RELAÇÕES DE CURA: APONTAMENTOS DA GEOGRAFICIDADE NA RELAÇÃO PESSOA E PLANTA MEDICINAL

Page 1

UNIVERSIDADE FEDERAL DE MINAS GERAIS INSTITUTO DE GEOCIÊNCIAS DEPARTAMENTO DE GEOGRAFIA

LUIZA DIAS MOREIRA

RELAÇÕES DE CURA: APONTAMENTOS DA GEOGRAFICIDADE NA RELAÇÃO PESSOA E PLANTA MEDICINAL

BELO HORIZONTE 2018


LUIZA DIAS MOREIRA

RELAÇÕES DE CURA: APONTAMENTOS DA GEOGRAFICIDADE NA RELAÇÃO PESSOA E PLANTA MEDICINAL

Trabalho de conclusão de curso apresentado ao Departamento de Geografia do Instituto de Geociências da Universidade Federal de Minas Gerais como requisito para obtenção do título de licenciado em Geografia.

Orientador (a): Prof(a). Dra. Virgínia de Lima Palhares.

BELO HORIZONTE 2018


RESUMO

A sensibilidade que existe em cada um, mesmo que escondida, intermedia nossa relação e visão com/de mundo. Na relação com os seres da flora, em especial com as medicinais, a sensibilidade humana permite que desfrutemos do poder que emana das plantas. Enraizadas nos quintais, as plantas medicinais se relacionam com os sujeitos onde há envolvimento emocional, no Lugar. Nesse sentido, o presente trabalho explora a relação existente entre pessoa humana e planta medicinal em seus lugares de vida. Os feirantes da Feira Agroecológica Raízes do Campo demonstram uma forte relação com a terra, e com as plantas. Assim, suas histórias e lugares de vida acolheram a busca por desvelar a relação presente entre pessoa e planta, procurando entender também que influência a relação exerce na preservação dos saberes relacionados as plantas medicinais. Permeada pela geograficidade, a admiração e o respeito presentes nos cuidados que envolvem as plantas medicinais mostrou-se como a principal relação. Para além das experiências compartilhadas, para aqueles que buscam o poder das plantas, aconselho sentir.

Palavras-chave: plantas medicinais, geograficidade, lugar.


ABSTRACT

The sensibility within each one, even though hidden, mediates our relation and vision with/of the world. In our relation with the flora, specially the medicinal ones, the human sensibility allows us to enjoy the power that come from the plants. Rooted in our backyards, the medicinal plants relates to the subject where there's emotional involvement, in place. In this sense, the present study explores the existing relationship between humans and medicinal plants, in their places of life. The marketers from Feira AgroecolĂłgica RaĂ­zes do Campo show a strong relationship with the earth and the plants. Thus, their stories and places of life welcomed the search for unveiling the relationship present between human and plant, trying to understand also what influence the relation exerts in the preservation of the knowledge related to medicinal plants. Permeated by geography, the admiration and respect present in the care that involve the medicinal plants proved to be the main relation. Beyond the shared experiences, to those that seek the power of the plants, I advise you to feel.

Keywords: medicinal plants, geograficitĂŠ place.


LISTA DE FIGURAS

Figura 1 – Um olhar sobre o quintal de Maria Lucia....................................................... 21 Figura 2 – Plantas medicinais em meio à horta de Dakini................................................. 24 Figura 3 – Conversa com Seu Lázaro na sala de sua casa................................................. 26


SUMÁRIO

INTRODUÇÃO ....................................................................................................................... 7 1 – SABERES QUE CURAM .............................................................................................. 10 1.1 - Cultivando a cura: as plantas medicinais ........................................................................ 10 1.2 - Lá no quintal: o lugar ...................................................................................................... 15 2 – ENTRE AS PLANTAS DO QUINTAL .................................................................. 17 2.1 – De Jabó aos quintais ............................................................................................ 17 2.2 – Sua história, seu quintal, suas plantas ..................................................................... 20 3 – PERCEPÇÕES E APONTAMENTOS: pessoa humana – planta medicinal ........... 28 PLANTANDO UMA MUDA: considerações de vivência ............................................... 33 REFERÊNCIAS.......................................................................................................... 34 APÊNDICES ............................................................................................................. 36


7

INTRODUÇÃO

A intenção por desenvolver um trabalho dessa natureza faz parte da minha construção pessoal. Para mim, as plantas medicinais têm um significado especial devido à relação presente entre elas e eu, desde a infância. Apoiada nos saberes de minha mãe, qualquer gripe ou resfriado, cortes ou dores eram tratados, também, com as plantas cultivadas no quintal. Todo o ritual de pedir licença e retirar corretamente as folhas, para não machucar, fez-me cultivar a relação de respeito e admiração às plantas medicinais. Quando me mudei da casa de minha mãe parece que não levei comigo os saberes que me foram ensinados sobre o uso das plantas nos processos de cura e tratamento de males. Hoje, a dipirona em comprimido tem mais espaço na minha vida do que o boldo do quintal. Esse incômodo aumentou à medida que comentários descrentes no poder das plantas aparecem no meu cotidiano na metrópole belorizontina. Assim, o trabalho tem início com um questionamento pessoal sobre como essa relação íntima estabelecida com as plantas medicinais pode afetar a valorização desse saber e por conseguinte a preservação do mesmo. A minha breve experiência com os feirantes da Feira Agroecológica Raízes do Campo, de Jaboticatubas – MG, me levou a escolhê-los como alvo da pesquisa. Percebi neles fortes raízes com a terra. A feira, uma realização da associação Amanu - Educação, Ecologia e Solidariedade, tem como princípio de suas atividades a busca por uma sociedade mais justa e ecológica. Seu corpo é formado por agricultores agroecológicos de diversas comunidades tradicionais do município de Jaboticatubas - MG, que preservam saberes e práticas ancestrais. Na intenção de buscar conhecer as relações possíveis entre os feirantes e suas plantas medicinais, escolhi me aproximar de seus quintais. Local de morada das plantas por eles cultivadas, entre elas as medicinais. As plantas medicinais são entendidas aqui como as que, dentre todas suas outras funções - alimentares, ornamentais -, são usadas principalmente para a cura e tratamento de doenças. Entendo que com o desenvolvimento da indústria farmacêutica, e com as facilidades advindas desse processo, o cultivo e uso das plantas medicinais vêm diminuindo e perdendo


8

credibilidade. Nesse sentido, o resgate desses saberes na comunidade de produtores agroecológicos da Feira Raízes do Campo visa também conhecer, divulgar e preservar esse saber. Para tanto, o trabalho buscou desvelar a relação existente entre pessoa humana e planta medicinal. Os significados, sentidos e sentimentos atribuídos pelos sujeitos ao poder das plantas curativas podem dar indícios de sua perpetuação. Para alcançar o objetivo, o estudo procurou refletir, também, sobre a regularidade com a qual as plantas medicinais são usadas pelos moradores em comparação aos remédios convencionais (alopáticos); como se dá a transmissão dos saberes vinculados às plantas medicinais; e quais significados são atribuídos às plantas medicinais pelos sujeitos que as cultivam. As relações estabelecidas entre o homem e a natureza são objeto de estudo da geografia. No trabalho valho-me da Geografia Cultural de aporte para realização. Assim, para buscar entender a relação entre a pessoa humana e as plantas medicinais optei pelo trabalho em campo nos seus quintais como possibilidade de experienciar, percorrer e observar. O trabalho em campo é a aproximação do pesquisador com a realidade, de interatividade com os “atores” que vivenciam a realidade estudada (MINAYO, 2012). Dessa forma, a vivência no quintal, o caminhar desbravador, as conversas e histórias em meio às plantas e o aprendizado sobre diferentes usos de plantas ali enraizadas foi vital para me aproximar da compreensão a qual me proponho. Outra ferramenta de pesquisa qualitativa utilizada foi a história de vida como técnica de coleta de dados, que permite ao sujeito contar sua história. Objetiva-se compreender uma vida, ou parte dela, como caminho possível para desvelar e/ou reconstituir processos vividos pelos sujeitos em diferentes contextos (SOUZA, 2006). “As histórias individuais mostram-nos, efetivamente, uma cultura, um meio social, um esquema de valores e de ideologia.” (BARROS; SILVA, p.140, 2010). Ademais, por meio da oralidade, baseada em depoimentos, as pessoas externam seus sonhos, desejos, frustrações e perdas. Assim, os depoimentos, em sua riqueza de detalhes, mostram as especificidades da trajetória das pessoas e suas visões de mundo. Essas feições são importantes para o que objetiva-se a pesquisa. A relação íntima existente entre a pessoa humana e as plantas medicinais perpassa pelas suas histórias, sentimentos, valores e visões de mundo. Nesse sentido, a história de vida como instrumento de metodologia qualitativa aproxima pesquisador e pesquisado, que “constitui momento de


9

construção, diálogo de um universo de experiências humanas.” (SILVA et al., p.27, 2007). Por meio dessas experiências, em destaque as relacionadas às plantas medicinais, foi possível se aproximar da relação existente entre a pessoa humana e planta medicinal. Foi possível perceber

quais

os

valores

atribuídos,

quais

memórias

estão

relacionadas,

que

centralidade/papel tem em sua história, como são vistas… Nos trabalhos em campo nos quintais em Jaboticatubas-MG utilizei três ferramentas como forma de registro: diário de campo, gravações em áudio e fotografia. O diário de campo guarda o esforço de detalhar minhas reflexões sobre as vivências e práticas em campo, de forma que as impressões e breves análises pós-campo ali registradas serviram de parâmetro para o desenvolvimento do trabalho. Considerando o procedimento metodológico de história de vida, como técnica de coleta de dados, as gravações em áudio permitem que nada fosse perdido; ademais o processo de transcrição é um reencontro com a conversa, que possibilita novos olhares e novas análises. Ainda, como forma de registrar os momentos vividos, as fotografias tiveram o olhar voltado aos quintais e às pessoas que me acolheram. Como afirma Minayo (2012), essa forma de registro amplia o conhecimento do estudo, porque proporciona documentar momentos e situações que ilustram o cotidiano vivenciado. Para tanto, dada a metodologia do trabalho, não seria possível realiza-lo com todos os feirantes da Feira Agroecológica Raízes do Campo - são cerca de 16 barracas - devido ao tempo de realização da pesquisa e a distancia entre as comunidades. Dessa forma, para escolher as gentes da pesquisa optei por viver a feira, desenrolar e tecer conversas com os feirantes em uma manhã despreocupada. Três pessoas chamaram minha atenção durante a conversa e com elas decidi trabalhar. A primeira, Maria Lucia, ou como ela prefere Dona Maria, comercializa produtos feitos com plantas medicinais - como remédios, garrafadas, sabonetes medicinais – na feira, além de realizar atendimentos para indicar remédios naturais para o tratamento e cura de doença. A segunda, Dakini, comercializa derivados de leite e ovos. Atraiu-me na sua fala a questão da “volta às minhas origens”, na qual o contato com as plantas medicinais está presente. Por último, Luiza, ou melhor, seu pai Seu Lázaro. A escolha de trabalhar com o pai da feirante ao invés dela mesma se deu pelo fato de na fala da Luiza estar presente muita “descrença” no poder das plantas medicinais, mesmo que seu pai seja um curioso e utilizador destas. O trabalho é composto por três partes. Na primeira, Saberes que curam, converso com experiências que buscam desvelar a sentiência das plantas e entender o quintal como lugar. A


10

segunda, Entre as plantas do quintal, apresenta uma visão sobre Jaboticatubas e os quintais das gentes pesquisadas. Na ultima, Percepções e apontamentos: relação pessoa humana – planta medicinal, exploro as vivências para entender a relação existe as pessoas que fizeram parte dessa pesquisa e as plantas medicinais enraizadas em seus quintais.

1 – SABERES QUE CURAM A sensibilidade que existe em cada um, mesmo que escondida, intermedia nossa relação e visão com/de mundo. Na relação com os seres da flora, em especial com as medicinais, a sensibilidade humana permite que desfrutemos do poder que emana das plantas. Enraizadas nos quintais, as plantas medicinais se relacionam com os sujeitos onde há envolvimento emocional, no Lugar. “Onde estamos, é o nosso elo, é a ponte que nos conecta com o todo e com o outro.” (MORAES, 2015, p. 18). 1.1 - Cultivando a cura: as plantas medicinais Conhecido como Fitoterapia – do grego phuton (plantas) e therapeia (terapia)1 – o estudo de plantas medicinais proporciona o conhecimento e divulgação dos saberes relacionados ao uso das plantas nos processos de cura, alívio de sintomas e tratamento de doenças. De um lado, temos aqueles que valorizam esses saberes, de outro, aqueles que desacreditam que o uso de chás, xaropes e pomadas feitas com base nas plantas são eficientes no tratamento de doenças. Sobretudo, levando-se em consideração os avanços da medicina e da indústria farmacêutica, além das facilidades em adquirir remédios alopáticos nas farmácias, o uso e cultivo de plantas medicinais para o uso familiar têm perdido espaço (AMOROZO, 2002). Uma forma de valorizar esse saber está presente na legislação brasileira no Decreto Nº 5.813, de 22 de junho de 2006, que aprova a Política Nacional de Plantas Medicinais e Fitoterápicos. A política visa garantir à população brasileira o acesso seguro e o uso racional de plantas medicinais e fitoterápicos. Outros aspectos interessantes previstos pelo decreto, presentes nos objetivos específicos, são:

1

Disponível em: http://fitoterapia.com.br/. Acessado em: 23/11/2018


11

Ampliar as opções terapêuticas aos usuários, com garantia de acesso a plantas medicinais, fitoterápicos e serviços relacionados a fitoterapia, com segurança, eficácia e qualidade, na perspectiva da integralidade da atenção à saúde, considerando o conhecimento tradicional sobre plantas medicinais. [...] Promover o uso sustentável da biodiversidade e a repartição dos benefícios decorrentes do acesso aos recursos genéticos de plantas medicinais e ao conhecimento tradicional associado. (BRASIL, 2006, p. 21).

A meu ver, há valorização dos saberes tidos como tradicionais, pois sabemos que os maiores detentores de conhecimentos a isto relacionados são as comunidades tradicionais e povos indígenas. O Brasil é o país de maior biodiversidade do planeta que, associada a uma rica diversidade étnica e cultural que detém um valioso conhecimento tradicional associado ao uso de plantas medicinais [...]. (BRASIL, 2006, p. 9).

No entanto, “apesar das diretrizes políticas atuais, permanece a carência de investimento em pesquisas e ações que viabilizem a implantação nos municípios de ações, projetos e programas, pertinentes a sua viabilização.” (DE ALMEIDA, et. al. 2013, p. 32). Nesse sentido, estudos relacionados à etnobotânica - campo interdisciplinar que compreende o estudo e a interpretação do conhecimento, significação cultural, manejo e usos tradicionais dos elementos da flora (CABALLERO, 1979) – têm resgatado esses saberes tradicionais no Brasil. No entanto, não vou me deter a um estudo etnobotânico ou fitoterápico. Entendo que para compreender a relação entre a pessoa humana2 e a planta é preciso reconhecer as plantas como seres viventes, para mais, como seres sensíveis aos acontecimentos do mundo, que carregam o poder de cura. Nesse sentido, entendendo as plantas – não só as tidas como medicinais, mas todas as plantas - como sentientes, o livro “A vida secreta das plantas” (1986) traz experiências que buscaram conhecer e mostrar a sensibilidade e interação de mundo encontrada nas plantas. Dentre elas gostaria de destacar, para apresentar a sensibilidade que acredito existir nos seres da flora, a experiência realizada por Clave Backster (1986) A aventura começou em 1966. Backster passara a noite em sua escola para operadores de polígrafos, onde ensina a técnica de detecção de mentiras a policiais e agentes de segurança de todo mundo. Num impulso súbito, decidiu colocar os elétrodos de um dos seus detectores sobre uma folha da dracena. (TOMPKINS; BIRD, 1986, p. 19) 2

Termo usado em acordo com as ideias de Edith Stein, na qual a estrutura da pessoa humana compreende as dimensões corpórea, psíquica e espiritual. (Coelho Júnior, A.G. & Miguel, M. (2006). A relação pessoacomunidade na obra de Edith Stein. Memorandum, 11, 08-27.)


12

Com o uso do galvanômetro Backster notou alterações no gráfico ao ameaçar queimar uma folha da planta (dracena). Percebeu, ainda, que a planta diferenciava as ameaças reais das simuladas. Com a hipótese de que as plantas pensam, Backster realizou uma série de experiências para analisar o fenômeno. Assim, o pesquisador percebeu que “as plantas reagiam não só a ameaças concretas, mas também a ameaças em potencial, como o súbito aparecimento de um cachorro ou de uma pessoa que não lhes queria bem.” (TOMPKINS; BIRD, 1986, p. 22). Este último foi observado por Backster em uma visita de um fisiologista ao laboratório no qual as plantas apresentaram o que parecia ser um desmaio ou até fingindo a morte frente à ameaça (presença) dos que lhes maltratam. Além de ilustrar a percepção das plantas aos acontecimentos do entorno, outra série de experiências mostrou a Backster que “a despeito da distância, parece estabelece-se entre uma planta e a pessoa que dela cuida um vínculo de afinidade ou um tipo especial de comunhão.” (TOMPKINS; BIRD, 1986, p. 24). Relação essa tão forte que a planta é capaz de reagir às emoções vividas pelo seu cuidador durante seu dia. Outro curioso sobre o assunto, Marcel Vogel (TOMPKINS; BIRD, 1986), após conhecer as experiências feitas por Backster resolveu repeti-las com um grupo de alunos, sendo que apenas ele teve resultados parecidos com o pesquisador. Intrigado, com a ajuda de uma amiga, realizou a experiência de coletar folhas de uma árvore e alimentar algumas delas com energia positiva, ou seja, pensamentos positivos e de carinho, e deixar as outras de lado. A folha deixada de lado rapidamente secou, já as alimentadas com o pensamento seguiram verdes e com aparência saudável. Assim, Vogel passou a pesquisar sobre os efeitos dos pensamentos e emoções humanas sobre as plantas e a forma com a qual estas retribuem - relacionamento energético entre pessoa e planta. Sobre a pesquisa de Vogel descrita por Tompkins e Bird em “A vida secreta das plantas” (1986), gostaria de destacar a fala do pesquisador em uma audiência: Não há dúvida de que o homem pode se comunicar, e de fato se comunica, com os seres vegetais. As plantas são objetos vivos, sensitivos, enraizados no espaço. Podem ser cegas, surdas e mudas, do ponto de vista humano, mas estou absolutamente convencido de que são instrumentos de alta sensibilidade para medir as emoções do homem. As plantas irradiam forças energéticas que nos são benéficas e que podemos sentir. Elas se alimentam em nosso próprio campo de força, o qual, por seu turno, as reabastece de energia. (TOMPKINS; BIRD, 1986, p. 36)


13

Devo concordar com Vogel. Esses seres enraizados no espaço são dotados de um cuidar que vai além de substâncias químicas. São trocas energéticas baseadas no respeito e cumplicidade dos envolvidos. Que cura dará a planta a um cético de seus poderes? Para tanto, Moraes (2015) em seu trabalho “As mulheres e as plantas - uma ligação ritualística entre o feminino e o todo” disserta sobre a cura que envolve os sujeitos: O curar não vem apenas do simples colher e preparar. O que está no entorno destes atos são também elementos de cura. O tratar da planta, a licença do colher, a saudação ao seu elemento curativo e a sua vida. O modo e quando se colhe, a maneira certa de preparar, e toda a dança circular que envolve a curandeira, a planta, a química e o necessitado, são partes fundamentais dessa grande magia. Ao buscar sanar nossas feridas, também buscamos o abraço, a palavra, o aconchego. Nossas feridas mais profundas são curadas pelas palavras, pelo toque. Muitas vezes os remédios nos vêm apenas como um placebo, razão de todo o cuidado no qual fomos envolvidos. (MORAES, 2015, p. 27).

