Plant Project #29

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Para quem pensa, decide e vive o agribusiness

O AGRO COMO O MERCADO GOSTA Como as exigências dos consumidores de todo o mundo impactam na forma de produzir no campo AGRICULTURA REGENERATIVA POR QUE O SISTEMA CONQUISTA CADA VEZ MAIS PRODUTORES E EMPRESAS

O PAMPA E A SOJA EXPANSÃO DAS LAVOURAS DO GRÃO DESAFIA A TRADIÇÃO DOS GAÚCHOS IMAGEM LUCRATIVA

OS MUNICÍPIOS QUE COLHEM A FAMA DO QUE PRODUZEM

GASTRONOMIA

UMA MERECIDA E LUXUOSA HOMENAGEM À MANDIOCA

FAZENDAS VERTICAIS INVESTIDORES IRRIGAM (E MUITO!) venda proibida distribuição dirigida www.plantproject.com.br

AS LAVOURAS DENTRO DE GALPÕES

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Você constrói um novo futuro.

Principais benefícios: Gestão de resíduos Tratamento de efluentes Consumo de água Autossuficiência em energia limpa Sistema de tratamento de gases Investimento de 2,75 bilhões de reais Geração de 7.500 empregos durante a obra

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Nós também. Economizando 2.000 litros de água para cada tonelada de celulose.

projeto

cmpc Juntos construímos o futuro. Hoje. O que faz a diferença para um mundo mais sustentável são as atitudes. Por isso, estamos lançando o Projeto BioCMPC, um conjunto de 31 ações ligadas à sustentabilidade e à modernização das nossas operações da Unidade Industrial no Rio Grande do Sul, trazendo benefícios ambientais e sociais, além de um aumento de 18% na capacidade produtiva. Um projeto que trará desenvolvimento local e está alinhado às melhores práticas de ESG, tornando a CMPC uma das empresas de celulose mais sustentáveis do Brasil.

Saiba mais em cmpcbrasil.com.br/bio PLANT PROJECT Nº29

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E ditoria l

UM GIGANTE VULNERÁVEL Para quem pensa, decide e vive o agribusiness

O AGRO COMO O MERCADO GOSTA Como as exigências dos consumidores de todo o mundo impactam na forma de produzir no campo AGRICULTURA REGENERATIVA POR QUE O SISTEMA CONQUISTA CADA VEZ MAIS PRODUTORES E EMPRESAS

O PAMPA E A SOJA EXPANSÃO DAS LAVOURAS DO GRÃO DESAFIA A TRADIÇÃO DOS GAÚCHOS IMAGEM LUCRATIVA

OS MUNICÍPIOS QUE COLHEM A FAMA DO QUE PRODUZEM

GASTRONOMIA

UMA MERECIDA E LUXUOSA HOMENAGEM À MANDIOCA

FAZENDAS VERTICAIS INVESTIDORES IRRIGAM (E MUITO!) venda proibida distribuição dirigida www.plantproject.com.br

AS LAVOURAS DENTRO DE GALPÕES

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O professor Marcos Fava Neves, economista da USP de Ribeirão Preto e um dos maiores estudiosos das cadeias produtivas do agronegócio, já fez as contas. A cada minuto, o Brasil exporta mais de R$ 1 milhão em produtos agropecuários. Mais de 200 países são clientes de nossos produtores e empresas e a pauta de itens vendidos é bastante diversificada. Ao final de 2021, contabilizamos mais de US$ 120 bilhões em vendas externas, um crescimento de quase 20% em relação ao ano anterior. Com importações na casa de US$ 15 bilhões, o setor registrou um superávit superior a US$ 105 bilhões. São dados de dar orgulho a quem produz. Apresentados assim, friamente, parecem desenhar um cenário confortável para o País e para os exportadores. Quando se olha a imagem com lupa, percebe-se, porém, sinais de que é preciso cautela espalhados por toda parte. Se exportar é o que importa (e realmente é importante), talvez seja hora de nos importarmos também com a qualidade dessas vendas e da política externa brasileira. Afinal, cerca de dois terços das exportações do agronegócio estão concentrados em apenas dez países clientes. Os dois principais, China e União Europeia, são o destino de nada menos do que 47,5% dos embarques de produtos agrícolas brasileiros. Concentração semelhante se encontra nas commodities exportadas. Nosso principal produto, a soja, representa 14% do total das exportações brasileiras (não apenas as agrícolas). Somente a China compra cerca de 70% desse volume. A incerteza que ronda a geopolítica global, aliada a esse quadro de imensa dependência das vontades de uns poucos clientes, nos indica que, ao invés de uma fortaleza, temos no flanco comercial externo uma possível vulnerabilidade. Em tempos assim, a inteligência e a sutileza são armas fundamentais para o sucesso da diplomacia comercial. A China já informou ao mundo que tem um plano para aumentar em 40% sua produção de soja até 2025, reduzindo dramaticamente a dependência de compras externas – e também aumentando a demanda interna por fertilizantes e defensivos, o que certamente trará impactos nos mercados globais desses produtos. Já a União Europeia a cada dia eleva o nível de barreiras ambientais impostas às commodities brasileiras. Falar grosso e fechar os olhos para essas questões não manterá esses mercados abertos. Tampouco abrirá outras portas para nossos produtos. Entender o que os clientes querem é o que faria um bom vendedor.

Luiz Fernando Sá Diretor Editorial

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Mantenha um controle uniforme sobre seu sistema de resfriamento com Ackumen ™ Cooling Management Há muitas coisas que podem dar errado em seu sistema de resfriamento, o que pode colocar em risco o desempenho geral do seu processo ou da sua planta. Gerenciar a água de resfriamento em usinas de açúcar e etanol é ainda mais desafiador devido à presença de sustâncias orgânicas no sistema. Mas sua especialidade está em sua operação principal, não na área de utilidades de água; então é difícil entender o que está acontecendo e qual será o possível impacto sobre seus resultados. Com o Ackumen Cooling Management, você pode manter um controle uniforme sobre o sistema de resfriamento. Usando o Insights Lab, você pode saber definitivamente quais ações precisam ser executadas e quando. Com transparência de processo, você verá com segurança todo o seu processo de resfriamento de qualquer lugar. E com a manutenção proativa de nossos sensores de automonitoramento e autodiagnóstico, você evitará o desvio do sensor e manterá seus dados “íntegros”. Problemas em seu sistema de resfriamento colocam em risco as principais expectativas operacionais. Mantenha seu sistema de resfriamento operando de forma eficaz para que continue atendendo adequadamente seu principal negócio. Entre em contato com o representante de vendas da Buckman ou digitalize o Código de Barras para obter mais informações.

Ackumen Cooling Management Insights acionáveis Transparência de processo Manutenção proativa

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Ín di c e

plantproject.com.br

G pág. 7 Ag pág. 17 Fo pág. 61 Fr pág. 65 W pág. 73 Ar pág. 91 S pág. 99 M pág. 118 G LO B AL

D i retor E di toria l Luiz Fernando Sá luiz.sa@plantproject.com.br D i retor C o mercia l Renato Leite Marketing e Publicidade Multiplataforma renato.leite @plantproject.com.br D i retor Luiz Felipe Nastari A rt e Andrea Vianna Projeto Gráfico e Direção de Arte C ol a b ora d ores : Texto: Texto: Amauri Segalla, André Sollitto, Bruno Cirillo, Evanildo da Silveira, Lívia Andrade, Marco Damiani, Ronaldo Luiz, Sérgio Quintanilha, Suzana Barelli Fotos: Isadora Guarnier Design: Bruno Tulini Revisão: Rosi Melo A dm i n i str aç ão e Fi na nç as Cláudia Nastari Sérgio Nunes publicidade@plantproject.com.br Im pre s s ão e aca ba m ento : Piffer Print

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Uma nova vida no solo: Compostagem de restos mortais para transformá-los em adubo vira um novo e polêmico negócio nos EUA

G GLOBAL

O lado cosmopolita do agro

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G

GLOBAL

O lado cosmopolita do agro

E S TA D O S U N I D O S

AO PÓ VOLTARÁS... A compostagem humana, processo que consiste em transformar restos mortais em adubo para o solo, ganha cada vez mais adeptos. Segundo ambientalistas, método pode ajudar no combate às mudanças climáticas

Em dezembro de 2020, a arquiteta americana Katrina Spade realizou o sonho de uma vida inteira. Depois de 15 anos de pesquisas, ela abriu oficialmente a Recompose, a maior empresa dos Estados Unidos especializada em, veja só, compostagem humana. Por mais mórbida que possa parecer, a iniciativa vem ganhando adeptos no país inteiro – entre os vivos e os mortos. “A menos que sejamos cremados ou mumificados, nosso corpo irá se decompor depois que morremos. E ponto”, disse Spade em entrevista recente. “O que proponho é facilitar essa decomposição, de forma que o organismo humano possa se integrar à terra, 8

