Gaia

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GAIA CORPO | MENTE | MEIO AMBIENTE

EDIÇÃO O1 | DEZEMBRO DE 2O17

O ALTERNATIVO É DO POVO O que é a medicina alternativa e como ela chegou ao sistema público de saúde em Florianópolis.

REGISTRO DO MOVIMENTO

ALIMENTAÇÃO COM CONSCIÊNCIA

PASSO A PASSO: COMPOSTEIRA SEM MINHOCA


“Escolher tornar-se mais

sábia significa sempre escolher aprender de novo.” Clarissa Pinkoa Estés, A ciranda das mulheres sábias 2 | GAIA | Nº 01 | DEZ 2017


À você Em uma sociedade que se afasta cada vez mais da natureza, viver em equilíbrio se tornou um luxo. Estar em contato com o que nos faz humanos deveria ser a premissa mais básica de existência, mas a verdadeira condicionante que nos colocam é o lucro: devemos nos afastar das fontes essenciais de felicidade que residem dentro de nós, para procurar cada vez mais a felicidade fora, no consumo. A volta para dentro de si e o equilíbrio de corpo, mente e espírito não pode e nem deve ser algo a ser vendido. Mas acreditamos que o conhecimento necessário para esse empoderamento, que não vai ser encontrado na grande mídia, deve ser disponibilizado. O nosso desafio é este: divulgar um conhecimento que, embora exista em cada um de nós, precisa ser tirado de sua dormência. Esperamos de alguma forma, contribuir para o crescimento pessoal de cada leitora/or. Com carinho,

Lavinia e Yeda

GAIA

Corpo | Mente | Meio Ambiente Edição O1 | Dez. 2O17

Editoras Lavínia Kaucz e Yeda Teixeira

Formato 200x260mm

Projeto gráfico-editorial Lavínia Kaucz e Yeda Teixeira

Importante Esse trabalho é experimental, sem fins lucrativos e de caráter puramente acadêmico, desenvolvido pelas acadêmicas Lavínia Kaucz e Yeda Teixeira como exercício de projeto gráfico-editorial para a disciplina de Laboratório de Produção Gráfica do curso de Jornalismo da Universidade Federal de Santa Catarina (UFSC) no semestre 2017/2. Não será distribuído, tampouco comercializado.

Assessoramento Ildo Golfetto Textos Eduardo Nicolodi, Eliana Maria de Freitas, Liana Chiaradia, Lavínia Kaucz, Marina Paim e Yeda Teixeira Imagens Felipe Buzzi, Pixabay e Verônica Gazola

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SUMÁRIO

EQUILÍBRIO SEM NOIA 06 ALIMENTAÇÃO COM CONSCIÊNCIA Os benefícios de comer com atenção plena

08 EXPERIÊNCIA INFINITA

Como a consciência se expande.

09 ARTETERAPIA

O que é esta terapia alternativa que utiliza formas, cores e muita produção.

11 NAUFRAGADOS NO PARAÍSO

Ele vive em uma das praias mais lindas de Florianópolis, isolado da cidade.

13 COMPOSTEIRA ORGÂNICA

Passo a passo de uma composteira feita com o que você tem em casa.

P.06

14 ENTREVISTA

Conversa com Miriam de Oliveira. As práticas alternativas aplicadas na psicoterapia.

P.12

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REPORTAGEM ESPECIAL 16 O ALTERNATIVO É DO POVO

O que é a medicina alternativa e Como ela chegou ao sistema público de saúde em Florianópolis.

RETRATOS 24 CINESIA

O registro do movimento pelas lentes de Veronica Gazola.

28 AS RUAS DE RIO DO SUL

O cotidiano do interior de Santa Catarina fotografado por Felipe Buzzi.

P.18

SERVIÇÃO 30 SE CONSELHO FOSSE BOM... O que as editoras indicam para assistir, ler e passear.

P.26

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Foto: Pixabay.com

EQUILÍBRIO SEM NÓIA

COM

ALIMENTAÇÃO CONSCIÊNCIA

Os benefícios de comer com atenção plena Texto por Eliana Maria de Freitas

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e acordo com pesquisas científicas, uma pessoa pode ter até 200 pensamentos por dia somente sobre comida. Se contarmos também os pensamentos com imagens corporais, esse número pode ser ainda maior. O que nos leva a tais pensamentos? De onde vem a origem sobre a importância do alimento em nossas vidas? Quem determina padrões de beleza? Por que nos boicotamos, comendo alimentos não saudáveis, se sabemos exatamente quais são benéficos para nossa saúde? Existem muitas respostas para tantos mistérios que rodeiam nosso comportamento alimentar, que vão muito além de nutrir-se. Segundo Patrizia Collard, terapeuta holística, a maioria das pessoas já sentiu algum grau de infelicidade com a própria aparência e pensa constantemente em comida, mesmo que não associe a aparência aos hábitos alimentares.

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Origem do mindful eating O termo vem do inglês e significa “comer consciente”. O mindful surgiu a partir dos princípios da meditação mindfulness, que designa um estado mental de atenção plena.


Alimentar-se é um ato presente desde o feto e que nos acompanha para toda a vida. Comemos por diversão, por prazer, quando estamos tristes, comemos em família, com amigos, por espiritualidade, pela influência da cultura e não somente por necessidades biológicas. Talvez esses motivos nos deem as respostas por quê que é tão complicado seguir um plano alimentar. A nutrição comportamental idealiza uma visão inovadora da nutrição, que inclui os aspectos fisiológicos, sociais e emocionais da alimentação e promove mudanças no relacionamento do nutricionista com seu paciente, e da comunicação na mídia e da indústria com seus consumidores. Voltando para questão dos 200 pensamentos diários sobre comida, e seu impacto nas nossas escolhas, a meditação mindfulness, pode ser um chave poderosa para mudar nosso padrão de pensamentos e consequentemente nosso comportamento. “Mindfulness” pode ser induzido ao focarmos nossa atenção intencionalmente na experiência direta do momento presente, numa atitude aberta e não-julgadora. Esse estado mental pode ser treinado por meio de técnicas ou exercícios meditativos e psicoeducativos, os quais são parte fundamental das Intervenções Baseadas em “Mindfulness”. Essas intevenções têm sido bastante estudadas cientificamente, e seus benefícios podem ajudar pessoas com diagnósticos de câncer, ansiedade, compulsão alimentar, depressão, dor crônica, cardiopatias, entre outros transtornos relacionados ao “estresse”, emagrecimento bem como indivíduos considerados “saudáveis”, mas com níveis elevados de “estresse” em seu dia-a-dia, como profissionais, estudantes e atletas.

