Jornal Lampião - edição 12

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Abril de 2012

Edição: Nome dos Editores Edição: Nome dos Editores

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Jornal Laboratório I Comunicação Social - Jornalismo I UFOP I Ano 3 - Edição Nº 12 - Dezembro de 2013

Eu te anuncio nos sinos das catedrais Caderno especial

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Abra o guarda-chuva, vem água por aí...

Quanto vale a alimentação básica em Mariana?

Natal motiva ações solidárias na cidade

Tradição que flui entre as margens do Ribeirão

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Dezembro de 2013 Arte: Pedro Carvalho

Editorial

Tirinha

Possibilidades e descobertas LAMPIÃO é conhecer e reconhecer por experiência, é tentativa, é a busca por um novo jeito de se fazer um jornal impresso no mundo padronizado do papel. É fato que o jornalismo vive uma constante mutação e por isso nos propomos a fazer do LAMPIÃO parte de um processo de mudança, já que estamos em um lugar de aprendizado, mas sem perder a sua qualidade. É tempo de possibilidades e descobertas, de ousar e de mexer em time que está ganhando por não temer a sensação de experimentar algo novo. A 12ª edição do LAMPIÃO chega às ruas com diversas novidades. Começando pela equipe, o jornal ganhou ajuda extra nesta edição com a chegada da professora Denise Figueiredo, que reforçou a orientação dos repórteres. Além disso, dessa vez contamos com uma equipe de produção composta por três turmas, de 25 alunos cada, o que fez com que o nosso jornal ganhasse quatro páginas e aumentasse o espaço de discussão de temas que interessam aos nossos leitores.

Com essa nova possibilidade, surge o caderno especial, que aborda algo que é muito peculiar na Região dos Inconfidentes, o patrimônio histórico arquitetônico. Pensando em promover reflexões e críticas sobre o tema, nossos repórteres e fotógrafos foram às ruas para retratar esta realidade, trabalhando basicamente a partir de três ângulos: tradição, manutenção e dilemas. O tema que abre o caderno destaca os 300 anos da Catedral da Sé e sua importância na vida dos marianenses. Em seguida, abordamos as indefinições sobre as obras do PAC destinadas aos monumentos de Mariana e Ouro Preto. E encerramos o caderno evidenciando os dilemas que permeiam os patrimônios históricos: impasses, descaracterizações e custos. Nessa edição também buscamos registrar problemas que afetam diretamente o patrimônio do LAMPIÃO: nossos leitores. A chuva é um tema recorrente em todo fim de ano e agora é mostrada através de um levantamento das obras

que foram feitas com a criação de um plano de contingência, servindo como prévia do que podemos esperar para o verão na cidade. A Arena Mariana também é destaque dentre os transtornos que a população enfrenta. A dificuldade para utilizar o espaço, as obras inacabadas (sem previsão de término) e o problema com a nova lei dos assentos fazem com que esse tema reapareça no jornal. Outra novidade dessa edição é o espaço destinado aos distritos, na página 15. Com o problema de locomoção que nos impede de retratar essas regiões no jornal da mesma forma que falamos sobre Mariana e Ouro Preto, a ideia dessa “coluna” é contar histórias dos personagens reais que vivem afastados dos centros das cidades e a primeira história a ser contada aqui é sobre a tradição dos balaios presente em Lavras Novas. Para fechar a edição, um ensaio de encher os olhos, sobre quem sempre vemos e nunca observamos. Viva as mudanças!

LAMPIÃO premiado três vezes Com dois anos de existência, 12 edições, e inovando a cada semestre, o jornal LAMPIÃO encerra 2013 recebendo mais um reconhecimento da comunidade. Dessa vez, dos “coleguinhas” jornalistas, que elegeram a reportagem “Mulheres no Cárcere”, da aluna-repórter Jéssica Romero, publicada na 9ª edição do LAMPIÃO, como uma das três melhores na categoria Impresso (Estudantes) no 7º Prêmio Délio Rocha de Jornalismo de Interesse Público. Única universidade federal contemplada nessa categoria, a reportagem conquistou o 2º lugar. O prêmio é concedido pelo Sindicato dos Jornalistas Profissionais de Minas Gerais. Em setembro deste ano, o jornal foi contemplado na categoria Comunicação, do Tro-

féu Comunidade 2013, realizado pela TV Top Cultura, de Ouro Preto, por meio da Fundação Cultural de Minas Gerais. A premiação destaca personalidades e instituições de Ouro Preto e Mariana, que buscam trabalhar pelo desenvolvimento e bem-estar da população. A seleção é feita pelo Conselho Consultivo da Top Cultura. São contempladas as categorias: Educação, Saúde, Ação Social, Trabalho Comunitário, Cultura, Patrimônio Histórico, Turismo, Meio Ambiente, Comunicação, Esporte e Lazer. Em maio, durante o Congresso Intercom Sudeste, realizado em Bauru (SP), o jornal conquistou, pelo segundo ano consecutivo, o Prêmio Expocom na categoria Jornalismo Impresso, como me-

lhor jornal-laboratório da Região Sudeste. Nessa premiação, concorrem trabalhos experimentais realizados por estudantes de Jornalismo. O prêmio é concedido pela Sociedade Brasileira de Estudos Interdisciplinares da Comunicação (Intercom). O LAMPIÃO é um produto laboratorial do curso de Jornalismo da Universidade Federal de Ouro Preto (Ufop), realizado pelos estudantes do 5º e 6º períodos na disciplina Laboratório Impresso I – Jornal, sob orientação de professoras de redação e reportagem, fotografia e planejamento visual. VEJA OUTRAS INFORMAÇÕES NA VERSÃO ONLINE: http://migre.me/ gLPoL

Lampejos “Rezando, suspirando, gemendo e chorando. Depois de cinco anos o crime prescreveu. Mas não na arte. A gente ainda tem esperança. Todo o ano eu toco o sino, mesmo sendo proibido. É a melhor forma de lembrança”. Padre Simões. Pág 9

“Os exercícios são bem prazerosos. Cada uma de nós tinha algum problema como dor ou depressão. Hoje as dores melhoraram, outras colegas dizem que não fazem mais uso de remédios e que até ajudou na cura da depressão”. Maristela Avelino, dona de casa. Pág. 12

“Eu acho que o cenário musical daqui é muito rico, principalmente se comparado a outras cidades do mesmo porte no interior de Minas”. Vitor Oliveira, baterista da Groove de Vinil.

“Os produtos do distrito me trazem a gostosa lembrança da minha infância. Apesar de atualmente morar na cidade, os doces artesanais trazem um pedaço do campo para o meu cotidiano”. Pastor Cilas de Oliveira. Pág. 13

Pág. 15

“Eu aprendi muito mais na regular, mas na questão de cuidado a Apae é melhor, não porque eles (a escola regular) não querem, mas como vão dar atenção pra todo mundo?”. Deisilaine Costa, estudante da Apae. Pág. 6

“Precisamos passar por uma reestruturação viária, que inclui não só a questão do trânsito, mas também, questões sociais e econômicas”. Alexsandro Nunes de Oliveira, comandante da Guarda Municipal de Ouro Preto. Pág. 4

Entre Olhares Gabriel Koritzky

O Mapa

Entre olhares

Quando eu for, um dia desses, Poeira ou folha levada No vento da madrugada, Serei um pouco do nada Invisível, delicioso Que faz com que o teu ar Pareça mais um olhar, Suave mistério amoroso, Cidade de meu andar (Deste já tão longo andar!) E talvez de meu repouso… Mário Quintana

Fale Conosco Jornal Laboratório produzido pelos alunos do curso de Jornalismo – Instituto de Ciências Sociais Aplicadas (ICSA)/ Universidade Federal de Ouro Preto – Reitor: Prof. Dr. Marcone Jamilson Freitas Souza Diretor do ICSA: Prof. Dr. José Artur dos Santos Ferreira. Chefe de departamento: Profa. Dra. Ednéia Oliveira. Presidente do Colegiado de Jornalismo: Prof. Dr. Ricardo Augusto Orlando – Professores responsáveis: Adriana Bravin (Reportagem), Denise do Prado (Reportagem), Ana Carolina Lima Santos (Fotografia) e Priscila Borges (Planejamento Visual) – Editoras chefes: Janine Reis e Maysa Alves - Sec. de redação: Mylena Pereira - Editora de Arte: Rosi Silveira - Editor de fotografia: Pablo Bausujo - Editor Multimídia: Marcos Resende - Reportagem: Bianca Cobra, Carolina Brito, Caroline Gomes, Dalília Caetano, Daniela Júlio, Daniella Andrade, Dayane Barreto, Éllen Nogueira, Ester Louback, Fernanda Belo, Fernanda de Paula, Fernanda Marques, Geovani Fernandes, Gisela Cardoso, Hiago Maia, Isadora Lira, Isadora Ribeiro, João Gabriel Nani, Júlia Mara Cunha, Kênia Marcília, Rafael Melo, Roberta Nunes, Teka Lindoso, Thaís Corrêa, Viviane Ferreira - Fotografia: Bárbara Monteiro, Gabriel Koritzky, Filipe Monteiro, Giuseppe Rondoni, Jéssica Moutinho, Kaio Barreto, Marllon Bento, Osmar Lopes, Paula Bamberg, Rodrigo Pucci, Rosana Freitas, Tamara Pinho, Thiago Anselmo, Thiago Huszar - Diagramação: Aldo Damasceno, Ana Elisa Siqueira, Bruna Fontes, Bruna Lapa, Danielle Diehl, Isabella Madureira, Israel Marinho, Laura Vasconcelos, Lucas Machado, Maria Fernanda Pulici, Mayra Santos Costa, Nathália Souza, Pedro Carvalho, Túlio dos Anjos - Multmídia: Bárbara Monteiro, Hiago Maia, Filipe Monteiro, Gabriel Koritzky, Júlia Mara Cunha, Maria Fernanda Pulici, Mayra Santos, Marllon Bento, Pedro Carvalho, Rodrigo Pucci - Revisão: Cristiano Gomes, Hélen Cristina, Cristiane Guerra, Jéssica Michelin - Monitora: Isabela Azi - Colaborador: Neto Medeiros - Tiragem: 3.000 exemplares. Endereço: Rua do Catete, n° 166, Centro. Mariana - MG. CEP 35420-000

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Dezembro de 2013 Arte: Túlio dos Anjos

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cidade

Mariana em guerra com a chuva Após 11 anos, o município volta a ter um plano para reduzir problemas causados pelos temporais; vistorias e obras de prevenção já foram realizadas, mas algumas ainda não foram concluídas; volume de água será até 40% maior que em 2011/2012 Marllon Bento

lincon zarbietti

Gisela Cardoso Inundações, enchentes e deslizamentos de terras são episódios que se repetem durante o período de chuva, em Mariana. Em dezembro de 2011, a cidade foi incluída na lista dos 21 municípios mineiros que decretaram estado de emergência devido aos fortes temporais. Já no fim do ano passado, entre 15 e 19 de dezembro, foram registrados 13 deslizamentos no município. Cerca de 200 pessoas ficaram desalojadas e 88 desabrigadas, segundo o Corpo de Bombeiros e a Defesa Civil. A doméstica Maria Aparecida Souza, moradora do Bairro Vale Verde, foi uma das pessoas que deixou sua casa por conta das chuvas. “Começaram a surgir rachaduras na minha casa, e nos disseram que a gente tinha que sair, pois o barranco poderia ceder a qualquer hora. Eu e minha família fomos para a casa de um parente, mas com o medo de voltar e não encontrar mais nada no lugar”, contou a moradora. De acordo com as previsões, as águas não tendem a ficar mais calmas para o fim deste ano. Segundo a Coordenadoria Estadual de Defesa Civil (Cedec-MG), a próxima temporada – que começa este mês e vai até o fim de janeiro de 2014 – será ainda mais carregada de raios, e com volume de água previsto de 437,9 milímetros – ou seja, 30% a 40% maior do que no mesmo período em 2011 e 2012, que foi

aproximadamente de 262,74 milímetros. No entanto, para reverter os quadros anteriores, a Prefeitura de Mariana já mobilizou a equipe da Defesa Civil municipal. Segundo o coordenador da Defesa Civil, Welbert Stopa, foram feitas 160 vistorias em áreas de risco na cidade e 60 nos distritos. As áreas mais vulneráveis são os bairros Santa Rita de Cássia, Cabanas, Vale Verde, Rosário, São Gonçalo e Santo Antônio. “Em todos os bairros nós tivemos algum transtorno causado pela chuva do período passado. Nós visitamos e emitimos um relatório aos órgãos responsáveis, e tomamos providências”, informou o coordenador Welbert Stopa. Além do mapeamento das áreas de risco, obras de prevenção estão sendo realizadas, assim como palestras educativas nas comunidades. Em novembro, a Defesa Civil lançou o Plano de Contingência para o período chuvoso de 2013 e 2014. O evento, que foi aberto ao público, contou com a presença de representantes da prefeitura, Guarda Municipal, Corpo de Bombeiros e da Polícia Militar. O plano consiste em estabelecer diretrizes e logísticas operacionais de preparação, prevenção e resposta que serão desencadeadas por todos os órgãos do município. Este é o primeiro Plano de Contingência de Mariana desde o ano de 2002. Sobre as obras de preven-

Em 2011, a Igreja do Rosário teve parte do cemitério destruido pela chuva. Apesar disso, nenhuma ação preventiva foi realizada

ção, o secretário interino de Obras e Planejamento de Mariana, Leandro Rodrigues dos Santos, diz que já foram investidos, até o momento, aproximadamente R$ 8 milhões em contratos de execução de serviços. Alguns projetos incluem a construção de muros de gabião às margens dos córregos que desaguam no Ribeirão do Carmo, como no Bairro Santo Antônio, e no córrego Ma-

tadouro, na Rua Senador Bawden. Também foi construído um muro de contenção na encosta da Rua Erico Veríssimo, no Vale Verde – um dos locais que mais sofreu com as últimas chuvas. A Defesa Civil garante que, a partir de agora, os moradores não terão mais problemas com deslizamentos de terras. Confira, abaixo, a relação das obras de prevenção no município.

Obras em Mariana Realizadas: 1 Construção de dois muros de contenção no Bairro Santana (Ruas Senador Bawden e Lucy de Moraes). 2 Construção de dois muros de contenção no Bairro Santo Antônio (próximo à ponte de madeira e abaixo da creche CMEI Santo Antônio). 3 Construção de muro de contenção estaqueado no Bairro Vale Verde (Rua Érico Veríssimo). 4 Limpeza dos córregos adjacentes de Mariana (iniciada na Rua Cônego Amando, do Bairro Chácara).

