Púrpura

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Púrpura Edição 08 julho de 2019

Celebração do universo feminino

Sexualidade Feminina Curiosidades sobre pontos de prazer do órgão sexual feminino

Metamorfose Ambulante Histórias sobre transições capilares de mulheres negras



Caras leitoras

A

Revista Púrpura é voltada para a desconstrução do papel feminino em sociedade. A maior preocupação é fazer com que todas as mulheres se sintam representadas e se reconheçam em pelo menos algum dos aspectos apresentados pelas editorias da revista. Entendemos que para conseguir ter uma boa relação externa com as pessoas, é necessário se conhecer, saber de suas especificidades e celebrá-las. Pensando nisso, elaboramos espaço para que a mulher conheça e entenda seu corpo, para que seja capaz de tomar as suas próprias decisões, baseadas em conhecimento prévio concreto e não em pressões exteriores. Vamos além de apenas o corpo feminino e a celebração dele, vamos também para o mercado externo, abordando profissões que ainda tem pouca visibilidade e são pouco executadas pelas mulheres. O objetivo é mostrar que todos os espaços precisam ser ocupados pela representatividade feminina e que o maior incapacitador, por vezes, são preconceitos sem embasamento. Na Púrpura não há espaço para ódio contra qualquer existência. Mulheres brancas, negras, gordas, magras, ou qualquer meio termo vão ter espaço em nossas páginas. Não estamos procurando nenhuma ditadura estética, comportamental, ou qualquer outra, aqui é um espaço para ampliar as possibilidades, e fazer com que talvez você se sinta mais capaz. Esperamos que você aprenda conosco e continue o processo diário de se descobrir, de se amar e ver quantas coisas que ainda podemos conquistar juntas. Assinado: Ana Luíza Pedroso e Georgia Rovaris.

Expediente Tipografia textos: Kepler std Corpo: Dez Tipografia Títulos: Abril Fatface Imagem capa: Art Por Doula M (Pinterest). Textos por: Ana Luíza Pedroso, Georgia Rovaris, Luana Moreno e Juliana Ferrari. Imagem da página 2: Freepik Esse trabalho é experimental, sem fins lucrativos e de caráter puramente acadêmico, criado e editado pelas acadêmicas Ana Luíza Pedroso e Georgia Rovaris, como exercício de projeto gráfico-editorial para a disciplina de Laboratório de Produção Gráfica do curso de Jornalismo da Universidade Federal de Santa Catarina (UFSC) no semestre 2019-01. Não será distribuído, tampouco comercializado. Seu conteúdo e suas opiniões são de inteira responsabilidade dos acadêmicos, isentando assim, a UFSC e o docente da disciplina de qualquer responsabilidade legal por essa publicação. Julho de 2019


Sumário

5 8

12

Regula Métodos contraceptivos: Anticoncepcional oral

Fridas

Grandes mulheres: Perfil com Clarice Lispector

Ventre

Maternidade solo: Não é como brincar de bonecas

16 Afrodite 18 imPERFEIÇÃO 23

Onde ela quiser

Mercado de trabalho para mulheres e guia da profissional: Pilota de avião Segredos da sexualidade feminina: Pontos de prazer

Entrevista com a Daniela Dalpozzo Cabelo afro e transição capilar

4 | Julho 2019 | edição 1 | Púrpura


Regula

A pílula é o método mais comum para evitar gravidez Créditos imagem: Simone Van Der Koelen

A

pílula anticoncepcional é um dos métodos de contraceptivos mais conhecidos e usados pelas mulheres no Brasil. Uma pesquisa feita pelo IBGE (Instituto Brasileiro de Geografia e Estatísticas), em 2015, mostrou que cerca de 79% das brasileiras faziam uso de métodos contínuos de prevenção de gravidez. Os métodos são os mais variados, DIU, pílula anticoncepcional, injeção, e por aí vai. Em entrevista para o Dr. Dráuzio Varela, o médico ginecologista José Mendes Aldrighi explica como são feitas as pílulas: “as pílulas contêm dois hormônios femininos sintéticos: o estrogênio associado ao progestogênio. Além de bloquear a ovulação, essas pílulas agem sobre o colo do útero, impedindo que

dilate, como forma de dificultar a passagem do espermatozoide para a cavidade uterina, ou seja, elas fecham a porta de entrada do espermatozoide. Além disso, agem no próprio útero evitando que adquira as condições necessárias para acolher o ovo. Há um segundo grupo é formado pelas pílulas que contêm só progestogênio. Essas agem sobre a hipófise para bloquear a ovulação e provocam um fechamento mais intenso do colo do útero para impedir a ascensão do espermatozóide.” A pílula, em geral, tem 97% de eficácia com o uso recomendado, ou seja, se o medicamento que você está tomando supre as necessidades do seu corpo. Além disso, ela precisa ser tomada todos os dias no mesPúrpura | edição 1 | Julho 2019 | 5


mo horário, isso vai fazer com que ela seja ainda mais eficaz, aumentando a eficácia de 98% a 99%. Caso a mulher faça uso regular, mas com alguns deslizes, de horário e esqueça de tomar dentro de 12 horas a probabilidade de engravidar é mais alta, a eficácia pode ser de 95%. Cada metabolismo vai agir diferente com a quantidade de hormônio que for ingerida. Os médicos ginecologistas geralmente recomendam o uso da pílula para o primeiro contato da mu-

79% das brasileiras dizem fazer uso contínuo de métodos contraceptivos lher com métodos contraceptivos, isso porque a dose hormonal presente nas pílulas estão distribuídas, o que faz com que o corpo vá absorvendo poucas doses dos hormônios e tenha uma melhor adaptação, sem muitas chances de efeitos colaterais muito agudos. Apesar disso, há uma lista de possíveis efeitos colaterais que podem ser causados nas mulheres, os principais deles podem ser vistos a seguir.

Efeitos colaterais mais frequentes: • • • • • • • • • •

Dores de cabeça Náuseas Alteração no fluxo mentrual Retenção de líquidos Inchaço Alteração do humor Diminuição do libido Aumento do risco de trombose Aumento de acnes (espinhas) Alteração dos sintomas da TPM

6 | Julho 2019 | edição 1 | Púrpura

É importante lembrar que as pílulas anticoncepcionais não são indicadas apenas para a prevenção de uma gravidez indesejada. Como os hormônios presentes afetam o funcionamento de todo o corpo, podendo ser usada inclusive para redução de alguns problemas do útero e ovários, por exemplo. Não há apenas pontos negativos com o uso desse medicamento, há também aspectos positivos.

