R$ 1 mil a R$ 5 mil mensais.

recebem mais de R$ 5 mil mensalmente.


REVISTA UBC

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O pesquisador Giovani Marangoni, da Escola Superior de Propaganda e Marketing do Rio (ESPM), comenta. “Sou músico por origem, é importante dizer de onde venho. Minha formação musical é informal, assim como a da maioria dos músicos no Brasil. Nunca deixei de tocar, compor e produzir e continuo, nunca parei, mas precisei procurar outras receitas, como professor e pesquisador. Viver de música é muito complexo”, descreve. “Quando, nas décadas de 80 e 90, as tecnologias digitais começaram a se popularizar entre os músicos, eles ganharam um pouco de autonomia, mas o mercado de música continuou a ser como sempre: sem uma classe média propriamente”, diz. Contribui para isso a persistente dificuldade de compor, produzir, gravar, distribuir e ter sua música efetivamente usada – e remunerada – por uma TV, uma rádio. Fatores como uma maior profissionalização de quem faz música, melhores remunerações por parte de quem os contrata ou usa suas criações, uma menor inadimplência dos usuários e uma base de associados mais robusta nas sociedades de gestão coletiva são fatores-chave para mudar essa situação. “A base de mais de 30 mil associados da UBC representa uma elite intelectual que compreende a necessidade de uma sociedade arrecadadora. Muitos que tocam por aí em festas e bares nem se aproximam desta realidade. Talvez

BANHEIRO DE AEROPORTO, HOTEL, POSTO DE GASOLINA: TODOS TÊM QUE PAGAR PELO USO DE MÚSICAS.” Pedro Mann, cantor e compositor

até estejam começando a entendê-la e participar dela através do digital. Mas ainda vai levar tempo até que exista uma classe média de fato na música.” O cantor e compositor Pedro Mann opina que uma maneira viável para aumentar os ganhos dos artistas com direitos autorais no Brasil é a pressão política. “Neste momento, por exemplo, há uma constante movimentação no Congresso para beneficiar o setor turístico e hoteleiro com isenções de pagamento de direitos autorais, em detrimento dos autores. Banheiro de aeroporto, hotel, posto de gasolina: todos têm que pagar pelo uso de músicas, e é preciso que haja cumprimento e fiscalização. O que é arrecadado via streaming ainda é muito incipiente, os valores

devem subir. Além disso, tem uma coisa importante: sou formado em música numa universidade, e ali mal se falava em direito autoral. Não há informação para o compositor dentro da faculdade”, critica o criador, que vê na formação e na educação as principais ferramentas para virar esse jogo.

LEIA MAIS Na página 33 (Fique de Olho) e no site da UBC, mais informações sobre a grande queda na distribuição de direitos autorais provocada pela pandemia ubc.vc/QuedaAD


MERCADO 38

86% DOS PROFISSIONAIS DA MÚSICA TIVERAM

PERDAS

DURANTE PANDEMIA Pesquisa inédita da UBC com o cRio/ESPM revela que 30% dos trabalhadores do setor perderam toda a sua renda neste período de paralisia; confira outros dados por_ Ricardo Silva

de_ São Paulo

Que a pandemia afetou o mercado musical de uma forma quase cataclísmica já está bastante claro. Assim como o fato de que, quaisquer que sejam as dificuldades, a música continuará a ser um porto-seguro para tantos criadores do Brasil. O que faz a Pesquisa Músicos e Pandemia, uma inédita Parceria da UBC com o cRio, o think tank da Escola Superior de Propaganda e Marketing (ESPM), é traduzir essas verdades em números.


REVISTA UBC

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O PERFIL DE QUEM RESPONDEU À PESQUISA

CE

PE 6 % BA 9 % MG 9 % RJ 25 %

Fundamental

29% Superior comp. 28% Médio

SP 22 %

Superior inc.

