A iconografia pelo olhar do Artesão - Catálogo de Artesanato, Gastronomia e Turismo

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Artesão

A iconografia pelo olhar

A BAHIA recriada através dos olhares e fazeres de artesãos de oito destinos turísticos

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A iconografia pelo olhar

Artesão A BAHIA recriada através dos olhares e fazeres de artesãos de oito destinos turísticos

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Rio São Francisco

Salvador e Baía de Todos-os-Santos Costa dos Coqueiros Costa do Dendê Costa do Cacau Chapada Diamantina Costa do Descobrimento Portal do Sertão 6

Sertão do São Francisco


Sumário

A iconografia pelo olhar artesão mpreender para novos mercados E 09 O apoio ao artesão 10 Apresentação 13 Conexões 15 Olhar nosso quintal 17 Olhar a fé 21 Um olhar, uma trajetória 25 Um olhar sobre os sujeitos e objetos do artesanato: a salvaguarda dos ofícios artesanais 29 Olhar o sabor 35 Eixos temáticos 39 DEPOIMENTO DOS ARTESÃOS Mestre Aguilardo, Metal 52 Maria do Carmo, Associação de Artesãos de Saubara, Casa das Rendeiras 54 Joelma Bispo Silva, Copartt - Cooperativa do Trançado Tupinambá 83 Jéssica Oliveira, Comunidade Quilombola de Jatimane 95 Rony Santana dos Anjos, Associação de São João da Penelinha 110 Jan Araújo, Ceramista 127 Célia Amorim, Tecelã, Porto Seguro 149 Zé de Rita, Associação de Artesãos de Santa Brígida 164 Alda Moreira, Artesã, Associação Casa do Artesão de Juazeiro-ACAJ 185

8 Destinos Turísticos Salvador e Baía de Todos-os-Santos

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Costa dos Coqueiros

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Costa do Dendê

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Costa do Cacau

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Chapada Diamantina

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Costa do Descobrimento

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Portal do Sertão

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Sertão do São Francisco

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Agradecimentos 189 Legendas 190 Expediente 196 Bibliografia

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Terra de Fé Terra Mãe Terra de Histórias Terra de Sabores 7


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A Bahia recriada através dos olhares e fazeres de artesãos de oito destinos turísticos

Empreender para novos mercados

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por meio do artesanato que parte importante da cultura baiana chega a outros Estados e a outros países. Esse trabalho desenvolvido pelas mãos habilidosas de artesãs e artesãos do nosso Estado é também fonte de renda para muitas famílias e comunidades que vivem deste ofício. E como toda atividade empreendedora que promove o desenvolvimento econômico local, o Sebrae não poderia deixar de estar ao lado do artesanato baiano. Nosso papel é capacitar e apoiar essa produção em todo o Estado, para que essas peças possam ampliar sua presença nos mais diversos mercados. Há mais de uma década, atuamos junto ao artesanato local, que hoje apresenta seus produtos para públicos diversos (moradores das localidades, turistas e comerciantes). A produção atual segue critérios de curadoria que avaliam matérias-primas utilizadas, técnicas aplicadas e temáticas abordadas. Esse processo contribui para estabelecer um alto padrão de qualidade, que se potencializa com a criatividade e o

talento dos nossos artesãos. Ao se estabelecer como parceiro deste segmento, o Sebrae também realiza diversas ações de acesso a mercado, a exemplo das rodadas de negócio, que permitem aos artesãos negociar diretamente com representantes de grandes empresas compradoras. As rodadas se configuram no maior evento de comercialização do artesanato no Estado. Outras ações importantes desenvolvidas pelo Sebrae contam com parceria do Sistema Faeb/Senar. São iniciativas como o projeto Brasil Original – Edição Bahia, que estabelecem um diálogo com o artesanato baiano e suas manifestações culturais, técnicas e habilidades tradicionais. Essas ações se inserem nas atividades de renovação da experiência dos visitantes de oito regiões turísticas do Estado, estabelecendo a contextualização cultural através do olhar dos artesãos na interpretação das iconografias regionais. Embalado pelo turismo local, o artesanato reforça a diversidade da identidade iconográfica de cada

região. Sob o olhar do artífice e orientação técnica de especialistas, como designers e agentes de mercado, esta publicação reúne a produção de artesãos que se empenham no aperfeiçoamento de seus ofícios, gerando renda para suas famílias e comunidades, preservando e fortalecendo suas culturas. Essa iniciativa oportuniza a divulgação e a comercialização do artesanato de referência da Bahia, e está em total consonância com a missão do Sebrae de promover a competitividade e o desenvolvimento dos pequenos negócios, fomentando o empreendedorismo nesta atividade. Talento e criatividade sempre estiveram nas mãos dos nossos artesãos. O que buscamos, ao longo desses anos, é agregar conhecimento para que seus produtos possam conquistar cada vez mais mercados, levando a Bahia mais longe nos olhares, experiências e recordações. Jorge Khoury Superintendente do Sebrae Bahia

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O apoio ao artesão

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Senar Bahia e o Sebrae Bahia, dentro das suas missões de promover o desenvolvimento da produção sustentável, da competitividade e do empreendedorismo, tendo como base os princípios da livre iniciativa, da economia de mercado, da cidadania, da qualidade de vida e da inclusão social, desenvolvem uma parceria para promover o Artesanato de Referência Iconográfica dentro da cadeia do Turismo na Bahia. A preocupação do Senar Bahia com o desenvolvimento sustentável das diversas regiões do Estado em assuntos relacionados à formação rural

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e a atividades assemelhadas, com a atuação do Sebrae Bahia no artesanato, motivaram a formatação dessa parceria, com o objetivo de responder às necessidades de integração dos segmentos – Artesanato e Turismo no Estado da Bahia. Artesãos enquadrados como microempreendedores individuais ou constituídos em associações ou cooperativas, que tenham em suas atividades o Artesanato de Referência baiana e que ainda necessitam de capacitações e consultorias especializadas em gestão, design e acesso a mercados para o desenvolvimento da sua atividade

e a profissionalização da gestão dos pequenos negócios de artesanato foram fatores preponderantes e determinantes para que as instituições desenvolvessem suas atuações. Humberto Miranda Presidente do Sistema FAEB/SENAR


A Bahia recriada atravĂŠs dos olhares e fazeres de artesĂŁos de oito destinos turĂ­sticos

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Apresentação

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s artesãos são verdadeiros intérpretes de nossa cultura. Estimulamos estes profissionais a contarem suas histórias, que são a melhor maneira de reconhecermos a nossa identidade. Compreendemos que valorização do fazer artesanal, como uma manifestação cultural do nosso povo, deve enfatizar os vínculos entre o artesão e o seu meio. A iconografia, conjunto de imagens reunidas em torno de um tema, foi adotada com este objetivo. Identificamos que cada região turística se baseia em um conjunto de imagens para a divulgação de seus atrativos, reúnem as mais belas paisagens, festas e monumentos para despertar o desejo em conhecê-las. Nossa estratégia é o encontro de olhares de cada artesão e artesã das diversas regiões turísticas da Bahia, que possuem trajetórias e

conhecimentos próprios de sua cultura e colaboram, muitas vezes para a realização de outras manifestações que são tradições em suas comunidades. O olhar destes artesãos interpreta e amplia a nossa percepção e sensações sobre o local que moramos ou visitamos, revelando suas formas, cores, cheiros e sabores; o tangível e o intangível, através do imaginário popular e pessoal. São encontros de olhares que renovam e recriam as tradições, belezas e experiências de se ver e estar na Bahia. Por sua vez, o turista ao chegar ao seu local de destino, já carrega na bagagem uma série de expectativas e imagens que reuniu ao planejar sua viagem e que contribuíram para o desejo de conhecer aquele local. É importante que o artesanato integre este conjunto de imagens e possibilite que o visitante possa

identificar e interagir com os artesãos que exercem a atividade em sintonia com os valores de sustentabilidade socioeconômica e cultural de sua região, contribuindo para o desenvolvimento da economia da cultura local. Convidamos a todos para que através da interpretação dos artesãos baianos da sua cultura, percebam a diversidade de olhares que formam a rica identidade do artesanato da Bahia. Uma diversidade de imagens e histórias que se revelam e misturam, abrindo caminho para o poder da imaginação e da criação do nosso povo. Tatiana Martins Coordenadora de Artesanato do Sebrae Bahia

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Conexões

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ão inúmeras as formas atuais de interação que abrem caminhos para novos modelos de negócios no turismo. O universo do artesanato, por sua vez, possibilita a inserção de uma vasta gama de conteúdos e experiências que abrangem diversos temas, proporcionam descobertas e contribuem para customizar as necessidades dos viajantes em busca de novas formas de viajar. Nesse cenário, a conexão dos artesãos com os diversos setores do turismo é vital para a construção de imagem forte dos destinos turísticos. O setor artesanal abrange uma rica diversidade de temas, histórias e ofícios que interpretam e povoam as regiões visitadas e ampliam o sentido da experiência do visitante. Se no turismo materializam-se as experiências dos viajantes, cabe ao artesanato sintetizá-las. O turismo é uma importante atividade de apoio às práticas de negócios e ao consumo consciente, o que contribui para

o desenvolvimento sustentável do setor e de comunidades, colaborando para a integração regional e a preservação da cultura local e do meio ambiente. O artesanato oferece oportunidades para a inclusão social, através do aproveitamento das vocações e habilidades locais, e tem, no turismo, sua principal forma de escoamento e de acesso ao mercado. O código global de ética para o turismo aponta a importância do envolvimento dos agentes locais e das comunidades em seu benefício. Assim, o desenvolvimento sustentável do turismo cultural deve promover o respeito pelos valores culturais e éticos das comunidades. A atividade do turismo possibilita, por sua vez, o acesso ao mercado e a sobrevivência de técnicas tradicionais, empregadas em produtos que se tornaram obsoletos, mas que entretanto, podem servir para o desenvolvimento de produtos inovadores, mantendo vivo o legado de antigos mestres, bem como

os saberes, práticas e vínculos que o exercício dessas técnicas representa para as populações tradicionais ou os núcleos familiares que, por gerações, perpetuaram esses saberes. Identificamos a busca de diversos olhares e interpretações das iconografias locais com base nos seus bens patrimoniais tangíveis e intangíveis, como forma de reforçar, simultaneamente, os intercâmbios interculturais com os visitantes e melhorar a qualidade da experiência do turista. O caminho de fortalecimento da imagem da Bahia no turismo que se baseia na identidade local é de grande importância para o aumento do sentido de valor e das experiências vividas pelos visitantes. Esta publicação tem como objetivo valorizar as trocas que se manifestam através da cultura popular e do artesanato, propondo a interação entre nossos artesãos e turistas.

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Olhar nosso quintal “Muito silêncio mesmo, a maré baixa descobrindo o apicum sem fim [...], um friozinho molhado [...], os vazamarés e outros caranguejinhos de plantão à porta de seus buraquinhos, a enchente começando a lamber a borda do mangue, um lumezinho bruxuleando na porta da casinha que ficava embaixo do coqueiro, uma vontade mansa, meio boba, meio sem pé nem cabeça, de que aquilo tudo parasse, que não fosse necessário fazer mais nada, quase como se a alma saísse do corpo.” (RIBEIRO, 2007, p. 239)

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este pequeno fragmento, recolhido do livro Viva o Povo Brasileiro, o escritor baiano João Ubaldo Ribeiro (1941–2014) está falando do tempo em movimento, em um recanto da ilha de Itaparica, lugar onde nasceu. Gostaria de agregar a essa descrição uma visualização cromática e imaginária.

Nessa perspectiva ficcional, convido você leitor a colorir o referido fragmento e a imaginar uma paleta de cores em movimento, com seus distintos matizes – a cor indiciada pela ação não finalizada, ou seja, a cor em um tempo contínuo, no qual pode residir a essência das harmonias cromáticas. Então, pergunto: – De que cor seria este “friozinho molhado”? Que matizes cromáticos teriam os ”vazamarés e outros caranguejinhos”? De que cor seria a “casinha que ficava embaixo do coqueiro”? E quando o coqueiro projetasse sua sombra, ou o vento soprasse suas folhas, a casinha mudaria de cor? Para encontrar possíveis respostas, ou melhor, para imaginar uma paleta cromática, irei rememorar também um encontro que tive com uma artesã que tecia lindas colchas coloridas, lá nas bandas de Baiacu, na contracosta

da ilha de Itaparica. Então, perguntei: – Como você consegue tecer tantas harmonias cromáticas? Ela me respondeu: – Observando as flores que crescem ao redor... Para cada flor, uma manta. Simples assim. A partir dessas breves reflexões, acredito que a percepção inventa cores, ou melhor, a percepção metamorfoseia a realidade com a nossa memória, sob a influência direta da luz. Embora isso seja totalmente provocativo, é cientificamente constatável, pois, sendo a cor um fenômeno de radiação física, ela pode revelar – por ativação de átomos da periferia da cor dominante por contraste com a cor indutora – a coloração complementar que surge nos corpos chamados incolores, como resíduo de absorções parciais dos raios luminosos incidentes, pois ela é controlada por meio da absorção e reflexão dos raios luminosos pela matéria. Um fator a ser acrescido é que “nenhum corpo absorve

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ou reflete integralmente a totalidade dos raios luminosos incidentes.” (PEDROSA, 1991, p.39). Então, poderemos encontrar uma possível paleta cromática, em um “tempo gerúndio”, potencializada não só pelo matiz (comprimento de onda), pelo valor (luminosidade ou brilho), pelo croma (saturação ou pureza da cor), mas, essencialmente, pelo nosso imaginário. Pode-se pensar, assim, que a percepção de cada território de origem, de cada ”quintal”, seja fator essencial para estimular o processo de criação, ou seja, essas percepções estão estreitamente relacionadas com o potencial da matéria encontrada em cada local, assim como a cor do lugar, sua topografia, seu clima, sua vegetação e, essencialmente, a experiência. Sim, a arte reside no nosso quintal, seja ele físico, subjetivo ou ficcional. Considero a identidade cultural um adjetivo do saber. Logo, a junção das duas palavras – identidade e cultural – produz o sentido de saber se reconhecer como espaço geográfico, tempo, gênero, raça,

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história, nacionalidade, crença religiosa e etnia. Em síntese, o processo criativo é estimulado, conjuntamente, pela percepção e reconhecimento de sua identidade, como nos mostra Caetano Veloso, na letra da sua música “Trem das cores”. Sugiro escutar... Escutou? Pois bem, com possibilidades de mutações cromáticas, Caetano percebeu os contrastes mutáveis, tratando metaforicamente os fenômenos cromáticos que ocorrem em graus e situações diferentes, por alteração de uma ou mais cores químico-físicas em presença uma das outras e, essencialmente, com reconhecimento de sua identidade cultural. A cor e o trem, ambos em movimento, “recortados” de sua infância em Santo Amaro, no Recôncavo Baiano. Importante observar que o artista mineiro Israel Pedrosa (1926–2016), como já sinalizei anteriormente, no seu livro, “Da Cor à Cor Inexistente”,

abriu caminho próprio a partir de uma descoberta a que ele deu o nome de cor inexistente. Pedrosa reduz a experiência estética ao aqui e agora das excitações da retina. E isso não impede – pelo contrário, propicia – tal intensificação do campo visual, que termina por desencadear em nós uma carga de impacto e, por um instante que seja, nos fascina, como os “Reinos do Amarelo”, do poeta pernambucano João Cabral de Melo Neto (1920-1999): “A terra lauta da mata produz e exibe um amarelo rico (se não o dos metais): o amarelo do maracujá e os da manga, o do oiti-da-praia, do caju e do cajá; amarelo vegetal, alegre de sol livre, beirando o estridente, de tão alegre, e que o sol eleva de vegetal a mineral, polindo-o, até um aceso metal de pele.” Então, é possível falar que o universo da cor que nos cerca é um mágico caleidoscópio que, em um tempo gerúndio, constitui a alma desse universo. A percepção das múltiplas


aparências dessas cores indica um elevado estágio de conhecimento sensível. Em nossas andanças, podemos flagrar a cor com os seus infinitos matizes, que podem nos conduzir à conscientização das manifestações mais sutis da natureza, para potencializar o percurso criativo. Nessa perspectiva, acredito que a escolha da paleta cromática está atrelada ao reconhecimento de cada ”quintal”, de cada lugar de origem, povoados de distintas identidades culturais, as quais, por sua vez, estão em contínuo movimento, pois vivemos o mais dinâmico e colorido dos séculos de que se tem notícia, prelúdio de um futuro cada vez mais luminoso e de um desenvolvimento sem precedentes de novos códigos de expressão e de comunicação visual, que precisam perceber e potencializar suas “raízes” para se tornarem “universais”.