Ainda, ao falar de cura, gostaria de retomar uma vivência. No corredor no Instituto de Geociência da UFMG, certa vez ouvi uma frase vinda da porta da sala da pós-graduação em Geografia: “Essa sala tá tão triste, podíamos trazer uma planta pra cá”. No instante anotei. Como pode a simples existência de um ser vegetal no ambiente trazer alegria? Esta para mim é uma das comprovações das suspeitas de Vogel de que existe um relacionamento energético entre planta e pessoa humana. Há um potencial curativo na planta para além de suas substâncias, é pura energia que age sobre nós em forma de compartilhamento - entre o sujeito e o ser vegetal. Outra vivência cotidiana que me faz refletir sobre essa troca é a vida ou morte de plantas em determinados locais. Ou seja, já ouvi relatos sobre cultivos bem sucedidos de determinada espécie em um ambiente não adequado para seu desenvolvimento - falta de incidência solar, por exemplo. E, pelo contrário, de cultivo mal sucedido de uma espécie mesmo em condições propícias ao seu desenvolvimento. Será essa uma prova da importância do envolvimento pessoal e alimentação positiva à planta? A relação estabelecida entre o ser humano e planta pode determinar seu sucesso de desenvolvimento quando cultivada em jardins, hortas, plantações e quintais. Quando se trata da cura, a relação estabelecida entre pessoa humana e planta - curandeira(o) ou paciente - pode influenciar no processo, haja vista, o envolvimento ritualístico de cura (MORAES, 2015). Para mais das experiências ilustradas pelo livro “A vida secreta das plantas” (1986) e por tantos outros meios que tentam mostrar a sentiência das plantas, é preciso sentir. A interação


14

entre pessoa humana e planta está na alma. Está na alma dos que acreditam no seu poder de cura, no seu poder de fornecer boas energias e mais beleza a ambientes estéreis ou carregados, no seu poder de alimentar não só o corpo. E, em concordância com Vogel (1986), não há o que se provar cientificamente enquanto os sujeitos, “(...) que não se dão conta de que uma experimentação criativa requer que o experimentador se torne parte da própria experiência” (TOMPKINS; BIRD, 1986, p. 40), entendam “que a empatia entre planta e homem é a chave [...].” (TOMPKINS; BIRD, 1986, p. 40). Para entender o conceito de empatia recorro a Edith Stein (2004). A filósofa dedicou-se ao estudo da empatia como apoio para a compreensão da pessoa humana. Nesse sentido, “Stein se propõe a tratar minuciosamente de aspectos que dizem respeito à estrutura dos seres humanos e de suas vivências, valorizando o ‘“eu que vive e conhece”’ e os ‘“sujeitos alheios”’, que se estabelecem em relação ao mundo cotidiano da vida.” (GRZIBOWSKI; BAREA, 2015, p. 36). Dessa forma, estendo a relação estudada por Stein entre seres humanos, para seres humanos e plantas, uma vez que entendo o ser vegetal como ser vivente. Assim, “a empatia se dá na relação essencial entre o Eu e o Outro.” (GRZIBOWSKI; BAREA, 2015, p. 36). A vivência empática possibilita a percepção do Outro. E intuitivamente, o Eu, percebe o sentir do Outro, revive os atos e os sentimentos do Outro. “A empatia se dá como um ato de percepção que considera os fatores da percepção externa e interna numa relação não originária por seu conteúdo, mas que acontece originariamente em meu ser, me puxando para dentro da vivência do Outro, a tal ponto de viver a sua vivência como se fosse minha.” (GRZIBOWSKI; BAREA, 2015, p. 38). Nas palavras de Stein, “la experiencia a la que remite el saber sobre el vivenciar ajeno se llama empatía.” (STEIN, 2004, p. 36). Dessa forma, “o ato da empatia permite ao indivíduo reconhecer a alteridade, mas também adentrar na intimidade do Outro, através das vivências. [...] As vivências são diferentes para cada um, mesmo assim podemos compartilha-las através do ato da empatia.” (PALHARES, 2014, p.8). A empatia é sentir com o Outro. É abrir-se e permitir-se com o Outro. É vivência. Nos lares dos agricultores da Feira Agroecológica Raízes do Campo de Jaboticatubas - MG acredito encontrar uma relação empática entre ser humano e ser vegetal. O envolvimento dessas pessoas com seus locais de morada, seus quintais, proporciona potencialmente esta relação. É geograficidade (DARDEL, 2011) que se manifesta por meio da relação entre pessoa humana e ser vegetal.

A relação empática entre estes dois acontece pela


15

geograficidade, pela relação visceral do homem e a Terra. “Amor ao solo ou busca por novos ambientes, uma relação concreta liga o homem à Terra, uma geograficidade (géographicité) do homem como modo de sua existência e de seu destino.” (DARDEL, 2011, p. 1, 2). A geograficidade é a essência do ser-no-mundo, do ser no lugar. Nesse sentido, considero o quintal não apenas como um local, e sim como Lugar, lugar de envolvimento emocional que permite a interação homem-planta.

1.2 - Lá no quintal: o lugar

O quintal, para aqueles que circulam pelo meio rural, é o espaço dos saberes (ALMEIDA, 2016). São lugares onde as experiências, as práticas dos saberes e a vida acontecem. Sendo assim, muitas vezes ao tratar do lugar recorremos à memória. “A memória é a experiência vivida que o significa, definindo-o enquanto tal.” (MARANDOLA JR., 2012, p. 229). O lugar que se recupera na memória “parece mais conectado a uma tradição, a uma experiência profunda de entrelaçamento com a terra.” (MARANDOLA JR., 2012, p. 229). O quintal como lugar onde se reproduz conhecimentos sobre as plantas sejam plantas medicinais ou alimentares, é lugar de memória, de resgate. Logo, são nos quintais que acontece a interação entre os seres humanos e as plantas que cultivam. Neste trabalho busco entender, pela geograficidade, a relação que existe entre pessoa humana e plantas medicinais para compreender sobre sua preservação e perpetuação. Segundo Dardel (2011), o homem externa sua relação fundamental com a Terra – geograficidade – pelo ordenamento e manejo dos seus campos, rios, vinhas e através de seu gênero de vida e de seus lugares. Portanto, o quintal não é entendido aqui somente como um espaço situado próximo à casa de morada familiar, que abrange as laterais e os fundos da casa. O quintal é compreendido como Lugar, ou seja, espaço que “transforma-se em lugar à medida que o conhecemos melhor e o dotamos de valor.” (TUAN, 1983, p.6). Ao tratar dos aspectos do Lugar, Relph (2012) aborda os caminhos nos quais o lugar tem sido ou pode ser pensado. Um destes aspectos é o entendimento do lugar como raiz ou enraizamento, na qual “a partir da perspectiva da experiência cotidiana, lugar é muitas vezes entendido como onde se tem nossas raízes, o que sugere uma profunda associação e pertencimento” (RELPH, 2012, p. 24). Outro que gostaria de destacar é o de interioridade, que “refere-se à familiaridade, conhecendo lugar de dentro e fora, diferente de como faz o


16

turista ou um observador. Estar em casa é, para muitas pessoas, a forma mais intensa de interioridade.” (RELPH, 2012, p. 24). Estes dois aspectos estão relacionados ao entendimento de quintal como lugar. Nesse trabalho, lugar “onde ocorre a ‘fundação’ de nossa existência terrestre e de nossa condição humana. Podemos mudar de lugar, nos desalojarmos, mas ainda é a procura de um lugar; nos é necessária uma base para assentar o Ser e realizar nossas possiblidades, um aqui de onde se descobre o mundo, um lá para onde nós iremos.” (DARDEL, 2011, p. 41)

Nesse sentido, o quintal como lugar faz parte da experiência cotidiana, que o dota de valor, de significados. Tuan (1983) em “Espaço e Lugar: a perspectiva da experiência” relata um fato de uma moça da zona rural de Illinois que ao sair em lua de mel para Califórnia relata como tudo parecia irreal. E o real é sua casa, seu lugar. “O real são os fazeres diários, é como respirar. O real envolve todo nosso ser, todos nossos sentidos.” (TUAN, 1983, p.161). O quintal, sendo uma extensão da casa, faz parte da vida cotidiana que envolve nossos sentidos. “A casa como lugar e a vida cotidiana são realidades que constroem o vivido e o percebido. [...] Os acontecimentos simples podem, com o tempo, se transformar em um sentimento profundo pelo lugar.” (ALMEIDA, 2016, p.147). Assim, o valor do lugar depende da relação íntima humana com o ambiente. Nesse sentido “na ausência da pessoa certa, as coisas e os lugares rapidamente perdem significado.” (TUAN, 1983, p. 155). Assim, entendo que as plantas representam para as pessoas que as cultivam, que as guardam, que as usam no tratamento de males parte da significação do lugar. A interação existente entre eles atribui valor ao lugar, valores familiares, ancestrais, tradicionais, comunitários, emocionais e sensitivos. Em um dos relatos de “Espaço e Lugar: a perspectiva da experiência” , Tuan (1983) aborda sobre a sociedade do homem primitivo que tinha como lugar central – sede – o espaço no qual os feridos eram tratados. “Os seres humanos são os únicos entre os primatas que têm o sentido de lar como um lugar onde o doente e o ferido podem se recuperar com cuidados solícitos.” (TUAN, 1983, p. 153). Entre os macacos e símios a proteção está no bando. Logo todos devem andar com o bando em suas caminhadas diárias ou serão abandonados, mesmo quando feridos. “Lugar é uma pausa no movimento. [...] A pausa permite que uma localidade se torne um centro de reconhecido valor.” (TUAN, 1983, p. 153). Os primatas, diferentemente do homem, não fazem uma pausa para cuidar de um membro ferido ou doente. “Os homens o


17

fazem, e este fato contribui para a intensidade de um sentimento de lugar. [...] A afeição duradoura pelo lar é em parte o resultado de experiências íntimas e aconchegantes.” (TUAN, 1983, p. 153). Dessa forma, retomo Moraes (2015) quando comenta sobre a cura que envolve mais que somente o ato de colher e preparar. O lugar onde ocorre o tratamento e cura de males – o quintal – proporciona experiências íntimas e aconchegantes que o dotam de valor. Experiências estas permeadas pela presença vivente das plantas. Sobre o lugar é preciso dizer ainda que, ele “pode adquirir significado para o adulto através do contínuo acréscimo de sentimento ao longo dos anos.” (TUAN, 1983, p. 37). Nesse sentido, pode ser um processo que aparece no lidar com a terra, no cultivar, na luta pela terra, nas práticas familiares de cultivo e beneficiamento da produção, ou seja, na geograficidade que está presente entre os agricultores da Amanu - Educação, Ecologia e Solidariedade.

2 - ENTRE AS PLANTAS DO QUINTAL Onde estão as plantas? Enraizadas nos quintais de Jaboticatubas-MG, as plantas medicinais fazem parte da vida das pessoas humanas que permitiram a construção desse trabalho. Nesse capítulo, apresento Jaboticatubas-MG e o trabalho da associação Amanu - Educação, Ecologia e Solidariedade. Ainda, exploro alguns pontos da história de vida de cada pessoa humana pesquisada - D. Maria, Dakini e S. Lázaro – tendo as plantas medicinais como centralidade.

2.1 – De Jabó aos quintais Localizada na franja metropolitana de Belo Horizonte, aproximadamente 60 km da capital, o município de Jaboticatubas - Jabó para os íntimos - compõe um mosaico de geografias. Uma das peças desse mosaico é o Parque Nacional da Serra do Cipó, Unidade de Conservação de Proteção Integral. Abriga cerca de 65% da sua totalidade no território municipal3. Há também o crescimento da mancha urbana e, principalmente, dos condomínios horizontais. Outra parte 3

De acordo com a Prefeitura Municipal de Jaboticatubas. Disponível em: <http://www.jaboticatubas.mg.gov.br/jaboticatubas.mg.gov.br/index.php?option=com_content&view=article&id =40&Itemid=119> Acesso em: 24 out. 2014.


18

desse mosaico são as comunidades rurais tradicionais presentes no município que compõem a paisagem local, expressam uma ruralidade e preservam traços da regionalidade mineira. A paisagem rural de Jaboticatubas tem sua base natural sustentada pelo Cerrado. Isto proporciona a alguns agricultores coletar produtos como o coco macaúba e o jatobá para produzir quitandas artesanais. Além disso, os demais materiais provenientes desse extrativismo - as folhas do coco macaúba - por exemplo, são usados para outros produtos fabricados artesanalmente, como a vassoura. Assim, o saber fazer das gentes rurais concede a Jaboticatubas a condição de detentora de bens imateriais que lhe proporcionam uma identidade cultural própria ligada a suas ruralidades. As ruralidades estão vinculadas à dimensão cultural/identitária da pessoa ou do grupo. “O apego à terra, às atividades agropecuárias, o modo de vida rural, o vínculo com as plantas e animais, o jeito de falar, o orgulho por ser do campo, entre outros fatores, corresponderiam a territorialidades da população rural, e, portanto, a ruralidades.”(CANDIOTTO; CORRÊA, 2008, p. 238) As ruralidades estão concretizadas no espaço por meio de objetos e ações – do simbólico - entendidos pela sociedade como característicos do rural. Por conseguinte, observa-se que a imagem do rural tem atraído o olhar do urbano para as paisagens rurais, (...) o contato com a natureza é, então, realçado por um sistema de valores alternativos, neoruralista e antiprodutivista. O ar puro, a simplicidade da vida e a natureza são vistos como elementos “purificadores” do corpo e do espírito poluídos pela sociedade industrial. O campo passa a ser reconhecido como espaço de lazer ou mesmo como opção de residência. (CARNEIRO, 1998, p. 57).

Jaboticatubas é um município apreciado e procurado pelos citadinos como opção para um estilo de vida próximo à natureza. Com o crescimento das metrópoles associado aos caos urbano (cidades densamente povoadas, violência, poluição etc.) o rural passa por um processo de (re)valorização, no qual os citadinos estão à procura de uma melhor qualidade de vida O crescimento urbano e dos condomínios horizontais em Jaboticatubas são um exemplo da pressão exercida pelo urbano no rural, do transbordamento do urbano no rural. A apropriação da sociedade urbana no rural pode representar um risco de perda de identidade do lugar, em sua singularidade e especificidade, consumindo bens simbólicos e materiais e práticas culturais rurais. “A apropriação do rural incorpora novos valores, técnicas e hábitos no local, criando assim, identidades configuradas em ruralidade.” (PALHARES; PINHO, 2007, p.8).


19

No entanto, essa aproximação dos bens culturais e naturais rurais pela sociedade urbana não necessariamente significa uma destruição da cultura local. Essa interação rural-urbano pode resultar no reforço dos vínculos com a localidade e a manutenção da identidade. “Ao invés de diluir as diferenças, pode propiciar o reforço de identidades apoiadas no pertencimento a uma localidade.” (CARNEIRO, 1998, p. 58). Frente à possibilidade de desaparecimento dos aspectos culturais locais pelas forças dos agentes sociais nesse mosaico geográfico, a associação Amanu – Educação, Ecologia e Solidariedade realiza projetos visando maior valorização da cultura local, desenvolvimento rural sustentável e melhor qualidade de vida para os agricultores locais. A Amanu é uma associação civil sem fins lucrativos, e tem como objetivo desenvolver ações populares locais que sejam vinculadas a uma sociedade mais justa e ecológica, no município de Jaboticatubas-MG. Seus princípios abrangem a utilização da sabedoria popular dos agricultores familiares, as práticas agroecológicas na produção rural e a economia popular solidária. (LARA, 2017). Nesta perspectiva, a Feira Agroecológica Raízes do Campo, é uma ação desenvolvida pela Amanu, elaborada de forma coletiva com os agricultores das comunidades rurais de Jaboticatubas, que se posiciona como movimento de resistência (à modernização homogeneizante - à homogeneização cultural que a globalização vigente exerce), tanto no que se refere à preservação da cultura e identidade local quanto à reorganização de antigas práticas de produção para a sobrevivência e permanência do agricultor/feirante no seu ambiente de origem. (LARA, 2018, p.13).

O projeto da feira nasceu a partir das turmas de Alfabetização de Jovens e Adultos do Projeto MOVA-Brasil (Movimento de Alfabetização de Jovens e Adultos), que funcionaram em Jaboticatubas pela coordenação da associação. Tinham como proposta apoiar a agricultura familiar das comunidades locais e valorizar a cultura local. No biênio 2012-2013, os alunos e professores desenvolveram o projeto “Nessa Terra Tudo Dá”, resultando em um diagnóstico das necessidades dos agricultores envolvendo a produção e a comercialização de seus produtos. Hoje, fruto desse projeto, a feira acontece na Praça Nossa Senhora da Conceição, no centro da cidade, nos segundos e quartos sábados do mês. Funciona não apenas para comercialização


20

dos produtos, mas também como espaço de troca de vivências. Com as mercadorias são divididas histórias e saberes das culturas tradicionais presentes nas práticas das comunidades rurais, “despertando nos envolvidos uma identidade cultural referente ao lugar derivada das relações ali vivenciadas.” (LARA, 2018, p.7). Nesse sentido, os saberes, as receitas e os produtos das gentes rurais do município de Jaboticatubas estão impregnados da relação que estabelecem com o lugar em que vivem, suas vivências e experiências com a terra, expressões da geograficidade. (DARDEL, 2011). Então, optei por explorar a vivência com cada pessoa humana que possibilitou a realização desse trabalho, D. Maria, Dakini e S. Lázaro. Todos os três apresentaram diferentes formas de ver e interagir com a terra e com as plantas medicinais. Descrever um pouco a história de cada um deles, a partir da vivência que tive com cada um deles, será suporte para as considerações e percepções sobre a relação que existe entre cada pessoa humana pesquisada e as plantas medicinais.

2.2 – Sua história, seu quintal, suas plantas Maria Lúcia Maria Lúcia, ou Dona Maria como ela prefere ser chamada, é uma jovem senhora sabida. Mora com seu companheiro, Seu Tião, na comunidade do Barreiro em Jaboticatubas. Tive a felicidade de passar um final de semana na casa deles. O quintal não é muito grande, mas é um oásis para quem gosta de planta (Figura 1). Cheguei para o almoço de sábado e logo iniciamos a prosa. Dona Maria se apaixonou pelas plantas medicinais desde a infância, lá nas proximidades de Marilac-MG. Parte de seu conhecimento atual vem da bisavó (índia), que passou para a avó, que passou para a mãe, que passou para ela. Quando nova, D. Maria vivia atrás de sua mãe curiosa sobre os tratamentos (nome dado por ela aos tratamentos envolvendo plantas medicinais/ tratamento naturais). Disse ter apanhado muito por causa dessa curiosidade, a mãe ficava brava dela atrás o tempo todo – “vai aprender quando tiver idade”. Sempre que a mãe e a avó se reuniam para falar sobre as plantas, sobre como fazer os chás, como colher as


21

ervas4, D. Maria ficava a espreita ouvindo. Quando ela foi ficando mais crescida, continuou acompanhando. Então, a mãe começou a ensinar as “coisas”, o nome das plantas, como fracionar, os chás... A avó era uma referência para os cuidados com a família, era sempre chamada quando alguém adoecia. Assim, na roça quando se machucava era com as plantas que a família tratava.

Figura 1 – Um olhar sobre o quintal de Maria Lucia.

Fonte: Luiza Dias. 16/09/18. Atualmente, D. Maria é a referência. Alguns irmãos, com quem ainda tem contato, se aconselham com ela sobre os tratamentos medicinais. Ela é referência também para os conhecidos de Ilha Solteira-SP, para onde pretende se mudar assim que puder. (Ela e S.Tião compraram um terreno no município, próximo a um filho de D.Maria que mora lá. Estão “arrumando” a mudança já há um tempo – mais de um ano – aguardando a compra do terreno deles em Jabó). É referência também na Feira Agroecológica Raízes do Campo onde muitos 4

A palavras “ervas” ou “ervas medicinais” é usada no presente trabalho como sinônimo de plantas medicinais.


