TRABALHO FINAL DE GRADUAÇÃO 1

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UNIVERSIDADE DE FORTALEZA CENTRO DE CIÊNCIAS TECNOLÓGICAS ARQUITETURA E URBANISMO

TRABALHO FINAL DE GRADUAÇÃO

OCUPAR PARA PRESERVAR: INFRAESTRUTURA VERDE PARA NOVAS FORMAS DE HABITAR A CIDADE

RAYANARA RODRIGUES SANTOS FORTALEZA, 2018



UNIVERSIDADE DE FORTALEZA CENTRO DE CIÊNCIAS TECNOLÓGICAS ARQUITETURA E URBANISMO

TRABALHO FINAL DE GRADUAÇÃO

OCUPAR PARA PRESERVAR: INFRAESTRUTURA VERDE PARA NOVAS FORMAS DE HABITAR A CIDADE

TRABALHO DE CONCLUSÃO DE CURSO APRESENTADO À CORDENAÇÃO DE ARQUITETURA E URBANISMO DA UNIVERSIDADE DE FORTALEZA, COMO REQUISITO PARCIAL PARA A OBTENÇÃO DO TÍTULO DE ARQUITETURA E URBANISMO

Orientação por: Fernanda Claudia Lacerda Rocha

RAYANARA RODRIGUES SANTOS FORTALEZA, 2018


Ocupar para preservar:

Infraestrutura verde para novas formas de habitar a cidade

Ficha catalográfica da obra elaborada pelo autor através do programa de geração automática da Biblioteca Central da Universidade de Fortaleza

Santos, Rayanara. Ocupar para preservar : Infraestrutura verde para novas formas de habitar a cidade / Rayanara Santos. - 2018 89 f. Trabalho de Conclusão de Curso (Graduação) - Universidade de Fortaleza. Curso de Arquitetura E Urbanismo, Fortaleza, 2018. Orientação: Fernanda Rocha. Coorientação: Newton Moura. 1. Infraestrutura verde. 2. Preservação. 3. Recuperação. 4. Integração. 5. Parque urbano. I. Rocha, Fernanda. II. Moura, Newton. III. Título.

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TRABALHO FINAL DE GRADUAÇÃO

OCUPAR PARA PRESERVAR: INFRAESTRUTURA VERDE PARA NOVAS FORMAS DE HABITAR A CIDADE BANCA EXAMINADORA

Profª. Ma. Fernanda Claudia Lacerda Rocha ORIENTAÇÃO

Profª. Camila Bandeira Cavalcante

Arq. e Urb. Rebeca Gaspar Maia

Fortaleza, 15 de junho de 2018

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Ocupar para preservar:

Infraestrutura verde para novas formas de habitar a cidade

tempo.

.AGRADECIMENTOS Primeiramente a Deus, a quem eu devo todas a minhas conquistas, pois sem a sua misericórdia e graça sei que nada teria sido possível. Aos meus pais, por serem meu maior exemplo de perseverança, pelos princípios ensinados, pelo apoio e dedicação, por sempre acreditarem e confiarem no meu potencial, e por me proporcionarem condições para realizar esse sonho. Aos meus irmãos, Rayanne e Robson, pelo incentivo, por me acompanharem durante toda a minha caminhada e por confiarem no meu potencial. Ao meu namorado, Rodrigo Dias, com quem eu tenho o privilégio de compartilhar meus dias. Obrigada pelo carinho, encorajamento e força nas diversas vezes em que quis fraquejar, por acreditar em mim mesmo quando nem eu mesma acreditei, pela cumplicidade e pela paciência infindável em me ajudar e compreender o misto de sentimentos durante todo esse processo. Aos meus amigos mais antigos de infância, em especial a Carol Cleophas, Joabe Soares, Bárbara Delgado, Andrezza Dantas e Rafaela Medeiros, por não desistirem de mim, por tentarem me animar nos momentos em que mais precisei, e por compreenderem o sumiço durante todo esse

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Aos meus amigos de curso, que me acompanharam e enfrentaram comigo os momentos tão puxados e desafiadores que o curso oferece, obrigada pelos risos, conversas, companheirismo nas noites viradas, e por tornarem essa caminhada tão dura mais leve. Luana Costa, Shaiane Viana, Fernanda Marjore, Viktor Araújo (até mesmo quando longe, se fez presente), Davi Callou, Victor Seledônio, Angélica Abreu, Roberta Dultra, Marjorie Martins, Mateus Felipe, Tatiana Mendes, Yuri Vianna, Nathália Martins, vocês se tornaram amigos para a vida toda. A minha orientadora, Fernanda Rocha, pela profissional incrível que ela é, pela sabedoria compartilhada, por estimular sempre o contínuo conhecimento e aprendizado, e por ter acreditado em mim, mesmo chegando de forma tão repentina nessa última etapa. Ao meu co-orientador, Newton Becker, agradeço pelo acompanhamento durante os primeiros meses, por compartilhar seus conhecimentos e experiência, pela paciência e confiança, e pelo encorajamento em querer se destacar e ser um arquiteto que busca novas metas e conhecimentos. Por fim, à banca examinadora, por aceitar o convite e se dispor a contribuir na discussão desse projeto


.RESUMO

.ABSTRACT

Grande parte da população de Fortaleza reside em áreas de ocupações informais. Baseando-se no fato de que a maioria dessas habitações ocorrem em áreas consideradas ambientalmente frágeis, este trabalho busca construir um equilíbrio entre o espaço ambientalmente sensível e o espaço construído. A proposta deste estudo prevê a recuperação do espaço ambiental, tendo como base a comunidade Guaribal, localizada às margens da Lagoa da Taperoaba e situada no bairro Serrinha, na cidade de Fortaleza. A infraestrutura verde foi adotada como estratégia principal, respeitandose ainda um limite hídrico seguro. Além disso, foi dada suma importância à preservação de espaços ambientalmente frágeis a partir do convívio entre eles e regiões ambientalmente sensíveis, caracterizadas principalmente pela comunidade local, objetivando-se, portanto, reduzir a vulnerabilidade desses territórios e recuperar as áreas ambientalmente analisadas. A partir do projeto de um parque urbano, este estudo fundamenta-se na criação de um espaço integrado à comunidade local que coopere para a preservação ambiental, tendo como partido a reintegração do recurso hídrico (a lagoa), à paisagem local.

A great percentage of Fortaleza population lives in areas marked by informal occupations. Based on the fact that a majority of those habitations occur in enviromentally fragile areas, this study focus on building a balance between an enviromentally sensitive area and the built space. The main goal of this present study lies on the recovery of the enviromental space, based on the Guaribal Community, situated at the shores of the Lake Taperoaba, in the district of Serrinha, at the city of Fortaleza. The concept of Green Infrastructure was adopted as main strategy, respecting the limits of secure hydric boudaries. Besides that, it was given significant importance to the preservation of spaces considered enviromentally fragiles, from a process of socializing between the community and those areas, characterized specially by the local community, therefore, viewing an opportunity to reduce the vulnerability of those territories and to recover the analyzed areas. Starting from the project of an urban park, this study lies on the creation of an integrated space with the local community that cooperates to the enviromental preservation, based on the concept of the reintegration of the hydric resource (the lake) with the local landscape.

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Ocupar para preservar:

Infraestrutura verde para novas formas de habitar a cidade

.LISTA DE SIGLAS

.LISTA DE IMAGENS

APP – Área de Preservação Permanente

MAPA 01: Sobreposição entre áreas de sensibilidade ambiental e os assentamentos precários.

IBGE - Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística IEV – Infraestrutura verde LUOS – Lei de Uso e Ocupação do Solo

IMAGEM 01: Comunidade Guaribal localizada em área considerada de risco.