O que é comer consciente? Eu mindful O mindful eating, que traduzido para o português significa comer consciente, surgiu a partir dos princípios da meditação, sair do piloto automático na hora da escolha do que se comer. Na medida em que se treina o cérebro com as práticas, você fica mais perceptível ao presente e tem maior poder de autoconhecimento e controle sobre suas emoções, sensações e todas as influências a sua volta. Por que antes de julgar-se ou

criticar-se, você consegue por exemplo identificar quando se trata de fome fisiológica ou emocional. A peditatra Jan Chozen Bays, no seu livro (Mindful Eating: A Guide to Rediscovering a Healthy and Joyful Relationship with Food), fala que o comer com atenção plena é “uma experiência que engaja todas as partes do nosso ser corpo, mente e coração, na escolha e preparo da comida, bem como no ato de comê-la em si. Envolve os cinco sentidos: visão, tato, olfato, paladar e audição – sim os alimentos tem sons e é uma sensação que muitas pessoas só descobrem quando praticam mindful eating.

Mindful eating fazendo conexões A comida realmente é uma zona de conforto que permeia a vida de muitas pessoas. A busca por falta de algo em suas vidas, faz com que a procura do alimento seja sem o menor critério e bom senso. A vida parece um prato sem sabor, sem sal e sem tempero e indústria alimentícia através do seu conceito de utilizar ingredientes que potencializam o mecanismo cerebral para nos acostumar com determinadas substâncias, inclusive comparadas a drogas como opoióides e outra mais. A conexão que você irá descobrir com mindful eating é um campo enorme no universo que diz respeito ao seu a você inserido no mundo. Faça alguns questionamentos como; Estou sendo grato pelo prato? Quem plantou? Que energia foi dada a este alimento até surgir na minha frente? Será que houve o uso de trablho escravo? Qual impacto na natureza que eu estou causando comer? Entre esses e outros questionamentos, devolva a energia a quem te trouxe o alimento. A vida também se nutre com amor, compaixão, solidaridade, amizade e tantos outros sentimentos do bem. Venha praticar o mindful eating também.

Eliana Maria de Freitas Nutricionista terapeuta de meditação mindfulness & mindful eating. Assessoria Nutricional em Escolas e atua com atendimento personalizado em Nutrição Clínica Funcional e Comportamental. Terapeuta de meditação mindfulness & mindful eating. Contato: nananutri.freitas@gmail.com | (48) 99167-6072

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INFINITOS SONHOS DA CONSCIÊNCIA

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iferente do paradigma dominante da nossa sociedade, que diz que a consciência é apenas um produto da matéria, e que a matéria é a substância final e portanto mais substancial da nossa experiência de realidade, o que acontece na nossa experiência direta – e portanto na realidade- é que é impossível experienciar um mundo físico exterior sem o “uso” de consciência. Assim, até a crença de que um mundo físico é mais substancial que a consciência´ é apenas uma crença (uma das infinitas possibilidades da consciência) criada dentro desse mesmo campo unificado onde todas as possibilidades de realidade acontecem, a consciência. A consciência tem capacidade de se fragmentar em infinitos formatos de experiência em ordem (com o motivo de) experienciar a si mesma. Não há causalidade implícita nessa ação, ou seja, não há um motivo -da maneira que conhecemos-, pois causalidade e motivo são conceitos relativos à relação com o tempo, com a linearidade, e o tempo e a linearidade são apenas um dos infinitos formatos de expressão de consciência.

“NÓS NATUR ALMENTE ESTAMOS EM UM ESTADO DE PERMISSIVIDADE” Nesse sentido, a faculdade de permitir que tudo seja permitido e estar em um estado de abertura é o nosso estado natural – é algo implícito ao nosso ser. Nós naturalmente estamos em um estado de permissividade, a não ser que estejamos fazendo um esforço (uma atitude) baseada em algum medo, que por sua vez é sustentado em alguma crença negativa, para se manter negando e resistindo à configuração de consciência presente no seu campo-consciente. Quanto mais a consciência desperta para a sempre-permanência de si mesma, mais ela consegue acessar frequências elevadas de entendi-

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Eduardo Nicolodi Fundador do canal “Infinitando”, no Youtube.

mento sobre a estrutura da realidade, ou seja, tem acesso a insights, pensamentos e até sentimentos representativos de uma visão holística e integrada de como a realidade é constituída. Em diversas religiões antigas e hoje em dia em diversos meios “espirituais”, tem-se a ideia de que Deus está dentro de cada um, no mais íntimo de cada experiência, porque muitos indivíduos já passaram por experiências de fusão com o todo e de serem inundados pelo que parece luz/amor/ graça. Isso é uma maneira válida de expressar a realidade dos fatos, porém, para ser mais preciso com as palavras, não é que Deus esteja presente em cada experiência, mas na verdade cada experiência é constituída apenas de Deus. Pela consciência ser a única existência, a mesma não compartilha os limites das formas – limitações- , e portanto sua natureza é naturalmente infinita, sem forma, sem qualidades, e a partir disso a mesma possui potencial de se manifestar de TODAS as maneiras possíveis, todas as maneiras exploráveis pela consciência. Essa experiência de leitura, a experiência de canalização dessas palavras, a experiência de entrar em um rio em meio a natureza, a experiência de caos urbano. Se você pensar em termos de quantidade de experiências que existem, pense nos 7 bilhões de seres humanos que existem no planeta. 7 bilhões de experiências de consciências que tomam diferentes graus e tons de realidade, porém, todas compartilhando essa mesma qualidade: consciência. Além dos 7 bilhões de seres humanos, agora pense nos trilhões de espécies animais que nós já temos conhecimento em nosso planeta. Cada 1 desses TRILHÕES tem uma experiência única de realidade, uma maneira diferente de configurar a existência, e todos eles também compartilham essa mesma fonte de experiência: consciência infinita. Agora você entende quando dizem que somos um sonho na mente de Deus?