22

vão

comprar

remédios

naturais

(pomada,

mel

com

tintura,

sabonete

etc.)

e

consultar/aconselhar sobre os tratamentos naturais para algumas doenças. Além dos conhecimentos adquiridos com a família, D. Maria procurou aprender mais em um curso de medicinas naturais no interior de São Paulo. E como ela mesma diz, a paixão foi só aumentando. Mesmo tendo trabalhado com artesanato (joia, calçado, chinelo etc.) é na roça e nas plantas que D. Maria se sente em casa. “E até hoje se mandar eu escolher, cidade, ou alguma outra coisa para eu mover, eu desisto, eu prefiro continuar movendo o que eu tô movimentando ate hoje”, os cuidados com as plantas, o cuidar com as plantas. Nas falas de D. Maria percebe-se muito orgulho e entusiasmo quando se trata do cuidar com as medicinas naturais. Ela se vangloria dos sucessos no tratamento com plantas medicinais, “o umbigo do meu menino foi curado com coisa natural, não foi coisa de médico nem nada”. Tem orgulho dos saberes dela e de todas as pessoas que ajudou. Ela costuma dizer que hoje as pessoas estão “desenganadas com médico”, ou seja, não está mais adiantando os tratamentos convencionais ou o médico atestou que não há mais solução. Assim, muitos vêm procura-la após ter tentado tratamentos convencionais em hospitais. D. Maria e Seu Tião têm muito cuidado com seu quintal, plantas e bichos. Se pudessem colocavam a casa toda em um caminhão e levavam para Ilha Solteira-SP. Mesmo com a vontade da mudança senti na conversa com eles um apego muito grande ao lugar de morada. Apego não só pelo quintal, pela propriedade conquistada, mas também pelo cerrado... Pelo córrego... Pelo rural... Senti uma conexão com o rural, o amor por cultivar a terra e estar junto a ela, e uma certa aversão a morar na cidade. Para D. Maria, seu quintal extravasa as cercas. É quintal-casa e quintal-mata (ARAUJO; PALHARES; 2018). O quintal-casa relaciona-se aos limites da casa, do quintal “convencional”, que abrangem a horta, o pomar e o galinheiro. Percebo no quintal-casa de D. Maria o quintal como lugar, com elos físicos e emocionais. Mas não se restringe nem se perde pela relação com o cerrado. Maria Lucia caminha e vasculha o cerrado que abraça sua casa à procura de plantas medicinais típicas. Nessas andanças já sabe exatamente onde tem o que precisa. O córrego atrás de sua casa também é lugar de colher as ervas medicinais. Como ela mesma diz, as plantas de beira d’água são melhores. Assim, o quintal extrapola as cercas da casa - é quintal-mata. Todas as plantas colhidas vão para um quartinho especial da casa; depois são secas e embaladas. O cheiro do quarto é de se embriagar. Uma união de aromas das diversas plantas medicinais ali armazenadas. As garrafas, óleos, pomadas, própolis e méis preparados por ela


23

também são guardados ali. À medida que ia me mostrando a casa, as plantas e no passeio pelo córrego, D. Maria me contava sobre os usos medicinais das plantas que tinha, histórias de pacientes que teve, de cuidados que fez a si e ao companheiro, e o mais importante, a forma certa de tirar a planta para preserva-la. O respeito que ela tem com as plantas medicinais, “porque ela é vida”, está na fala, no colher, no manusear e na responsabilidade que tem ao indicar. É preciso ter certeza do que a pessoa tem para se indicar um remédio. Lembra-me a todo o momento D. Maria. O médico serve para os exames, para diagnosticar. Então ela trata, cuida e cura com as plantas medicinais. É a chamada Raizeira. Os chás são indicados com dosagem e número de dias. Os produtos que ela mesma faz são sempre sua preferência, por ter certeza da quantidade que colocou de cada elemento, evitando, assim possíveis intoxicações. O cuidado e zelo pelo outro estão presente o tempo todo. Dona Maria me explicou sobre a hora certa de colher as plantas para não fragilizar tanto ela (pela manhã ou no entardecer), e também qual a melhor parte para se retirar (galhos menores, casca dos galhos, etc.). Infelizmente Dona Maria perdeu seu diploma do curso de plantas medicinais em um incêndio em sua casa anos atrás. Tudo está guardado na cabeça, na memória. Ela e Seu Tião já deram cursos de vivência em seu quintal – quintal-casa e quintal-mata – com estudantes de Viçosa e outros elaborados pela Amanu. Estão sempre dispostos a compartilhar os conhecimentos e dizer da importância disso.

Dakini Dakini é uma mulher de meia idade que vive com a irmã em uma fazenda próximo a entrada de Jaboticatubas-MG. A independência e a união das duas me encantou. Dakini administra a fazenda leiteira Mato de Nossa Senhora. O leite produzido serve para fazeção de mozarela, requeijão, queijo fresco e para venda de leite in natura. Ela comercializa na feira os produtos derivados do leite produzidos por ela na fazenda. Nascida em Medina-MG, mudou-se para Belo Horizonte na juventude para estudar. Cansada da cidade, Jaboticatubas foi um refúgio e uma possibilidade de se reconectar com suas origens – o rural. As plantas medicinais sempre foram a forma como se tratava as doenças dos familiares. Dakini aprendeu muito do que sabe com a avó, descendente de índia e raízeira, referência para familiares e conhecidos. Já em Jaboticatubas, Dakini teve a oportunidade de


24

fazer um curso de homeopatia. O interesse no curso veio como forma de resgate de uma tradição familiar de conhecimentos sobre as plantas medicinais, e acréscimo de novos saberes em busca de tratamentos mais naturais – “menos alopatia e mais homeopatia”. (Figura 2). Figura 2 – Plantas medicinais em meio a horta de Dakini.

Fonte: Luiza Dias. 05/08/18. Quando mudou-se para Belo Horizonte foi morar com uma tia, que ainda preservava alguns conhecimentos, mas tinha poucas ervas plantadas efetivamente. Utilizavam-se do Mercado Central como fornecedor para alguns “chás” que precisavam. Dakini fala muito sobre o “caos” urbano e como gosta do ritmo de morar na roça (onde sinto ser seu lugar), mesmo tendo muito trabalho na fazenda, a proximidade com a casa – no rural – dá uma tranquilidade, permite um descanso e traz uma leveza, como ela mesma diz. Na fazenda, Dakini e a irmã cuidam da horta e do galinheiro. As plantas medicinais mais utilizadas por elas estão plantadas na horta. Como o terreno que abrange a fazenda é muito grande os fragmentos de cerrado nativo em meio ao pasto guardam muitas plantas medicinais conhecidas e utilizadas pelos trabalhadores da fazenda e por elas. Dakini “troca muitas


25

figurinhas” sobre plantas medicinais com os trabalhadores da fazenda. Sempre que precisam de alguma erva do mato eles já sabem onde achar – benefícios do trabalho de “bater pasto”. Entendo que a dimensão da fazenda abrange o quintal-casa e o quintal-mato. Na propriedade encontram-se os dois. O quintal-casa é aquele mais próximo à morada das irmãs. E o quintalmato o cerrado e pasto que compõem a fazenda. Dakini em si não explora muito o quintalmata, mas se utiliza das plantas vindas dele. Muitos frequentadores e moradores dos condomínios horizontais de Jabó que a conhecem pedem plantas para chás quando precisam. Então, mesmo não tendo conhecimento profundo, Dakini ensina e indica tratamentos com o uso das plantas e de outros métodos conhecidos por ela – uso de urina para tratamento de conjuntivite, por exemplo – para pessoas próximas. Na minha primeira ida à casa dela fizemos um passeio pelo quintal. Foram me apresentadas todas suas plantas medicinais, histórias e usos atribuídos. A irmã é a principal cuidadora dos bichos e Dakini se interessa mais pelas plantas. A vontade de morar na roça, de voltar às suas origens, move o trabalho de Dakini. Impossibilitada de construir no pequeno terreno que comprou em Jabó, o convite para trabalhar e morar na fazenda foi uma oportunidade de iniciar esse resgate das origens, que já acontece há mais de 10 anos. Quando se mudou para Belo Horizonte, sua intenção era retornar para Medina-MG. A necessidade de trabalhar e a mudança de muitos parentes para a capital impossibilitou esse retorno. Então, Jaboticatubas foi um achado. Ainda, a Amanu é hoje uma paixão, um casamento como ela mesma diz. Dakini faz parte da equipe técnica da Amanu e já não se imagina não trabalhando e contribuindo com a associação. Seu Lázaro Aproximar-me de Seu Lázaro, e sua esposa Dona Zeni, foi uma conquista. Todos os combinados anteriores ao campo em seu quintal ocorreram com a filha Luiza, feirante da Raízes do Campo. Logo, inicialmente, foi muito distante nossa interação, embora eu tenha sido muito bem acolhida. Com seus 71 anos, Seu Lázaro tem uma aparência muito envelhecida, mas guarda a certeza que não se pode parar – “o velho não pode parar não, se ele parar, acabou. Atrofia, sabe”. Já trabalhou na roça e com carvão. Atualmente, cuida de “uma roçinha pequena”.


26

Minha caminhada pelo quintal – na comunidade de Taquaraçu de Baixo – ficou um pouco restrita pela chuva forte no dia do campo. (Figura 3). Da varanda da casa era possível ver a pequena horta. Dona Zeni é a responsável pelos cuidados com as plantas na horta. Quando perguntei sobre o uso de plantas medicinais ela disse não se interessar muito, que é mais “coisa do Lázaro”, mas cultiva algumas, como poejo, melissa, hortelã... Ela comumente faz chá de melissa para o neto ficar mais calmo. Seu Lázaro é curioso sobre plantas medicinais. Nas minhas perguntações entendi que os conhecimentos vieram da família, de conhecidos e de um livro antigo “AaZ de plantas” – que infelizmente pegou fogo em um incêndio na antiga casa. Embora conheça as formas de preparo em chá ou por maceração, as plantas medicinais são consumidas por Seu Lázaro, principalmente, em forma de tintura – na pinga. Tudo quanto é planta que ele ganha ou colhe é curada na cachaça por dois dias e então consumida, às vezes sem precisão, mas de forma preventiva talvez, ou como um placebo. Figura 3 – Conversa com Seu Lázaro na sala de sua casa.

Fonte: David Milan. 04/08/18


27

Na hora de indicar, muita responsabilida. Enfatiza a necessidade de saber exatamente o que a pessoa tem – assim como Dona Maria. Seu Lázaro é uma referência para seus conhecidos, mas diz que gosta mesmo é de usar nele próprio. De médico, diz querer distância; e o único problema de saúde que tem é a diabetes. Com 36 hectares, o quintal de Seu Lárazo é expressivo. São poucas as plantas medicinais cultivadas por ele. No quintal-casa, próximo à casa de morada da família, a maior parte das plantas medicinais utilizadas nasceu por conta própria. Os demais são buscados por ele mato a fora – quintal-mata. O cerrado que abraça sua casa é local de colheita das ervas, mas também extrapola-se a cerca para pegar alguma planta de que necessita. Seu Lázaro demonstra muito zelo pelo colher a planta medicinal na mata. Deve-se saber colher para preservar a vida e desenvolvimento da planta. Seu Lázaro disse que alguns remédios estão até difíceis de encontrar, mesmo nos lugares que ela já conhecia, por causa da forma errada de se tirar, que acaba matando a planta. Diferentemente do Seu Lázaro, os filhos não foram criados consumindo majoritariamente ervas medicinais como forma de tratamento. Nenhum deles demonstra interesse no conhecimento sobre as plantas medicinais. Embora Raquel, filha do casal, demonstra muitos conhecimentos adquiridos com o pai, que provavelmente serão preservados. Nas falas de Raquel, e de Luiza também, nota-se certo desdém pelas plantas medicinais, como se não funcionassem. Mas o problema de garganta inflamada do filho de Raquel está sendo controlado pelo chá de romã, pois o médico disse que não era correto tomar tanto antibiótico seguido – desde o início do uso do chá de romã não teve mais necessidade do antibiótico. Raquel e Rafael, outro filho do casal presente no dia, ficaram rindo das memórias que vinham em meio a nossa conversa. Quando crianças era preparado para eles um xarope feito com leite e casca de jatobá – “diz que é bom pra tosse” – depois de adoçado era gostoso de tomar. Então mesmo sem estar doentes eles queriam tomar o “quik” – Raquel disse que parecia quik5 devido à casca do jatobá que possui uma coloração avermelhada. Meu retorno à casa de Seu Lázaro e Dona Zeni para conhecer melhor o quintal e conversar mais sobre suas histórias e as plantas medicinais ficou impossibilitado pelo adoecimento do Seu Lázaro – pneumonia.

5

Composto feito de morango para se misturar no leite.


28

3- PERCEPÇÕES E APONTAMENTOS: relação pessoa humana – planta medicinal Uma das lembranças mais caras de uma velha dama amiga minha, recentemente falecida, era de quando visitava, há cerca de sessenta anos, uma grande casa de campo onde encontrava várias das pessoas mais eminentes daquele tempo, e o anfitrião, já idoso, chefe de uma família antiga e ilustre, demonstrava reverente afeição pelas suas velhas árvores. Seu maior prazer era sentar-se ao ar livre ao entardecer, tendo diante dos olhos as grandes e velhas árvores de seu parque; antes de se recolher ele fazia uma caminhada para cumprimentá-las uma a uma, e descansando a mão na casca lhes sussurrava boa-noite. Estava envelhecido, confidenciou à sua jovem hóspede, que sempre o acompanhava nesses passeios de fim de dia, de que elas tinham almas inteligentes e conheciam e encorajavam sua devoção. W.H. Hudson, Far away and long ago [Longe daqui, há muito tempo, 1918]; Everyman’s Libraly, 1939, p.202.

É aos poucos que percebemos as entrelinhas presentes em cada um... Cada segundo que estive com cada pessoa humana pesquisada foi aproveitado para as entrelinhas desse trabalho. As relações que estabelecemos com o mundo vivido não são sempre claras e definidas. Se não pararmos para percebê-las dificilmente saberemos onde se conectam. D. Maria, Dakini e Seu Lázaro apresentam diferentes formas de se conectar com a terra, com a natureza, com as plantas medicinais. A artista plástica australiana Janet Laurence explora noções de arte, ciência, imaginação, memória e perda. A prática de Janet Laurence examina nossas relações físicas, culturais e conflitantes com o mundo natural por meio de obras específicas de cada local, galeria e museu. Trabalhando em diversos meios, Laurence cria ambientes imersivos que navegam pelas interconexões entre o mundo da vida. Seu trabalho explora o que pode significar curar, ainda que metaforicamente. O ambiente natural funde esse sentimento de perda comunal com uma busca de conexão com poderosas forças vitais. O trabalho de Laurence nos alerta para as sutis dependências entre água, vida, cultura e natureza em nosso ecossistema. Em face disso, nós ansiamos por uma forma de alquimia, pelo poder de


29

encantamento e transformação. Seu trabalho nos lembra que a arte pode provocar o público em uma consciência renovada sobre o meio ambiente.6

Em uma vista recente ao Brasil , durante o quarto Seminário Internacional de Educação do Inhotim, Janet realizou uma oficina - Workshop Elixir – com os jovens participantes dos projetos Jovens Agentes Ambientais, Jovens Agentes, Laboratório Inhotim e Encontro Marcado. Como é a nossa relação com as plantas, sobretudo, as medicinais? Como uma experiência multissensorial pode mudar nossa relação com a natureza? A residência educativa promovida por Janet no Workshop Elixir foi ao encontro dessas questões. Em entrevista ao programa Terra de Minas da TV Globo7 Janet falou sobre como sempre quis trazer as pessoas para dentro de um mundo natural, isso porque não costumamos pensar sobre a experiência direta que temos com as plantas. A ideia dela é criarmos uma relação intima com as plantas para cuidarmos mais da natureza à medida que estreitamos essa relação. A relação que estabelecemos com a natureza nos conecta a ela. Uma vez que entendemos as plantas como seres sentientes, enraizados no espaço e pertencentes ao lugar de vida da pessoa humana, entendemos também o compartilhamento de vivências, do espaço vivido, que acontece entre estes. A empatia então seria a chave para entender a relação que existe entre ser humano e ser vegetal? Por mais ricas que foram as minhas vivências com Dona Maria, Dakini e Seu Lazáro, não sou capaz de afirmar qual a fonte dessa relação. Mas, pude perceber pelas conversas e histórias a latência que permite a forte ligação, que sim existe, entre essas pessoas e suas plantas; entre essas pessoas e seus lugares de vida. Nascidos na roça, a lida com a terra esteve presente na construção de quem são hoje. E todos os três demonstram, por ações ou falas, o encanto e proximidade com a terra, com o rural. Nesse capitulo, o caminho é explorar a vivência que tive para construir apontamentos sobre a relação íntima existente entre a pessoa humana e as plantas medicinais. Primeiro, é preciso clarear a mais pura crença dessas pessoas aos benefícios das plantas medicinais. A planta é sim a primeira opção. Os saberem acumulados pela experiência direta com as plantas e pela tradição familiar vinda da oralidade são a base para os cuidados. Mesmo

6

[tradução própria]. Apresentação/biografia de Janet Laurence. Disponível em: http://www.janetlaurence.com/biography/. Acessado em: 10 nov. 2018. 7 Programa exibido no dia 3 nov. 18. Disponível em: https://globoplay.globo.com/v/7132163/. Acessado em: 10 nov. 2018.


30

em suas singularidades, em suas diferentes formas de tratar as plantas, os envolvidos demonstram o cuidado ao se relacionar E.. igual cê ta falando né, a minha mãe, meus avós, meus bisavós, tudo, sempre falava: quando cês tive gente, que cuidar da sua saúde, cuida da sua saúde, mas cuida da planta também. Não pega não... Minha mãe me ensinou eu a colher as plantas, não judiar das plantas, conversar com a planta, pedir licença pras plantas, com muita educação, e.. só dá a planta... se era noite, boa noite, se era boa noite... tem o jeitinho de falar... que as vezes tem uma planta que tem os horários de pegar né? Se é boa tarde... Então minha mãe me ensinou isso tudo. Se é um cálice, se só tem um cálice que lá vai direto e mais galho nenhum, não toca! Não toca! Espera quando ela tiver a disposição de você pegar. Às vezes é uma altura que cê não aguenta. Cê vai querer cortar o cálice. Não. (Dona Maria) Aí é... minha mãe me ensinou, se você vai tirar uma casca, não tira. Não toca, não tira não! Da madeira não. Se cê alcança a galha, tira numa galha. Ali cê tira aquela galinha, pedindo licença ainda, com educação, que ela é vida! (Dona Maria) Ele ranca a casca do pé de mangaba de um jeito que a mangaba morre. Num é assim! (Seu Lázaro) Num é assim que tira, cê que ver! Cê chega e tira uma galha dela, por conta de que, aquela galha não vai fazer falta, ele vai brotar. Agora chega e ranca tudo, casca, o pau, até nas ponta lá em cima, e a mangaba morre. É igual a mama de cadela, um remédio igual aquele tinha que preservar ele o máximo que pudesse, você vai e tira uma raiz, mas deixa um pedaço , um pedacinho assim ele brota de novo. (Seu Lázaro) A muda tá ali, tô aguando para depois plantar. Bom plantar quando chove, como ela tá pegadinha, não justifica o sol rachando de quente eu enfiar ela na terra, ela sente né. (Dakini)

Considerando que os quintais desses sujeitos extrapolam cercas e se adentra pelo cerrado típico da região, sua praticas apontam para uma relação homem/natureza que promove conservação. “Mais do que repressão [do uso dos recurso naturais], o mundo moderno necessita de exemplos de relações mais adequadas entre homem e natureza.” (DIEGUES, 1996, p.97). A forma como essas pessoas se relacionam com as plantas, como manuseiam, demonstra como o saber tradicional está aliado à conservação das espécies da fauna. Como apontam trabalhos de etnobotânica as pessoas afetam a estrutura de comunidades vegetais e paisagens, a evolução de espécies individuais, a biologia de determinadas populações de plantas de interesse, não apenas sob aspectos negativos como comumente se credita à intervenção humana, mas beneficiando e promovendo os recursos manejados. (ALBUQUERQUE; ANDRADE; 2002, p. 275).