Viga Gordilho Maria Virginia Gordilho Martins, conhecida como Viga Gordilho, é artista visual e Prof.ª Dr.ª da EBA/UFBA. Realizou exposições individuais e coletivas em espaços culturais, museus e instituições, em várias cidades brasileiras, africanas e europeias. Autora de livros, textos e artigos sobre processos criativos. Membra da ANPAP – Associação Nacional e Pesquisadores em Artes Plásticas desde 1996 e da Academia de Ciências da Bahia.

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Olhar a fé

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alar de artesanato e de arte, é enaltecer a simplicidade. É incorporar riquezas e valores que aparentemente não estão tão visíveis. É beber de fontes que não se esgotam em sua estética, transferindonos para um lugar singelo, leve e belo. A simplicidade convoca o instinto, clama a intuição, oferta possibilidades de criação para que possa conhecer um “novo”. A partir da simplicidade, cresce a generosidade e, com ela, partilhamos sentimentos de doação. Devemos também apreciar e contemplar as grandes obras artísticas de museus, os produtos de arte padronizados que compõem a indústria cultural. Contudo, as obrasprimas produzidas artesanalmente, de forma simples, criam laços de identidade, afetividade e amor. Muitos pesquisadores temem falar sobre artesanato, para não serem considerados reducionistas.

Entretanto, contemplar o artesanato, apreciando-o, é valorizar o grande artista que, através de suas mãos, atua de forma simples e singular. A Bahia tem o enorme privilégio de reunir, em seu celeiro artesanal, expressões soberanas de identidade, estética, sabores, cultura, ritmos, sobretudo de fé. Uma fé não apenas de cunho religioso, mas uma fé impregnada no fazer, permitindo que cada peça criada registre emoção e simplicidade. Manter viva a preservação do patrimônio cultural, material e imaterial, legitima a importância do artista-artesão para com sua arte. Dentre tantos ícones de nossa Bahia, no que tange patrimônio material e imaterial, Irmã Dulce, além de grande personalidade, destaca-se na construção do imaginário através de uma imagem-símbolo: uma mulher de fé que, recheada de valores, utilizou

suas mãos para, de forma simples, criar e transformar dificuldades em vitórias. “No amor e na fé encontraremos as forças necessárias para nossa missão.” (Irmã Dulce) A própria Irmã Dulce consolidou sua missão através dos alicerces do amor e da fé, traduzindo sua generosidade em diversidade, seu jeito singular em inclusão, sua persistência em simplicidade, desenhando um mosaico de valores atemporais que possibilitaram a remoção de suas fraquezas, transformando seus feitos em uma grande obra. É imensurável a importância da obra deixada pelo “Anjo Bom da Bahia” – uma verdadeira obra de arte que tece conexões não apenas para o acolhimento de seus doentes, mas transgride a arte da transformação. O exemplo está no mosaico desenvolvido no artesanato pelos assistidos do CCIDP – Centro de

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Convivência Irmã Dulce dos Pobres e do CATA – Centro de Acolhimento e tratamento de Alcoolismo. O referido mosaico transforma vidas, (re)organiza o caminho de cura e, sobretudo, faz essas pessoas acreditarem em si, oportunizando vivências e experiências singulares com sua criação. Ressignifica seu processo, possibilitando um novo olhar para o estético e para o belo. Sai de um lugar intrêmulo e gera movimento, pois cada fragmento irá compor um mosaico de sensibilidade, de história e arte. Assim como Irmã Dulce, os artesãos utilizam as mãos de forma simples, para criar uma arte grandiosa de valores, amor e fé. Anualmente, é possível contemplar a mistura do artesanato, da fé e da devoção na ornamentação dos altares de Santo Antônio, no Memorial Irmã Dulce, no qual está imbricada uma

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tradição, um fazer popular que é passado por gerações. A devoção da “Bem Aventurada” ao Santo existia bem antes de ela entrar para a vida religiosa, uma ligação de fé e “amizade”, pois era a Ele que fazia seus pedidos e orações. O altar com a imagem pertenceu a seu avô, Manoel Lopes Pontes. Cada produção não se resume a papéis coloridos, fitas, arabescos traçados, nos materiais sustentáveis e recicláveis. Ela se realiza, sobretudo, nos elementos que compõem o altar: ora a toalha de renda para embelezar o local da imagem do santo, ora os porta-velas e incensos incrementados de detalhes para enaltecer o momento de louvor, confeccionados por mãos simples, que alimentam uma tradição secular. A ornamentação do altar de Santo Antônio de Irmã Dulce enaltece as crenças e os festejos do catolicismo popular, bem como a feição lúdica,

aproximando devotos de diversas religiões, um verdadeiro convite às habilidades artesanais. Preconizar o sagrado no fazer artesanal legitima as expressões populares de identidade e resistência de nosso povo, eternizadas em sua devoção e no oficio artesanal, possibilitando ao artesão uma alma equilibrada, leve, recheada de arte e fé. Mônica Silva Artista Plástica e Arte-Educadora do Memorial Irmã Dulce


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Um olhar, uma trajetória

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a minha trajetória, procurei, como artista plástica e designer, ser observadora, estudiosa e curiosa. O resultado foi a vontade de unir a arte e o design para contar histórias de meus ancestrais, revelando nossos símbolos, nosso cotidiano e a cor local. Um diálogo da cultura africana com as culturas indígena e europeia. Um grande desafio foi o de fazer um trabalho pioneiro: ser artista, designer e empresária. Em 1986, iniciei minha primeira marca, a Didara, com uma proposta de construção e de padrão. Em 1987, transformei uma loja no Centro Histórico em um verdadeiro laboratório para interagir com clientes que vinham interessados na cultura baiana. A memória social em que mergulhei foi a africanidade: afro-brasilidade e afrobaianidade. Posicionei a marca como contadora de histórias por meio das

estampas, tendo como suporte produtos de moda e decoração, num pioneirismo para a moda afro-brasileira. Atualmente, a marca Goya Lopes Design Brasileiro ampliou seu leque de possibilidades não só para o afro-brasileiro como também para o design brasileiro. Meu processo criativo foi sempre o de perceber, intuir, observar, pesquisar, para depois compor. Os ícones não só falam de uma história, mas contêm uma mensagem atual e local. Sempre me lembro de meus primeiros contatos com a cultura baiana. Aos 11 anos, meu pai me levou para estudar desenho com a professora Marisa Gusmão. Eu fazia desenhos de observação e interpretação com exvotos, cerâmica de Maragogipinho, peças da cultura popular baiana. Ao longo dessa caminhada, estive sempre

alerta e sensível, percebendo e intuindo, cada vez mais, as solicitações dos processos criativos que aconteciam. As ideias fluíam, e minha ancestralidade vinha à tona. O caminho era ousar sempre com eficiência. E ainda refletir sobre nosso papel na sociedade, aproveitar todo nosso potencial, confiar em nós, pensar grande e pensar no outro, fazendo um trabalho sistemático, objetivo e constante. Gostaria de colocar uma experiência na qual ajudei a criar a identidade de um artesanato. Em 1998 e 1999, fui convidada pela Comunidade Solidária a orientar um grupo de mulheres chamado AMAV – Associação Mulheres Artesãs de Valente, que fica a 246 km de Salvador. A limitação da água no semiárido e a tradição, na região, de aplicações e bordados mudaram o nosso rumo de fazer estamparia com essas mulheres.

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Uma vivência com o filme “Colcha de Retalhos” e um passeio com as Mulheres de Valente na boleia de um caminhão fizeram com que elas me apresentassem o bioma do semiárido. A ideia era criar uma atmosfera adequada para que elas se reconhecessem no seu ambiente. Logo a paleta de cores foi desenvolvida ao ar livre: azul do céu, amarelo e laranja do sol, branco das nuvens, verde dos mandacarus e cactos, vermelho das flores, marromclaro dos bodes e telha da terra. O segundo momento era destinado a desenhar esses elementos percebidos e sentidos, que já se transformavam em referências. Então, elas trouxeram a história do boi valente, que deu origem ao nome da cidade.

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Conseguimos identificar duas jovens que tinham o dom de desenhar. Com a história do boi valente e o bioma do semiárido, foi um pulo para, com vivacidade e simplicidade, criar uma linguagem própria, uma poesia aplicada em bordados. Com uma memória e uma história para contar, foram criados produtos artesanais de fácil execução: almofadas, colchas de retalhos, toalhas, bolsas etc.

Elas comercializaram os produtos em feiras e lojas, e participaram do programa Valores do Banco do Brasil. O resultado foram ideias e arquétipos que criaram um processo para inventar uma tradição. Goya Lopes Artista Plástica e Designer


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Um olhar sobre os sujeitos e objetos do artesanato: a salvaguarda dos ofícios artesanais

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ançar um olhar para o artesanato a partir da perspectiva da salvaguarda dos ofícios artesanais, entendidos como patrimônio cultural brasileiro, significa tentar compreendê-lo não apenas a partir de seus produtos, tampouco somente a partir das técnicas utilizadas. Um olhar orientado pela preocupação com a memória e a salvaguarda – ou seja, com as diversas medidas necessárias para o apoio e fomento, visando garantir sua continuidade e preservar sua identidade – é necessariamente dirigido ao sujeito do fazer, ou seja, coloca artesãs e artesãos no foco de sua abordagem. As condições de existência dos artesãos são as condições de possibilidade dadas para o artesanato. Não apenas o meio geográfico e as matérias-primas disponíveis criam tais condições, mas o meio social e cultural em que tais

artefatos surgem e se desenvolvem são decisivos para a compreensão de suas características e seus significados. O mesmo olhar que enfoca os sujeitos artesãos também encara os produtos de seu fazer para além de sua condição de mercadorias: procura investigar a vida social desses objetos. Assim como as pessoas, esses objetos têm uma vida, uma história: eles nascem, vivem, envelhecem e chegam ao fim. Durante sua vida, eles trocam de mãos, cumprem diferentes finalidades, adquirem diversos significados e atuam na vida das pessoas, causando diferentes tipos de impactos, emoções e consequências. De fato, os artefatos agem. Isso não quer dizer que eles tenham a intenção ou a consciência de agir, como um humano, mas que eles geram efeitos na vida social. O artesanato deve, assim, ser compreendido como um sistema

que envolve agentes humanos e não humanos imbricados e mutuamente constituídos. O artesão faz o artefato, mas o artefato também faz o artesão, pois circunscreve sua forma de agir, seu pensar e o lugar que ocupa em sua comunidade e na sociedade, condiciona seu corpo e seus gestos. Lembro vivamente de minha primeira visita a Dona Cadu, mestra ceramista de Coqueiros, no município de Maragogipe, e da impressão que me causou ver aquela senhora octogenária sentada no chão, pernas estendidas e abertas, coluna reta, sem apoio na parede, modelando o barro por horas e horas a fio, rindo e contando causos. Que corpo é esse que a cerâmica criou? Que enorme resistência ao desconforto e à dor moldou o corpo de Dona Cadu enquanto ela moldava o barro? Mais espantoso ainda foi ver a queima da cerâmica a céu aberto, algumas horas depois. Mesmo a cerca de 20 metros da altíssima pilha de utensílios,

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equilibrada com imensa destreza e entremeando madeira para a queima e os objetos que seriam queimados, o fogo era tão quente, ainda mais sob aquele sol de meio-dia, que eu mal conseguia ficar ali parada olhando. Dona Cadu, no entanto, estava a cerca de 3 metros da pilha, ajeitando as madeiras com uma longa vara, cuidando para que a queima acontecesse de forma homogênea, controlando o fogo, usando um saber incorporado que me pareceu tão complexo que duvidei que alguma tecnologia mecânica pudesse substituir o que aquele corpo sabia sobre o barro, a madeira e o fogo. Anos depois, lendo os autores citados em nota, não tive dificuldade em entender sua afirmação de que os objetos agem, e que eles também fazem as pessoas, pois logo me lembrei de Dona Cadu.

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O sistema-artesanato, porém, envolve outros agentes humanos: em uma ponta, aquele que coleta a matériaprima (que nem sempre é o próprio artesão); na outra ponta, aquele que compra o artefato, ou talvez aqueles a quem ele o mostra, contando a história daquele objeto, que muitas vezes é parte de uma viagem, de uma aventura, alguma história que também constitui a identidade desse sujeito.

Às vezes, esse comprador se torna um aficionado, um colecionador, e os artefatos também passam a definir como ele se vê e se apresenta aos outros. No meio da cadeia, existe um ou vários intermediários, vendedores de vários tipos e portes. E há, não podemos esquecer, pessoas como nós, que pesquisam, fotografam, fazem livros, criam e aplicam políticas públicas de e para o artesanato. São todos que, de outra forma, também vivemos de artesanato – porém, em geral, em condições muito diversas daquelas dos artesãos. Nossos corpos não aguentam o chão duro, nem o calor do fogo. Nossa relação com ele, muito menos corpórea é, por isso também, mais externa, e temos de ser humildes para reconhecer nossas limitações em falar daquilo que conhecemos, na verdade, por fora. Por fora do fazer, por fora do corpo. Essa reflexão, hoje já consolidada nos estudos socioantropológicos sobre a cultura material, é necessária para as instituições e pessoas que vêm trabalhando as políticas para o artesanato brasileiro (e baiano). Muitas vezes esses objetos são pensados fundamentalmente como mercadoria, e as políticas concentram seus esforços no fomento à cadeia produtiva,

na agregação de valor comercial aos artefatos e no escoamento da produção. A contribuição que o olhar antropológico sobre essa relação entre sujeitos e objetos, preocupado com a salvaguarda dos saberes e fazeres, pode trazer a essas políticas é a de propor que elas sejam planejadas de maneira a considerar as profundas vinculações de afeto e significado que unem homens e mulheres aos objetos que criam; que elas levem em conta o conjunto de valores associados aos artefatos: valores de uso, valores estéticos, valores afetivos e valores identitários. Sabemos que, na história dessas políticas, nem sempre as intervenções estatais e empresariais levaram tais vinculações afetivas e semânticas em conta. Ao formular políticas para o artesanato, cabe aos gestores públicos zelar para que elas não venham a gerar implicações mais deletérias que benéficas, seja para as comunidades, seja para os objetos em si. Alguns riscos que podem se colocar para as comunidades são a criação de divisões antes inexistentes, ou o acirramento de conflitos já existentes entre os diferentes sujeitos da prática, ou ainda a desconsideração de categorias locais de especialidade e hierarquia,


impactando formas de organizações social e política locais. Para os objetos, há o risco de criar padronizações estéticas e reificar formas e significados, empobrecendo, assim, seu múltiplo potencial de significação e criatividade. Em suma, as políticas para o artesanato tanto podem potencializar e fomentar, como podem fossilizar uma determinada tradição artesanal local. Os artesãos podem ser vistos como potenciais vetores de resistência à ordem capitalista clássica, a qual se caracteriza pela divisão do trabalho e pela alienação do produtor em relação aos saberes envolvidos na produção, assim como em relação a seus frutos, típicos do trabalho industrial. Afinal, eles conhecem todas as etapas da produção de seus artefatos e dominam todas as técnicas necessárias. Mas seria um erro vê-los como remanescentes de tempos pré-capitalistas, pois os mecanismos desse sistema os afetam e limitam: a imensa desvalorização do trabalho artesanal e a figura dos atravessadores, que efetivamente lucram com os produtos, enquanto seus produtores permanecem, via de regra, em condições precárias, acabam reduzindo os artesãos a