5 Desassoreamento do Rio Brumado, localizado no distrito de Cachoeira do Brumado. 6 Construção de um muro de gabião no Bairro São Cristóvão (acesso à Vila Maquiné). 7 Construção de muro de matacão, enrocamento e pavimentação na estrada de acesso ao distrito de Paracatu. 8 Desassoreamento e limpeza do Ribeirão do Carmo (iniciado na Rua São Jorge, do Bairro Colina, e na Rua Cascalheira do Bairro Barro Preto).

Não concluídas: 1 Retaludamento, drenagem e estabilização das encostas na Avenida Nossa Senhora do Carmo. 2 Obras de contenção na Cartuxa, Santa Rita de Cássia, alto do Rosário e Colina.

3 Retaludamento na encosta do Bairro São Gonçalo. 4 Desassoreamento dos rios dos distritos de Bandeirantes e Monsenhor Horta.

Correndo contra o tempo Gisela Cardoso Apesar da iniciativa da Defesa Civil e das obras realizadas pela prefeitura, ainda há um longo caminho pela frente para evitar maiores estragos e transtornos causados pelas chuvas que se aproximam. A conclusão da obra do talude na Avenida Nossa Senhora do Carmo, estava prevista para setembro, mas foi transferida para este mês. Segundo o vice-prefeito Duarte Eustáquio Gonçalves Júnior (Du), o atraso foi devido às chuvas dos últimos meses. No final do mês passado, quando foi apurada esta reportagem, a nova previsão para a finalização do talude era de 30 dias. As margens do Ribeirão do Carmo, no Bairro Santana, ainda necessitam de maiores cuidados. As casas ribeirinhas poderão ser facilmente inundadas em épocas de cheias. Além disso, o muro de algumas delas está visivelmente

inclinado, podendo desabar a qualquer momento - consequência da erosão próxima às margens. O vice-prefeito também se manifestou a esse respeito. “O que mais me preocupa é o Ribeirão do Carmo. Estamos planejando muros de contenção na beira do rio, e o gabinete do prefeito já os pediu com urgência”, afirmou Duarte Eustáquio Gonçalves Júnior. Além disso, as obras do talude na encosta do Bairro São Gonçalo já foram iniciadas, e também na Rua Bahia, do Bairro Colina. De acordo com o vice-prefeito, essas obras ainda não têm uma data de finalização exata, mas a previsão é que sejam concluídas antes do período crítico de chuvas previsto para este mês. VEJA O MAPEAMENTO DAS ZONAS DE RISCO NA VERSÃO ONLINE EM: http://migre. me/gHNTv

Moradores sofrem com risco constante Kaio Barreto

Família de Karine convive com a insegurança de ter uma lona como parede

Dayane Barreto O Ribeirão do Carmo atravessa toda a cidade e chegou a lhe dar nome quando Mariana ainda era um arraial. Nas épocas mais chuvosas, o nível do rio sobe e ele ganha força. Os moradores da Rua Alfredo de Morais, no Bairro Santana, conhecem bem o poder do Ribeirão quando chove muito. Em dezembro de 2011, a força das suas águas derrubou um muro de contenção, ao longo do leito, levando embora a murada dos fundos de diversas casas. Segundo a moradora Karine de Almeida Procópio, durante a limpeza do leito do rio, a contenção cedeu devido à retirada das pedras que ajudavam a segurá-la. A cena foi desesperadora, o muro de contenção começou a puxar os fundos das casas e tudo que se encontrava no quintal: fogão, máquina de lavar e até um galinheiro fo-

ram levados rio abaixo, enquanto os moradores tentavam puxar e salvar o que ainda era possível. “Começou a trincar desde lá de cima e foi caindo tudo”, recorda a dona de casa Tânia Maria de Melo, de 50 anos. Como se não bastasse o risco de enchente, os moradores da Alfredo de Morais ainda sofrem com as enxurradas que vêm do Bairro Galego, e sem escoamento apropriado, chegam a inundar as casas. “A gente sente como se não fizesse parte da cidade, como se aqui fosse uma ocupação irregular”, reclama a moradora Karine. O próximo período de chuvas se aproxima e quem mora ali se preocupa. “Pode acontecer do rio encher muito e a água derrubar o resto do barranco. Esse é o nosso maior medo”, relata o estudante Márcio Flavio de Melo, 30 anos. Depois do incidente em 2011, as pedras foram

recolocadas, mas os quintais das casas continuam abertos, sem muro, o que faz com que os moradores enfrentem também o perigo de furtos. A dona de casa Maria da Conceição Delfino, 50 anos, conta que até sua caixa d’água, que estava no quintal, foi roubada. “Eles entram sempre durante a noite, não posso deixar mais nada lá fora”, diz. As trincas que insistem em aparecer a cada dia nas paredes das casas formam uma espécie de mapa de uma tragédia anunciada. “Se chover mesmo o tanto que estão falando que vai chover esse ano, eu posso dar tchau pra essa casa”, lamenta Maria da Conceição. O tempo que Karine viveu às margens do Ribeirão do Carmo lhe ensinou a compreendê-lo. “Esse rio aqui prega cada peça, só a gente que mora aqui há mais de 30 anos é que sabe do que ele é capaz”.


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Dezembro de 2013 Arte: Mayra Santos Costa

CIDADE

Estresse constante, solução distante Previsto para 2015, o Plano de Mobilidade Urbana pretente resolver problemas no trajeto entre Ouro Preto e Mariana Bárbara monteiro

Fluxo intenso de veículos em horários de pico torna trânsito mais lento no Alto da Cruz

Caroline Gomes Estresse e cansaço. O deslocamento entre as cidades de Ouro Preto e Mariana se tornou motivo de revolta entre os passageiros. O que antes era um passeio realizado em trinta minutos, hoje é uma viagem que pode durar mais de uma hora. O número de veículos que circulam pelas cidades, a lentidão do transporte público e a estrutura de algumas ruas contribuem para que o trajeto de 12 km se torne mais longo. Mesmo com a presença de guardas municipais e câmeras de monitoramento, a falta de sinalização e o estreitamento da rua dificultam um controle mais rigoroso do congestionamento local. Um dos principais casos é a estrada que passa pelos Bairros Alto da Cruz até a saída do Taquaral, em Ouro Preto. Em busca de solucionar o transtorno, a Guarda Municipal de Ouro Preto, em parceria com o Instituto da Mobilidade Sustentável (Ruaviva), está elaborando o Plano de Mobilidade Urbana, que tem previsão para entrar em vigor no início de 2015. “O Plano de Mobilidade Urbana vai traçar rotas alternativas. Precisamos passar por uma reestruturação viária, que inclui não só a questão do trânsito, mas também, questões sociais e econômicas”, diz o comandante da Guarda Municipal de Ouro Preto, Alexsandro Nunes de Oliveira. O Plano de Mobilidade Urbana irá facilitar a vida de pedestres e condutores, além de torná-la mais segura. Isso porque durante a passagem em vias engarrafadas, muitos veículos tentam circular pelas calçadas, causando transtorno aos pedestres. Os motoristas também ficam muito incomodados com os congestionamentos. É o que conta o Lúcio Flávio, 39 anos, que transporta os universitários para Mariana. “O congestionamento dificulta muito, porque de três a quatro minutos que você perde ali, já atrapalha tudo. Antigamente era bem melhor, porque a gente chegava rápido, hoje em dia demora muito”, diz Lúcio. O engarrafamento não atrasa somente os motoristas, mas também as pessoas que dependem do transporte público, boa parte da

população, para se deslocarem de uma cidade para outra. O tempo gasto no percurso reflete diretamente no dia a dia dos passageiros que, para se adaptarem aos horários e às variações de tempo dos ônibus, mudam de rotina. O atendente Marcus Alves, 23 anos, é um dos usuários e passa por essa situação todos os dias. “Trabalho em Mariana e preciso pegar esse ônibus de segunda a sexta. Para chegar lá às 8h, preciso pegar o ônibus com, no mínimo uma hora de antecedência. Se não, corro o risco de chegar atrasado ao meu serviço. É muito desconfortável essa situação, porque eu tenho que adiantar sempre o meu horário”, diz o usuário. Em nota de esclarecimento a empresa Transcotta Turismo explica que o percurso entre Ouro Preto e Mariana deve ser realizado em aproximadamente uma hora, por determinação do Departamento de Estradas de Rodagem de Minas Gerais (DER/MG). “É importante salientar que existe uma lentidão dentro das cidades de Ouro Preto e Mariana como em todo o percurso que as une, quer pelo grande número de caminhões e carros de passeio que ali trafegam, como também pelos inúmeros declives e curvas perigosas, aliando tudo isto às paradas para embarques e desembarques de passageiros”, afirmou a empresa. Outro aspecto que influencia na questão dos engarrafamentos e, consequentemente, no aumento do tempo gasto pelo transporte público são os motoristas infratores. “São condutores que ignoram a sinalização e estacionam em lugares proibidos. Há um número significante, ainda, de pessoas que dirigem falando ao celular mesmo com todas as campanhas públicas preventivas”, afirma o comandante da Guarda Municipal de Ouro Preto. Sair de casa com antecedência, escolher caminhos alternativos e mentalizar coisas boas quando estiver no trânsito podem ser medidas provisórias para evitar a “dor de cabeça” do dia a dia. Enquanto pedestres e motoristas esperam pela implantação do Plano de Mobilidade Urbana, paciência, tranquilidade e bom senso não tem contraindicação.

“Rodovia da morte” ainda é um problema Geovani Fernandes Notícias sobre acidentes nas estradas do país não são novidade nos jornais. Com o aumento do tráfego nas rodovias brasileiras durante os feriados, esse risco é ainda maior. De acordo com o Ministério dos Transportes, dados da Polícia Rodoviária Federal (PRF) e estudos do Instituto de Pesquisa Econômica Aplicada (IPEA), cerca de 50 pessoas morrem por dia nas estradas, ruas e avenidas nacionais. Segundo o Departamento Nacional de Trânsito (Denatran), cerca de 20 mil mortes acontecem anualmente. Em Mariana não é diferente. Na Rodovia do Contorno, MG 129, km 143, próximo à distribuidora da Skol, os acidentes constantes são um transtorno na vida dos cidadãos do Bairro Cruzeiro do Sul, onde está localizado o trecho conhecido pelos marianenses como “rodovia da morte”. De fevereiro à outubro desse ano, a imprensa noticiou três acidentes com cinco vítimas fatais. Curvas sinuosas e o declive acentuado nos dois lados da pista, estimulam o aumento de velocidade dos veículos, elevando as chances de acidentes graves ocorrerem. Em dias de chuva, o risco é ainda maior, pois a pista se torna escorregadia. O Departamento de Estradas de Rodagem de Minas Gerais (DER/ MG) diz que uma das causas para o aumento do número de acidentes foi o crescimento populacional registrado nas últimas décadas nas proximidades da pista, criada há trinta anos para a retirada do tráfego na cidade. Para a moradora do bairro Elizabeth da Silva, animais na pista e a im-

Rodrigo Pucci

Excesso de velocidade e desrespeito às placas de sinalização, imprudências comuns no km 143, são algumas das causas de acidentes

prudência dos motoristas são outros fatores que contribuem para a ocorrência dos desastres. O Presidente da Associação Comunitária do Bairro Santana, que abrange os bairros Cruzeiro do Sul e Bandeirantes, José Geraldo Borges, diz que os problemas ocorrem há muitos anos e já se reuniu diversas vezes com vários prefeitos para discutir possíveis soluções. Em reunião feita no dia 2 de outubro entre o prefeito Celso Cota e a Associação, os moradores apresentaram ofícios feitos de 2008 até 2013, que pediram soluções rápidas,

como instalação de um radar, quebra-molas e proteção do viaduto. O prefeito diz que a responsabilidade do trecho é do Governo do Estado, mas alega que há um projeto junto a Câmara dos Vereadores para a municipalização da rodovia. Para que isso se efetive, é necessária a aprovação do DER/MG. A Câmara afirma que há três propostas apresentadas nas assembleias desse ano, que visam a melhoria do local. Entre elas, estão a instalação de semáforos para motoristas e pedestres, construção de passare-

las e obras de drenagem na margem esquerda da rodovia. Ainda segundo a Câmara, o aumento do risco de acidentes é causado pela depredação da sinalização da pista e pelo uso irregular das margens da rodovia como estacionamento. O DER/ MG informa que a 17º Coordenadoria de Ponte Nova é a regional responsável por esse trecho. Essa Coordenadoria não deu mais detalhes sobre projetos para aumentar a segurança do km 143, mas diz haver uma vistoria e estudos sendo feitos junto à Prefeitura nos trechos de

sua responsabilidade. Para a Coordenadoria, uma possível solução é a construção de um novo trevo ou rotatória na região. Desde março de 2010, a Secretaria de Transporte realiza obras de recuperação e manutenção da rodovia, enquanto a conservação permanente é feita pelo DER/MG. O Departamento de Estradas de Rodagem informa também que foram feitas obras de recapeamento da pista de rolamento, sinalização horizontal e vertical, recomposição de aterros e de trechos defeituosos da pista.


Dezembro de 2013 Arte: Maria Fernanda Pulici

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economia

Custo da alimentação em Mariana Valor da cesta básica no município chega a consumir mais de um terço do salário mínimo filipe monteiro

Produtos orgânicos, como os vendidos por Vanderli, são mais valorizados que os tradicionais

Isadora Ribeiro Açúcar, arroz, banana, batata, café, carne, farinha de trigo, feijão, leite, margarina, óleo, pão e tomate. Com apenas 13 produtos, a cesta básica correspondeu a R$ 233,19 do salário mínimo em Mariana no mês de outubro, o que representa mais de 30% do valor total. Esses produtos compõem a cesta básica oficial, que é diferente da tradicionalmente vendida nos supermercados. Baseada nas despesas com alimentação de um trabalhador adulto, a cesta básica foi ofi-

cialmente decretada pelo Governo Federal em 1938. É importante lembrar que ela não representa todos os gastos de um indivíduo com alimentação, mas pode ser adotada como referência para a análise do poder de compra do salário mínimo na cidade. Para fazer o cálculo médio do valor da cesta básica, os produtos são analisados em quantidades padronizadas e considerados pelas marcas mais baratas (ver infográfico). De acordo com o projeto de extensão CiDATAnia, da Universidade Federal de

Ouro Preto (Ufop), o custo da cesta básica em Mariana representou, no mês de agosto, 34,62% do salário mínimo, que é de R$ 678,00. Em setembro, a porcentagem foi de 33,9% e em outubro subiu para 34,39%. Se pouco mais de um terço da renda dos trabalhadores que recebem um salário mínimo mensal vem sendo gasto somente com a cesta básica, será que os outros dois terços são suficientes para suprir as demais despesas do mês? Segundo o Departamento Intersindical de Estatística

e Estudos Socioeconômicos (Dieese), o Salário Mínimo Necessário, que é uma estimativa de quanto deveria valer o salário mínimo nacional, equivaleu a R$ 2.729,24 no mês de outubro. Esse valor considera as despesas básicas de uma família formada por dois adultos e duas crianças. Para a feirante Vanderli da Conceição Messias, o custo de vida em Mariana sempre foi consideravelmente alto. “O custo de vida em Mariana é muito caro, muito difícil”, afirma. Moradora do distrito de Furquim, ela se dirige para a cidade diariamente, onde vende verduras e frutas que cultiva. Trabalhando como feirante há catorze anos, ela ressalta que o valor que ganha não cobre todos os gastos do mês. Conforme aponta o secretário de Desenvolvimento Econômico do município, Helielcio Jesus Vieira, o aumento da procura por bens de consumo e serviços é importante na análise dos custos de Mariana. Ele explica ainda que essa demanda é fomentada especialmente pela mineração, pelo ensino superior e pelo turismo. “Estes três segmentos fazem com que a cidade receba muitas pessoas”, completa o secretário.