31

Percebe-se que há um cuidado com o ser vegetal que permeia o respeito. Como diz dona Maria “Tudo quer respeito!”, com a planta medicinal não é diferente cê ta tirando de uma vida pra cuidar de outra vida. (Dona Maria).

Entendo que o respeito está presente, também, no cuidar do outro. Principalmente, na responsabilidade em cuidar do outro, em compartilhar o conhecimento e acolher o necessitado. Mais presente na fala de Maria Lúcia e de Lázaro, receitar o tratamento com plantas medicinais deve ser cuidadoso. Tem que consultar pra saber, aqui eu sempre falo eu não trato no escuro. Eu trato pra mim saber como é que eu tenho que entrar com o remédio na pessoa, se aquele remédio vai fazer bem para a pessoa, se a pessoa tem alergia aquele remédio, tem tratador ai que, num sabe saber se você tem alergia do produto. (Dona Maria) Se quiser, faz o diagnostico, me procura eu tô pronta pra tratar. Mas sabendo como que eu vou tratar. Porque você vai no médico, e fala “a D.Maria eu quero tratar natural, e a senhora trata e tal”. Tá tudo bem “você fez o diagnostico?”, fiz ou não fez, então faz depois eu trato. (Dona Maria) É, porque deixa eu te falar, as vezes você arruma um remédio pra uma pessoa, mas a gente tem que saber o que que a pessoa tem. (Seu Lázaro). Agora tem doença que você não sabe o que que a pessoa tem. Quando a pessoa sabe o que que tem, ai a gente sabe mais ou menos, a gente que conhece o remédio. (Seu Lázaro)

Quando se convive com essas pessoas o ouvido atento proporciona o aprendizado. Nas histórias contatas dos tratamentos bem sucedidos, um amontoado de plantas e suas funções são compartilhadas. No passeio pelo quintal são apresentadas as particularidades e como identificar cada planta. Percebi que para aprender é preciso viver e conviver com as plantas e pessoas. O gosto por compartilhar o conhecimento sobre as funções e usos de cada planta vem acompanhado do compartilhar a admiração. A lida dessas pessoas com a planta medicinal, para além dos estudos científicos, demonstra o que Vogel (TOMPKINS; BIRD, 1986) fala sobre o relacionamento energético entre plantas e pessoas: é uma troca. Quando eles falam sobre os remédios naturais e seus efeitos no


32

organismo há sempre uma exaltação do poder das plantas. Todos eles têm orgulho em dizer que não precisam de médico, de remédios controlados e como o tratamento com plantas medicinais é possível e efetivo. A relação com as plantas medicinais, em suas singularidades, é importante para cada um, é parte do seu modo de vida. Seria ousado dizer que a relação com as plantas medicinais faz parte da cura do próprio ser, da manutenção de sua felicidade? Pesquisas em saúde mostram como a lida com a terra e com as plantas é benéfica para o tratamento e prevenção de doenças, a chamada terapia hortícola ou hortiterapia. “A Hortiterapia é uma técnica que permite às pessoas alcancem maior bemestar físico e mental por meio do cultivo das plantas e do contato com a natureza.” (RELF, apud MARÇALLO et al. 2007, p.102). Enxergo o lidar com as plantas medicinais entranhado nessas pessoas como uma terapia. A morada das plantas medicinais – seja o quintal-mata, o quintal-casa, a horta – é o jardim terapêutico8 dessas gentes. “A apreciação passiva da natureza, bem como a participação ativa no jardim, cultivando as plantas, influi positivamente nas emoções, na saúde e no comportamento das pessoas.” (RELF apud MARÇALLO et al. 2007, p.102). Assim, percebe-se uma relação entre pessoa e planta que promove bem estar. O relacionamento afetivo presente, nas atividades dessas gentes com suas plantas, faz parte então do seu modo de vida e significa o lugar em que vivem – espelham a geograficidade. Assim como Maria Lúcia diz não querer trocar seu lugar na roça por qualquer apartamento chique na cidade, Dakini também demonstra como o encontro com seu lugar satisfaz a alma. Apesar de que você trabalha muito. Você tem uma leveza né. O descanso é maior. Ou já desacostumei, por exemplo, de musica. É só se eu sair e ir para um ambiente que tá a festa. Porque assim, por exemplo, Belo Horizonte você tem barulho o tempo inteiro. Então essa coisa assim, do desgaste, mental e físico, na cidade grande, Belo Horizonte, por exemplo, para mim é muito maior do que aqui. Aqui você trabalha o dia inteiro, mas você vem aqui, joga a roupa e deita no sofá, liga o ventilador! Volta por serviço de novo. Toma um banho... Em Belo Horizonte não tem isso. É correria o tempo todo. Cê pega um ônibus, cê trabalha, cê.. né! Então, aqui você volta para as suas raízes. (Dakini)

Ainda, ela diz como se sentiu mal quando tentou morar em Lagoa Santa-MG, como se lá tivesse uma energia ruim. Agora, na fazenda em Jaboticatubas-MG, ela se sente em casa, de volta as suas raízes, no seu lugar

8

O termo “terapêutico” pode ser bastante amplo, no trabalho ele é entendido como um processo benéfico destinado a proporcionar o bem‐estar do indivíduo.


33

Podemos mudar de lugar, nos desalojarmos, mas ainda é a procura de um lugar; nos é necessária uma base para assentar o Ser e realizar nossas possiblidades, um aqui de onde se descobre o mundo, um lá para onde nós iremos.” (DARDEL, 2011, p.41)

Em Jaboticatubas-MG essas gentes assentam o seu Ser. Em seus quintais estabelecem as relações que ordenam suas vidas. A geograficidade se manifesta – sutilmente – na relação de respeito e admiração com as plantas medicinais; e de enraizamento e interioridade (RELPH,2012) com o lugar de vida.

PLANTANDO UMA MUDA: considerações de vivência Como é a nossa relação com as plantas, sobretudo, as medicinais? Como essa relação influencia na preservação dos saberes relacionados as plantas medicinas? Estas foram as perguntas que nortearam o trabalho. O esforço em desvelar a relação existente se deu em todas as conversas tidas com as gentes da pesquisa. Mas devo dizer que não obtive o sucesso esperado. O processo que envolve a pesquisa é uma digestão lenta. Mesmo sabendo que não são sempre alcançados todos os objetivos, ou que nem sempre chegamos ao esperado há uma angustia. Não sei se por um problema metodológico, de tempo hábil ou ainda por escassez bibliográfica sinto que meu trabalho não alcançou todo o esperado e que não está finalizado. Mas sinto que plantei uma muda. Uma muda de curiosidade e de sensibilidade para a relação com as plantas, não só em mim, mas em muitos que me ouviram falar sobre a pesquisa. Espero que essa muda seja a minha contribuição para a preservação dos saberes relacionados às plantas medicinais. Em Jaboticatubas, percebi que a interação entre as pessoas e o meio rural sustentam o conhecimento. Quando estive na feira conversando com as pessoas a fim de encontrar meus sujeitos de pesquisa a dificuldade de escolha foi tamanha. A grande maioria dos feirantes conhece muitas plantas medicinais e as tem na horta, no quintal, no vizinho e no mato. A relação e conhecimento com as plantas medicinais vêm, na grande maioria, de uma herança familiar rural que tinham as plantas como principal ou única forma de tratamento. Sobre Dona Maria, Seu Lázaro e Dakini, senti neles a vontade e disponibilidade de compartilhar seus conhecimentos. Em seus diferentes núcleos de influência os três difundem seus saberes sobre as plantas medicinais. Maria Lúcia onde for será a mestre em plantas que compartilha o saber nas histórias, nos tratamentos e vivências. Dakini no processo de retorno às suas raízes rurais se faz aprendiz e professora ao mesmo tempo, o que proporciona uma


34

troca de saberes nas conversas. Sobre Seu Lázaro, o legado ficará escondido no inconsciente de sua filha Raquel, que mesmo mostrando desinteresse e desconfiança na eficácia, demonstra muito conhecimento guardado do que ela diz se “a loucura do pai”. Ainda, a conservação desses saberes está na mãos dos interessados em conhecer sobre o poder das plantas e estreitar a relação que temos com elas, pois a Feira Agroecológica Raízes do Campo está aberta para compartilhar. Após plantada a muda, espero um dia colher os frutos da frondosa árvore que vislumbra no futuro.

REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS ALMEIDA, Maria Geralda de. Mulheres rurais - a descoberta e conquista da cidadania pela valorização dos quintais. Revista GeoNordeste, n. 2, p. 138-161, fev. 2017. ISSN 2318-2695. ALBUQUERQUE, U.P.; ANDRADE, L.H.C. Conhecimento botânico tradicional e conservação em uma área de caatinga no estado de Pernambuco, Nordeste do Brasil. Acta Botânica Brasílica, v.16, n.3, p.273-85, 2002 AMOROZO, Maria Christina de Mello. Uso e diversidade de plantas medicinais em Santo Antonio do Leverger, MT, Brasil. Acta Bot. Bras., São Paulo, v. 16, n. 2, p. 189-203, Apr. 2002. ARAUJO, Vanessa Dias de; PALHARES, Virgínia de Lima. EXTRAPOLANDO AS CERCAS: o sentido de quintal em André do Mato Dentro, Santa Bárbara – MG. Revista GeoNordeste, [S.l.], n. 1, p. 58-72, jun. 2018. BARROS, V.A.; SILVA, L. R. A pesquisa em história de vida In:GOULART JR., Edward; CANEO, Luiz Carlos; LUNARDELLI, Maria Cristin Frollini. Psicologia organizacional e do trabalho: relatos de experiências de estagio. Bauru, SP: UNESP, 1998 240p. BRASIL. Decreto nº 5.813, de 22 de junho de 2006. Política Nacional de Plantas Medicinais e Fitoterápicos. Diário Oficial da União, Brasília, DF, 23 jun. 2006. Seção 1, p. 2. 2006. 2006b. BRUYN, S.T. The human perspective in sociology. The methodology of participant observation. In: HAGUETTE, Teresa Maria Frota. Metodologias qualitativas na sociologia. 14. ed. Petrópolis, RJ: Vozes, 2013, p. 62 – 73. CABALLERO, J. La Etnobotânica. In: BARRERA A. (ed.). La Etnobotânica: tres puntos de vista y uma perspectiva. INIREB, Xalapa. p. 27 –30. 1979.


35

CANDIOTTO, L. Z. P.; CORRÊA, W. K. Ruralidades, urbanidades e a tecnicização do rural no contexto do debate cidade-campo. Campo-território: revista de geografia agrária, v. 3, n. 5, p.214-242, 2008 CARNEIRO, Maria José. Ruralidade: Novas identidades em construção. In: Estudos Sociedade e Agricultura. CPDA-UFRJ, N.11, out. 1998. DARDEL, Eric. 1899-1967. O homem e a terra: natureza da realidade geográfica / Eric Dardel; tradução Werther Holzer. – São Paulo: Perspectiva, 2011. DE ALMEIDA, Mara Zélia et al. Fitoterapia no SUS no Estado da Bahia: contribuição para valorização do conhecimento e das práticas tradicionais na rede básica de saúde. Revista Fitos, [S.l.], v. 6, n. 01, p. 29-34, out. 2013. DIEGUES, A.C. O mito moderno da natureza intocada. São Paulo, Hucitec, 1996. GRZIBOWSKI, Silvestre; BAREA, Rudimar. Empatia e Ética na fenomenologia de Edith Stein. Revista Ágora Filosófica. Ano 15. n. 1. p. 34-46. jul./dez. 2015-2. LARA, Maria Luiza. ENTRE O GLOBAL E O LOCAL: A Feira Agroecológica Raízes do Campo. Belo Horizonte, Minas Gerais, 2017. MARANDOLA JUNIOR, Eduardo. Lugar enquanto circunstancialidade. In: MARANDOLA JUNIOR, Eduardo; HOLZER, Werther; OLIVEIRA, Livia de. Qual o espaço do lugar? geografia, epistemologia, fenomenologia. São Paulo: Perspectiva, 2012. MARÇALLO, M.M.; SABBAGH, M.C. e CUQUEL, F.L. Hortiterapia melhora as habilidades sociais e de comunicação de jovens portadores de necessidades especiais. Revista Brasileira de Horticultura Ornamental, Campinas, v. 13, n. 2, p. 101-106, 2007. MINAYO, Maria Cecilia de Souza. Pesquisa social: teoria, método e criatividade. 32. ed. Petrópolis, RJ: Editora Vozes, 2012 MORAES, Letícia Oliveira. As mulheres e as plantas - uma ligação ritualística entre o feminino e o todo. Belo Horizonte, Minas Gerais. 2015. PALHARES, Virgínia de Lima. Apontamentos sobre a apreensão da empatia Steiniana na comunidade. In: V Seminário do Grupo de Pesquisa em Geografia Humanista, Ilhéus, BA, 2014. PALHARES, Virgínia de Lima.; PINHO, Vânia Fátima de Paula. Preservação da identidade cultural no mundo globalizado: Córrego do Bação-MG. Anais do II Colóquio Nacional do NEER. 2007 RELPH, Edward. Reflexões sobre a emergência, aspectos e essência de lugar. In: MARANDOLA JUNIOR, Eduardo; HOLZER, Werther; OLIVEIRA, Livia de. Qual o espaço do lugar? geografia, epistemologia, fenomenologia. São Paulo: Perspectiva, 2012.


36

SILVA, Aline Pacheco; BARROS, Carolyne Reis; NOGUEIRA, Maria Luisa Magalhães; BARROS, Vanessa Andrade. "Conte-me sua história”: reflexões sobre o método de História de Vida. Mosaico: estudos em psicologia. 2007, Vol. I, nº 1, p. 25-35 SOUZA, E. A arte de contar e trocar experiências: reflexões teórico-metodológicas sobre história de vida em formação. Revista Educação Em Questão, 25(11), 22-39. 2006. STEIN, Edith. El Problema de la empatía. Traduzido por BONO, Jose Luis Caballero. Madrid:Ed. Trotta, 2004 TOMPKINS, Peter; BIRD, Christopher. A vida secreta das plantas. 8a ed. Rio de Janeiro: Expressão e Cultura, 1986. 324p. TUAN, Yi-Fu. Espaço e lugar: a perspect lugar: a perspectiva da experiência. São Paulo: DIFEL, 1983. 250p.

APÊNDICES

CONVERSA COM DAKINI

DATA: 29/09/2018

L: Gostaria que você me contasse um pouco assim... da sua trajetória de vida e incluísse assim, a medida do possível como é que foi a participação das plantas medicinais ao longo da sua vida. D: ao longo da vida, então cê quer... L: desde a infância, como é que você aprendeu, como é que isso foi perpassando a sua vida, como

é

que

é

hoje...

?

D: Assim é... Conhecimento profundo da manipulação a gente não tem, que a gente aprendeu com a minha avó. Porque ela que era a raizeira né. Então desde pequena a gente era tratado assim... L: Lá no norte de minas né? D: lá no norte de minas. Ai a minha avó ela é descendente de índio, então ela sempre mexou com essas coisas. Quando a gente tinha alguma coisinha ela ia lá no mato pegava e fazia os chá, manipulava as coisas. Porque na minha cidade.. Hoje existe SUS né, lá existia era posto de saúde. Então assim, pra você ter acesso ao médico era assim... era complicado né.


37

Principalmente porque a gente morava na roça né. Aí a gente cresceu assim. Minha avó fazendo as coisas, depois foi ensinando a gente, ai a gente mesmo já ia fazendo E depois quando eu vim morar aqui em Jabó, porque depois eu fui morar em Belo Horizonte, estudei lá e tudo. Quando eu vim pra Jabó, ai eu tomei contato com o curso de homeopatia. Né?! Ai eu achei uma boa assim, resgatar aquilo que já era tradição na família né, que a gente já tava acostumado com isso. E um pouco mais de conhecimento. Porque o professor Anisio, que deu o curso de homeopatia aqui, ele é profundo conhecedor né, trabalhava com isso, tal. Foi ai que a gente resgatou, e eu voltei para as raízes assim né, dessa vida da gente ter menos alopatia e mais homeopatia. As raízes é.. a gente voltou agora a cultivar, umas que já tavam perdidas lá tinha um nome aqui tem outro.. E o resgate é mais ou menos isso, mais ou menos assim. Do inico ate aqui as coisas se deram assim. Assim, especificamente na minha infância eu tive, mesmo morando em Belo Horizonte depois, eu tive umas coisas assim que a gente lembrava e fazia. A gente não tinha lá todas as raízes... Por exemplo, achava uma arruda mas você não achava um guiné. Porque guiné é menos tradicional em Belo Horizonte. A gente sempre usou mastrus, santa maria, que também não achava em Belo Horizonte. Cê ia no mercado central as vezes lembrava de alguma coisa que sua avó ensinou, que cê tava acostumado a fazer e comprava no mercado central. E pra resgatar mesmo e voltar a plantar foi só quando eu vim morar aqui. Que ai deu. Agora eu to habitat né! Que é o mesmo da minha infância. E o resgate é por ai. É a memoria e a lida né! Você volta as suas origens né quando você ta aqui. Em Belo Horizonte não, cê ia no mercado. L: Então você prefere aqui do que Belo Horizonte? D: Ah prefiro. É mais natural e você tem uma leveza assim... Apesar de que você trabalha muito. Você tem uma leveza né. O descanso é maior. Ou já desacostumei por exemplo, de musica, é só se eu sair e ir para um ambiente que tá a festa. Porque assim, por exemplo, Belo Horizonte você tem barulho o tempo inteiro. Então essa coisa assim, do desgaste, mental e físico, na cidade grande, Belo Horizonte por exemplo, para mim é muito maior do que aqui. Aqui você trabalha o dia inteiro mas você vem aqui, joga a roupa e deitaaaa no sofá, liga o ventilador! Volta por serviço de novo. Toma um banho... Em Belo Horizonte não tem isso. É correria o tempo todo. Cê pega um ônibus, cê trabalha, cê.. né! Então, aqui você volta para as suas raízes. Portanto eu que nem corro para ir na farmácia, vou ali pego uma coisinha, cê tem de tudo. Eu acho assim, se você tem uma doença grave, tem que ir para um especialista, tem que fazer um tratamento. Mas no dia a dia você tem o conhecimento. Porque toda droga ele vem né... desse processo né... Igual, eu tava com uma dor de cabeça brava, eu falei eu não vou