condições análogas à do trabalhador fabril e, muitas vezes, dando ensejo ao “industrianato”: a produção manual em larga escala, a partir de um único modelo, o que torna o trabalho repetitivo, exaustivo, extinguindo a criatividade do artesão e o amplo leque de valores e significados dos produtos, que se reduzem, aí sim, a mercadorias. A política de salvaguarda do patrimônio imaterial no Brasil tem tangenciado, nos últimos 14 anos, as políticas para o artesanato. Oficialmente iniciada no ano 2000, com a publicação do Decreto nº 3551/2000, a política de salvaguarda começa a ser efetivamente aplicada com o registro dos primeiros bens culturais de natureza imaterial em 2002: o ofício de paneleira do distrito de Goiabeiras, em Vitória, Espírito Santo, e a Arte Kusiwa, pintura corporal e arte gráfica dos indígenas Wajãpi. O fato de o primeiro bem cultural a ser registrado ter sido o ofício das paneleiras, mulheres ceramistas que produzem panelas de barro pretas para a moqueca capixaba, já demonstra as imbricações entre tais políticas. Contudo, tanto em relação a esse como aos que depois se seguiriam, o registro dos ofícios sob a categoria “Saberes e Fazeres” procura dar ênfase ao como fazer,

envolvendo a descrição das técnicas utilizadas, mas também ao por que fazer, ou os sentidos do fazer. As redes de relações dos artesãos, suas formas de organização, suas tecnologias de transmissão dos saberes, sua vinculação com o território e com as fontes de matérias-primas fornecem não apenas um contexto sobre o bem registrado, mas são fatos entendidos como elementos indissociáveis daquele bem, e que devem ser objeto da política de acautelamento, tendo em vista salvaguardar não apenas as formas e os meios, mas os sentidos atribuídos a tais fazeres, entendidos como práticas culturais em sua acepção mais ampla – e não apenas como tecnologias de fabricação de objetos. Um caso interessante a respeito dos “saberes e fazeres associados aos modos de fazer” (descrição ampla e pouco específica, que engloba muitas dimensões das práticas sociais e culturais) são os saberes e as práticas associados aos modos de fazer Bonecas Karajá, do Tocantins, registradas como patrimônio cultural nacional em 2012 e inscritas no Livro de Registro dos Saberes. Vale notar que as próprias bonecas, chamadas Rtixòkò, foram tituladas simultaneamente como

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“expressão artística e cosmológica do Povo Karajá”, inscritas no Livro de Registro das Formas de Expressão. No entanto, o duplo registro – como saber e como forma de expressão – mostra a intenção de não reduzir o significado do bem cultural mas, ao contrário, de evidenciar como as bonecas se articulam em uma rede de significações que envolve também a pintura corporal e as peças de vestuário e adorno dos Karajá consideradas tradicionais, que atuam como indicativos de categorias de gênero, idade e estatuto social.

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Outros saberes e fazeres artesanais registrados foram o Ofício das Baianas de Acarajé (2005), o Modo de Fazer Viola de Cocho do Mato Grosso e Mato Grosso do Sul (2005), o Modo Artesanal de Fazer Queijo de Minas, nas Regiões do Serro e das Serras da Canastra e do Salitre (2008), o Modo de Fazer Renda Irlandesa de Sergipe (2009), o Modo de Fazer Cuias do Baixo Amazonas (2015). A ênfase no “modo de fazer” sugere uma atenção especial aos métodos e técnicas e, de fato, as problemáticas da salvaguarda desses bens recaem sobre as características específicas do saber-fazer, condicionadas ao acesso a certas matérias-primas naturais (como o próprio barro para as paneleiras de

Goiabeiras, ou as madeiras necessárias para fabricar a viola de cocho e outros materiais utilizados tradicionalmente para sua confecção, encontrados no ecossistema local) ou fabricadas (como o lacê para as rendeiras de Sergipe, elemento que diferencia sua renda de outras do país, uma marca distintiva, ameaçada pelo iminente fechamento da única fábrica desse aviamento), ou a normas de produção (como o queijo de Minas, não pasteurizado, ameaçado pelas normativas da vigilância sanitária que obrigam os produtores à pasteurização). Dessa forma, as políticas de salvaguarda dos bens registrados se focam na resolução de problemas encontrados pelos detentores para a continuidade de seu fazer, nas quais o Estado pode intervir na qualidade de mediador ou articulador. O caso do Modo de Fazer Cuias do Baixo Amazonas interessa a esta nossa análise das imbricações entre as políticas de salvaguarda do patrimônio imaterial e as políticas para o artesanato, pois as cuias de Santarém e da região são produzidas por comunidades apoiadas pelo Promoart (Programa de Promoção do Artesanato de Tradição Cultural), integrado ao Programa Mais Cultura, do Ministério da Cultura, e foi

a partir de estudos e ações realizados no âmbito daquele programa, ao longo de uma década, que o Centro Nacional de Folclore e Cultura Popular (CNFCP/ Iphan) propôs o registro do seu modo de fazer, em parceria com a Associação das Artesãs Ribeirinhas de Santarém (Asarisan) e com apoio técnico da Universidade Federal do Oeste do Pará (UFOPA). Tratou-se de projeto de apoio à produção e comercialização de cuias, visando a valorização do produto e das produtoras, e que trouxe, em seu bojo, a interação entre as comunidades ribeirinhas e os agentes sociais externos, acarretando mudanças estéticas e de significado nas cuias. O principal objetivo do projeto era a “reconstituição da memória e da difusão de um rico repertório iconográfico que, à época da implantação do projeto Cuias de Santarém, se esvaía num contexto de desvalorização da ornamentação com incisos, num mercado que privilegiava cuias lisas ou parcamente decoradas, às quais correspondiam baixos preços de venda” (Carvalho, 2011: 14). Outro desdobramento foi a criação de uma marca coletiva da Asarinan, que foi adotada como instrumento de proteção à propriedade intelectual e de agregação de valor à produção artesanal daquelas comunidades tradicionais.


Os estudos para o registro do Modo de Fazer Cuias tiveram um olhar atento para os “modos de usar”, levando em conta os usos locais, pois “as populações ribeirinhas locais usam as cuias para pegar água do rio, tomar banho, cozinhar, consumir líquidos e outros alimentos, tirar água da canoa, decorar as paredes das casas, como vasos de plantas etc.” (http://portal. iphan.gov.br/pagina/detalhes/1055/), mas também enfocaram os novos circuitos de consumo de objetos artesanais utilitários ou decorativos, nos quais uma ampla gama de objetos confeccionados com as técnicas de produção da cuia (fruteiras, copos, jarras, vasos, travessas, braceletes, farinheiras, petisqueiras, entre outros) é inserida em uma economia de mercado, tendo como destino centros consumidores muitas vezes distantes. Dessa forma, percebe-se que políticas de apoio à comercialização não são incompatíveis com a salvaguarda dos aspectos patrimoniais, dos valores e sentidos que os objetos têm para determinados sujeitos e comunidades, mas devem sempre ser conduzidas levando em conta os interesses das comunidades, suas formas próprias de associativismo, sua gestão e protagonismo em tais

processos. Este breve apanhado das ações de salvaguarda do patrimônio imaterial voltadas aos ofícios artesanais tradicionais, através do uso do instrumento do registro como patrimônio cultural do Brasil, pretende contribuir para trazer novos olhares sobre possíveis abordagens a serem adotadas pelas políticas para fomento do artesanato, mantendo como foco não apenas os objetos, mas os sujeitos dos fazeres artesanais. As reflexões contidas neste texto são subsidiadas pelos aportes teóricos de Arjun Appadurai (2008), Alfred Gell (1998) e Bruno Latour (2012), dentre outros autores que vêm se dedicando, nas últimas décadas, aos estudos sobre a cultura material.

BIBLIOGRAFIA APPADURAI, Arjun (Org.). A vida social das coisas. As mercadorias sob uma perspectiva cultural. Série Antropologia e Ciência Política, v. 41. Niterói: Eduff, 2008. CARVALHO, Luciana Gonçalves de (Org.). O artesanato de cuias em perspectiva – Santarém. Rio de Janeiro: IPHAN, CNFCP, 2011. GELL, Alfred. 1998. Art and Agency: An Anthropological Theory. Oxford: Clarendon Press. LATOUR, Bruno. Reagregando o social: uma introdução à teoria do ator-rede. Salvador: EDUFBA-Edusc, 2012.

Maria Paula Fernandes Adinolfi Bacharel em História e Mestre em Antropologia Social pela Universidade de São Paulo, Doutoranda em Antropologia pela Vrije Universiteit Amsterdam. Técnica em Ciências Sociais da Superintendência do Instituto do Patrimônio Histórico e Artístico Nacional na Bahia.

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A Bahia recriada através dos olhares e fazeres de artesãos de oito destinos turísticos

Olhar o sabor

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em dúvida, uma refeição se inicia com os olhos. Como se diz: “comer com os olhos”. É o momento em que a comida é revelada com todas as cores e formas. E também quando ela é servida: na mesa, na banca de uma feira ou mercado, num ritual religioso, no tabuleiro, entre tantos lugares que trazem símbolos e significados e que também ampliam e distinguem os sabores. O ato de comer é muito maior e mais complexo do que simplesmente se nutrir. Todos os sentidos são acionados para o entendimento verdadeiro da relação entre homem e natureza, que é traduzida pela escolha e pela transformação daquilo que chega da terra, das águas e do ar, porque cada ingrediente tem um sentido e, assim, lhe é atribuída uma feição simbólica. Nesses processos da cultura, no âmbito da alimentação, muitas técnicas

artesanais são necessárias para atender às necessidades funcionais e à construção das identidades. Desse modo, unem-se ferramenta e matériaprima para interpretar e criar o objeto. Com certeza, a comida é indissociável de seu utensílio, pois há uma profunda relação entre o preparo culinário e sua apresentação. E, sem dúvida, a comida é, ao mesmo tempo, comunicação e linguagem. E esse diálogo simbólico irá acontecer entre a comida, o utensílio e o comensal. Assim, o caruru – feito com quiabos, azeite de dendê e temperos – será verdadeiramente um caruru quando for servido numa gamela redonda de madeira, pois a imagem e seu significado são tão comestíveis quanto a receita. Desse modo, o entendimento pleno do sabor se dá pelo conjunto visual unido ao entendimento do paladar, que é

também resultante de um processo formado pela cultura. Outro exemplo é a farofa de dendê ou o molho lambão que, quando servidos numa tigela Nagé, produzida pelas mãos do oleiro, terão um valor e um sabor especial, que são atribuídos pela estética do objeto e pelo que ele traz de referência cultural da Bahia. Modelagem no barro, trançado em diferentes fibras naturais, entalhe sobre madeira, renda de agulha e de bilro, bordado, tecelagem, metalurgia e reciclagem formam um amplo e diverso repertório que acompanha a comida da cozinha à mesa. E, assim, a comida ganha sua identidade, pois vai muito além do ingrediente: ela é memória cultural e afetiva, e ainda referência étnica. O objeto tem uma fala funcional, e seus elementos visuais lhe dão

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sentido, uso e apreciação estética. Por isso, deve-se entender que cada objeto está integrado a outros objetos semelhantes, segundo suas características visuais, para formar um conjunto ou família de utilitários com diferentes significados, como os utilitários para guardar e servir água: o quartinhão, a quarta e a quartinha. Quando se faz a comida, é fundamental escolher o objeto específico para cada fase ou ação do processo culinário – pilar, peneirar, ralar, fatiar, frigir, refogar, cozer, assar, servir, entre tantos outros –, para atender às diferentes receitas e vivenciar os diferentes rituais de comensalidade. E a Bahia, por ser multicultural, ibérica e indígena, por acolher imigrantes da Europa e do Oriente Médio, por ser tão multiafricana, traduz, mediante formas, desenhos, gravuras e outros meios iconográficos, sobre barro, madeira, papel, fibra e tecido, referências ancestrais e fundadoras de um amplo e rico acervo artesanal e culinário.

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E todo esse patrimônio, quando relacionado à comida, ganha um sentido especial, pois traz referências, pela

imagem e pelo sabor, sobre o que se come e como se deve comer. Nesses verdadeiros diálogos, entre a pessoa e a alimentação, são realizadas escolhas visuais que aguçam o desejo de comer, de retomar, pela comida, as memórias de famílias, de comunidades, de templos religiosos e de festas populares. Porque sempre a comida estará integrada ao seu utensílio, promovendo, assim, as mais profundas revelações de pertencimento a uma história e a uma tradição. Raul Lody Antropólogo, museólogo, curador do Museu da Gastronomia Baiana, SENAC Bahia


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Eixos Temáticos

Quatro eixos temáticos organizam as referências que norteiam e revelam a diversidade e a riqueza do artesanato baiano: Terra de Fé, Terra Mãe, Terra de Histórias e Terra de Sabores.

Terra de Fé Terra Mãe Terra de Histórias Terra de Sabores

A colaboração dos artesãos para a expressão da diversidade religiosa de nosso povo, através do olhar sensível dos artífices que abrange objetos de representação da fé e da liturgia.

As riquezas naturais do território baiano que estimulam todos os sentidos e fazem de cada bioma do Estado, um patrimônio a ser vivenciado e cuidado.

História, acontecimentos, personalidades, manifestações culturais e tradições interpretadas pelos artesãos baianos.

Toda a riqueza de cores e sabores das receitas que formam o caldeirão cultural baiano em que ficam mais gostosas quando o artesanato põe a mesa.

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O diálogo do artesanato baiano com as manifestações culturais, habilidades, técnicas tradicionais e atuais, embalados pelo turismo local, reforçam a diversidade da identidade iconográfica de oito regiões da Bahia.