Benefícios das pílulas: • Regula o período da menstruação • Pode diminuir o fluxo de algumas mulheres • Pode reduzir as dores das cólicas menstruais • Controlar disfunção hormonal que causa acne • Diminuir síndrome do ovário policístico • Reduzir miomas

Você sabia? • A pílula pode ser usada para ajudar na prevenção de doenças causadas por falta de cálcio, como osteopenia ou osteoporose, para mulheres acima dos 40 anos. • A pílula foi criada por um pesquisador católico que acreditava que o sexo era uma das chaves para um casamento saudável, feliz e duradouro. Mesmo que a igreja católica acredite que o único método usado deve ser o uso de tabelas • As primeiras pílulas eram feitas com estrogênio de inhames. • Caso você apresente: Hemorragias, Anemia, Ausência de menstruação, Ganho de peso, Perda de


líbido, após o uso das pílulas, esses são os principais indicativos que a medicação que você está tomando não é indicada para o seu corpo. Levando isso em consideração, você deve voltar ao seu médico, o mais rápido possível, e trocar a pílula que está tomando.

Como todo medicamento, as pílulas anticoncepcionais devem ser tomadas levando em consideração que também possuem uma série de contra indicações. Saber o seu histórico de doenças já diagnosticadas em sua família pode ajudar nesses casos. Os riscos são sérios, e devem ser estudados cautelosamente, já que os hormônios presente nos comprimidos podem estimular que doenças que alguns pacientes já têm tendência a ter. Portanto nas consultas médicas não se deve esconder qualquer tipo de problema que pode fazer com que seu organismo não seja indicado para o uso da medicação. Nestes casos, algum outro método pode ser escolhido. Quando for se encontrar com a sua médica se certifique que você não está dentro de nenhum dos grupos de riscos:

Importante: É muito importante a consulta com um ginecologista para a indicação do melhor método contraceptivo para o seu caso. O uso da pílula anticoncepcional não previne doenças sexualmente transmissíveis, (DSTs) como AIDS e sífilis. Portanto, a camisinha deve sempre ser usada em todas as relações sexuais.

Reportagem por Ana Luíza Pedroso

Contra indicações: • Mulheres com parente de primeiro grau (pai, mãe) com problemas cardiovasculares • Com pressão alta • Fumantes acima de 35 anos • Com histórico de trombose • Com histórico de enxaqueca, câncer de mama ou câncer nos ovários • Diagnosticadas com diabetes Púrpura | edição 1 | Julho 2019 | 7


8 | Julho 2019 | edição 1 | Púrpura

, a t a r e e t i a s L en to t in tan ca i m l u ucó b IMAGEM: ACERVO PAULO GURGEL VALENTE


Fridas

Clarice Lispector “Eu sou tímida e ousada ao mesmo tempo”, declarou Clarice Lispector para uma entrevista à TV Cultura ,divulgada postumamente apenas em 28 de dezembro de 1977, a pedido da autora e jornalista.Caótica, intensa e muitas vezes incompreendida Clarice começou a escrever ainda criança, por volta dos 7 anos já tentava sem sucesso publicar contos no Diário de Pernambuco.A paixão por escrever parecia não ter vínculo nenhum com a família, mas mais tarde ela descobre que sua mãe escrevia diários com textos pessoais e poemas, apesar que ela nunca chegou a lê-los. Sua obra é carregada de epifanias, que de um certo modo simbolizam o bucolismo de Clarice. Ela declarou em entrevista à TV Cultura, ao ser questionada se era mais fácil se comunicar com adultos ou crianças, que “Quando eu me comunico com adulto eu estou me comunicando com o mais secreto de mim mesma, aí é mais difícil”. Enquanto literata produziu no período do Modernismo, já sua experiência como jornalista foi na Era Vargas e Ditadura Militar, carregada de repressão. A autora nasceu em 10 de dezembro de 1920, batizada de Haia Lispector, em Tchetchelnik, uma aldeia da Ucrânia. Chegou ao Brasil em 1922 com pouco mais de um ano de idade, junto dos pais e das irmãs, fugindo da perseguição na Guerra Civil Russa.Viveu em Maceió até 1925 quando se muda para Recife, no Pernambuco. Apesar de não ser natural do Brasil, se considerava brasileira, nordestina. Se criou no nordeste e essa vivência foi inspiração para sua última novela “Treze nomes, treze títulos” que conta segundo Clarice “A história de uma moça que só comia cachorro-quente”. Em 21 de dezembro de 1930 morre sua mãe, na época Clarice tinha apenas 10 anos.

Em 1939 entrou para faculdade de direito, onde conhece seu futuro marido. Nesse mesmo ano pediu a nacionalidade brasileira, conquistada em audiência no dia 6 de outubro. “Aos poucos o dia vai‑lhe entrando pelo corpo. Ouve um ruído de folhas secas pisadas. Passos longínquos, miúdos e apressados”(trecho do conto O Triunfo), esse ritmo também levava Clarice. Acordava às 4h30 ou 5h e tomava seu café, fumando sozinha. As primeiras horas da manhã eram suas preferidas, o dia ia começando e o trabalho junto dele. O Triunfo foi o primeiro conto publicado na imprensa, em 1940, no semanário Pan. Em 26 de agosto desse mesmo ano morre seu pai. Agora era apenas ela e as irmãs. Nesse período Clarice trabalhava em um escritório ,além dos estudos universitários. Insatisfeita com seu emprego pede para Lourival Fontes um posto de tradutora no DIP, departamento de imprensa e propaganda criado por Getúlio Vargas no ano anterior. Na falta da vaga ganha a função de redatora e repórter da Agência Nacional e começa efetivamente seu trabalho como jornalista. Em 1943 lança seu primeiro romance Perto do coração selvagem. Nesse mesmo ano concluiu os estudos de direito, apesar de nunca ter tido a intenção de seguir carreira, e casou-se com Maury Gurgel. Seu marido era cônsul de terceira classe e logo foi designado agente de ligação entre o Ministério das relações exteriores e as autoridades estrangeiras, em Belém do Pará. Ficaram em Belém por 6 meses, nesse tempo Clarice ficou afastada das funções de jornalista e impaciente declarou “Tenho lido o que me cai nas mãos”, em carta enviada do Central Hotel, em 6 de fevereiro, ao amigo Lúcio Cardoso.