Projeto CiDATAnia Em Mariana, não há um órgão ligado à administração do município que seja responsável por fornecer o índice de custo da cesta básica. Os dados disponíveis são do projeto CiDATAnia, desenvolvido por cinco professores da Ufop, quatro deles do Departamento de Ciências Econômicas e Gerenciais (Deceg) e um do Departamento de Estatística (Deest). A meta é gerar indicadores que representem a realidade socioeconômica da região de Ouro Preto e Mariana. Em sua primeira fase, o projeto focou a cesta básica, que este ano teve seus produtos isentos de tributos por medida presidencial. Os resultados iniciais partem da apuração de dados coletados nos principais supermercados de Mariana entre os meses de agosto e outubro. O professor Chrystian Mendes, que participa da pesquisa, ressalta que “são resultados preliminares, ainda há muita coisa para ser feita”. Porém, já é possível estipular o impacto dos produtos da cesta básica no consumo em Mariana e comparar com outras cidades da região como, por exemplo, Viçosa.

Valores médios dos produtos da cesta básica em outubro Tomate 9,77%

Açúcar Cristal 1,60%

Arroz (tipo 2) 2,26%

9 kg R$ 22,79

Batata Inglesa 5,21% Café 2,34%

Pão 22,28%

Óleo de Soja 0,94%

3 kg R$ 3,73

6 kg R$ 51,96

Banana 7,53%

O gráfico mostra a parcela que cada produto ocupou do valor total médio da cesta básica no mês de outubro, em Mariana. Ao lado, são listados os preços médios e as quantidades de cada produto que devem ser consideradas para o cálculo. Os valores se baseiam no consumo mensal de um trabalhador em idade adulta.

Lá, o Departamento de Economia (DEE) da Universidade Federal de Viçosa (UFV) disponibiliza mensalmente um boletim com o Índice de Preços ao Consumidor (IPC). No IPC, constam sete grupos de referência para a análise do custo de vida: alimentação; vestuário; habitação; artigos de residência; transporte e comunicação; saúde e cuidados especiais; educação e despesas especiais. Cruzando os dados do projeto CiDATAnia com o IPC -Viçosa, é possível comparar o custo da cesta básica nas duas cidades. Com cerca de 18 mil habitantes a mais que Mariana, Viçosa está a 116 quilômetros e também possui demanda de estudantes. Entre os meses de agosto e outubro, a diferença entre os preços da cesta básica nas duas cidades cresceu. Em agosto, o valor foi R$ 1,76 mais barato em Mariana. Em setembro, ficou R$ 5,17 mais caro que em Viçosa. Em outubro, o preço voltou a subir, fechando R$ 6,18 mais caro em Mariana. Segundo Chrystian, a intenção é que o projeto possa se aprofundar, possibilitando medir não só o valor da cesta básica, mas o custo de vida geral da região.

1,5 kg R$ 3,73

4,5 kg R$ 17,30 7,5 kg R$ 17,57 3 kg R$ 5,28

7,5 l R$ 18,70

6 kg R$ 12,16

Carne Bovina (segunda) 29,47%

Margarina 1,55%

750 ml R$ 2,19

Leite (tipo C) 8,02% Fonte: projeto cidatania ilustração: mayra SANTOS costa

Feijão 7,42%

600 g R$ 5,45

6 kg R$ 68,73

750 g R$ 3,62

Farinha de trigo 1,60%

Consumidor tem acesso a impostos na nota Daniela Karine O Natal e o Ano Novo se aproximam e o comércio de Mariana já se prepara para o aumento das vendas. Com a implantação da Lei de Discriminação dos Impostos, os consumidores passam a saber o valor dos tributos embutidos no preço dos produtos. Para isso, basta solicitar a nota fiscal no ato da compra. A Lei Federal 12.741/2012 estabelece a obrigatoriedade a todos os estabelecimentos comerciais de informarem ao consumidor, nos documentos fiscais, os valores aproximados dos tributos federais, estaduais e municipais. Os impostos a serem discriminados são: IOF (Imposto sobre Operações Financeiras), IPI (Imposto sobre Produtos Industrializados), PIS/PASEP (Programa de Integração Social e de Formação do Patrimônio do Servidor Público), Cofins (Contribuição para o Financiamento da Seguridade Social), Cide (Contribuições de intervenção no domínio econômico), ISS (Imposto Sobre Serviços) e ICMS (Imposto sobre Circulação de Mercadorias e Serviços).

Comerciantes e prestadores de serviço de Mariana já têm conhecimento da lei e do prazo final para se adequarem, que é junho de 2014. Todos os tipos de empresa deverão cumpri-la, inclusive as microempresas. “Os empresários têm que citar no corpo da nota fiscal ou no campo observações o percentual ou o valor dos impostos que o consumidor está pagando”, explica Patrícia Camêllo, contadora e consultora de gestão empresarial. Além de discriminá-los nos documentos fiscais, o comerciante tem a opção de destacá-los em paineis a serem afixados em local visível no estabelecimento. No entanto, a lei não obriga a divulgação de cada tributo separado, apenas o total aproximado. Os consumidores de Mariana já estão recebendo os documentos fiscais com a aplicação da nova lei e divergem de opinião sobre os benefícios que ela proporciona. “Essa transparência na carga tributária vem somar à conscientização com relação à prática do Governo mediante aos gastos, à aplicação destes tributos em projetos que visem

melhoria na educação e saúde”, diz a professora Andreia Costa. Já para a coordenadora de recebimento de notas fiscais, Dirlene Bretas, a discriminação dos impostos é desnecessária, pois acredita que vai fazer mais confusão na cabeça das pessoas. “Eles deveriam pensar em simplificação da área tributária e da nota fiscal, e baixar os impostos para cair o preço dos produtos”, comenta Dirlene. Para o secretário de Desenvolvimento Econômico, Helielcio Jesus Vieira, essa medida pode auxiliar a população a compreender a carga tributária. “É importante que a população tenha conhecimento de como a elevada carga tributária interfere na economia municipal, estadual e nacional”. O secretário percebe ainda a possibilidade de redução dos impostos a longo prazo. “Em um futuro próximo, será possível realizar um estudo de como reduzir a alta carga tributária incidente sobre produtos e serviços, tornando os preços praticados no Brasil mais competitivos e atrativos como nos outros países”, diz ele.

Tributos pagos nas compras IOF: Incide sobre operações de crédito, de câmbio e seguro e operações relativas a títulos e valores mobiliários. IPI: É um imposto federal e incide sobre produtos industrializados no Brasil. PIS/Pasep: São impostos pagos por pessoas jurídicas e utilizados para o pagamento de seguro desemprego, abonos e participação na receita dos órgãos e entidades para os trabalhadores. COFINS: É um tributo federal que incide sobre a receita bruta das empresas em geral. Ele é destinado ao financiamento da seguridade social (previdência social, saúde e assistência social). CIDE: É um imposto federal. Incide sobre a importação e a comercialização de petróleo e seus derivados, gás e álcool etílico. ISS: É um tributo municipal e incide sobre os serviços prestados mediante a utilização de bens e serviços públicos. ICMS: É um imposto estadual. Incide sobre a circulação de mercadorias, serviços de transporte interestadual e intermunicipal, comunicações, energia elétrica, entrada de mercadorias importadas e sobre serviços prestados no exterior. Fonte: Site da Receita Federal


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Dezembro de 2013 Arte: Bruna Fontes

EDUCAÇÃO

Medidas inclusivas desafiam escolas Políticas públicas asseguram a inclusão, mas faltam qualificação, estruturas acessíveis e conscientização sobre tema Roberta Nunes Quando o assunto é inclusão de pessoas com deficiência, a falta de estrutura física acessível e apoio especializado ainda é algo a ser sanado nas escolas de ensino regular. Em Mariana, 34 alunos nessa situação estão matriculados na rede municipal, enquanto em Ouro Preto são 109. As escolas atendem esses estudantes de acordo com as demandas específicas de cada diagnóstico, mas nem sempre isso acontece. A aluna do 2º ano do ensino básico da Associação de Pais e Amigos do Excepcional (Apae) de Ouro Preto, Deisilaine Costa, 16 anos, que teve paralisia infantil, afirma que a escola regular ainda não está totalmente preparada para recebê-la. Ela estudou um ano em uma escola pública em Jequeri, na Zona da Mata mineira, e critica a discriminação, falta de estruturas acessíveis e apoio profissional. Apesar disso, admite a qualidade do currículo escolar. “Eu aprendi muito mais na regular, mas na questão de cuidado a Apae é melhor; não porque eles (a escola regular) não querem, mas como vão dar atenção pra todo mundo?”, questiona Deisilaine. A professora Vera Lúcia, 42 anos, sabe do longo caminho a percorrer para a inclusão, pois é docente do 3º ano do ensino básico na Escola Municipal Monsenhor José Cota, em Mariana, onde a filha Wellidiany Reis, 16 anos, deficiente visual, cursa o 4º ano. “Antes era bem mais difícil. Hoje minha filha tem apoio, mas a professora e a monitora se desdo-

Jéssica moutinho

Deisilaine (esq.) voltou a Apae por não se adaptar à escola regular. Salas de recursos (dir.) podem mudar essa realidade

bram para dar conta”. A pedagoga da escola, Sueli de Souza, comenta que “na teoria o regimento escolar insere a inclusão, mas na prática há muitas dificuldades”. Já na Escola Estadual Dom Silvério, em Mariana, entre os 21 alunos com deficiência está Franciele de Paula, 17 anos, com surdez, que frequenta as aulas do segundo ano do ensino médio com o auxílio da intérprete Renata Reis. A aluna comenta que “sempre faltam professores e, às vezes, intérpretes também”.

Para o ano que vem, a coordenadora da educação inclusiva da Secretaria de Educação de Mariana, Elizabeth Araújo, anuncia o concurso municipal para a contratação de 18 monitores e a criação da quarta sala de recursos na escola Dom Luciano. Atualmente, são quatro intérpretes de libras, um professor de braile e 16 monitores contratados. Este ano foram oferecidos cursos de capacitação a 36 profissionais em Mariana. Além deles, toda a rede já pôde aprender como fazer o Pla-

no de Desenvolvimento Individual (PDI), instrumento para atender às necessidades dos estudantes. As políticas públicas asseguram os diretos dos alunos com necessidades educacionais especiais, mas a legislação por si só não garante a efetivação da inclusão. O texto original do Plano Nacional da Educação, diretriz para próxima década, já traz avanços importantes para a educação inclusiva, mas há ainda mais desafios a serem superados e vencidos.

Sala de recursos

Roberta Nunes As salas de recursos são ambientes dotados de equipamentos, mobiliários e materiais didáticos para a oferta do atendimento educacional especializado. Elas oferecem apoio aos alunos com deficiência. Na relação do Ministério de Educação (MEC), sete escolas foram contempladas com o kit para a implantação das salas em Mariana, mas apenas três estão em funcionamento. “A previsão é que todas estejam funcionando ano que vem”, afirma a coordenadora Elisabeth Araújo. Em Ouro Preto, somente duas salas de recursos estão ativas. Segundo a responsável pelo apoio à inclusão na Secretaria Municipal, Wanderly Ferreira, foram destinadas nove salas pelo MEC, mas “não é só abrir a sala e colocar o professor, é preciso capacitá-lo, adaptar, equipar o mobiliário. Estamos abrindo as salas de recursos de forma gradativa”, esclarece. Uma das instituições regulares que tem se adequado é a municipal Simão Lacerda, em Ouro Preto, que trabalha a inclusão já no projeto pedagógico escolar. A escola realiza atendimento especializado na sala de recursos, adota um programa de aula flexível, avaliações diferenciadas e faz o Plano de Desenvolvimento Individual do aluno, levando em conta as demandas específicas. A professora Solange Marques compartilha a importância da conscientização no espaço escolar sobre a inclusão.

Atividades culturais reduzem evasão escolar Isadora lira Pedreiro e feirante, Maurício José Osório Ciriaco, 15 anos, trabalha desde os 9. Por sentir dificuldades em conciliar o trabalho com os estudos, Maurício foi reprovado três vezes seguidas na 5ª série. Por este motivo, pensou em abandonar a escola, mas acabou matriculando-se na Educação de Jovens e Adultos (EJA), modalidade de ensino voltada para alunos que não puderam concluir os estudos no ensino regular. Estudante da escola Wilson Pimenta Ferreira, no Bairro Santo Antônio (Prainha), Maurício conheceu os proje-

tos desenvolvidos pelos professores que organizam apresentações de música, teatro e literatura para auxiliar no aprendizado dos alunos da EJA. Embora fique com vergonha de participar, Maurício prefere os projetos do que as aulas, e diz que fica mais animado para ir à escola nos dias das atividades porque “os projetos são bons demais”. Segundo a pedagoga da escola, Aparecida Valaniel, “na EJA é tudo diferente. Criamos os projetos para diminuir a evasão, que é grande, e incentivar os alunos a estudarem mais”. Esses projetos usam temas do cotidiano

dos estudantes para incentivar a criatividade e resgatar o prazer de aprender. É uma didática diferenciada que atrai o aluno através da arte e o envolve com a matéria estudada. A professora de Português, Aparecida de Sá, considera a evasão dos alunos um desafio a ser vencido. “Alguns trabalham em turnos, outros faltam por problemas familiares. Além disso, as aulas, que são no período noturno, já começam atrasadas, pois a maioria dos estudantes vem direto do trabalho. É difícil dar continuidade às matérias e ensinar o conteúdo previsto, por isso, os

projetos têm se apresentado como uma opção de ensino com bons resultados, não apenas em relação às notas dos alunos, que melhoraram, mas em relação à frequência nos dias de atividades também”, relata a professora. Para a auxiliar de serviços gerais Marta Aleixo de Morais, 44 anos, “os projetos são muito bons, uma forma mais dinâmica e interessante de aprender e interagir com os outros alunos”. Marta é um dos 52 estudantes da EJA da escola Wilson Pimenta Ferreira, cursa a 6ª série, e está entre os mil estudantes da modalidade no município de Mariana.