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Regiões Turísticas da Bahia • Salvador e Baía de Todos-os-Santos • Costa dos Coqueiros • Costa do Dendê • Costa do Cacau • Chapada Diamantina • Costa do Descobrimento • Portal do Sertão • Sertão do São Francisco

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Salvador e BaĂ­a de Todos-os-Santos

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Rio São Francisco

Salvador e Baía de Todos-os-Santos Costa dos Coqueiros Costa do Dendê Costa do Cacau Chapada Diamantina Costa do Descobrimento Portal do Sertão 46

Sertão do São Francisco


Salvador e Baía de Todos-os-Santos

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alvador foi fundada em 1549 e se manteve como primeira capital do Brasil até 1763. Era a sede do governo colonial. A capital administrativa e a praça-forte foram construídas como um baluarte sobre a Baía de Todos-os-Santos. Conhecida como berço da cultura do Brasil, aqui nasceram muitos escritores, compositores e músicos, muitos deles responsáveis pela imagem de cidade alegre, mística e hospitaleira, com forte presença africana, cuja resistência se materializou mediante a cultura e a religião. Salvador é constituída de praias que abarcam a orla atlântica e as águas da

Baía de Todos-os-Santos, com suas ilhas e mangues, além de um conjunto arquitetônico tornado patrimônio da humanidade. Sua história nos legou o samba de roda e a capoeira, além da comida de rua, de tabuleiro, com destaque para o acarajé, que inicia o visitante no universo das comidas de dendê, ingrediente mais emblemático da culinária baiana. Em um dos mais belos cenários nacionais, com seu mar de águas calmas e cristalinas, envolta por uma aura histórica secular e pela Mata Atlântica, em contraste com os vastos manguezais, restingas e recifes de corais, a Baía de Todos-os-Santos é

o berço deste Estado que lhe tomou o nome e que segue, até hoje, atraindo turistas de todas as partes, desejosos de conhecer essa terra da alegria, onde o Carnaval desponta como a principal festa popular do país. Ela foi descoberta para os olhos ocidentais em 1° de novembro de 1501. Era então conhecida como o grande mar interior, Kirimurê, pelos Tupinambás. Foi rebatizada pelos portugueses com o nome de Baía de Todos-os-Santos, com base no calendário católico, e divulgada ao mundo pelos mapas do cartógrafo florentino Américo Vespúcio. A cultura da cana-de-açúcar floresceu no solo massapê, e grandes contingentes de população africana

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foram trazidos e escravizados como mão de obra. E foi desse parto difícil que nasceu nossa identidade. A fé foi o principal veículo da resistência contra a escravidão e forjou o corpo e a alma de seu povo em constante saudação à memória da ancestralidade africana. Através das religiões de matriz africana, terreiros de candomblé e orixás estão presentes no dia a dia e nas celebrações populares, como o hábito de vestir branco às sextas-feiras e as festas da Lavagem do Bonfim e de Iemanjá. Toda essa riqueza histórica e cultural se reflete na diversidade dos ofícios artesanais. Salvador agrega diversas manifestações artesanais: bordados e rendas, trabalho em metal, instrumentos musicais, aproveitamento de materiais, entalhe em madeira e cerâmica. As ricas rendas de Saubara, o entalhe em madeira e a cerâmica figurativa de Cachoeira, e a louça de

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barro de Coqueiros, a panela original para o preparo da moqueca baiana. Os temas da produção artesanal de Salvador e do Recôncavo são unidos pela Baía de Todos-os-Santos e por sua história. Não poderiam deixar de incluir as figuras tradicionais das baianas, a diversidade religiosa católica com o legado de Irmã Dulce unindo o amparo ao próximo e a fé, a natureza exuberante das praias, a Mata Atlântica com bela e diversificada vegetação, tudo isso embalado com o ritmo das festas populares.


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Terra da Fé | Salvador e Baía de Todos-os-Santos

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“Vim para Salvador ainda menino. Aprendi primeiro a arte de sapateiro, mas me lembro de, ainda criança, ir buscar no mangue a pinha do brejo para fazer brinquedo. Trabalhar com o metal foi aos onze anos de idade. Meu pai era carpina, construía saveiros em Jeribatuba. O que mais admiro na minha profissão é o poder da criação: observar algo, como um peixe, e recriar aquilo com o meu gosto e habilidade. Meus clientes têm confiança na qualidade de meu trabalho. O que é mais pedido é a penca de barangandãs. Peças mais elaboradas faço por encomenda, como paramentos para o povo de Santo. Me esforço para que meus clientes elogiem o resultado, para a minha satisfação e para a deles. O artesanato em metal está morrendo... Voltei à atividade por causa de meus clientes. Se não fosse por eles, já não estava mais em atividade.“ Mestre Aguilardo Mestre em metal


Na Bahia, a manifestação de religiosidade se expande além dos espaços de culto, envolvendo as pessoas no cotidiano, nas celebrações, como marcos presentes também na paisagem da cidade. Os templos católicos definem a silhueta da capital, Salvador. Suas construções remontam ao período de expansão da cidade nos séculos XVIII E XIX, que nos legou um acervo barroco inserido na cenografia urbana de forma teatral, criando surpresas aos sentidos. Assim, as práticas religiosas, que incluíam além da elegância dos gestos litúrgicos, as festas, procissões

e romarias, devido à composição étnica do povo baiano e a sua diversidade de crenças, alcançaram importante papel de socialização.

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Dentre os símbolos de fé está a roupa da baiana. Nela, é possível perceber que cada elemento e cada adereço do corpo carregam uma tradição, uma história. A roupa da baiana é uma verdadeira montagem multicultural, na qual se revelam questões sociais, religiosas, de gênero e do fortalecimento do papel da mulher na sociedade baiana de ontem e de hoje.

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A festa de Iemanjá, que é promovida todos os anos no dia dois de fevereiro, no bairro do Rio Vermelho, pela colônia de pescadores da Colônia Z1, envolve cerca de 30 embarcações que levam os presentes da rainha do mar. Um barracão é construído para receber as oferendas do orixá, em frente à Casa do Peso. A festa de largo integra o calendário de festas de

largo da cidade, que se inicia com a festa de N. Senhora da Conceição da Praia e termina com o Carnaval. São montadas também barracas de comida e bebida para atender a mais de 100 mil pessoas. Iemanjá é cultuada no candomblé como orixá da fertilidade e da fecundidade, deusa das águas, que também é protetora dos pescadores.

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“Aqui em Saubara, aqui no Recôncavo, a tradição passa de mãe para filha. Foi um trabalho das avós. Temos papelão de renda que veio das bisavós. Foram elas que deixaram, disso a gente não abre mão. A renda é a beleza da mulher, não tem uma que não se sinta fora do mundo quando veste uma roupa de renda, e não há renda que se iguale à renda de bilro.” Maria do Carmo Associação de Artesãos de Saubara, Casa das Rendeiras


Cachoeira – principal entreposto comercial entre os sertões, as riquezas das minas e o centro regional durante a expansão da economia da cana-de-açúcar no vale do Paraguaçu e do Iguape – é uma cidade monumento nacional, palco de importantes manifestações culturais que envolvem a produção do artesanato tradicional das rendas e bordados, aliando as origens europeias às tradições afrobrasileiras. A principal celebração da cidade, a Festa da Irmandade da Boa Morte, é realizada no mês de agosto. Trata-se de uma tradição cultural e religiosa que atrai pessoas de vários cantos do mundo. Foi declarada patrimônio imaterial da Bahia no ano de 2010.

A Irmandade da Boa Morte é um grupo formado por mulheres negras descendentes de escravas. São devotas de Nossa Senhora da Boa Morte, da Assunção ou da Glória. Sua indumentária, o traje de beca, é composto pelas seguintes peças: saia plissada de cetim preto; camisa e bata com detalhes em renda; torso e lenço que é amarrado à cintura, todos brancos e bordados em richelieu; pano da costa; e um sapato de couro branco chamado de chagrin, além das joias, correntes, contas de orixás, braceletes, pulseiras e brincos.

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As festas de largo da cidade de Salvador são as manifestações mais populares da religiosidade de seu povo. São democráticas e nelas se pode observar as mais genuínas manifestações de agradecimento que se expressam através de diversas formas: música, dança e culinária. A lavagem da Igreja do Bonfim, que acontece sempre no primeiro domingo do mês de janeiro, agrega, em procissão, milhares de pessoas vestidas de branco, lideradas por baianas que carregam jarros de água de cheiro e flores. A caminhada cobre um percurso de oito quilômetros, que se inicia da Igreja da Conceição da Praia. O principal ritual é a lavagem das escadarias do adro da Basílica de Nosso Senhor do Bonfim pelas baianas. Receber um pouco da água de cheiro sobre a cabeça é considerado um banho de purificação. Já a festa de Santa Bárbara, no dia quatro de dezembro, é famosa pelo caruru servido no mercado que leva o nome da santa, na Baixa dos Sapateiros. Os fiéis se vestem de vermelho para homenagear a protetora, senhora dos raios, trovões e tempestades, tingindo o largo do Pelourinho, onde uma missa é celebrada na Igreja de Nossa Senhora

do Rosário dos Homens Pretos, e de onde sai a procissão que percorre as ruas do centro. Personalidade religiosa, muito querida em vida pelos baianos, Irmã Dulce, Maria Rita de Souza Brito Lopes Pontes, nasceu em 26 de maio de 1914, em Salvador. Aos 13 anos, passou a acolher mendigos e doentes em sua casa. Em 13 de agosto de 1933, recebeu o hábito de freira das Irmãs Missionárias e adotou, em homenagem à sua mãe, o nome de Irmã Dulce. Já em 1935, iniciou sua obra, dando assistência à comunidade pobre de Alagados. Irmã Dulce faleceu no dia 13 de março de 1992, aos 77 anos, deixando como legado uma vida de ajuda ao próximo. Foi beatificada pelo Papa Bento XVI, em 10 de dezembro de 2010. Hoje é reverenciada não só pelos baianos. Em 2019, será canonizada e oficialmente sua imagem, será associada com os ideais cristãos da fé, esperança e caridade.

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Terra da Fé | Salvador e Baía de Todos-os-Santos

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As tradições portuguesas das festas juninas em louvor a Santo Antônio, São João Batista e São Pedro, dias 13, 24 e 29 de junho, respectivamente, permanecem na Bahia. Muito populares no Nordeste brasileiro e ao universo rural, essas comemorações surgiram associadas às celebrações da fartura, ligadas à agricultura e por aqui ganharam sabor local, com ingredientes da terra: milho, amendoim e mandioca. No Largo de Santo Antônio, no bairro de Santo Antônio Além do Carmo em Salvador, o santo lisboeta é homenageado com a realização de trezenas e missas, além de uma festa de largo que congrega as famílias. Os símbolos que representam esse tríduo festivo são a fogueira, a realização de quadrilhas, de origem francesa, e a música que se relaciona com o período, o forró.

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Terra Mãe | Salvador e Baía de Todos-os-Santos

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Situada entre o Oceano Atlântico e a Baía de Todos-os-Santos, a península em que se situa Salvador, a “cidade da Bahia”, se destacava aos olhos viajantes que se aproximavam por mar pela mistura entre o casario e a exuberante vegetação tropical. Ainda se preservam trechos da Mata Atlântica original, e há flores

tropicais nos parques urbanos que fazem lembrar aquela antiga paisagem. Esse intenso colorido contrasta com nuances dos tons de azul do mar. As praias da cidade, seus coqueirais e a brisa, são inspirações constantes para poetas, cantores e também artesãos, que retratam sensações, sabores e olfatos, numa verdadeira sinestesia que estimula todos os sentidos.

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A capoeira, presente hoje em todo o mundo, teve em Vicente Joaquim Ferreira Pastinha, seu grande divulgador. Mestre Pastinha, como era conhecido, começou a aprender capoeira aos oito anos de idade, com o africano Mestre Benedito. Tornou-se professor de capoeira e fundou sua própria escola em 1941. Escreveu um livro, Capoeira Angola, estabelecendo um método de ensino com base nas antigas tradições africanas.

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A capoeira foi inscrita na Lista Representativa do Patrimônio Imaterial da Humanidade em 2014, pela Organização das Nações Unidas para a Educação, a Ciência e a Cultura (UNESCO). Com o Centro Histórico do Pelourinho, declarado Patrimônio Cultural Mundial, por ser

considerado um sítio de excepcional e universal valor histórico, a capoeira é uma manifestação cultural afrobrasileira que foi considerada um bem imaterial ou intangível, o que

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compreende as expressões de vida e tradições de comunidades, grupos e indivíduos que recebem de seus ancestrais conhecimentos e passam a seus descendentes.


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Terra de HistĂłrias | Salvador e BaĂ­a de Todos-os-Santos

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A figura da baiana é uma referência emblemática à gente de sua terra: generosa, amigável e alegre. As baianas de acarajé foram inscritas no Livro dos Saberes em 2005. A profissão é considerada uma prática tradicional das chamadas comidas de baiana, feitas com azeite de dendê e ligadas ao culto dos orixás, encontradas principalmente em Salvador. Dentre essas comidas, destaca-se o acarajé, bolinho de feijãofradinho, frito no azeite de dendê fervente.

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A ba ia na do aca rajé, podemos comprova r na h istória, ex iste há ma is de 300 a nos, qua ndo mu lheres negras escravas levava m o ta bu leiro na ca beça pa ra vender a limentos nas ruas. Atua lmente, podemos considera r que, mu itas consegu ira m, com essa ativ idade, compra r sua a lforria. Mu itas ba ia nas são mães, chefe de fa m ília e exercem lidera nça em suas comu n idades, gera ndo emprego e renda. Elas constituem u m exemplo de empreendedorismo que a briu portas pa ra o protagon ismo fem in ino e que inclu i outras ativ idades. Pesquisas recentes revelam que, há cerca de 3.500 baianas registradas na cidade de Salvador e existem, oficialmente, representantes em 21 Estados brasileiros.

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Terra de Sabores | Salvador e Baía de Todos-os-Santos

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Caruru* Ingredientes: • 2 kg de quiabo • 500 g de camarão seco • 1 litro de caldo de peixe ou de camarão • 1 xícara de castanha de caju torrada e sem casca • 1 1/2 xícara de amendoim torrado sem casca • 200 g de gengibre picado • 2 cebolas grandes cortadas em cubos • 1 xícara de azeite de dendê • 2 dentes de alho picados • Sal a gosto Modo de preparo: 1. L ave os quiabos, corte as cabeças e as pontas. Pique-os em pedaços

A culinária baiana foi formada por múltiplas referências: indígena, africana e europeia. Entre os espaços da casa e da rua, foi na cozinha que se travou uma relação de poder refletida na mesa e no gosto do baiano. Algumas características da comida votiva ganharam os tabuleiros, sem se

tratar de elemento sacro. Foram, assim, também preservados elementos do gosto de matriz africana que resistem até hoje e que têm como representante maior, a comida de dendê.

66 *Receita de Cristiano Santos Ribeiro - Instrutor de cozinha do Senac

pequenos e reserve. 2. C oloque o camarão, 2 xícaras de água, a castanha, o amendoim, o gengibre e a cebola no liquidificador e bata bem. 3. L eve uma panela com o azeite de dendê e o alho ao fogo médio e refogue por 30 segundos. 4. A dicione o creme de camarão e o sal, refogando tudo junto por 2 minutos. 5. Acrescente o quiabo, o caldo de peixe e cozinhe por cerca de 30 minutos. 6. A crescente mais sal, se necessário, misture um pouco e cozinhe por mais 15 minutos até que o quiabo esteja bem cozido. 7. S irva com arroz branco ou arroz com coco.

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Costa dos Coqueiros, extensa faixa de belas paisagens do litoral ao norte de Salvador, com suas planícies, e planaltos costeiros repletos de dunas e coqueirais, é a mais acessível das regiões turísticas litorâneas. Possui uma sequência de ecossistemas de áreas úmidas associadas, onde se encontram pântanos, manguezais, brejos e lagoas de água doce, além de uma faixa litorânea que inclui áreas de desova de tartaruga marinha e uma extensão de praias delineadas por recifes, corais.

A expansão do território português nas recém-ocupadas terras do Novo Mundo, limitada pelo Tratado de Tordesilhas, se deve às agressivas lutas que os Ávilas promoveram contra os índios, obtendo, em recompensa, grandes sesmarias, onde expandiriam seus domínios. Seu fundador, Garcia d’Ávila, almoxarife de Tomé de Souza, responsável da coroa pela instalação da capital da colônia, Salvador, em 1549, estabeleceu-se em Tatuapara em 1560, hoje município de Mata de São João, penetrando no interior do território através da criação de gado pelos vales do Rio Itapicuru e do

Rio Real, alcançando os atuais Estados do Piauí e do Maranhão. As lutas contra as missões pela conquista de terras para os currais e em busca da escravidão dos índios foram contínuas, empreendidas pela Casa da Torre no combate aos missionários, que defendiam a dominação dos indígenas através da aculturação. As aldeias e missões reuniam índios de vários grupos, que eram catequizados e trabalhavam a terra segundo o domínio dos religiosos. A primeira missão jesuítica foi fundada em 1557, e em 1562 já

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eram onze no litoral, alcançando cerca de 40 mil índios aldeados em pouco tempo. As ruínas da Casa da Torre, na Praia do Forte, e as igrejas de Santo Amaro de Ipitanga, em Lauro de Freitas, e do Divino Espírito Santo de Abrantes, em Camaçari, são testemunhas desses tempos. Nessas igrejas são celebradas as festas de seus padroeiros. A chegada do progresso – com a abertura de estradas unindo os povoados de pescadores e a construção de pontes possibilitando a travessia dos rios que desaguam de forma mansa no oceano – trouxe novas possiblidades de aproveitamento econômico do litoral, cuja economia, até então, era baseada na cultura da mandioca, do coco e da pesca.