PLHIS - Plano Local de Habitação de Interesse Social

IMAGEM 02: Condomínio residencial, localizado próximo a lagoa da Sapiranga, em Fortaleza, Ce.

RMF - Região Metropolitana de Fortaleza

TABELA 01: Serviços ambientais.

ZPA – Zona de Preservação Ambiental

IMAGEM 03: A infraestrutura verde conecta ecossistemas e paisagens em um sistema de hubs, links e sites.

ZRU – Zona de Requalificação Urbana

TABELA 02: Tipologias de elementos da infraestrutura verde (IEV). MAPA 02: Localização da comunidade Garibaldi. MAPA 03: Uso e Ocupação do solo da área de intervenção e do seu entorno imediato. MAPA 04: Classificação viária da área de intervenção e do seu entorno imediato. IMAGEM 05: Quadra de areia, localizada dentro do limite da comunidade Guaribal.

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IMAGEM 04: Ocupação comunidade Guaribal. GRÁFICO 01: Dados Socioeconômico referentes a comunidade Guaribal. GRÁFICO 02: Acesso à infraestrutura na comunidade Guaribal. MAPA 05: Localização da lagoa Taperoaba. IMAGEM 06: Acúmulo de lixo nas proximidades da lagoa Taperoaba IMAGEM 07: Acúmulo de lixo na comunidade Guaribal IMAGEM 08: Habitação locada sobre o riacho da lagoa Taperoaba. IMAGEM 09: Acúmulo de lixo e esgoto em valas a céu aberto.

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.SUMÁRIO Agradecimentos .CAPÍTULO 01 Reflexões iniciais

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1. Introdução e justificativa 1.1. Antecedentes da proposta 1.2. Um breve panorama de Fortaleza 1.3. Relevância do tema 2. Objetivos 2.1. Objetivos gerais 2.2. Objetivos específicos 3. Metodologia

.CAPÍTULO 02 Referencial teórico

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4. Referencial teórico 4.1. Proteção ou segregação? 4.1.1. Legislação ambiental 4.1.2. Segregação urbana 4.2. A paisagem como infraestrutura 4.2.1. Importância da Paisagem na Vida Urbana 4.2.2. Infraestrutura Verde como Paisagem

.CAPÍTULO 03 Diagnóstico 5.1 ÁREA DE INTERVENÇÃO 5.1.1 Uso e Ocupação do Solo 5.1.2 Mobilidade Urbana 5.1.3 Condicionantes Legais 5.2 A COMUNIDADE 5.2.1 Ocupação 5.2.2 Aspectos Socioeconômicos e de Infraestrutura 5.3 A LAGOA 5.3.1 Análise Hídrica 5.3.2 Análise Volume de Chuvas

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.CAPÍTULO 04 Memorial Justificativo

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6.1 Conceito 6.2 Plano de infraestrutura verde

.CAPÍTULO 05 O projeto

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7.1 Partido Habitações Parque urbano Implantação geral

Considerações finais

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REFLEXÕES INICIAIS


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.INTRODUÇÃO E JUSTIFICATIVA 1.1. Antecedentes da proposta

Este trabalho foi desenvolvido a partir do interesse em estudar uma temática relacionada a uma parcela da cidade que habita regiões conhecidas como cidades ilegais, ou informais (áreas não reconhecidas pelo poder público do ponto de vista urbanístico). Além disso, a constatação de que a maioria dessas habitações estão localizadas em áreas ambientais foi outro fator que motivou a construção deste trabalho, o qual discorre acerca da possibilidade de se construir um equilíbrio entre o espaço ambientalmente sensível e o espaço construído (ROLNIK, 2006). O mapa 1, mostrado a seguir, apresenta a sobreposição entre as áreas ambientalmente sensíveis e os assentamentos precários na cidade de Fortaleza. A partir de dados disponibilizados pelo Diagnóstico Geoambiental de Fortaleza e o Plano Local de Habitação de Interesse Social (PLHIS), é possível concluir que há um número significativo de áreas protegidas pela lei, geralmente margens de riachos e lagoas, que se encontram sujeitas a ocupações irregulares. O resultado é que cerca de 66,6% dos assentamentos precários estão localizados em áreas ambientalmente frágeis (FREITAS, 2014). Em relação ao processo de ocupação territorial,

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existe uma discrepância entre o que é preconizado em lei e o que de fato ocorre. A Lei Federal nº 10.257/01, denominada Estatuto da Cidade, “estabelece normas de ordem pública e interesse social que regulam o uso da propriedade urbana em prol do bem coletivo, da segurança e do bem-estar dos cidadãos, bem como do equilíbrio ambiental”. Esta lei compreende significativos direitos e instrumentos urbanísticos e sociais. De tais direitos são estabelecidas garantias “... à terra urbana, à moradia, ao saneamento ambiental, à infra-estrutura urbana [...] para as presentes e futuras gerações”, conforme o inciso I, do art.2º, do Estatuto da Cidade. Diante de tal contexto é possível indagar: por que a realidade que observamos é tão destoante do que é preconizado em lei? A partir dessa questão, gerou-se um interesse em estudar e entender o que é descrito por Martins (2006, p. 11) como “tensão entre o lugar de moradia e a proteção das áreas ambientalmente sensíveis”, questionando-se o porquê desses dois temas serem vistos de maneira segregada. Além disso, há a necessidade de repensar os limites do que é protegido ou não, pois “ao impedir ou restringir a urbanização de grande parte das áreas ambientalmente protegidas, a legislação ambiental acaba por potencializar a degradação de ecossistemas importantes” (FREITAS, 2014, p. 114).


ReflexĂľes iniciais MAPA. 01| Comunidade Guaribal localizada ente em ĂĄrea considerada de risco. Fonte: Produzida pela autora, a partir de Dados do Google Earth.

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Portanto, ao perceber a necessidade de uma solução frente ao dilema da questão ambiental versus o acesso a moradia por parte da população de baixa renda, este trabalho tem como intuito contrapor o sistema baseado em um urbanismo excludente e demonstrar a possibilidade de ocupação de tais territórios sujeitos a riscos ambientais, dentro de um limite de segurança hídrica, ao mesmo tempo que é mantida a função ecológica dessas regiões.

1.2. UM BREVE PANORAMA EM FORTALEZA A Região Metropolitana de Fortaleza (RMF) é formada por 15 municípios e ocupa uma área de cerca de 580 mil hectares. Além disso, apresenta uma população de 3,6 milhões de habitantes, que se dividem em cerca de um milhão de habitações, sendo 68% do total encontrado no município de Fortaleza (IBGE, 2010). Porém, essa distribuição é feita de maneira desigual e desorganizada. Segundo dados da Fundação João Pinheiro (2016), coletados no ano de 2014, o déficit de unidades habitacionais da RMF correspondia a 123.644, das quais 87,2% das unidades correspondem a população com até três salários mínimos. O mesmo documento da Fundação João Pinheiro (2016) mostra dados referentes a domicílios vagos em condições de serem ocupados, tendo um número de 132.453 habitações propícias para uso na Região

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Metropolitana de Fortaleza, o que comprova que a demanda por habitação pela população de baixa renda não é atendida pelo mercado imobiliário, já que ele tem como foco principal um público de a classe média e alta. Sendo assim, as famílias de baixa renda tendem a recorrer a locais desprezados pela cidade formal, os quais são desfavoráveis a urbanização, ou seja, elas se deslocam para áreas de maior sensibilidade ambiental, onde, no caso de Fortaleza, situam-se às margens inundáveis de rios e lagoas urbanas (FREITAS, 2014). A comunidade Guaribal, alvo desta análise, constitui um exemplo desse tipo de ocupação “não planejada”, onde grande parcela das habitações encontra-se às margens e até mesmo sobre o riacho da lagoa Taperoaba, mostrado na imagem 1 a seguir. Esse cenário serviu de base para a busca por uma ocupação adaptativa que congrega os fatores ambiental e social.