As três melhores poesias com o tema “Sou fruto do meu passado e semente do meu futuro” receberão os seguintes prêmios: 1° Lugar – Notebook; 2° Lugar – Tablet; e 3° lugar – Câmera digital. A

premiação será realizada em 3 de dezembro, às 19 horas, no Centro de Convenções de Mariana. As melhores poesias serão publicadas em um livro distribuído gratuitamente no dia da entrega dos prêmios.

thiago huszar

Concurso de poesia Isadora Lira Com a intenção de criar algo diferente para os estudantes jovens e adultos, a Prefeitura de Mariana está promovendo o I Concurso de Poesia da EJA. A coordena-

dora dessa modalidade na Secretaria de Educação, Vanilza Ribeiro, explica que o concurso surgiu da intenção de apoiar esses alunos que, muitas vezes, são prejudicados em relação aos do ensino regular.

Literatura atrai alunos na Educação de Jovens e Adultos

Auxílio transporte sairá em 2014 teka lindoso

Rozebel Damas tem 22 anos e é estudante de Enfermagem na Faculdade Dinâmica do Vale do Piranga (Fadip), em Ponte Nova. Ela se cadastrou em setembro no Programa de Auxílio Transporte para Universitários, oferecido pela Prefeitura de Mariana, mas até hoje não recebeu seu benefício e não sabe quando começará a usá-lo. “Eles só receberam meu envelope com

os documentos e não informaram mais nada”, relata. A proposta do benefício é de depositar a quantia de R$100,00 na conta bancária do estudante que cadastrar seus documentos no Programa. “O dinheiro para financiar este auxílio sairá dos 30% dos impostos arrecadados em Mariana que devem ser obrigatoriamente destinados à área de Educação”, diz o vereador Cristiano Vilas Boas,

autor da iniciativa. A estimativa é de que o Programa atenda a 1,5 mil pessoas nesta primeira remessa, sendo possível ainda realizar o cadastro até o final deste mês. Rozebel diz que seus cole-

gas de faculdade se cadastraram e foram informados de que no mês seguinte o dinheiro seria depositado em suas contas. Contudo, o decreto que autoriza a concretização desta proposta ainda não

Como se cadastrar: Basta levar cópia dos documentos abaixo na Secretaria de Educação de Mariana. Telefone: (31) 3557-9030 . RG . Comprovante de residência; . CPF . Cartão bancário.

foi assinado pelo prefeito Celso Cota. O vice-prefeito Duarte Júnior informou que “o Projeto da Lei está na Procuradoria municipal aguardando aprovação dos documentos e, em seguida, será assinado pelo Prefeito”. Está previsto que o projeto entre em vigor no início do próximo ano. “A fiscalização do projeto será feita por uma comissão avaliadora, com a possibilidade de visitas a domicílios e li-

gações para averiguar se o estudante reside em Mariana”, afirma Duarte. Para renovar o benefício, a cada semestre o interessado deverá entregar, na Secretaria de Educação de Mariana, um comprovante de rematrícula. Para novas inscrições, os estudantes devem cadastrar seus documentos e esperar que o auxílio seja depositado no período de renovações do próximo semestre letivo.


Dezembro de 2013 Arte: Laura Vasconcelos

Ministério Público exige estudos de impacto ambiental para obras de pavimentação em Ouro Preto

Confira o ensaio “Olhares que se revelam”, na versão on line: http://migre. me/gLLUG

Crescimento desordenado é desafio para a manutenção de características da arquitetura barroca

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PAC aguarda finalização de projetos para liberar recursos para Mariana

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PATRIMÔNIO Peças de um tesouro chamado catedral Thiago Huszar

O brilho dos 365kg de ouro dos altares reflete o valor da Catedral da Sé, em Mariana, mas as pessoas que constroem a sua história continuam a ser o maior patrimônio da igreja

Bianca Cobra Com a voz grave, em um ritmo ensaiado e palavras que, de tanto repeti-las, foram decoradas, Paulo Gomes da Silva, 37 anos, conduz o caminho pela Catedral da Sé. Bem vestido e sorridente, vai contando a história da igreja construída há 300 anos. Paulo é guia dos pontos turísticos de Mariana há 20 anos, por isso, não gagueja nem hesita. Seu repertório de histórias já foi ouvido por muitas pessoas e turistas. Com passos lentos, parando para apontar os ricos detalhes da arquitetura, o guia marianense dá informações detalhadas sobre vários aspectos: desde a presença das três fases do Barroco, distribuídas pelos dez altares, às pinturas chinesas que adornam algumas das paredes. Sabe também das histórias dos santos presentes nesses altares, além das datas que são informadas com precisão durante as longas explicações. De repente, Paulo interrompe seus passos e me pergunta se quero conhecer a cripta que contem os restos mortais dos bispos e arcebispos da Arquidiocese. Diz que muitas pessoas preferem não visitá-la, pois têm medo de encontrar um lugar sombrio. Porém, ao descer as escadas e adentrar a cripta, encontro um espaço pacífico e si-

lencioso. O local é também um ambiente de orações para os fiéis. No túmulo do último bispo enterrado lá, Dom Luciano Mendes de Almeida, existem muitas flores e preces. Essa fé das pessoas que frequentam a igreja é uma das coisas que mantém a tradição religiosa da catedral. Com missas celebradas todos os dias, católicos fazem da ida à igreja uma atividade diária. É o caso de Juracy de Oliveira, ou Dona Ceci, como é mais conhecida. Essa senhora de 86 anos diz que o valor da missa é único; é quando ela sente a presença de Deus na sua forma mais intensa. Dona Ceci diz começar e terminar o dia na igreja. De manhã e à noite passa por lá, seja para assistir as missas ou para fazer orações. Ela faz parte da Pastoral do Batismo e tem uma relação muito próxima com a igreja. Para a senhora, a catedral ficou pequena para tantos fieis, mas continua bela e acolhendo a todos. Além de acolhedora, é a mãe de todas as igrejas da cidade, isso de acordo com o padre Nedson Pereira de Assis, pároco de Mariana. “Nela os padres foram ordenados, além dela estar presente em todo o período de formação deles. É um templo de espiritualidade e fé”. A matriz, além dessa tradi-

ção para os fiéis, ainda possui tesouros que a fazem ser única e são fundamentais para a construção de sua identidade. Qualquer pessoa que entre na igreja é surpreendida pela beleza e imponência de seus altares. O brilho abundante de ouro é o que dá ao seu interior um aspecto valioso. Outro atrativo singular, o órgão alemão Arp Schnitger,

do Século XVIII, é um dos itens mais autênticos da igreja, pois faz parte de um grupo seleto de instrumentos. São somente 30 no mundo e esse é o único fora da Europa. Josineia Godinho é organista e sabe da importância que o órgão tem para a catedral marianense. “A junção dele com a arquitetura faz com que a igreja seja algo que Thiago Huszar

O Órgão Arp Schnitger, de 1753, carrega o nome de seu criador

impressiona”. A organista coordena os concertos realizados na catedral e faz com que o raro som possa ser ouvido por todos. As relações das pessoas com a igreja da Sé são muitas. Tem o turismo e quem se sustenta com isso como o guia Paulo, tem a religião que dá sentido para a vida de pessoas como Dona Ceci e tem o ins-

trumento de trabalho de pessoas como Josineia. Isso faz com que a catedral tenha um grande valor para a população. Não é apenas um valor material, arquitetônico e artístico, mas sim um valor simbólico, de presença no cotidiano, de influência na própria vida. É esse valor que transforma as pessoas no mais precioso tesouro da Sé.

Vozes que encantam Bianca Cobra No mês de dezembro são realizados os concertos de Natal na Igreja da Sé. A programação se inicia após o dia oito e as apresentações acontecem nos finais de semana, depois das missas da noite. O padre Geraldo Buziani afirma que esses concertos são muito importantes para a comunidade e a igreja porque “é uma forma de evangelizar através da arte, mostrar o valor da família e da confraternização entre todos”. As canções natalinas que preenchem a igreja através das vozes dos corais são um meio de aproximar as pessoas e lembrá-las o significado do Natal, de acordo com Adeuzi Batista, maestro dos Corais Silvinha Araújo e Tom Maior. Com a ajuda dos participantes dos corais, ele também faz arrecadação de brinquedos para crianças dos distritos

de Mariana no final do ano. O maestro diz que as pessoas esqueceram o que é o Natal, e os corais, através de suas músicas, ajudam a lembrar do nascimento de Jesus e do espírito natalino. Batista ensaia participantes dos corais como Terezinha de Paula, 75 anos, ou Terezinha Morango, como é mais conhecida. Para ela, o Natal é uma festa especial que merece ser celebrada. “No último concerto fomos aplaudidos de pé. Foi emocionante e lindo”, declara a coralista. A programação desse ano deverá ser anunciada nos próximos dias pela Paróquia Nossa Senhora da Assunção, mas grupos de corais, como Tom Maior, Silvinha Araújo e Coral Catedral se apresentam todos os anos. Há também o Auto de Natal, da Comunidade de Padre Viegas, que sempre emociona a todos.


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Dezembro de 2013 Arte: Nathália Souza

PATRIMÔNIO

À espera dos milhões do PAC Valores só serão liberados após projetos serem concluídos; não há previsão de início das obras

João Gabriel Nani Muito se especula sobre a verba do Programa de Aceleração do Crescimento (PAC), que em sua segunda edição é destinada à recuperação das estruturas históricas, mas pouco ainda se sabe. Na cidade de Mariana a questão não é diferente. Segundo anunciado pelo Ministério do Planejamento, em agosto deste ano, o município deve receber aproximadamente R$ 67 milhões. Quinze projetos de restauração conseguiram ser aprovados, no entanto, os valores de cada um, nem ao menos os critérios elaborados para determinar quais receberiam a verba, além das datas de início e conclusão das obras, não foram divulgados. Listada pelo órgão federal como uma das principais cidades históricas do país, Mariana está em um seleto grupo de 44 que tiveram o benefício aprovado pela verba do PAC 2 - o processo levou em conta municípios com patrimônios reconhecidos pela Unesco ou indicados pela entidade como “merecedores” do projeto. Aguardando os milhões prometidos pela presidenta Dilma Roussef, durante uma cerimônia realizada em agosto, em São João Del Rey, a verba ainda não foi disponibilizada. Apesar da assertiva por parte do Governo Federal, questões relativas ao recebimento e emprego da verba continuam indeterminadas. O processo de elaboração dos projetos, idealizados por meio da

parceria entre o Instituto de Patrimônio Histórico e Artístico Nacional (Iphan) e Prefeitura Municipal de Mariana, não é claro. Os critérios adotados para a elegibilidade de estruturas históricas, merecedoras das ações enviadas ao Ministério do Planejamento, não estão amplamente explicados, omitindo, por diversas vezes, se outras estruturas históricas com problemas causados pelo tempo ficaram de fora. As únicas informações divulgadas pelas instituições são o montante a ser recebido e quais estruturas foram agraciadas, no caso, 15. De fora Segundo matéria divulgada no dia 21 de agosto de 2013, no site do jornal “O Estado de Minas”, 40 projetos de Mariana foram enviados ao PAC. Tomando em conta tal afirmação, constata-se que outras 25 estruturas devem ficar de fora do pacote. Não se tem informações oficiais de quais sejam elas e se, com a ausência na lista, correm riscos de terem as estruturas comprometidas gravemente por problemas estruturais. Tão pouco se serão incluídas no Programa Nacional de Apoio à Cultura (Pronac), que viabiliza, por meio de Organização da Sociedade Civil de Interesse Público (Oscip), que entidades privadas deduzam determinados valores de seus impostos e destinem às instituições que cuidam do patrimônio histórico.

Relação de recursos destinados

$0mi

36,46 29,85 33,77

67,28

202,09

37,44 49,75 19,69 10,49

16,98

133,75

47,6 50,76

170,96

38,97

230,47

43,48

151,21

38,54 22,57 54,68

$50mi

257,16

Fonte: Iphan

Mariana Ouro Preto AL AM BA CE GO MA MG MS MT PA PB PE PI PR RJ RN RS SC SE SP

$100mi

$150mi

$200mi

$250mi

$300mi

Outra questão que chama a atenção é em relação ao valor de cada obra. Segundo as determinações do PAC 2, cada projeto é aprovado individualmente, ou seja, não há a demanda de verba por cidade, mas sim por cada iniciativa proposta. Não foi divulgado, nem pelo Iphan nem pela Prefeitura de Mariana, o valor exato ou aproximado que será investido em cada obra. A única informação disponibilizada sobre o assunto é que somente na Matriz da Sé seriam investidos aproximadamente R$ 17 milhões, quase um quarto do montante total prometido à cidade. Também entre as estruturas a receberem uma fatia da verba está a Igreja de São Francisco de Assis, localizada no principal cartão postal de Mariana, o conjunto arquitetônico da Praça Minas Gerais. O monumento encontra-se com sérios problemas estruturais, e permanece fechado há mais de três anos. Quanto ao início das obras, não há previsão. O modelo de desembolso do programa não prevê repasse integral às prefeituras, mas sim a liberação de recursos na medida em que as obras forem licitadas. Não foi divulgada a data do início dos processos de licitação. A única informação quanto aos prazos é de que as prefeituras terão três anos para resgatarem a verba e aplicá-la, mas para isso é necessário que os projetos estejam devidamente apresentados e aprovados aos ministérios envolvidos: Cultura, Desenvolvimento e Planejamento. O Iphan de Mariana não quis esclarecer nenhuma questão relativa ao PAC 2, tais como critérios, prazos e patrimônios que não serão contemplados. Também não houve esclarecimento quanto aos projetos, e se estão dentro do prazo ou adequados às exigências do programa. À frente Em Ouro Preto a situação é diferente. A cidade receberá um montante de R$ 36 milhões, a serem distribuídos entre 13 estruturas. O Iphan da cidade já divulgou o valor

de cada obra como, por exemplo, a da Igreja de Nossa Senhora da Conceição, a mais cara, orçada em R$ 6,5 milhões. A estrutura, devido a fatores como o tempo, encontra-se em processo de deterioração e com problemas estruturais. Segundo o diretor estadual do Iphan, João Carlos Oliveira, parte das obras devem começar até mar-

ço de 2014. Os projetos já foram encaminhados ao PAC 2, e estão aptos a receber a verba, que está prevista para o orcamento de 2014 do giverno federal. Até a segunda quinzena de dezembro será aberto o processo de licitação das obras, geridas e fiscalizadas pelo próprio órgão. As obras devem ser concluídas em até três anos.

