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PRESSÃO GLOBAL SOBRE O YOUTUBE

SITE DE VÍDEOS SE TORNA O MAIOR DO MUNDO EM CONTEÚDOS MUSICAIS, MAS REPASSES INSUFICIENTES GERAM PROTESTOS DE ARTISTAS, ASSOCIAÇÕES E GRAVADORAS NA EUROPA, NOS ESTADOS UNIDOS E NO BRASIL

O YouTube está sob o escrutínio do mundo artístico. E no mundo todo. O gigante do grupo Google se tornou o maior portal global de música por número de obras publicadas, uma vez que se vale de seu status “colaborativo” e disponibiliza conteúdos musicais que seus usuários sobem, mas está bem atrás de plataformas como Spotify e Deezer no pagamento aos artistas. Segundo levantamento encomendado pelo executivo Jimmy Iovine, da Apple Music (e ex-Universal), e divulgado pela revista americana “Vanity Fair” no fim do ano passado, o YouTube é responsável, sozinho, por 40% das músicas escutadas na internet globalmente - mas por apenas 4% dos pagamentos de direitos autorais. Na últimas semanas, iniciativas na Europa, nos Estados Unidos e no Brasil foram lançadas para tentar reverter esse quadro.

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No dia 21 de junho, 58 membros do Parlamento Europeu enviaram uma carta à Comissão Europeia, órgão executivo dos países do bloco, pressionando por uma nova normativa continental que proteja compositores e músicos contra os baixos pagamentos por parte de grandes players do mundo digital. É que, baseando-se num dispositivo chamado de “porto-seguro” (safe harbour) e presente na Diretiva de Comércio Eletrônico 31/2000, da União Europeia, o YouTube e outros intermediários alegam ser meros “hospedeiros passivos e neutros” de conteúdos postados por terceiros (seus usuários), o que os habilitaria a isenções no pagamento de direitos autorais, como descrevem os signatários da carta. Os deputados europeus pedem uma revisão da normativa no sentido de deixar claro que tais isenções só valem para pequenas plataformas, e não para grandes conglomerados que monetizam e lucram com seu imenso repertório “colaborativo”, sem fazer a devida transferência aos autores das músicas postadas.

EM MAIO, O YOUTUBE ANUNCIOU TER FECHADO ACORDO COM AGREGADORES DIGITAIS E EDITORAS PARA PAGAR DIREITOS DE REPRODUÇÃO DAS MÚSICAS INCLUÍDAS NOS VÍDEOS. OS VALORES NÃO FORAM DIVULGADOS

Ainda segundo os signatários, a baixa remuneração de plataformas como o YouTube é uma ameaça direta à prosperidade da indústria criativa europeia, que eles dizem movimentar € 550 bilhões anuais, ou 4,4% do PIB europeu, além de empregar diretamente 8,3 milhões de pessoas, ou 3,8% da força de trabalho daquele continente.

Pouco mais de uma semana depois, outra carta, esta assinada por representantes de Abba e Coldplay, além de cantores como Ed Sheeran e Lady Gaga, reforçou a queixa e também pediu providências a Jean-Claude Juncker, presidente da Comissão. “A disparidade de valor solapa os direitos e as receitas daqueles que criam, investem e controlam direitos musicais, além de distorcer o mercado”, diz um trecho do documento. “Essas proteções foram colocadas em vigor duas décadas atrás a fim de ajudar a desenvolver as start-ups digitais nascentes, mas hoje estão sendo usadas indevidamente para proteger grandes empresas que distribuem nosso trabalho e o monetizam”, continuam os criadores.

Nos Estados Unidos, também em junho, estrelas globais como Paul McCartney, Taylor Swift, U2 e Pharrell Williams enviaram ao Congresso uma carta, apoiada por majors como Sony e Universal, em que atacam o Digital Millennium Copyright Act, legislação que acusam de beneficiar injustamente o YouTube, minorando as transferências por uso de suas criações no portal. A iniciativa foi concebida pelo empresário musical Irving Azoff. Segundo ele, o YouTube paga apenas um sexto do valor que serviços de streaming como o Spotify repassam anualmente. O site, sempre alegando que o valor pago só não é maior devido à publicação de conteúdos piratas por seus usuários, diz ter implementado “ações para combater essa prática”. Em abril, o blog YouTube Creator, ligado ao gigante dos vídeos, publicou um texto de Christophe Muller, diretor de Parcerias Musicais Internacionais do YouTube, em que ele alega que o gigante repassou até hoje US$ 3 bilhões aos titulares de músicas em todo o mundo. Mais: Muller diz que o YouTube desenvolveu uma ferramenta chamada Content ID, ou identidade de conteúdo, que faz uma varredora automática em “99,5% das reclamações sobre direitos autorais” (o outro 0,5% seria manual) a fim de detectar publicações indevidas na plataforma.

OS DIREITOS DE EXECUÇÃO PÚBLICA CONTINUAM SENDO SISTEMATICAMENTE DESRESPEITADOS PELO PORTAL, QUE CONTINUA INADIMPLENTE JUNTO AO ECAD E ÀS ASSOCIAÇÕES DE GESTÃO COLETIVA, COMO A UBC

No Brasil, o debate gira em torno da resistência do YouTube em reconhecer o stream como execução pública - e, assim, não fazer repasses ao Ecad. O protesto contra a prática do site já se estende por entidades como a UBC, a Associação Procure Saber (APS), a União Brasileira de Editores de Música (Ubem) e o Sindicato dos Músicos. Em junho, a UBC lançou um comunicado em que sustenta ser inaceitável o posicionamento da gigante em não reconhecer a legítima remuneração integral dos direitos autorais no Brasil. “O YouTube, ao insistir na sua posição oportunista de não reconhecer os direitos de execução pública, na verdade se vale de frágeis artifícios para pagar menos aos autores musicais brasileiros”, diz um trecho da nota pública.

Em maio, o YouTube anunciou ter fechado um acordo com distribuidoras digitais para o pagamento de direitos autorais no Brasil referentes aos direitos de reprodução das músicas incluídas nos vídeos. Os contratos para o cálculo, que seria retroativo, estariam sendo estabelecidos, segundo o portal TechTudo, da Globo.com, com os agregadores ABMI – Associação Brasileira da Música Independente, eMotion, MusicPost, ONErpm e Playax. Ou seja, para receber os direitos de reprodução, o criador precisa se ligar a uma dessas empresas. Os valores não foram divulgados.

Enquanto isso, segundo o Ecad, os valores devidos pelo portal pela execução pública continuam não sendo pagos, o que põe o YouTube no status de inadimplente e o exclui da primeira distribuição de streaming ocorrida no Brasil, em junho passado. Na ocasião, mais de 116 mil titulares receberam R$ 2,38 milhões - e 55% do total ficaram com o repertório da UBC. Saiba mais sobre essa distribuição e sobre a nova rubrica na página ao lado.