Marina Luz Rotava Paim Arteterapêuta marinaluzpaim@gmail.com Telefone:(48) 9 99002505

Liana Chiaradia Cofundadora do Guia da Alma, designer gráfica e ilustradora e ariana.

EXPRESSÃO PELA ARTETERAPIA

DESPERTANDO NA ERA DE AQUÁRIO

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Arteterapia surge da relação entre arte e terapia, na qual a arte passa a ser utilizada com recurso expressivo no processo terapêutico, podendo ser este em atendimentos individuais, oficinas, vivências e ateliês coletivo. Percebemos nessa forma terapêutica uma possibilidade de maior expressão por meio de diferentes recursos artísticos. Mas lembramos que nela não há necessidade de conhecimento sobre as técnicas de produção das artes, uma vez que nela valorizamos a forma como a elaboração simbólica se desenvolve e se apresenta. Para tanto, fundamentamos esta abordagem na Psicologia Analítica Junguiana e na Análise Psico-Orgânica. Entendemos que o trabalho do arteterapêuta com o cliente é fundamental no processo de individuação, uma vez que esse terapeuta facilitará tal processo de busca da consciênciasobre si mesmo e sobre o mundo. O Arteterapêuta utiliza diferentes recursos materiais (orgânicos ou inorgânicos: como a argila, areia, água, fogo, tintas, giz de cera, giz pastel, aquarela, papel, tecido, revistas) conforme a necessidade do cliente no atendimento arteterapêutico. Dessa forma, trabalhamos com os diferentes recursos das artes visuais, das cênicas, da literatura, da música e da expressão corporal facilitando o processo criativo.Com isso, permitindo o acesso de alguns conteúdos do inconsciente tornando-os conscientes para entender o que muitas vezes não se consegue expressar verbalmente. Com efeito, a Arteterapia se apresenta como uma alternativa na busca da saúde mental e física levando sempre em consideração o que o cliente expressa e suas limitações.

m número cada vez maior de pessoas tem tido acesso à informação e a oportunidade da descoberta interior. As pessoas estão conectadas, abrindo as portas do coração, dando espaço para a sensibilidade e quebrando ideias ultrapassadas ligadas ao ego, medos e capitalismo. Ainda existem muitas questões a serem equilibradas no planeta. Despertando e vibrando no amor, temos a oportunidade de mudar a realidade a nossa volta e ajudar quem ainda não despertou para esta Nova Era.

“TODOS TEMOS UM PROPÓSITO DE VIDA NESTE PL ANETA” Todos temos um propósito de vida pessoal neste planeta, nesta vida, agora! O autoconhecimento, a conexão consigo mesmo e com seu eu superior são o primeiro passo para a descoberta dessa missão – que faz mais sentido ainda quando você também a leva para o coletivo! Medite e conecte-se com você e com tudo que está ao seu redor; Fale com sua criança interior, dando espaço para a criatividade e felicidade; Perdoe, agradeça e cultive as relações; Aceite quem você é e cuide da sua saúde! Espiritualizese, entregue-se, desperte!

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RECEITA:

REQUEIJÃO DE INHAME Texto e imagens por Lavínia Kaucz

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ubstituir o leite na dieta, ou pelo menos diminuir o consumo, é uma atitude cada vez mais adotada no mundo. Os motivos são vários: intolerâncias alimentares ou alergias, a busca por uma alimentação mais variada, ou a escolha por uma dieta livre de qualquer produto de origem animal.De qualquer forma, é sempre interessante conhecer alternativas ao que normalmente comemos, e usar a criatividade no preparo de alimentos variados. Afinal, temos à nossa disposição inúmeras espécies de alimentos, principalmente no Brasil, que possui uma diversidade inigualável no mundo. Então por quê consumir apenas leite, ovos e carne? Pensando nisso, trouxemos uma receita de requeijão de inhame, um tubérculo tipicamente brasileiro, que leva ingredientes simples e baratos, que normalmente temos em casa.

COMO FAZER: Cozinhar o inhame até ficar macio. Em seguida, bater tudo no liquidificador. O requeijão dura cerca de uma semana na geladeira.

VOCÊ VAI PRECISAR DE: 3 inhames pequenos 1 colher de polvilho azedo Suco de meio limão Temperos a gosto (usamos cebolinha, salsinha, sal e açafrão da terra)

Benefícios do inhame • limpa o sangue • fortalece o sistema imunológico • promove o equilíbrio hormonal • é rico em vitaminas e minerais

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NAUFRAGADOS NO PARAÍSO A decisão de viver em contato com a natureza Texto e fotos por Lavínia Beyer Kaucz

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eu Valdir volta para casa com uma mochila cheia de cenouras e um galho que serve como cajado. Com 66 anos a força já não é a mesma, mas é suficiente para percorrer a trilha de aproximadamente três quilômetros que leva até sua casa, na comunidade de Naufragados, em Florianópolis. A pontinha ao sul da ilha é um ponto turístico que atrai muitos turistas no verão, mas além disso também é o lar de várias pessoas que decidiram se afastar dos confortos da cidade para viver as dificuldades e maravilhas de um local quase intocado e junto à natureza. Morador da comunidade há 41 anos, Seu Valdir conta que só sai de lá em momentos de necessidade. O caos da cidade, para ele, é praticamente insuportável. Na sua casa construída com garrafas de vidro que ele recolheu da praia e da trilha, a energia elétrica é gerada por painéis solares, e ele raramente a utiliza – mantém a geladeira desligada e esquenta a água com serpentina. Ele é veemente ao afirmar que não trocaria essa vida por nada: a simplicidade é o que tem de mais valioso.