à natureza. Acho mais inteligente.” A ideia, de fato, não tem nada de tétrica. Em tempos de mudanças climáticas – e diante da urgência em proteger o planeta –, métodos como a compostagem humana são vistos como uma forma eficaz de evitar emissões. Essa é a premissa por trás da Recompose e de outras seis fazendas de corpos que surgiram nos últimos dois anos nos Estados Unidos após o setor ser regulamentado. Cinco estados americanos – Delaware, Havaí, Maine, Massachusetts e Nova York – possuem legislações que autorizam a compostagem de pessoas. Na Europa, a Suécia foi o primeiro país a liberar


Equipe da Recompose na estufa da empresa no estado de Washington e o resultado da compostagem

a prática, e há discussões jurídicas em andamento no Reino Unido e na Alemanha. Mas, afinal, como é feita a compostagem? Durante 30 dias, o corpo permanece em um compartimento fechado que contém pedaços de materiais orgânicos, como lascas de madeira, alfafa e palha. De tempos em tempos, ele é girado lentamente para estimular a proliferação de micróbios e bactérias capazes de decompor a matéria orgânica. Com o auxílio do calor, o corpo vira adubo em apenas um mês. O método é semelhante à compostagem de alimentos, em que a proporção adequada de nutrientes e materiais cria o ambiente propício para a decomposição. No final, os familiares recebem o adubo resultante do processo, em um volume suficiente para encher dois carrinhos de mão. Depois, o material pode ser usado para plantar flores, árvores ou qualquer outro vegetal. A lógica da compostagem humana é justamente essa: graças a esse método, os

nutrientes do corpo humano irão sustentar uma nova vida no solo. “O processo nos lembra que, apesar de toda a tecnologia inventada, continuamos a integrar ciclos essenciais, de vida e morte, da natureza”, diz a fundadora da Recompose. Além disso, o sistema tem inegáveis vantagens ambientais. Segundo as empresas envolvidas com esse tipo de trabalho, a redução natural orgânica de um corpo impede que 1,4 tonelada de carbono seja lançado na atmosfera. Se a iniciativa fosse adotada em larga escala, portanto, o planeta agradeceria. Não é difícil entender por que a compostagem humana é melhor para o clima. Apenas nos Estados Unidos, a cremação de pessoas produz 250 mil toneladas de emissões de dióxido de carbono por ano. E o problema tende a se agravar. Atualmente, a cremação é a escolha de 50% dos americanos, mas pesquisas recentes mostram que até 2040 o índice deverá chegar a 80%. Ao longo dos anos, o enterro convencional, por sua vez, transforma cemitérios em aterros

tóxicos. Com o adensamento populacional, no futuro certamente faltará espaço para dar fim aos restos humanos, especialmente nas grandes cidades. É por isso que muitos ambientalistas enxergam na compostagem um caminho tão necessário quanto inevitável. A compostagem esbarra em alguns obstáculos para se tornar popular. Um deles é o preço. Na Recompose, o custo do processo integral, do transporte do corpo até a entrega do adubo para os familiares, é de US$ 5,5 mil, acima do valor gasto em uma cremação básica. Na lógica de mercado, porém, quanto mais empresas entrarem no ramo, maior a chance de os valores caírem. Também é preciso enfrentar velhos tabus. Depois que a compostagem humana foi aprovada no estado de Nova York, representantes da Igreja Católica local produziram um comunicado que se opunha ao tratamento orgânico dos corpos. No texto, a Igreja chamou o processo de “mais apropriado para vegetais e cascas de ovos do que para corpos humanos”. Os defensores da compostagem rebatem com outro argumento. Eles afirmam que o processo, afinal de contas, pode dar novo significado para a ideia religiosa de ressurreição, na medida em que restos humanos adubam a terra e ajudam a dar vida a árvores e muitas outras plantas. Seria, assim, um novo começo. PLANT PROJECT Nº29

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G ESTONIA

O ROBÔ REFLORESTADOR A Estônia, pequeno país de 1,4 milhão de habitantes no mar Báltico que ganhou a merecida fama de sociedade mais digital do mundo, traz agora uma inovação na área ambiental: o robô reflorestador. Desenvolvido pela empresa de tecnologia Milrem Robotics, ele é capaz de carregar até 300 mudas e plantar 1 hectare de árvores em menos de seis horas. Embora o veículo tenha sido projetado para trabalhar em florestas comerciais, que atendem demandas específicas do mercado – madeireiras, por exemplo –, seus criadores asseguram que ele pode ser utilizado para restaurar florestas naturais. Os robôs são equipados com um sistema

conhecido como Lidar (Light Detection and Ranging), que usa laser para criar imagens tridimensionais do ambiente, além de GPS para navegar nos terrenos. Com isso, o equipamento sabe exatamente onde plantar, o que favorece o desenvolvimento da planta. A Milrem afirma que o equipamento também pode ser usado para outros fins, como preparar o solo para o plantio.

TURQUIA

REALIDADE VIRTUAL PARA VACAS Nos últimos anos, as diferentes aplicações da realidade virtual levaram a pequenas revoluções em diversos setores. Na medicina, a tecnologia tornou mais seguras as cirurgias invasivas. Na indústria automotiva, ajudou a desenhar motores e o interior de carros. Foi também graças à realidade virtual que os videogames passaram a ser atividades mais interativas. Agora a inovação pode ser importante aliada para a produção de leite. Izzet Koçak, um pecuarista da cidade de Aksaray, na Turquia, teve a ideia de equipar suas vacas com óculos de realidade virtual. Com a ajuda de veterinários, o dispositivo foi moldado para se ajustar à cabeça dos animais. Além disso, uma equipe de tecnologia alterou a paleta de cores no software para tornar o aparelho mais adequado aos olhos das vacas. Algumas cores tiveram que ser ajustadas, pois elas não enxergam, por exemplo, vermelho ou verde. Segundo o fazendeiro, os óculos criam para as vacas a ilusão de que estão em um “lindo campo ensolarado.” Resultado: a produção diária de leite saltou de 22 para 27 litros por animal. 10


G CHINA

AS ERVILHAS ELÉTRICAS O uso de campos elétricos para estimular o crescimento de lavouras, técnica conhecida como eletrocultura, está longe de ser unanimidade entre os agricultores, mas a Academia Chinesa de Ciências garante ter a prova definitiva de que o sistema funciona. Os pesquisadores cultivaram dois conjuntos de ervilhas em uma estufa. Uma delas foi exposta a um campo elétrico de alta-tensão gerado a partir da força do vento e da chuva. Segundo os cientistas, as tais ervilhas “elétricas” cresceram num ritmo duas vezes mais

rápido do que as suas versões comuns, e seu tamanho final também foi ligeiramente superior. “O principal avanço é que o sistema autoalimentado pode aumentar o rendimento das culturas ao colher a energia

desperdiçada do vento e da chuva”, declarou Jianjun Luo, idealizador do projeto. Agora ele quer apresentá-lo a grandes produtores e convencê-los de que a proposta pode ser aplicada em larga escala

MÉXICO

O valor sagrado do cacau

Não é de hoje que os historiadores conhecem a importância do cacau para a civilização maia. Achados arqueológicos já mostraram que o fruto era utilizado como moeda de troca, mas tudo indica que seu valor transcendia aspectos meramente econômicos. Pesquisadores da Universidade de Brigham Young, nos Estados Unidos, identificaram alguns dos locais onde o

cacau era cultivado na região de Yucatán, no atual norte do México. Os cientistas analisaram 11 amostras de solo e encontraram substâncias como teobromina e cafeína, que, combinadas, oferecem evidência da presença de cacau. Em um dos campos pesquisados, os cientistas encontraram braceletes, modelos de cerâmica de frutos de cacau e um incensário. Ou seja, tratava-se de um lugar sagrado. “A descoberta inspira uma rica narrativa”, disse Richard Terry, um dos autores do estudo. “Para os maias, o cacau estava carregado de valor econômico, político e espiritual.” PLANT PROJECT Nº29

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G J A PÃO

Como um príncipe provocou uma crise ecológica A ciência descobriu há muito tempo que a maioria dos ecossistemas são sensíveis a forasteiros. Se uma espécie que não é nativa for introduzida em algum ambiente saudável, há boa chance de a invasão gerar desequilíbrios. Os japoneses são a prova definitiva dos estragos que seres estrangeiros podem provocar. Confira a seguir como um príncipe bem-intencionado – mas desconhecedor das relações de causa e efeito na natureza – provocou uma verdadeira carnificina nos rios e lagos do Japão.

O PRESENTE Em 1960, o príncipe Akihito, herdeiro do trono japonês, visitou Chicago. Apaixonado por peixes, ele ganhou do prefeito da cidade um presente inusitado: 18 bluegills, o peixe oficial do estado de Illinois. Akihito levou os exemplares para o Japão, mas não poderia imaginar que sua decisão significaria um erro histórico. 12

A MISSÃO De volta ao Japão, Akihito impôs uma missão à Agência Nacional de Pesca do Japão: eles deveriam criar em cativeiro os bluegills e depois soltá-los nos lagos japonesas. Pedido de príncipe cumpre-se à risca e foi exatamente isso o que os pesquisadores fizeram.

