Todos os gêneros 2021

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8ª edição [2021]


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TODOS OS GÊNEROS MOSTRA DE ARTE E DIVERSIDADE

8a edição | São Paulo, 2021


Coordenação editorial Carlos Costa Edição Amanda Rigamonti e Thiago Rosenberg Conselho editorial Ana de Fátima Sousa, Carlos Gomes, Galiana Brasil, Juliano Ferreira, Lucas Baliões, Nicole Plascak, Regina Medeiros, Sofia Fan e Tiago Ferraz Projeto gráfico Helga Vaz e Liane Tiemi (terceirizada) Produção editorial Bruna Guerreiro Supervisão de revisão Polyana Lima Revisão DWT Soluções Integradas (terceirizada) Olhares para o infinito (duplas) André Vitor Brandão e Giovanni Venturini; Ave Terrena e Estela Lapponi; Cris Diniz e Juhx Bonfim; Edu O. e Emerson Pontes (Uýra Sodoma); Grupo Mexa e Plataforma Beijo; Jéssica Teixeira e Juão Nyn; Kika Sena e Leandrinha Du Art; e Laryssa Machada e Lee Brandão


SUMÁRIO

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EDITORIAL OLHARES André Vitor Brandão e Giovanni Venturini Ave Terrena e Estela Lapponi Cris Diniz e Juhx Bonfim Edu O. e Emerson Pontes (Uýra Sodoma) Grupo Mexa e Plataforma Beijo Jéssica Teixeira e Juão Nyn Kika Sena e Leandrinha Du Art Laryssa Machada e Lee Brandão


EDITORIAL


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Desde 2013 Todos os gêneros: mostra de arte e diversidade vem pensando a experiência humana a partir de frestas mais ou menos amplas. Por meio de apresentações artísticas, conversas, oficinas e publicações, busca-se promover uma reflexão sobre temas como gênero, corpo, sexualidade e afetividade, isto é, sobre quem somos e como nos entendemos e nos relacionamos. Algumas edições do programa têm suas ações voltadas para uma questão central – a intersexualidade, a vida soropositiva ou as múltiplas masculinidades, por exemplo –, mas, em 2021, Todos os gêneros tenta fazer da fresta janela e propõe olhar para o infinito. Oito olhares, oito janelas: nas próximas páginas estão reunidas oito imagens que representam, de acordo com artistas de diferentes áreas de expressão e regiões do país, um olhar para o infinito. Não o infinito em si, mas o que dele se deixa ver de uma janela ou de um ponto de vista. Os trabalhos foram elaborados por algumas das pessoas que se apresentaram na programação artística do evento, realizada pouco antes do lançamento deste material, em agosto de 2021 – integralmente on-line, como no ano passado. Foi feita a elas uma provocação: trazer um olhar, algo tão pessoal, para o infinito, algo tão além de cada um de nós – e fazer isso em pares, fundindo perspectivas e ensaiando pontos de vista ao mesmo tempo singulares e plurais. Cada dupla teve liberdade para adotar as técnicas, as linguagens e as ferramentas que quisesse: fotografia, desenho, colagem, texto e o que mais coubesse entre as margens desta publicação. Também não deixa de ser um desafio pensar o infinito nestes tempos em que a ideia de finitude se mostra tão ostensivamente presente. Em que o país vive o luto por centenas de milhares de vidas perdidas e por constantes atentados a instituições, figuras públicas e formas de pensar dedicadas às liberdades individuais e ao respeito pela diversidade. No aqui e no agora, o infinito existe sobretudo como potência. E assim é o corpo. Assim são os afetos. E são essas as potências para as quais Todos os gêneros volta o seu olhar. Em itaucultural.org.br é possível acessar conteúdos desenvolvidos em edições anteriores do programa, como depoimentos em vídeo e a versão digitalizada de publicações impressas.