“Eu sou tímida e ousada ao mesmo tempo”

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“As árvores estavam carregadas, o mundo era tão rico que apodrecia. Quando Ana pensou que havia crianças e homens grandes com fome, a náusea subiu-lhe à garganta, como se ela estivesse grávida e abandonada”,trecho do conto Amor, presente na obra laços de família. Esse fluxo de consciência do conto é muito presente nas obras de Lispector, tanto nos contos como nas crônicas jornalísticas. Em um contexto de segunda guerra mundial, seus textos lembravam do ser humano, traziam a tona uma sensibilidade que podia ser esquecida. No ano de 1945, o último de Guerra, Clarice trabalhou em um hospital americano dando assistência a brasileiros feridos na guerra. Nos anos seguintes a principal atividade profissional da autora são os contos.Recebeu ,em 1951, o convite de publicar uma seleta deles na coleção Cadernos de cultura, ,do Ministério da Educação e Saúde, dirigida por Simeão Leal. A autora estava no Brasil vivendo no Rio de Janeiro, depois de seis meses na Inglaterra. Mas no próximo ano se muda para os Estados Unidos, onde fica por sete+ anos. No período em solo carioca assina sob pseudônimo de Teresa Quadros a coluna feminina Entre Mulheres para o semanário Comício. Nas colunas publicou especialmente crônicas. A crônica é um gênero misto, fica entre o jornalismo e a literatura, porém se enquadra no jornalismo literário. Carrega o cotidiano com um aspecto mais reflexivo diferente da notícia que apenas expõe os fatos e não visa fazer o leitor pensar .Para Campos (1966), “a crônica nasceu no jornal e para o jornal”. O estilo é parte essencial do gênero, por isso cada texto carrega muito de seu autor. Nesse sentido Clarice contribuiu para o jornalismo literário por seu estilo original, seus textos tratavam de assuntos aparentemente superficiais mas que evidenciaram problemas sociais e estruturais como a subjugação da mulher na década de 1960.

Ela separa-se do marido em 1959, e retorna ao Brasil. O divórcio traz uma necessidade de trabalho para complementar sua renda, que no período vinha de direitos autorais dos seus livros e publicações ocasionais em periódicos, com isso volta a colaborar na imprensa. Começa em agosto a coluna ,no Correio da manhã, Correio feminino- Feira de utilidades.Ela adota o pseudônimo de Helen Palmer para evitar julgamentos. Por volta de 1950, surgiu o anticoncepcional, o preservativo de látex e antibióticos para tratar doenças sexualmente transmissíveis, essas novidades contribuíram para a formação de uma nova identidade social feminina, junto do feminismo que nasceu no Brasil uma década antes. Isso não denota total liberdade da mulher, mas um início da mudança de pensamento.Suas crônicas vinham em forma de conselhos, segredos e receitas mas buscavam brincar com o subjetivo da mulher e empoderar. Não que Clarice não tenha errado fortalecendo alguns padrões por ocasião, como em um dos textos de sua coluna que ela diz “Manias que enfeiam(...).Por exemplo, a mania de estar sempre comendo alguma coisa(...), como se vivesse eternamente com fome. Além de extremamente deselegante, dá a impressão de que não come o bastante em casa. Os homens detestam isso. Sem falar nas gordurinhas supérfluas que essa gulodice constante faz aparecer”. O ano de 1966 marcaria a trajetória da escritora. Em 14 de setembro, Clarice adormece com um cigarro aceso provocando um incêndio. O quarto foi todo destruído e ela ficou com graves queimaduras pelo corpo, passou dois meses hospitalizada sob risco de morte. O acidente desencadeia um quadro depressivo, apesar disso publica seu primeiro livro infantil, O mistério do coelho .

“A crônica nasceu no jornal e para o jornal”

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Imagem: Amazon

Para conhecer ainda mais a história de Clarice Lispector, indicamos essas biografias:

Clarice, - Benjamin Moser Esta biografia foi considerada como “consagrador da carreira de Clarice Lispector”, além de ajudar a formar a imagem e deixar um legado, principalmente para a cultura literária que a jornalista deixou para o país.

Imagem: Amazon

Começa uma coluna no Jornal do Brasil, para onde envia crônicas por mais de 6 anos. A tensão política estava evidente em 1968. A luta contra o regime militar se intensificou. A semana começou com a prisão do líder estudantil Jean Marc , no dia 20 estudantes se reúnem com o conselho universitário e o reitor na UFRJ, Universidade Federal do Rio de Janeiro para discutir o ensino universitário ao saírem do local são reprimidos pela polícia, e cerca de 300 pessoas presas. No dia seguinte Clarice estava na passeata carioca contra a ditadura, que contou ,dentre os manifestantes, com cerca de 300 artistas. Dias depois a autora volta às ruas na Passeata dos Cem Mil. Nesse mesmo ano editou seu segundo livro infantil A mulher que matou os peixes, o lançamento estava marcado para 17 de dezembro no Museu de Arte Moderna do Rio mas foi cancelado após a promulgação do AI 5 e fechamento do Congresso. No ano de 1969 é aposentada pelo instituto nacional de previdência Social, INPS. Em 6 de dezembro de 1973 saí do Jornal do Brasil após a demissão de Alberto Denis, pelo que foi entendido como uma onda antissemita na administração do periódico. Clarice ainda escreve uma coletânea sobre sexo ,por encomenda de Álvaro Pacheco, que resultou em 13 contos. No ano de 1974 é mordida no rosto pelo seu cachorro e precisa ser operada. Encerrando o ano publica seu terceiro livro infantil intitulado A vida íntima de Laura, publicaria depois em 1977, ano de sua morte seu quarto e último livro infantil encomendado pela marca estrela. Morre na manhã das vésperas do seu aniversário. Clarice teve uma obstrução intestinal repentina e foi internada na Casa de Saúde São Sebastião. Em 28 de outubro passa por uma cirurgia em que descobrem a causa do problema: um tumor maligno no ovário. O tratamento aplicado foi apenas paliativo, nada reverteria um quadro tão avançado da doença.

Clarice Lispector. Uma Biografia Não Autorizada – Marcus Deminco Esta obra vai tratar a mística de Clarice, como uma “bruxa” ou “feiticeira” da literatura, trazendo outro ponto de vista para a história da autora. Essa é uma versão especial para colecionadores da obra “O segredo de Clarice Lispector”.

Por Luana Moreno

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IMAGEM: FREEPIK

Não é como brincar de bonecas Formas de maternidade não convencionais e realidade das histórias de mães solo no Brasil

12 | Julho 2019 | edição 1 | Púrpura

Reportagem por Ana Luiza Pedroso e Georgia Rovaris


VENTRE

M

eninas negras, brancas, pobres ou ricas, a maternidade é brincadeira desde que conseguem segurar a primeira boneca. Apesar da maioria crescer acreditando que ser mãe é algo natural, a realidade não é tão romântica, muito menos fácil e intuitiva, especialmente se não há ajuda. A psicóloga Carolina Duarte de Souza, especializada em Terapia Relacional Sistêmica, explica que as brincadeiras de cuidado não são algo natural que a psicologia possa explicar, mas um comportamento socialmente construído que é pesquisado em estudos de gênero. “Esses estudos vão trazer uma questão do patriarcado. O mito da maternidade. Como se a mulher nascesse pronta para ser mãe”. Apesar da cultura ocidental responsabilizar as mães por criar os seus filhos, isso não é uma regra em todo o mundo. A filosofia africana Ubuntu acredita que “Uma pessoa só é uma pessoa por meio de outras pessoas”, o que reafirma o ditado, que se tornou popular, que diz: “É necessário uma aldeia inteira para criar uma criança.” A psicóloga Carolina comenta sobre a necessidade de ajuda para a criação dos filhos. “Em famílias monoparentais, que só há um adulto responsável, é muito importante que ele tenha uma boa rede de apoio para auxiliar. Os vizinhos, a comunidade, devem ser acionados para um melhor cuidado dessa criança”.