A INFESTAÇÃO Os bluegills se tornaram milhares em cativeiro e, logo depois, começaram a ser soltos na natureza. Na década de 1990, o bluegill havia colonizado todos os ecossistemas de água doce do país. Só então descobriu-se que isso era um problema, mas já era tarde demais.


O PREDADOR Os bluegills são comedores vorazes. Alimentam-se de insetos, plâncton, plantas aquáticas, ovas de peixes nativos e qualquer coisa que se mova e for menor que eles. No início do século, o invasor passou a representar 90% de toda a fauna do Lago Biwa, o maior do Japão, que já abrigou 30 espécies de peixes nativos. O CONTRA-ATAQUE No início do século, o governo japonês enfim percebeu que os bluegills eram um sério problema. Foi quando nasceu um programa de estímulo à pesca e uma campanha

nacional para inspirar japoneses a comer esses peixes. Restaurantes lançaram novidades como o sushi bluegill e uma empresa chegou a criar um hambúrguer feito da espécie. Nada disso adiantou. O SOCORRO DA GENÉTICA Agora geneticistas japoneses estão às voltas com um projeto ambicioso: usar os recursos da edição genética para esterilizar os bluegills. Os cientistas sequenciaram o genoma do infame invasor e produziram peixes machos que transportam um gene estéril, eliminando sua capacidade de reprodução. Se os bluegills

modificados forem introduzidos na natureza, espera-se que, em alguns anos, eles diminuam consideravelmente o número de exemplares da espécie. A POLÊMICA Boa parte da opinião pública japonesa é contra a introdução de peixes geneticamente modificados na vida selvagem. Eles argumentam que não há estudos sobre os impactos que a iniciativa provocaria nos ecossistemas. Temem que um erro do passado leve a outro no futuro. Enquanto isso, os bluegills continuam fazendo estragos nas águas do Japão PLANT PROJECT Nº29

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G ISRAEL

ELES VOAM E COLHEM FRUTAS Robôs que colhem frutas não são novidade nas lavouras, mas máquinas que voam para realizar esse tipo de tarefa ainda são raras – ainda. A startup israelense Tevel Aerobotics pretende lançar em 2022 uma plataforma de condução autônoma com vários equipamentos voadores amarrados, dotados de braços robóticos e garras que são usadas para pegar as frutas das árvores. Com a ajuda da inteligência artificial, os robôs voadores são capazes de colher apenas as frutas que estão maduras. Segundo a Tevel, que foi fundada por veteranos da indústria aeroespacial, eles também realizam outras tarefas, como desbaste e poda de árvores, reduzindo assim o custo de produção de

frutas em cerca de 30%. A solução está em fase final de testes e a ideia é introduzir sua versão comercial primeiro na Europa e depois nos Estados Unidos. A invenção tem potencial econômico. Estudos mostram que o setor de robótica agrícola tem crescido a uma taxa média anual de 30%.

ALEMANHA

EM BUSCA DO CORAÇÃO VALENTE DOS PORCOS

A ciência moderna sempre soube que, cedo ou tarde, a humanidade criaria animais com o fim específico de fornecer órgãos para humanos. Na Alemanha, a Universidade Ludwig-Maximilians (LMU), em Munique, foi autorizada pelas autoridades regulatórios a produzir porcos para o transplante de coração em pessoas. A ideia é que os animais estejam prontos para 14

a sua missão em 2025, ou até um pouco antes disso. Primeiro, contudo, o coração dos porcos será testado em babuínos. Em janeiro de 2022, pela primeira vez na história, uma equipe de cirurgiões americanos transplantou com sucesso o coração de um porco geneticamente modificado em um humano. Como não poderia deixar de ser, o anúncio da universidade alemã despertou a fúria dos defensores dos direitos dos animais, que prometem fazer de tudo para impedir que o projeto seja levado adiante. O debate está apenas começando e certamente acompanhará o avanço da ciência.



G ZIMBÁBUE

A bíblia dos insetos comestíveis

A indústria de insetos comestíveis está crescendo rapidamente. Nos Estados Unidos e na Europa, já é possível comprar alimentos processados que têm como base grilos e larvas. A China lançou há pouco tempo uma novidade: salgadinhos feitos a partir de bichos-da-seda. As opções são tantas que a Universidade de Tecnologia de Chinhoyi do Zimbábue decidiu investir

em uma ousada empreitada: reunir todas as receitas conhecidas no mundo para o preparo de insetos. O livro, ou a bíblia dos insetos, traz opções para todos os paladares, como bolinhos de besouros, nuggets de percevejos e samosa de vermes. Segundo os pesquisadores, o trabalho identificou cerca de 40 espécies que humanos podem comer, e todos eles possuem alto valor nutritivo. Os defensores dos insetos na alimentação também afirmam que a sua produção em larga escala será benéfica para o meio ambiente. Estudos mostram que as emissões de gases do efeito estufa provenientes da agricultura de insetos são 40% inferiores às emissões da pecuária.

E S TA D O S U N I D O S

LAGOSTAS DE LABORATÓRIO Até pouco tempo atrás, fabricar carne em laboratório parecia algo impossível de ser realizado pela ciência. Com os avanços dos últimos anos, porém, as proteínas cultivadas com a ajuda da tecnologia estão chegando a níveis surpreendentes de sofisticação. Uma das empresas mais inovadoras do mundo nessa 16

área, a americana Upside Foods associou-se à startup Cultured Decadence para produzir, em seus tubos de ensaio, lagostas e outros crustáceos. Ao contrário das proteínas à base de plantas, que são fabricadas a partir do processamento de grãos e leguminosas como soja, feijão e ervilha e imitam a textura e o sabor da carne de animais como

gado, frango e peixe, as carnes de laboratório são, de fato, uma proteína animal. Elas são obtidas com o uso de biorreatores a partir de células retiradas de animais vivos. Depois, esse material orgânico é banhado com nutrientes especiais, que oferecem condições ideais de crescimento.


Retalhos de jeans sustentável: Exigências do consumidor estão mudando a produção de algodãoe de outras culturas

Ag AGRIBUSINESS

Empresas e líderes que fazem diferença

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Ag Empresas e líderes que fazem diferença

No passado, bastava ao agronegócio produzir itens de qualidade, mas agora isso tornou-se insuficiente. Para responder às pressões do mercado, é preciso ser cada vez mais sustentável

O VERDE DÁ AS CARTAS P or A mauri S egalla

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foto: Shutterstocik PLANT PROJECT Nº29

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N

o final de janeiro passado, a gigante suíça de alimentos Nestlé divulgou um plano ambicioso de combate ao trabalho infantil na cadeia de cacau, fruto utilizado em boa parte de seu portfólio. Até 2030, a empresa pretende que US$ 1,4 bilhão cheguem a 160 mil famílias produtoras do oeste da África, especialmente na Costa do Marfim e em Gana, de onde saem cerca de 60% do cacau consumido no mundo. Em contrapartida, as famílias deverão adotar boas práticas agrícolas e estimular as crianças a frequentar a escola. “Nós vamos ajudar a garantir a confiança do consumidor em nossos produtos e responder à crescente demanda por cacau comprado com responsabilidade”, ressaltou Magdi Batato, vice-presidente executiva da Nestlé. A Nestlé não incorporou em sua rotina ações como as apresentadas acima porque é uma empresa que se propõe a fazer o bem pura e simplesmente. Tal propósito certamente está por trás do movimento, mas o impulso para que o conglomerado se mobilizasse veio da própria sociedade. Nos últimos anos, a pressão para que as empresas deixassem de comprar cacau produzido em regiões que exploram mão de obra infantil partiu de ONGs de defesa dos direitos humanos, ganhou volume nas redes sociais e chegou às manchetes de veículos como o jornal americano The New York Times e a revista britânica The Economist, ambos de enorme influência no mundo. O tema sensível estava assim colocado na mesa, e ninguém – especialmente as empresas sérias – poderia ignorá-lo.