Falta manutenção João Gabriel Nani Com a verba a ser investida na restauração do patrimônio de Ouro Preto e Mariana, o que de fato recebeu atenção foi a conservação das obras. No entanto, nota-se que o valor envolvido demonstra a grande necessidade de intervenção nas estruturas deterioradas pelo tempo. Esse fato se dá devido à ausência de projetos que priorizem não a restauração dos bens, mas sim a manutenção. Quem afirma é o diretor estadual do Instituto do Patrimônio Histórico e Artístico Nacional (Iphan), João Carlos Oliveira. Segundo ele, não há, no momento, uma cooperação entre as partes envolvidas (Iphan, Prefeitura e Igreja) para a manutenção dos pequenos problemas estruturais que afetam o patrimônio. “Se houvesse (iniciativas na manutenção) evitaríamos problemas maiores, como os que enfrentamos hoje”. O diretor ressalta ainda que sem esse apoio mútuo, não tem como haver intervenções tangenciais, já que o órgão, por si só, não tem total poder de interferência. “O Iphan não pode entrar na igreja e dizer: vamos mudar isso, mudar aquilo. É necessário que, no caso, a igreja trabalhe junto conosco. O responsável do lugar nos informe o que é importante e precisa ser mudado, e nós conciliaremos com as possibilidades de intervenção”. Quando há uma parceria, os trâmites legais se tornam mais facilmente resolvidos, e, por fim, as verbas necessárias para sanar as demandas são enviadas, afirma. No entanto, João Carlos aponta como principal problema a falta de coope-

ração entre as instituições na questão da conservação. Os projetos do PAC elaborados em parceria com a Prefeitura e as demais instituições foram aprovados e receberão, em tese, a verba. No entanto, o processo poderia ser diferente. “Se trabalhássemos juntos em projetos contínuos de manutenção do sítio arqueológico, a aprovação de valores seria mais fácil, já que as obras seriam mais baratas, e evitaríamos que determinadas estruturas chegassem a apresentar problemas mais sérios”. É errado dizer que as cidades receberam dinheiro. Ninguém ainda recebeu nada”. João Carlos Oliveira A burocracia para que se realizem intervenções também atrapalha. Quando trata-se de patrimônio histórico, qualquer intervenção depende da elaboração de um projeto prévio, gerenciado pelo instituto, afim de que os valores necessários para arcar com os custos das obras sejam recebidos. Na questão do PAC, João Carlos ressalta. “É errado dizer que as cidades receberam dinheiro. Ninguém ainda recebeu nada; o que houve foi uma tentativa (sic) de empenho, assim digamos, para que comecem as intervenções”. Ou seja, sem a elaboração colaborativa de projetos prévios de conservação, não há verba. Para o inicio de 2014, o Iphan já trabalha em uma iniciativa para formar um grupo com os líderes locais das instituições envolvidas para manter a conservação dos bens históricos.


Dezembro de 2013 Arte: Nathália Souza

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Gabriel Koritzky

40 anos na escuridão

Sem o brilho das peças sacras furtadas da Igreja do Pilar, a cidade ainda lamenta o crime sem resposta Paula Bamberg

Carlos José mostra fotos em livro, únicas recordações das peças roubadas

Thaís Corrêa “Rezando, suspirando, gemendo e chorando. Depois de cinco anos, o crime prescreveu. Mas não na arte. A gente ainda tem esperança. Todo ano eu toco o sino, mesmo sendo proibido. É a melhor forma de lembrança”. Essas foram as palavras do padre Simões, na última entrevista concedida para a jornalista Laura Godoy, meses antes de morrer. Padre Simões era o pároco da Igreja Nossa Senhora do Pilar, em Ouro Preto, no ano de 1973, quando peças sacras foram roubadas do museu que fica no subsolo da Basílica, entre elas três cálices de prata folhada a ouro, usados no Triunfo Eucarístico, em 1733. Segundo Laura, que além de jornalista é pesquisadora e desenvolveu uma monografia sobre o assunto, o padre nunca se conformou com o que aconteceu. Para ela, quando o religioso afirmava que “o crime prescreveu”, sua

intenção era dizer que foi abandonado por não ter solução, uma vez que judicialmente crimes de roubo de peças sacras não expiram, como ressalta o promotor de Justiça de Defesa do Patrimônio Cultural e Turístico de Minas Gerais, Marcos Paulo de Souza Miranda, para o jornal Estado de Minas, na edição do dia 01 de novembro de 2013. O atual diretor de Arte Sacra de Ouro Preto da Basílica Nossa Senhora do Pilar, Carlos José Aparecido de Oliveira, menciona que atualmente muita informação sobre o caso é vaga, principalmente porque, desde a época do roubo, o governo proibiu a divulgação de informações sobre o crime, o que pode ter ocultado outras possíveis descobertas. O chefe do escritório técnico do Instituto do Patrimônio Histórico e Artístico Nacional (Iphan), João Carlos de Oliveira, declara que a causa dos roubos ocorrentes

na época, podem ter sido resultado de falhas na gestão e de dificuldades encontradas, pelas paróquias, em administrar a sua própria segurança. Oliveira alega ainda que nos anos seguintes, não houve registros de roubos em outras igrejas da região, em função do avanço da tecnologia que proporciona diversos meios, cada vez mais eficazes, de vigilância e proteção. Quanto aos novos projetos de segurança, João Carlos declara que desde 2010 o Projeto de Segurança Eletrônica para Bens Protegidos foi aprovado e já está em vigor , e que através do PAC Cidades Históricas, que conta com a iniciativa do Iphan e recursos federais, mais investimentos serão realizados até 2015. Essa iniciativa completa um projeto de intrusão nas igrejas, que abrange tanto a segurança na prevenção de roubos, quanto na solução de incêndios e outros acidentes.

Asfalto causa polêmica Thaís Corrêa Desde outubro, um conflito entre a Prefeitura de Ouro Preto e a Promotoria de Justiça da 4ª Vara da comarca, paralisou as obras de asfaltamento que eram produzidas pelo poder público, em diversos bairros da cidade. As obras do programa Promova, orçado em R$25 milhões, foram realizadas em diversos bairros, como Bauxita, Santa Cruz, Vila Aparecida e São Cristóvão e não apresentavam estudos de impacto ambiental que, segundo o Ministério Público, comprovassem que as ruas com asfalto não representassem risco à segurança dos moradores. Além disso, a Promotoria afirma que o asfalto causa dano às áreas tombadas como patrimônio e oferece riscos de deslizamento de encostas na região. Dentre as obras, a realizada na Vila Aparecida causou maior polêmica, já que o asfaltamento chegou à Rua Engenheiro Corrêa, que dá

acesso ao museu Casa dos Inconfidentes, construção que data do Século XVIII. De acordo com informações divulgadas na imprensa, em reportagem publicada no jornal Estado de Minas em 25 de outubro de 2013, a Promotoria alegou que se tratava de uma obra que não condiz com o município reconhecido como Patrimônio Histórico da Humanidade pela Unesco. A Promotoria de Defesa do Patrimônio Cultural e Turístico de Minas Gerais não atendeu a reportagem do LAMPIÃO. Já o Instituto do Patrimônio Histórico e Artístico Nacional (Iphan), órgão que é responsável por dar o aval para a realização de obras que se relacionam ao perímetro tombado, autorizou as intervenções. Segundo o chefe de escritório técnico do Iphan de Ouro Preto, João Carlos de Oliveira, mesmo o museu sendo um patrimônio do Século XVIII, ele está inserido em uma área de ocupação contempo-

rânea. Ele afirmou ainda que a Vila Aparecida, bem como os demais locais que receberiam a pavimentação, localizam-se fora do centro histórico da cidade. Já para Maria Moreira, que mora há trinta anos do bairro, a mudança foi essencial. De acordo com Dona Mariinha, como gosta de ser chamada, a estrada ficou mais limpa, menos perigosa e muitas pessoas que antes não passavam por lá, hoje fazem até caminhada de manhã. A assessora do museu, Gabriela Barone, afirmou que, no princípio, os funcionários estranharam um pouco a mudança com a chegada do asfalto, mas que por outro lado o acesso melhorou muito a qualidade de vida de quem sempre passa por ali. Segundo ela, “também é importante ver o lado humano do asfaltamento”. A secretaria de Obras de Ouro Preto quando procurada para comentar o assunto, não quis se pronunciar.

Jéssica Moutinho

Pavimentação da rua do Museu destoa do patrimônio histórico


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Dezembro de 2013 Arte: Aldo Damasceno

patrimônio

Possibilidades e limites para se construir em Ouro Preto Construções desordenadas sem projetos comprometem a arquitetura barroca da cidade Patrimônio Mundial Kaio Barreto

O crescimento desordenado contrasta com o cenário histórico. A vista da rua Claudio Manuel tem ao fundo o bairro Alto da Cruz, que apresenta grande número de construções irregulares

Dalilia Caetano Uma cidade originada da exploração do ouro, onde aventureiros de várias partes do Brasil estiveram em busca de riqueza. Hoje mundialmente conhecida e reconhecida pelo seu conjunto arquitetônico barroco, principalmente do centro histórico da cidade, Ouro Preto guarda relíquias como casarões, igrejas, arruamento, chafarizes e outros monumentos construídos no Século XVIII. No entanto, a preservação e conservação desse patrimônio vêm sendo um desafio em função do crescimento da população e ocupação do solo. De acordo com o Instituto do Patrimônio Histórico e Artístico Nacional (Iphan), devido ao volu-

me de imóveis construídos desordenadamente, tornou-se inviável contabilizar o número de casas em áreas impróprias. Bairros como Morro do Piolho, São Sebastião, Morro Santana e Alto da Cruz são os que apresentam maior quantidade de construções irregulares. Isto porque o custo elevado dos projetos faz com que a população realize as obras sem esse planejamento. A lei nº 65/2010 criou o Serviço Municipal de Engenharia e Arquitetura Pública para oferecer assistência técnica gratuita para qualquer intervenção no imóvel, mas por falta de convênio, ainda não foi colocada em prática. Conciliar o cenário paisagístico do Século XVIII com estruturas

modernas é um desafio que merece ser discutido e repensado na cidade, como salienta o chefe do escritório técnico do Iphan de Ouro Preto, João Carlos de Oliveira. “A cidade é um organismo vivo, por isso, sua expansão é natural, porém, ela não pode continuar acontecendo de forma inconsequente como vemos hoje. Para que seja viável a preservação desse conjunto arquitetônico é necessário que a população ouro-pretana saiba que não é possível restaurar, construir ou inserir elementos em edificações históricas de modo seguro sem haver projeto”, pontua João. A comerciante Maria da Consolação Rezende adquiriu um imóvel no Bairro Antônio Dias e solici-

tou ao instituto a aprovação do seu projeto, antes do início das obras. “Comprei uma casa que data do Século XVIII e que necessitava de reforma. Pretendo realizar a obra de forma segura e com qualidade, por isso contratei um engenheiro e um arquiteto para o projeto. Procurei o Iphan que analisou as adaptações para que a obra pudesse ser executada. Hoje me sinto realmente tranquila em saber que vou reformar uma casa antiga contribuindo para a preservação da história de Ouro Preto”, comenta Consolação. Para a arquiteta aposentada Marília Machado, é necessária a preservação da materialidade da história de Ouro Preto, tendo em vista a qualidade da arquitetura que se pretende

inserir em uma estrutura já existente. “Acredito que é possível introduzir elementos modernos na arquitetura histórica da cidade sem que haja perda da identidade arquitetônica. Mas tais intervenções devem primar pela qualidade dos materiais utilizados para que estes possam dialogar com a estrutura preexistente, preservando a história da cidade e, sobretudo respeitando a memória que continua viva”, salienta a arquiteta. O Iphan dará início a fiscalização de obras irregulares e a aplicação de multas a partir desse mês. Segundo o órgão, o início da fiscalização estava previsto para 2010, mas isso não foi possível devido a falta de estrutura administrativa para atender as demandas existentes neste período.

O valor da conservação de um imóvel tombado Éllen Nogueira O centro histórico de Mariana é um referencial da cidade, patrimônio tombado onde há importantes edificações do período Barroco que constituem a riqueza da primeira capital de Minas. Mas, morar em imóveis construídos no Século XVIII tem seu preço. Principalmente porque a conservação dos casarios particulares é responsabilidade de seus proprietários e qualquer intervenção nesses imóveis deve ser aprovada pelos órgãos competentes, o que implica em adequações muitas vezes onerosas, como gastos

com materiais que devem ser mantidos como os originais. Para realizar qualquer obra, seja de reforma, ampliação, demolição, comercial ou residencial é preciso pedir autorização e apresentar o projeto para a Prefeitura e o Instituto do Patrimônio Histórico e Artístico Nacional (Iphan). Quando aprovado, e com o Alvará de Construção, elas podem ser iniciadas. O aposentado Elógio da Silva Pontes, proprietário e morador de um imóvel na Rua Waldemar de Moura Santos mantém a fachada de sua casa original, uma exiTamara Pinho

gência do Iphan, e leva todos seus projetos de reforma para a aprovação do órgão. O imóvel já passou por muitas obras e, para conservá-lo é preciso gastar muito dinheiro, afirma o proprietário, “pois os materiais são muito caros, como as telhas coloniais’’. A aposentada Graciana Fernandes de Oliveira, proprietária de um imóvel na Rua Santana há 69 anos, fez várias mudanças na sua casa, quando ainda nem era necessária a autorização. A residência era pequena, com um grande quintal de torrefação. Foi modificada para conforto da família que nasceu lá. Dos nove filhos, oito nasceram na residência, e também um neto. Sua filha, Angêla Maria de Oliveira Cota, bancária aposentada, conta que na última reforma feita pela família o projeto foi levado ao Iphan e na mesma semana foi aprovado. “Tivemos que usar as telhas coloniais mesmo, que são

o dobro do preço das que a gente já tinha feito o orçamento”. Para ela, “a reforma é difícil quando tem que trocar as janelas, que devem ser exatamente iguais. E tem que mandar fazer na marcenaria porque elas não são de modelos comuns e também são muito caras”. Angêla não vê problemas em preservar a fachada, só acha que não precisava das restrições internas, porque quem está na casa conhece as necessidades. A Prefeitura de Mariana tem um setor responsável pela aprovação dos projetos e fiscalização de obras em execução. E também para orientar quanto aos procedimentos que devem ser realizados para regularização, notificando casos em que haja descumprimento da lei. A Secretaria Adjunta de Desenvolvimento Urbano fornece mais informações aos engenheiros e arquitetos, responsáveis técnicos das obras.