ReflexĂľes iniciais IMAGEM. 01| Comunidade Guaribal localizada ente em ĂĄrea considerada de risco.Earth. Fonte: Produzida pela autora, a partir de Dados do Google Earth, 2010.

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1.3. RELEVÂNCIA DO TEMA A degradação ambiental, compreendida como “a alteração adversa das características do meio ambiente”, segundo a Lei nº 6.938 de 31 de agosto de 1981 que institui a Política Nacional de Meio Ambiente, acomete de forma progressiva o espaço urbano de países subdesenvolvidos, expandindo-se mediante a intensificação da urbanização no ambiente construído (PEQUENO, 2003). Os impactos dessa degradação tornam-se mais evidentes e pesam sobremaneira às áreas naturais identificadas por sua fragilidade ambiental. Tais regiões são caracterizadas por sua difícil urbanização, haja vista sua proximidade a recursos hídricos. Portanto, encostas íngremes, beiras de córregos e áreas alagadiças, compõem territórios vistos como desfavoráveis à urbanização, consequentemente se tornando oportunidades de ocupação por parte da população de baixa renda (ROLNIK, 2000). Essas condições de precariedade de acesso à moradia estão diretamente ligadas a um abandono Estatal, e, consequentemente, a um déficit de políticas públicas, o que faz com que, na disputa por um espaço urbano, os mais frágeis sejam levados a construir suas casas de maneira informal (MARTINS, 2006). Outro ponto a ser analisado é a divergência social na utilização dos espaços. Enquanto uma

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IMAGEM. 02| Condomínio residencial, localizado próximo a lagoa da Sapiranga, em Fortaleza, Ce.. Fonte: Produzida pela autora, a partir de Dados do Google Earth, 2010.


ReflexĂľes iniciais

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parcela da cidade formal utiliza essas áreas para fins de especulação imobiliária, outra parcela não reconhece a utilização de áreas protegidas como valorização de empreendimentos imobiliários voltados para a população de classe média e alta. Exemplo desse cenário são os condomínios localizados próximos a Lagoa da Sapiranga (imagem 2), na cidade de Fortaleza, onde é possível notar uma barreira física (muros) entre o imóvel e a lagoa, fazendo com que o potencial ambiental e paisagístico da região não seja usufruído pelo empreendimento.

Guaribal, uma comunidade segregada do restante da cidade, localizada às margens e sobre o riacho da lagoa Taperoaba. Este estudo propõe a recuperação e requalificação de um espaço ambientalmente e socialmente sensível, respeitando um limite hídrico seguro e tendo como forte elemento a infraestrutura verde (IEV). Em resumo, este estudo objetiva a preservação de espaços ambientalmente frágeis, a partir do convívio entre eles e a comunidade local, reduzindo a vulnerabilidade desses territórios e requalificando a área analisada.

Nesse contexto, este estudo tem a intenção de propor uma nova maneira de ocupação das margens de riachos e lagoas, tendo como base que a legislação vigente não tem sido suficiente para assegurar a proteção e preservação desses espaços. Utiliza, portanto, uma visão sistemática, em que a questão ambiental e urbanística serão analisadas mutuamente, a fim de solucionar o cenário da exclusão de uma parte da população que tende a ser segregada do restante da cidade, e garantir o uso adaptado aos espaços ambientalmente frágeis que se encontram desprezados.

2.2. OBJETIVOS ESPECÍFICOS

.OBJETIVOS

- Facilitar o acesso da comunidade a áreas de lazer e convívio.

2.1. OBJETIVOS GERAIS

Este trabalho tem como foco a reconciliação do espaço ambiental com o espaço construído, a partir do conhecimento do cenário da comunidade

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- Levantar dados legislativos acerca das questões urbanísticas e ambientais vigentes. - Estabelecer um novo limite seguro às margens do recurso hídrico, e comparar à Zona de Preservação Ambiental. - Elaborar um diagnóstico da área em que o projeto será implantado, para que sejam analisados aspectos históricos, socioeconômicos e culturais. - Estimular a relação da comunidade com o recurso hídrico.

- Mostrar que é possível haver uma descentralização das soluções de manejo de água. - Apontar diretrizes para moradias localizadas em áreas de risco.


Reflexões iniciais

.METODOLOGIA Para a construção deste projeto, a metodologia foi dividida em três etapas. A primeira delas se refere à revisão bibliográfica, em que foi feito um levantamento dos livros, artigos, teses, e leis urbanísticas e ambientais vigentes, presentes na legislação federal e municipal. Estes dados serviram de base para a elaboração de um referencial teórico consistente com a intenção de alcançar a compreensão acerca das questões previamente levantadas. Foi optado por abordar somente as leis federais e municipais, uma vez que, além da importância de se ter um panorama geral da legislação do país, sabe-se que, hoje, a jurisprudência determina que dentro de áreas urbanas, a legislação a ser seguida deve ser a mais específica, e não a mais restritiva, ou seja, a legislação municipal.

A terceira e última etapa consiste na definição dos elementos e produção da proposta final do projeto, a fim de alcançar o objetivo geral estabelecido no trabalho. TABELA. 01| Esquema de objetivos da Pesquisa. Fonte: Elaborado pela

A segunda etapa é referente a realização do diagnóstico da área estudada neste trabalho, levantando-se dados acerca da comunidade Guaribal, a partir de entrevistas e visitas de campo. Além disso, foram analisados dados da hidrografia local referentes a lagoa Taperoaba, a partir do estudo da bacia, para que fosse possível a realização dos dados pluviométricos e a subsequente delimitação da área de segurança hídrica no local estudado.

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REFERENCIAL TEÓRICO


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.REFERENCIAL TEÓRICO 4.1. Proteção ou segregação?

Este trabalho trata de uma questão socioambiental, uma vez que aborda a presença de assentamentos populares, os quais, em sua maioria, são precários e não regulamentados, construídos em locais ambientalmente frágeis. Protegidos por lei, esses locais são interditados à habitação e desvalorizados por parcela significativa do mercado imobiliário, sendo excluídos da cidade formal. Logo, passam a compor um quadro em que a precariedade urbana e ambiental coexistem (MARTINS, 2006). Portanto, a fim de compreender o cenário abordado, e questionar a eficiência dessa legislação, é necessário compreender o que está decretado em legislação federal e municipal, especialmente no tocante à proteção do ambiente e dos recursos hídricos, e a sua consequente reflexão na cidade.