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As mudanças começaram a ocorrer no fim dos anos 1940. A multinacional que explorava petróleo nos municípios da região, porém a produção veio a declinar nas décadas seguintes, devido ao esgotamento dos poços. Esse período da chegada do progresso, com a construção do polo petroquímico de Camaçari, trouxe também novos hábitos e costumes, o que foi retratado pelo cineasta Glauber Rocha em seu filme de estreia, Barravento, de 1962, e o romance Tieta do Agreste, publicado em 1977, do escritor Jorge Amado.


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O cortejo de baianas toma conta das ruas de Lauro de Freitas em homenagem ao padroeiro Santo Amaro de Ipitanga. Elas arrastam uma multidão até a igreja matriz, onde lavam as escadarias e distribuem água de cheiro. A devoção ao Santo, foi iniciada pelos jesuítas, em 1578 e deu origem à atual cidade de Lauro de Freitas. Essa tradição se repete há três séculos, com baianas, capoeiristas, grupos de dança afro, percussão, teatro e arte circense, dançando e cantando para mostrar toda a diversidade da cultura local.

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Terra Mãe | Costa dos Coqueiros

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A sede do Projeto Ta ma r, na Pra ia do Forte, fu ndado em 1980, se consolidou como u m dos principa is pontos de atração da Costa dos Coqueiros. Atra i tu ristas e v isita ntes de todas as idades e é recon hecido internaciona lmente como u ma das ma is bem-suced idas experiências de conservação ma rin ha, serv indo de modelo pa ra outros pa íses, sobretudo porque envolve as comu n idades costeiras d ireta mente no seu tra ba lho socioa m bienta l. A m issão do projeto é rea liza r pesqu isa, conservação e ma nejo das cinco espécies de ta rta rugas ma rin has que ocorrem no Brasil, todas a meaçadas de extinção, protegendo cerca de 1.100 k m de pra ias, em 26 loca lidades, em á reas de a limentação, desova, crescimento e desca nso desses a n ima is, no litora l e em ilhas oceâ n icas, em nove Estados brasileiros.

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Terra Mãe | Costa dos Coqueiros

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Com as tartarugas marinhas, a baleia jubarte possui, ao longo da Costa dos Coqueiros, uma área privilegiada para sua observação, devido aos hábitos costeiros da espécie e ao estreitamento da plataforma continental no litoral norte da Bahia. Assim, o turismo de observação ocorre próximo da costa, o que possibilita a sensibilização da opinião pública contra a caça desses animais pelo Instituto Baleia Jubarte, que possui uma base na Praia do Forte desde 2001.

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Terra de Histรณrias | Costa dos Coqueiros

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Ao longo de sua história, a região turística da Costa dos Coqueiros caminhou com a região do agreste baiano. À medida que as atividades litorâneas capitaneadas pelo turismo foram alcançando importância e autonomia, houve maior visibilidade da região do agreste, pela proximidade e facilidade de escoamento dos produtos artesanais na zona litorânea. Entretanto, manifestações importantes, como os bordados em Redendepe (termo empregado pelas bordadeiras do município de Inhambupe, para indicar o bordado em redendel, produzido em sua terra), o bordado em ponto cheio feito à máquina e produzido no município de Itapicuru, e a louça de barro de Rio Real, que possui uma elegante e elaborada decoração floral em pigmento de argila de tauá e tabatinga, integram a identidade cultural da região pelo fluxo de trocas entre as comunidades do interior e do litoral dos municípios que integram essas regiões.

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Terra de Histórias | Costa dos Coqueiros

As praias e as dunas da Costa dos Coqueiros apresentam um grande potencial que vem sendo convertido em benefício para a região, promovendo a inclusão de artesãos através da proteção das áreas de extração e do manejo sustentável das palmeiras de Piaçava e outras espécies nativas que são aproveitadas, há gerações, para a produção de objetos utilitários. A produção é realizada principalmente por mulheres que formam a Copartt – Cooperativa do Trançado Tupinambá e associações, nos diversos povoados ao longo de toda a Costa dos Coqueiros.

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“O artesanato já foi nosso meio de sobrevivência quando não tínhamos alternativas; hoje é um meio de vida que não queremos deixar. Nos modernizamos, criamos coisas novas, mas ainda é a tradição de nossos antepassados. O trançado é nossa identidade, nossa cultura e fonte de renda. Representa nossa dignidade como mulher, nossa autoestima. É onde podemos nos encontrar quando estamos chateadas, viradas na pêga.” Joelma Bispo Silva Copartt – Cooperativa do Trançado Tupinambá

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Terra de Sabores | Costa dos Coqueiros


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Camarão no Coco* Ingredientes: • 1 coco verde sem a água • 4 00 mL de creme de leite fresco (ou duas caixinhas de creme de leite) • 6 00 g de camarão limpo • 2 colheres de sopa de farinha de trigo • 1 cebola cortada em cubinhos • 5 00 mL de leite integral • S uco de um limão Extras: cheiro-verde, sal, pimentado-reino, noz-moscada e manteiga Parmesão ralado na hora a gosto 200 g de requeijão cremoso Modo de preparo: 1. Tempere o camarão com o sal, o limão e a pimenta-do-reino a gosto no camarão já limpo. Deixe descansar por pelo menos 30 minutos. 2. E m uma panela bem quente, coloque a manteiga e refogue o camarão aos poucos, para não formar água, rápido, coisa de 1

minutinho, só até que fiquem rosados. Faça isso com todos os camarões e reserve. 3. N a mesma panela, faça o molho branco. Coloque 1 colher de sopa de manteiga e refogue a cebola. Depois, acrescente duas colheres de sopa de farinha de trigo. Frite bem a farinha até ficar dourada. Agora, comece a colocar o leite aos poucos, mexendo sem parar, até que os grumos de farinha se soltem e o molho fique cremoso. Tempere com sal, pimenta-doreino e noz-moscada a gosto. 4. J unte o creme de leite ao molho branco e deixe ferver. Acrescente o requeijão cremoso. Agora, raspe bem o coco, tirando toda aquela parede branquinha da fruta, e junte ao molho. 5. C oloque os camarões dentro do molho, corrija o tempero e encha o coco com o molho, deixando transbordar para ficar lindo. 6. S irva acompanhado de arroz branco e batata palha.

A sequência de praias ao longo de 193 km de Costa dos Coqueiros abastece a mesa com uma fartura de mariscos e peixes. A água de coco é oferta dos vastos coqueirais e torna a bebida a ideal para hidratar o organismo. Entre os doces, a cocada, é claro, se destaca em variações bem temperadas com gengibre de sabores de frutas, como goiaba e abacaxi. Restaurantes locais interpretam esta fartura em sintonia com as tendências da gastronomia internacional.

85 *Receita de Cristiano Santos Ribeiro - Instrutor de cozinha do Senac


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Rio São Francisco

Salvador e Baía de Todos-os-Santos Costa dos Coqueiros Costa do Dendê Costa do Cacau Chapada Diamantina Costa do Descobrimento Portal do Sertão 88

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Costa do Dendê

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ituada entre a foz do Rio Jaguaripe e a Baía de Camamu, a Costa do Dendê é um verdadeiro mosaico de praias, baías, manguezais, costões rochosos, restingas, nascentes, lagoas, rios, cachoeiras e estuários. Seus 115 km de litoral abrangem as localidades de Valença, Morro de São Paulo, Boipeba, Igrapiúna, Cairu, Camamu, Taperoá, Nilo Peçanha, Ituberá e Maraú. Praias de águas tranquilas e áreas preservadas de Mata Atlântica, intensa umidade garantida por um regime de chuvas ao longo de todo o ano. Uma trama formada por rios que encontram o mar, definindo um litoral recortado

por ilhas que esconde povoados centenários e largas áreas assoreadas, onde manguezais são abundantes, ao lado de áreas que garantem o plantio de seringueiras e guaraná, e onde a palmeira nativa da piaçava se alterna com o cultivo do dendê, atestando a fertilidade da região. Existe na região, também, vegetação litorânea, na qual estão englobados os manguezais, a vegetação de praias, as dunas e as restingas. Os manguezais localizam-se em solos de vasa, recentes, de pequena inclinação, não só em áreas banhadas diretamente pelo oceano, como em braços de mar, lagunas e cursos baixos de rios, até

onde se faz presente a salinidade. Todo o interior das Baías de Todosos-Santos, de Tinharé e de Camamu é acarpetado de denso manguezal. As praias de águas claras e quentes, com formações variadas de recifes de coral e emolduradas por vastos coqueirais, figuram entre as melhores do país nos principais guias do gênero. O arquipélago fluvial do Rio Una abriga uma variedade de ilhas paradisíacas – Tinharé, Boipeba e Cairu. A estonteante Baía de Camamu abre-se em dez ilhas inexploradas, com vegetação primitiva e coqueirais. Os intermináveis manguezais servem de berçário para robalos, tainhas, caranguejos, siris,

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camarões, pitus, ostras e lambretas. Uma extensa contracosta de águas plácidas é ideal para navegação, vela, mergulho e pesca.

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A Costa do Dendê é uma das áreas mais antigas de povoamento do país. Era originalmente ocupada pelos índios Aimorés e Guerens, combatidos até o início do século XIX. Durante o período da colônia, nos séculos XVII e XVIII, a região se firmou como grande produtora de farinha de mandioca e materiais de construção, especialmente madeira, abastecendo a capital, Salvador, e também o Recôncavo, onde a cana-de-açúcar ocupava quase toda a totalidade das áreas cultivadas. Com a necessidade de deslocamento pelos rios e baías, a oferta de madeira de excelente qualidade para a construção naval fez da região um importante polo para a construção de embarcações. As populações ribeirinhas, ainda hoje, empregam canoas entalhadas em um só tronco, uma herança indígena. Além da pesca e do transporte, as embarcações são destinadas para o lazer, na realização de regatas que mobilizam jovens em datas festivas e em passeios pelas ilhas e praias da região. Os saberes da construção do saveiro, embarcação

típica baiana, foram trazidos pelos portugueses, reunindo conhecimento mouros e do oriente, adquiridos pelas suas conquistas. Aqui foi agregado o conhecimento nativo no emprego das madeiras existentes em grande diversidade na Mata Atlântica. Em 1722, os jesuítas do Colégio da Bahia instalaram uma serraria hidráulica em Camamu, dando continuidade à exploração das árvores nativas, iniciada com extração do pau-brasil. Piratas, conquistadores e contrabandistas ali se refugiaram, por sua posição estratégica. Foi o Governador Diogo Luís de Oliveira que ordenou a construção de um forte em Morro de São Paulo, em 1631, o qual passou por ampliações até contar com quase 700 metros de muralhas. A fortaleza foi uma das maiores fortificações do litoral brasileiro. O Farol da Fortaleza do Morro de São Paulo teve o início de suas obras em 1848, porém seu término apenas ocorreu no ano de 1855. Nessa época, era o mais moderno do litoral do Brasil.


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Terra da Fé | Costa do Dendê

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O patrimônio religioso construído na região é vasto, embora se destaquem as igrejas do Amparo, em Valença, e o monumental Convento Franciscano, em Cairu. Dentre as festividades religiosas, destacam-se as festas dos padroeiros, a procissão marítima de Senhor do Bonfim, realizada no fim do mês de dezembro em Camamu, e a procissão marítima de Nossa Senhora dos Navegantes, acompanhada pela Filarmônica Lira Jaguaripense. Em paralelo à Romaria, acontece a Regata dos Navegantes, onde competem canoas à vela em diversas modalidades.

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“Nossa região, nosso povoado é rodeado de piaçaveiras. Saber tirar a quantidade certa de fibra faz o trabalho ser sustentável. A piaçava é a vida da comunidade, ela dá trabalho e renda, garante o futuro para nossos filhos e netos, é importante, é nossa autonomia. O turismo aqui é de base comunitária, o atrativo é a demonstração do trabalho da piaçava. Em Jatimane, temos todas as vertentes do trabalho com a piaçava: fazemos a retirada, o pente para cobertura, a catagem para vassoura, o artesanato do coco e a cestaria.” Jéssica Oliveira Comunidade Quilombola de Jatimane

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Cada palmeira da piaçava (Attalea funifera) atinge de 12 a 15 metros de altura, e começa a produzir a partir dos sete anos, rendendo de 8 a 10 quilos de fibras anualmente, durante uma década de vida útil. Segundo levantamento realizado na região de Cairu, o aproveitamento dentro da mata é de 62% de fibra de primeira, quase toda destinada à exportação; 22% de fibras de segunda são utilizadas na fabricação de vassouras e escovas. É aproveitada ainda como cobertura de quiosques, choupanas, barracas, instalações rurais e casas de veraneio.

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Considerado o maior polo de cerâmica da América Latina, com mais de 100 olarias em funcionamento, o distrito de Maragogipinho, localizado a cerca de 220 km de Salvador, é visto por muitos como um patrimônio histórico escondido. A tradição já alcança os 300 anos e é passada de pai para filho. A produção conserva as ferramentas antigas, o que valoriza ainda mais o trabalho dos artesãos da comunidade. Várias gerações são formadas moldando o barro. Maragogipinho é um vilarejo tranquilo, com muitos atrativos naturais. A comunidade se situa à beira de um braço do rio Maragogipinho que vai afluir no Rio Jaguaripe. As olarias, a maioria com instalações rústicas, não negam a origem indígena. Muitas com paredes de bambu ou varas cobertas de sapê estão distribuídas em corredores estreitos, disputando espaço com pequenos cursos d’água cobertos de mangue.

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s, ar,

Uma exuberante Mata Atlântica que abriga uma das maiores biodiversidades do planeta cobre o litoral da Costa do Dendê. A palmeira africana que nomeia o destino, encontrou as condições ideais para o seu cultivo. O azeite produzido do seu fruto é o principal tempero da culinária baiana, porém a região guarda também outros sabores ancestrais da culinária quilombola e ribeirinhas, transmitidos por gerações até nós.

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Tainha Defumada com Banana* Ingredientes: • 1 tainha grande defumada • S al a gosto • F io de óleo para refogar • 2 cebolas picadas • 5 dentes de alho picados • C heiro-verde a gosto • 3 tomates picados • 1/2 pimentão vermelho • 1/2 pimentão amarelo • P imenta-do-reino a gosto • 5 bananas não muito maduras ou 5 batatas-doce cozidas • 1 litro de água • 1 30 g de extrato de tomate

Modo de preparo: 1. R efogue em uma panela grande, de preferência panela de barro, e coloque o óleo, a cebola, o alho e deixe dourar, em seguida coloque os pimentões, acrescente os tomates mexendo aos poucos até que seque toda a água do tomate. 2. D epois, coloque o extrato de tomate, as postas da tainha e mexa cuidadosamente, acrescente a água até cobrir as postas, quando começar a levantar fervura, acrescente o cheiro-verde, as bananas e as batatas já cozidas, deixe por 15 minutos e desligue o fogo. 3. S irva com arroz branco e o pirão do próprio caldo. Logo em seguida, coloque a banana e acrescente o caldo de frango até forrar as bananas e deixe cozinhar até que as bananas fiquem macias e o caldo grosso.