Isadora Pereira de Barcelos, 21, estudante, Florianópolis

“Eu nasci para ser mãe”, era o que Isadora repetia, e era o que ela realmente acreditava, até parir Aurora. O seu parto aconteceu na data esperada, mas definitivamente não foi como ela tinha planejado. Isadora deu a luz a Aurora no chuveiro da maternidade. Sozinha. Seu companheiro da época, pai de sua filha, estava presente, mas não fez nada para ajudar. Ela conta que antes de fazer força para sua filha sair, lembrou de uma publicação que tinha lido que dizia para sua natureza se sobrepor a vontade dos homens. No momento o seu pensamento foi “vamos

lá filha, me ajuda, somos só eu e você nesse mundo”. Depois que já estava na maca, a médica confirmou a frase que ela repetiu ao longo de sua vida “você nasceu para ser mãe”, mas Isadora só conseguia pensar o quanto estava despreparada e como ela não estava sentindo nenhuma conexão com sua filha naquele momento. Duvidou da médica e, principalmente, duvidou de si mesma para exercer a maternidade. Sua dúvida sobre a maternidade parecia só aumentar e ela não conseguia se sentir uma boa mãe. Isso pode ser entendido como um dos sintomas de depressão pós-parto. A doença consiste em tristeza após algumas semanas do parto, podendo fazer com que a mãe interaja menos com a criança, além de causar irritabilidade, choro frequente, sentimentos de desamparo e desesperança, diminuição da energia e motivação, entre outros. Segundo o estudo da Escola Nacional de Saúde Pública Sergio Arouca (Ensp/Fiocruz), publicado no Journal of Affective Disorders, um dos fatores que desencadeiam os sintomas depressivos é a baixa qualidade do atendimento, que foi o caso de Isadora. “Eu fiquei sozinha naquela sala, gritando muito, porque eu tava com muita dor. As enfermeiras passavam no corredor e não me atendiam”. As mulheres que relataram um atendimento ruim no trabalho de parto tiveram probabilidade duas vezes maior de apresentar a doença do que aquelas que avaliaram o serviço como muito bom. Por quase todo o primeiro ano da maternidade Isadora tentou ficar junto com o que ela chama de “progenitor da Aurora”. Durante esse tempo, saiu da casa de sua mãe, onde morava e não se sentia bemvinda, para ir para um lugar onde ela parecia incomodar ainda mais: na casa dos pais de seu companheiro. Nesse período o progenitor, como ela mesma o chama, estava economizando dinheiro para ir para um festival na França, o que fez com que por muitos dias a refeição do dia de Isadora fosse amido de milho com água, enquanto cozinhava a única batata da casa para a sua filha comer. Púrpura | edição 1 | Julho 2019 | 13


Quantidade de embriões A quantidade de embriões depende da idade da mulher. dois para mulheres com menos de 35 anos, três para quem tem até 40 anos e quatro após essa idade.

Depois de oito meses sofrendo com diversos tipos de abusos, voltou a morar com sua mãe e rompeu as relações com seu namorado. Hoje sustenta ela e a sua filha com o dinheiro que ganha como cuidadora de sua bisavó, já que perdeu o seu emprego recentemente. O sonho de Isadora é ter estabilidade o suficiente para conseguir criar a sua filha do jeito que ela acredita ser o melhor. “Ela tá ali comigo todos os dias, e ela é incrível, é minha parceira, é a minha maior alegria, mas ela também é a razão de todos os meus problemas. Ela é o meu caos, mas ela também é minha calma. É meus extremos.” Mesmo com todas as dificuldades ela diz não conseguir imaginar a sua vida sem a sua filha.

Eneá de Stutz, 53, Brasília

O desejo de ser mãe sempre esteve presente na vida de Eneá. Porém, seu marido não compartilhava do mesmo sentimento. Aos 46 anos e com a possibilidade da menopausa chegar, decidiu se separar e fazer uma fertilização in vitro. Nesse procedimento clínico o óvulo é fecundado pelo espermatozóide fora do organismo da mulher, para logo ser implantado no útero. Geralmente, o esperma vem de um doador anônimo em casos de reprodução independente, que foi como Eneá fez, mas pode ser de seu companheiro, ou escolhido em um banco internacional pago, onde a mulher determina algumas características. Em entrevista para a revista Saúde o médico Marcio Coslovsky, da Primordia Medicina Reprodutiva no Rio de Janeiro, fala que os índices de sucesso do procedimento estão cada vez mais altos. “As boas clínicas brasileiras trabalham com uma taxa de 40 a 45%. E as melhores atingem 51%”. Na época Eneá já era professora da Universidade de Brasília (UnB), com uma carreira estável e convicta de sua decisão, bancou financeiramente o procedimento, por completo. Ela diz não lembrar exatamente o total que gastou, mas desde o descongelamento dos seus óvulos, remédios, exames, doação do esperma e mais o procedimento em si, o gasto final superou R$15 mil. 14 | Julho 2019 | edição 1 | Púrpura

Durante a gestação, o ex-marido de Eneá passou a morar com ela. Depois que Ninian nasceu ele assumiu a paternidade socioafetiva, que é quando alguém reconhece uma criança que não tem laços de sangue e nem adotivos, como filha. “Minha filha sempre soube de toda a história da gestação e nascimento dela e, hoje somos uma família alternativa, vivendo eu, meu ex-marido e minha filha juntos”. Eneá é uma das muitas mulheres que assumiu a vontade de ser mãe independente, fugindo de forma convencional de maternidade.