23%

Pós/Mestrado/PhD

RS 10 % 61 a 70 anos 51 a 60 anos

15 % Mulheres

Homens

16 %

25% 27 %

41 a 50 anos 31 a 40 anos

13 %

70 anos ou mais

OUTROS 18 %

85%

8%

até 30 anos

16 %

12 %

4%


MERCADO 40

Sentiram no bolso a paralisia do mercado 86% dos 883 músicos, compositores, intérpretes, produtores e outros profissionais da música que responderam ao questionário e representam, com margem de erro de cinco pontos, o universo musical nacional. E um número similar, 83%, não pretende abandonar sua carreira. O perfil desses profissionais, condizente com a média nacional, é majoritariamente de homens (85%), de 31 a 50 anos (52%) e com ensino médio (29%) ou superior

(28%). Instrumentistas, cantores e compositores são os profissionais mais comuns da cadeia produtiva, e a faixa de renda mínima que eles disseram necessitar para se manter varia, sobretudo, entre R$ 2 mil (24%) e R$ 3 mil (20%). Entre todos, 56% trabalham unicamente com a música, preocupantes 30% disseram ter perdido toda a sua renda durante a pandemia, e 56% disseram não ter qualquer renda (ou só 10%) oriunda de apresentações ao vivo durante a pandemia.

RESILIÊNCIA E GRANDE AMOR PELA MÚSICA Para o pesquisador Giovani Marangoni, coordenador da pesquisa, os resultados permitem constatar uma vinculação muito grande dos artistas da música aos shows. “Como essa atividade foi a primeira a parar e está sendo a última a voltar durante a pandemia, o impacto financeiro sobre o setor é muito grande. Outra coisa que percebemos é que muitos passaram a fazer lives, acreditando que ganharão dinheiro com isso. Mas uma boa parte crê que quem mais lucrará serão os grandes nomes do mainstream.” Ainda de acordo com Marangoni, é interessante destacar que mais de 80% não pretendem abandonar a música apesar das dificuldades, um sinal inequívoco de resiliência. Mas 15% pretendem diminuir a atuação na música e abraçar outras áreas paralelamente. “Isso casa com os 33% que já tinham outra atividade fora da música antes da pandemia. As pessoas que se enveredam por essa difícil escolha da música como profissão têm, sobretudo, um grande amor pela arte. Enfrentam as dificuldades, não conseguem se manter totalmente com ela, mas não desistem.”

LEIA MAIS Mais análises de Marangoni e de outros especialistas e a pesquisa na íntegra ubc.vc/UBCESPM


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OCUPAÇÕES COM A MÚSICA PREJUDICADAS PELA PANDEMIA 49%

49% 35% 25% 16%

Instrumentista

Cantor/a

13%

Autor/a ou Produtor/a Arranjador/a Compositor/a fonográfico/a

Professor/a

12%

7%

3%

Empresário/a Não, nenhuma Funcionário/a ocupação foi de gravadora prejudicada ou editora pela pandemia

VOCÊ PENSA EM DEIXAR DE TRABALHAR COM MÚSICA ATÉ O FINAL DESTE ANO?

53.00%

30.00%

15.00%

2.00% Sim, pretendo mudar totalmente

Sim, pretendo diminuir minha atuação com música e focar noutra profissão

Não. Pretendo continuar trabalhando apenas com música

Não. Pretendo continuar trabalhando apenas com música, mas diversificando minhas atuações

QUANTO AO FUTURO DAS LIVES APÓS A PANDEMIA, QUAIS DAS AFIRMAÇÕES ABAIXO MAIS SE APROXIMAM DO SEU PENSAMENTO: 47.00%

27.00%

26.00%

Vão perder audiência, voltando a ser como eram antes

Vão perder, mas terão maior audiência do que tinham antes

Continuarão tendo grande audiência

3% Roadie


ARRECADAÇÃO E DISTRIBUIÇÃO 42

RÁ DIO:

SINTONIZE-SE NESTAS REGRAS

Veja como funcionam a captação das músicas tocadas pelas emissoras e a repartição do dinheiro neste segmento do_ Rio

Um dos mais importantes segmentos de arrecadação e distribuição de direitos autorais musicais no Brasil, o rádio tem regras bastante específicas no contexto da gestão coletiva. A partir desta edição, a Revista UBC revisita as principais rubricas, como são chamados os segmentos no Ecad, para mostrar o caminho entre a execução pública e a chegada do dinheiro até você, titular. Para começar, a distribuição de direitos autorais de rádio contempla apenas as execuções musicais em emissoras adimplentes, ou seja, que pagam a mensalidade ao Ecad. Há anos, segundo sucessivos levantamentos da UBC, a taxa de inadimplência tem estado próxima de 60% das emissoras brasileiras, o que significa que a música tocada em três quintos das rádios nacionais não gerará rendimentos aos seus compositores, produtores, músicos e intérpretes. Em outubro do ano passado, por exemplo, a dívida das emissoras que não estavam em dia era de R$ 7,3 milhões.