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Para continuar sendo bem-sucedida, a Nestlé percebeu que era preciso dialogar com os novos tempos. Isso explica os enormes investimentos que a companhia faz e os inúmeros projetos que possui no campo da sustentabilidade, talvez a área mais relevante para o mundo corporativo neste século 21. Se, no passado, bastava às empresas produzir itens de qualidade, agora isso tornou-se insuficiente. Estar bem posicionado exige atenção permanente, interação profunda com o mercado e reação rápida às demandas da sociedade. Expostas como nunca, as empresas descobriram a força implacável que vem do outro lado do balcão – o lado do consumidor. “No mundo digital, o poder do consumidor saiu da esfera regional e chegou ao planeta inteiro”, diz o consultor Eduardo Tancinsky. “Uma pressão que é feita na Europa, como o boicote a produtos brasileiros que devastam a Amazônia, pode levar a prejuízos em fazendas, digamos, no Mato Grosso.” CARBONO NO CARDÁPIO Um mecanismo importante para combater os malefícios ambientais é o mercado de crédito de carbono. De maneira geral, o crédito de carbono pode ser compreendido como a representação da não emissão de dióxido de carbono na atmosfera. A cada uma tonelada não emitida gera-se um crédito, que pode ser comercializado com países ou empresas que eventualmente não cumpriram suas metas ambientais. A gigante de produtos de higiene e limpeza Unilever e a varejista Amazon são exemplos de


Matéria de capa

organizações que se comprometeram a tirar dinheiro do caixa para compensar as suas emissões. Como não poderia deixar de ser, o Brasil, palco da Amazônia, pode faturar alto com esse tipo de operação. Segundo estudo da ICC Brasil e WayCarbon, o potencial do mercado brasileiro é de US$ 100 bilhões em receitas até 2030. A pressão vem de todos os lados, inclusive da mãe de todas as instituições que buscam o desenvolvimento mundial – a ONU. Segundo dados apresentados em um dos painéis do Pacto Global, a indústria têxtil é uma das mais poluentes do mundo. Ela responde por cerca de 10% das emissões globais de CO2 e por 20% da poluição de águas de rios. Além disso, 23% do consumo global de químicos é feito pelo setor e 5% de tudo o que se deposita em aterros sanitários são roupas.

Diante de dados tão devastadores, e da crescente pressão para que se mude esse quadro, o grupo catarinense de moda Malwee decidiu agir. O maior impacto que sua atividade gera em emissões é proveniente da chamada cadeia de valor. Segundo a engenheira Taíse Beduschi, gerente de Sustentabilidade da Malwee, as matérias-primas são a principal fonte de problemas. O algodão, que responde por 70% das fibras usadas pela Malwee, é apontado, ao lado do couro bovino, como um dos grandes vilões ambientais do setor de moda no mundo, o que se deve sobretudo às elevadas emissões de carbono e ao alto consumo de água nas lavouras. Recentemente, lembra a executiva, a empresa começou a comprar algodão com o selo Better Cotton Initiative (BCI), que certifica melhores práticas na produção do algodão. Até 2030, a

Ag

Malwee pretende rastrear 100% de toda a sua cadeia de fornecimento. Isso inclui o monitoramento completo das atividades de seus fornecedores, como eventuais violações trabalhistas. Com isso, a companhia não apenas contribuiu para a preservação do planeta e para o aprimoramento da agenda social do País, mas escapa de ser alvo de críticas. “A sociedade exige cada vez mais padrões elevados de sustentabilidade em todas as atividades produtivas, e o mundo corporativo deve estar atento a essas demandas”, diz Tancinsky. A cobrança chega a todas as camadas empresariais. Uma das maiores grifes de luxo do mundo, a americana Ralph Lauren também está preocupada com a sustentabilidade da cadeia do algodão. Em parceria com a conterrânea Dow, a principal indústria química do planeta, PLANT PROJECT Nº29

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desenvolveu um método de tingimento de algodão mais sustentável. Segundo as duas gigantes, o tratamento conhecido como EcoFast Pure reduz significativamente a quantidade de água, de produtos químicos e de energia necessários para o tingimento das fibras. O objetivo, conforme alegam as empresas, é enfrentar desafios urgentes, como as mudanças climáticas e a crescente escassez de água. Projetos como o da Ralph Lauren são importantes para reduzir impactos ambientais, mas o rastreamento da cadeia produtiva talvez seja a chave para que as empresas ligadas de alguma forma ao agronegócio protejam a natureza. Três dos maiores frigoríficos do Brasil – JBS, Marfrig e Minerva – afirmam manter sistemas de monitoramento que verificam o cumprimento da política 22

ambiental de seus parceiros. O grande desafio, porém, é monitorar os fornecedores de seus fornecedores, já que nem sempre as empresas têm informações sobre eles. CRÉDITOS DE COURO Couro, por exemplo, é muito difícil de rastrear. Como ocorre na cadeia de carne, o ponto de partida para farejar a origem do couro é o gado. No Brasil, dono do maior rebanho bovino do mundo – são mais de 200 milhões de cabeças –, há muitos caminhos obscuros. Metade desses animais está na Amazônia, onde muitos produtores burlam leis ambientais para vender, com aparência de legalidade, o gado que ocupa áreas desmatadas. Uma prática conhecida é a “lavagem de gado”, a transferência de animais de fazendas ilegais para outras que são autorizadas a


Matéria de capa

fazer a venda final, método que geralmente dribla os sistemas de monitoramento. Em recente reportagem publicada pelo The New York Times, JBS e Marfrig disseram que pretendem rastrear todos os seus fornecedores indiretos na Amazônia até 2025. Por sua vez, a Minerva declarou que a meta é ter cadeias de suprimentos totalmente rastreáveis na América do Sul até 2030. Se cumprirem o prometido, as empresas darão notável contribuição para o planeta. Caso contrário, estarão sujeitas ao escrutínio – e ao boicote – de parceiros comerciais, sejam eles governos ou redes de supermercados. E, claro, entrarão na mira de consumidores furiosos. O novo compromisso das empresas revela como, de fato, o jogo mudou. Os verbos “produzir” e “devastar” não podem mais estar na mesma página, sob o risco de as empresas sofrerem os efeitos adversos da pressão da sociedade. No final de dezembro, seis redes europeias de supermercados anunciaram a decisão de não vender mais carne bovina de origem brasileira até que se prove que ela efetivamente não veio de áreas de desmatamento. Não é de hoje que se fala em boicote a produtos que degradam a Amazônia. Uma das primeiras ações desse tipo partiu do McDonald’s. No distante 2006, a rede de lanchonetes – que ironicamente sofre diversas formas de pressão por trabalhar com fast-food – anunciou a

Ag

suspensão temporária da compra de soja brasileira por causa do desmatamento. Em 2019, grandes marcas internacionais de vestuário como H&M, Kipling, Timberland, Vans e The North Face interromperam a compra de couro do Brasil em meio à forte repercussão internacional das queimadas na região amazônica. De fato, há sérios entraves a resolver, mas é preciso reconhecer que o Brasil tem bons exemplos a apresentar. No ano passado, o couro sustentável da JBS, chamado Kind Leather, recebeu a melhor nota do setor no Higg Materials Sustainability Index (Higg MSI), que certifica matériasprimas utilizadas na indústria da moda. Para a obtenção do selo, são avaliados aspectos como uso racional de água, eliminação de combustíveis fósseis e redução

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de produtos químicos. Segundo a JBS Couros, seu sistema de produção remove, logo no início do processo, as partes do couro que seriam pouco aproveitadas para então direcioná-las a outras indústrias, como farmacêutica e de alimentos. Com isso, a empresa transforma resíduos em matéria-prima, contribuindo para a sustentabilidade de toda a cadeia de valor. Em outra frente, mas também na cadeia de couros, um projetopiloto liderado pela Textile Exchange, através do programa Leather Impact Accelerator (LIA), pretende testar a ideia de se criar um mercado mundial de créditos de couro responsável, combatendo o desmatamento e incentivando a adoção de práticas de bem-estar animal. Pelos próximos três anos, com o apoio de grifes internacionais como a sueca H&M, a entidade, que reúne as principais empresas da moda 24

no mundo, vai aplicar o modelo em propriedades da Amazônia e do Cerrado. A Produzindo Certo, empresa especializada em levar assistência técnica de sustentabilidade ao campo, será a responsável pela implementação do piloto junto aos pecuaristas. “Queremos demonstrar como produtores conseguem passar a atuar como agentes de conservação quando devidamente remunerados”, afirma Charton Locks, diretor de Operações da Produzindo Certo. No projeto, o pecuarista que demonstra compromisso e responsabilidade na produção a partir de um protocolo determinado, sem desmatamento e com bem-estar animal, faz jus a um crédito de couro, calculado a partir da quantidade de animais que estiveram na fazenda durante o ano. “O modelo é semelhante ao que já acontece em mercados como o da palma, da soja e do

carbono, por exemplo”, diz Charton. “A marca não estará comprando o couro diretamente do produtor, mas o remunerando pela quantidade necessária para compensar parte do uso de couro na fabricação de seus produtos”. COMMODITIES COM ALGO A MAIS A cafeicultura brasileira também está atenta à nova realidade. Atualmente, o País conta com vários certificados de sustentabilidade, mas o Conselho dos Exportadores de Café do Brasil (Cecafé) pretende ir além. O objetivo da entidade é que o setor seja reconhecido como cultura de baixa emissão de carbono (CO2), um dos principais gases causadores do efeito estufa. Em 2021, o Cecafé iniciou um programa voltado à aferição do gás carbônico nas lavouras. Chamado de Projeto Carbono,