4.1.1. LEGISLAÇÃO AMBIENTAL No Brasil, o termo proteção ambiental foi previamente entendido como a proteção de ecossistemas de valores estéticos e culturais. Tal ideia foi defendida por naturalistas que lutavam pela preservação de uma parcela da natureza que deveria permanecer intocada, sob a égide da

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aprovação do primeiro Código Florestal Brasileiro, promulgado em 1934 (MARTINS, 2006). Hoje, a Lei nº 12.651/2012, tida como Código Florestal, defende uma preservação que vai além dos valores estéticos, e contempla normas gerais acerca da proteção e manutenção do ambiente natural, definidos como “áreas de preservação permanente” e “áreas de reserva legal”. A Área de Preservação Permanente (APP) é definida pelo Código Florestal, no art. 3º, inciso II, como “área protegida, coberta ou não por vegetação nativa, com a função ambiental de preservar os recursos hídricos, a paisagem, a estabilidade geológica e a biodiversidade, facilitar o fluxo gênico de fauna e flora, proteger o solo e assegurar o bem-estar das populações humanas”. Além disso, esta mesma lei, no art. 4º, estabelece a largura mínima da APP de acordo com a largura do curso d’água, tendo como limite mínimo 30 metros e podendo alcançar até 500 metros de largura. Esses valores são medidos a partir do limite do curso d’água, delimitando, assim, o espaço em que não poderá haver qualquer tipo de intervenção, defendendo a ideia de que enquanto esses espaços permanecerem sem ocupação, aspectos como a vegetação local, os recursos hídricos e a paisagem se manterão protegidos ambientalmente. Por outro lado, o artigo 65 do Código Florestal, Lei nº 12.651/2012, afirma que ao se tratar de “regularização fundiária de interesse específico


Referencial teórico dos assentamentos inseridos em área urbana consolidada que ocupem área de preservação permanente não identificadas como áreas de risco”, a largura mínima da faixa não edificável passa a ser 15 metros do curso d’água (ANTUNES, 2015, p. 90). Porém, o Código Florestal não especifica a partir de que ponto se inicia a contagem do limite do curso d’água. Ele estabelece, no art. 4º, que a contagem é realizada “desde a borda da calha do leito regular”, mas não define de forma precisa o que é o leito regular. Além disso, a lei reforça questionamentos acerca do início de tal limite, e das condições que o curso d’água apresenta, uma vez que tal delimitação poderia ser medida a partir de um rio em condições de cheia ou de seca, ou poderia também estar relacionada à vazão máxima, mínima ou média do recurso hídrico em questão. Diante de tais questionamentos, foram realizadas pesquisas com base no Plano Diretor de Fortaleza, na Lei de Uso e Ocupação do Solo de Fortaleza (LUOS) e na Lei nº 9.443/ 1997, nomeada como a Lei dos Recursos Hídricos, haja vista constituírem acervo pertinente para a elucidação do quadro. O Plano Diretor de Fortaleza, Lei Complementar nº 062/ 2009, em seu art. 59, também discorre acerca de áreas voltadas para a “proteção, preservação, recuperação ambiental e ao desenvolvimento de usos e atividades sustentáveis”, dividindo essas áreas em zonas, e tendo como a mais restritiva a Zona de Preservação Ambiental (ZPA).

O art. 63 do Plano Diretor de Fortaleza define a ZPA como uma zona destinada a preservação dos ecossistemas e recursos naturais, subdividida em três subzonas: a ZPA 1 (Faixa de Preservação Permanente dos Recursos Hídricos), ZPA 2 (Faixa de Praia) e a ZPA 3 (Parque Natural Municipal das Dunas de Sabiaguaba). O art. 66, da mesma Lei, estabelece, no primeiro parágrafo, a proibição do parcelamento do solo na Zona de Preservação Ambiental, e do inciso I ao VI estão determinados os parâmetros da ZPA, sendo eles: I - índice de aproveitamento básico: 0,0; II - índice de aproveitamento máximo: 0,0; III - índice de aproveitamento mínimo: 0,0; IV - taxa de permeabilidade: 100%; V - taxa de ocupação: 0,0; VI - altura máxima da edificação: 0,0. Portanto, fica vetado pela lei qualquer tipo de construção nas áreas demarcadas como Zonas de Preservação Ambiental. Reafirmado também pela Lei nº 236/ 2017, Lei de Uso e Ocupação do Solo de Fortaleza (LUOS), onde o art. 103 decreta que “não será permitido o parcelamento do solo, tampouco a edificação, na Zona de Preservação Ambiental (ZPA), sendo permitido apenas uso indireto dos recursos naturais”. Para tanto, sabe-se que a legislação ambiental

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que prevalece dentro das áreas urbanas é a legislação mais específica, ou seja, a municipal. Portanto, a delimitação das áreas de preservação em Fortaleza deve seguir os critérios das ZPA’s previamente citados. Porém, foi constatado que a única lei que aborda diretamente as medidas das áreas ambientalmente protegidas é o Código Florestal, uma vez que nem mesmo a Lei nº 9.443/ 1997, a qual institui a Política Nacional de Recursos Hídricos, aborda a questão do limite do rio e de medidas referentes às áreas voltadas para a proteção ambiental.

4.1.2. SEGREGAÇÃO URBANA A partir do momento em que as zonas e limites de proteção legislativos são demarcados, definemse áreas voltadas somente para a preservação ambiental existente, as quais em geral são privadas de infraestrutura de saneamento e drenagem, além de não terem planejamento de contenção de erosão. Portanto, esses espaços se tornam desvalorizados para o mercado imobiliário, o qual volta seus investimentos para outras áreas da cidade, investindo em habitações de média e alta renda, com baixo interesse em atender a demanda por habitações populares (MARTINS, 2006). É válido citar outros fatores que reforçam a contribuição para o processo de ocupação dos espaços ambientalmente sensíveis, como: a carência das políticas habitacionais de baixa

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renda, a pressão por habitações de baixo custo, o crescente aumento do valor dos terrenos bem localizados, a baixa qualidade do transporte público nas áreas mais afastadas, o insuficiente controle urbanístico pelo Estado e as vantagens locacionais destes espaços com relação à periferia (FREITAS, 2009). Logo, é possível constatar que essa legislação restritiva, aliada ao desinteresse de parcela do mercado imobiliário, tem cooperado para consequências que se contrapõem ao discurso de preservação e resguardo referentes às questões do ambiente e dos recursos hídricos. A ausência de investimentos nesses espaços, como em serviços de infraestrutura, aliado ao difícil acesso a moradias de baixa renda, agravam o problema ambiental nas comunidades localizadas nas APP’s e em suas proximidades (MARTINS, 2006; PEQUENO, 2003). Por conta da indeterminação da permanência dos moradores, as instalações de redes de esgoto são, muitas vezes, adiadas ou anuladas pelo poder público. Como resultado, ocorre a contaminação dos recursos hídricos e do solo, acarretando riscos à saúde da população local e do restante da cidade, uma vez que esses locais também referenciados como corredores de degradação são capazes de deixar marcas de deterioração ao longo dos sistemas hídricos e das áreas diretamente influenciadas por eles (MARTINS, 2006; PEQUENO, 2003). Esse fato reforça a questão de um urbanismo


Referencial teórico de risco, o qual é “marcado pela inseguridade quer do terreno quer da construção ou ainda da condição jurídica da posse daquele território” (ROLNIK, 2000, p. 02). Esse fenômeno pode ser entendido de forma local ou difusa. Localmente, um possível cenário decorrente desse quadro, ocorre quando desmatamentos e ocupações de encostas acontecem em rios, lagoas e córregos, ocasionando erosão. Em períodos de chuva essa situação se agrava com a formação de enchentes, de forma que toda a cidade acaba sofrendo por esse processo, pela propensão ao surgimento de agravos na saúde pública (como as doenças respiratórias resultantes da combinação entre poluição atmosférica e baixa umidade do ar), uma repercussão difusa do urbanismo de risco (ROLNIK, 2000). Portanto, esse quadro sugere a constatação de um urbanismo que não considera sua base biofísica e seus processos naturais, devido à existência de leis, em sua maioria, falhas e superficiais, que aliadas a um ideal de “ausência de investimentos nas áreas protegidas, conflitos entre planos e projetos setoriais, omissão na fiscalização da ocupação de áreas de mananciais” não tem atingido os seus objetivos no contexto da preservação ambiental e social, fazendo com que a população e o meio ambiente sofram com as consequências dessas questões, além de contribuir para acelerar o processo de degradação ambiental (BONZI et al, 2017; GORSKI, 2010, p. 101).