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erca de 180 km, entre os municípios de Itacaré e Canavieiras, formam a chamada Costa do Cacau, reduto de belezas naturais, rios margeados por fazendas de cacau, praias intocadas, de vastos coqueirais, em meio à Mata Atlântica, e densos manguezais. A região encanta pelas paisagens e pela opulência dos anos áureos do chamado “ouro negro”. A arquitetura preserva o casario colonial dos séculos XVIII e XIX, em ruas calçadas de pedras, igrejas e casarões antigos, reduto de parte importante da História Nacional e que remonta ao período em que a produção e exportação cacaueira eram as

atividades primordiais da economia brasileira. Cenário de filmes e novelas – grande parte com base na obra do escritor Jorge Amado, traduzida em diversos países, ambientada em Ilhéus, principal cidade da Costa – a região, além de reduto histórico, é destino certo para quem procura diversão e contato direto com a natureza. Canavieiras, Ilhéus, Itabuna, Itacaré, Santa Luzia, Una e Uruçuca oferecem opções variadas aos visitantes. A abundância de praias inclui desde picos para a prática de surfe e pontos de pesca – em especial do robalo, em Canavieiras – águas calmas e verdadeiros paraísos ainda pouco explorados. Cachoeiras

radicais – como a do Cleandro, em Itacaré –, rios e corredeiras são um convite à prática de esportes de adrenalina e aventura, como rafting, rapel e canoagem. O cacau teria sido introduzido na Bahia, presumivelmente, em 1655, quando D. Vasco de Mascarenhas solicitou ao Capitão-mor da Capitania do Pará garfos brotados ou amêndoas que pudesse semear na Bahia. Ao que se sabe, a experiência não teve sucesso. A planta teria sido reintroduzida em 1746, pelo francês Louis Frederic Warneaux, que doou sementes provenientes do Pará a Antônio Dias Ribeiro, proprietário da Fazenda Cubículo, à margem direita

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do Rio Pardo, em Canavieiras. A difusão dessa cultura se deu a partir de dois focos: Ilhéus, de onde se alastrou para o interior e para o norte, e o Vale do Jequitinhonha, de onde se estendeu para o extremo sul. O Parque Estadual da Serra do Conduru é uma das unidades de conservação e proteção. A área é detentora de uma das maiores biodiversidades do planeta e com elevado grau de endemismo. Possui uma área de 9.275 hectares, que abrange áreas dos municípios de Ilhéus, Uruçuca e Itacaré. O nome do parque é uma homenagem ao Conduru (Brosimum rubescens), árvore de madeira nobre e muito valorizada, que é encontrada nas florestas ombrófilas do sul da Bahia.

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Das quatro espécies de mico-leão existentes, uma possui populações no sul da Bahia, na costa do Cacau: o mico-leão-de-cara-dourada. A espécie vive em florestas e passa a maior parte do tempo em árvores. Assim como os saguis, tem unhas em forma de garras que lhes permite agarrar-se a troncos e galhos de árvores. Os micos-leões andam, correm e saltam como esquilos, usando as quatro patas. Alimentam-

se principalmente de frutos, insetos, pequenos vertebrados e ovos de aves. Estão protegidos no município de Una por uma reserva natural. Na literatura sobre a região, destacase o escritor Afrânio Peixoto, que traça o perfil de duas bravas pioneiras, nos romances Maria Bonita (1914) e Fruto da Terra (1920), cujo cenário é constituído pelas ribeiras do Prado e do Jequitinhonha, onde o autor passou parte da mocidade. Porém, o grande embaixador da região é, de forma inconteste, Jorge Amado que, com Cacau (1933), inicia a composição de um mosaico do enriquecimento rápido da região, feito, literalmente, de suor e sangue, através de personagens que passaram a fazer parte da memória coletiva nacional.


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Terra da Fé | Costa do Cacau

A Costa do Cacau compreende o litoral das terras que correspondiam à Capitania Hereditária de Ilhéus; elas se limitavam a oeste com o meridiano de Tordesilhas, tendo dado poucos resultados essa estratégia de povoamento à região.

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O maior papel na colonização do litoral coube aos jesuítas, que chegaram ao Brasil em 1549, com o I Governador Geral do Brasil, Tomé de Souza. Na Capitania de Ilhéus, os jesuítas receberam grandes glebas de terras, onde fundaram residências, colégios e aldeias. No atual município de Ilhéus, fundaram o Colégio de N. S. da Assunção, além de possuírem o Engenho de Sant’Ana, doado, em 1563, pela filha de Mem de Sá ao Colégio de Santo Antão de Lisboa. A festa da Puxada do Mastro de São Sebastião, em Olivença, tem origem no século XVI, quando os padres jesuítas estabelecidos na região – numa tentativa de catequização dos indígenas – se apropriaram de uma manifestação cultural nativa, a corrida de tora, para disseminar elementos cristãos entre os indígenas aldeados. Sua história está intimamente relacionada

à história de permanência e resistência dos indígenas Tupinambá de Olivença. No local onde a árvore é derrubada, denominado de cepa, existe um misto de fé, devoção e sacralidade. Atualmente, faz-se o replantio de árvores no local da cepa. O mastro puxado pela população é arrastado pelas praias de Olivença, até chegar à ladeira principal, onde é aguardado por uma multidão que, ao som de bandas locais, anima a festa.


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No último domingo do mês de setembro, ocorre uma procissão marítima em homenagem a São Miguel e, no dia 23 de abril, São Jorge é homenageado por cerimônias do candomblé. A devoção a São Sebastião está expressa na monumentalidade da catedral que domina com suas torres o centro da cidade de Ilhéus.

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Terra Mãe | Costa do Cacau

O mico-leão-de-cara-dourada talvez seja o mais célebre habitante da Costa do Cacau. Tão belos quanto ameaçados, para a preservação da espécie, foi criada a reserva biológica de Una. Os micos-leões desempenham um papel ecológico importante, pois dispersam as sementes da maioria dos frutos que comem. Quando um mico-leão engole sementes, elas - muitas vezes - passam intactas por seu trato digestivo. Quando o micoleão as expele, as sementes são depositadas em um local distante. Ao realizar esse transporte, os micos-leões ajudam as árvores a espalharem suas sementes pela floresta tropical.

troncos das palmeiras de pupunha não eram aproveitados, assim como a casca do coco ia para o lixo. Poder criar algo que vai deixar os outros felizes com este material me deixa orgulhoso. Hoje, o artesanato, aqui em Panelinha, tira o jovem da rua, da malandragem e o encaminha. Se a pessoa se empenhar, vai ter um futuro, pois nosso produto tem boa aceitação e, por isso, tem potencial.” Rony Santana dos Anjos Associação de São João da Panelinha

“Em nossa localidade, o artesanato em coco emprega a maior parte dos moradores. Fomos, aos poucos, desenvolvendo a melhor forma de produzir e dar acabamento. Na época da colheita do cultivo de palmito, os

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Jorge Amado legou à literatura nacional algumas das mais admiradas personagens femininas. São quatro as grandes musas do escritor baiano – Gabriela, Dona Flor, Tereza Batista e Tieta – que marcaram a segunda e mais popular fase de sua produção, quando sua obra passa a ter uma dimensão humorística. Predomina uma visão irreverente e anárquica, segundo a qual, só os personagens populares estão livres do conjunto moral hipócrita da classe média e da burguesia local.

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O desenvolvimento da cacauicultura se processou de forma lenta, só experimentando um grande surto no fim do século passado e início do atual. Até 1860, as espécies utilizadas na região só podiam ser cultivadas na margem dos rios, ficando sujeitas às inundações. A partir dessa data, são introduzidas novas sementes, que possibilitam estender as plantações pelas encostas dos vales. Entre 1860 e 1890, o cacau se firmou como cultura predominante. Embora o produto fosse exportado desde 1834, é entre 1890 e 1930 que a cultura tem o seu grande boom, e o cacau assume a posição de principal produto de exportação baiana. À semelhança do que ocorrera no Recôncavo durante o ciclo da cana-de-açúcar, no sul do Estado, a cacauicultura está muito relacionada com os rios regionais: Pardo, Jequitinhonha, Mucuri e Contas. Os cacauais subiram os vales desses rios, que foram, durante muito tempo, as únicas vias de escoamento da produção para os portos litorâneos.

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Terra de Sabores | Costa do Cacau


Mousse de Chocolate com Nibs* Ingredientes: • 1 90 g de leite condensado •2 00 g de chocolate meio amargo •4 gemas de ovo •5 0 g de manteiga • 1 90 g de creme de leite • 1 30 g de chantilly •3 g de gelatina sem sabor •5 0 mL de água • 1 00 g de nibs de cacau

Modo de preparo: 1. L eve o chocolate picado e a manteiga para derreter em banho-maria. Reserve. 2. A dicione as gemas ao chocolate e, após dissolver, retire do fogo. Reserve. 3. Acrescente o leite condensado, o creme de leite e a gelatina, já hidratada e derretida. Misture bem e, por último, coloque o chantilly; envolva bem, acrescentando os nibs de cacau para dar a crocância necessária. 4. E m seguida, distribua em taças e leve para a geladeira. 5. S irva gelado!

A produção de cacau é uma atividade antiga no país, na qual o município de Ilhéus tinha bastante destaque até o início da década de 1990. Depois, uma praga conhecida como “vassoura da bruxa” destruiu as lavouras da região e transformou o cenário. Antigamente, o chocolate produzido tinha uma característica bastante doce, ou seja, continha grande quantidade de açúcar. Porém, o paladar do consumidor está se modificando, e o que se percebe é que o gosto do cacau vem sendo mais apreciado, o que motiva empresários e fazendeiros a investirem nos chocolates finos ou chocolates gourmet.

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Chapada Diamantina reúne atrativos variados, naturais e culturais, no centro do Estado da Bahia. É um roteiro para quem busca paz e tranquilidade ou para quem está atrás de história e aventura. A descoberta do ouro, nos últimos anos do século XVII, inaugurou um novo ciclo econômico no Brasil e foi fator decisivo na ocupação de seu interior. A vegetação da Chapada Diamantina é variada: Mata Atlântica, campos floridos e planícies verdes alternando com a caatinga e o cerrado, um cenário de rara beleza. Inicialmente foi habitada pelos índios Maracás. Em 1844, a colonização foi impulsionada

pela descoberta de diamantes valiosos nos arredores do Rio Mucugê. Essa região possui uma diversidade grande de fauna e flora. São orquídeas, bromélias e trepadeiras, além de espécies animais, como tamanduá-bandeira, tatu-canastra, porco-espinho, gatos selvagens, capivaras e inúmeros tipos de pássaros e cobras. O Parque Nacional da Chapada Diamantina foi criado na década de 1980 do século XX, para proteger toda essa riqueza. Com altitudes médias em torno de 1.000 metros, a Chapada Diamantina eleva-se como um divisor de águas entre os afluentes do São Francisco

e rios como o Paraguaçu e o de Contas. A Chapada Diamantina e a Serra Geral apresentam um clima tipicamente tropical, com precipitações pluviométricas máximas no verão e/ ou no outono, e mínima no inverno e/ ou na primavera. As chuvas não são, porém, muito abundantes, estando toda a região incluída no Polígono das Secas. A maior parte da região apresenta clima Tropical Semiúmido. O município de Rio de Contas, cujas lavras eram mais produtivas e estava estrategicamente situado à margem do caminho que ligava o porto de Salvador aos sertões de Minas Gerais e Goiás, transforma-se rapidamente em uma verdadeira capital regional.

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Sua área de influência era enorme. Os termos das duas vilas, Jacobina e Minas de Rio de Contas, estendiam-se muito além da Chapada Diamantina e da Serra Geral. Em direção norte-sul, esse território ia da altura do atual município de Mirangaba até a fronteira Bahia–Minas; na direção transversal, desde o Rio São Francisco até 100 km da costa. Um estreito corredor, margeando o Rio de Contas, conectava esse imenso território com o Atlântico. Em fins de 1839, um explorador mineiro descobriu diamantes na Chapada. Ocorreu, então, uma corrida sem precedentes para aquela região, despovoando-se os antigos centros baianos de mineração aurífera e os diamantíferos mineiros. As lavras reproduziam-se por encanto, e não ficou leito de rio, córrego ou brejo da vertente oriental da Chapada Diamantina, que não fosse escavado.

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Destes tempos de corrida pela fortuna, início do século passado, ficaram na memória também o poderio dos coronéis. O mais conhecido nos sertões baianos foi Horácio de Matos, que do alto de seu poder, chegou a ameaçar invadir Salvador. Tal era sua valentia.


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Terra da Fé | Chapada Diamantina

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As festas do catolicismo, na Chapada Diamantina, reúnem celebrações trazidas pelos ciclos do ouro e do diamante nos séculos XVIII e XIX, e se constituem em importantes e populares manifestações de fé que atraem fiéis, moradores e turistas. Destacamos aqui três entre as mais antigas.

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Na cidade de Rio de Contas, as celebrações de Corpus Christi

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constituem uma tradição de muitos anos, com uma programação extensa organizada por sua Igreja Matriz. A festa apresenta como destaque a “Noite das Lanternas”, tradição em que as casas acendem velas em suas frentes e a cidade dispensa a energia elétrica. No dia seguinte, o caminho da procissão é decorado com um colorido tapete, feito à base de pó de serra, com símbolos da celebração.

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A festa de Corpus Christi acontece sempre 60 dias depois do domingo de Páscoa, ou na quinta-feira seguinte ao domingo da Santíssima Trindade, em alusão à quinta-feira santa, quando Jesus instituiu o sacramento da eucaristia. A Festa do Divino Espírito Santo mantém sua tradição ao longo de 144 anos, percorrendo as ruas do casario colonial da cidade de Andaraí e apresentando o desfile do Imperador e a Missa Solene de Pentecostes. A origem da Festa do Divino se encontra em Portugal do século XIV, por iniciativa da rainha Isabel de Aragão. A devoção foi trazida à cidade pelos garimpeiros vindos da região aurífera do Grão Mongol, em Minas Gerais. A originalidade da festa de Andaraí se dá com a escolha de um menino como imperador, com o cortejo formado por crianças, diferentemente das outras cidades onde o imperador é sempre um adulto. A Festa do Nosso Senhor Bom Jesus dos Passos, que acontece entre os meses de janeiro e fevereiro em Lençóis, é a ocasião em que os garimpeiros expressam o agradecimento por sua proteção.

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Ela se inicia com a lavagem das escadarias da igreja pelas baianas, com água de cheiro e flores, seguida pelo período de novena, e seu auge se dá com a missa solene e a procissão de Nosso Senhor dos Passos nas ruas do centro histórico, no dia 2 de fevereiro. Ela termina com a bênção aos garimpeiros na Sociedade União dos Mineiros, no dia 3 de fevereiro. A data da comemoração, dia 2 de fevereiro, porém, marca a chegada da imagem de Senhor dos Passos em Lençóis, em 1852. Após um longo percurso marítimo e fluvial de Portugal até Salvador, a imagem foi recepcionada e levada em procissão

pelos garimpeiros até a cidade, onde foi erigida, em 1855, uma capela para abrigá-la. A realização de festas religiosas envolve grupos ativos em suas localidades, entre eles os artesãos, que compartilham seu conhecimento, suas técnicas, habilidades e práticas para confeccionar paramentos e ornatos que abrilhantam a realização dessas festas, tornando-as memoráveis. Santeiros, bordadeiras, rendeiras e costureiras produzem uma gama de elementos em louvor de sua fé.

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“Eu acredito que a natureza é tudo, é como uma mãe que nos dá, cuida da gente e nos cobre. Há inspiração para todos, os mais sensíveis captam. Todo dia ela se renova, se encontram coisas novas. Meu pai, J. C., diz que não nos ensinou, a mim e a meu irmão Hermes, mas nos deu liberdade para encontrar um caminho próprio para recriar e cuidar do meio ambiente.”

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Jan Araújo Ceramista

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O Marimbus é uma grande área alagadiça, localizada entre Lençóis e Andaraí. É possível fazer passeios de canoa a partir da comunidade quilombola de Remanso, que fica a 18 km de Lençóis. A vegetação é exuberante, há plantas aquáticas, pássaros e animais raros, como onças, veados e jacarés. Entre o real e o imaginário, os artesãos recriam esse ambiente, dando forma a seres míticos das águas, como as sereias, e ampliando as belezas e histórias que se contam na região.

