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POP, REGGAE, ROCK, PARALAMAS

A banda que, de tão especial no contexto musical brasileiro, é quase um gênero em si mesma se aproxima dos 40 anos com uma interminável lista de hits e seu líder, Herbert Vianna, homenageado com o Prêmio UBC 2020

por_ Eduardo Lemos | de_ Londres | fotos_ Mauricio Valladares

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Há quase 40 anos nascia uma parceria longeva que marcaria a história recente da música brasileira. Integrado por Herbert Vianna — Prêmio UBC 2020 pelo conjunto da sua obra —, Bi Ribeiro e João Barone, o grupo Os Paralamas do Sucesso rapidamente mexeu com a cena rock que dominava o Brasil de 1982. Distanciando-se das amarras do gênero, eles partiram em busca de seu próprio sotaque sonoro e poético e, assim, modernizaram e ampliaram a ideia do que é ser uma banda no Brasil.

Em sua discografia, os Paralamas alternam momentos de experimentação — como se escuta em “Selvagem?” (1986), “Os Grãos” (1991) e “Severino” (1994) — e trabalhos de perfeita construção pop, casos de “O Passo do Lui” (1984) e “Nove Luas” (1996). São também marcantes a conquista da América Latina nos anos 90 e a continuidade da carreira mesmo após o acidente de Herbert, em 2001.

Em 4 de fevereiro de 2001, Herbert Vianna sofreu um acidente que o deixou paraplégico e vitimou sua esposa, Lucy. Naquele momento, à incerteza sobre como seria a sua recuperação, somava-se a dúvida de se os Paralamas poderiam retomar a carreira. As respostas foram positivas nos dois sentidos: Herbert conseguiu tocar a vida adiante apesar das sequelas que o acidente lhe trouxe, e a banda subiu aos palcos menos de dois anos depois. Há quase 40 anos nascia uma parceria longeva que marcaria a história recente da música brasileira. Integrado por Herbert Vianna — Prêmio UBC 2020 pelo conjunto da sua obra —, Bi Ribeiro e João Barone, o grupo Os Paralamas do Sucesso rapidamente mexeu com a cena rock que dominava o Brasil de 1982. Distanciando-se das amarras do gênero, eles partiram em busca de seu próprio sotaque sonoro e poético e, assim, modernizaram e ampliaram a ideia do que é ser uma banda no Brasil.

Ao se falar de arte, os critérios de avaliação podem ser subjetivos. Mas, especialmente na música, é possível observar que os nomes que causaram grande impacto têm, pelo menos, cinco pontos em comum: popularidade, potência, inventividade, capacidade de influenciar e longevidade. E todos eles se verificam facilmente na obra dos Paralamas.

1. POPULARIDADE

“Vital e sua Moto”, “Cinema Mudo”, “Óculos”, “Meu Erro”, “Fui Eu”, “Romance Ideal”, “Ska”, “Mensagem de Amor”, “Me Liga”, “Assaltaram a Gramática”, “Alagados”, “A Novidade”, “Melô do Marinheiro”, “Selvagem”, “O Beco”, “Uns Dias”, “Quase um Segundo”, “Perplexo”, “Lanterna dos Afogados”, “Caleidoscópio”, “Tendo a Lua”, “Trac-Trac”, “Vamo Batê Lata”, “Uma Brasileira”, “Saber Amar”, “Luiz Inácio”, “Lourinha Bombril”, “La Bella Luna”, “Busca Vida”, “O Amor Não Sabe Esperar”, “Ela Disse Adeus”, “Aonde Quer Que Eu Vá”, “O Calibre”, “Seguindo Estrelas”, “Cuide Bem do Seu Amor”, “Na Pista”, “De Perto”, “Meu Sonho”, “Mormaço”, “Sinais do Sim”.

Essas são 40 músicas que estouraram em interpretações dos Paralamas, a maioria composta por eles ou em parcerias com outros. Seja quando aborda temas políticos, seja quando reflete sobre a existência humana ou as relações amorosas, a obra da banda é, sobretudo, uma obra popular. “As músicas deles nunca serão datadas. Têm uma poesia muito inteligente e, ao mesmo tempo, muito comunicativa”, elogia a cantora e compositora Fernanda Abreu.

2. POTÊNCIA

Uma das marcas do trabalho dos Paralamas é a qualidade do material apresentado, em qualquer fase destes quase 40 anos de carreira. Pegue-se, por exemplo, a primeira música (“Vital e Sua Moto”) do primeiro disco (“Cinema Mudo”, de 1983). A história de um sonho juvenil (e dos percalços para atingi-lo) é contada com leveza e embalada em um arranjo entusiasmante.

O cantor e compositor carioca Rubel, um dos nomes mais populares da chamada nova MPB, só nasceria na década seguinte, em 1991. “Vital” lhe chegou aos ouvidos na adolescência e abriu a sua cabeça. “Eu lembro de escutar essa música e pensar: mas pode fazer isso? Uma música sobre um cara chamado Vital? E a moto dele? E ainda por cima chamar a música de ‘Vital e sua Moto’? É tudo tão simples e direto e certeiro e divertido e sagaz e popular ao mesmo tempo”.

3. CAPACIDADE DE INFLUENCIAR

Skank, O Rappa, Nação Zumbi, Pato Fu, Los Hermanos, Pitty, Maria Gadú, Lucas Santtana, Ana Cañas, Maglore, Vitrola Sintética… É longa a lista de artistas que vieram depois dos Paralamas e já assumiram a influência do grupo em suas produções. As razões são diversas: uns citam a mistura da música brasileira com outras sonoridades; outros mencionam a capacidade de Herbert de compor canções atemporais; e há os que se inspiram no respeito ao público e na perseverança do grupo em continuar fazendo música juntos mesmo depois de 38 anos.