4.2. A PAISAGEM COMO INFRAESTRUTURA 4.2.1 IMPORTÂNCIA DA PAISAGEM NA VIDA URBANA Diante de um cenário de disputa entre a questão de proteção ambiental e o difícil acesso a espaços que propiciem a qualidade de vida das pessoas, reforça-se a ideia de que a natureza e a cidade são entidades que devem ser vistas em conjunto. Pois a partir da noção dos serviços ambientais (mostrados na tabela 1) é possível compreender que eles são essenciais para a qualidade de vida no ambiente urbano. Portanto, por serem indispensáveis, fortalece a noção de que “a paisagem também pode ser entendida como infraestrutura” (BONZI et al, 2017, p. 04). A tabela 1 a seguir, feita a partir de dados disponibilizados pelo Conselho de Avaliação Ecossistêmica do Milênio (2005), mostra que o meio ambiente abrange serviços de provisão (abastecimento), regulação e suporte, serviços esses que muitas vezes são deixados de lado em detrimento de outros, como os correspondentes a cultura. O conhecimento acerca dos serviços importantes ofertados pelo meio ambiente tem contribuído para a qualificação da paisagem natural como alternativa de substituição e reforço dos serviços exercidos pela infraestrutura convencional (BONZI et al, 2017).

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TABELA. 01| Serviรงos ambientais.

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Referencial teórico

4.2.2. INFRAESTRUTURA VERDE COMO PAISAGEM A Infraestrutura Verde (IEV) surge como estratégia fundamental na busca pelo equilíbrio entre o espaço ambiental e urbano. Ela compreende uma infraestrutura cujo fator primordial é a diferenciação de práticas convencionais, desenvolvidas pela necessidade de mudar as percepções sobre planejamento e proteção dos espaços naturais. Portanto, a IEV é uma importante ferramenta no auxílio da manutenção da saúde ambiental e social (BENEDICT; MACMAHON, 2002).

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A Infraestrutura Verde fornece a organização espacial para a conservação e para o desenvolvimento, reconhecendo a necessidade de oferecer lugares para a população viver, trabalhar, fazer compras e desfrutar a natureza. A Infraestrutura Verde ajuda as comunidades a identificar e priorizar as oportunidades de conservação e planejar o desenvolvimento de forma a otimizar o uso do solo para atender as necessidades das pessoas e da natureza (BENEDICT; MACMAHON, 2006, p. 02).

Na Infraestrutura Verde o princípio mais forte é o da conectividade, conectando ecossistemas e paisagens em um sistema de hubs (espaços para a vegetação e animais, locais de origem ou destino para a vida selvagem, pessoas e processos

ecológicos), links (conexões de manutenção dos processos ecológicos) e sites (espaços que contribuem com importantes valores ecológicos e sociais), ilustrados na imagem 3. Outra dimensão essencial da Infraestrutura Verde é a multifuncionalidade, ou seja, a possibilidade de exercer, em um mesmo espaço, duas ou mais funções, como regulação climática, purificação do ar, conforto térmico, drenagem, lazer, mobilidade e integração com a natureza (BONZI et al, 2017). Em relação a função de drenagem e manejo das águas urbanas, a IEV pode atuar como um importante elemento contra inundações e alagamentos, diminuindo o volume do escoamento superficial, aumentando a infiltração e removendo os poluentes difusos antes de chegarem aos recursos hídricos (MOURA et al, 2017). Com base nos princípios de biorretenção, a tabela 2 a seguir dispõe de algumas tipologias de elementos da IEV, relacionadas as melhores práticas de manejo das águas da chuva, com base no Plano de Infraestrutura Verde para o Campus Cidade Universitária, desenvolvido por professores e alunos da Universidade de São Paulo. Portanto, defende-se que as áreas verdes e as infraestruturas devem ser vistas além de suas responsabilidades convencionais, tendo a infraestrutura verde como elemento fundamental, a partir do entendimento que ela reconhece e aproveita os serviços que a natureza desempenha como estratégia projetual, utilizando-se do

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Infraestrutura verde para novas formas de habitar a cidade

paisagismo para integrar e se diferenciar das propostas de infraestrutura convencional rígida, em busca de uma solução de infraestrutura natural, flexível, descentralizada e conectada, garantindo a formação de uma paisagem multifuncional (PELLEGRINO et al, 2017).

IMAGEM. 03| Sistema IEV

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TABELA. 02| Elementos IEV


Referencial teรณrico

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DIAGNÓSTICO


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Infraestrutura verde para novas formas de habitar a cidade IMAGEM. 05| Quadra de areia, localizada dentro do limite da comunidade

.ÁREA DE INTERVENÇÃO 5.1.1. Uso e ocupação do solo

A área de intervenção é situada no bairro Serrinha da cidade de Fortaleza (mapa 2), o qual está localizado na zona central da cidade e é administrado pela Secretaria Executiva Regional IV. A partir do mapa 3 é possível observar que o uso predominante na área de intervenção é o residencial, mas também compreende a presença de uso comercial, serviço e institucional. O uso residencial se constitui, em sua maioria, pela comunidade Guaribal, um assentamento informal que se formou às margens de um curso d’água, a lagoa Taperoaba e seu riacho. Já o uso institucional é marcado pelo instituto Irmã Giuliana Galli, que compreende uma creche e uma escola de ensino fundamental, estando a creche localizada dentro dos limites da comunidade Guaribal. O local apresenta poucos espaços públicos de lazer, como praças, porém, dentro do limite da comunidade há duas quadras, estando uma delas situada onde antes era um espaço de acumulação de lixo, em frente a creche e às margens do riacho da lagoa Taperoaba (imagem 5).

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Guaribal. Fonte: Acervo pessoal


Diagnรณstico

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Infraestrutura verde para novas formas de habitar a cidade MAPA. 02| Localização da comunidade Garibaldi.Fonte: Elaborado pela autora.

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MAPA. 03| Uso e Ocupação do solo da área de intervenção e do seu entorno imediato. fonte: Elaborado pela autora

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Diagnรณstico

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Infraestrutura verde para novas formas de habitar a cidade

5.1.2. MOBILIDADE URBANA A área de estudo é composta em sua maioria por vias locais, tendo também vias estruturais, como a Av. Dr. Silas Munguba, via de maior porte encontrada no local que tangencia a área de intervenção, relacionada tanto com a ligação de bairros como com o acesso principal ao transporte público. I. Via arterial I II. Via coletora III. Via local

5.1.3. CONDICIONANTES LEGAIS O Plano Diretor de Fortaleza, Lei Complementar nº 062/ 2009, afirma que a área de estudo abrange duas zonas, ZPA1, abordada no capítulo de referencial teórico deste trabalho, e ZRU2 (mapa 04). Segundo o art. 95, desta mesma lei, a Zona de Requalificação Urbana 2 (ZRU 2) é caracterizada pela “insuficiência ou precariedade da infraestrutura e dos serviços urbanos, principalmente de saneamento ambiental, carência de equipamentos e espaços públicos e incidência de núcleos habitacionais de interesse social precários, destinando-se à requalificação

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urbanística e ambiental e à adequação das condições de habitabilidade, acessibilidade e mobilidade”. O art. 97 do Plano Diretor de Fortaleza, estabelece os parâmetros da Zona de Requalificação Urbana 1, citados abaixo: I - índice de aproveitamento básico: 1,5; II - índice de aproveitamento máximo: 1,5; III - índice de aproveitamento mínimo: 0,10; IV - taxa de permeabilidade: 30%; V - taxa de ocupação: 60%; VI - taxa de ocupação de subsolo: 60%; VII - altura máxima da edificação: 48m; VIII - área mínima de lote: 125m2; IX - testada mínima de lote: 5m; X - profundidade mínima do lote: 25m. MAPA. 04| Classificação viária da área de intervenção e do seu entorno imediato. fonte: Elaborado pela autora