Saiba mais: • Antes de começar uma obra é necessário obter o Alvará de Construção na Prefeitura, que evita multas e o embargo da obra. Para obter esse Alvará é necessário apresentar o projeto da obra que você quer realizar. • Contrate um arquiteto ou engenheiro civil para ser seu responsável técnico e elaborar o projeto arquitetônico com suas necessidades. • O recolhimento de IPTU pela prefeitura não significa legalidade da edificação. Regularize seu imóvel com habite-se, a baixa de construção que certifica se sua edificação está de acordo com o projeto aprovado e inteiramente acabado e seguro. • Quando o imóvel está dentro da poligonal de tombamento o projeto deverá ser aprovado também pelo Iphan. • Para mais informações sobre a documentação necessária para solicitar a análise de projetos, consulte o setor de Documentação e Arquivo ou Secretaria Adjunta de Desenvolvimento Urbano na Prefeitura de Mariana. Fonte: Prefeitura Municipal de Mariana

CASA COM JANELAS DE RÓTULAS

E

xemplar típico das construções urbanas do final do Século XVIII e início do XIX, que traziam janelas em rótulas esquadrias constituídas de peças de madeira sobrepostas diagonalmente, de modo a formar desenhos variados, com a finalidade de resguardar a intimidade, segundo costume árabe.

Placas sinalizam o patrimônio tombado em casas históricas


Dezembro de 2013 Arte: Israel Marinho

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solidariedade

Uma encomenda de Natal Correios buscam padrinhos para criancas da comunidade; Prefeitura arrecada R$ 5 mil para casas de apoio Rosana freitas

reabilitação e convivência institucional e social dos usuários.

Tayná de Oliveira, 8 anos, gosta muito de ler e escrever ...

Fernanda Marques À medida que as comemorações de fim de ano se aproximam, as campanhas que promovem doações diversas se intensificam. Roupas, alimentos não perecíveis, brinquedos e livros estão entre os donativos mais comuns destinados a crianças, adolescentes e adultos. Em Mariana não é diferente. É o caso da campanha promovida pela Prefeitura com a Associação dos Guardas Municipais de Mariana (Asgum), que, responsável por coordenar o estacionamento dos shows de comemoração da festa da cidade durante o mês de julho, arrecadou R$ 5 mil destinados a Associação

de Pais e Amigos dos Excepcionais (Apae) e à Comunidade da Figueira. “Tiramos os gastos que tivemos com funcionários e logística e destinamos essa quantia”, afirma o responsável por Relações Públicas da Guarda Municipal, Valério Freitas. Diretora da Comunidade da Figueira, Neuza Elena de Oliveira Melo, destacou a importância da preocupação da Asgum. “É um dinheiro que veio pra somar e que nos ajudou a oferecer melhores condições e acessibilidade para os alunos daqui”. A comunidade atende a crianças, adolescentes e adultos, com deficiência física e mental, procurando proporcionar condições de

Cartas Uma bola, um caderno e um estojo. Esses foram os pedidos de Pedro, 12 anos, em sua carta para o Papai Noel esse ano. A correspondência, que será adotada por um padrinho, faz parte do projeto desenvolvido pelos Correios há mais de dez anos na cidade. A campanha “Papai Noel dos Correios” existe há trinta anos no país e, além de incentivar a adoção de cartinhas de Natal, objetiva apadrinhar e arrecadar brinquedos para as crianças de famílias com baixa renda. “Eu entendo que meus pais não podem me dar essas coisas, mas acho que alguém pode. Sei que Papai Noel não existe, mas tem pessoas boas por aí”, afirmou o menino, que mora no Bairro Cabanas, com a mãe, Luciene Souza, 32, atendente de supermercado. Ela considera importante uma ação como essa. “Já é a terceira vez que participamos e o Pedro não abusa. É só para ajudar a gente nas maiores dificuldades. O menino precisa de bem pouco pra ficar feliz”, esclareceu. A mãe disse que é muito prático participar do projeto: é só levar a correspondência para a agência dos Correios com o endereço correto e esperar o retorno. De acordo com o gerente da Agência dos Correios da cidade, Marco Antônio Braga, apesar de ser aberta a toda a comunidade, a campanha seleciona, a cada ano, uma escola ou creche. Esse ano o convênio estabelecido foi com a Creche de Passagem. “Selecionamos principalmente áreas com crianças em situa-

ções de risco”. Braga explicou que orienta as crianças a limitar o preço do presente, para não correrem o risco de ficar sem apadrinhamento. “Já conseguimos até cadeira de rodas durante a campanha, mas fica mais fácil quando são coisas mais baratas e acessíveis”. Procurando garantir um Natal especial para uma criança, a estudante de Filosofia da Universidade Federal de Ouro Preto (Ufop), Ana Paula Barbosa, 24, decidiu ado-

tar uma cartinha. Ana esclarece que sente vontade de ajudar as crianças. “Na minha casa éramos muitos irmãos, nove no total, nem sempre tinha presente pra todo mundo e não dava pra comprar pra todos. Cresci querendo ajudar a trazer felicidade pra outras crianças”. Os presentes devem ser levados por funcionários dos Correios nas escolas e creches conveniadas antes do final do semestre letivo, e, para a comunidade local até o Natal. Rosana freitas

Rosana

... por isso, ficaria feliz se ganhasse o kit de livros que pediu na cartinha

Hemominas reforça campanha Portal da Transparência por doação de sangue serviço

Carolina Brito No período de festas de fim de ano há diminuição no número de doadores de sangue, embora a demanda por transfusões aumente devido aos acidentes de trânsito. Segundo Ana Célia Milagres, do setor de captação da Fundação Centro de Hematologia e Hemoterapia de Minas Gerais (Hemominas), as campanhas são reforçadas principalmente durante os feriados de dezembro (Natal e Ano Novo) e no Carnaval. Ana Célia ressalta, ainda, que cada bolsa de sangue pode beneficiar até quatro pessoas. Em Mariana, a coleta de sangue

é feita de duas a três vezes por ano, e as reservas locais são abastecidas pela Hemominas de Belo Horizonte. Somente no hospital Monsenhor Horta são utilizadas cerca de 60 bolsas por mês. A dona de casa Glória Nascimento recebe transfusões mensalmente no hospital e acredita que doar é um ato nobre.“É muito triste precisar de sangue e não ter”. Na campanha realizada em novembro, em Ouro Preto, além de coleta de sangue, também foi feito cadastro para possíveis doadores de medula óssea. Quando um paciente precisa de tal transplante e não possui um doador compatí-

vel na família, esse cadastro é consultado. Segundo dados do Ministério da Saúde, a chance de encontrar uma medula compatível é, em média, de uma em cem mil. Em relação ao processo de doação de sangue, caso não ocorra transtornos, a duração é de aproximadamente 40 minutos. O mecânico Adriano Cardoso, morador de Ouro Preto, foi doador na campanha de novembro pela primeira vez. O que me motivou foi o fato de poder ajudar a quem precisa”. Na ocasião, foram coletadas 120 bolsas de sangue - quantidade preestabelecida pela Hemominas.

Rosana freitas

Para colaborar: - Pesar acima de 50 kg; - Dormir bem na noite anterior à doação; - Não ter tido hepatite após os 11 anos de idade; - Não ter feito tatuagem ou piercing nos últimos doze meses; - Não doe sangue em jejum. Pela manhã, alimente-se antes. À tarde ou à noite, dê um intervalo de 3 horas após o almoço ou jantar. Mais informações podem ser obtidas no site: www.hemominas.mg.gov.br

A universitária Paula Nogueira participa da campanha pela primeira vez

a serviço do cidadão

Teka Lindoso Você sabia que Ouro Preto, no período de janeiro a agosto deste ano gastou cerca de R$ 137 mil com indenizações por demissões do servidor público? E com a Segurança Pública foram aproximadamente R$ 300 mil em despesas no mesmo período? Todos os valores são pagos com o dinheiro do cidadão. Já pensou em fiscalizar aonde é aplicado o imposto que você paga? A Lei de Acesso à Informação entrou em vigor em maio de 2012. Ela regulamenta o direito de receber dos órgãos públicos as informações produzidas por eles. Para unificar o acesso do público aos dados administrativos, o Governo Federal elaborou o Portal da Transparência, que transmite os dados da União e também de uma localidade específica pela internet. No portal é possível analisar as quantias repassadas do Governo para sua cidade e assim cobrar que os investimentos sejam feitos. O detalhamento do repasse de recursos do Governo Federal para Ouro Preto este ano, no valor de R$ 59,2 milhões, pode ser consultado no site do Portal da Transparência. Através de informações fornecidas no portal, a estudante universitária do Espírito Santo, Thainã Taufner, 20 anos, consultou os dados de sua cidade, Alegre. O município apresentou problemas relacionados à merenda escolar e Thainã acessou o portal para verificar se o dinhei-

ro destinado chegava ao município corretamente; com isso notou que a lacuna era regional. “Também entrei no site para verificar a distribuição dos recursos dos royalties do petróleo explorado no meu estado”. JB Donadon Leal é professor doutor da Universidade Federal de Ouro Preto (Ufop). Leciona no curso de Jornalismo e afirma que “o espírito da lei é o de criar a cultura da informação pública. Dessa forma, o cidadão não terá que requerer informações e esperar que elas sejam disponibilizadas, mas as encontrará disponíveis”. Esta iniciativa propõe que os costumes sejam mudados e incentiva a participação ativa do cidadão na gestão pública. A linguagem burocrática e a falta de divulgação são notadas como falhas do portal. O ex-presidente da Comissão Permanente de Licitações de Ouro Preto Guilherme Silva considera que o Portal “é de extrema utilidade sendo um dispositivo não só de consulta, mas também de fiscalização. Porém, ao efetuarem suas consultas, as pessoas encontram linguagem técnica, o que dificulta a compreensão do que lhes é exposto”. O município de Ouro Preto possui, desde 2010, seu próprio Portal da Transparência. Você pode acessálo junto ao site da Prefeitura (www. ouropreto.mg.gov.br). Já o Portal da Transparência do Governo Federal pode ser analisado no site www.portaltransparencia.gov.br.


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Dezembro de 2013 Arte: Ana Elisa Siqueira

esporte

Obras atrasadas afetam esporte em Mariana A cidade ficou cerca de cinco anos sem ginásio e recebeu primeira parte do Complexo Olímpico apenas em 2012 Osmar Lopes

Fernanda de Paula Em 2007, a cidade perdeu seu único ginásio e recebeu a promessa da construção de um Complexo Olímpico para a prática de várias modalidades esportivas. Problemas políticos enfrentados pela administração do município entre 2008 e 2010 foram os causadores dessa demora na entrega da primeira parte do Complexo. Esse atraso causou prejuízos à cena esportiva de Mariana e os atletas ficaram cerca de cinco anos sem um espaço para treinos e para competições. Mesmo após a entrega desse novo ginásio, o esporte ainda sofre prejuízos, já que o local não recebe treinamentos. O projeto do Complexo surgiu no mandato de 2005-2008 do prefeito Celso Cota e terá duas locações e equipamentos de várias modalidades esportivas (vide box). Para isso foram investidos R$ 27 milhões na construção de um Complexo Olímpico. Segundo o secretário de Esportes Helerson Freitas, esse projeto foi criado para incentivar o esporte na cidade. “O planejamento é que Mariana tenha o maior complexo esportivo do estado”, explica o secretário. As obras iniciaram em 2008, mas ficaram paralisadas por dois anos. Segundo o secretário de Esportes, isso aconteceu devido às trocas de prefeitos que a cidade enfrentou entre 2008 e 2012. “Tivemos vários problemas políticos, um prefeito aceitava a construção do ginásio, outro não”, disse Helerson. Por isso, a entrega da primeira parte do Complexo só aconteceu em 2012, com a inauguração da Arena Mariana. Ainda assim, o esporte continua prejudicado com a derrubada do antigo espaço. O presidente da Associação Marianense de Voleibol, Wallace Barros, reclama que não há liberação do Complexo para treinos, afetando o time. “Isso prejudica muito as equipes, pois quando chove

Ainda sem espaço para treinar, equipe de atletismo utiliza pista improvisada ao lado da quadra do Centro de Referência da Infância e do Adolescente

não podemos treinar na Quadra da Chácara, porque ela não é coberta”, diz Barros. O secretário de Esportes justifica a não liberação do espaço, dizendo que “a quadra da Arena é de um piso flutuante, demandando muitos cuidados e impossibilitando o uso o dia todo”. A equipe de atletismo também é prejudicada. De acordo com o presidente da Associação Marianense de Atletismo Luís Gustavo Gomides, os atletas já foram realocados várias vezes para diferentes bairros da cidade à espera da finalização das obras e ainda não encontraram um local apropriado para treinar.

Há outras equipes na cidade, como a de skate, natação e ginástica olímpica, que passam por problemas piores, já que não possuem local para treinos e tampouco para competições. Outro problema a ser enfrentado pela Arena Mariana é a não adequação à Portaria 622/2012, publicada logo após a inauguração da Arena. Essa norma estabelece que as arenas olímpicas de todo o país devem ter arquibancadas com cadeiras de plástico ou estofadas certificadas pelo Inmetro. Atualmente, a arquibancada da Arena Mariana é feita de degraus de cimento. De acordo com o

secretário de Esportes, não há planos para adequação a essa norma. “A Arena cumpre todos os requisitos exigidos pela União, apenas nesse quesito que ela não se adéqua. Futuramente, pretendemos cuidar desse assunto”, diz ele. A construtora responsável pela Arena segue no local fazendo pequenos acertos. O projeto inicial do Centro Olímpico sofreu algumas modificações e está em fase de reestruturação. Por isso, a construção dos outros espaços que vão compor o Complexo será iniciada em janeiro ou fevereiro de 2014, sem data prevista para conclusão.

Status dos Espaços do Complexo Olímpico Vila Aparecida Ginásio olimpico

Obra inaugurada

Pista de Skate

Elaboração do projeto

2 quadras

Elaboração do projeto

Ginásio de ginástica olímpica

Elaboração do projeto

Cabanas Pista de atletismo Piscina olimpica

Elaboração do projeto Elaboração do projeto

Ginástica na Praça incentiva atividade física ao ar livre Giuseppe Rindoni

Marianenses aproveitam as manhãs para fazer exercícios aeróbicos no Jardim, um dos quatro locais onde o Projeto Ginástica na Praça acontece

Daniela Karine Todos sabem que praticar exercícios físicos faz bem para o corpo e para a mente. Para estimular os moradores de Mariana à prática de atividades físicas e proporcionar melhor qualidade de vida, a Secretaria Municipal de Desportos desenvolve o Projeto Ginástica na Praça. Ele foi criado para atender principalmente a pessoas com idade superior a 40 anos. A iniciativa acontece em quatro bairros da cidade: Praça Gomes Freire (Centro); Toca do Zé Pereira (Chácara); Escola Municipal Dom Luciano (Rosário) e Ginásio Poliesportivo (Passagem de Mariana). A iniciativa consiste em oferecer atividades ao ar livre, orientadas por professores de educação física. “Queremos levar a prática de atividades físicas a locais diferentes, para incentivar as pessoas a fazer algo que não fosse somente dentro das praças esportivas”, explica o secretário Municipal de Desportos, Helerson Freitas da Silva.