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Os conjuntos arquitetônicos e paisagísticos de Lençóis, Rio de Contas, Mucugê e Igatu são protegidos por tombamento pelo IPHAN. São núcleos que conservaram muito de suas características originais, além de estarem situados em uma região de serras, que são protegidas por áreas de proteção ambiental e pelo Parque Nacional da Chapada Diamantina, desde os anos 1980. O patrimônio cultural da Chapada Diamantina inclui manifestações

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imateriais – festas, celebrações e saberes populares – que são vestígios da época do auge econômico das vilas e cidades da Chapada, no século XIX. Essa região, entre 1845 e 1871, foi a maior produtora mundial de diamantes, o que tornou Lençóis a terceira cidade mais importante da Bahia, entreposto comercial de exportação de minerais para a Europa e de importação de artigos de luxo. Em uma época de acelerado desenvolvimento, o processo de urbanização foi intenso, chegando a

agregar até 30 mil pessoas em torno das áreas de mineração, as quais, com a decadência da exploração, foram sendo abandonadas. Há ta m bém conju ntos de pi ntu ras rupestres, como o Complexo A rqueológico Serra das Pa ridas, no d istrito de Ta nqu i n ho, em Lençóis, formado por 18 sítios a rqueológicos. O loca l d ispõe de quatro á reas pa ra v isitação, as qua is revela m i nscrições que representa m pessoas, a n i ma is e figu ras geométricas.

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Terra de Histรณrias | Chapada Diamantina

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Durante um século, de 1745 a 1845, Rio de Contas foi o grande entreposto comercial da região. Com a descoberta dos diamantes, o domínio passa a ser de Lençóis. Entretanto, enquanto o ciclo do ouro baiano durou mais de cem anos, o diamantífero se esgotou em 25 anos. Foi o artesanato que manteve Rio de Contas depois do esgotamento das jazidas de ouro. Ainda em meados do século passado, afirmava-se que Rio de Contas era um grande centro artesanal. Lá ainda se produz o crivo rústico e peças em metal fundido e madeira.

Uma das razões foi sua localização no caminho real, que interligava o interior da Bahia às cidades mineiras através da Serra Geral, região onde floresceram a tecelagem, os bordados e a renda Marambaia, especialmente na cidade de Guanambi, grande centro produtor de algodão.

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Godó de Banana* Ingredientes: • 1 dúzia de banana-da-terra verde •3 00 g de carne do sol •2 00 g de bacon •3 00 g de linguiça defumada ou josefina •2 tomates picados • 1 cebola picada • 1 /2 pimentão maduro • 1 L de caldo de frango •2 g de açafrão da terra • 1 /2 maço de coentro •S al a gosto

Modo de preparo: 1. C orte as bananas em cubinhos e separeas em uma tigela com água. 2. C orte a carne do sol e a linguiça em pedacinhos. 3. E m uma panela, ponha uma colher de sobremesa de óleo, junte a cebola e refogue-a. 4. Acrescente o tomate, o pimentão, o coentro, o extrato e sal a gosto. 5. C oloque o bacon, a carne do sol e a linguiça, e refogue por 15 minutos. 6. L ogo em seguida, coloque a banana e acrescente o caldo de frango até forrar as bananas e deixe cozinhar até que as bananas fiquem macias e o caldo grosso.

A culinária típica da região da Chapada Diamantina inclui desde a comida dos garimpeiros até a cozinha sofisticada e contemporânea dos hotéis e restaurantes do lugar. É um convite para conhecer costumes e hábitos de um povo que viveu as riquezas do ouro e do diamante. Muitas das receitas representam um testemunho da capacidade criativa de nosso povo para adaptar os recursos disponíveis para a sua sobrevivência.

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*Receita de Cristiano Santos Ribeiro - Instrutor de cozinha do Senac

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Terra de Sabores | Chapada Diamantina

A Chapada Diamantina é privilegiada pela altitude, característica propícia para o cultivo do café, pois garante temperaturas amenas e promove o amadurecimento mais lento do fruto, fazendo com que permaneça mais tempo na planta e absorva ainda mais açúcares e sais minerais.

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Nessa região, a produção de café gourmet se destaca e vem colecionando premiações em concursos de cafés especiais em âmbitos estadual e nacional, com repercussão internacional.

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onsiderada o berço da história e da cultura do Brasil, a Costa do Descobrimento foi tombada como Patrimônio Natural Mundial pela UNESCO, em 1999. Cercada por diversos atrativos naturais – praias, baías, enseadas, falésias, recifes de corais, manguezais e rios navegáveis –, a região possui condições favoráveis para o turismo de aventura e e para o ecoturismo. Nela, diversas praias paradisíacas encantam os visitantes do local. Em Porto Seguro, as mais visitadas são Tacimirim, Taperapuã e Mundaí; em Cabrália, destacam-se Coroa Vermelha, Mutary e Arakakaí; Trancoso tem as praias de Nativos dos Coqueiros como boas

opções para banho; em Arraial d’Ajuda, existem as praias de Mucugê, Parracho, Pitinga, Taípe, Lagoa Azul, Apaga Fogo e Araçaípe; quem visita Caraíva não pode deixar de conhecer a praia do Espelho que, localizada no meio de uma falésia, está entre as mais belas do Brasil. Quando do “descobrimento” do Brasil pelos portugueses, o litoral baiano estava ocupado por duas nações indígenas do grupo linguístico tupi, os Tupinambás, que ocupavam a faixa compreendida entre Camamu e a foz do Rio São Francisco. Já os Tupiniquins se estendiam de Camamu até o limite com o atual Estado do Espírito Santo. Um pouco mais para o interior, ocupando uma faixa paralela à apropriada pelos

Tupiniquins, estavam os Aimorés. Esses grupos dominavam aqueles territórios há dois séculos. Em 9 de março de 1500, partia de Lisboa com o objetivo formal de concluir relações comerciais com as Índias, iniciadas na viagem de Vasco da Gama, uma esquadra de treze navios comandados por Pedro Álvares Cabral. O fato é que, em 21 de abril, a frota avistou o Monte Pascoal, no atual município de Porto Seguro, litoral sul da Bahia. Ali permaneceram até 2 de maio, quando rumaram para a Índia. Aqui se iniciou a formação de nosso país. A pesca constituiu atividade econômica importante na região,

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incentivando a construção naval. O cronista Vilhena, no fim do século XVIII, afirmou que a pescaria de garoupas fora da barra, em Santa Cruz Cabrália, era a maior ocupação dos habitantes da vila, além de roças de mandioca e de legumes. Viajantes relatam que existiam, em Porto Seguro, muitos barcos cobertos que capturavam garoupas, salgando-as para enviar a Salvador. Ainda hoje, a pesca constitui uma atividade econômica importante desses municípios. Apesar de ser o local de chegada dos portugueses, a região permaneceu pouco habitada até o fim do século XIX. A integração só viria com a abertura da BR-101, a Bahia–Rio litorânea, inaugurada em 1972. São as estradas que facilitaram o turismo e a expansão da pecuária, introduzindo grandes mudanças na região.

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Além do marco da realização da primeira missa nas novas terras em Coroa Vermelha, um fator importante de colonização do litoral baiano foi a ação catequizadora das ordens religiosas. Os franciscanos foram os primeiros a estabelecer contato com a nova terra. Já na expedição de Cabral, vieram oito religiosos dessa ordem, chefiados por Frei Henrique de Coimbra, que seguiram para a Índia. Por volta de 1516, chegaram a Porto Seguro dois missionários da Província de São Francisco de Portugal, que

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desenvolveram a catequese entre os Tupiniquins e a assistência religiosa aos colonos, soldados e degradados portugueses. Foram eles que construíram a primeira igreja no país, dedicada a São Francisco de Assis, e localizada no Outeiro da Glória.

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O povo Pataxó hoje vive no extremo sul da Bahia e no Nordeste do Brasil. Existem cerca de trinta aldeias nos municípios de Porto Seguro, Santa Cruz de Cabrália, Prado, Itamaraju, além de três aldeias em Minas Gerais. O povo identificado como Pata xó, segu ndo d iversas fontes h istóricas, v iv ia trad iciona l mente entre as bacias dos rios João Ti ba e São Mateus, ao su l, e Pa rdo e Contas, ao nor te, e m contato com u m bom nú me ro de out ra s et n ia s. A h istória do povo Pata xó é ma rcada por lutas e momentos de d ispersão em decorrência da i ntensa pressão que sofreu com a ex pa nsão das ativ idades da agricu ltu ra e criação de gado. Chegou a ser considerado, na l iteratu ra, como u m povo ex ti nto nos a nos 1950. Desde então, vem luta ndo pa ra se ma nter no território e ga ra nti r seus d i reitos. O a rtesa nato é hoje fonte de renda e resistência cu ltu ra l desse povo.

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“Quem chega nessa região quer conhecer os sabores e a cor locais. As pessoas valorizam os pequenos detalhes, se apaixonam pelas artes, pelo artesanato e pela gastronomia, que também é uma arte. Elas procuram algo nosso, nossa identidade, e querem levar algo que lembre quem somos.” 15.

Célia Amorim Tecelã, Porto Seguro

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Trancoso foi fundada pelos padres jesuítas em 1586. O povoado permaneceu desconhecido nacionalmente, até ser descoberto no fim dos anos 1970 pelos hippies.

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A Praça do Quadrado, um dos cartões-postais de Trancoso, é onde se encontra a bela Igreja de São João Batista, construída em 1650. Ao redor da praça, encontram-se charmosas pousadas, restaurantes e lojas, visitadas por turistas do mundo todo.

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Peixe na Folha de Bananeira e Molho de Iogurte* Ingredientes: • 1 peixe inteiro, com aproximadamente um quilo e meio • S uco de meio limão • 8 0 mL de azeite • 1 folha de bananeira • 1 maço de cheiro-verde (salsa e cebolinha) • M eio maço de coentro Modo de preparo: 1. Tempere o peixe com azeite, limão, sal, alho e salsinha batidos no processador. 2. E mbrulhe na folha de bananeira e coloque para assar em forno a 180 ºC por, aproximadamente, quarenta minutos.

Ingredientes (Molho de Iogurte): • 70 mL de iogurte natural integral • 1 limão • 2 colheres de sopa de azeite de oliva • 2 colheres de sopa de cheiro-verde Modo de preparo: 1. C oloque no liquidificador o iogurte integral, o suco do limão, 2 colheres de azeite, o cheiroverde picado, o sal e a pimenta a gosto, bata bem e reserve. 2. C oloque o peixe no prato de servir e adicione o molho por cima. Decore com folhinhas de salsa. Sirva com bananas-daterra grelhadas.

A contribuição indígena é um dos pilares da nossa culinária, além do conhecimento dos ingredientes locais, contribuíram para a formação do nosso paladar com inúmeras técnicas do fazer comer. Entre os processos empregados, podemos destacar a tecnologia de processamento da mandioca, que fornece uma enorme gama de insumos e o moqueado, técnica de assar carnes, peixes e vegetais no moquém, que é uma grelha de varas posta sobre uma fogueira. Incorporamos, ao longo do tempo, outros sabores, como o leite e o queijo, provenientes do pastoreio, cuja produção hoje é destaque no sul do Estado.

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Rio São Francisco é protagonista de muitas histórias. Sua grande extensão, sua importância como manancial e como via de transporte entre as populações ribeirinhas nos faz entender por que ele é inspiração para tantos casos, muitos reais, outros míticos, que povoam o imaginário sertanejo. Partindo da capital, Salvador, seguindo em direção a Paulo Afonso, ao norte, atravessando regiões cobertas de caatingas, vales e o Raso da Catarina, é possível conhecer o fascínio que o São Francisco e a região que serviu de cenário às andanças de lampião e seu bando, despertam.

Seguindo pelo Portal do Sertão, chegamos aos municípios que compõem a região dos lagos e cânions do São Francisco: Abaré, Paulo Afonso, Glória, Rodelas e Santa Brígida. Jeremoabo e Macururé completam a rota, incluindo o berçário e o habitat da arara-azul-de-lear (Anodorhynchus leari), a região do Raso da Catarina, área de proteção ambiental e reserva biológica, onde vivem os índios Pankararé. Paulo Afonso, polo regional, se destaca, no cenário turístico, como principal portão baiano de entrada para a região dos lagos e tem como principal atrativo a exploração do turismo de aventura e o ecoturismo. Há opções que exploram a prática de esportes, trilhas

na caatinga, passeios nos cânions do Rio São Francisco e visitas aos polos de piscicultura, com a criação de tilápia. Terra natal de Maria Gomes de Oliveira, a Maria Bonita, companheira de Lampião, o cangaceiro que angariou também muitos parceiros na região para seu bando. O município nasceu do grande potencial hidroelétrico da cachoeira de Paulo Afonso, que hoje abriga um complexo de cinco usinas, mantido pela Companhia Hidroelétrica do São Francisco (CHESF). Suas ruas, planejadas para abrigar os trabalhadores das usinas, foram arborizadas com caraibeiras (Tabebuia caraíba) que florescem anunciando a

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primavera, repleta de flores amarelas. Entre mandacarus, xique-xiques e macambiras, que são abundantes na região, destaca-se a palmeira do licuri ou ouricuri que, além das amêndoas de seu coco servirem de principal alimento das araras-azuis, possui vasta importância para o ecossistema da caatinga, contribuindo também como fonte de matéria-prima para o artesanato de cestaria, que emprega a técnica do trançado costurado, uma das importantes manifestações culturais da região.

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Região de coronéis, cangaceiros e mulheres fortes, nela também se destacaram líderes religiosos, como Pedro Batista, em Santa Brígida. Ao fixar ali sua residência, trouxe consigo uma legião de seguidores que formou o caldeirão de manifestações populares que hoje caracteriza o município.


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No sertão, a fé se faz presente no cotidiano, no imaginário de devoção. A relação com o divino se dá também por um pacto de fé no contexto simbólico religioso, como no caso do ex-voto, presente oferecido pelo fiel aos santos de devoção como sinal de agradecimento, se a promessa for

realizada. Os ex-votos assumem a forma material da graça recebida e são colocados em santuários ou cruzeiros. Assim, são comuns esculturas em madeira, cera ou argila que simbolizam partes do corpo beneficiadas pela cura de enfermidades.

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Quando chove no sertão, a caatinga renasce. As chuvas trazem os alimentos, a caatinga se transforma em um berçário para várias espécies de pássaros, como a araraazul-de-lear, que corre risco de extinção, mas também cardeais, nambus e seriemas.

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As flores tomam os campos, dominando os tons de amarelos e roxos dos Ipês, conhecidos como caraibeiras. O ciclo da vida continua: plantas, animais e o homem se renovam com a fartura de alimentos, preparando-se também para enfrentar os momentos difíceis da estiagem e da seca.

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“É da natureza que o povo aqui tira seu sustento. A preservação é importante, porque o licuri serve de alimento para os pássaros, a arara que cobiça seus coquinhos, insetos e a criação. Mas do que tudo, se não preservar não tem matéria-prima. Temos que ter consciência da nossa realidade, do nosso dia a dia. Quando a gente vê a natureza toda florida, é a coisa mais linda que tem, os besouros beijando e se alimentando delas, e é dela que tiramos nossas cores com que tingimos a palha, que também sai da natureza.” Zé de Rita Associação de Artesãos de Santa Brígida

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A mulher sertaneja se destaca pela capacidade de liderança em suas comunidades, assumindo diversos papéis, entre os quais o ofício de artesãs buscando se profissionalizar e garantir autonomia financeira, além de lutarem pela igualdade. A tecelagem, as rendas e os bordados, que antes ajudavam a configurar um espaço doméstico e íntimo, hoje representam atividades de socialização, em que o coletivo se faz além das residências, expandindo seu universo social. Além da geração de renda, buscam satisfação pessoal e realização de objetivos coletivos.