Diagnรณstico

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5.2. A COMUNIDADE 5.2.1. OCUPAÇÃO A comunidade Guaribal é caracterizada pela presença de assentamentos irregulares localizados dentro de uma Zona de Proteção Ambiental 1, apresentando situação de risco, devido às condições precárias das habitações situadas próximas a lagoa Taperoaba. A partir das visitas ao local, foi possível perceber que a comunidade Guaribal não se encontra apenas próxima ou às margens da lagoa Taperoaba. Pois, uma parcela significativa das habitações permanece sobre o curso d’água, comprometendo não só a vida dos moradores como também do potencial hídrico da bacia da qual ela faz parte, devido à contaminação das águas. A imagem 4 a seguir mostra o plano oficial para essa área e o seu estado atual. Ao constatar que nesse espaço havia uma área de proteção ambiental, o perímetro permaneceu intocado, sem nenhuma intervenção ou planejamento. Consequentemente, foi iniciado um processo de ocupação por uma população desfavorecida financeiramente que, em busca de um espaço urbano para construir suas habitações, compreendeu a área em questão como oportunidade de moradia, formando a comunidade conhecida hoje como Guaribal.

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Diagnóstico IMAGEM. 04| Ocupação comunidade Guaribal. Fonte: Elaborada pela autora. SOUZA et al, 2015.

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5.2.1. ASPECTOS SOCIOECONÔMICOS E DE INFRAESTRUTURA A partir de dados do Censo IBGE 2010, demostrados nos gráficos 1 e 2, foi verificado que a comunidade é constituída em sua maioria por adultos (30 a 59 anos) e crianças (0 a 14 anos). Já em relação a configuração familiar, foi constatado que mais da metade da população é composta por famílias de 2 a 4 pessoas, e com renda acima de 70 reais. Em relação ao acesso à infraestrutura, a maioria das habitações é atendida por coleta de lixo e possui esgoto particular. Porém, sabe-se que apenas cerca de 0,60% desse esgoto é destinado para a rede geral de esgoto, sendo o restante encaminhado para fossa rudimentar (53,20%), para fossa séptica (25,48%), para o recurso hídrico (9,99%) e para valas (6,71%). E apesar dos dados coletados afirmarem que a maioria da comunidade é atendida por coleta de lixo, a visita ao local mostra uma realidade diferente (imagens 6 a 11). Pois, foi percebido que tanto o lixo quanto o esgoto acabam sendo direcionados para o recurso hídrico que, consequentemente, durante o período de chuva, sofre com alagamentos que são agravados por questões como, esgotamento sanitário e acúmulo de lixos nas ruas, acarretando condições de risco para a saúde humana e ambiental.

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Diagnóstico GRÁFICO. 01| Dados Socioeconômico referentes a comunidade Guaribal. Fonte: Elaborado pela autora, a partir de dados do Censo IBGE, 2010.

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Infraestrutura verde para novas formas de habitar a cidade GRĂ FICO. 02| Acesso Ă infraestrutura na comunidade Guaribal. Fonte: Elaborado pela autora, a partir de dados do Censo IBGE, 2010.

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Diagnóstico IMAGEM. 06| Acúmulo de lixo nas proximidades da lagoa Taperoaba fonte: Acervo pessoal.

IMAGEM. 07| Acúmulo de lixo na comunidade Guaribal

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Infraestrutura verde para novas formas de habitar a cidade IMAGEM. 08| Habitação locada sobre o riacho da lagoa Taperoaba. Fonte: Acervo pessoal

IMAGEM. 09| Acúmulo de lixo e esgoto em valas a céu aberto. Fonte: Acervo pessoal.

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Diagnóstico IMAGEM. 10| Valas a céu aberto. fonte: Acervo pessoal

IMAGEM. 11| Acúmulo de lixo e esgoto no riacho da lagoa Taperoaba. Fonte: acervo pessoal

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5.3. A LAGOA 5.3.1. ANÁLISE HÍDRICA A lagoa Taperoaba faz parte da microbacia B-3.5, referente a bacia do Rio Cocó, principal recurso hídrico da cidade de Fortaleza, com área aproximada de 215,9 km² (mapa 6). Segundo Christofoletti (1980), através de estudos baseados na Geomorfologia Fluvial, é possível afirmar que os rios representam o elemento mais significativo dos componentes de uma bacia de drenagem, além de serem os agentes que permitem o transporte de materiais “intemperizados”, por escoamento das águas, a partir da topografia, das áreas mais elevadas para as mais baixas, sendo alimentados por meio de águas superficiais e subterrâneas. Portanto, o escoamento fluvial corresponde à quantidade total de água que chega até os cursos d’água. Uma maneira de iniciar o estudo das bacias hidrográficas é a partir da hierarquia fluvial, a qual constitui um processo de estabelecimento de uma classificação relacionada a determinado curso d’água em relação ao conjunto da bacia hidrográfica na qual se encontra. Os canais de primeira ordem são aqueles que não recebem outros canais de escoamento, ou seja, as nascentes. Já os canais de segunda ordem são aqueles que recebem escoamento somente dos de primeira ordem. Os de terceira, por sua vez,

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recebem escoamentos dos canais de primeira e segunda ordem, e assim sucessivamente. O canal de maior ordem hierárquica, será portanto aquele considerado o principal da bacia hidrográfica (CHRISTOFOLETTI, 1980). No caso do mapa 5, demostrado anteriormente, realizado a partir da sub-bacia B-3, referente a Bacia do Rio Cocó, foi concluído que a lagoa Taperoaba é de primeira ordem, ou seja, uma nascente, uma vez que é por onde o sistema começa, constituindo um recurso hídrico independente da interferência de outras afluentes.


Diagnóstico MAPA. 05| Hipsométrico e ordenamento hídrico na sub-bacia B-3, referentes a bacia do rio Cocó. Fonte: Realizado pela autora.

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Infraestrutura verde para novas formas de habitar a cidade MAPA. 06| Localização da lagoa Taperoaba.. fonte: Elaborado pela autora

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Diagnรณstico

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5.3.2. ANÁLISE VOLUME DE CHUVAS Após a análise hídrica realizada anteriormente, aliada às constatações relacionadas às condições de alagamentos e enchentes e suas consequências na área de estudo, foram realizados cálculos pluviométricos da cidade de Fortaleza, e cálculo do volume de escoamento da área de intervenção, a fim de delimitar a área alagável e mitigar questões referentes a áreas consideradas de risco, as quais ameaçam a qualidade de vida das pessoas e a integridade do recurso hídrico, tendo como referência um certo período de tempo futuro. Utilizando-se da metodologia de Lima (2016), foi estabelecido o cálculo de intensidade pluvial i = (K x Tª) / (t + b)c , sendo T o tempo de retorno em anos e t a duração da chuva em minutos, que varia de acordo com a pretensão de cada projeto. Para tanto, os valores referentes a “K”, “a”, “b” e “c” foram conseguidos a partir do software Pluvio 2.1, pelo pesquisador Lima (2016). E o tempo de retorno definido para o presente estudo foi do período de 100 anos e duração de chuva de 60 minutos. A partir da realização do cálculo, obteve-se o resultado da maior intensidade de chuva na região metropolitana de Fortaleza de 89,43 milímetros por hora, no tempo de decorrência de 100 anos. Sobre esse volume total de precipitação e seguindo a metodologia de Lima (2016) foi elaborado o