38

tomar remédio! Eu já notei, quando eu tomo por exemplo, dipirona! Rapidinho a dor de cabeça some, mas ai vice abaixa a pressão. Eu tenho uma queda de pressão quando eu tomo a dipirona. Então eu prefiro a dor de cabeça. Ai eu vou lá faço um chazinho de guiné, tomei, demora, mas depois passou, e você não fica com aquele... Eu acho bem melhor... Eu prefiro ficar com dor de cabeça e demorar para ela passar, tomar um chá de guiné, do que baixar a pressão. Se baixa a pressão, ai eu deito... não consigo fazer mais nada. L: Você mudou para belo horizonte com que idade? D: Belo Horizonte, 16 anos. L: e foi com sua família? D: não, foi sozinha. Assim, minha família ficou lá.. assim, os irmãos, cada um foi morar pra um canto. Você morava no interior, e eu queria continuar estudando. E lá so tinha até a oitava serie, não tinha nem segundo grau. Ai eu ganhei uma bolsa de estudos. Naquela época os deputados davam uma bolsa de estudos para quem terminasse a oitava série e quisesse continuar conversando. Ai eu vim para belo horizonte para fazer o segundo grau. Agora já tem na minha cidade. L: aqui você morou com quem? D: eu morei com minha tia. L: e ela tinha esse contato com as plantas ou era menos por causa da questão urbana? D: Não, ela tinha contato ainda, só que não plantava. Se você procurar por exemplo, naquela época quando eu vim para cá, minha tia tinha uma arruda plantada, tinha transsagem plantada, tinha santa maria plantada... então alguma coisa tinha! Plantas mais usuais tinha. Camomila esses trem assim. Agora, a quantidade de planta assim não tinha. Aaah passa no mercado central e traz. Quer dizer, a tradição acompanha né, cê não desgarra daquilo. Igual assim, eu lembro quando a gente era pequeno, a gente pegava conjuntivite, hoje você corre na farmácia pinga colírio, cê fazia xixi e lavava o olho. Isso é uma coisa que.. a vida inteira você faz isso. Quando eu falo os meninos acham engraçado né, mas... L: eu não sabia disso! D: Lá na minha cidade desde pequenininha todo mundo sabia disso. Você pega o primeiro xixi e lava os olhos e não enxuga, deixa secar o xixi. Faz umas três vezes no dia, no outro dia


39

já ta bom. Ensinei pro Luiz, pro Félix. O Luiz já sabia! Falou: Dakini é tanta verdade que eu fiz e no outro dia já tava bem. Então, tem as coisas que a gente faz... Igual berne, não pode apertar, tem que por o pedaço de toucinho que ela passa pro toucinho. Tem umas coisas assim que a gente traz e não tem como você apagar, isso aqui é batata você e faz e pronto. L: e você tem gosto por isso? D: Ah, eu gosto! Porque assim, não tem outra reação... um efeito colateral. Ao passo que qualquer outro remédio que eu tomo eu já sinto... L: eu organismo já acostumou com essas coisas mais naturais né. D: tem isso também, o remédio pra mim... L: desde pequena foi a preferência pelo natural ? D: a foi! Porque era o acesso que a gente tinha. E minha vó também, eles falavam que ela era curandeira, então assim, não conseguia atendimento no hospital carregava lá e lá mesmo ela conseguia, ela benzia... Gerava uma confiança na gente. Não vou no médico não, vou lá na minha avó. L: e ela morava com você quando você era pequena? D: não, mas morava próximo. L: e você ainda tem família lá? D: Minha avó já é falecida, meu avô, meus pais.. mas tem! Tem meus tios, meus primos... L: e você costuma ir lá? D: Ah tem muito tempo que eu não vou lá. L: aqui é só você e sua irmã? D: é! Temos parente em lagoa santa. L: e sua irmã gosta? D: gosta! Ela gosta. Depois que eu fiz o curso de homeopatia.. Porque ela tem vários problemas de saúde, né, igual eu te falei, ficou tudo pra ela e menos pra mim, Ela tem pé quebrado, ela tem labirintite, ela tem problema de ovário, então assim... Tudo que é remédio


40

(natural) ela toma. Ela faz o tratamento também, tem que fazer... Mas os remédios aqui a gente cultiva. Igual eu te mostrei aquele dia, a variedade que tem aqui, e lá pros mato também. E tem um pessoal aqui da cidade, principalmente os que trabalha aqui na fazenda, que eles conhece muitas raízes também. L: ai vocês trocam figurinhas? D: é! Fala ô to precisando de tal, ele vai lá (no mato) e acha. A não, lá pra cima lá tem! L: e aqui é grande? Quanto que é a área? D: Nossa aqui é imenso. Eu não lembro assim de cabeça não, mas cê pega na porteira lá encima depois do posto de gasolina, ai passa assim, não tem uma porteira preta depois, que tem um cartaz. De lá, ate o cemitério é tudo dele. Então é muita coisa. L: então acaba que você consegue planta do mato, dentro da própria propriedade né. D: sim, as que eu conheço mas não sei onde têm, eu peço o pessoal, porque eles bate pasto aí, vai andando batendo pasto, toca vaca.. Ai o que eles conhecem eu peço pra eles. Assim, minha irmã tem um problema de pedra nos rins, por exemplo, que ia precisar de cirurgia. Ai todos os chás que a gente conhecia ela tomou. E tinha um rapaz, hoje ele não ta aqui mais não, Seu Wilson. Ele falou nó, tem uma raiz ai, não lembro o nome dessa raiz, ai ele foi lá e trouxe pra ela. Ela foi tomando e expeliu as pedras, não precisou da cirurgia. Ai ele: a não, aqui mesmo na fazenda tem. Ai ele foi no pasto ai e trouxe. L: eles conhecem muita coisa né, porque anda a propriedade. E aqui são quantas vaquinhas? D: aqui são mais de 80. Só vaca leiteira né. Fora que tem os outros, os bezerros, boi.. tem a junta de boi que carrega o capim pra alimentar né, e como a área é muito grande eles tem que bater pasto né, eles andam muito. Igual eu falei com você, carqueja, aqui (horta) não tem , mas lá do outro lado tem. Ai quando eles precisam, porque tem muita gente que pede. L: e passa alguma água aqui dentro? D: passa, aqui embaixo tem um córrego. L: e a nascente é aqui dentro ou fora?


41

D: não, a nascente é no vizinho, no irmão dele, do outro lado é o irmão dele. A nascente é la pra cima. Mas é preservado né, por que só tem esse, se acabar não tem como você tratar de gado, se você não tiver na propriedade. L: tem gente que fala que planta de beira d’água é melhor. Tem umas espécies diferentes... D: isso ai tem mesmo, Alcino conhece muito. Ele que roda ai, ele limpa. Quando vem enxurrada, vem galho e tal, ai ele sempre vai limpa a nascente, limpa o córrego. L: e maior parte das pessoas que trabalham aqui são da cidade (Jaboticatubas)? Assim, já tem tradição de roça. D: Alcino tem tradição de roça, seu Luiz, é... a maioria é da cidade aqui mesmo. Apesar de tão próximo de BH as tradições são, aqui ainda é muito rural. Qualquer um que você perguntar aqui, eles foram nascidos criados aqui, ou tem parente aqui. E normalmente eles conhecem muito de planta. L: quando eu fui na feira conversar com as pessoas para ver com quem eu ia trabalhar, eu fiquei assim: mas todo mundo mexe com planta. Todo mundo tem no mínimo 4 espécies na horta, fora os que tem na propriedade, o que pega no vizinho, no mato. Mas sempre tem alguma pessoa que é referência né. D: a Maria Lucia cê conhece né, lá da feira?! Ela trabalha diretamente nessas coisas né. Eu sou mais assim um resgate. Agora eu tenho aqui de tudo, vira e volta... A Dona Conceição também sabe muita coisa, quando eu preciso de alguma coisa eu vou lá nela. Ela deu pra minha irmã uma muda, que diz que era boa para combater solitária no cérebro. A muda tá ali, tô aguando para depois plantar. Bom plantar quando chove, como ela tá pegadinha, não justifica o sol rachando de quente eu enfiar ela na terra, ela sente né. L: ela vai ficar muito fragilizada né. D: O tempo ta mudando, assim que der uma chuva, eu vou e planto. A água da chuva tem muito nitrogênio. L: E como que foi a sua aproximação com a Amanu? D: Foi assim... Eu fazia vários cursos ali no sindicato dos produtores rurais. Fui fazer o curso de derivados do leite, fiz de embutidos, que é a linguiça, né... E lá eu conheci a Ines,


42

japonesinha que mora aqui no Serra Morena (condomínio), que ela foi fazer também. É rica, não tinha nada para fazer foi lá fazer (risos). L: (risos) Na Amanu tem muitos colaboradores que são dos condomínios né, que são de bh e vieram morar aqui em condomínios e ajudam de alguma forma a Amanu né? D: Sim, acaba ajudando, interagindo.. aí o Getúlio falou, vai lá fazer esse curso, que é de graça, cê não ta fazendo nada.. Ai a gente s conheceu, trocamos contato, ai ela: ah, quando tiver outro curso ai eu vou também. Ai tava precisando, porque tem que ter 13 pessoas na cidade pro Senar aprovar o professor, ai quando faltava eu ligava para ela e ela ia. Ai ia nos duas lá para ajudar ou outros a fazer, então eu devo ter uns 10 cursos ai (risos). Disso daí ela falou: aaah ta chegando um pessoal ai, aqui pra Jabó, tem um casal ai, que é de uma Ong, diz que vai entrar com uns cursos ai. Ah já ouvi falar até conheço. Do mova né, que eles tinham feito. Aí, aah deve ser os meninos que eu conheço. Aí, vamo vamo. Fomu lá e eles falaram que precisavam de pessoas para o pessoal de viçosa poder aprovar o curso. Ai nos tamo dentro. Ai de lá a gente viu que tinha muito haver com a gente, e ficamo ajudando. Ai acabei entrando também para a Amanu, eu sou da equipe técnica, vai fazer 10 anos já. E fiquei. L: então já tem quantos anos que você já ta aqui em Jaboticatubas? D: aaah tem quase... 18 anos. L: nossa é muito tempo. Aqui na fazenda? D: não. Aqui na fazenda foi o mesmo ano da Amanu que eu fiz pra cá, acho que vai fazer 10 anos já. L: e como é que você ficou conhecendo aqui? D: Aqui é o seguinte, a gente tinha uma lojinha ali, na.. no centro da cidade, que vendia peça de geladeira, fazia os contatos para arrumar geladeira, isso tudo né. E vontade de morar na roça. Eu tinha comprado um sitiozinho já. Ai eu conheci a esposa de seu Luiz (dono da fazenda), ai a gente conversando tudo lá né, ai eu: nossa eu tinha tanta vontade de morar na roça e tudo. Até comprei um lugarzinho para mim. Ó que ainda não seu para construir lá. Ainda né, então a gente ficava aqui, e ia para Lagoa Santa. Ai ela falou: ah, meu marido ta precisando.. Porque lá o pessoal que morava aqui tinha ido embora. Ele ta precisando de uma pessoa para dirigir lá. Você gosta de fazenda, você não quer ir lá conhecer não? Ai eu falei: ah, vou lá conhecer. Ai eu vim num dia no outro dia eu já mudei. Ela me trouxe ai eu ah


43

gostei, que dia que pode mudar, ai ela: uai, na hora que você quiser. A gente passa lá em casa pega a chave e você limpa. Fui lá peguei a chave e limpei. No outro dia mudei. L: que ótimo! E quando você tava em Belo Horizonte... D: Porque eu ia morar no centro. Ai quando eu vim para morar aqui não foi para morar na rua não, eu vim, eu sai de lá para morar na roça, resgatar minhas origens, descansar minha cabeça. Ai de cara, já tinha uns meses que eu tava aqui, e ela me chama. A gente ia para Lagoa Santa, ficava no comércio, e vinha. Ai quando eu decidi ficar mesmo na cidade, ela falou que tinha a casa aqui: vê lá se te agrada e tal. L: então deixa eu ver, você mudou de Medina para Belo Horizonte. E de Belo Horizonte para Lagoa Santa. Como é que foi isso? D: ah é que eu cansei de Belo Horizonte. L: você cansou desse vuco-vuco? D: é! L: você é mesmo uma pessoa do interior? (risos) D: É! Porque assim, eu vim para estudar e para voltar pra lá. So que ai eu estudei, ai eu tive que trabalhar, pra poder completar meus estudos, e tudo né! Ai na hora de voltar... como é que eu vou fazer? A parentada ta vindo de lá para cá. Os irmãos já tinha pipocado.. A maioria já tava em Lagoa Santa, outros em São Paulo, outros no Rio de Janeiro, eu vou voltar para lá.. Ah vou para Lagoa Santa que meu irmãos tão lá. Ai fiquei um tempo, só que eu não gostei de lagoa santa... L: Por que? Já tava muito crescido. D: é... Não sei porque a energia do lugar não... tinha uma energia ali que eu falei nó Belo Horizonte é igual... L: ai você conheceu Jaboticatubas? D: é, tinha um vizinho da minha irmã que é de Jaboticatubas ele tem sítio aí. Eu comprei dele. Ai a gente veio.. eu falei: tem que botar meu comercinho lá em Jabó, que ai quando a gente construir nos muda de vez! Só que ai antes de construir eu mudei.


44

L: e você ainda tem esse sítio? D: Não eu devolvi para ele, porque eu comprei aqui na cidade. Eu morando aqui já tinha tudo, eu não podia administrar dois lugares. Ai eu vendi lá e comprei aqui no bosque dos coqueiros... lá no final. Que dá de frente para outra fazenda (risos). Falei: no dia que o dono dessa aqui morrer, porque le não deixa eu ir embora daqui, eu já vou que meu terreno é colado em outra fazendo e o pessoal lá é amigo meu também. É um sossego, eu gosto daqui, não pretendo sair. L: ai você trouxe a sua irmã para ficar junto de você? D: é! Ela trabalhava com enfermagem né, e tava muito cansada. Que ela trabalha dia sim, dia não. E quando eu comprei aqui, metade foi o dinheiro dela, do acerto lá do Felício Rocho. Ai ela falou: ah, vou também. Ela tinha separado né. Então vamos. Aí ta ai, nos duas aqui. Ai vira e volta nós tamo em Lagoa Santa, os parentes estão lá... Tem no interior, até mesmo ela foi para lá e ficou 15 dias lá em Medina. Quando quiser matar saudade vai né. Eles chamam a gente... mas aqui a gente administra né. Então quando sai não pode sair as duas. Agora mesmo ela vai viajar. E depois eu vou viajar para Porto Seguro. Vou tirar uns dias e tudo né. Eu gosto de praia né. Porque o povo fala assim: ah, vai para o mato. Não, eu já oro na roça. Quando eu saio eu quero ir para praia. (risos). Porque rça eu já gosto dessa. Tem a Serra do Cipó né, que a gente vai ali. Não justifica eu sair de uma roça e entrar em outra. E assim, eu não gosto de shopping e esses trem. Eu gosto de literatura, cinema... Ai eu saio e vou para praia, eu adoro ir para praia. Olha as ondas descansa. Olhar o infinito! L: é.. descansa. E a Amanu então, ela já faz parte da sua vida tem 10 anos... D: agora não tem como separar mais. Eu falei com Luiz, isso é um casamento, que eu não quero separação. Pega o jeito e a gente se identifica. A luta da gente é por isso mesmo, do resgate da tradição, da terra, da natureza... Eu sou voluntária, eu não ganho. Só nas feiras. Mas carreira dentro da Amanu eu não tenho vontade, porque o que eu ganho aqui é bom para mim. Dá para viver... Mas os meninos que são jovens eles tem que construir a carreira deles. O Luiz e a Daya, eles precisam. Ele vivem só disso. Eu não, eu faço parte da equipe técnica voluntária. Ai quando tem os editais, a gente fala logo para eles participarem. L: A Daya e o Luiz não plantam? Eles estão vivendo só da Amanu?


45

D: Eles plantavam, agora não dá mais. Estão vivendo só do editais. Tem uma agora de dois anos. E as parcerias. Com o Slow Food, com o Coco Macaúba, do Pequi. Ai tem venda de produto que eles tem porcentagem. Mas não tem como manter funcionário. O edital é um projeto. Acabou, acabou. L: Esses editais, quem costuma fornecer o dinheiro? D: São varias empresas. È muito difícil ser do governo. Normalmente empresa privada. Do governo é muito burocrático. Tem um do Banco do Brasil. Que é pouquinho e exige muito, dá ate vontade de desistir. Mas não desiste não. Dinheiro do governo tem que pegar também (risos). Para conhecer é uma trabalheira. Burocrático e desgastante. L: Dakini, a Amanu ela tem uns princípios que chama muito a atenção. Comercio justo, educação, ecologia, solidariedade... Você acha assim, que as pessoas que estão ali na feira, que tão junto com a Amanu, ela tem isso também? Essa consciência e essa ideologia. D: O pilar é esse mesmo. Todos os feirante, eu acredito, porque em todas as nossas reuniões trimestrais a gente vê isso bem claramente. A questão da ecologia e da solidariedade é muito grande. A questão da educação é uma coisa que precisa ser mais trabalhada. Porque eles são semi alfabetizados. Mas eles compram a ideia. Mas assim, quando tem uma coisa muito trabalhosa que a pessoa tem que ter um conhecimento uma educação, para eles já tica meio difícil. Eles começam a fazer corpo mole... Mas assim se é para abraçar a causa, eles abraçam. Assim, agora a gente ta querendo fazer a transição do agroecológico para o orgânico e ta muito difícil. Por causa dessa questão da educação. Você vê lá que são muito poucos adolescentes, maior parte são mais velhos, e idosos, trabalhar isso com eles é muito difícil. Por exemplo, vamos fazer uma embalagem bonita. Até agora não se conseguiu isso. Porque para eles o negocio é plantar, produzir e vender. A questão do solidário também. Ali as pessoas se ajudam, é muito difícil achar um que não esteja ajudando, colaborando. Mas esse negócio da educação, mesmo para a mentalidade aqui de Lagoa Santa, é uma coisa muito difícil para você trabalhar. Alguns lá foram alfabetizados pelo Mova. Então assim, a cidade pouco valorizou essa questão do rural. O rural tinha que ser aquele pobre trabalhador que apesar de entender da natureza, da saúde natural, não tinha valor nenhum. Porque aqui existe uma polaridade muito grande entre ser muito rico e ser muito pobre. E a Amanu conseguiu de certa forma valorizar e dar certa dignidade para eles. Né. Através dessa cultura da terra, da produção. Né. Já tinha muita gente que já tinha abandonado essa raiz e tudo, e isso ai foi resgatado. Eles valorizam e compram a ideia sim. Tanto que a Amanu cresceu e muito! E


46

assim, os cabeças de lá, os mais estudados, tem que trabalhar de voluntário. É difícil. Eu não posso largar meu serviço para viver dos projetos. Eu ajudo, to ali, toco, mas ai é complicado você abraçar totalmente a causa. A questão da causa, eles valorizam sim. A solidariedade e a ecologia. Mas a questão da educação para eles já é mais secundário. L: e a população jovem, ajuda muito? D: Olha, ta fazendo um trabalho nas próprias comunidades para valorizar. Ai mexe com a educação infantil. O menino já crescer sabendo da a semente, a produção, valorizando a terra, saí estudar fora, mas pode voltar. Porque, não adianta fazer isso para quem já ta com 60, 70 anos. Se você não vai ter quem vai herdar. Então a gente ta fazendo para eles. A gente quer que isso continue. Tem que ter cabeça nova, com disposição. Então tem esse trabalho educativo com os meninos. Ai quando tem reunião a Kelly faz esse trabalho. São os pais e os filhos. Eles ficam lá, a Kelly traz toda uma didática que ela aplica lá para eles, os joguinhos todos, que seja voltado para terra, para a realidade... Para valorizar o que é deles. Não negar as raízes. Esse trabalho tem que existir. Porque senão não tem fundamento, vamos fazer para quem? Porque a Amanu acaba a partir do momento que não tem mais gente, não tem mais zona rural, não tem mais água... O solidário entra ai, não estamos lutando por uma coisa só para gente né. L: que esses resgate das tradições é muito importante mesmo, valorizar todas as produções, os produtos que são típicos daqui... D: isso não vai acabar nunca... sempre acha alguém para resgatar... tem que existir quem segura essa bandeira. L: sim! D: Então, vamos tomar um café?!