Matéria de capa

seu objetivo é demonstrar quanto a cafeicultura brasileira está contribuindo para a redução das emissões de gases associados às mudanças climáticas. A primeira etapa, iniciada no final do ano passado, consistiu em avaliar 40 fazendas cafeicultoras em Minas Gerais. Há inúmeros projetos em andamento. Todas as mil fazendas brasileiras que fornecem café para a Nespresso, uma das unidades de negócios do Grupo Nestlé, fazem parte do programa AAA de Qualidade Sustentável. Graças a essa iniciativa, realizada em parceria com a Rainforest Alliance, os cafeicultores têm acesso a técnicas que levam à produção de grãos de alta qualidade, mas com a adoção permanente de técnicas sustentáveis. Maior celeiro de soja do mundo, o Brasil está na vanguarda global quando o assunto é produção sustentável. O País lidera a lista dos países com maior produção de soja certificada, com aproximadamente 3,7 milhões de toneladas. Três estados – Mato Grosso, Rondônia e Pará – concentram os exemplos positivos. Juntos, eles abrigam 89 propriedades que possuem o selo RTRS (Mesa-Redonda sobre Soja Responsável, na sigla em inglês), iniciativa internacional na qual produtores, comerciantes e processadores de soja trabalham em conjunto com bancos e organizações sociais para

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assegurar o cultivo de soja sustentável e a responsabilidade social do setor. Juntas, as fazendas perfazem um total de 1,7 milhão de toneladas de grãos em capacidade produtiva. Mas, afinal, por que a certificação é importante? Com o selo, a região se beneficia principalmente pela facilidade no escoamento da produção para a Europa. “A exportação rastreada facilita as transações com empresas compradoras que buscam a certificação”, aponta Cid Sanches, consultor externo da RTRS no Brasil. Em outras palavras: ela, em suma, se contrapõe a eventuais pressões do mercado. O mundo mudou. Produzir com sustentabilidade passou a ser a principal demanda da sociedade, que exige compromissos ambientais e sociais cada vez mais firmes. E não há dúvida: o agronegócio é protagonista desse movimento.

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MAIS VIDA NA LAVOURA Como a agricultura regenerativa tem ajudado produtores e empresas a mitigar os efeitos das mudanças climáticas

foto:

Por Lívia Andrade

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Vespa predadora de pragas no cafeeiro: com técnica regenerativa, insetos ajudam no controle dos inimigos da produtividade PLANT PROJECT Nº29

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s eventos climáticos extremos têm colocado o mundo em alerta, chamando a atenção dos países para a necessidade urgente de adoção de medidas para a contenção do aquecimento global. Neste contexto, um termo da década de 1970, cunhado pelo americano Robert Rodale (1930-1990), voltou à tona. Trata-se do conceito de “Agricultura Regenerativa”, um modo de produção que prioriza a saúde (microbiologia) do solo e uma visão mais holística de todo o processo. No Brasil, a agricultura regenerativa

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vem ganhando visibilidade graças ao trabalho de empresas como a Scheffer e a reNature. A primeira é uma das maiores produtoras de grãos do Brasil e foi a pioneira no País a conquistar, no início do ano passado, o selo “Regenagri”, de agricultura regenerativa, emitido pela certificadora Control Union. Com uma área de cultivo de mais de 220 mil hectares espalhados pelos estados de Mato Grosso, Maranhão e Pará, a Scheffer iniciou a produção regenerativa (soja e algodão) em pouco mais de 4 mil hectares. “Começamos há cinco anos porque do jeito que estava não era sustentável. Todo ano tínhamos que aumentar o número de aplicações de químicos”, diz o economista Guilherme Scheffer, diretor financeiro da empresa. A princípio, o projeto era uma aposta, uma tentativa de evoluir, fazer algo diferente. “Lá atrás, só tínhamos gastos. Se pensássemos só nos custos, não teríamos chegado aonde chegamos”, diz Scheffer. Além do plantio direto, o manejo regenerativo prioriza o uso de insumos biológicos e levou a empresa a investir R$ 35 milhões na construção de uma biofábrica para a produção “on farm” de micro-organismos, que são usados em todas as unidades da empresa. Os resultados não demoraram a aparecer. A nova forma de conduzir a lavoura trouxe de volta os inimigos naturais das pragas e, no solo, a vida começou a desabrochar com o aparecimento de minhocas e fungos. Na safra 2019/20, a aplicação de químicos nas lavouras de soja diminuiu 53% e nas áreas de algodão, 34%. Isso sem alterar os índices de produtividade. A busca por


Sustentabilidade

uma agricultura mais equilibrada trouxe uma externalidade positiva em 2021. A Scheffer fechou uma operação de crédito verde de US$ 16 milhões com o Rabobank. “Conseguimos um desconto na taxa de juros que está atrelado a dobrar a área do projeto [para 8,1 mil hectares] até a expiração do crédito [em 2023]”, explica o economista. A reNature, startup holandesa que tem o brasileiro Felipe Villela como um dos fundadores, é outra empresa que tem disseminado o conceito. “Queremos regenerar 100 milhões de hectares, o que significa 2% da área agrícola mundial. Vamos fazer isso apoiando 10 milhões de agricultores na transição para uma agricultura de baixo carbono”, explica o cofundador. Mas, afinal, o que é agricultura regenerativa? Trata-se de um sistema de manejo que promove a resiliência climática ao regenerar o solo. “Ser sustentável é reduzir os impactos negativos, ser carbono neutro é minimizar o dano já causado ao meio ambiente”, diz Villela. “Ser regenerativo vai além. É ser carbono positivo, melhorar as condições do ambiente com técnicas como plantio direto, plantas de cobertura que não deixam o solo exposto e retêm água e carbono. Tem a ver com rotação e diversificação de culturas, como o plantio de árvores, arbustos e forrageiras que atraem os inimigos naturais da plantação

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principal”, acrescenta. Criada em 2019, a reNature vem ajudando empresas como Nestlé, Danone, Chandon, Tommy Hilfiger a mapear a cadeia de suprimentos e mensurar o impacto da adoção de determinados pacotes tecnológicos na redução das emissões de gases do efeito estufa (GEE). Tal ação está alinhada com dois objetivos de desenvolvimento sustentável da Agenda 2030 da Organização das Nações Unidas (ONU): agricultura sustentável (2º ODS) e ação contra a mudança do clima (13º ODS). Além disso, a temática está em sintonia com o Pacto Ecológico Europeu, que propõe medidas para a Europa se tornar neutra em carbono até 2050. SEMÁFORO AMARELO O aquecimento global é uma grande ameaça para o mundo, sobretudo para os países produtores de café. No Brasil, modelagens climáticas indicam que, se houver um aumento de 4 °C, importantes regiões produtoras poderiam se tornar inaptas à cafeicultura. Diante disso, em 2019 a Nespresso começou a pensar em como dar uma resposta às mudanças climáticas. Na época, o Brasil estava adiantado na estratégia de sustentabilidade. “Desde 2017, tínhamos cumprido a meta de fazendas com certificação Rainforest e isso nos deu um respiro para pensar o planejamento para 2020- 2030”, PLANT PROJECT Nº29

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diz Guilherme Amado, responsável pelo programa de agricultura sustentável da Nespresso no Brasil e no Havaí. Neste ínterim, ele foi apresentado a Felipe Villela, cofundador da reNature, que atua de diferentes formas para ajudar grandes empresas na transição para uma economia de baixo carbono. “A primeira delas é através de um planejamento estratégico, em que mapeamos a cadeia de suprimento e identificamos onde a companhia pode trabalhar para atingir os indicadores almejados”, diz Villela. A segunda maneira é via assistência técnica. “Implantamos projetos-piloto em fazendasmodelo para disseminar as práticas”, diz o empreendedor. O monitoramento do impacto é a terceira forma de ação. “Medimos o carbono sequestrado, os aspectos sociais e, em breve, vamos lançar uma plataforma de Pagamentos por Serviços Ambientais (PSA)”, explica. A quarta modalidade “stakeholders engagement” facilita o acesso a investimentos e a mercados premium. “Fazemos a ponte com empresas europeias dispostas a pagar um diferencial por produtos regenerativos”, ressalta Felipe. A parceria da reNature e Nespresso engloba todas as modalidades. “Desde as primeiras conversas, queríamos identificar uma fazenda para criar uma unidade demonstrativa”, diz Amado. Em 2020, o contrato entre as duas empresas foi 30

assinado e, no ano passado, foi dado início ao projeto com nove fazendas do Cerrado Mineiro, região que concentra mil dos 1,2 mil fornecedores de café da Nespresso no Brasil. A propriedade-modelo é a Guima Café, do grupo mineiro BMG, que tem 850 hectares de cafezais. Deste montante, 53 hectares são de cafeicultura regenerativa, sendo que 3