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Tilápia com Xerém* Ingredientes: • 1 tilápia com aproximadamente 600 g • S uco de 2 limões • S al • M el • 2 xícaras de chá de xerém de milho (milho quebradinho) • 3 xícaras de chá de água • 1 colher de sopa de manteiga • 1 xícara de uvas-passas • 1/2 xícara de chá de caldo de peixe • 2 colheres de sopa de óleo • 4 dentes de alho picadinhos • 1 cebola grande picadinha • 2 tomates • 1 xícara de chá de coentro e cheiro-verde picados • S al e pimenta a gosto

Modo de preparo: 1. Tempere a tilápia com o sal, o limão e o mel. Reserve. Depois de uma hora, coloque para assar no forno a 140 ºC por 30 minutos. Reserve. 2. C oloque o xerém de milho em uma vasilha com a água e deixe hidratando por algumas horas. 3. A queça uma panela e coloque o óleo. Junte o alho e a cebola e deixe fritar. Acrescente os tomates picados e refogue um pouco. Misture bem. Acrescente água quente. Coloque sal e pimenta e deixe cozinhar. Quando ferver, abaixe o fogo, tampe a panela e deixe cozinhar. Depois, acrescente o coentro, o cheiro-verde e as uvaspassas, dê uma boa misturada e desligue o fogo. 4. S irva o peixe com a farofa de xerém.

A exploração dos recursos hidroelétricos do Rio São Francisco alterou a relação entre o sertanejo do nordeste baiano com o rio. Foram-se as cachoeiras e corredeiras e foram formados lagos com a construção das barragens, que possibilitou a criação de peixes. Hoje, o município de Paulo Afonso se destaca pela produção de tilápia, que fornece além de proteína para a alimentação, o couro que é aproveitado pelo artesanato. Região de resistência indígena, seu legado persiste na alimentação com a presença do milho, que cultivado ao longo do rio é ingrediente de farofas, cuscuz e xeréns. Outro legado é a convivência com a caatinga e a identificação de suas potencialidades, que fez com que a apicultura se tornasse uma importante atividade regional.

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egião rica em história, o sertão do São Francisco, que integra o Vale do São Francisco, se projeta como uma nova zona turística a ser desenvolvida. O destino está em processo de consolidação e é formado pelos municípios de Juazeiro, Casa Nova, Curaçá, Remanso e Sobradinho, além de exercer influência sobre as regiões vizinhas, já que o município de Juazeiro, principal ponto de divisa entre os Estados da Bahia e Pernambuco, se mantém com um próspero comércio às margens do Rio São Francisco e constitui um moderno polo agroindustrial, com intensa atividade de exportação.

A cidade das carrancas e das gaiolas, antigos barcos movidos a vapor, que faziam ligação com cidades do norte de Minas Gerais, ainda guarda alguns monumentos da arquitetura civil do século passado, tendo se modernizado com a urbanização da orla fluvial, ocupada por pequenos bares e restaurantes. A proibição de criação de gado a menos de 10 léguas do litoral, formalizada em 1701, para não liquidar com as matas e prejudicar a agroindústria açucareira, estimularia a conquista do sertão do São Francisco. Por outro lado, a crescente necessidade de bois

para a movimentação dos engenhos, transportes e abastecimento alimentar, incrementava o tamanho dos currais. A eliminação quase completa dos índios Cariri, nos primeiros decênios dos setecentos, liberou uma grande área para a instalação de fazendas de gado. Só após a expulsão dos holandeses, os d’Ávilas cruzariam o Rio São Francisco e estenderiam seus rebanhos até o interior do Piauí. Dali, cruzaram o Rio Parnaíba e ocuparam o Maranhão e, já no início do século XVIII, em outra frente, voltaram-se para o leste, conquistando o Ceará.

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Além da agroindústria de fruticultura com base na irrigação, às margens do Rio São Francisco há a cultura do sisal, que é a principal fibra dura produzida no mundo, correspondendo a aproximadamente 70% da produção comercial de todas as fibras desse tipo. No Brasil, o cultivo do sisal se concentra na região Nordeste, sendo o Estado da Bahia o maior produtor nacional, com mais de 90% da produção. É uma cultura praticada por pequenos produtores, com predomínio do trabalho familiar. O sisal, além de constituir fonte de renda e emprego para um grande contingente de trabalhadores, é um importante agente de fixação do homem na região semiárida nordestina e, em algumas localidades, é a única alternativa de cultivo com resultados econômicos satisfatórios. A região do Vale do São Francisco, especialmente os municípios de Juazeiro e Petrolina, em Pernambuco,

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é referência na produção de vinhos. Favorecida por água em abundância, modernas tecnologias de irrigação, baixo índice pluviométrico e três mil horas de sol por ano, conta com uma área de 120 mil hectares irrigados e uma produção anual de 8 milhões de litros de vinho.


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Na cidade de Barra do São Francisco, importante centro oleiro, o Mestre Gerard desenvolve uma produção de imagens únicas que une as técnicas tracionais do trabalho com o barro local, como o emprego do tauá e da tabatinga, com a temática do sincretismo, que se deve à história da constituição dos cultos, os quais agruparam divindades no Brasil, quando elas eram normalmente cultuadas de modo separado e em regiões distintas, no continente africano. Desse modo, formou-se aqui uma espécie de panteão geral, tradicionalmente inexistente em qualquer lugar do Velho Continente Negro. Esse fenômeno de sincretismo interno, pois não envolveu elementos religiosos articuladores externos às culturas e às práticas africanas em seu conjunto, alude também à referência aos santos católicos que, relacionados ou de forma autônoma, mantêm os seus cultos e sua gênese própria.

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A caatinga, palavra originária do tupi-guarani, que significa “mata branca”, é o único sistema ambiental exclusivamente brasileiro. Possui extensão territorial de 734.478 km², correspondendo a cerca de 10% do território nacional. Ela está presente nos Estados da região Nordeste do Brasil e no norte de Minas Gerais. As temperatu ras méd ias a nua is são elevadas, osci la ndo entre 25ºC e 29ºC. O cl i ma é sem iá rido, e o solo, raso e ped regoso, é composto por vá rios tipos d iferentes de rochas. As secas são cícl icas e prolongadas, i nterferi ndo de ma nei ra d i reta na v ida de u ma popu lação de, aprox i mada mente, 25 m i l hões de ha bita ntes.

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Terra Mãe | Sertão do São Francisco

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As chuvas ocorrem no início do ano, e o poder de recuperação do bioma é muito rápido: surgem pequenas plantas e as árvores ficam cobertas de folhas. A ação do homem já alterou 80% da cobertura original da caatinga, que atualmente tem menos de 1% de sua área protegida em 36 unidades de conservação, onde não se permite a exploração de recursos naturais. Preservar o bioma da caatinga deve ser uma preocupação de todo artesão que adquire recursos dessa região ou nela está inserido.

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Terra de Histórias | Sertão do São Francisco

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“A cultura ribeirinha, os pescadores e as lavadeiras fizeram a cidade existir. São vários os caminhos que podemos seguir pelas lembranças e relembranças das nossas histórias. No Angari havia muitos pescadores, mas hoje estão deixando de pescar, não há mais tantos peixes. Existiam também senhoras lavadeiras que tiravam do rio seu sustento. Sem estudo, nunca olharam para elas. Eram invisíveis e achavam que podiam não ter valor, mas acordavam cedo, trabalhavam e cuidavam de suas famílias. Assim, essa força não pode cair no esquecimento. Temos de fazer com que todos saibam que elas são parte da nossa identidade.” Alda Moreira Associação Casa do Artesão de Juazeiro (ACAJ)


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O sertão pode ser interpretado como um local imaginário, mágico e mitológico, onde a natureza e o homem se unem para criar um espaço de recriações e narrativas que se fundem com a realidade, seja através da oralidade, seja das histórias de cordel, que são

acompanhadas por imagens do reino do maravilhoso e passam a povoar extensas regiões agrestes de beleza única e que instigam a nossa imaginação, assim como a dos artesãos que incorporam essa dimensão a seu trabalho.

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Terra de Sabores | Sertão do São Francisco

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Bode Assado com Chutney de Manga* Ingredientes: • 1 1/2 kg de carne de bode • 1 cebola pequena picada • 4 dentes de alho • 1 tomate picado • 1 maço de cebolinha verde • 1 maço de coentro • ½ kg de farinha • S al e pimenta-do-reino a gosto Modo de preparo: 1. R etalhe a carne de bode já limpa, tempere com sal, pimenta-doreino, alho e coloque para secar à sombra. 2. D epois de seca, corte os pedaços e misture tudo com ½ kg de farinha, um pouco de água para não ensopar e óleo fervente. 3. L eve ao forno e deixe assar até que fique bem sequinho. 4. E nquanto estiver assando, regue com o próprio caldo ou acrescente água, se necessário,

para que a carne não fique ressecada. 5. S irva com molho e farofa. Ingredientes (Chutney de Manga): • 2 xícaras de vinagre, pode ser tinto ou de maçã • 2 xícaras de açúcar refinado • 2 mangas grandes e firmes • 1 raiz de gengibre • 3 dentes de alho picados • 1/2 colher de chá de sal • 1 pau de canela • 2 cravos Modo de preparo: 1. M isture o vinagre e o açúcar em uma panela, mexa bem e leve ao fogo baixo. 2. D eixe levantar fervura. 3. C oloque as mangas picadas em cubos e o restante dos ingredientes. 4. D eixe cozinhar, até que as mangas fiquem bem macias e o caldo grosso, e coloque o cravo e a canela, e deixe apurar o sabor.

Desde as suas origens, na Bahia dos tempos de colônia, a criação do gado procura por novas pastagens, a construção de pousos e currais ajudaram a consolidar a conquista e o desbravamento dos sertões. Porém, foram os caprinos que melhor se adaptaram às condições do clima semiárido e da caatinga. O bode assado ou cozido se impõe, portanto como o principal prato do Sertão do São Francisco. A presença do rio, que alimenta também os projetos de irrigação da região, possibilita a produção de frutas tropicais para exportação, como a manga. Já a atividade vinícula, produz na região vinhos que se harmonizam muito bem com a carne do carneiro e do bode.

186 *Receita de Cristiano Santos Ribeiro - Instrutor de cozinha do Senac


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Agradecimentos Prestamos nossas homenagens aos artesãos que recriam cotidianamente saberes ancestrais através do fazer e que dão novos sentidos e identidade ao nosso mundo. Profissionais que transformam com seu trabalho matérias-primas, muitas vezes insuspeitas, em variada beleza, nos enchendo de admiração pela inventividade e expressividade.

Que continuem a incorporar conhecimentos de ponta, que potencializem seus esforços produtivos e criativos, e o permitam ser a ponte destes conhecimentos com as gerações seguintes.

Os fazeres artesanais hoje aglutinam vários profissionais gestores, designers, administradores, arquitetos, antropólogos e parceiros comerciais, que possibilitam a interação das sensibilidades individuais, dos saberes tradicionais e coletivos, com as necessidades técnicas atuais do artesão.

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Legendas Mosaico de bordados e rendas da Bahia. Autoria Andreia Caetano. Capa Mosaico de bordados e rendas da Bahia. Autoria Andreia Caetano/ Penca de Balangandãs. Aguilardo Teixeira. Salvador Guardas INTRODUÇÃO

SALVADOR E BAÍA DE TODOS-OS-SANTOS

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COSTA DOS COQUEIROS

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COSTA DO CACAU

COSTA DO DENDÊ

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CHAPADA DIAMANTINA

COSTA DO DESCOBRIMENTO

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PORTAL DO SERTÃO

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SERTÃO DO SÃO FRANCISCO

AGRADECIMENTOS XI Rodada de Negócios para o Artesanato da Bahia. Promovido pelo SEBRAE em 2018. Artesãos, gestores e consultores. Casa do Comércio. Salvador. Bahia.

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Expediente Serviço de Apoio às Micro e Pequenas Empresas Bahia – Sebrae Conselho Deliberativo do Sebrae Bahia Antônio Ricardo Alvarez Alban Diretoria da Superintendência Jorge Khoury

Consultoria Fátima Seabra Fernanda Mesquita Rua Horácio César, 64 – Dois de Julho Salvador – Bahia - CEP: 40060-350 0800 570 0800 www.ba.sebrae.com.br

Diretoria Técnica Franklin Santana Santos Diretoria Administrativa-Financeira José Cabral Ferreira Unidade de Atendimento Coletivo Célia Fernandes (gerência) Ana Paula Almeida (coordenação de Turismo e Economia Criativa) Tatiana Martins da Silva (coordenação de Artesanato)

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Conteúdo Andreia Caetano Rodrigo Lyra Tatiana Martins da Silva

SENAR BAHIA CONSELHO ADMINISTRATIVO Presidente do Conselho Administrativo Humberto Miranda Oliveira Superintendente Carine Menezes Magalhães Rua Pedro Rodrigues Bandeira, 143 – Comércio Salvador – Bahia - CEP: 40015-080 (71) 3415-3100 www.sistemafaeb.org.br


Colaboradores Convidados Goya Lopes Maria Paula Fernandes Adinolfi Maria Virgínia Gordilho Martins Mônica Silva Raul Lody Editoração Yayá Comunicação Integrada Fotos Todas as fotos de produtos, artesãos e gastronomia desta publicação são de autoria de Valmir Martins, exceto: Foto 13 - Salvador e Baía de Todos-os-Santos, Luiz Henrique Castro Nunes. Fotos 15 e 16 - Salvador e Baía de Todos-os-Santos, Roger Conrado. Foto 19 - Costa do Dendê, iStock Photos. Foto 12 - Costa do Dendê; Foto 14 - Portal do Sertão, Andreia Caetano. Fotos 4 e 6 - Costa do Cacau, Helbert Bastos Magalhães.

Foto 8 - Costa do Dendê; Foto 19 - Portal do Sertão, domínio público. Foto 6 - Chapada Diamantina; Fotos 10 e 11 - Sertão do São Francisco, Rodrigo Lyra. Foto 9 - Costa do Descobrimento; Fotos 12, 13, 14, 15 e 17 - Sertão do São Francisco, Overbrand Imagens, Mário Bestetti. Foto de agradecimento: Soraia Carvalho. Todas as fotos de paisagens desta publicação são do Banco de Imagens iStock Photos, exceto: Fotos 1 e 6 - Portal do Sertão, Ministério do Turismo disponível em www.flickr.com/photos/mturdestinos. Foto 8 - Costa do Descobrimento, Overbrand Imagens, Mário Bestetti. Impressão Qualigraf - Serviços Gráficos e Editora Ltda. Publicação Novembro/2019. Tiragem 300 exemplares.

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Bibliografia ALVES, Marieta. Dicionário de artistas e artífices na Bahia. Salvador, UFBA, 1976. ARAÚJO, Nelson de. Pequenos Mundos - Um Panorama da Cultura Popular da Bahia. TOMOS I, II E III. Universidade Federal da Bahia, Fundação Casa de Jorge Amado. Salvador. 1986, 1996 e 1998. ARTESÃO DE PORTO DE SAUÍPE ASSOCIADOS. Trançados de Porto de Sauípe. Entre Rios, s.d. BAHIA. Secretária da Cultura e Turismo Superintendência de Desenvolvimento do Turismo. Roteiro Ecoturistico da Bahia. Baia de Todos-os-Santos/ Costa dos Coqueiros/ Costa do Dendê/ Costa das Baleias/ Costa do Descobrimento (Coleção Turismo). A Secretaria. Salvador. 2002. BORGES, Adélia. Design, artesanato: o caminho brasileiro. São Paulo. Editora Terceiro Nome, 2011. BRASIL, Ministério da Educação. Secretaria de Cultura. Tecelagem manual no Triângulo Mineiro. Brasília, 1984. CASCUDO, Luís da Câmara. Rede de dormir - uma pesquisa etnográfica: etnografia e folclore clássico. Rio de Janeiro. Editora Funarte. INF, 1983.

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