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OLHARES


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ANDRÉ VITOR BRANDÃO

GIOVANNI VENTURINI


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R O

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Como dois artistas que criam uma obra ocupando lugares diferentes, dois corpos celestes dançam juntos, ainda que a distância. Um orbitando a coreografia do outro, uma coreografia se alimentando da outra. Se as margens das páginas permitissem, a dança seguiria infinitamente. O título do trabalho situa-se justamente na dobra entre as páginas, numa dobra no espaço-tempo que permite o encontro entre tantos corpos e lugares. André Vitor Brandão é mestre em educação, cultura e territórios semiáridos pela Universidade do Estado da Bahia (Uneb), especialista em dança, educação e artes cênicas pela Faculdade São Fidélis (FSF) e licenciado em artes visuais pela Universidade Federal do Vale do São Francisco (Univasf ). Atua como gestor e curador de espaços culturais e desenvolve, em Petrolina (PE), um trabalho sistemático de pesquisa e criação em dança contemporânea com a Qualquer um dos 2 Companhia de Dança. Giovanni Venturini é ator, dramaturgo, roteirista e poeta. Sua carreira teve início nos palcos, realizando peças com diretores como Clarisse Abujamra, Marcelo Romagnolli, Mira Haar e Yara de Novaes. Já passou por telenovelas e séries de TV e apaixonou-se pelo cinema ao participar de longas-metragens como Veneza, de Miguel Falabella, Maior que o mundo, de Roberto Marques, e A sogra perfeita, de Cris D’Amato. É autor do livro Anão ser – no espetáculo solo homônimo, reúne poesia, teatro e circo, somados a vivências e experiências pessoais. Giovanni e André aparecem em fotos tiradas por Lívea Castro e Fernando Pereira, respectivamente. Apoio: Nó Movimento em Rede e Qualquer um dos 2 Companhia de Dança.


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AVE TERRENA ESTELA LAPPONI


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Faça-se um favor: recuse a submissão é a afirmação de um desejo infinito de que as coisas se transformem. A espiral é uma linha curva e contínua que parece passar pelo mesmo lugar várias vezes, mas com um deslocamento. Com isso, traz uma profundidade que remete às pessoas com corpos excluídos, rejeitados e destroçados pelo sistema que nos antecederam. Duas frases, uma dita por Ave e a outra por Estela, quando reunidas, formam um mantra repetido circularmente, de forma que a junção de imagem, texto, cor e conceito cria uma possibilidade infinita de transformação. Ave Terrena é escritora, diretora, atriz e professora da Escola Livre de Teatro de Santo André. Integra os grupos Laboratório de Técnica Dramática (LABTD) e Queda para o Alto. Entre os seus trabalhos mais recentes estão Cartas de una travesti brasileña, parte do 5o ciclo de dramaturgia contemporânea escrita e dirigida por mulheres, organizado pela Coordinación Nacional de Teatro de México; Para onde voam as feiticeiras, eleito melhor filme nos festivais de cinema de Vitória e Queer Porto (Portugal); As 3 uiaras de SP city, premiado na 4a mostra de dramaturgia em pequenos formatos cênicos, do Centro Cultural São Paulo (CCSP); E lá fora o silêncio, premiado no edital Peças em Processo do Teatro da Universidade de São Paulo (Tusp); e o livro de poesias Segunda queda, contemplado pelo Programa de Ação Cultural do Estado de São Paulo (ProAC). Tem formação em letras pela Universidade de São Paulo (USP) e integrou o Núcleo de Dramaturgia Sesi-British Council em 2014. Estela Lapponi é performer e videoartista paulistana. Tem como objetivo, na sua investigação artística, o discurso cênico do corpo com deficiência, a prática performativa e relacional e a integração das artes visuais e performáticas. Desde 2009 realiza práticas artísticas em diversas linguagens e teoriza sobre o conceito que criou, “corpo intruso”, e sua performatividade na personagem Zuleika Brit. Em 2011 escreveu o “Manifesto anti-inclusão” e, em 2020, “Saudação aos antepassados DEFs”. Em 2018 dirigiu e produziu seu primeiro curta-metragem, ProfanAÇÃO, contemplado pelo edital de produção de curtas da Spcine e com o qual dá início à sua pesquisa de inserção do recurso de acessibilidade como parte da poética da obra.


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CRIS DINIZ OLHARE

JUHX BONFIM


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Criança viada, adulta, trans ou travesti, seja gênero fluido, fluindo constantemente entre os gêneros que toda a vida seguimos descobrindo. São mais de 7 bilhões de gêneros habitantes deste planeta. Entre os ciclos que vêm e vão como um oito, em um eterno retorno de algo que nunca se repete, a infinita busca pela felicidade e por um reencontro com a infância. No processo de reconstruir um mundo que se foi, a redescoberta e a ressignificação de coisas que foram repetidas em uma infância invadida por verdades que não nos cabem. Manifesto do escapismo é sobre a destruição desses conceitos na recuperação da infância. Cris Diniz possui mestrado em processos criativos na cena contemporânea com recorte em iluminação cênica e corpo, pela Universidade Federal de Ouro Preto (Ufop); graduação em interpretação teatral com formação complementar em artes visuais, pela Universidade Federal de Minas Gerais (UFMG); e licenciatura em artes cênicas pela mesma instituição. Nos processos criativos de que participa, tem como fio condutor estético a dramaturgia visual e suas potencialidades. Juhx Bonfim é trans não binária, gênero fluido, drag queen, artista visual, performer e maquiadora. Natural de Crateús (CE), mora em Teresina (PI). Formanda em artes visuais pela Universidade Federal do Piauí (UFPI), por meio das poéticas visuais, luta pelas causas LGBTQIA+ e contra a gordofobia.