4. INVENTIVIDADE

Artisticamente, Herbert e os Paralamas foram revolucionários em ao menos dois momentos: no primeiro, em 1986, eles deixaram de lado as influências do rock inglês e passaram a olhar para as produções jamaicana, africana e brasileira. Um desvio de rota — inesperado pelo mercado e até criticado por companheiros de geração — que culminaria no terceiro disco do grupo, “Selvagem?”, com o trio assumindo influências regionais, abrindo diálogo com expressões musicais do Terceiro Mundo e propondo uma nova estética para a música feita no Brasil. A presença de Gilberto Gil nos vocais de “Alagados” e na letra de “A Novidade” simboliza a queda do muro que separava o rock brasileiro da MPB.

Aquele era o primeiro ano pós redemocratização do país, e esta história seria diferente se Herbert Vianna não percebesse o esgotamento dos temas juvenis e passasse a olhar para o que estava acontecendo ao seu lado. “Todos os dias, indo para a universidade, eu cruzava a Favela da Maré e via a batalha, o despertar, ou o não dormir, das pessoas. Quando li a biografia do Bob Marley, descobri que ele havia nascido numa favela da Jamaica chamada Trenchtown. O que eu tentei fazer foi deduzir como é o despertar das pessoas que vivem nestas condições e que têm tantas portas fechadas pela sociedade”, explica ele, sobre a letra de “Alagados”.

A segunda revolução veio na virada da década de 80 para 90, quando os Paralamas empreenderam uma carreira de sucesso na América Latina, chegando a fazer mais shows fora do que no Brasil. Nenhuma banda brasileira, até ali, havia se inserido tão fortemente na cultura de países como Argentina, Chile e Venezuela.

5. LONGEVIDADE

Das bandas que surgiram nos anos 80 e continuam ativas, os Paralamas são a única que mantém a mesma formação. “O Herbert é um cara superdotado em matéria de música e composição. E ele sempre foi muito generoso no contexto da banda, confiando na gente para dar um caráter coletivo às composições. Talvez essa seja a grande mágica das bandas que duram tanto tempo e que funcionam bem”, diz João Barone. “Desde o acidente, só o ajudamos emprestando a nossa memória em coisas que, às vezes, ele confunde. Ou ajudando-o a descobrir qual é a atmosfera musical que a letra está inspirando. Passou a ser um desafio muito legal, algo que lembra o que já acontecia de uma maneira mais subliminar.”

“O Herbert compõe letras sem parar, e a gente fica tentando dar forma a elas. Nós nos encontramos sem compromisso, e cada um leva o que pensou em casa, vai juntando, até chegar a alguma ideia que seja interessante para nós três”, descreveu Bi, em entrevista de 2013.

“O episódio da superação do acidente é uma coisa extraordinária, ver como a música se preservou completamente na pessoa e na personalidade dele. Herbert voltou com tudo intacto: o elã, o entusiasmo musical, tudo isso ficou nele. É um fenômeno muito impressionante”, observa Gilberto Gil, que tem uma relação mútua de admiração com o grupo.

LEIA MAIS | No site da UBC, todas as homenagens a Herbert pelo Prêmio UBC 2020

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ubc.vc/PremioUBC2020

Edição totalmente virtual da premiação destaca obra ímpar do compositor e dos Paralamas

do_ Rio | foto_ José Fortes

LIVES, EXPOSIÇÃO DE FOTOS E DOCUMENTÁRIO NA HOMENAGEM A HERBERT

O artista recebe o troféu em casa: reconhecimento pelo conjunto de uma longa e frutífera carreira

O artista recebe o troféu em casa: reconhecimento pelo conjunto de uma longa e frutífera carreira

Num ano marcado por uma pandemia, o Prêmio UBC 2020 teve uma edição diferente e especial, com uma série de atividades on-line espalhadas por vários dias, uma homenagem não só ao ganhador do troféu deste ano pelo conjunto da sua obra, Herbert Vianna, mas também a todos os compositores.

Uma série de lives especiais, com curadoria de Liminha e apresentação da VJ e apresentadora Sarah Oliveira, teve excelentes depoimentos de Fernanda Abreu, Aloysio Reis, Roberto Berliner, João Barone e do próprio Liminha. Tudo ainda disponível no perfil da UBC no Instagram. Além disso, o canal da UBC no YouTube teve a estreia de um documentário especial sobre Herbert, e, no nosso site, uma exposição de fotos da trajetória de Herbert e dos Paralamas, feitas por Maurício Valladares, ainda pode ser vista.

Presidente da associação, Paulo Sérgio Valle elogia a entrega a Herbert Vianna do Prêmio UBC, que, desde a sua retomada, em 2017, já homenageou Gilberto Gil, Erasmo Carlos e Milton Nascimento. “O Prêmio UBC 2020 é, muito merecidamente, de Herbert Vianna, um compositor que todo o Brasil admira. Consegue ser sofisticado e popular ao mesmo tempo. Pelo conjunto de sua obra e cada música individualmente, faz jus ao prêmio deste ano.”

Marcelo Castello Branco, diretor-executivo da associação, faz coro: “Herbert sempre foi um músico prodigioso, um autor que traduz as relações humanas de forma carinhosamente voraz, além de sempre retratar nossa realidade política com olhar atento e crítico. É uma honra para a UBC poder homenageá-lo.”

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