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Casa do Seu valdir, construída com garrafas de vidro que ele recolhe na praia

U Seu Valdir volta para casa pela trilha de aproximadamente 3 mil metros

Seu Valdir e seu cavalo, seu animal de estimação

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ma casa no campo, uma praia deserta, a possibilidade de ver as estrelas quando anoitece. Tudo isso parece um sonho distante – seja por dificuldades financeiras de tomar essa decisão, seja porque a vida urbana se tornou muito confortável. Segundo o Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística (IBGE), 80% dos brasileiros vivem em cidades. Essa urbanização ocorreu de maneira repentina, e as grandes cidades cresceram, em geral, sem um planejamento que garanta bem-estar à todos. Em meio ao concreto, um pedaço de verde é luxo. Em Florianópolis, embora existam grandes centros populacionais, não é preciso andar muito para entrar em contato com a natureza. A trilha de Naufragados faz parte do Parque Nacional da Serra do Tabuleiro, que ocupa 1% do território brasileiro. E pra chegar lá de ônibus a viagem dura menos de uma hora – e mais 30 minutos de trilha. Mas nem tudo é paradisíaco: por ser uma unidade de conservação ambiental, os moradores estão passando por intermináveis processos para manter o direito de morar em Naufragados.


COMPOSTEIRA

Aprenda a fazer uma composteira sem minhocas, econômica e que não ocupa espaço! Texto por Yeda Teixeira Fotografia por Lavínia Kaucz Ilustrações de Pixabay

Ter uma composteira em casa é um forma de criar consciência sobre seus próprios alimentos orgânicos, evitar que sejam descartados em aterros e ainda adubar a terra sem utilizar produtos químicos. Ou seja, todos saem ganhando. O problema é que nem todos nós temos espaço, dinheiro e tempo suficiente para nos dedicar a tarefa de criar uma composteira caseira. Além disso, muitas pessoas preferem não manusear minhocas, que são utilizadas para acelerar o processo da compostagem. Então, aprenda a fazer uma composteira para espaços pequenos, sem minhoca e com materiais que, provavelmente, você já tem em sua casa!

O QUE VOCÊ IRÁ PRECISAR: • resíduos orgânicos • um vaso com terra • um pote com tampa (do tamanho que achar melhor) • uma faca

O QUE VAI E O QUE NÃO VAI: Vai: frutas, verduras, legumes, grãos, cascas de ovos, borra de café e saquinhos de chá. Não vai: carnes, limão, temperos, líquidos, óleos e gorduras e papel higiênico.

Corte o fundo do pote e descarte junto com o lixo reciclável. Depois coloque o pote no vaso e pressione para ficar firme.

Pique os resíduos orgânicos e coloque dentro do pote. Lembre-se: não pode colocar carne, lacticínios e outros tipos de lixo.

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3 Está pronto! Agora é só deixar os microorganismos fazerem o trabalho de decomposição do resíduo.

Tampe o pote para que não fique com mal cheiro e não atraia bichos.

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“Diante de uma alma, seja só outra alma” Uma conversa com Miriam Oliveira: psicóloga que usa práticas alternativas em seus atendimentos Texto por Lavínia Kaucz e Yeda Teixeira Ilustrações de Pixabay.com

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os 14 anos, Miriam da Conceição de Oliveira, saiu do Maranhão para São Paulo com a esperança de ter uma vida melhor. Sempre teve ambição pelos estudos. Mesmo tendo parado na quarta série do ensino fundamental, colecionava e lia gibis da Marvel, paixão que hoje encontra nos filmes. Em Piracicaba, interior de São Paulo começou a vida como empregada doméstica. Com o tempo, avançou e trabalhou em outros setores do comércio da cidade em que o peixe para. Porém, a ambição de estudar nunca se perdeu. Depois de anos de psicoterapia, Miriam decidiu que gostaria de se tornar psicóloga para ajudar outras pessoas que passam por dificuldades psicológicas ao longo da vida.

coterapia para o paciente se dá pela condição de expansão do campo de consciência. Ou seja, o paciente vai se tornando cada vez mais conhecedor do seu mundo interno e, portanto, mais apropriado da sua condição de ser em desenvolvimento. Para o psicoterapeuta, a relação interpessoal contribui para o aprimoramento das condições de percepção do seu próprio mundo interno, usando seu conhecimento, suas ferramentas e sua história de vida, mas o foco vai ser sempre o trabalho com o paciente e o psicoterapeuta Então não tem essa objetividade científica tão falada, porque se trata de uma relação. A prova disso é o que o Jung aconselhou para todos os psicoterapeutas junguianos: “conheça todas as teorias, domine todas as técnicas, no entanto diante de uma alma, seja só outra alma”.

“A principal técnica que poderia ser chamada de alternativa é o trabalho corporal calatonia”

Como a psicoterapia contribui para o paciente? E para o psicólogo? Para Jung, a grande contribuição para a psi14 | GAIA | Nº 01 | DEZ 2017

Quais práticas alternativas você utiliza na terapia? Quais são as que mais sente prazer em fazer com o paciente e por que? A principal técnica que poderia ser chamada de alternativa é o trabalho corporal calatonia. No


entanto, esta é uma técnica muito séria e comprometida com o desenvolvimento do paciente, o que demandou muito estudo e compreensão do corpo humano. Foi trazida pelo Dr. Petho Sandor, húngaro que veio para o Brasil e aqui aprimorou a técnica da calatonia. Eu também utilizo a aromaterapia porque tem todo um grupo de estudos e ela proporciona bem estar, calma e a gente sabe que existe uma influência da aromaterapia para a saúde do paciente. Utilizo também a musicoterapia como técnica que auxilia no desenvolvimento do paciente. Na verdade, eu utilizo todas estas técnicas de forma integrada, porque todas dão muito prazer para o paciente e a mim.

Você acredita na integração corpo, mente, espírito e natureza? Sim, acredito! O homem não pode viver fragmentado, embora seja o que nós tem os mais evidente na sociedade atual. Então, na medida em que o homem se entrega a esse auto conhecimento, ele também integra suas várias partes. O homem, ele tem uma natureza interna e vive na natureza, nós é que burilamos tanto a natureza e tornamos algo transformado a partir das nossas ações e portanto nós achamos que estamos separados dela. Quando nós nos integramos, nós passamos cada vez a respeitar a natureza nas suas várias manifestações.

Quais mudanças você nota nos seus pacientes depois que realiza estas práticas? As mudanças mais significativas é o maior centramento e também a capacidade que o paciente vai desenvolvimento em prestar atenção naquelas imagens próprias, que o Dr Sandor chamou de imagens integradoras e portanto imagens curativos. Elas, por si só, movimentam o paciente no sentido de uma compreensão mais acentuada do próprio mundo.