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EDU O.

EMERSON PONTES

(UÝRA SODOMA)


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O que sustenta uma floresta biodiversa sobre um solo pobre senão um rezo ancestral? A ecologia chama de retroalimentação a decomposição e a absorção de materiais orgânicos aos pés das árvores amazônicas. Para nós, indígenas, é mais simples: a mata come de si mesma. Ela produz folhas, frutos, flores, ossos e galhos para, então, comê-los. A floresta cliva o binário da morte e da vida. É o solo, as árvores e todas as vidas integradas num rezo ancestral e infinito. Edu O. é artista da dança, da performance e do teatro, escritor e professor da Escola de Dança da Universidade Federal da Bahia (UFBA). Mestre em dança pela UFBA com especialização em arteterapia pela Universidade Católica do Salvador (UCSal), é doutorando em difusão do conhecimento pela UFBA. Dirige o Grupo X de Improvisação em Dança e é cofundador do Coletivo Carrinho de Mão. Entre os seus trabalhos artísticos, destacam-se: Judite quer chorar, mas não consegue!, Odete, traga meus mortos e Ah, se eu fosse Marilyn!. Com experiência internacional, desde 2004 é artista e produtor do Euphorico, intercâmbio Brasil-França, parceria do Grupo X com a companhia francesa Cir Artmacadam. Emerson Pontes é um artista visual indígena. Formado em biologia e mestre em ecologia, atua como arte-educador em comunidades ribeirinhas. Reside em Manaus (AM), território industrial no meio da Amazônia Central onde se transforma para viver Uýra, manifestação em carne de bicho e planta que se move para exposição e cura de doenças sistêmicas coloniais. Por meio de elementos orgânicos e utilizando o corpo como suporte, encarna essa árvore que anda e atravessa suas falas em fotoperformance e performance. Interessa-se pelos sistemas vivos e pelas suas violações; e, a partir da óptica da diversidade, da dissidência, do funcionamento e da adaptação, reconta histórias naturais de encantaria e de atravessamentos existentes na paisagem floresta-cidade.


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GRUPO MEXA

PLATAFORMA BEIJO


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Corpos e memórias de travestis ocupam as ruas de duas metrópoles. Em Belo Horizonte, integrantes da Plataforma Beijo colocam-se entre as encruzilhadas onde viveu a travesti Cintura Fina para imaginar uma cidade que estampa as memórias de uma multidão. Ao rebatizar a rua com seu nome, erguem seus mitos para essa cidade e geram provocações a respeito das memórias que ocupam as outras. Em São Paulo, o Grupo Mexa reencena um cortejo realizado em setembro de 2016, em que suas fundadoras fizeram uma caminhada entre a Casa Florescer, centro de acolhida onde moravam, e a Casa do Povo, centro cultural que comissionou sua primeira performance. Nesta nova ação, o grupo dividiu o cachê recebido pelo Itaú Cultural com todas as mulheres (em especial, trans e travestis) que atuam como prostitutas na região que quiseram realizar o trajeto. Refazendo aquele caminho, o grupo se depara com novas provocações: ele já não é o mesmo, e a rua também não está igual. Pelo que o grupo caminha agora? O Grupo Mexa foi criado em 2015, após episódios de violência em alguns centros de acolhida em São Paulo. O grupo realiza ações que transitam entre a arte e a política, assumindo lugares de fala e de falha de conceitos que procuram enquadrar corpos e estéticas. É formado por membros da comunidade LGBTT que, a partir de derivas, performances, escritas e protestos, criam obras limítrofes, que não se encaixam em categorias precisas. O coletivo já se apresentou em espaços como Esponja, Casa do Povo, Pinacoteca e Galeria Jaqueline Martins, além de ter participado de mostras como a Verbo, realizada pela Galeria Vermelho, a Bienal Sesc de dança e a Mostra internacional de teatro (MITbr). Em 2019 recebeu o Prêmio Denilto Gomes de Dança na categoria Olhares para Estéticas Negras e de Gênero. A Plataforma Beijo tem como objetivo promover trabalhos artísticos que friccionam as dimensões estéticas, éticas e políticas em sua linguagem. Fundada em 2014, em Belo Horizonte (MG), é uma frente artístico-política de resistência às normas cisgênero e heterossexual. Em sua trajetória estão os trabalhos Não conte comigo para proliferar mentiras, Espécie, Escapulário, Projeto maravilhas e Dança orgia manifesto. Desde 2018 realiza a Quarta kuir, mostra permanente de artes queer. A foto do Grupo Mexa é de autoria de Ivi Maiga Bugrimenko e a da Plataforma Beijo é de André Victor.




