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Religiões mediterrânicas, a Lusitânia e as origens de um país

JORGE QUEIROZ Sociólogo

As religiões, como as línguas, são elementos centrais na definição de uma cultura, tema recorrente no actual debate sobre “valores civilizacionais” e as causas dos conflitos. Na visão do “homo religiosus” nada do que existe é natural, mas uma criação divina. O céu, as constelações, o sol e a lua, a pedra e o rio, as estações do ano, a fertilidade da terra-mãe, os humanos e as outras espécies, tudo é sacro e transcendente.

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“No centro encontram-se dois eixos: o sagrado e o símbolo” escreveu Mircea Eliade (1907-1986), nos seus estudos sobre religiões e comportamentos religiosos. A História das Religiões e das Religiões Comparadas, procura análises não influenciadas pelas convicções do investigador.

A Teologia, o estudo de Deus, centra-se na fundamentação e interpretação filosófico-normati- va de uma determinada religião. Em várias épocas as religiões obtiveram reconhecimento e engrandeceram-se pela capacidade de teorização e argumentação dos teólogos.

A Sociologia da Religião, trata o fenómeno social religioso, as crenças e as práticas, contém a sociografia, quantificação das dimensões espaciais, demográficas, através de conquistas e colonizações o cristianismo e o islamismo expandiram-se para regiões exteriores às origens geoculturais, sendo o judaísmo exclusivamente étnico.

As religiões emergentes afirmaram-se pela diferenciação, absorção e incorporação de cultos preexistentes, usando idênticos conceitos.

Existe um substrato mediterrânico ancestral anterior ao surgimento da civilização helénica, o culto das deusas-mãe, da fertilidade, o ciclo geração/regeneração que se prolongou nas sociedades subsequentes … Vários autores referem a luta contra a fome e a descoberta da agricultura como origem dos cultos agrários da Antiguidade. Deméter, deusa grega das estações do ano, da fertilidade e das colheitas foi entre outros exemplos, uma explicação mística e pedagógica do mundo natural. Quando Perséfone, a irmã, deusa das flores e dos perfumes, foi raptada por Hades, deus da morte e da escuridão, Deméter mandou parar o crescimento das plantas, logo surgiu a fome. O acordo com o raptor estabeleceu que Perséfone ficaria três quartos do ano com a irmã e Hades com o restante período, isto é, durante o inverno, tempo frio, chuvoso e escuro.

O Panteão dos deuses gregos e romanos, genealógico, extenso e pleno de vivências dramáticas, teve a função de explicar as leis da natureza, os comportamentos humanos, o significado da vida. O festival dedicado a Deméter eram as “Eleusinas”, o seu equivalente romano a “Cerealia” celebrava a deusa Ceres, ocorria no início da Primavera e durava sete dias, tal como hoje continuam a ser celebradas as festividades pascais inseridas nos calendários religioso e civil.

As religiões da Lusitânia no período pré-romano, foram investigadas no século XVI por André de Resende (1500-1573), teólogo e arqueólogo, e pelo monge Frei Bernardo de Brito (1569-1617) historiador alcobacense e de Cister.

A partir do iluminismo e do romantismo novecentista, surgiram tentativas de explicação científica das origens da nacionalidade e da “raça” e celebrações ideológico-nacionalistas e místicas de acontecimentos e figuras históricas.

A história e cultura portuguesas foram sempre questionadas e polémicas, Alexandre Herculano defendeu a inexistência de qualquer vínculo entre a sociedade portuguesa e as tribos que habitaram a Península, Portugal é segundo Herculano “uma realidade medieval da Reconquista”.

Opositor das ideias de Herculano, José Leite de Vasconcellos (1858-1941), médico, etnógrafo, arqueólogo, defendeu a relevância das religiosidades locais no artigo “O deus lusitano Endovellico” (1890), iniciando “As religiões da Lusitânia”, obra em três volumes (1913).

Moisés Espírito Santo, sociólogo e etnólogo das religiões em “As origens do cristianismo português” fundamenta a matriz oriental e norte-africana do esoterismo ibérico, a influência de Astarté, deusa fenícia da lua e da fertilidade. A continuidade de simbologias aparece em diferentes épocas e religiosidades.

A ascensão e institucionalização do cristianismo na Península Ibérica ocorreu no período da colonização romana. O Concílio de Eliberi ou Elvira no séc. IV, perto de Granada, foi a primeira reunião magna da alta hierarquia cristã na Península Ibérica, reuniu 40 dioceses africanas e peninsulares, com presença entre outros dos bispos de Ossonoba/Faro, de Évora e Mérida.

A origem mística de Portugal, contida no mito fundador do aparecimento de Cristo a Afonso Henriques em Ourique, convive a partir do século XIX com a história científica e o racionalismo.