CONVERSA MARIA LUCIA

DATA: 15/09/2018

TRANSCRIÇÃO AUDIO CONVERSA MARIA 15/09 – continuação do part1 maria lucia


47

L: Mas e ai? o que a gente tava falando? Eu já perdi a linha do papo. Você tava falando sobre você ter trabalhado com isso desde sempre, ai um médico virou para você e pafou que era para você voltar depois que esse negocio de artesanato tinha dado uma diminuída, M: é isso mesmo. Ai eu voltei começando a tratar ai eu fui, acho que te falei essa parte que o negocio do curso, eu acho que não falei não. Ai quando teve u curso aqui da viçosa que eu queria relembrar mais, é reforçar, ai quando o professor descobriu é... ele falou “D. Maria você não vai ser aluna você vai ser professora no meu lugar”, em vez de eu ser aluna eu fui ser professora pros meninos pras meninas, pras turma né. Aí foi da onde que o povo pegou muito mais conhecimento, e eu fui fazer os tratamento, ai aonde tem pessoa que necessite de tratamento ai eu vou fazendo, vou socorro a pessoa, pessoa desenganada de médico, vou faço o remédio, faço o exame aqui né, vem aqui eu faço com aquela que até sua mãe tem também, que eles achou que eu conheci lá mas eu já tinha ele, que é o pendulo. L: uhum M: eu trabalho com o pendulo, e aquilo é verdade, aquilo não falha, é verdade de mais, conta direitinho. E nessas alturas eu cheguei praqui foi assim, morava lá no interior, lá era sem recurso, a gente veio para cá, mas sempre nesse foco, trabalhar natural, com as coisas, medicina natural, Meu pai tinha né e tudo que faz é confirmado. Aí eu não tenho vontade de sair desse foco não, tratamento natural, a gente chegamos de lá para cá ai continuamos trabalhando, cuidando das pessoas, com os remédio natural, vai nos campo para reconhecer, né, té que eu falei assim, “nó, se eu não tivesse com o tempo tão corrido e eles não tivessem chegando tarde, a gente até q ia passear um bucadinho né”. L: uhum M: Pra reconhecer um bucado de planta igual a gente fez né. Mais aí, eu sei dizer que o meu tratamento envem, que vé eu vou fazer 42 anos que eu trabalho com esses tratamento, nunca chegasse uma pessoa perto de mim, que falava assim, “seu remédio não vale nada, é engano”. Eles pega e fala assim, “D. Maria fantástico seu remédio. A senhora vai pra frete, porque assim o remédio da senhora é garantido”. E por tanto que to na praça trabalhando e as pessoas chegam com uma planta que outro arrumou, eles não confia, eles chegam perto de mim e pergunta “ô D.Maria essa planta é isso?” Ou pergunta eu “ô D.Maria você conhece essa planta aqui ?” Ai eu pergunto “Como você chegou até essa planta, que que você quer dizer dessa planta para mim?” “ah D.Maria eu precisava dessa planta assim e assim.” “A é!” ai eu falo coisa “A planta não é o que você queria, mas se a pessoa passou como é, não foi eu que passei, e eles pega e fala “como é essa planta?” As vezes eu tenho ela na banca, ai apresento para eles, essa é uma diferença essa ai é bem diferente. Igual aquela madeira que você falou ou eu falei para você, é.. canela de velho. L: uhum M: é fantástico canela de veio! Canela de velho é bom demais mesmo, para tirar dor do corpo, alé de tirar dor do corpo, ansiedade, pros rins, pra bixiga, é para muita coisa a canela de velho, pra emagrecer em primeiro lugar. Então a pessoa vem com a folha e me mostra, “ô D.Maria


48

esta é essa folha?” e fala a espécie da folha, eu falei assim... ai eu olho se for eu falo, se não for... Igual, ontem veio uma dona aqui e falou comigo, falou assim.. “D.Maria essa aqui é a folha canela de velho que eu to precisando?” Eu falei assim “não é”. Existe 8 espécie dessa planta, e se você não ficar veiáca você toma enganada. Toma enganado, vai encher a barriga de água, mas não vai fazer efeito. Não adianta nada. Então a pessoa tem que ter muito, muito conhecimento. Como eu tenho 42 anos de, de experiência, de experiência, portanto meu curso eu nem achei bom por do jeito que eles coloco. Eu acho que você viu ali... Mestre.. eu não gostei. L: por que? M: Eu não gostei desse jeito. L: como você preferiria? M: se tivesse colocado assim... Pessoa de experiência... Era melhor de que.. de a pessoa mestre né. Então, quando eu recebi eles já tinha.. eles não me coiso.. e já tinha com isso. E eu falei isso aqui eu acho que ta errado. Um mestre que eu conheço é a mais de que nós, que é Deus. Ele é o mestre. Eu não me senti isso por isso não. Eu queria ser uma pessoa assim de entendimento. Porque Deus deu entendimento pra nós. Que mestre é só Deus né. Cê num acha certo? L: uhum M: Então mestre é só Deus... mas já ta lá pronto né. Não discuti, não falei nada. Ai é igual eu to falando, né, as vezes eu to na cidade a pessoa me procura , aqui as pessoa me liga direto, para mim fazer os tratamento, fazer palestra, já dei palestra para médico, pra essas pessoas que ta estudando pra médico né. Num tem essas pessoas que ta estudando e as vezes fez o curso todo pra médico, e quer continuar estudando pra médico, ai eu tenho feito muita palestra. Lá eu internada lá, as meninas chegando as estudante tudo de branquinho estudando, ai nós conversando pra lá depois que eu melhorei.. elas.. a menina pegou q falou assim “ ô D.Maria eu quero assunto da senhora, a senhora tem um jeitinho de saber, sabe muitas coisas...” Eu olhei assim gente...e “quem falou com essa menina ?” Ai a gente contando.. ai ela pegou e fez isso ai ô... L: gravou? M: Fez isso ai que você ta falando sobre o assunto de medicina, como, como é que começou, que tipo q começou, ai eu expliquei tudo e foi muito fantástico. Foi! E depois ele me ligou “D.Maria aquelas palavras que a senhora falou para mim foi muito bom nas minhas provas.” Ai ela pegou e me agradecendo.. me liga aqui agradecendo por isso aí, eu sei.. eu não tenho a perder não, por que.. querendo ou não querendo, graças a Deus primeiramente, Deus me deu sabedoria e essa sabedoria eu não quero que perca não, eu quero praticamente ensinar, igual pra fazer um chá, é importante você aprender a fazer o chá.. Eu não sei como sua mãe sabe fazer.. L; como é que você faz?


49

M: eu acho que é igual o da sua mãe, se não for.. independente do chá, independente da folha, igual a folha de abacate... A folha de abacate é boa pra rins, e tem uma outra folha que não precisa seca ela, e a folha de abacate precisa secar ela. Porque a folha de abacate.. Conforme a folha dá mancha no pulmão, conforme a outra folha não precisa. Igual folha de abacate com uma plantinha que ta ali depois eu vou mostrar você, ou eu acho que mostrei você... L: qual? M: não, mostrei não, mostrei foi o rapaz. Ela é bom pros rins, tira pedra de rins, tira pedra de vesícula, tira tudo. Então a folha de abacate tem que ser seca. A folha de abacate depois dela seca, você ferve a agua, a quantidade da água, vamos supor, como se você fosse tomar duas dosagem só, dias, vamos supor. Ai você ferve água e põe em meia xicara, aquela meia xicara é duas dose. Ai cê toma duas doses. Você ferve a agua e pega isso aqui (mostra com as mãos o encontro do dedo indicador com o polegar e do meio), isso aqui chama uma polegada, uma polegada quer dizer os três dedos juntos, uma polegada, você põe a mão assim e pegou uma polegada. As vezes a pessoa acha que fazer o chá é isso ó, peguei (mão cheia)! Não é assim, você vê como é que a pessoa é, pegou um punhado, que significado tem aquilo ali?! Passou do limite. Uma polegada é isso aqui (sinal com as mãos). L: uhum M: ó uma polegada de qualquer folha de chá é isso aqui (sinal com os dedos). Não sei se sua mãe tem essa experiência, da medida o chá de folha. Uma polegada!. Aí, uma polegada serve pra..um...é... um copo americano, uma xicara. Ou de contrário, dois copos, até dois copos é significado uma polegada. Uma polegada. E a.. para o significado, para o resultado de um comprimido, vamos supor que você tem costuma de tomar um comprimido, um comprimido, então eu vou passar para você um medicamento em pó, vamos supor que eu vou passar para você um medicamento em pó, é de folha mas é triturada em pó. Ai eu vou e pega.. eu passei para você toma, você pensar ‘ô D. Maria como é que eu vou tomar?” Ai eu vou te explicar para você. É.. se for para pressão alta, se é um medicamento em pó, vamos supor, ou pra pressão alta, ou pra glicose, pra colesterol. Aí cê pega, você vai pegar isso aqui (com as mãos junta o indicador e o polegar), essa pitada. L: uhum M: Isso aqui chama uma pitada. Isso aqui. Ai corresponde a um comprimido. L: uhum M: As vezes a pessoa acha que encher uma colher ou um cabo de colher, ou uma colher de chá, ou uma colher de sobremesa.. Não. Não resolve. O que resolve para você é a qualidade, não é a quantidade. A quantidade você pode ser intoxicado, ou não pode fazer.. se não for intoxicado, não pode fazer.. não vai dar resultado de nada. Porque?! Se você vai no médico o médico vai pedir. Vai falar com cê assim ó “você ta..” vamos supor você ta com esse problema de saúde, ai eu to passando para você um antibiótico, vamo supor que o médico cismou que o antibiótico é forte para você, divide o antibiótico em meio comprimido. Ai você vai e divide aquele comprimido, e se você não dividir, ele vai te intoxicar. Assim é o remédio


50

natural também. Se você não trabalhar com essas medidas, algo vai fazer para você. Então não é importante, igual esse aí (seu Tião). Eu brinco com ele que ele quer da uma de tratar né, mas eu fico corrigindo. Que ele fala assim, isso e isso e isso e isso assim é bom, eu falo “um, um, um” (negação) olha você errado ai, pode não. Você é errado, porque tem que tratar é tratar, não é matar. Ou de contrário não passar do limite. Remédio, tem muito o saber do remédio. Tem muito saber. Independente da planta, você vai usar, uma planta só, independente do seu problema, da sua “organise”, se você for tratar e seu organismo não aceitar, cê vai usar 7 espécie de planta. Ai como é que esse remédio chama? Não é um chá, você acha que é um chá, no seu pensar é um chá, num é? É um chá. Mas ai você me fala, me responde ai agora pelo menos no sentido, ele é um chá comum, simples, ou “nutio”? Ou composto? L: composto né? M: Composto. Por que é composto? É composto porque já passou de duas.. passou de duas ervas o chá é composto. Vamos supor que eu vou fazer o tratamento para você. Vamos supor ali.. Deus me livre eu sei que você não tem! Você veio para tratar é.. gastrite, é problema de coração, problema de sinusite, problema de enxaqueca, problema de as vezes é.. labirintite. É o que mais ta coisando o problema de depressão. Bom, ai cê veio para consultar. Você fez os exames no médico, deu é isso né, ai cê veio consultar, ai eu vou ver se seu organismo vai aceitar toda essas ervas junto. L: uhum M: Nem todos os problemas que nos temos pode tomar mais que uma erva, e ai você tem que consultar. Ai você chega lá no médico com uma dor de barriga. Você pode esta com dor de barriga, ou você pode estar com outro problema, o médico pergunta para você tudo, cê tem isso.. num é? Ah! Como é que chama sua mãe? A sua mãe teve isso? a você teve uma parentada que teve isso? Num é isso? Num fala isso? L: uhum M: Eu to mentindo? Fala isso né! Agora o significado da pessoa vem, pra tranar na.. é.. alternativo, é natural. Tem que consultar pra saber, aqui eu sempre falo eu não trato no escuro. Eu trato pra mim saber como é que eu tenho que entrar com o remédio na pessoa, se aquele remédio vai fazer bem para a pessoa, se a pessoa tem alergia aquele remédio, tem tratador ai que, num sabe saber se vc tem alergia do produto. Num sabe, ou a aqui pra nós, eu acho ate que a sua mãe não sabe tirar, ver que a pessoa tem alergia do produto. E a obrigação de todo o tratador é saber. Imagina vc chega num médico e cê tem alergia a um produto, o médico vai perguntar, vc tem alergia? Num pergunta? A algum medicamento? Num pergunta? L: uhum M: Ou eu to falando mentira? L: pergunta.


51

M: Pergunta! E se você tiver alergia claro que você vai falar! Eu tenho alergia de, de dipirona, eu entro em coma com a dipirona. Eu não tomo dipirona. No caso... quer dizer.. agora, eu não tomo nada, de remédio médico não! Mas eu não tomo, então tem gente que acha o.. a.. o guia alternativo o único lugar de cê fazer a prova é aqui ô.. (dorso da mão), o tratamento natural. Cê vai tratar com um tratamento, ai se você tem aquela planta e ela vê, você vai e faz o teste aqui (mão), aqui ó é o teste. Remédio natural... Faz no punho, do esquerdo, isso aqui é um punho, o esquerdo, você fechou é um punho num é? Cê fechou aqui, é com a mão fechada. Isso aqui eu aprendi com a minha avó. Tirar... fazendo a prova de quem tem alergia. Ai ela falava assim, “vou ver se você tem alergia?” E ai passava, se começar a mudar aqui a pele, vai se avermelhar porque você tem alergia, agora se ficar normal você não tem alergia. Ai tem muito tratador que trata e não sabe como olhar qual remédio que tem alergia, que a pessoa tem alergia dele e qual é que não tem. Então por isso que eu falo com todo mundo que eu não trato no escuro. Não trato. Se quiser, faz o diagnostico, me procura eu to pronta pra tratar. Mas sabendo como que eu vou tratar. Porque você vai no médico, e fala “a D.Maria eu quero tratar natural, e a senhora trata e tal”. Ta tudo bem “você fez o diagnostico?”, fiz ou não fez, então faz depois eu trato. Eu acho que você viu isso ate pregado na minha barraca lá. L: uhum M: cê num viu? L: uhum M: Porque não é não mentira q eu fiz esse papel para a pessoa não ticar perguntando. Pus lá, interessa? Então confirma aquilo ali vai fazer. Porque ce vir no escuro, eu não trato no escuro. Porque é coisa séria você mexer com humano, pessoa humana. É coisa seria, porque se vc não puder tratar por bem por mal não interessa, quero saber se a pessoa ta é bem. Então muita gente gosta de ir lá na minha barraca assim “o D.Maria, eu achei a senhora muito clara e franca, que a senhora é franca. Se eu só puder tratar, passar o remédio pra pessoa aqui na barra a senhora passa, e se a senhora não puder você me procura nesse tal lugar assim assim. Você não... quer meu endereço, toma aqui meu telefone e meu endereço, isso ai eu passo. Se fosse outra pessoa que não quer cuidar de vida, tava nem ai... Eu vendia meu remédio de qualquer maneira, passava para a pessoa. To nem ai que dia que vai tomar, que tipo de dosagem, não eu..eu.. eu falo as coisas mastigadinha. Ai Tião ta assim, nó mas como é que você consegue guardar tudo na cabeça? São milhares de pessoas que chega na minha barraca, cê viu lá. Procurando.. Mas é igual eu falo, algumas coisas que eu vejo aqui que compensa passar, eu passo. Aquele que eu vejo.. não.. não tem como, esse ai não tem. Cê já fez seu exame? você já sabe a sua causa? Ah não eu to.. eu vou fazer. Então eu espero e vai fazer, as vezes a gente que comprar remédio e eu deixo de vender porque eu sei que ele não esta em condições de tomar aquele remédio. Porque é minha responsabilidade. Agora se eu quisesse ganhar mesmo, ah to nem ai não a pessoa procura e eu tem ta aqui. Não! Isso eu não faço não. Eu sou muito franca e muito sincera. L: tem que ter responsabilidade. M: é responsabilidade.


52

L: e quando você era mais nova seu filhos estavam em casa ainda você tratava deles só com planta ? M: só com planta. L: não eram de tomar remédio né? M: não só levava, igual to falando com cê. L: levava no medico e diagnosticava. M: Isto. Ai ele passava a receita e por educação eu pegava as receitas, por educação. Chegava em casa rasgava e jogava no lixo. Não tava nem ai não. “a D.Maria tantos dias quero ver seu filho aqui.” A tá, uhum. Eu tratava.. ai quando chegava naquela data levava.. repetia. A D.Maria vamo repedir o exame e tal. Repede. “ô D.Maria seu menino ta ótimo.” Eles achavam que era o remédio deles. Não! Não! Aqui tinha um menino aqui que tinha morava com meu menino, o menino tava só emagrecendo, só emagrecendo, só emagrecendo, só emagrecendo. Ai meu filho, era o enteado dele, não era pai não, era menino que ele pegou para criar. Olhei pro menino e falei assim, “meu filho, dá remédio de verme esse menino. Dá remédio pra verme porque, esse menino ta cheio de verme. Ele falou assim. Não, ta não eu levei ele no médico assim... Sim menino! Ta na cara! Deus é tão bom para mim que responde a minha palavra. Deus é tão bom que eu falei e o menino tava alimentando não e tudo que ele tava comendo ele tava jogando pra fora. Falei assim.. esse menino ta com verme bravo! Ai ele não levou a causa a serio não. Ai ele levou o menino no médico, e só passou um remédio pra febre. ele tava tanto que os vermes tava dando febre no menino de tanto que tinha. Falei, isso é verme. É mãe? Mas não levou a serio não. Ai levou no medico o medico passou remédio pra febre, eu falei ta bom..Ai quando foi de noite menina, falei assim cês escuta o que eu to falando em, quando foi de noite.. ele pegou e pros verme pra boca, ele pegou e veio cá né, Nó mãe, senhora é danada em. Falei como, danada como? Sou danada não menino misericórdia, cê ta doido. A senhora falou que o menino tava com verme e ta a prova aqui, o menino tava pondo verme pra boca, de tando que eles tavam atacada. Ai mãe o que q é bom? Ai começou a me pedir remédio né. Ai eu fiz o remédio pro menino, ai o menino tava comento, tava com o estomago brilhando. Eu fiz remédio pro menino, coisa simples, é igual aquilo que tava passando ali (dvd), erva de santa maria com hortelã. Peguei ela, esfreguei lá na panela assim verdim com hortelã, e fiz o sumo, e dei o menino três dias. Menino voltou a comer, os verme parou de atacar o menino, parou o indispor do estomago. O menino tava com tanto verme que tava que os verme tava “repurgano” o estomago, tudo que ele comeu o estomago não aceitava, que tava cheio de mais né. Ai.. ai que ele começou a falar é mãe, senhora ta certa! Tem que ir no médico não, tem que ir é na senhora, médico melhor é a senhora. Medico socou remédio lá no menino ó, da remédio de febre pro menino, deu nada a febre continua, poir os vermes tão fazendo febre no menino. Começou a tomar esse remédio ai a febre sumiu, e o menino voltou o paladar, e o ... cabou! O menino virou outro. O menino virou outro. Com um simples remédio, ai ele desse tempo pra cá, “é mãe.. eu não vou em medico, a hora que eu quiser eu vou na senhora. É. E ai é o que você ta falando, meus meninos foi tudo criado com remédio natural. Só o caso que eu falo quando preciso, como eu não tenho os aparelhos na mão nem nada, vou fazer os exames. É igual o Tião, Tião ta ai sem vistas de teimosia. Eu tava quase


53

igual ele ó, eu cuidei de mim. Falei assim, Tião nos vamos fazer o diagnostico e vamo fazer o problema que ta acontecendo com as nossas vistas. E ele não quis tratar comigo. Não quis! Aaah to nem ai, vou tratar de mim. Eu não enfiava uma agulha, tava ruim de vistas, eu peguei e enfiei a cara em sumo de serralha, sumo de serralha com mel e leite. Tomei! Menina foi uma beleza. Falei com ele pra tomar... Não! Esse trem é ruim quero não assim assim! Ai eu falei ruim é a doença. Ai ate que parou nos hospital lá, operou e agora vai ter que operar de novo. Operou da glaucoma e agora.. L: agora é catarata ne? M: agora é catarata que avançou. Cê viu que ele quase não vê. Ta ai porque, Porque não quis tratar. E é igual o caso dele também, ele pega, ele pega e foi tratar no médico, e o médico não deu conta da mãe dele. E que que aconteceu, veio tratar comigo. E ta bom. Ô menina a mão dele fazia dó. Ele pegava um cabo de colher assim, o sangue corria. L: coitado M: acido úrico no sangue. E coisa boba que trata. Chapéu de couro, é.. caninha do brejo, Acho que chapéu de couro cê conhece, conhece? L: por nome eu não sei não, tem que ver (risos) M: depois eu te mostro. Chapéu de corro, caninha do brejo. Caninha do brejo tem ele seca. É que eu tratei que ele toma, e o médico falou que não tinha cura. Agora tem uma outra coisa que ele tem que tomar e ele ta tomando. Eu levei ele no médico, porque ele tava muito estressado, ele tava muito nervoso, qualquer coisinha o topete subia, falei assim, esse trem ta complicado! Aí eu peguei e falei assim, gente o que que eu vou fazer. Eu vou levar ele no médico. O medico chegou e falou ô D.Maria, seu marido ta estressado com os trabalho que ele gosta de fazer e ele não ta dando conta, a idade já ta avançada, cê vai passar esse remédio o resto da vida dele. É.. controle. Remédio controle. L: uhum M: Remédio controle para dopar a pessoa. Pra ficar tranquilo. Olhei pro medico assim aaah tá, coitado do meu marido, eu vou ele esse, devera, vou matar meu marido mais rápido. Nem! Peguei o exame peguei o papel e.. peguei o exame não peguei o pedido de, receita. E ta ali ate hoje ó. Peguei assim e já sei o que eu vou fazer. Fiz uns floral, par ele, de flor de café e flor de maracujá. Nó menina é uma benção. É esse aqui eu ele ta tomando. E junto com o remédio pra próstata que é a dourada do campo. E to dando que ele também deu principio, é.. irritação na próstata. Ele fez os exames e deu. E bom de mais e o médico me falou o que que punha o idoso agitado né. É não poder fazer o serviço que ele tinha costume de roça, cê vê ai não capina mais não, uma que ele não ta conta, serviço aqui ele pagou trator, mas quando ta nas planta lá ele vai e paga os outros pra limpar né, pra chegar na terra né. Assim que ele faz, sempre eu falo deixa disso, cê quer jogar seu dinheiro é fora, para com isso. Vai fazer o que, gosta! E ai tá. Ai eu fiz os remédios e dou ele, né, fiz os remédio e dou ele, ele fica tranquilo. Se eu fosse olhar o médico dava aquele remédio bravo.