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JÉSSICA TEIXEIRA

JUÃO NYN


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A O maracá, aqui, é uma representação do universo. Dele escapam sementes e estas são mundos potenciais, códigos de partida e de acesso a infinitos outros universos reais e virtuais. Jéssica Teixeira é atriz, produtora, diretora e dramaturga. Graduou-se em teatro e fez mestrado em artes na Universidade Federal do Ceará (UFC). Trabalha com as artes da cena desde criança e, atualmente, desenvolve uma pesquisa sobre corpo impossível a partir da investigação de seu próprio corpo estranho, matéria-prima para a criação de seu primeiro espetáculo solo, E.L.A, no qual é atriz, produtora e dramaturga. Juão Nyn é multiartista e atua nos campos da performance, do teatro, do cinema e da música. Membro do Coletivo Estopô Balaio e do Teatro Interrompido – Cia. de Arte, é formado em teatro pela Universidade Federal do Rio Grande do Norte (UFRN) e integra a banda Androyde Sem Par. É autor do livro Tybyra: uma tragédia indígena brasileira, escrito em formato de monólogo teatral.


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KIKA SENA

LEANDRINHA DU ART


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Tido por séculos como um símbolo da perfeição, como o cânone das proporções, o Homem vitruviano de Leonardo da Vinci é atualizado para duas travestis – uma preta e periférica e a outra branca e com deficiência. Como criar uma nova referência, ou novas referências, para a medida de todas as coisas? Pensar no infinito é pensar em possibilidades, e estas existem na diferença. Se o infinito está em algo, é dentro do imperfeito. Kika Sena é arte-educadora, diretora teatral, atriz, poeta e performer residente em Rio Branco, no Acre. Licenciada em artes cênicas pela Universidade de Brasília (UnB), é pesquisadora nas áreas de gênero, sexualidade, raça e classe. Desde 2015 desenvolve pesquisas relacionadas à voz e à palavra em performance de cunho político referente ao corpo da mulher trans e travesti nas cenas teatral e social. Integra a Coletiva Teatral Es Tetetas, com sede em Rio Branco. Leandrinha Du Art é midiativista, escritora, colunista da Mídia Ninja e militante LGBT e PcD (Pessoa com Deficiência). Graduanda de teologia e pesquisadora na área de filosofia, nos últimos anos, tornou-se o rosto referência nas pautas de sexualidade e gênero para PcDs e LGBT.


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LARYSSA MACHADA

LEE BRANDÃO


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OLHARES

Vento forte é vendaval demonstra a visão infinita dos movimentos corporais e da liberdade para transitar em diferentes tempos: passado, presente e futuro. Os corpos se movimentaram, se movimentam e infinitamente se movimentarão através das capturas de pulsação de movimento. A obra evidencia isso com cores e texturas que se entrelaçam em grãos com fluidez, trazendo a sensação de amplitude também com temas e sombras e resultando na expansão do movimento. Laryssa Machada é artista visual, fotógrafa e cineasta. Nascida em Porto Alegre (RS), atualmente vive em Salvador (BA). Constrói imagens como rituais de descolonização e novas narrativas de presente e de futuro. Estudou jornalismo, ciências sociais e artes; aprendeu um tanto mais com a cadência bonita do samba. Seus trabalhos discutem a construção de imagem sobre LGBT, indígenas e povo da rua. Lee Brandão é artista. Iniciou sua carreira aos 5 anos de idade, cantando em igrejas. Por volta dos 17 anos, tornou-se o primeiro instrutor de capoeira com deficiência do Distrito Federal (DF) e também começou sua trajetória na dança. Passou a ministrar aulas de danças urbanas e a atuar como coreógrafo e bailarino para algumas drag queens. É a primeira drag queen com deficiência do DF.


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Memória e Pesquisa | Itaú Cultural Todos os gêneros: mostra de arte e diversidade / organização Itaú Cultural. - 8. ed. – São Paulo : Itaú Cultural, 2021. 15 Mb ; PDF Evento realizado no período de 04 a 13 de agosto de 2021. ISBN 978-65-88878-25-5  1. Gênero. 2. Sexualidade. 3. Corpo. 4. Artes visuais. 5. Artes cênicas. 6. Evento de arte – catálogo. I. Instituto Itaú Cultural. II. Título. CDD 306.76 Bibliotecário Jonathan de Brito Faria CRB-8/8697


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