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hectares foram implantados especificamente para o projeto. “Os 3 talhões ficam numa área com solo e microclima idênticos. No primeiro, plantamos no método convencional; no segundo, colocamos plantas de cobertura nas entrelinhas do cafezal; e no terceiro, além das forrageiras, plantamos uma linha de biodiversidade com abacate, cedro e erva-baleeira”, diz Lucimar Silva, gestora da Guima Café. Segundo o cofundador da reNature, o objetivo é monitorar os impactos relacionados ao sequestro de carbono, biodiversidade, resiliência climática e comparar os dados financeiros. “O quanto cada manejo diminuiu no uso de fertilizantes, quanto aumentou a renda por conta dos abacates. Vamos acompanhar o processo para compartilhar os dados com outros produtores que queiram implementar”, diz Villela. Paralelamente, a Nespresso tem outras parcerias. Uma delas é com a pesquisadora Madelaine Venzon, da Epamig, que estuda controle biológico conservativo, que consiste no plantio consorciado da lavoura principal com arbustos (erva-baleeira e fedegoso) e árvores (ingá) que aumentam a população de inimigos naturais das pragas do café. Outro acordo de peso é com o Ribersolo – Laboratório de Análises Agrícolas de Ribeirão Preto (SP), que está conduzindo a amostragem para formação de

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uma base de dados – baseada na metodologia da microbiologista Ieda de Carvalho Mendes, da Embrapa – que desenvolveu, para outras culturas, uma tabela com níveis de atividade microbiológica do solo. “Daqui dois anos, queremos que ela trabalhe uma tabela semafórica para o café, com indicadores verde, amarelo e vermelho associados à matéria orgânica e à composição do solo, argila, areia e silte”, explica Amado. A Nespresso também tem uma parceria importante com o Instituto de Manejo e Certificação Florestal e Agrícola (Imaflora), que desenvolveu um guia do que seria a agricultura regenerativa para o Cerrado Mineiro. “É uma região estratégica em nível global, porque é a única no mundo que tem mecanização em escala”, diz o líder do Programa Nespresso AAA de Qualidade Sustentável. “Os cafés do Cerrado são ingredientes-chave para grande parte de nossas cápsulas, porque os cafeicultores de lá têm grandes volumes, qualidade, consistência e padrão”, acrescenta. Além disso, os cafés naturais (aqueles que secam com a casca) dão corpo à bebida e seguram o blend com outros cafés com acidez mais alta. "Outra vantagem é que existe disponibilidade de fornecimento, ou seja, compramos menos café do que há disponível. Ainda temos uma margem de crescimento grande”, explica. SOB MEDIDA A marca premium de café da PLANT PROJECT Nº29

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Trigo mourisco nas entrelinhas do cafezal: forregeira atrai inimigos naturais que controlam a broca-do-café

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Nestlé trabalha com um sistema de agricultura regenerativa TaylorMade, customizada para se encaixar ao seu modelo de negócio. “Para a Nespresso, a cafeicultura regenerativa é um modelo de agricultura lucrativa baseada na natureza”, diz Guilherme. “Hoje, o nosso desafio é estabelecer quais os indicadoreschave para monitorar o solo saudável, a biodiversidade, a água, o carbono e os indicadores econômicos”, acrescenta. A companhia estima que, na sua base de fornecedores, 150 se enquadrariam na nomenclatura de “early adopters”, produtores que estão na vanguarda da adoção das novas tecnologias. Não por acaso, para este ano a meta da empresa é escalar o projeto de nove para 100 fazendas, implementando quatro práticas agrícolas. A primeira delas, considerada a mais importante, é o plantio de um mix de seis forrageiras entre as linhas dos cafezais. Cada planta de cobertura tem uma finalidade. O trigomourisco atrai abelhas e crisopídeos, um inimigo natural do bicho mineiro. A braquiária tem raízes profundas e ajuda a infiltração da água. “Quando há plantas de cobertura, aumenta a umidade do solo, a evapotranspiração é menor, com isso irrigo menos e aproveito melhor os recursos hídricos”, diz Lucimar. A segunda é a escolha de cultivares de café mais adaptados às mudanças climáticas, ou seja,

mais resistentes ao estresse hídrico. No caso da fazenda Guima, a variedade escolhida foi a IPR 100, que tem tolerância à ferrugem, antracnose e resistência à seca. Já a terceira é a utilização de insumos orgânicos e compostagem com acréscimo de pó de rocha e inoculação de micro-organismos que ajudam a ativar os nutrientes desse resíduo das pedreiras. E a quarta e última é a arborização, que consiste em plantar árvores e arbustos onde for possível, uma vez que eles reduzem a erosão por vento e fazem um sombreamento parcial que ajuda na maturação dos cafés. “Nossa recomendação é de que haja uma linha de biodiversidade (de árvores) a cada 40 metros. Estamos preparando um guia de espécies, mas a ideia é que tenham um fim econômico, ecológico ou os dois”, explica. Neste primeiro momento, a Nespresso tem ajudado os nove fazendeiros parceiros com a consultoria e financiamento de árvores, do mix de sementes de plantas de cobertura e das análises de solo. “Para as 100 fazendas, ainda vamos conseguir oferecer recursos, mas quando escalarmos para mil fazendas, esperamos contar com recursos que venham de outras fontes. Não só do prêmio Triple A, mas do mercado de carbono e do pagamento por serviços ambientais”, diz Amado. É importante lembrar que para a Nestlé atingir a meta de ser Net Zero até 2050, a empresa terá


que comprar créditos de carbono dentro da própria cadeia, não mais de projetos externos. “Não consigo enxergar outra solução, a não ser utilizar os solos. É a melhor tecnologia à disposição e, dentro da pegada de carbono global, a produção de café verde tem uma porcentagem significativa, que vem da adubação nitrogenada. O regenerativo tem a ver com isso, com todas estas outras formas de adubação, que diminuem a necessidade de fertilizantes químicos”, diz o líder do Programa Nespresso AAA de Qualidade Sustentável. CAFEICULTURA REGENERATIVA Fernando Nogues Beloni, produtor de café, batata e cebola na região de Patrocínio (MG) nunca tinha ouvido falar no

termo agricultura regenerativa, até que um cliente, um distribuidor francês de cafés especiais, indagou se ele adotava esse tipo de manejo. “Não sabia o que era, disse que iria ver, porque já fazia muita coisa sustentável”, diz. Ao pesquisar sobre o conceito, descobriu que o sistema implementado nos 400 hectares de café da Agrobeloni se enquadrava como agricultura regenerativa. Ele faz o plantio de forrageiras (capim braquiária, feijão-guandu, milheto etc.) entre as linhas dos cafezais. Além de contribuir para manter a temperatura do solo mais amena, esta técnica atrai os inimigos naturais das pragas do cafezal, que vem visitar as flores de plantas de cobertura, como trigo mourisco e crotalária. E, ao serem roçadas, a parte aérea dessas forrageiras se transforma em

adubo verde, fazendo a ciclagem de nutrientes e diminuindo a necessidade de adubo químico. Este é um dos pilares da agricultura regenerativa: promover o equilíbrio do ecossistema, ajudando a reduzir a demanda por fertilizantes sintéticos. Neste contexto, uma mudança implementada há cinco anos por Beloni tem feito toda a diferença. “Comecei a fazer compostagem em larga escala com os resíduos das fazendas: palha de café, batata podre, cebola e também compro esterco bovino, esterco de aves, bagaço de cana e pó de rochas regionais”, diz. “Fazemos um blend para a compostagem ter uma relação carbono/nitrogênio ideal”, explica. Com essa prática, o agricultor reduziu consideravelmente o uso de fertilizantes químicos. “Já não uso adubos fosfatados há três PLANT PROJECT Nº29

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Ag Matéria de capa O produtor Fernando Beloni: mais biodiversidade, menos defensivos

anos, potássio também não coloquei nada este ano. O que fazemos é um complemento do nitrogênio, que só o da compostagem ainda não é suficiente. Mesmo assim, já diminuímos bastante”, diz o cafeicultor, que é cooperado da Cooperativa dos Cafeicultores do Cerrado Mineiro (Expocaccer). O manejo sustentável ganhou ainda mais força há três anos, quando o produtor implantou uma biofábrica na fazenda para multiplicar fungos e bactérias, que são usados no controle biológico das pragas e doenças da lavoura. “Isso nos fez reduzir o uso de defensivos químicos.” Mas quando indagado pelo cliente francês, o agricultor não 34

sabia que seu cafezal era regenerativo. Também não conhecia nem um tipo de certificação para esse modo de produção. “Mas, logo na sequência, li uma reportagem do grupo Scheffer, que tinha conquistado a certificação Regenagri, emitida pela certificadora Control Union e fui atrás.” Em dezembro de 2021, saiu o selo da Agrobeloni, que se tornou a primeira fazenda de café no mundo certificada como agricultura regenerativa. “Ano passado, já tinha vendido toda a minha produção, mas para a próxima safra já tenho pedidos tanto da França como do Japão.” Por ser algo novo, Beloni não sabe quanto a mais receberá por

esse diferencial. “Cafés com certificação Rainforest costumam receber entre R$ 30 e R$ 50 a mais por saca. Os cafés carbono neutro da cooperativa monteCCer receberam R$ 100 a mais por saca. Acredito que o acréscimo do Regenagri também ficará em torno de R$ 100”, diz. Por sinal, os princípios fundamentais da agricultura regenerativa, que consiste em não revolver o solo e fazer plantio de forrageiras de cobertura estão muito difundidos na região. Segundo Juliano Tarabal, superintendente da Federação dos Cafeicultores do Cerrado, “de uns cinco anos para cá, a maioria dos produtores tem adotado este manejo”.