Miriam de Oliveira miteixeira18@hotmail.com (19) 98143-5792

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Domínio Público/Pixabay

ESPECIAL

o alternativo é do povo O que é a medicina alternativa e como ela chegou ao sistema público de saúde em Florianópolis Texto e Imagens por Lavínia Beyer Kaucz e Yeda Teixeira

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“I

magine um menino e uma pipa. Você é o menino, a pipa é sua mente, e a linha que segura a pipa é a sua respiração”. Essa metáfora foi utilizada por Murilo Leandro Marcos, médico do Sistema Único de Saúde (SUS) especializado em yogaterapia, durante uma de suas aulas em Florianópolis. Quem é alheio a prática pode até estranhar, mas a respiração pode controlar a mente e o corpo. Com a intenção de promover um sistema de saúde que pense no ser humano como um todo, física e mentalmente, a yoga e outras 13 modalidades foram incluídas na Política Nacional de Práticas Integrativas e Complementares (PNPIC) em 2017, passando a ser reconhecidas pelo SUS. Mas esta política faz parte de um contexto maior. As plantas medicinais, as práticas corporais como a yoga, a meditação, a acupuntura e tantas outras fazem parte de um grupo chamado medicina alternativa. O que elas têm em comum é que todas oferecem tratamentos alternativos ao modelo convencional de cuidado com a saúde. Esses métodos ajudam o corpo de uma forma mais sutil a se reequilibrar, oferecendo suporte para aumentar o potencial de recuperação do corpo, além de prevenir o surgimento de doenças. Boa parte das enfermidades comuns tende a melhorar, quaisquer que sejam os cuidados. “A medicina convencional não é boa para estimular o corpo a equilibrar, ela é boa para eliminar a doença.” afirma Charles Tesser, médico e professor do departamento de Saúde Pública da Universidade Federal Santa Catarina (UFSC). Em geral, as medicinas não-convencionais partem de uma filosofia vitalista, que compreende que tudo que está vivo possui uma energia vital. Na China, por exemplo, o conceito de “Qi”, base da medicina tradicional chinesa, significa “gás” ou “éter” e representa o sopro vital que anima a vida no Universo. Hipócrates, pai da medicina ocidental, chamava de “pneuma cósmico” essa energia que entra no corpo através dos pulmões, atinge o coração e se espalha pelo sangue. Já a medicina convencional segue uma linha científica que enxerga o funcionamento do corpo como uma máquina, identificando e reparando o mecanismo alterado. A medicalização vai nesta lógica, que pode ser efetiva em muitas situações,

mas nem sempre é o tratamento ideal ou a única possibilidade. Por ser uma maneira rápida de inibir os sintomas, é a forma que mais se adequa ao ritmo da sociedade atual. “Temos uma sociedade com muito mais exigências e menos tolerância para o adoecimento e cuidado.” explica Tesser. Os remédios, como os antibióticos, tratam de uma parte do corpo, mas podem causar efeitos colaterais que prejudicam outras partes.

“TEMOS UMA SOCIEDADE COM MUITO MAIS EXIGÊNCIAS E MENOS TOLER ÂNCIA PAR A O ADOECIMENTO E CUIDADO” RACIONALIDADES MÉDICAS “Medicina alternativa” é um termo amplo: é usado para designar tanto a acupuntura quanto a meditação ou o chá de ervas que sua vó receitava. Mas por ser tão abrangente, esse termo não consegue explicar o universo que existe além da medicina convencional. No início dos anos 90, a profa. Madel Luz, da Universidade Federal do Rio de Janeiro (UFRJ), desenvolveu uma classificação para esse leque– as racionalidades médicas, que são sistemas complexos em seis dimensões: uma COSMOLOGIA, que é a raiz filosófica que sustenta cada medicina; uma MORFOLOGIA humana, correspondente à anatomia na biomedicina; uma DINÂ MICA VITAL humana, correspondente à fisiologia na biomedicina; uma DOUTRINA MÉDICA, que define o que é doença e o que pode ser tratado ou curado; um SISTEMA DE DIAGNÓSTICO, que determina as origens, fase e evolução provável das doenças; um SISTEMA TER APÊUTICO, que determina a forma de intervenção mais adequada à doença identificada pela diagnose. DEZ 2017 | Nº 01 | GAIA | 17


História

A

Idade Média, que durou aproximadamente mil anos, ficou conhecida como a “Idade das Trevas”. De fato, a prática da ciência era vista pela Igreja como heresia, e o conhecimento científico praticamente não evoluiu no Ocidente até o século XVII. A Revolução Científica simbolizou uma separação da Teologia e da Ciência. Naquele contexto, essa separação foi revolucionária por contestar os paradigmas que imperavam até então. Mas as consequências não demoraram a aparecer: a supervalorização da ciência, em detrimento dos conhecimentos tradicionais e manifestações culturais dos povos. Aquilo que não pode ser provado pelo método científico perde o valor, e o conhecimento é entendido como fruto de uma visão objetiva do mundo. Nesse contexto surgiu a biomedicina, que corresponde ao método mais utilizado nos dias de hoje, que a academia reconhece e aplica. Nos anos 60, a biomedicina passa por uma crise. “Não é uma crise de eficacidade, mas está ligada ao relacionamento entre médicos e pacientes, somada com a vontade das pessoas doentes de buscarem tratamentos mais ligados com a natureza”, comenta Renata Sigolo, professora de História da Saúde na UFSC. O movimento hippie e os protestos de maio de 68 na Europa faziam críticas ao estilo de vida urbano e capitalista que se estabeleceu após a Segunda Guerra Mundial. Além disso, a biomedicina naquele momento estava passando por um crescimento no uso de fármacos. Apesar de estarem ligadas às críticas dos movimentos de contracultura, quem reivindicou o uso de medicinas alternativas no Brasil e no mundo foi a classe média. “A partir do final da década de 80, a biomedicina percebe as medicinas alternativas como um filão comercial”, explica Sigolo. Quando as outras medicinas passam a ser reconhecidas e incorporadas pela biomedicina, ocorre uma mudança de perspectiva: de alternativas, elas passam a ser chamadas de “complementares”. “Em um momento elas eram concorrentes, e em um segundo momento passam a ser auxiliares”,comenta a historiadora. O termo “medicina integrativa” surge mais tarde e corresponde às práticas que podem ser

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testadas e aprovadas a partir do mesmo critério da biomedicina. Um exemplo é a acupuntura: a explicação científica da sua eficácia aponta para o estímulo de pontos nervosos do corpo, já a explicação da medicina chinesa abrange teorias como a do Qi e Yin-Yang. “O que a biomedicina faz é

tirar essa cosmologia, e explicar do seu jeito, rejeitando a explicação do outro”, acrescenta Sigolo.