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cálculo de vazão de escoamento Q = C x i x A, a fim de colher dados referentes ao volume máximo de escoamento superficial da microbacia estudada, na área de intervenção delimitada, de acordo com suas características de solo e ocupação. A área de contribuição utilizada no cálculo da vazão abrange um perímetro mais extenso que o delimitado pela comunidade Guaribal, a qual, por se encontrar na porção mais baixa dessa área, juntamente com a lagoa Taperoaba, constitui ponto de recebimento das águas pluviais. Baseandose nesse fato, foi possível assumir que a água escoada para a área da comunidade (local onde haverá a intervenção projetual) sofre influencias externas das áreas do entorno. Na referida equação, demonstrada na tabela 4, Q corresponde a vazão de escoamento, C é o coeficiente de escoamento superficial, i é a intensidade resultante do cálculo anterior, e A corresponde à área de contribuição da microbacia. O valor do coeficiente C utilizado se refere a uma média realizada a partir de valores baseados nas características das superfícies presentes na área em estudo. Comparando o limite de área alagável, marcado a partir do resultado dos cálculos de vazão superficial, com os limites de APP e ZPA, especificados pelas leis ambientais vigentes, é possível perceber que eles nem sempre coincidem, questionando-se, mais uma vez, acerca dos critérios utilizados na criação dessas leis e no alcance dos valores dos limites de proteção ambiental especificados na


Diagnóstico legislação. (Mapa 07). Vale salientar que o valor de vazão de 25.801,15 m³/h foi determinado considerando a situação real do lugar, e não um limite arbitrário baseado em uma legislação generalista. Tais dados, conforme demonstrado anteriormente, consideram a condição da bacia urbana na realidade social e ambiental a qual está inserida na cidade de Fortaleza. A partir dessa delimitação foi possível verificar as construções que se encontram em área de risco, suscetíveis a inundações, e propor a remoção e realocação dessas habitações, conforme demonstrado no diagrama a seguir (imagem 12). TABELA. 03| Intensidade pluviométrica Fonte: Produzida pela autora com base nos dados de LIMA, (2016).

TABELA. 04| Vazão superficial de escoamento das águas pluviais na área em estudo Fonte: Produzida pela autora com base nos dados de LIMA,

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Diagnóstico

MAPA. 07| Comparativo área alagável e legislações ambientais vigentes Fonte: Produzida pela autora

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MEMORIAL JUSTIFICATIVO


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Infraestrutura verde para novas formas de habitar a cidade TABELA. 05|

.MEMORIAL JUSTIFICATIVO 6.1. Conceito

A perspectiva conceitual que norteou o desenvolvimento desse projeto está relacionada a uma visão que defende a convivência e integração da paisagem natural e da paisagem construída, tendo como base os fundamentos da Infraestrutura Verde, que considera as funções da natureza no espaço em que está inserida, e destaca o caráter de uma paisagem multifuncional.

6.2. PLANO DE INFRAESTRUTURA VERDE A partir do diagnóstico, com base na metodologia do Plano de Infraestrutura Verde para o Campus Cidade Universitária, desenvolvido por professores e alunos da Universidade de São Paulo, foram estabelecidos objetivos e metas que configurassem soluções aos problemas constatados. Posteriormente, foram elencados elementos que colaborassem para o alcance desses objetivos, considerando as funções da IEV (provisão, controle e cultura), depois identificaramse os locais onde esses elementos poderiam ser implantados.

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autora

Passos plano de infraestrutura verde. Fonte: Produzida pela


Memorial justificativo

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Após esses três passos supracitados, foram estabelecidas sete diretrizes que em conjunto com os elementos caracterizam estratégias para atingir os objetivos propostos.

DIRETRIZES • Recuperar a qualidade da água; • Preservar a paisagem ambiental; • Promover a interação da comunidade com a lagoa e o riacho; • Integrar diferentes tipos de usos; • Aumentar a vitalidade da área; • Conservar a identidade local; • Criar áreas estratégicas de adensamento populacional;

AÇÕES Essas diretrizes confluíram na concepção de três ações, descritas a seguir: 1. Controle de Cheias: Adoção de medidas relacionadas ao controle do uso e ocupação do solo nas áreas consideradas inundáveis, com o intuito de aumentar a permeabilidade dessas áreas, e promover a realocação da população que se encontra dentro do limite de área inundável e a recuperação ambiental desses espaços. Nas ruas, previu-se a criação de caminhos verdes,

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a partir de uma nova proposta de desenho das vias e calçadas, com integração de arborização viária e outros elementos da vegetação, aliando soluções alternativas de drenagem urbana. 2. Recuperação, Preservação e Educação Ambiental: Implantação de um sistema de Infraestrutura Verde (IEV), além da presença de equipamentos educacionais e recreativos. 3. Remoção e Realocação da População em Área Suscetível a Inundação: Previu-se a realocação da população que se encontra em áreas inundáveis com o intuito promover a segurança dessas famílias e a recuperação ambiental. A população será realocada para áreas próximas, ainda dentro do limite de estudo, e a área resultante da desocupação será recuperada ambientalmente e fará parte do projeto do parque urbano. Todas essas ações convergem na proposta de três projetos: corredores verdes, parque urbano e habitações adaptadas ao espaço ambiental inserido, dos quais apenas o o parque urbano foi detalhado nesse estudo.


Memorial justificativo

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0 PROJETO


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.O PROJETO 7.1. O PARTIDO

Tem-se a lagoa Taperoaba e o seu riacho como elemento ambiental estruturador do projeto, tendo a requalificação do recurso hídrico e do ambiente em que está inserido como premissa do projeto, trazendo-o de volta à paisagem e tornando-o visível novamente aos olhares das pessoas, a partir de um espaço integrado à comunidade local e que simultaneamente coopere para a preservação ambiental. Pois, segundo Herbert Dreiseitl (artista e arquiteto paisagista alemão que estuda trabalhos ligados a água desde 1980), “a água apesar de sempre presente no tecido urbano, está cada vez mais invisível aos olhos da população” (apud Gorski, 2010, p. 105).

.HABITAÇÃO As habitações removidas foram realocadas dentro do próprio perímetro da proposta de projeto do parque urbano, e apesar de não se pretender chegar a um projeto detalhado dessas habitações neste trabalho, foi realizado um estudo preliminar em relação a área de cada moradia, a fim de certificar que a área destinada para as habitações seja capaz de atender ao número total de realocações.

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Para isso, foi desenvolvida uma planta baixa esquemática (imagem 13) que atende uma família composta por um casal e três filhos, podendo variar também para atender uma família de um casal e quatro filhos, a partir da transformação da sala de jantar em um quarto. Caso houvesse a necessidade, essa mesma área destinada para uma habitação, poderia ser facilmente revertida em duas habitações que atendem até um casal individualmente. IMAGEM. 13| Planta baixa esquemática das habitações. Fonte: Produzida pela autora


O Projeto

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IMPLANTAÇÃO Os blocos das habitações foram dispostos levando em consideração a orientação do sol e o direcionamento dos ventos. Além disso, eles foram distribuídos de maneira que apesar de estarem na mesma orientação variassem de tamanho em relação a quantidade de habitações que cada um compõe, a fim de se obter uma implantação que preservasse o dinamismo presente na comunidade (IMAGEM 14). IMAGEM. 14| Implantação habitações. Fonte: Produzida pela autora

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O Projeto

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.PARQUE URBANO A proposta do parque urbano busca uma paisagem multifuncional que não só abrange áreas comuns voltadas para encontro, lazer e recreação, como também desempenha serviços ambientais relevantes, como a preservação e proteção do corpo hídrico, e a manutenção das águas pluviais, reduzindo os efeitos negativos das enchentes à população local e às proximidades. Aliando essas funções ambientais à identificação de dinâmicas distintas existentes dentro do espaço estudado, foi desenvolvido um programa de necessidades organizado em cinco zonas, distribuídas ao longo de todo o perímetro da área do parque, que corresponde a cerca de 7,9 ha, respeitando as características e as necessidades locais. ZONA AMBIENTAL • Área de preservação • Caminhos verdes ZONA EDUCACIONAL • Trilha interpretativa • Pomar • Horta urbana