54

L: é M: sarava um coisa, mas a gente ficava.. L: mas dava problema em outra. M: outro, muito mais pior. E.. igual cê ta falando né, a minha mãe, meus avós, meus bisavós tudo, sempre falava quando cês tive gente que cuidar da sua saúde, cuida da sua saúde, mas cuida da planta também. Não pega.. Minha mãe me ensinou eu a colher as plantas, não judiar das plantas, conversar com a planta, pedir licença pras planta, com muita educação, e.. só dá a planta se era noite, boa noite, se era boa noite... tem que falar que se tem uma planta que tem os horários de pegar né? Se é boa tarde. Se só tem um cálice, só tem um cálice direto e mais galho nenhum, não toca! Não toca! Espera quando ela tiver a disposição de você pegar. As vezes é uma altura que cê não aguenta. Cê vai querer cortar o cálice. Não. L: ai cê vai matar ela atoa. M: é.. ai é proibido né. Aí é... minha mãe me ensinou, se você vai tirar uma casca não tira. Não toca, não tira não da madeira não. Se cê alcança a galha, tira numa galha. Ali cê tira aquela galinha pedindo licença ainda, com educação, que ela é vida! L:uhum M: E ela vai cuidar de que? L: da vida. M: dá vida! Se ela é vida ela vai cuidar de uma vida. Se você não cuida de uma vida como é que ela tem que cuidar de você? L:uhum M: não tem como. Aí ela me ensinou tudo isso, cê ta tirando de uma vida pra cuidar de outra vida. E tem gente que não tem educação, e é ignorante, e é estupido e tudo. Como é ele sempre me xinga eu, e eu Tião ce fica no seu lugar que cê não sabe o que você ta fazendo. Eu to conversando com minhas plantas. Minhas plantas me entende, elas são vida. L:uhum M: ele faz assim e fala “ó a doida, falando sozinha”. Não! To falando sozinha não. To olhando eu to pegando uma folha, ela ta verde, ela tem vida, ela só não tem vida se ela tiver seca. Ai não tem como né. Ai eu converso com minhas plantas, eu saio por ai afora explicando, conversando nó eu não joguei água no cê, cê ta precisando de uma águinha. Nó que judiação.. conversando com ela, cê precisa de vê. Ele acha bravo com eu isso ai ó. Eu saio conversando com ela, e cê que ver matar uma planta! Que tudo quer respeito, cê quer ver matar qualquer tipo de planta, é se ocê levantar, isso ai vc vai ter experiência, é uma experiência muito grande que eu vou passar pra você. Cê levantar e pelo menos nem agradecer a Deus por esse dia, por esse ar que a gente respira, por a gente ter amanhecido num dia maravilhoso. Aí se ocê não falar isso com você mesmo, da onde cê tiver e sair para fora e


55

for cuidar das plantas, as plantas não agradece. A planta morre. Eu tenho experiência disso, você acredita?! Porque, cê você não conversou com você mesmo, cê não corrigiu você mesmo, como é que você vai corrigir a planta? Eu tenho experiência por isso. E muita gente acha que é mentira e é verdade. E outra coisa, se você dorme, se você veste sua roupa pro cê dormir, não convém você sair da.. que você dormiu com a sua roupa pra você ir cuidar ou de uma criação ou de uma planta. Ela sente. Porque é falta de respeito. Dentro da sua casa cê pode tudo, mas imagina se chega uma pessoa, uma comparação, se chega uma pessoa cê vai atender cê ta de camisola ou você ta com uma roupa transparente cê vai atender?! Não, é claro que não né. L: então você não vai atender a planta né?! M: então é a planta! Olha que conhecimento grande que cê buscou hoje. L: Entendi M: Óia, assim mesmo é a planta. Eu durmo com uma camisola ou com uma roupa e essa é de dormir, e serva para dentro do meu ambiente né, que eu vou ficar, não vou sair mais, não vou conversar com ninguém. Agora eu durmo e eu levanto, opa ta tarde, e me esqueço que eu to de qualquer maneira e vou atender as coisas, não. Ela sente que.. eu já matei vários vasos meus. Olha como é que a ciência é grande. O gente porque minha planta tava tão bonita, porque que sentiu, porque que ta morrendo. Ai eu mudei, eu tinha essas manias aí, sair com roupa de e cuidar da planta. Não faz isso. É falta de respeito. Com animal, com planta, qualquer planta. Porque cada canto tem seu canto. Cada lugar tem o seu lugar. L: uhum M: se não serve para mim atender uma pessoa, não vai servir para eu atender uma animal, para eu atender uma planta, por que é falta de respeito. E minha menina veio falar assim um dia também, aconteceu isso com ela. Ô mãe minha planta tava bonita, e ela ta amarelando e ficando feia. Falei assim aé! Ai eu fui explicar para ela. Esperai ai, como é que você levanta, cê chega e da um bom dia para sua planta, ela rio de mim. Cê chega e conversa com sua planta? Ela rio de mim. É isso que ta faltando para a sua planta. E como é que você chega perto dela, cê levanta da cama com a roupa de dormir e tal e tal.. A mão não tem.. eu acho que não tem.. não tem nada haver não mãe. Tem! Muda seu jeito de agir e começa a fazer isso para você ver. L: tem muita gente que acha que é só jogar água né?! M: Isto! É igual um animal. Igual um animal aqui ó, um animal. Eu sempre converso com o Tião. Ô Tião cê tem uma mania que eu não gosto disso. Por os animal no terreiro, tem que ter respeito, tem que saber cuidar, não é só comida, não é só água, tem que dar um remedinho, tem que ver porque que o bicho ta sentido. Né só comida e água não. Cê tem que saber cuidar dos bicho, que eles gosta de mais, igual as galinha tudo, o falei assim ontem, tem que compra remédio. Eu tenho remédio. Eu trato de animal, e de humano, e de animal também tem remédio do mato. Ai o cachorro dele tava sofrendo aquele ataque que eu fale com cê, que eu


56

tava contando (convulsão), verme de mais! E eu vi o bicho e falei ô Tião, ta com verme, verme ta matando ele. Ai vamo ali.. L: ai você deu planta pra eles? M: busquei planta no campo que tem, chama.... como é que chama gente, a madeira gente... L: né canela não? M: não, né não. Ai esqueci o nome da madeira dele gente. L: depois cê lembra. M: Eu esqueci o nome da madeira, ai, esqueci. Praticamente é tanta planta. L: uhum M: Ai eu busquei, fiz, quatro chá e o bicho melhorou. Abriu o apetite, não tava querendo comer. Jogava lá, quer comer come não quer.. Falei não, não é assim não meu filho, cê errado ai! Pode não. Trata! Cê gosta, trata. Se precisa de remédio dá remédio, precisa de ir no médico não, precisa de dinheiro não, comida tem hora, água tem hora, tudo tem que ter respeito. Ai voltando eu falei com a minha menina ela achou graça, minha mãe ta ficando doida, falei não! Acompanha essa doidura da sua mãe pra você ver como é que as coisas vai funcionar! L: vai pra frente né! M: vai funcionar! Ai minha filha.. num é que minha mãe ta certa, ai ela começou a agir do jeito que eu falei com ela, pra fazer a experiência. Mãe minha planta voltou, ta bonita. Cê sabe porque, ela tava contrariada, porque a planta é vida minha filha, tudo tem vida. Cê quer vê, se tiver um tempinho amanhã nós vamos descer ali em baixo. Vou mostrar para você ver. Vou mostrar para você ver que não é.. que é verdade! Tem uma planta, não sei se você conhece, ele chama sangra d’água. L: conheço não M: ele, cê tira uma casquinha dele cê vê o sangue correr na madeira. Cê precisa de ver. Aí tinha umas meninas que.. ela é.. essa planta é que as prostitutas caça muito. L: por que? M: ela é de fazer iodo e é cicatrizante, e é pra apertar. L: aaah entendi. M: procura muito as prostitutas. Então.. é.. eu tava olhando, gente essas mulher fica caçando essas plantas ai eu fui.. é.. olhar no meu livro pra que que era. Que quando eu to e dúvida eu olho né! Ó não é que era isso mesmo? É como diz o ditado, é pra selar. Né, é pra selar. L: pra apertar o trem..


57

M: Ai outro dia eu tava lá... e to Tião olha que pecado, a pessoa vem e tira, tem coragem de tirar um pedaço da planta. Olha pra você vê, você sente, é viva, é viva olha o liquido caindo igual sangue da madeira. Ó amanha eu vou descer la e vou mostrar pra você ver. E é melhor que aquela outra planta que muita gente usa, não sei se você já ouviu falar, barbatimão. L: barbatimão conheço! M: Barbatimão é boa e é perigosa. Porque barbatimão, ela faz aquela cicatriza é rápido. De preferencia se tiver um machucado no corpo. E se ela tiver um machucado no corpo que que acontece, ela sara rápido. Mas sarou a pele, nós por dentro é água, né, ali é a pele, cara aquilo ali o que, cê ta provocando ali no caso um tumor lá dentro. Porque você sarou por fora, e por dentro? Ai vai em vez de ficar melhor vai fazer algo ali né, que não sarou por dentro, sarou por fora. Então essa outra não, essa outra já é mais devagar, ela sara totalmente. Ela puxa a infecção que o barbatimão não puxa. Apenas fecha a infecção por dentro. Barbatimão fecha, essa não essa sara total. E portanto que eu tenho o iodo dela. Que ela é bom para quem faz troço de... L: cutícula? M: é! Que da uma feridinha, eu tenho o iodo dela. Da uma cutícula, da uma machucadinha né. Tira a cutícula ali dá uma machucadinha né! Ai vai passa aquilo ali sara. Mas não deixa a infecção, porque ela puxa a infecção e sara. E o barbatimão ela prende a infecção e não sara. O barbatimão, eu trabalho com ele é praticamente só o sabão. Sabonete de barbatimão. L: uhum M: mas esses outros tipos de remédio eu tenho medo de passar porque muita gente acha é normal e não, eu tenho medo. De preferencia para lavar machucado, não é indicado lavar com barbatimão. Porque o machucado ta muito aberto vai passando e vai puxar a pele vai puxar a carne mas a infecção não puxa. Ai vai sarar com a infecção e ai pode dar outro coisa por fora. Então eu não indico muito. Ai quando eu, quando a pessoa me procura por barbatimão falo assim “aé? Por acaso a barbatimão cê quer para q?” ai a pessoa me fala, “se for para isso e isso tudo bem, agora se for para ferida, algum tumor, eu não passo não. Passo não. Porque a barbatimão ela é bom, igual eu uso o sabonete, eu sei a quantidade que eu coloquei ali. L: uhum M: e o barbatimão se eu passar a casca para você, cê vai usar ela lá do jeito que você quiser. Num é? Ou de contrario eu tenho a seiva do barbatimão, a seiva também é praticamente pra mim fazer o sabonete, eu faço a seiva e faço o sabonete, que eu sei a quantidade que pôs no sabonete. O sabonete o que q acontece, ocê vai usar ele mas cê ta sabendo que que tem nele, que quantidade, num vai provocar nó cê nenhuma, ali não vai uma grande de uma vez, vai lacrando devagarzinho. Depois que você tomar 2-3 banhos ta fazendo devagarzinho, magina ocê com aquele trem igual um uma, uma... acho que nem o café é forte igual ele. Aquele trem.. quando você põe ele, faz a...a seiva dele, ele é igual um mingau, aquele mingauzão, você puxa assim sai seiva assim....Ali é forte de mais cê tem que saber como é que usa. Então


58

aquela seiva ali, eu uso mais para fazer o sabonete. E o sabonete não, o sabonete pode.. e... o sabonete intimo ele pode trabalhar na sua parte intima, ele pode trabalhar numa picada de bicho, né, ele pode trabalhar num machucado, a gente fala, só sabonete intimo porque mais as pessoas trabalha, usa mais para intimo, mas ele pode ser corporal também, o sabonete. As vezes tem algum machucadinho no corpo cê pode usar esse sabonete intimo, é ótimo. Mas eu não indico o barbatimão pra você usar a seiva dele assim não, através dum banho, porque o sabonete intimo ele é pra todo tipo de micose, todo tipo de agitação na pele. O sabonete do barbatimão. Ele só não é bom para usar, igual eu falei com cê pra fechar machucado. Mas picada de bicho, aonde não tem machucado ele é ótimo, pra isso. Porque muita gente as vezes.. ah esse remédio vai ser bom para isso, a menina fala assim ó me arruma o barbatimão.. não arrumo o barbatimão. Se cê achar outra pessoa que conhece a pessoa pode passar pra você, mas eu não faço isso não. Porque são muito perigoso. L: e é, eu admiro isso que você tem respeito pelo que você passa, porque você ta cuidando de outra pessoa, então se der um problema você não pode ser responsabilizar por esse problema. M: não pode! L: é melhor você contra indicar mesmo. M: então por isso que pode ficar: ó D.Maria não passa.. Igual cê falou assim ò D.Maria cê dá receita tal assim... Dou receita, mas assim, do meu jeito. Eu vejo que é uma coisa que não compensa, eu to falando com cê do barbatimão, as vezes, eu não to falando que você conhece... ou as vezes você.. as vezes acostuma.. é.. é.. vê uma pessoa sobre o barbatimão, aí o barbatimão tem essa causa ai mesmo.. agora a sangra d’água ou “mague” que tem dois nomes que ela tem, ela já é diferente, é mais tranquilo. Não dá pra fazer isso ai que eu to te falando com cê, pode banhar.. qualquer tipo de lesão, qualquer tipo de machucado, que ele não vai cicatrizar de uma vez, essa outra, que eu faço o iodo, igual eu falei pro cê do machucado, picada de bicho, essa pomada ai ó mesmo ela tem essa, essa matéria, que é a sangra d’água. Ela tem por que ela.. L: as suas coisinhas você faz, ai você deixa guardado ? M: deixo guardado. L: aí, tem o lugar que você seca as folhas...? M: tenho! Ta é ali, vem cá para você vê, vou mostrar para você ver. Eu nem cabei de arrumar não, porque tava, eu tinha colocado, era.. eu coisava, tinha outro quarto como eu vi que tava muito mal organizado, ta escuro olha! L: ta escurecendo né?! M: tava mal organizado, ai eu pego, ai eu falei assim esse quarto eu vou acabar de preparar, pra mim por as minhas ervas. Sabe? L: uhum


59

M: ai eu coloquei, ai eu deixo fechado por caos ade bicho, praticamente de bicho, de gato, os bichos sabe? L: é bom né, igual você falou que tem que deixar as plantas mais suspensa. M: é! Eu não fecho o quarto todo, eu deixo uma gretinha pra elas.. L: respirar M: é! I minha filha cê precisa de ver, essa Maria é bagunçada, mas num é não, é que eu não cabei de arrumar, sabe, eu to arrumando. Ai cê vê que o quarto to limpinho, novinho, ta vendo! L: uhum M: aqui é ervas, tudo ervas, ta vendo, isso tudo ervas ó! (mostrando.) L: uhum M: ó! Tudo é erva de tratamento! Essa aqui é as tintura mãe que sua mãe faz também, que ta aqui. L: uhum M: no escuro, e ainda tampo. Ai eu deixo aquela gretinha ali sabe, que se fechar tudo minha filha você não aguenta entrar aqui dentro. L: é verdade. M: o cheiro da planta vai! Mesmo assim ô (mostra o saco fechado) o jeito que você ta vendo ai. Ta tudo marcado assim ô. L: tem nome M: tem nome, tudo tem nome. Tudo tem papel dento, tudo. Então é assim, eu vou fazer as prateleiras tudo assim... Terminou de me mostrar todo o espaço e os remédios e plantas que já tinha separado.

CONVERSA SEU LÁZARO (áudio com muito ruído) S: minha mãe foi parteira muitos anos né. L: É! Ela foi parteira?!

DATA: 04/08/2018


60

S: a parteira antigamente era um socorro né. Porque não tinha para onde correr não. Então... as mulher ficavam gravida, não tinha um exame, não tinha um médico, não tinha nada. Aquilo ali era simpatia e benzeção, valia de mais né. Pra cascavel. A cascavel picava uma pessoa cê tinha que fazer benzeção, tinha q benzer. L: e dava certo? SL: Dava certo uê! L: sério mesmo?! SL: certo! Muito certo mesmo! L: e não tem nenhum chá pra picada de cobra não? SL: não, não! (interrupção do neto – áudio não dá para entender). SL: Agora, agora, única coisa que fazia, pegava um torrão de terra e por no lugar. Que a cobra diz que ela puxa o veneno da terra, né, e a terra ajuda a puxar. L: uhum SL: pincipalmente molhando um pouquinho e põe o torrão, mas não aperta o lugar não. L: uhum SL: então, é a benzição. L: e quem que era a benzedeira da região? SL: A minha tia benzia sabe, nunca perdeu ninguém. L: é?! SL: todos que ela benzeu sabe! L: graças a Deus. SL: Tinha uma tal de Maria Vitalino, uma veia, ela benzia uma pessoa engasgada, engasgava e ela benzia, e o engasgo sumia sabe. Agora, hoje não, hoje... o sangue, esse dedo meu aqui ele cortou fora, cortou ele fora na pedra, o vizinho aqui benzeu , foi ate no pronto socorro, fui operar depois do jogo do malvado do Brasil, e graças a Deus o Brasil perdeu (risos), ai... e não saiu mais gosta de sangue. (ruído) Não saiu nem mais uma gota. L: e o senhor ainda faz alguma coisa? De roça? SL: alguma coisa eu faço né, uma roçinha pequena, L: cuida da horta?