Plant + Koppert

UM PASSO RUMO AO FUTURO Com comando e identidade renovados, a Koppert reforça sua liderança no setor de biológicos

Líder mundial em controle biológico e polinização natural, a Koppert está de caras novas. O plural aqui utilizado não é à toa. Assim que começou 2022, a empresa holandesa apresentou ao mercado as faces que a guiarão pelas próximas décadas. Depois de mais de 20 anos sob a liderança dos CEOs Paulo Koppert e Henri Oosthoek, a terceira geração das famílias fundadoras assume o comando já deixando a sua marca. A identidade da companhia foi totalmente renovada, com o famoso K sendo reestilizado para representar a conexão da marca com os novos tempos da agricultura. “Nossa nova marca garantirá uma imagem poderosa em todos os mercados globais”, afirma Martin Koppert, recém-empossado como Chief Business Officer (CBO) na divisão Agri da empresa, responsável pelos produtos voltados a grandes culturas. René Koppert foi nomeado CEO, Joram Oosthoek assumiu como principal executivo financeiro (CFO), René Ruiter, como CBO da horticultura, e Peter Maes, Chief Strategy Officer (CSO). No Brasil, Gustavo Herrmann e Danilo Pedrazzoli, respectivamente diretores comercial e industrial, permanecem responsáveis pela operação da filial, que cresce a uma média superior a 35% ao ano, com expectativa de faturar R$ 400 milhões em 2022. “A nova marca nos inspira ainda mais a perseguir nossa missão, que é uma agricultura 100% sustentável”, afirma Herrmann. “O novo K leva nosso olhar para o futuro, com as cores reforçando a conexão com a natureza e as soluções ilimitadas que podem ser encontradas

nela”, diz Jaqueline Antonio, gerente de Comunicação e Marketing da Koppert Brasil. A identidade renovada reforça também o posicionamento de liderança da empresa na inovação. Com investimentos previstos de R$ 200 milhões nos próximos anos, a Koppert Brasil não só tem aumentado a capacidade de atender a uma demanda maior por bioinsumos no País, mas também no desenvolvimento de novas soluções mais adaptadas ao modelo produtivo local. Segundo levantamento da Spark Inteligência Estratégica, na safra 2020/21 eles movimentaram um mercado de R$ 1,7 bilhão e são cada vez mais utilizados em grandes culturas, como soja (21% das lavouras), cana (50% da área total), e algodão (com o avanço de 28% a 67% no espaço de duas safras). “Antes, o mercado via os biológicos como produtos de pouca tecnologia. Conseguimos mudar essa percepção”, afirma Pedrazzoli. A Koppert Brasil tem investido na incorporação de novas tecnologias, inclusive através de aquisições como da Geocom, especializada na aplicação de biodefensivos por drone. Rebatizada de Natutec, a empresa atingiu a marca de mais de 1,9 milhão de hectares atendidos com a liberação de agentes macrobiológicos nos últimos 12 meses. O novo K também estará estampado no SparcBio, primeiro centro de pesquisa em controle biológico aplicado em agricultura tropical do mundo, parceria com o governo de São Paulo, a Fapesp e a Esalq. Ali também estão sendo dados mais passos para o futuro da agricultura.

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UMA FLORESTA PARA CHAMAR DE SUA Programa de restauração de florestas da Fundação SOS Mata Atlântica une gigantes do agronegócio a produtores que necessitam fazer compensação ambiental Por Marco Damiani

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Centro de Experimentos Florestais da SOS Mata Atlântica em Itu (SP): entidade atua em projetos em 11 estados 38

ma floresta para chamar de sua, capaz de compensar desmatamentos feitos para dar lugar ao plantio ou pasto, cumprir demandas do Código Florestal, sequestrar carbono da atmosfera e, ainda, produzir créditos ao investidor nesse modelo e ao proprietário da terra beneficiada. Não se trata de uma promessa, mas de uma realidade proporcionada pela tecnologia de implantação e restauração de florestas desenvolvida ao longo das últimas quatro décadas pela Fundação SOS Mata Atlântica – a ONG de reconhecimento internacional dedicada à recuperação de florestas nativas no País. Nesse campo, em oposição às informações sobre a degradação ambiental crescente, as notícias são boas: é possível criar, em pouco espaço de tempo, novas florestas em áreas atingidas por queimadas, utilizadas em lavouras e

pastagens ou devastadas por intempéries. Dos tempos em que esparramava sementes jogadas de um helicóptero sobre a Serra do Mar, em São Paulo, nos anos 1990, até os dias de hoje, a entidade avançou em conhecimento e parcerias. É possível, até mesmo, criar uma floresta com recursos ofertados por grandes players do agronegócio, interessados em associações com pequenos e médios produtores para agregar ações sustentáveis às suas marcas. Ganha a organização e, por outro lado, o mercado internacional de créditos de carbono, que comercializa compensações ambientais. Chama atenção a velocidade com que a SOS Mata Atlântica consegue apresentar resultados em seu processo de erguer florestas ricas em sustentabilidade, diversidade e viabilidade. “Entre dois e três anos a partir da introdução no solo das primeiras mudas, a


nova floresta já fica em pé e não demanda mais interferência humana para continuar crescendo”, conta Rafael Bitante, gerente de Restauração Florestal da entidade. “Em cinco anos, a mata está madura, alta e variada, em condições de produzir todos os benefícios ambientais do verde”, completa ele. Para cada hectare em recuperação, 2.500 mudas de árvores são plantadas, representativas de 70 a 100 espécies nativas da Mata Atlântica. Em média, um hectare de floresta nascida por esse processo tem custo estimado em R$ 47 mil. É a situação do terreno que vai determinar qual será o método de regeneração e de implantação. De ponta a ponta, isto é, da definição do projeto à conclusão do trabalho, cerca de 200 trabalhadores em diferentes funções de manejo são mobilizados. A SOS Mata Atlântica se encarrega de aproximar potenciais

investidores dos proprietários interessados em ter florestas em áreas predeterminadas. CERVEJA E FLORESTA A Heineken do Brasil está entre as grandes empresas que usam os modelos da SOS Mata Atlântica para obter compensação ambiental. “A sociedade enfrenta uma série de acontecimentos que nos lembram da necessidade de cuidar do lugar onde vivemos”, afirma Beatriz Dias de Sá, coordenadora de Sustentabilidade e Negócios Corporativos da cervejaria. “Temos o respeito e o cuidado pelas pessoas e pelo meio ambiente como um valor da nossa companhia e entendemos que é fundamental usar a nossa presença no mercado e na sociedade para, além de contribuir, incentivar impactos positivos. Não é à toa que há mais de dez anos realizamos o projeto Aprendendo com a Mata

Atlântica – iniciativa de educação ambiental que promove, além da recuperação ambiental, o desenvolvimento educacional e já impactou mais de 40 mil estudantes”, lembra ela. “O reflorestamento é uma maneira efetiva de fazer essa compensação. Da nossa parte, temos todo o interesse em participar de ações que promovam sustentabilidade a partir de uma tecnologia moderna e eficiente”, afirma. Assim como a Heineken, grandes companhias como a AES Tietê, Ypê, Nestlé, Raízen, Scania e Mercedes já assinaram contratos com a SOS Mata Atlântica para se associarem, na qualidade de investidores no reflorestamento, a empreendimentos de recuperação ambiental. “Nove em cada dez grandes companhias do agronegócio brasileiro estão preocupadas com emissões de carbono e como realizar a sua compensação”, lembra o gerente Bitante. PLANT PROJECT Nº29

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42 MILHÕES DE MUDAS Os números resultantes dessas parcerias impressionam. Desde a sua fundação, em 1986, a ONG já teve financiado o plantio de 42 milhões de mudas de árvores, somando mais de 3 mil projetos em 500 municípios da região da Mata Atlântica em 11 estados. A soma da área beneficiada é equivalente a 23 mil campos de futebol. Há duas grandes metodologias no processo de restauração florestal, a passiva e a ativa. No primeiro modelo, a simples eliminação dos fatores de degradação já cria as condições para a introdução de sementes e mudas. É o caso de áreas de pastagens, nas quais a