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ZONA ESPORTES • Quadra poliesportiva • Campo de várzea • Pista de skate • Academia ao ar livre • Área infantil ZONA INTERAÇÃO • Área de convivência • Área contato com a água • Área multiuso ZONA HABITACIONAL • Habitações


O Projeto IMAGEM. 14| Zoneamento parque urbano. Fonte: Produzida pela autora

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.IMPLANTAÇÃO GERAL Tendo como base os conceitos e o programa de necessidades estabelecidos anteriormente, a implantação geral mostra o rebatimento da proposta baseado em três pontos principais: preservação, conexão e contato. Foi criada uma faixa de vegetação nas margens da lagoa e do riacho, com o intuito de manter a qualidade da água, fazendo-a passar por um processo de filtração e limpeza, antes do seu escoamento direto para a lagoa. Jardins de chuva foram desenvolvidos para atingir tal objetivo. Às margens do corpo d’água, será permitido o acesso de transeuntes, que poderão ter contato direto com o recurso hídrico, para lazer, convivência, contemplação ou descanso. Os caminhos criados a partir da diferenciação de piso, fazem referência ao movimento fluido da água e conduzem ao elemento estruturador do projeto: o recurso hídrico. Foram criadas também pontes que demarcam do início ao final do riacho. As pontes foram desenhadas a fim de abranger não só o papel de conexão das áreas do entorno do recurso hídrico, como também de se tornar espaços de permanência ao criar passeios e paradas à beira d’água, como os píeres. Essas conexões e caminhos induzem o morador a adotar o corpo d’água como componente integrante do plano visual, permitindo-o refletir em sua própria identidade as relações e sensações que o ambiente lhe propicia, uma vez que o recurso hídrico passa

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a ser um elemento presente diariamente na paisagem.


O Projeto IMAGEM. 15| Implantação geral do parque urbano. Fonte: Produzida pela autora

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Infraestrutura verde para novas formas de habitar a cidade IMAGEM. 16| Cortes do parque. Fonte: Produzida pela autora

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O Projeto

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VEGETAÇÃO A vegetação do parque foi pensada com o intuito de garantir a qualidade da paisagem natural e proporcionar um conforto térmico que propicie e estimule a permanência e interesse dos usuários, em sua maioria moradores da comunidade Guaribal. Foi dada preferência às espécies nativas, adaptadas a áreas alagáveis e que colaboram com o processo de requalificação do ambiente natural que compõe a localidade. Vale salientar que toda a massa vegetal existente foi preservada e integrada harmonicamente às demais vegetações propostas. As espécies vegetais escolhidas estão dispostas na imagem 17 e na tabela 06. Uma das espécies arbóreas presentes no projeto é o Oiti. É adaptada a períodos de cheia e seca e é indicada para a recuperação de matas ciliares, além de proporcionar um grande sombreamento. Foi utilizada, assim como o Ipê branco, nas áreas verdes que margeiam o corpo d’água, e na região de preservação delimitada no zoneamento. A Carnaúba, espécie palmácea, foi utilizada para marcar as entradas e o direcionamento às áreas alagáveis, próximas a lagoa e ao riacho. Com o intuito de delimitar a entrada e os acessos ao parque, além da carnaúba, propõe-se a utilização de Ipê amarelo, que, a partir da diferenciação em sua cor, destaca-se e chama a atenção da população local.

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Na área infantil foi proposto um pomar, utilizandose de espécies como o Cajueiro, que com sua grande copa marca a área voltada para as crianças juntamente com a Pitombeira e a Acerola.


O Projeto IMAGEM. 17| Localização espécies vegetais do parque urbano. Fonte: Produzida pela autora

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TABELA. 06| autora

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EspĂŠcies vegetais do parque urbano. Fonte: Produzida pela


O Projeto

PLANO DE DRENAGEM Assume-se que a questão do acesso ao tratamento de esgoto, que hoje não atende toda a comunidade, como mostrado no diagnóstico deste trabalho, será solucionada, uma vez que se trata de um direito urbano, garantido na lei e de responsabilidade do poder público. Com base nessa assertiva, entende-se que o esgoto coletado nas residências do entorno não chegará ao recurso hídrico.

no estudo (gráfico 03). Portanto, a meta alcançada representa um número aceitável, por conseguir reduzir de forma significativa o escoamento das águas pluviais na área analisada, além de contribuir para o tratamento e a preservação da qualidade do recurso hídrico.

Sendo assim, o plano de drenagem surge com o intuito de tratar as áreas alagáveis e evitar o direcionamento de águas poluídas diretamente para o riacho. Para isso, foram utilizados elementos de biorretenção em todo o parque (imagem 18), a fim de reter a vazão superficial calculada (tabela 04). Porém, ao final do cálculo de retenção, percebeu-se que não foi possível atingir o objetivo proposto (tabela 07), uma vez que o volume total de retenção do parque resultou no valor de 12.331 m³, correspondendo a 67% do volume de água escoada dentro da área de contribuição (tabela 08). Apesar de não ter conseguido atingir a totalidade de vazão da área de contribuição, o valor alcançado de 67% representa uma importante variável, com impactos significativos na melhoria do tratamento da água do recurso hídrico. A área do parque representa somente 18% da área total de contribuição, e, ainda assim, conseguiu reter mais da metade da vazão superficial total escoada

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Ocupar para preservar:

Infraestrutura verde para novas formas de habitar a cidade IMAGEM. 18| Plano de drenagem do parque urbano. Fonte: Produzida pela autora

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O Projeto GRAFICO. 03| Área do parque em relação a área total de contribuição. Fonte: Produzida pela autora

TABELA. 08|

Retenção do parque em relação a vazão superficial total da área de contribuição. Fonte: Produzida pela autora

TABELA. 07|

Cálculo de retenção dos elementos do parque urbano. Fonte: Produzida pela autora

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O Projeto

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.CONSIDERAÇÕES FINAIS CONSIDERAÇÕES FINAIS Este estudo tem como importância primordial demonstrar a importância de se trabalhar com espaços que, por diversas razões, são considerados socialmente marginalizados. Existem ainda diversas regiões que, especialmente por razões socioeconômicas, são muitas vezes excluídas de processos de jurisprudência que deveriam buscar a promoção de qualidade de vida da população como um todo, sem excluir ou marginalizar certos locais por quaisquer que fossem as razões. O objetivo do arquiteto como agente social não deve ser apenas enxergar e trabalhar áreas consideradas economicamente favorecidas. A arquitetura tem engendrada em seu âmago a possibilidade de, através da revitalização de espaços ambientalmente frágeis e, em especial, da integração dos recursos naturais com a comunidade local, promover de forma significativa e duradoura a qualidade de vida da população afetada.

parque, a regularização fundiária e a remoção de habitações não conseguem solucionar o problema em sua totalidade. Portanto, este projeto se propõe a constituir um marco na reestruturação de uma região ambientalmente sensível, que, através de sua aplicação concreta e do incentivo a sua progressão e evolução, pode contribuir de forma significativa para a preservação do ambiente e para a melhoria da qualidade de vida da população local. .

O projeto do parque urbano, desenvolvido neste estudo, firmou-se como solução pontual à problemática relacionada ao escoamento pluvial do território em questão. Para atingir a totalidade da área, faz-se necessário uma abordagem holística e ampla, que congregue ruas, lotes e vias públicas, uma vez que ações pontuais como o

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