Brenda Karoline da Silva, 24, São João Batista

Brenda não planejou a gravidez. Ela saiu de São João Batista, uma pequena cidade de Santa Catarina, para viver em Curitiba e tentar cursar psicologia. Ela trabalhava e morava sozinha na cidade, até que começou a ter encontros eventuais com um rapaz. Nesse período decidiu voltar para a sua cidade natal, sem saber que estava grávida de Ana Beatriz, hoje com três anos. Descobriu a gestação quando já estava de sete meses e enfrentou a reação das pessoas. “Foi julgamento de todos os lados. Falavam que eu ia quebrar a minha cara, que ter um filho solteira nos tempos de hoje não é nada fácil, que eu não ia conseguir. Eu tô provando pra eles que eu tô conseguindo. Não dependo deles para nada”. Hoje, vive sozinha com Ana Beatriz e trabalha em uma fábrica de sapatos. O pai de sua filha presta pouca assistência. “O nosso combinado na pensão foi 250 reais, se eu tivesse levado para a justiça por causa do salário dele seria uns 400 reais, só que o nosso combinado foi 250”. Para ser definida, o juiz leva em consideração três pontos chave, sendo eles: necessidade de quem pede, possibilidade de quem vai pagar e a proporção entre os dois primeiros requisitos. O acordo informal que eles fizeram faz com que ela não consiga contar sempre com o dinheiro. “Ele atrasa, esquece que tem que pagar, aí quando vem deixar ela não dá satisfação da pensão”. Segundo um levantamento feito pelo GLOBO, tramitaram em


2018 nos Tribunais de Justiça de 10 estados brasileiros (Alagoas, Bahia, Distrito Federal, Espírito Santo, Goiás, Mato Grosso do Sul, Rio de Janeiro, Rio Grande do Sul, Santa Catarina e São Paulo) cerca de 104 mil processos de cobrança de pensão. Para a abertura do processo o interessado precisa procurar um advogado e a justiça tomará as medidas cabíveis. Caso não haja o pagamento, o juiz pode bloquear contas, penhorar bens e enviar um documento notificando a empresa onde a pessoa trabalha. Se nenhuma dessas medidas resolver a situação, a última instância é a prisão de até seis meses. Como Brenda banca os gastos de sua filha sozinha e nunca levou o pedido de pensão para um advogado.

Karoline Miranda, 24, Rio de Janeiro

Graduada em História, estudante de Jornalismo, estagiária, doceira, professora particular e mãe. Essa é a realidade de Karoline Miranda que “tenta fazer muitas coisas”, como ela diz, para poder sustentar sua família. Karoline engravidou de seu filho Gael quando tinha 19 anos, no segundo período da faculdade de História. Sua mãe foi contrária a gravidez “Ela não apoiou, ela queria que eu abortasse. Tentou muitas vezes fazer com que eu abortasse, e nada. Até que eu cheguei e falei ‘Olha, eu não quero mais, eu não quero abortar, eu quero ter esse filho’”. Karoline tentou ficar com o pai de seu filho, mas não deu certo. “O pai do Gael nunca foi um pai exemplar, e atualmente ele não tem participação na vida do Gael, ele quase não vê o filho, e não paga pensão. Então, a nossa relação é defasada”. Como mulher negra, além do preconceito racial teve que enfrentar o julgamento por estar grávida “Hoje eu marco na minha agenda a quantidade de homens brancos que me rejeitou. [...] A quantidade de olhares de reprovação quando me viram grávida, mas afinal, já era esperado, visto que eu negra logo engravidaria”. Por mais que o relato indique uma construção social, a Síntese de Indicadores

Sociais de 2015, uma pesquisa do IBGE, diz que 57,7% das jovens entre 15 a 19 com filhos, são negras ou pardas. Karoline encontrou um jeito de falar com algumas dessas mulheres. Em 2013, criou o blog ‘Uma Mãe Feminista’, para compartilhar suas vivências. Hoje o site possui mais de 30 mil curtidas no Facebook e conta com um grupo de mais de 7 mil mulheres dialogando sobre o assunto.

“Hoje eu marco na minha agenda a quantidade de homens brancos que me rejeitou” As histórias de Isadora, Brenda e Karoline estão entre as 11 milhões de histórias de mulheres que criam seus filhos sozinhas, segundo o relatório divulgado pelo IBGE de 2017. Muitas delas sem assistência financeira da parte do progenitor de seus filhos. Conforme essa pesquisa entre 2005 a 2015, o número de mães solo no país aumentou em um milhão, passando de 25,8% para 26,8%. Há ainda, cada vez mais mulheres que planejam a maternidade, e decidem ter os seus filhos depois de se firmar no mercado de trabalho, como Eneá. Dados registrados pelo IBGE em 2017 mostram que, das 2,86 milhões de crianças registradas no Brasil, 35% são filhos de mulheres com 30 anos ou mais. O dado indica que, cada vez mais, as brasileiras estão conseguindo assumir o controle de suas vidas, além de poder se estabelecer financeiramente, antes de tomar a decisão de se tornar mãe. É importante lembrar que esse deve ser um momento em que a mulher decida, com consciência sobre o seu corpo e sua vontade. Nem toda mulher tem o desejo de exercer a maternidade, a decisão é de cada uma e deve ser respeitada. Púrpura | edição 1 | Julho 2019 | 15


Onde ela quiser

Espaço para pilotas de cresce 106% nos O

mercado de trabalho para mulheres é um dos setores em que o machismo se faz mais presente na maioria dos países. A primeira luta é a de igualdade salarial, que ainda é diferente na maioria das profissões. Outras atividades consideradas “masculinas”, também costumam pagar melhor, como por exemplo: vendedor externo, pedreiro, motorista, isso se comparado com funções consideradas “femininas”, como: diaristas, recepcionistas, secretárias, cozinheira, enfermeira, professoras, entre outras. Segundo pesquisa do IBGE, o rendimento habitual médio mensal de todos os trabalhos e razão de rendimentos, diferenciados por gênero, entre os anos de 2012 a 2016, mostra que as mulheres ganham, em média cerca de 75% do salário total dos salários destinados a homens. Isso quer dizer que as mulheres têm seus salários habituais em aproximadamente R$ 1.764, enquanto os homens possuem a média salarial de R$ 2.306. Os cargos de chefia, também são exercidos majoritariamente ao sexo masculino, apesar de que o número de mulheres que estão conseguindo chegar aos cargos tenha aumentado nos últimos anos no Brasil. Segundo pesquisa Datafolha, a parcela de mulheres de 30 a 49 anos ocupando cargos de 16 | Julho 2019 | edição 1 | Púrpura IMAGEM: FREEPIK


avião últimos dois anos gerência e diretoria, no setor formal, no começo dos anos 2000 era de 32,3%, em 2003 essa porcentagem aumentou para 39,2%. Já em 2017 o número subiu ainda mais, chegando a 42,4%, apesar de ainda vermos mais homens em posições de poder, o número de chefes mulheres já está quase chegando a metade do número total. Outro fator que dificulta o mercado de trabalho para as mulheres são os filhos. Segundo pesquisa da Fundação Getúlio Vargas, a FGV, 50% das mulheres são demitidas depois de voltar da licença maternidade. O estudo foi feito com 247 mil mães, entre 25 e 35 anos.