Outro fator a ter em conta é que a distribuição de rádio é feita de forma indireta, utilizando uma amostragem de 200 mil execuções realizadas em cada trimestre em todas as cinco regiões geográficas do Brasil. Esta amostra é certificada pelo Ibope, e o tamanho é robusto para que seja representativo e adequado ao universo real de execuções, com uma margem de erro de apenas 0,2 pontos percentuais. Então, quando você vê no seu demonstrativo 10 execuções em rádio, isso não significa que a música tocou 10 vezes, mas sim que foi captada 10 vezes dentro daquele espaço amostral. A distribuição é feita também trimestralmente: janeiro (para execuções de julho a setembro do ano anterior), abril (para execuções de outubro a dezembro do ano anterior), julho (para execuções de janeiro a março do mesmo ano) e outubro (para execuções de abril a junho do mesmo ano).


REVISTA UBC

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OS 3 ‘HITS’ DO SEGMENTO RÁDIO

LEIA MAIS Confira regras detalhadas para cada um dos segmentos de arrecadação e distribuição ubc.vc/GuiaDist

1.

Distribuição indireta: O volume de execuções país afora impede que cada uma das músicas tocadas seja aferida diretamente. Por isso, uma amostragem de 200 mil execuções é realizada em cada trimestre em todas as regiões. A margem de erro é de só 0,2%.

2.

Distribuição trimestral: Janeiro, abril, julho e outubro são os meses em que o dinheiro chega aos titulares.

3.

Alta inadimplência: Cerca de 60% das emissoras costumam estar inadimplentes. No ano passado, a dívida delas com o Ecad passava de R$ 7,3 milhões.


DÚVIDA DO ASSOCIADO 44

LEIA MAIS Consulte a seção de demonstrativos no Portal do Associado para ver em detalhes os valores que lhe cabem em cada distribuição portal.ubc.org.br

“Por que o valor que recebi é diferente do que consta no demonstrativo do Ecad?” REVISTA UBC Há vários anos, a UBC adotou um critério de antecipação de valores em distribuições que não são as trimestrais (nas quais são entregues aos titulares os valores mais robustos, de TV aberta e rádio, por exemplo). Isso ocorreu para garantir uma certa homogeneidade nos valores pagos, evitando que eles variem demais e que os titulares fiquem sem rendimentos entre essas distribuições maiores. Um exemplo: em outubro há uma distribuição trimestral que costuma concentrar os maiores valores do ano. Em novembro e dezembro, para evitar uma queda abrupta no dinheiro

entregue, antecipamos alguns valores de janeiro, caso haja previsão de recebimento pelo titular. O Ecad faz um cálculo e concede a antecipação, e a sociedade deve checar se a antecipação é devida ou não. Geralmente, antecipa-se um terço do valor que ele normalmente recebe. Este valor, no mês correto da distribuição, será amortizado, ou seja, o titular não o receberá outra vez porque já entrou na antecipação. Outra razão de possível diferença nos valores é quando há o pagamento de valores arrecadados pela execução das músicas dos associados no

exterior. Fruto de acordos entre a UBC e sociedades estrangeiras, o dinheiro também não passa pelo Ecad, o que pode provocar cifras não coincidentes. Além disso, no extrato da UBC consta o desconto de Imposto de Renda na fonte, o que também pode gerar alguma diferença em relação ao extrato do Ecad.

E VOCÊ, TEM DÚVIDA? Entre em contato com a UBC pelo e-mail atendimento@ubc.org.br, pelo telefone (21) 2223-3233 ou pela filial mais próxima.


DOAÇÃO DO YOUTUBE BENEFICIA ASSOCIADOS DA UBC A maior plataforma de vídeos do mundo entregou R$ 532,7 mil ao Ecad, e as sociedades que o compõem decidiram ajudar seus associados mais necessitados. A UBC repartiu os R$ 76,1 mil que lhe couberam entre 303 titulares que haviam se inscrito no Fundo Juntos Pela Música. Os pagamentos serão realizados na distribuição de novembro. SAIBA MAIS EM UBC.VC/YTDOA


A SUA MÚSICA JÁ TINHA IDENTIDADE PRÓPRIA. AGORA, ELA FICOU INCONFUNDÍVEL A Cisac estreou um novo e moderno sistema ISWC, um código que é uma espécie de ‘carteira de identidade’ de uma música. Antes, ele era emitido por cada sociedade de autores em diferentes países. Passa a ser centralizado, o que deverá abolir erros e duplicações. Mais investimento em tecnologia. Melhores rendimentos para os titulares. Já disponível na UBC.

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