61

SL: não a horta é ela, mais ela (referindo a esposa, D. Zeni). Busco lenha na cacunda, L: ainda?!!!! Nossa senhora SL: Agora... o velho é descriminado né. As vezes a pessoa chega para um velho e um novo, ele chama o novo que não sabe o que que é trabalhar, ele não conhece nada, nem suar, nem suar num soa sabe, Ele deixa de chamar o velho pra chamar o novo, L: tem que deixar os velhos descansarem já trabalharam de mais. SL: Não! O velho não pode parar não, se ele parar acabou. Atrofia sabe. L: é verdade SL: Um amigo meu tomou umas pinga e ficou oito dias deitado, não conseguiu levantar mais. L: tem a idade do senhor? SL: não, já morreu. Ele atrofiou sabe, pelejou (ruído)... A gente.. não é preciso dizer que a gente precisa correr não, mas não para não! L: pode parar não SL: se parar piora. A minha mãe trabalhou de mais, de mais da conta. Meu pai, só... só pensava na mulhezada. L: aé?! SL: só na mulhezada! L: não trabalhava na roça não? SL: papai nem, ele ia... ó.. ó.. Ele só jogava para nos ir.. DZ: ele falava que não podia trabalhar não que ele tinha o olho azul! L: aé?!!!! SL: é! (risos) DZ: (gargalhada) L: tem disso? Uai! que negocio é esse?! SL: não, isso aí, isso aí é arrumação desse povo, tina que enchia a bola dele, que ele era muito bonito e aí (risos) L: ai ele aproveitava né! SL: (risos) mas uma vez ele discutiu mais mamãe, uma hora ele falou assim, ocê num é mulher desse tipo, nem um chifre tem coragem de por! Graças a deus! Se vc não tem


62

coragem de por, você toma. (risos) Falou na cara dela assim ó (risos). Papai deixou 11 filhos fora do casamento. L: sério? SL: 11 filhos. Que a gente sabe né! Ele ainda tem uma vantagem , os filhos dele fora do casamento é idêntico ao da família ... eu tenho uma irmã que se por ela junto com uma irmã do casamento tem que prestar a tenção pra saber qual q é qual... (risos + ruído). L: e a mãe do senhor? SL: minha mãe já morreu, todos os dois já morreu. L: e ela só trabalhava em casa? SL: mamãe fazia assim ó.. ó.. ela vendia uma cachaça, vendia uns tira gosto, criava porco, tinha um gadinho, tinha... fazia doce pra vender, aí... mas papai era assim ó... nós mexia com carvão sabe. Essa época não tinha essa policia não.. o meio ambiente vai matar o povo brasileiro de fome, porque, plantar pra colher já num dá, por que a plantação.. a planta produz pouco, agora os bicho vem como e como é que você faz?! L: e o senhor planta alguma coisa aqui? SL: eu planto alguma... uma roçinha. Porque do jeito que ta num tem base... O foguete. Saltar foguetada pra espantar passarinho da roça , ele nem avuar da espiga ele não avoa, nem.. L: solta foguete para assustar passarinho e ele vai embora da plantação? SL: não vai nada não, só dos dois primeiro ele assusta sabe.. L: depois não assusta mais, acostumou! SL: acabou.. ó ó.. maritaca, mico estrela, tucano, quati, porco do mato, capivara.. cê não pode .. tem que acabar com eles. L: coitados... SL: tem que acabar, não tem base... ou então deixa o mundo para eles ué. L: mas o senhor plantava aqui antes? SL: nos já plantamos essa baixada aqui pra cima tudo de milho sabe. Mas chegou um ponto que vc tem que vigiar porque num tem sabe sô, não da não, ta doido L: tem muito bicho na região? SL: essas “truncadas” .. a doença que da á nas galinhas ela busca pro terreiro da gente, toda doença que pega ela traz pro terreiro, dá a doença (ruído)... tem base não ué. Que ela sai comento, ela come no chiqueiro, ela come no curral, qualquer lugar vc acha ela, carrega a doença pro terreiro,


63

L: entendi SL: tem base não. A.. a.. saracura ela hoje como junto com as galinhas da gente, L; os bicho tão ficando manso então SL: ta virando bicho de casa, L: e as plantas que o senhor usa para fazer chá, cê tem aqui na propriedade ou vc vai buscar fora? SL: algumas tem, algumas... agora a maior parte busca fora né... L: é fora? E o senhor já tem os lugares para buscar, alguém traz pro cê ? SL: não. Tem umas que a gente ganha sabe... igual esses dias eu to tomando genciana, L: pra que? SL: pra fígado, pra estomago, pra... L: e o senhor toma como? SL: eu tomo é na pinga, porque eu gosto da minha cachaça, ai une as duas coisas né! L: é! Entendi! (risos) SL: cê quer experimentar? L: não! Obrigada, eu to dirigindo. SL; má o que que tem?! Quando o carro é a álcool (risos – ruído) diz que não pode usar, mas quando o carro é a gasolina não tem problema (risos). L: ah entendi! (risos) DZ: vai nessa (risos) SL: o menina eu tenho um medo de carro. L: é?! você não aprendeu a dirigir não? SL: eu!? Não, nem Deus.. cê é doido! Carro, quando eu vejo um carro, (ruído) quando vou daqui até no asfalto, aqui tem um menino que ele ntra no carro vc não vê o carro, parece que não tem ninguém lá dentro que ele não dá altura (risos)... Tem um outro de uma camionete ali também que eu vou te falar sabe, aquele carro dele foi ele que cuidou, ele que pagou, (ruído) ele vai ate escorado de tão bêbado. Tem uma mulherzinha aí, uma dona que pelo amor de Deus, a mulher não sabe dirigir uma colher de ferro, ta de carro! Eu perguntei o marido dela, me diga uma coisa, vc já fez um plano funerário? Porque essa mulher nesse carro é problema! No jeito que eles vem no asfalto ele vem aqui (ruídos e gritos) Eu tenho medo de um carro viu.


64

L é perigoso, tem que tomar cuidado mesmo. SL: porque velho se quebrar acabou viu. Depois não concerta não viu, L: e o senhor coloca as plantas na cachaça , deixa um tempo e depois toma ela? Ou já coloca e já toma? SL: Eu coloco e deixo ficar uns dois dias sabe, mas eu não deixo a cachaça eu vou bebendo sabe.. L: o senhor toma todo dia? SL: Toda hora, isso aqui é, que ver uma coisa, vou te mostrar como é que ela fica. ZD: ta com casca de mangaba. L: e a senhora toma também? ZD: não cê ta doida! (ruído) L: quando a senhora precisa você faz um chazinho mesmo? ZD: eu uso mais é esses que tem na horta mesmo, é... hortelã, poejo, melissa... L: poejo é pra gripe né? ZD: é L: e a senhora que cuida da horta? ZD: é a horta não ta bonita não... L: nossa aquele tamanho de couve, não ta bonita?! ZD: tava faltando água L: agora tem muita água (estava chovendo) (ruído – neto) SL: aqui como é que a cachaça fica! L: aaah, fica escuro. (ruído) SL: você conhece a genciana? L: conheço (ruído) L: pode tomar ela de chá também?


65

SL: não, o certo... eu só tomei na pinga (ruído). L: e a senhora? Não esta muito ligada nas plantas? DZ: eu faço chá mais quando eu to gripada, pra ele eu faço também quando ele ta nervoso (neto), faço chá daquela melissa. L: cê gosta? N: uhum, eu tomo tudo L: você toma tudo com açúcar? N: não L: sem açúcar? SL: isso aqui é pau santo ó. L: olha só, e você põe na cachaça também? SL: não, esse aqui eu não coloco ele na pinga não sabe por que, eu ponho ele assim na mão esfarelo ele... DZ: pode por ele na água e deixa ai bebe SL: isso aqui é pra gases, pra problema intestinal, pra problema de estomago, pra problema renal, sabe.. L: uhum SL: pessoa que ta com incontinência urinária, ele é muito bom.. L: pau santo... E o senhor tem aqui ou alguém te deu? SL: não, eu busco no mato. (chega a Raquel, filha do seu Lázaro e da dona Zeni.) R: ta muito barro! L: muito barro, você veio a pé de lá? R: uhum R: uai, você não quer sentar não? L: eu tava aqui escorada conversando com seu pai. (risos) R: parece uma bonequinha num parece?


66

DZ: parece! (risos) SL: conhece “bugre”? L: não! Eu não conheço muito de planta não, conheço só as mais comuns. SL: Bugre é remédio assim, é.. ele é remédio pra normalizar a pressão. Tanto a alta quanto a baixa, normaliza. L: normalizar a pressão SL: normaliza. Tem uma, a catita cê conhece? L: não SL: olho de boi? L: não! Olho de boi é uma semente? SL: é uma semente L: conheço! SL: aquilo é um remedão viu L: é, serve pra que? SL: aquilo é remédio pra hemorroida, pra quem tem problema de hemorroida, pobrema de coração, veia entupida, quem teve derrame e ficou com sequela, se tomar olho de boi pelo menos uma vez por mês não tem derrame. (ruído) L: e o senhor toma como? SL: olho de boi? A gente casca aquela casca dele, e corta ele como uma faca, ou uma tampa de caneta, depois toma uma tampa de caneta, ele previne, não deixa dar derrame, ele é um remedão. (ruído) L: uhum. E o senhor costuma tomar remédio normal, remédio de farmácia? SL: tomo duas qualidade de remédio pra diabetes sabe, eu sou diabético, agora o.. o que eu mais tomo é os remédio do mato. A canela de velho pra tirar (ruído), mas é amarga! L: remédio bom é amargo (risos) SL: Jatoba?


67

L: Jatoba eu conheço, fede de mais, aquilo serve pra alguma coisa? R: a fruta só que fede. Ferve a casca dele no leite fica da cor de quik. SL: é a casca. L: ah entendi. Fica vermelha? Fica rosa? R: gostoso de mais. Fica rosa da cor de quik é uma delicia. SL: fica rosa L: é gostoso? R: e dizem que é bom pra tosse! (risos) SL; ele.. ele é expectorante sabe, ele é fortificante pros ossos, não deixa dar osteoporose, pessoa que tem desgaste no osso. L: e essas coisas o senhor foi aprendendo de um, de outro SL: ó.. ó.. aqui tinha um almanaque, depois a casa pegou fogo e queimou sabe, ele ensinava muito remédio do mato, das plantas né, picão, conhece picão? L: conheço picão. SL: aquilo é um remedão pra unha, eu graças a Deus não tenho não (risos) L: ta bom de fígado né, curado na cachaça. SL: (risos) eu não bebo hoje não, eu provo cachaça, agora eu já bebi cachaça que eu fazia assim com a barriga ó, e escutava tro tro (risos) L: (risos) SL: bebia uma meia de cachaça de duas vez. O dia inteiro a noite inteira! L: e aqui perto tem alguma cachaça boa? SL: aqui na vizinha tem. Ela compra 100 litros (risos) hoje eu vou lá encher um litro. E lá uma casa que se eu tenho dinheiro eu bebo, se eu não tenho eu bebo muito mais. L: (risos) então ta na vantagem. SL: ta na vantagem. Agora... a espinheira santa, conhece? L: conheço, tomo muito, eu tenho problema de estomago. SL: cê que curar o problema de estomago? L: quero. Eu tenho muito refluxo. SL: toma barbatimão.


68

L: barbatimão SL; barbatimão cura o estomago de uma maneira sabe, que o estomago ranca a casca. L: que isso? Isso é bom? (risos) SL: ele sara o estomago, ele ranca a casca, uma coisa que ajuda é o limão, o meu saiu L: e como que usa o barbatimão? SL: uai.. o barbatimão eu tomava ele assim, colocava ele numa água fervendo sabe, dentro dum copo, minha filha mais é ruim! Nossa L: é ruim! Nossa! Porque que remédio tem quer ser ruim. SL: agora, agora pra curar , vou te falar pro cê, sara! Ele é um cicatrizante fora do limite sabe. Eu graças a Deus, eu sou diabético, eu machuco e nada ni mim apostema, nada ni mim da (ruído) L: que bom. E os seus filhos algum deles se interessaram pelos conhecimento do senhor ou não/ SL: agora é medico né.. Eu quando eu vejo um médico, médico, padre, policia, político, pra mim é longe de mim. (risos) L: (risos) hoje a chuva atrapalhou eu a conhecer o quintal SL; vai voltar aqui outro dia uai! Agora você sabe onde que é. L: agora eu sei chegar, com dificuldade mas eu sei chegar (risos). L: mas nenhum filho seu pegou gosto pelas plantas não? SL: não, nenhum não. Já é em outro ambiente né, foi criado assim, passava mal levava no médico, ai comprava o remédio da farmácia, L: então quando eles eram menores o senhor não dava nada pra eles não? SL: sempre levou no médico né, agora toma um chazinho ai ... R: é, meu menino tava com as amidalas precisando de tirar né, ai direto dava dor de garganta eu ficava levando no médico e o médico sempre falando que olhar que tinha que fazer cirurgia. Parei de levar, e dou chá de romã (risos). L: e ta dando certo? R: dá! Casca de romã para ele gargarejar. Já tem uns dois anos já que ele não toma antibiótico. Eu levei ele até la em Jaboticatubas, e o médico falou também que vai ter que tirar essas amilhadas dele é muito grande, por isso que dá dor de garganta, mas com a romã deu certo. Ensinei ele a fazer gargarejo, ai toda vez quando começa, as vezes já ta ate com placa e eu dou.


69

SL: tem zopo que ninguém mais conhece. L: qual? R: aquela plantinha fedorenta que dá na beira de quintal que o povo chama de zopo, tem ali ó perto da tenha (apontou). SL: (vários nomes para a mesma planta difícil de anotar). R: deve ser assim, cada um que toma acha ruim e põe um nome diferente (risos) SL: mas é remédio bom de mais viu. R: você mostou ela as sacolas de folha que vc tem lá no tanque? SL: não, mostrei não. L: quem que te dá? SL: eu busco no mato né. L: e o senhor já sabe os lugar que tem? SL: sei. L; já vai direto SL: às vezes cê vai buscar um remédio, cê chega lá num acha nem sinal, o povo ta achando que o campo agora virou laboratório. R: é igual casca de mangaba, um foi lá e falou, casca de mangaba é bom pra quem tem diabete, bom pra abaixar a glicose. Gente, teve um dia que eu fui no mercado central e minha sogra pediu pra mim comprar pra ela, a menina falou comigo assim, nossa to em falta, to esperando chegar, (risos). L: da febre de um negócio! R: dá! SL: ele ranca a casca do pé de mangaba de um jeito que a mangaba morre. Num é assim! L: não sabe tirar né?! SL: não. Num é assim tira, cê que ver, cê chega e tira uma galha dela, por cota de que, aquela galha não vai fazer falta, ele vai brotar. Agora chega e ranca tudo, casca o pau, ate nas ponta lá em cima, e a mangaba morre. É igual a mama de cadela, um remédio igual aquele tinha que preservar ele o máximo que pudesse, vc vai e tira uma raiz, mas deixa um pedaço , um pedacinho assim ele brota de novo. R: você conhece? L: eu já ouvi falar, mas nunca vi a planta.


70

SL: ele é um remédio assim... é remédio pra vitiligo, aquele da mancha. Cura! Cura mesmo sabe. L: eu tenho uma amiga que tem vitiligo, vou falar com ela. SL: tem certeza que é vitiligo? L: tenho SL: é, porque deixa eu te falar, as vezes vc arruma um remédio pra uma pessoa, mas a gente tem que saber o que que a pessoa tem. Por exemplo, principalmente mulher. Porque mulher é tantos problemas que ela tem que como é que cê vai fazer. L: é perigoso ficar indicando né SL: Eu arrumei um remédio prum rapaz (ruído), ele tava todo branqueando assim. Ai eu falei se é vitiligo eu arrumo remédio para vc. Mas tem certeza que é vitiligo. Que o remédio pra vitiligo sabe, só vem lá de Cuba, o que o médico receita. Ai o meu menino deu vitiligo, meu filho mais velho, ai eu levei ele lá no dermatologista e falou tem que pediu o remédio o prefeito pra mandar vim de cuba, não tinha prefeito de santa luzia pra nada, o prefeito de santa luzia não valia de nada. Ai fui e levei ele num homeopata sabe, ele passou esse remédio que tinha em casa, ai sarou sabe. Ai, falei meu menino tomou e sarou, se ocê quiser experimentar, não to receitando pro cê não, to contando que meu filho teve e sarou. Não cê arruma pra mim. Eu arrumei pra ele, ele sarou. Agora tem doença que você não sabe o que que a pessoa tem, quando a pessoa sabe o que que tem, ai a gente sabe mais ou menos a gente que conhece o remédio. (ruído) Igual aquelas pessoas que come e fica inchado, com barrigão. Pau santo. Desinflama o intestino, é um remédio dez. É bom pro estomago, é bom pra garganta... (muito ruído) L: mas você então recebe conhecidos quem vem aqui perguntar o senhor o que que usa. SL: é.. onde me perguntando, falando comigo o que que tem e se eu conheço eu vou buscar o remédio pra ele. L: mas alguém aqui te indica e tudo? SL: não.. não. (muito ruído – falou sobre um problema que tem com verme e como resolveu.). Essas pessoa que fica dando furúnculo, tem o cabo vende tem a caroba, tem a.. L: mas o furúnculo o senhor faz como? Faz uma papinha e coloca no.. SL: não, não. Toma o remédio pra sarar. L: toma? E sara? SL: é.. é. Sara, sara e ele não volta mais. L: eu tenho ate marca de furúnculo. SL: aqui ó, aqui em mim deu um ó, deixa eu te falar, ta vendo a marca dele?


71

L: uhum SL: aí nos fomo trabalhar e toda hora eu machucava, ai tinha uma baiano lá que chama Zé Geraldo.. “à eu vou curar esse negocio seu agora”, “curar com o que rapaz”, “sara, sara”, foi lá rancou um pé de quiabo, daqueles quiabo grosso, sabe, quiabo espinhento, pegou a raiz dele bateu ele , botou num copo pôs água, e mandou eu tomar aquilo, menina a aquela baba nossa (risos) falei “é baiano se não valer de nada” “não, não vc não vai sentir , amanha você já vai sentir melhor.” Sarou e nunca mais abriu. L: coisa boa em SL: agora.. a gente vai conhecendo as coisas e eu gosto muito de usar remédio comigo. Que se eu tomei e não morri, também não vai morrer né (risos) L: (risos) vai que o outro passa mal SL: igual, mulher que da problema de hemorragia, aquela perda de sangue, a... a.. bolsa de pastor. L: a planta chama bolsa de pastor? SL: A planta chama bolsa de pastor. L: conheço ela não SL: aqui, aquele pau comprido lá é bolsa de pastor... você tira aquela casca dela ,bate bem batidinha, põe dentro da água fervendo, deixa esfriar e toma. Cabou a perda de sangue. L: muito bom! E a propriedade aqui é grande? SL: é 36 hectare. L e R: (risos) L: e você faz o que eu com 36 hectares? SL: ué não to fazendo nada porque minha propriedade... L; fica ai o 36 hectares (risos) R: é o pulmão daqui (risos) L; começar a dividir! (risos) SL: sabe porque eu ainda não dividi com os filhos, eu tenho medo deles vender e vim botar porteira aqui perto dá gente L: verdade, vende não! SL: Ó ó ó.. Eu gostaria muito que meus filhos morasse tudo junto comigo, por que ce presta são os meus e se não presta foi eu mesmo que arrumei (risos). Agora não tem jeito, ó pro cê


72

vê, ele vende e põe uma merda perto da gente, vizinho vagabundo nós já tem aqui com sobra. (risos) DZ: vocês vão almoçar com a gente né? L: uai.. vamos!


Issuu converts static files into: digital portfolios, online yearbooks, online catalogs, digital photo albums and more. Sign up and create your flipbook.