Pilota de avião

N

o Brasil, piloto de avião é a profissão que tem menos participação feminina, há apenas 1,4% do mercado ocupado por mulheres. Inclusive, a palavra ‘piloto’ não tinha flexão de gênero na língua portuguesa até pouco tempo e, apesar de que a palavra já seja adicionada aos dicionários, ‘pilota’ ainda é considerado uma forma menos formal de tratamento. Segundo dados levantados pela Agência Nacional de Aviação Civil (ANAC), em 2017, há apenas 1465 brasileiras que pilotam aeronaves, enquanto a quantidade de pilotos homens são de 46.556, mostrando que ainda há uma dominação masculina do mercado de pilotos de aviões.

Por: Ana Luíza Pedroso

Ainda segundo a pesquisa da ANAC, as mulheres têm mais participação em voos comerciais. Veja como é a divisão pelos tipos de voos:

63 em linhas aéreas 495 em voos comerciais 907 em voos privados fretados Apesar de que os números demonstram como o mercado ainda é comandado por homens, os dados, por incrível que pareça, são animadores. De 2015 para 2017 o aumento de mulheres na profissão foi de 106%. Não há nenhum motivo para que a disparidade entre os gêneros seja tão alta dentro da profissão. A única explicação possível é que o mercado ainda é machista neste setor. A prova para a licença de piloto é igual para homens e mulheres e não há nenhum recurso diferenciado que justifique a dominação masculina na área. As mulheres estão assumindo cada dia mais os espaços que foram considerados como masculinos, por muito tempo. Um grande exemplo é o aumento da participação feminina no comando de aviões e tantos outras profissões. Apesar de que ainda seja uma luta diária,o mercado de trabalho já está começando a naturalizar a divisão igualitária entre os gêneros em todas as profissões, não somente as consideradas masculinas, como as que são vistas como femininas também. Se a tendência de aumento continuar, em pouco tempo os céus estarão repletos de aviões comandados por pilotas. Púrpura | edição 1 | Julho 2019 | 17


Afrodite

18 | Julho 2019 | edição 1 | Púrpura

MAISIE COUSINS (1992, London)


Sexualidade: pontos de prazer do órgão sexual feminino O tabu da própria sexualidade faz com que 75% das mulheres no Brasil não cheguem ao orgasmo em todas as relações sexuais

O

sexo em si para muitas mulheres ainda é um assunto tabu, pouco falado e explorado. Deixar de falar sobre o assunto gera uma série de fatores que podem ser as razões das dificuldades que muitas meninas tem de alcançar o orgasmo. Esse problema é principalmente para as mulheres heterossexuais, isso porque o corpo feminino não é explorado. Muitas mulheres vivem a vida toda sem saber o que é gozar na relação sexual e também dizem nunca se masturbar.

3.000 participantes 18 a 70 anos dividido em cinco faixas etárias

O Projeto de Sexualidade ProSex, da Universidade de São Paulo (USP) fez uma pesquisa para demonstrar como é o perfil sexual dos brasileiros. A pesquisa Mosaico 2.0, teve 3 mil participantes com idade entre 18 e 70 anos, divididos em cinco diferentes faixas etárias. Os participantes são das cidades de: São Paulo, Belo Horizonte, Rio de Janeiro, Salvador, Belém, Porto Alegre e Distrito Federal. Esse estudo mostrou que para mais de 96% das pessoas, de ambos os gêneros, sexo é considerado essencial. Apesar da pesquisa mostrar que há uma equivalência dos gêneros na questão da importância das relações sexuais para a vida de cada um, as semelhanças param por aí. Quando questionados sobre a frequência ideal, ou que gostariam de ter, a maioria das mulheres escolheram a opção “três vezes por semana”, já os homens escolheram a opção máxima disponível no questionário “oito vezes por semana”.

Número ideal de relações sexuais por semana

5 regiões metropolitanas São Paulo,Belo Horizonte, Rio de Ja- 8 relações HOMENS neiro, Salvador, Belém, Porto Alegre 3 relações MULHERES e Distrito Federal

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Trazendo para a realidade, as mulheres responderam que tem relação sexual “duas vezes por semana”, enquanto os homens relatam “três vezes por semana”. Lembrando que o estudo teve como entrevistados pessoas com vida sexual ativa, muitos deles eram casais.

Número real de relações sexuais por semana 3 relações HOMENS 2 relações MULHERES Um fato curioso é que quando questionados sobre as maiores apreensões, ou seja, os medos, mais frequentes, as respostas das mulheres foram: “possibilidade de contrair doenças”, que são as sexualmente transmissíveis (DSTs). Já os homens responderam: “temor de não satisfazer a parceira”. Apesar dessa preocupação dos homens, 65% das entrevistadas dizem não chegar ao orgasmo em todas as relações sexuais. Outra pesquisa, encomendada pela folha mostra que apenas 18% das mulheres gozam em relações com penetração.

Preocupações sobre o sexo HOMENS: temor de não satisfazer a parceira; MULHERES: possibilidade de contrair doenças.

20 | Julho 2019 | edição 1 | Púrpura

O estudo feito pela Durex Global Sex Survey, feito com 1.004 brasileiros, mostra que 56% das mulheres estão insatisfeitas com a sua vida sexual. Além disso, apenas 22% relatam que conseguem chegar ao orgasmo durante o sexo, as demais, alcançando um total de 78%, dizem não gozar. Essa pesquisa está levando em consideração apenas relações heterossexuais, isso porque as mulheres lésbicas estão muito mais satisfeita sexualmente, alcançando o orgasmo em 75% das relações que tem. Essa situação relatada pelas pesquisas podem ser explicadas por uma série de fatores. Um deles, como já falado, é a falta de conhecimento do próprio corpo que as mulheres tem, deixando a responsabilidade integralmente para o seu parceiro, que faz o que funciona para o corpo masculino, esquecendo que a vulva possui órgãos complexos que precisam de uma atenção diferente.

Sexo é importante ou muito importante para:

95,3%

96,2% homens 94,5% mulheres


Clitóris

E

sse pequeno órgão poderoso tem uma única função: prazer. Ele fica na parte externa é o maior responsável pelos orgasmos femininos. Apesar de que a sua parte aparente seja um pequeno “botãozinho” ele é maior por dentro, e tem um formato de V de cabeça para baixo. Por isso que há outras partes sensíveis em toda a vulva, principalmente na parte dos lábios. O que faz o clitóris dar tanto prazer as mulheres são as oito mil terminações nervosas que ele possui, esse número corresponde ao dobro encontrado na glande masculina. Por isso que é necessário a mulher saber qual é a forma que a dá mais prazer, se pressionado de

forma inadequada (muito rápido, com muita intensidade e força) pode causar dor, ardência e causar uma má experiência para a mulher. Todo o orgasmo feminino tem relação com o clitóris, mesmo que ele não seja tocado diretamente, as outras partes internas são as responsáveis por dar prazer às mulheres. Diferente do mito do ‘Ponto G’, não há nenhuma desculpa para não achar o órgão, ele fica maior quando a mulher está excitada, assim como o pênis fica ereto. Saber como lidar com o clitóris é o passaporte para chegar aos orgasmos.