O que diz a Organização Mundial de Saúde?

E

m 2002, a Organização Mundial de Saúde (OMS) lançou sua primeira estratégia para a medicina tradicional. A publicação tinha como objetivo incentivar os países em desenvolvimento a regulamentar a prática das Medicinas Tradicionais e Complementares (MT&C), integrando-as aos sistemas de saúde públicos e aumentando sua disponibilidade para as populações mais pobres. Além disso, a publicação também identificou a necessidade de se produzir conhecimento na área, para sustentar a integração dessas práticas nos sistemas de saúde. Em 2014, a OMS publicou um documento atualizado, com base no progresso dos países e nos novos desafios no campo da medicina tradicional, traçando estratégias para a próxima década. Segundo a publicação, houve progressos significativos e estáveis na implementação, regulamentação e gerenciamento das MT&C desde o lançamento da primeira Estratégia em 2002.

“O QUE A BIOMEDICINA FAZ É TIR AR ESSA COSMOLOGIA, E EXPLICAR DO SEU JEITO, REJEITANDO A EXPLICAÇÃO DO OUTRO” Dos 129 estados-membros da ONU, 69 apresentavam políticas em MT&C em 2012, representando um aumento de quase 40% em relação a 1999. Esse


DEFINIÇÃO OMS Medicina Tradicional (MT): Medicina tradicional é uma longa história. É a soma total dos conhecimentos, habilidades e práticas baseadas nas teorias, crenças e experiências de diferentes culturas, usadas na manutenção da saúde assim como na prevenção, diagnose, melhoria ou tratamento de doenças físicas e mentais. Medicina complementar (MC): O termo “medicina complementar” se refere a um conjunto amplo de práticas de cuidado com a saúde que não são parte da medicina convencional ou tradicional daquele país e não são inteiramente integradas ao sistema de saúde dominante. Elas são usadas intercaladamente com a medicina convencional ou com a medicina tradicional em alguns países. Medicina tradicional e complementar (MT&C): MT&C emerge dos termos MT e MC, englobando produtos, práticas e praticantes.

número apresenta variações de acordo com as práticas. 80% dos países reconhecem o uso de acupuntura, mas apenas 29 destes têm regulamentação. O documento também apontou como está o terreno da educação e pesquisa no campo das Medicinas Tradicionais e Complementares. 56% dos países não têm ensino dessas outras medicinas no nível superior. Os números relacionados à pesquisa científica são um pouco mais otimistas: em 1999, apenas 19 países possuíam centros nacionais de pesquisa na área; em 2012, aumentou para 73.

“Os sistemas de saúde em todo o mundo estão experimentando níveis crescentes de doenças crônicas e aumento dos custos com cuidados de saúde”, segundo o documento. A demanda das MT&C nos sistemas de saúde está aumentando devido a diversos motivos, e um deles é a questão econômica: as medicinas tradicionais e complementares, eficientes principalmente na prevenção e no cuidado primário à saúde, são uma alternativa mais barata em relação à exames, receitas médicas e hospitalizações. Além disso, segundo o documento, pacientes e profissionais de atenção à saúde estão exigindo que os serviços sejam revitalizados, dando maior ênfase a cuidados individualizados e centrados na pessoa. Especialmente nos países em desenvolvimento, o potencial das medicinas tradicionais é forte devido à aceitação que elas recebem por parte das comunidades, e também à abordagem na maioria das vezes mais simples, econômica e não-tóxica.

“O QUE A BIOMEDICINA FAZ É TIR AR ESSA COSMOLOGIA E EXPLICAR DO SEU JEITO, REJEITANDO A EXPLICAÇÃO DO OUTRO” Outras razões para o aumento da procura por MT&C, apontadas pelo documento, são o aumento da demanda pelos sistemas de saúde no geral, a crescente insatisfação com os serviços de saúde existentes, um retorno do interesse pelo cuidado holístico e prevenção de doenças, além da utilização paliativa para oferecer qualidade de vida quando a cura não é possível. Na última década houve um aumento dos cuidados com a saúde porque as pessoas estão optando por ser mais proativas sobre o próprio bem-estar. Mas o documento alerta: “Muitos consumidores se voltam para os produtos e práticas da MT&C com o pressuposto de que ‘natural significa seguro’, o que não é necessariamente verdade”. DEZ 2017 | Nº 01 | GAIA | 19


No Posto de Saúde da Lagoa da Conceição, práticas como o yoga, auriculoterapia, acupuntura, plantas medicinais e outros são oferecidos para a população do bairro.

Do privado ao público

É

só pesquisarmos os espaços que oferecem práticas alternativas para percebermos que os valores cobrados são altos. A questão, afinal, é que o cuidado com a saúde e a oferta de tratamentos eficazes e que sejam alternativos ao modelo convencional, é uma demanda necessária também para classe baixa. A oferta de práticas e tratamentos alternativos no Sistema Público de Saúde não tem uma data de início específica, mas acredita-se que desde a criação do SUS, médicas e médicos que trabalhavam nos postos de saúde já faziam uso da medicina alternativa em seus pacientes. Por isso, em 2006, o Ministério da Saúde criou a Política Nacional de Práticas Integrativas e Complementares, as chamadas PICs. Dentre os diversos benefícios conquistados com a regulamentação das PICs, esta área alternativa, que até hoje sofre preconceitos dentro da academia, passa a receber proteção para sua continuidade na rede pública. “O principal ganho com o regulamento das PICs é reconhecer que estas práticas existem e proteger os profissionais e a continuação das práticas dentro do sistema público de saúde.” afirma Murilo Leandro Marcos, coordenador da Comissão

