Pernambuco Jardim de Baobas

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PERNAMBUCO Jardim de Baobás | Antônio Campos e Marcus Prado | 24

O DESEMBARQUE SECRETO DOS PRIMEIROS BAOBÁS EM PERNAMBUCO

O

historiador Joseph Ki-Zerbo é enfático ao afirmar que – nenhuma coletividade humana foi mais inferiorizada do que os negros depois do século XV–. Foram encomendados escravos negros aos milhões; utilizaram-se os negros como reprodutores de outros negros, em –coudelarias– constituídas para reproduzir novos negrinhos para o trabalho nas plantações. Quantas crianças africanas foram jogadas dos navios, ou abandonadas nos mercados escravos, longe das mães que eram levadas, porque era preciso muito tempo para alimentá-las até que fossem exploráveis–. LOCALIZADA A 65 QUILÔMETROS do Recife, litoral Sul de Pernambuco, Porto de Galinhas é hoje uma famosa praia pertencente ao município de Ipojuca. Por volta de 1850, quando o tráfico de escravos já era proibido por lei, o local tornou-se um porto clandestino improvisado de comercialização de escravos. Os escravos que ali chegavam, camuflados, eram trazidos de Angola e transportados nos porões dos navios. Cada “mercadoria” descia dos navios–encangada–por meio de argolas de ferro, nas mãos e nos pés, para evitar fugas repentinas. O olhar de espanto de cada negro e de cada negra, nessa hora, era como o olhar dos que vão cair no abismo. A sensação do vazio e do desprezo predominava. A sede, uma imensa sede de beber água... o que mais lhes era negado no percurso. Muito se escreveu sobre as dores sofridas pelos escravos nos navios negreiros, mas quase nada foi visto, na bibliografia consultada, sobre a angústia diante da escassez de água nessas embarcações de longo curso, notadamente quando vinham lotadas de gente. No interior dos navios negreiros, de modo geral, sabia-se da existência de carcaças fétidas amontoadas na escuridão infecta dos porões. Lá dentro tinha o cheiro do fogo do inferno, aquele fogo sulfúrico misturado com enxofre que não tem luz. Santa Catarina de Siena, aquela que tinha visões de Cristo e dos Anjos, certa vez viu um demônio e pediu a Deus que jamais lhe desse provação maior na sua vida, preferindo todo dia andar sobre brasas acesas, a olhar novamente para um deles. Imagine o que ela diria se visse de perto ao menos um daqueles –arrumadores–dos na-


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