Arte por UOL Universa

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Curiosidades 1) É normal a mulher não ter orgasmos ape- 7) O clitóris muda de tamanho. Como ele nas com a penetração; 2) O canal vaginal não é rico em termina-

ções nervosas por ser o lugar onde os bebês saem, o que poderia resultar em muita sensibilidade na região durante o parto;

3) O centro do prazer feminino é o clitóris, que fica na parte externa da vulva e é preciso ser estimulado durante a atividade sexual;

4) Estimular o clitoris durante a penetração pode facilitar a lubrificação da vagina e fazer com que chegue ao orgasmo;

é vascularizado ele modifica seu comportamento de acordo com a estimulação, o que quer dizer que ele fica ereto quando excitado;

8) O ponto G que fica na entrada do canal

vaginal é uma região sensível decorrente das terminações nervosas do clitóris que chegam até ali;

9) O prepúcio é como uma “capa” para o

clitóris. Ele tem a função de proteger esse órgão, como há muita sensibilidade, o toque direto pode resultar em dor e não prazer, portanto é importante que a estimulação direta seja feita com cuidado;

Apesar da parte aparente do clitó5) O clitóris possui cerca de oito mil célu- 10) ris ser pequena, ele não termina ali, há parlas especializadas em prazer, o dobro de terminações que são encontradas na glande do pênis;

6) Todo o orgasmo feminino tem relação

tes internas, que ficam em formato de um V invertido, que consegue distribuir o prazer para ambos os lados dos grandes lábios. Eles são responsáveis pelo prazer da mulher durante o sexo.

com o clitóris;

Reportagem por Ana Luiza Pedroso

22 | Julho 2019 | edição 1 | Púrpura


imPERFEIÇÃO

Vida saudável e pressão estética A sociedade vive hoje a febre do imediatismo, do rápido e do agora. Uma das consequências dessa tendência são os danos para a saúde mental e física. A nutricionista e pós graduanda em Ortomolecular e Fitoterapia, Daniela Dalpozzo, estuda o impacto desse comportamento no cotidiano e as influências na saúde das pessoas. Você acredita que essa influência digital pode acabar “desnorteando” o público? Isso pode retardar o tratamento do paciente?

Sim. Eu vivo isso . As vezes eu passo a alimentação para o paciente, com os horários de acordo com a rotina e as vontades da pessoa, e na próxima consulta, ela me diz “ eu vi que fulana tá tomando o suco x power verde”. E a primeira coisa que eu pergunto: “tu gostou?” e, normalmente, a resposta é não. Então, porque o paciente vai querer fazer um negócio que não ta dando prazer e que não é bom pra ele só porque fulana tomo? E muitas vezes são questões inviáveis financeiramente para a nossa vida. Muitas pessoas acabam gastando um dinheiro em cápsula de ervas etc., que poderia ser gasto na feira, comprando comida de verdade. Muitas acham que tem que viver a vida da blogueira e não a dela. E esse é o grande problema, né.

A ansiedade e a depressão são um dos novos “males” da atual sociedade. Quais seriam as consequências no dia a dia ?

Tudo. Todo mundo tá ansioso. A pessoa tá comendo mas ela já tá pensando no que ela tem que fazer daqui a pouco. Quando vê, já comeu demais e não se dá conta. Aí me falam “eu não emagreço por conta da ansiedade” e eu pergunto “tu tá comendo a ansiedade?” porque, na verdade, é um sentimento que nós precisamos descobrir a causa. 70% dos pacientes tomam remédio pra depressão. Esse é o mal do século. Porque no final das contas vivemos o futuro do futuro e não o agora, o que gera os transtornos. Eu sempre acabo indicando uma psicóloga para ajudar nessa questão de “ querer ser 100%” saudável, feliz, ativo, o tempo todo. A gente sabe que não dá pra ser assim sempre.

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Para você, quais são os reflexos do mundo do imediatismo na saúde ?

Certamente os transtornos alimentares [silêncio]. É a bulimia, a anorexia, a ortorexia. Qualquer uma das três é uma doença. São pessoas obcecadas pela dieta, pelo corpo, que muitas vezes não saem de casa porque podem comer algo que não devem. Os transtornos alimentares, com o reflexo da ansiedade e depressão, na “saúde” que não é saúde. No fim das contas só querem o corpo bonito.

Na questão da “mulher necessita de um corpo perfeito”, como você vê essa padronização e essa pressão da sociedade sobre o universo feminino?

Eu acho que agora está sendo um pouco desmistificada essa questão. Tem muita mulher botando a cara a tapa para falar disso, mas claro, ainda existe fortemente e é um problema. Por exemplo, “ aquela pessoa é muito alto astral, muito linda, mas é gordinha”, ou , “ ela é muito querida, mas é muito magra, tadinha”. Então. o comportamento social, a personalidade da pessoa, tá sempre ligado com o físico. [silêncio] Tem sempre esse “mas”.

24 | Julho 2019 | edição 1 | Púrpura

Voltando ao imediatismo, muitas pessoas procuram nos remédios a facilidade para emagrecer. Quais questões você levantaria sobre essa atitude?

A ansiedade. As pessoas não têm calma e querem resultado rápido. No retorno das consultas muitos me dizem: “eu emagreci só um quilo”. Que bom. Você não engordou, não manteve o mesmo peso, e ainda emagreceu um quilo. Para chegar nos 10kg você precisa perdeu o primeiro quilo, certo? E o remédio, tudo bem, você emagrece 20kg, mas daqui uns meses dá o rebote e o efeito sanfona. É uma bola de neve que soma ansiedade, depressão, não conseguir emagrecer, não vestir a roupa que quer, não ter relações com os namorados. É uma bola de neve.

O alimento no final das contas vira uma solução química depois de digerida. Essa pode ajudar na ansiedade?

Sim. Tem alimentos que vão auxiliar nesse processo e tem alimentos que não vão. A pessoa tá ansiosa e come um chocolate, por exemplo. Enquanto ela come tá tudo certo. Mas daqui uns minutos entra o arrependimento, o “porque eu fiz isso?”, a frustração. Se a pessoa tivesse comido normalmente sem se culpar, nada disso teria acontecido. As pessoas hoje em dia tem medo de comer.