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de PICs de Florianópolis. Os pacientes também ficam protegidos, já que a regulamentação garante que o profissional que esteja aplicando uma técnica seja capacitado para a função. Em Florianópolis, as PICs começaram a ser organizadas em 2010, a partir da formação da Comissão de Implantação do Programa Municipal de Práticas Integrativas e Complementares. No final deste mesmo ano, a Comissão (CPIC) se tornou permanente, dando início ao trabalho de regulamentar e legitimar os profissionais e as PICs na rede de saúde pública de Florianópolis. A estratégia executada pelos integrantes de comissão em parceria com profissionais da rede para a implementação das PICs, foi trabalhar com o contexto local, seguindo o modelo de atenção primária à saúde que já existia em Florianópolis. A atenção primária à saúde é o primeiro contato do cidadão com o SUS, geralmente provida pelos Centros de Saúde (CS) dos bairros. Em Florianópolis, os Centros de Saúde oferecem serviços de consultas agendadas, pronto atendimento e retirada de medicamentos e é considerada pelo Ministério da Saúde a cidade com os melhores índices na categoria de “Atenção Primária à Saúde”. Os integrantes da CPIC perceberam que eram


PRÁTICAS INTEGRATIVAS E COMPLEMENTARES

36

POSTOS DE SAÚDE DE 50 OFERECEM EM

FLORIANÓPOLIS

34 OFERECEM AURICULOTERAPIA 24 OFERECEM ACUPUNTURA 7OFERECEM HORTA 6 OFERECEM FITOTERAPIA 5 OFERECEM YOGA poucos os profissionais especializados que atuavam no SUS e que não haviam investimentos na contratação de novos profissionais e a ação alternativa foi oferecer cursos àqueles sem especialização. Para isso, os integrantes de comissão e outros profissionais voluntários começaram a oferecer a Oficina de Sensibilização em Práticas Integrativas e Complementares para todos os funcionários das unidades de saúde que demonstravam interesse. Durante a oficina, estes funcionários também são colocados para receber algumas das práticas que estão aprendendo. “Para o profissional aplicar bem uma PIC, é importante que ele também tenha recebido. Isso ajuda ele a perceber como aquela PIC pode ajudar e porque tantas pessoas gostam.” confirma o coordenador Murilo. Outra estratégia executada pela comissão foi a descentralização das PICs na cidade. Ao invés de existir um único local que disponibilize todas as práticas previstas por lei, elas estão distribuídas na maioria dos postos de saúde de Florianópolis.

Assim, os pacientes que já estavam submetidos às práticas terapêuticas alternativas continuaram a ter acesso aos tratamentos no posto de saúde mais próximo de sua casa e não precisaram se deslocar para outro local. Já os profissionais que atuavam na área antes da regulamentação, passaram a ter, oficialmente, acesso a alguns recursos e tempo para se dedicarem ao atendimento de seus pacientes.

“PAR A O PROFISSIONAL APLICAR BEM UMA PIC, É IMPORTANTE QUE ELE TAMBÉM TENHA RECEBIDO.”

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Nem tudo é azul

A

pesar de o modelo de implementação das práticas ter sido bem sucedido em Florianópolis, os postos de saúde não recebem investimento direto do Estado. Como explica o coordenador Murilo Leandro Marcos, o investimento para o funcionamento das PICs se dá através do profissional, do espaço disponibilizado e com alguns poucos recursos como agulhas para acupuntura, ventosas ou, de vez em quando, placas para auriculoterapia. Sem este investimento, a iniciativa de oferecer as PICs parte, principalmente, da disponibilização dos profissionais de cada unidade de saúde. E quando aquele profissional que oferecia uma yoga, auriculoterapia ou uma acupuntura sai da unidade, por quaisquer motivos, não há um reposição do profissional. As práticas terapêuticas que englobam as PICs têm um caráter contínuo. Ou seja, o ideal é que o paciente esteja sempre fazendo o uso de alguma das práticas, a fim de manter o bem estar físico e mental e evitar o surgimento de novos problemas. Como explica o coordenador Murilo, “um dos problemas das PICs e do sistema de saúde em geral é que não existe um plano de manter a saúde das pessoas e sim de tratar doenças.” Exatamente por

este motivo, é necessário que o paciente tenha indicação médica para fazer algum tratamento terapêutico nas unidades de saúde. Apesar de nossos ancestrais fazerem uso de chás, bênçãos e outras técnicas que eram usadas para a cura de enfermidades e até os dias de hoje algumas das receitas continuarem nas nossas vidas, o nome “medicina alternativa” gera preconceitos na sociedade. “Minha mãe sempre me tratou com remédio caseiro e só me levava [ao médico] quando estava muito ruim. Quando ela descobriu que o médico dava antibiótico para a garganta e febre, rápido ela aprendeu a olhar a minha garganta e ver se estava com febre e já me dava um remédio, já que não tínhamos dinheiro para pagar uma consulta. E hoje, por exemplo, ela confia muito mais no que o médico diz do que nas técnicas alternativas que ela tinha aprendido com a minha avó.” conta o professor Tesser. É necessário entender também que existem pessoas que não acreditam ou, simplesmente, preferem fazer uso da medicina convencional. E está tudo bem. Afinal, a medicina convencional nunca deixou de ser eficiente em diversos casos, mas a proposta é que não seja o único modelo oferecido no sistemas de saúde.

Paulo, por alguns problemas de saúde, adapta os movimentos que não consegue repetir, mas não deixa de participar.

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O salão comunitário da Lagoa da Conceição se enche de pessoas de todas as idades e condicionamentos físicos.