*O autor escreve de acordo com a antiga ortografia

> deiras existentes) e conseguia em 1924 gerar 30.000 caixas.7

Segundo Ana Rita Silva de Serra Faria e o Arquivo Júdice Fialho, esta unidade fabril produzia 7.193 caixas de conservas de peixe em 1938, 9.297 em 1939, 7.645 em 1940, 1.084 em 1941, 4.280 em 1942, 6.159 em 1943, 3.787 em 1944, 1.621 em 1945.8

Segundo a planta de conservas de peixe da Júdice Fialho em Lagos, esta era constituída: 1 - entrada e ruas de serviço da fábrica, 2enxugadores de peixe e casa da bomba e poço, 3 - hangar para enxugar peixe, 4 - casa do descabeçar, a-geradores de vapores de 20 cavalos, b-cozedores de peixe, c-chaminé de tijolo, 5 - casa de enlatar, 6 - pátio, 7 - depósito de lata vazia, 8 - casa de máquinas: matadouro, balanças, tesouras, 9 - retrete e urinol, 10 - casa de soldadores, 11 - casa de azeitar o peixe e tinas de azeite, 12 - adega de azeite, 13 - casa de ebulição depósito de lata cheia e estufas, 14 - depósito de lata cheia, 15 e 16 - depósito de desperdício seco de peixe, 17 - escada para o escritório, 18 - depósito de rações para o gado, 19 - depósito de utensílios para barcos, 20 - depósito de sal, 21 - forja e depósito de ferro, 22 - casa do gasómetro de acetileno, 23 - tanque para depósito de azeite de peixe, 24 - prensas para prensar o desperdício de peixe, 25 - eirado, 26 - terreno para um armazém, 27 - cocheira, 28 -armazém de tinas de salga de peixe, 29 - armazéns das estivas italiana e espanhola, 30 - tanques de alvenaria para água, 31 - hangar com caldeira para estanhar grelhas, 32 - nora mourisca com passeio, 33 - residência das mestres das estivas, 34 - palheiro, 35 - cavalariça, 36 - palheiro, 37 - terreno hortado, 38 - 1º andar no armazém n.º 14 para depósito de madeiras para caixas, 39 - residência do mestre da fábrica. 1º andar das casas 18 e 20, 40 - 1º andar do n.º 16.escritório da fábrica, 41 - aparelho do gasógeno Piersam. cf. Para a fábrica de conservas de peixe em azeite e molhos de Lagos, consulte-se a monografia de Luís Miguel Pulido Garcia Cardoso de MenezesJoão António Júdice Fialho (1859-1934) e o Império Fialho (1892-1981), Lisboa: Academia dos Ignotos, 2022, pp. 46-49; e Arquivo Distrital de Faro (ADF), Cota: 5ª CIProc. 583: Processo n.º 7 Unif., alvará n.º 188, documento 2 de 16-3-1922, referindo no processo inicial assinado por João António Júdice Fialho, que se destinava a laboração duma fábrica de salga, conserva e preparação de peixe; e Jorge Miguel Robalo Duarte Serra - O Nascimento de um império conserveiro: “A Casa Fialho” (1892-1939) [Texto Policopiado], tese de Mestrado em História Contemporânea pela Faculdade de Ciências Sociais e Humanas da Universidade do Porto, 2007, pp. 62-63.

2cf. Informação de Francisco Castelo via e-mail de 2-7-2020.

3cf. Ministério do Mar, Direção-Geral de Recursos Naturais, Segurança e Serviços Marítimos (DGRM), Arquivo do Instituto de Conservas de Peixe (19361986), Júdice Fialho, Conservas de Peixe, SARL, Portimão (S. José). Fab. 4.701.109, 1934.

4cf. Ministério do Mar, DGRM, Arquivo do Instituto de Conservas de Peixe (1936-1986), Júdice Fialho, Conservas de Peixe, SARL. Portimão (S. Francisco). Fab. 4.701.108, 1934 e Portimão (S. José). Fab. 4.701.109, 1934.

5cf. Francisco Capelo - Fototeca Municipal de Lagos

- Cem anos de Indústria Conserveira em Lagos - a memória em imagens - 1º Congresso da Associação de Municípios Terras do Infante - Centro Cultural de Lagos - 23 de Março 2019, pp. 22 e 23.

6cf. Arquivo Distrital de Faro (ADF), Cota: 5ª CIProc. 583: Processo Nº 7 Unif. - Alvará n.º 188. doc. S/N de 16 de Maio de 1960.

7cf. ADF, Cota: 5ª CIProc. 583: Processo n.º 7 Unif.Alvará n.º 188, documento 24 v.º, de 10-2-1939 e Jorge Miguel Robalo Duarte Serra, op. cit., p. 99. 8cf. Ana Rita Silva de Serra Faria - A organização contabilística numa empresa da indústria de conservas de peixe entre o final do século XIX e a primeira metade do séc. XX: o caso Júdice Fialho”, Tese de Mestrado, Universidade do Algarve / Universidade Técnica de Lisboa, Faro, 2001, Anexos, quadro II. 7, op. cit., p. 15.