Ainda sobre os medicamentos, você como pós graduanda em fitoterapia, onde encaixaria essa nova forma de medicação? Eu gosto muito dessa opção das plantas. Hoje em dia todo o paciente já chega cheio de remédio. Se tu for comparar o remédio com a fitoterapia, ele sempre vai ganhar. Além de inibir toda a funcionalidade do fitoterápico, no fim, o remédio ajuda de um lado e estraga de outro. Porque, por exemplo, tu toma um remédio para o colesterol mas ele não age na causa desse problema. Tá mascarando isso aí. O fitoterápico vai direto no ponto chave, mas demora cerca de 3 meses para começar a atuar no organismo, e as pessoas não querem esperar.

“Um corpo saudável só será saudável se vir com uma mente saudável. [...] É o que eu costumo dizer: o peso que mostra na balança não diz nada sobre a pessoa.” O remédio sempre ganhará pelo mercado ou pela eficiência?

Como você poderia esclarecer a frase “ um corpo magro não é sinônimo de saúde”?

[silêncio] Observar uma pessoa que perdeu 10kg e estudar como foi esse processo. As vezes ela não teve o mínimo de vida social, emagreceu muito rápido e gerou ansiedade e depressão, e o efeito rebote vem fácil. Um corpo saudável só será saudável se vir com uma mente saudável. A pessoa pode ter um sobrepeso e ter uma alimentação balanceada, com os exames em dia, praticar exercício. É o que eu costumo dizer: “o peso que mostra na balança não diz nada sobre a pessoa”.

O que você diria para as pessoas que sofrem com ansiedade, padronização, imediatismo, depressão, influencia digital… o que você diria?

[silêncio] Diria que elas devem seguir com quem elas identificam realmente. Não procurem quem não tem a ver com a sua realidade porque a era, agora, é digital. Não tem mais fuga. É necessário entender, saber lidar e aprender a fi ltrar. Cada um é único. Cada um tem a sua rotina, sua individualidade e suas preferências, e é necessário saber respeitar isso. Aquela velha frase: “cada macaco no seu galho”. E também não ter vergonha de pedir ajuda. Na minha opinião, 100% das pessoas deveriam fazer terapia. Nós somos um caminho na busca do autoconhecimento. E, claro, diria a minha frase: faça sempre o seu melhor.

Por Juliana Ferrari

Pela eficiência. Ele é mais forte. Por exemplo, podes tomar uma cápsula para melhorar a circulação. Com o remédio, em uma semana, tu já tá fazendo mais xixi, agora, o fitoterápico são 3 meses. Então obviamente ele é mais rápido, além de que muitas vezes é mais barato também. A indústria tá aí e eles querem vender.

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Púrpura | edição 1 | Julho 2019 | 27


Desde pequena, Rhaysa Gonzaga usava o cabelo com trança ou preso por ordem de sua mãe. Uma mulher branca e que não gostava de cabelo afro, a mãe dela a ensinou que o cabelo bonito era o liso. No primeiro salário, aos 15 anos, Rhaysa fez escova progressiva e permaneceu alisando até os 22 anos. Hoje, com 26 anos, Rhaysa tem seus cabelos naturais. Rhaysa estava passando pela transição capilar quando sua amiga, que estava com câncer de pâncreas, teve que começar a fazer quimioterapia. Rhaysa em solidariedade a sua amiga e querendo acabar com as duas texturas, liso e

28 | Julho 2019 | edição 1 | Púrpura

cacheado, decidiu raspar o cabelo. A amiga de Rhaysa morreu um mês depois. Rhaysa passou um ano indecisa sobre passar pela transição capilar. Ela deixava o cabelo crescer, mas logo voltava a alisar. Ao raspar o cabelo, Rhaysa doou para o CEPON. Após três anos com cabelo natural, Rhaysa resume sua trajetória em superação. “A sensação que eu tenho é de olhar no espelho e me ver de verdade”.


Wellem Christina não lembra quando começou a alisar o cabelo. Ela foi influenciada pela mãe até os 18 anos para continuar com os processos de alisamento. Hoje, com 26 anos, ela faz o que quiser com o cabelo, pois sabe que ele vai crescer de qualquer forma. Wellem fez relaxamento e progressiva durante anos. Foi só depois de participar da Rio+20, em 2012, que decidiu mudar e reconquistar seu cabelo natural. Após a conferência, ela foi para casa e começou a cortar o cabelo. Amou e manteve o cabelo curto por

um ano. Após cortar o cabelo, Wellem o coloriu de várias cores, e hoje em dia, mantém ele em rosa. Ela define a trajetória capilar em “metamorfose”.

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Gabriela Costa foi estimulada desde criança a passar relaxantes nos cabelos. Após passar pela transição, ela diz que foi um momento de descoberta e não se arrepende. Gabriela ficou até o final de 2016 com o cabelo alisado. A mudança veio quando ela entrou na faculdade e quando viu sua irmã, que também alisava o cabelo, com o cabelo natural, já que não podia passar por procedimentos químicos porque estava grávida. Gabriela ficou seis meses sem fazer relaxamento e depois colocou tranças. Após a trajetória, ela diz que jamais pretende voltar a alisar seus cabelos novamente.

30 | Julho 2019 | edição 1 | Púrpura

Gabriela resume o período, que passou de transição capilar, em busca de identidade. Ela diz que o cabelo a deixa forte e com todo volume e expressão, ela se tornou a mulher que é hoje em dia.


Aos nove anos, Cameron Ventura decidiu alisar o cabelo. Ela não gostava do volume e do jeito que o ele ficava pra cima. Incentivada pela mãe, só parou de alisar e resolveu passar pela transição capilar no primeiro ano do ensino médio. Atualmente, ela se ama careca. Também por influência da mãe, Cameron fez escova progressiva. O procedimento, agressivo aos cabelos, queimou as laterais da cabeça dela. No ensino médio, ela decidiu cortar para ver como era o cabelo natural e não recebeu apoio da família.

Depois de passar três anos sem alisar, Cameron, em setembro deste ano, decidiu raspar o cabelo porque a vida estava acelerada e o mais importante, para continuar se sentindo bem consigo. Ela aprendeu que o primordial é se amar independente do cabelo.

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Púrpura Às Putas Renasci nas cinzas das guerreiras Das queimadas Das violadas Das expulsas Das putas Das sujas Levantei e esfreguei suas cinzas no meu rosto Absorvi Esperei Respirei fundo E fui à luta Minha luta não é a guerra que as destruiu É enfrentar essa vida nojenta Tirando de perto de mim cada dedo Sujo Que diz que eu não consigo Renasci, me curei e vim viver Eu não vou deixar nenhum sequer me parar Dessa vez tenho as putas pra me proteger Iraci Falavina


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