Na prática

B

uzinas, correria para chegar numa loja antes de fechar, contas para pagar. O estresse do cotidiano continua lá fora. Mas dentro do salão comunitário da Lagoa da Conceição, a tranquilidade e a concentração estão presentes. É aula de Yoga. Ministrada por Murilo Leandro e Eliana Freitas, os mais jovens e mais velhos se reúnem para dar o melhor de si em movimentos de alongamento e meditação. Como disse Dona Júlia, 61 anos, sobre a aula “Cura as dores do corpo e da alma.” A yoga, por ser considerada uma prática corporal, é uma das PICs oferecida nos postos de saúde que não é necessário indicação médica para participar, mas muitos participantes do grupo estão lá por este motivo. Adaptando o movimento aos seus próprios limites, Paulo, de 60 anos conta sua experiência como aluno. “Como eu estava bem doente, com problemas na coluna, no estômago e bronquite, comecei a frequentar [a aula de yoga] e agora estou curado.” O grupo de nível iniciante existe desde março de 2016, começou pequeno e hoje conta com aproximadamente quarenta alunos. Alguns participantes vão para a aula por indicação médica,

outros pelo estilo de vida, mas no final todos saem com um sorriso no rosto, energia e se sentindo mais leves. “A gente sai daqui torcendo pra chegar a próxima aula”, conta Júlia. A possibilidade de yoga gratuito com um médico é atrativo até mesmo para outros profissionais da área. Milla Melleu, que é professora de yoga e também faz parte do grupo para fazer a prática percebe a diferença de participar do grupo “Em casa não tem o espaço, não tem a motivação. Eu gosto do campo energético com mais gente, gosto do fluxo, da respiração, do ‘vamos juntos’”, conta. A medicina alternativa ainda é cercada por preconceitos que estão sendo desmistificados com o tempo. A verdade é que todos nós nos identificamos com hábitos de vida e vivenciamos realidades diferentes que nos direcionam de forma consciente (ou não) para estilos de vida que vão além do convencional. Mas para que possamos escolher a via alternativa, é necessário que esta seja acessível. E é por esta razão, também, que a oferta de práticas terapêuticas e corporais no SUS é, não só essencial, mas uma conquista da comunidade e de profissionais. DEZ 2017 | Nº 01 | GAIA | 23


RETRATOS

CINESIA

Fotografias por Veronica Gazola Texto por Yeda Teixeira

Sinal aberto. Quarenta e três segundos. O cotidiano exige movimento e o movimento deixa vestígios.

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urante três meses, a estudante de Artes Visuais, Veronica Gazola, observou o movimento do centro de Florianópolis e registrou com sua câmera as manchas que pessoas desconhecidas deixavam no caminho. As cinco fotografias de longa exposição, retratam a cidade a partir de uma perspectiva rotineira, diferente do imaginário turístico das pessoas que conhecem Florianópolis apenas por suas praias. DEZ 2017 | Nº 01 | GAIA | 25


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PELAS RUAS DE RIO DO SUL

Fotos e texto: Felipe Buzzi

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s fotos foram tiradas no bairro Boa Vista, em Rio do Sul, entre agosto e novembro de 2017. A princípio, sem nenhuma pretensão ou trabalho jornalístico; é resultado das caminhadas que eu e minha namorada fazemos. As fotos entram em contraste com o que eu costumo ver morando em Florianópolis, cercado por prédios e muros. Quando volto para lá consigo ter maior intimidade com a rua, como gostaria de ter morando na capital. É uma relação que denota minha infância, longe de tudo e na estrada de barro.


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SERVIÇÃO

O ERRO DE DESCARTES

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Erro de Descartes é um livro que desafia a ciência convencional e oferece uma visão integrada e ao mesmo científica do ser humano. Contrariando as visões do cérebro humano como uma máquina com regiões e funções específicas, Antônio Damásio, um dos princiapais neurocientistas dos Estados Unidos, traz uma hipótese inovadora sobre a influência das emoções na tomada de decisões e na racionalidade como um todo. 30 | GAIA | Nº 01 | DEZ 2017

YOGA PARA NERVOSOS

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Poder do Agora, de Eckart Tolle, combina diversas tradições espirituais como cristianismo, budismo, hinduísmo e taoísmo para construir um livro que é um guia para a descoberta do potencial interior. O poder do agora é o poder de prestar atenção no presente, ao invés do futuro e passado, que são projeções mentais. Mais que um ensaio teórico, este livro é um manual prático para tomar consciência de pensamentos que nos afastam da alegria e paz interior.

O PODER DO AGORA

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ocê já pensou em aprender Yoga sozinho em casa? Essa é a proposta do livro “Yoga para Nervsoso”, de Hermógenes. O método terapêutico abordado no livro foi criado pelo médico José Hermógenes para tratamento do estresse e outras doenças neurológicas. As séries terapêuticas são específicas para deprimidos, excitados e tensos. O livro traz uma profunda fundamentação teórica sobre a filosofia do Yoga e seus benefícios para depois introduzir movimentos que podem ser feitos sem muito esforço.

Fot


MAPA DE FEIRAS ORGÂNICAS

O

Mapa de Feiras Orgânicas é uma ferramenta de busca, idealizada pelo Instituto Brasileiro de Defesa do Consumidor (Idec), com o objetivo de estimular a alimentação saudável em todo o Brasil e mostrar que os produtos orgânicos podem ser mais acessíveis aos consumidores. De acordo com uma pesquisa feita pelo Idec em 2012, muitos consumidores iriam preferir comprar alimentos orgânicos, se eles fossem mais acessíveis. Outro levantamento, feito pelo Instituto Terra Mater e o Instituto Kairós, concluiu que os produtos orgânicos são bem mais baratos nas feiras do que nos supermercados. Acessa aí e confere se tem uma feira perto da sua casa! O mapa está disponível no site www. feirasorganicas.org.br. Além do site, também é possível baixar o app disponível para IOS e Android.

CURSO GRÁTIS E ONLINE SOBRE PLANTAS E FITOTERÁPICOS

O

Sistema Único de Saúde (SUS) disponibiliza gratuitamente um curso online sobre plantas medicinais e fitoterápicos. O curso é direcionado aos Agentes Comunitário de Saúde (ACS), mas pode ser acessado por qualquer pessoa que tenha interesse. Esse módulo tem como base as diretrizes da Política Nacional de Práticas Integrativas e Complementares (PNPIC), em conformidade com os princípios estabelecidos para a Educação Permanente do SUS. Com carga horária de 80h, à distância, o curso não tem limite de vagas. Para realizar, acesse o site: www.avasus. ufrn.br

Texto: Lavínia Beyer Kaucz

Foto: ComunicTV

Foto: Pixabay DEZ 2017 | Nº 01 | GAIA | 31


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