A professora do projeto Raiane Aparecida Pereira disse que as alunas que participam das atividades começaram a sentir vontade de praticar regularmente exercícios físicos. “Eles fazem bem física e psicologicamente”, complementa Raiane. A dona de casa Maristela Avelino Guerra Coelho participa do Ginástica na Praça há quatro meses e já percebeu os benefícios do projeto. “Os exercícios são bem prazerosos. Cada uma de nós tinha algum problema como dor ou depressão, por exemplo. E hoje a gente ouve comentários que as dores melhoraram, outras colegas dizem que não fazem mais uso de remédios e algumas falam que até ajudou na cura da depressão.” O Ginástica na Praça atende hoje cerca de 120 pessoas. Em dezembro, mais três localidades serão contempladas pelo projeto. Haverá atividades nos bairros Cabanas, Santo Antônio e na Arena Mariana. Para participar do

projeto, os interessados devem se cadastrar no local onde são realizadas as atividades.

Exercite-se: Segundas e quintas-feiras Horário: 8h às 9h Chácara – Toca do Zé Pereira Rosário – Escola Municipal Dom Luciano Terças e sextas-feiras Horário: 8h às 9h Centro – Praça Gomes Freire (Jardim) Passagem de Mariana – Ginásio Poliesportivo As inscrições podem ser feitas no local. Fonte: Assessoria de Imprensa da Secretaria Municipal de Desportos

Academia a Céu Aberto no Bairro Rosário Daniela Karine A prática de exercícios ao ar livre é cada vez mais frequente no país. Projetos que estimulam esse tipo de atividade motivam mais pessoas a praticar exercícios físicos. Em Minas Gerais, existe o Projeto Academia a Céu Aberto, idealizado pelo Deputado Marques Abreu, ex-jogador do Clube Atlético Mineiro. O projeto consiste na implantação de academias a céu aberto em diversos municípios do estado. No momento, 52 municípios foram beneficiados e, em 2013, serão mais 36. O projeto prevê a instalação de 150 academias. O deputado Marques comentou que esse é um projeto pioneiro e explicou: “Os equipamentos das academias não utilizam pesos, trabalhando mais as atividades aeróbicas. Os exercícios podem ser praticados por pessoas de todas as idades”. Mariana foi uma das cidades contempladas pelo projeto, mas a academia ainda não foi instalada. Segundo o secretário de Desportos de Mariana, Helerson Freitas, ela será instalada no Bairro Rosário após término das obras de urbanização que estão acontecendo no bairro. A previsão de término das obras e da academia instalada é maio de 2014. O deputado Marques informou que está ciente que o projeto ainda não foi implantado. “Acompanho todo o processo desde a indicação até a efetiva execução e faço questão de verificar pessoalmente as instalações”, comentou. O secretário de Desportos, Helerson Freitas, informou que o município terá mais dez conjuntos de aparelhos a ser instalados em diversos bairros de Mariana. “Ainda está na fase de licitação, em breve teremos mais dez localidades sendo contempladas com estas academias”, diz ele.


Dezembro de 2013 Arte: Isabella Madureira

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Culinária

O doce pedaço da história Tradição secular da fabricação de doces é mantida viva e atrai turistas ao distrito de São Bartolomeu Ester Louback Há mais de dois séculos São Bartolomeu adoça a região de Ouro Preto. A produção de doces é o principal atrativo turístico e já foi considerada a profissão mais importante deste local. A tradição é repassada entre membros da própria família, mas a população está de braços abertos para transmitir esse estilo de vida para os forasteiros. As guloseimas do distrito são variadas, desde geleias, licores até compotas. Porém, os quitutes mais famosos são o doce de leite e a goiabada cascão. Os primeiros registros históricos do distrito datam do Século XVII, quando esta região tinha como função produzir e abaste-

cer de alimentos a capital mineira Vila Rica. A economia se baseava na extração do ouro, na agricultura e em uma tímida produção de marmelada. A produção deste doce se intensificou a partir do Século XIX e continuou até 1940, quando uma praga se instalou no local e extinguiu o marmelo. Para solucionar o problema, os doceiros adotaram a goiaba como seu principal ingrediente, pois na região sempre houve uma abundância de goiabeiras. Em São Bartolomeu, utilizam-se frutas encontradas nos quintais como goiaba, figo, pêssego, laranja-da-terra, cidra, limão e mamão. Não há uma plantação, as árvores são todas semeadas pelo vento e agentes naturais. Além

disso, a produção do doce respeita o ciclo da colheita. O ritmo pacato do distrito se adapta ao tempo da natureza e é esta mansidão que deixa o doce tão saboroso e único. Como afirma o pastor Cilas de Oliveira: “Os produtos do distrito me trazem a gostosa lembrança da minha infância. Apesar de atualmente morar na cidade, os doces artesanais trazem um pedaço do campo para o meu cotidiano”. Além de gostosa, a goiabada cascão faz bem para a saúde. Segundo a engenheira agrônoma Leila de Castro, o doce ajuda a combater a anemia, devido às vitaminas encontradas na goiaba. O processo caseiro de produção une diversas gerações desde a colheita e o prepa-

Giuseppe RIndoni

Este é o doce de maior brasilidade que eu conheço, lembra samba, o famoso ‘Romeu e Julieta’. Combinação perfeita que está na mesa de varias classes sociais brasileiras. É romântico, pois é uma combinação perfeita entre o queijo mineiro e este delicioso doce.” Leila de Castro, 48 anos.

O preparo artesanal dos doces de São Bartolomeu dá singularidade ao produto final Giuseppe RINDONI

O doce é aquela coisinha assim... Sabe aquela coisa que toca o coração? Que todo mundo gosta de pelo menos um pedacinho. O doce consegue tocar o coração das pessoas. Quem vem à São Bartolomeu sempre recebe esse toque, esse carinho através do doce.” Pia Chaves, 69 anos.

ro, até os retoques finais. Antes do amanhecer, as frutas são colhidas e preparadas para o cozimento imediato. A doceira Pia Chaves, que trabalha neste ramo há mais de vinte e cinco anos, afirma ter deixado a capital mineira para criar sua família no distrito. Ela acredita que a tradição familiar e o ritmo próprio do local são o alicerce da tradição de São Bartolomeu. Segundo Pia, atualmente, é raro encontrar doces de frutas caseiros sem agrotóxicos, sendo este o diferencial do distrito. O doceiro Vicente “Tijolo”, 79 anos, como é conhecido entre os moradores, tem como sua única fonte de renda a venda de doces. Desde criança ajudava o seu pai na produção e fala sobre a dificuldade em manter o trabalho devido à imigração dos jovens para os centros urbanos. “A maioria dos doceiros morreram e seus filhos foram para a cidade. Na minha época, a cada cinco casas, três faziam doce. Hoje já diminuiu mais de 50% dos produtores”, afirma Vicente. No ano de 2008, a produção de Doces de São Bartolomeu foi considerada Patrimônio Imaterial Municipal pelo Instituto do Patrimônio Histórico e Artístico Nacional (Iphan) e, desde então, o distrito está conseguindo maior visibilidade para a região, aprimorando a produção sem perder a qualidade e a característica artesanal. Para auxiliar nesse trabalho, no ano seguinte, os doceiros criaram a Associação dos Doceiros de São Bartolomeu, com o intuito de orientar os profissionais na otimização e produção de doces. Apesar das dificuldades para a manutenção da tradição, o doce de leite e a goiabada cascão de São Bartolomeu são inconfundíveis entre os turistas e os consumidores da região. O mito da culinária que flui no distrito mais antigo de Ouro Preto vai além da sua importância econômica: ele conta a doce história de um povo que acolhe moradores e curiosos da maneira mais saborosa possível.

VEJA MAIS INFORMAÇÕES SOBRE ESSES DOCES NA VERSÃO ONLINE : http:// migre.me/gHNYG

Assim como as receitas, os materiais utilizados na produção são herdados pelos doceiros

#eu no Lampião

Os protestos populares que aconteceram em diversas regiões do Brasil em junho e julho desse ano deram o que falar. Milhares de brasileiros foram às ruas, clamando por melhorias e por respeito a seus direitos. O preço abusivo das passagens do transporte coletivo, a corrupção política e os altos gastos com as obras esportivas foram alguns dos principais motivos dos protestos. Em Mariana, a população abraçou as causas sociais e fez sua voz ser ouvida. Veja como algumas pessoas avaliaram esse episódio histórico:

“Vi as manifestações com bons olhos. Principalmente pela juventude ter se manifestado em favor de um Brasil melhor, onde ela poderia ter oportunidades melhores não só para si, mas para as gerações posteriores. O difícil é a efetivação das propostas que foram lançadas, especialmente aquelas que podem trazer resultados concretos para a sociedade.” Lucas Henrique, 22, estudante

“Só de ter abaixado a passagem, já representa alguma mudança. O problema é o vandalismo, porque enquanto alguns tentam melhorar, outros tumultuam. Foi um ato nobre dos que foram se manifestar.” Michele Juventino, 25, secretária

“Ainda falta uma sacudida. As pessoas estão brincando que o gigante acordou, fez xixi e voltou a dormir. Deveriam ter outras manifestações, mas com fundamentos, porque vimos coisas bem ‘sem noção’ e pessoas protestando por qualquer coisinha. Eu, que trabalho com comédia, percebo muitas piadas em torno de tudo o que aconteceu.” Flavio Souza, 36, professor

“O que me motivou a ir às manifestações foi a mobilização geral, que dava a ilusão de que alguma coisa ia mudar, mas as manifestações foram abafadas quando o Brasil ganhou a Copa das Confederações.” Gessica Silva, 21, estudante

“Fui para a rua e ainda levei meus filhos junto comigo. Queria que eles vissem um pouco do que eu tive o prazer de ver em 1992, pelo impeachment do Collor. Foi histórico, uma coisa linda ver novamente tantas pessoas juntas por uma causa.” Fernando Maciel, 41, bancário

Texto: Hiago Maia

Foto: Bárbara Monteiro


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Dezembro de 2013 Arte: Danielle Diehl

turismo

Memória trilhada em um vagão de histórias Trem a vapor que fazia o percurso de 18 quilômetros entre Mariana e Ouro Preto foi substituido por máquina a diesel thiago anselmo

Daniella Andrade Trilhos, barulho, carvão, chaminé, fumaça e fuligem são características peculiares do trem a vapor, mais conhecido como Maria-Fumaça, que chega ao Brasil em meados do Século XIX. Usadas como principal meio de transporte por quase 100 anos, as locomotivas foram palco de novelas da vida de muitos que nela viajaram e tiveram papel fundamental no desenvolvimento das cidades. Na Região dos Inconfidentes, os 18 quilômetros de percurso férreo que separam Mariana e Ouro Preto eram vencidos por uma Maria-Fumaça. A vida passava devagar por essas bandas. As cargas e notícias não chegavam com menos de seis horas vindas da capital Belo Horizonte. Ao redor da estação, conhecida também por Estação Parque, pequenos comércios eram instalados na praça onde

hoje está localizada a Prefeitura Municipal de Mariana. A população esperava os jornais impressos chegarem por intermédio da Central do Brasil, principal ferrovia do país, que inaugura, em dezembro de 1888, seu prolongamento e criação do Ramal de Ouro Preto. Depois a continuação até Mariana, concluída em 1914. Após 43 anos, em 1957, por processo de modernização, as máquinas a vapor foram substituídas por locomotivas a diesel. Composta por quatro linhas, a estação de trem localizada na primeira capital de Minas, possuía cerca de 200 vagões para a locomoção de cargas e passageiros . O advogado Frederico Ozanan Teixeira, 72 anos, passou a juventude andando de trem de Mariana a Ouro Preto para estudar, nos anos 50. “Os mais espertos usavam guarda-pós”, afirma Ozanan, referindo-se thiago anselmo

Atuais locomotivas que fazem trajeto Ouro Preto-Mariana

Tradicional Maria-Fumaça, sem peças para reposição, está parada há mais de um ano na garagem da Ferrovia Centro-Atlântica

às capas de proteção contra a fuligem expelida pela chaminé da Maria-Fumaça. Um vestígio daquele tempo está guardado na oficina da Ferrovia Centro-Atlântica (FCA), ao lado da Estação de Trem de Mariana. Trata-se da locomotiva a vapor fabricada na República Tcheca, em 1949, utilizada no passeio turístico do Trem da Vale, entre Mariana e Ouro Preto, iniciado em 2006. A Maria-Fumaça, de 169 toneladas e 22m de comprimento, está paralisada há mais de um ano para manutenção, de acordo com o inspetor de tração da Vale, Gilberto Bastos da Cruz. Desde o início

das atividades do trem turístico, a locomotiva a vapor contava com a ajuda de uma movida a diesel, para aliviar o peso e diminuir a quantidade de vapor necessário para a locomoção do trem, ou seja, menos queima de carvão, lenha e abastecimento de água. Privatização Em 1996, com o processo de privatização das ferrovias, a FCA, empresa do Grupo Vale, ficou com a extensão dos 18 quilômetros entre Ouro Preto e Mariana. No mesmo ano a Vale paralisou as atividades na ferrovia por conta das más condições físicas da estrada de ferro. Em 2005, iniciou o pro-

crônicas

Um lugar de “estórias”

A Biblioteca Pública Benjamin Lemos tem um acervo de mais de 12 mil títulos

Em princípio tive a impressão que a biblioteca estava vazia, mas num canto avistei um senhor, trajando roupas simples, olhar concentrado, segurando com firmeza um livro em suas mãos. Resolvi me aproximar. Comecei a conversar e descobri nele uma verdadeira paixão pelos livros. Contoume que desde criança gostava de ler,

Confira Inspire-se! alguns dos livros mais lidos: Antologia Poética, de Vinícius de Morais O Encontro Marcado, de Fernando Sabino Dom Casmurro, de Machado de Assis Ninguém é de ninguém, de Zibia Gasparetto

Capitães de Areira, de Jorge Amado

A hora da estrela, de Clarice Lispector E no final a morte, de Agatha Christie O Cortiço de, Aloisio de Azevedo Caçadas de Pedrinho, de Monteiro Lobato Grande Sertão Veredas, de Guimarães Rosa Fonte: Biblioteca Benjamim Lemos

Viagens de trem: Embarques de Mariana: Sexta e sábado: 13h e 16h Domingos: 11h30 e 15h Embarques de Ouro Preto: Sexta e sábado: 10h e 14h30 Domingos: 10h, 13h30 e 16h30 Preços: Inteira: R$ 40,00 ida R$ 50,00 ida e volta. Meia: R$ 20,00 ida R$ 25,00 ida e volta. Vagão Panorâmico: R$ 60,00 ida R$ 80,00 ida e volta Fonte: www.tremdavale.org

Pegando carona na terapia thiago anselmo

Viviane Ferreira Andando pelas ruas de Mariana me deparo com um casarão típico de uma cidade histórica. Localizado em uma esquina, imponente, pintado de branco, com suas janelas de madeira, em um tom de azul escuro. Diante a sua porta, uma placa me chamou à atenção: “Biblioteca Municipal”. Em segundos, voltei ao meu passado e veio à mente várias cenas da época de escola, quando era frequentadora assídua da biblioteca do meu bairro. Era um lugar sempre cheio de vida, muitos estudantes dos bairros vizinhos utilizavam deste espaço para estudar. A nostalgia me fez rapidamente entrar no local. No interior do casarão me deparei com muitas estantes abarrotadas de histórias e autores. Machado de Assis, Fernando Pessoa, Carlos Drummonnd de Andrade, Jorge Amado, contos e crônicas surgiram a minha frente. Impossível não se deixar envolver pelas lembranças, as sensações e emoções que aqueles livros me propiciaram.

cesso de recuperação da linha férrea para o turismo, inaugurada em 05 de maio de 2006. O percurso possui belas paisagens naturais e arquitetônicas que selam as cidades irmãs na história. Hoje, composto por uma locomotiva a diesel e cinco vagões para passageiros, o trem turístico comporta 292 pessoas por viagem, com velocidade média de 20 km/h. Os vagões que mantêm os mesmos desenhos dos antigos trens alimenta a saudade da chaminé e, como na poesia de Manoel Bandeira, faz o embalo do “café com pão” da Maria-Fumaça deixar a viagem sobre os trilhos muito mais nostálgica.

pois assim conhecia outros mundos diferentes do seu. Por causa das dificuldades de sua família não conseguiu seguir adiante nos estudos, mas nunca perdeu o entusiasmo e o fascínio pela leitura. Sinto a emoção nas suas palavras, o brilho no seu olhar ao contar o encantamento pelos livros. “Venho toda semana pegar livros, a leitura é viciante”, me diz com um sorriso estampado no rosto. E assim, mais uma vez , aquele senhor irá cumprir a sua praxe semanal. Depois de olhar atentamente entre as estantes, escolheu o livro e foi para casa como se estivesse carregando um tesouro, o que para ele realmente é. Novamente eu fui transportada ao meu passado e aquela sensação prazerosa tomou conta da minha mente. A de ver que a biblioteca é sim, um lugar cheio de vida, histórias e paixões. Para todos os gostos e tipos de leitores.

Kênia Marcília fiança entre paciente e terapeuta, na Dedo polegar em haste, um simcarona ocorre o mesmo . É claro que ples gesto de “joia”, a linguagem somos alertados “para anotar a plauniversal da “carona” pode ser o iníca do carro”, “ligar pra alguém e avicio de grandes mudanças. Bem mais sar que está pegando carona”, como que “um jeitinho mais fácil e baramedidas seguras, mas preferimos to” de se locomover, é uma terapia acreditar que quem para pra oferesobre quatro rodas. cer carona, principalmente em dias Quando abrimos a porta do carchuvosos ou de sol a pino, é apenas ro de alguém que alguém generoso nos oferece caQuando abrimos a ou que quer comrona é como se porta do carro de alguém panhia naquele dia adentrássemos um em que tudo deu que nos oferece carona é consultório pela errado ou que nos como se adentrássemos um primeira vez, como sentimos solitários. um paciente espe- consultório pela primeira vez.” A carona é quarando ser atendise um livro de audo pelo terapeuta, a diferença é que toajuda motorizado, exercitamos a nesse caso não há distinção de papaciência como em nenhuma oupeis, caroneiro e motorista, ambos tra situação, em intensidades difesão pacientes e terapeutas. Depenrentes para caroneiro e motorista. de de quem quer se fazer ouvir, de O caroneiro necessita de uma paciquem quer falar ou apenas silenciar, ência maior em ficar esperando, na silêncio quebrado por aquele “oi” expectativa que alguém interrompa desconcertante ou pela indagação: a constante do movimento e diga a tá indo pra onde mesmo? frase tão esperada: “quer carona?”. Quando sentamos no divã, quer O motorista exercita uma pacidizer, na poltrona de um carro, soência menor, mas não menos imemos tomados pela ansiedade e isso diata: a de esperar que o caroneiro não foge ao motorista. Uma ansieentre no carro e se acomode logo, dade parecida com aquela da londe que coloque o cinto, muitas vezes ga espera por ser atendido em uma pressionado por outros motoristas consulta, à espera por ouvir chamar que buzinam insistentemente poro seu nome e no caso da carona, a que não exercitaram a paciência de espera pela quebra do gelo, o início esperar a generosidade alheia.Trânde uma conversa. sito! Irônico que com tantos teraMuitas vezes essa conversa aconpeutas em potencial seja responsável tece instantaneamente, motorista e por precisarmos de terapia. caroneiro falam sobre a infância, a E como não lembrar do farotina, os traumas, os prazeres ou tor primordial no nosso comparatisobre coisas triviais; outras vezes, vo? A sorte! Contamos com ela para o percurso termina sem a troca de conseguir um horário para consulnenhuma palavra, afinal o silêncio ta, contamos com ela para conseguir pode ser a melhor terapia - quereuma carona no horário, de preferênmos apenas alguém na poltrona, no cia na poltrona detrás, pois assim divã ao lado. como na sala de espera ou no divã, é Assim como é necessária consempre bom um cochilo.


Dezembro de 2013 Arte: Lucas Machado

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distrito: Lavras Novas

Produção de balaio trançado atravessa os séculos e sustenta famílias Atividade rentável segue tradição que sobrevive por conta própria, sem investimentos de órgãos públicos Fernanda Belo Lavras Novas está quieta, com apenas algumas pessoas começando a trabalhar ou abrindo seus comércios. O tráfego nas ruas é pequeno. Ao andar por esses caminhos tranquilos, alguns moradores circulam pelas casas de uns e outros. Conversa não falta. Seja ao telefone ou pessoalmente, não se vê uma pessoa sozinha. Percebe-se que a atividade predominante está no turismo: cartazes de escaladas, de passeios de canoa, de diversos restaurantes e pousadas, estão por toda parte. Porém, essa não é a única opção de entretenimento do distrito ouro-pretano. Lavras Novas também se mantém por meio da construção civil e do artesanato local: o balaio trançado. São cestos, vasilhames e esteiras de vários tipos e formas. Essas peças artesanais feitas de taquara, principal matéria-prima, são utilizadas como utensílios e artigos decorativos. A produção desses materiais segue uma tradição, que passa de geração em geração através dos anos. A técnica, praticada desde a ocupação do distrito, três séculos atrás, servia para armazenar as cargas transportadas pelos tropeiros. Também se utilizavam as esteiras na construção civil, para o forro das casas locais e dos arredores. Já no Século XX, o transporte de cargas se moderniza e a produção da cestaria é reduzida. Foram poucos os habitantes que permaneceram com a atividade para sustento das famílias. O balaio passa, então, a ter maior valor artistico, do que utilitário. Desde os nove anos de idade, o artesão Carlos Aurélio de Carvalho, 65, presencia a execução dessa atividade pela sua família. Recorda de fazer o ba-

Paula Bamberg

Carlos Aurélio mostra peças em taquara trançada em seu ateliê. Este tipo de artesanato é produzido no distrito desde o Século XVIII

laio com os restos que caiam ao chão, quando seu pai produzia o verdadeiro material a ser vendido. Hoje, referência no artesanato local, é o próprio Carlos quem ensina a prática do balaio na região. O modo de produção e a comercialização atuais são mais cômodos e realizados nas residências, quintais das casas ou nos ateliês de cada artesão. As vendas ocorrem nesses mesmos lugares. Os artistas já possuem uma clientela fixa e a maioria das peças são feitas sob encomenda. O crescimento do turismo também fa-

cilitou esse conforto e amplia, cada vez mais, a produção. MATÉRIA-PRIMA A coleta da taquara é feita em matas da região, em propriedades privadas da Barragem do Custódio e da Serra do Macaco, que ficam em torno de 20 quilômetros de Lavras Novas. Os cesteiros compram as taquaras dos proprietários e pagam por um carro que entrega o material nas casas dos produtores. A matéria-prima não é difícil de ser encontrada, porém, os custos para obtê-la são altos e isso reflete no

preço final dos produtos, que podem variar de R$ 5,00 até R$ 150,00. De acordo com o artesão Carlos Aurélio, o capital investido para a produção do balaio é por conta própria dos artesãos. O mecânico Paulo Sabin, 45, e o aposentado Celso, 64, moradores de Lavras Novas, também afirmam não ter nenhum investimento externo para a produção das cestarias. As peças também podem ser produzidas com outros tipos de materiais. Segundo Carlos Aurélio, o bambu e a vara são mais fáceis de se-

rem encontrados, mas requerem técnicas peculiares, como ferramentas específicas e formas de tratamento adequado. Já a taquarí, espécie de taquara, é a matéria-prima utilizada pelos antigos produtores e, se torna a ideal para a confecção do balaio, como afirma o artesão. Essa peça ainda não está disponível para uso, apenas daqui a sete anos; isso acontece, pois o ciclo de vida da espécie finda logo depois da sua reprodução, portanto, ao produzir sementes, ela seca e morre e, só após dez anos estará apta para ser coletada

de novo. A taquarí apresenta uma maior facilidade de manuseio e encontra-se em qualquer lugar, como, por exemplo, na beira de córregos. A produção artesanal do balaio com taquara trançada não está ligada apenas à renda para os produtores. As cestarias fazem parte da cultura e da tradição dos habitantes de Lavras Novas, e o artesão Carlos Aurélio defende que essa cultura permanecerá viva, mesmo com o passar dos anos porque “aquela pessoa que tem amor, que quer continuar com aquilo, vai seguir”.

cultura

Mão na massa e som na caixa Marllon Bento

Dayane Barreto O ritmo da bateria se funde ao som grave do baixo e tudo se mistura com /a potência inconfundível da guitarra. O som fica tão alto, no pequeno espaço em que ocorrem os ensaios, que parece pulsar dentro da gente. As composições vão direto para o computador, onde são tratadas pelos próprios membros das bandas e disseminadas pela internet. É assim, palpitando paixão pela música e colocando a mão na massa, que o cenário independente de Ouro Preto e Mariana ganha a sua força. Com repertórios autorais e integrantes que tentam conciliar a atividade com alguma outra ocupação profissional, bandas como a Groove de Vinil e a Arquelogia Siderúrgica fazem parte dessa verdadeira conexão de sons e pensamentos. “Eu acho que o cenário musical daqui é muito rico, principalmente se comparado a outras cidades do mesmo porte no interior de Mi-

Por falta de espaço para se apresentar , Vitor Oliveira, um dos idealizadores do festival Lupa, aprecia, toca e produz música independete na região

nas”, comenta César Raydan, baterista da Groove de Vinil, que com uma produção inspirada no funk, mesclada com elementos do jazz e soul, esteve presente na programação da Virada Cultural de Belo Horizonte, evento que em 24 horas distribuiu por vários espaços da capital mineira, diversas atrações artísticas

e culturais, conseguindo reunir cerca de 200 mil pessoas. Já a Arqueologia Siderúrgica, de Ouro Preto, define seu som como uma mistura de stoner rock, um subgênero do metal, com neo-psicodelia, inspirado na música psicodélica dos anos 60. “A gente vê muita banda de samba e MPB se destacando por aqui, mas

para o rock mesmo falta espaço”, destaca o guitarrista André Silva, que se torna o Tio André durante as manhãs, de segunda à sexta-feira, quando deixa a guitarra de lado para cuidar de seus alunos na creche Casa da Criança Jesus Maria e José, em Mariana. No rastro do movimento “faça você mesmo” do punk

da década de 70, um dos precursores da cultura independente, foi criado o Rock Generator. O festival nasceu a partir da aquisição de um gerador a gasolina, que levado a diversos lugares de Ouro Preto, possibilita a apresentação de bandas convidadas que, além do gosto pela música, compartilham tam-

bém a falta de espaço, apoio e reconhecimento. A última edição, em julho, atraiu cerca de 160 amantes do bom e velho rock no alto do Morro da Forca.. Os festivais Pepita, Grito Rock e Lupa são outros exemplos de um circuito que busca dar maior visibilidade para bandas independentes da região.


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Dezembro de 2013 Arte: Bruna Lapa

margens

Filipe Monteiro (fotos) Patrimônios cruzados por olhares distintos. Estaria o belo restrito ao legado que se firma em pedra nas montanhosas terras? As mãos calejadas pelas bateias, assim como a dos pais, não são desejadas às gerações futuras. Encarar a água fria logo pela manhã vira hábito. Às vezes, usar um chinelo é suficiente. É preciso aproveitar as manhãs de sol. Escavar, esperar e, enquanto isso, coexistir com as picadas de insetos e com as consequências físicas do repetitivo esforço de se inclinar. Entre muitos descasos, há um que se destaca: pela mesma água que garimpam, correm resíduos dos mais variados. Esgotos que desembocam sem nenhum tratamento e lixos lançados por incontáveis mãos compõem o ambiente de um rio onde o ouro é o reluzir mais valioso, mas não o único. Também não é o suficiente. Faiscar é renda complementar, sujeita às próprias vontades da natureza. Se a chuva vem, como é frequente nas tardes de verão, o trabalho iniciado com afinco ao amanhecer se perde entre as águas pela força da correnteza. Então é preciso aguardar até que o mesmo sol que castiga a pele retorne.

Isadora Ribeiro (texto) Patrimônios cruzados em eixos de visão opostos. O que é matéria estática se ergue ao alto. O que é tradição viva se prolonga no fluir das águas. A arquitetura barroca tombada em pedra e cal faísca o ouro bateado com o mesmo sacolejar iniciado no Século XVII. Entre a disseminação dos gestos, a perpetuação das técnicas e a propagação de uma cultura, os faisqueiros fazem de sua tarefa um patrimônio imaterial da antiga Vila de Nossa Senhora do Ribeirão do Carmo. É no leito desse mesmo ribeirão, que outrora nomeou aquela que viria a ser Mariana, que as bateias seguem seu compasso. O embalo das treinadas mãos orientam os olhares de quem acima caminha e de quem abaixo busca um mínimo cintilar do que se procura com teimosia. Na incerteza a que se lançam em repetidos dias, os distintos personagens completam a arquitetura do centro de Mariana. Em uma rotina que se cruza nas buscas imprevisíveis, a moldura barroca reveste o perpetuar contemporâneo de uma herança diluída pelos séculos que a trouxeram e que a conduzirão no tempo.

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margens


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