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saída do animal costuma deixar um solo fértil para o crescimento de muitas espécies de árvores e plantas. No processo ativo, os técnicos da Fundação visitam o local escolhido e realizam um levantamento completo sobre as condições do solo e do clima. Com base nos resultados, determinadas mudas e plantas são escolhidas para dar início à restauração. Normalmente, são selecionadas mudas das chamadas árvores de cobertura, mais altas, e sementes de espécies médias e pequenas, de modo a crescerem em paralelo. O principal alvo dos projetos de restauração florestal é, hoje, o interior de São Paulo. Há preferência por áreas que

envolvam mananciais, nascentes e rios, de modo a reduzir riscos de desabastecimento de água no entorno. A legislação estadual, ao mesmo tempo, incentiva a compensação ambiental. O Brasil tem metas de restauração ambiental bastante ambiciosas a cumprir, como a de recuperar 12 milhões de hectares e implementar 5 milhões de hectares de sistemas com integração entre lavoura, pecuária e floresta até 2030. Pelo Acordo de Paris, assinado pelas autoridades brasileiras, o País também precisa recuperar rapidamente 5 milhões de pastagens degradadas. A área da Mata Atlântica, que hoje tem cerca de 12% da vegetação


Sustentabilidade

original, é o bioma que mais deve ser beneficiado por essas metas. Nada impede que a tecnologia de restauração beneficie, no futuro, áreas devastadas na Amazônia. Mas o salto deve ser dado com segurança. “A região amazônica ainda não entrou no nosso foco, em razão do muito que há por fazer no próprio bioma da Mata Atlântica”, ressalva Bitante. “Mas não tenho dúvida de que, se formos chamados a estudar o caso específico da nossa floresta tropical, toda a tecnologia que desenvolvemos até hoje será muito útil.” MAIS ÁGUA E FORMIGAS Na ponta final do ciclo, o proprietário rural é o grande beneficiado. Fazendeiro no interior de São Paulo, onde cria, recria e engorda um rebanho de

5 mil cabeças de gado, o engenheiro agrônomo Manoel Rainho já acumula 120 hectares de florestas recompostas com mais de 160 mil mudas, em três fazendas diferentes. Ele participa dos programas Floresta do Futuro e Click Floresta, da SOS Mata Atlântica desde 2011. “Cedi as terras para recomposição, preservei córregos e resolvi minha questão de reserva legal para estar adequado ao Código Florestal”, diz Rainho. E tudo isso sem investir recursos próprios. “Empresas que precisam plantar, mas não têm terra, pagam pelo trabalho da SOS Mata Atlântica, mas nós mesmos não ficamos sabendo exatamente quem fez esse patrocínio”, explica. O engenheiro Rainho, de 53 anos, confirma que, com a tecnologia empregada na recomposição, em três anos se

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alcança um porte médio de 6 metros nas novas florestas, atingindo quase 10 metros após dois anos. “É um processo relativamente rápido”, conta. “Depois que a floresta está de pé, é só cuidar de formiga”, divertese. A primeira fazenda dele a ser beneficiada foi a Miralua, em Marabá Paulista, a partir de 2011. Foi escolhida uma Área de Preservação Permanente (APP) à volta do córrego Jataí. “Hoje, ele está mais profundo e mais volumoso, além de totalmente protegido”, comemora o fazendeiro. Pouco depois, propriedades nos municípios paulistas de Piquerobi e Caiuá também tiveram áreas recompostas, com 50 mil mudas em cada uma delas. Rainho tem planos agora de recompor mais 160 hectares de florestas em suas terras nos próximos anos. PLANT PROJECT Nº29

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TECNOLOGIA DO CAM Grunner amplia linha de produtos, fecha parcerias na área de tecnologia e aprimora estratégias de atendimento aos clientes. O objetivo é inovar sempre – e continuar crescendo em ritmo veloz

Na nova era tecnológica, as transformações trazidas por uma grande inovação quase sempre são muito rápidas, mas a Grunner levou o conceito de velocidade para um patamar ainda mais surpreendente. Nascida há apenas três anos – no universo corporativo, isso é muito recente –, a empresa de tecnologia para o agronegócio usou a breve, mas intensa, jornada para provocar uma revolução nas lavouras brasileiras de cana-de-açúcar. E para inaugurar uma iniciativa que em breve será uma nova categoria de produtos para otimizar as operações agrícolas. Criada pelos irmãos Henrique e Mateus Belei, tradicionais produtores de cana-de-açúcar de Lençóis Paulista, no interior de São Paulo, a Grunner é resultado de uma grande inovação. Incomodados com o chamado pisoteio nas linhas de cana – neste processo, o trator literalmente amassa o solo –, eles resolveram adaptar um caminhão para executar a operação de colheita e aplicação de insumos. A estratégia funcionou. Além de aumentar a produtividade da fazenda, sua ideia original, um caminhão autônomo que executa as operações sem pisotear as linhas revelou-se fundamental para reduzir custos e combater as emissões de CO2 no processo agrícola. O fato de a empresa ter nascido a partir de uma necessidade específica dos produtores se traduz inclusive no seu slogan: “Tecnologia do campo, para o campo”. 42

Como não poderia deixar de ser, a invenção conquistou produtores de diversas regiões brasileiras, consolidando a Grunner como uma companhia dotada de alta capacidade inovadora. Agora ela se prepara para dar um passo além. “Vamos diversificar a linha de produtos, buscar novas parcerias e melhorar a experiência de nossos clientes”, afirma Denis Arroyo Alves, que assumiu a presidência da Grunner em outubro do ano passado com a missão de liderar o projeto de expansão da empresa. Onde quer que se olhe, os números da Grunner impressionam. Atualmente, a empresa conta com cerca de 250 modelos ATR (usados para o transbordo da colheita de cana) em operação no mercado, mas eles deverão ser 600 até dezembro. O forte crescimento está ancorado em uma mudança fundamental na atividade da companhia. Ela não é mais uma empresa de caminhões adaptados, mas de máquinas agrícolas. “Isso faz muita diferença”, diz Arroyo. “Para nós, reforça a vocação da Grunner como uma empresa de tecnologia. Para os clientes, significa que, com a nova configuração, o veículo não precisa mais ter emplacamento, não paga IPVA. A mudança é positiva para todos os lados do negócio.” O ano de 2022 ficará marcado pelo maior ciclo de lançamentos da história da empresa. Na Agrishow, programada para abril, a Grunner apresentará ao


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PO, PARA O CAMPO

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mercado três produtos inéditos que poderão ser utilizados para novas aplicações. Todos eles seguem a mesma orientação que inspirou a criação da empresa: combinar alta tecnologia com ganhos de eficiência. Como os primeiros ATRs, as novas máquinas agrícolas possuem tecnologia de georreferenciamento e direção autônoma, além de bitolas ajustáveis que preservam as linhas da plantação. Ou seja, elas não apenas substituem os tratores, mas tornam a operação agrícola mais eficaz – e menos poluente, na medida em que o consumo de óleo diesel por tonelada de cana pode ser até 50% menor do que nos tratores convencionais. Outro aspecto que se mantém, e que está igualmente ligado à origem da Grunner, é a parceria exclusiva com a Mercedes-Benz. Pelo acordo estabelecido entre as duas companhias, os caminhões da marca alemã recebem o protocolo de tecnologia que dá origem às máquinas da Grunner, num processo colaborativo que é vital para acelerar a inovação. “As engenharias das duas empresas estão completamente conectadas”, resume Arroyo. O executivo lembra que as máquinas da Grunner alcançaram um feito e tanto: elas foram incluídas recentemente no ranking dos dez principais produtos da história da Mercedes. Ampliar parcerias é um dos focos da Grunner. A empresa acaba de assinar um acordo para fazer parte do AgTech Garage, de Piracicaba (SP), um dos principais hubs de inovação especializados em agronegócio do País. “Nossa ideia não é só usar tecnologias inovadoras, mas também fomentá-las”, diz o presidente da empresa. Também 44

está no horizonte a criação de “hackatons” – como são chamadas as maratonas de tecnologia – voltados para o agronegócio. A aproximação com startups é considerada essencial. Arroyo faz uma analogia interessante com os iPhones. Ele diz que, como nos smartphones da Apple, a ideia dos Grunners é embarcar diferentes tipos de tecnologia, e isso pode ser aprimorado mediante parcerias com terceiros. “Nós já temos diversas tecnologias embarcadas, mas queremos muito mais”, diz o executivo. “Se uma startup, por exemplo, criar um novo sensor, ele pode eventualmente nos interessar.” Como a Apple fez com o iPhone, a Grunner construiu, com suas máquinas agrícolas, uma nova categoria de produtos, que passarão a ser conhecidos como smartmachines, e certamente poucas empresas no mercado brasileiro, dentro ou fora do agronegócio, podem se orgulhar disso. As parcerias, de fato, encurtam caminhos e ajudam a acelerar o crescimento da empresa. Arroyo, porém, faz um alerta: nada disso faria sentido se não tivesse como objetivo maior resolver as dores dos clientes. “Nós gostamos muito de tecnologia, mas acima de tudo queremos criar soluções que atendem exatamente aquilo que o produtor precisa”, aponta. “Não adianta dizer que o equipamento traz inovações incríveis se elas não têm utilidade dentro da porteira. Os Grunners, ao contrário, resolvem um problema concreto no campo.” O crescimento expressivo vem acompanhado pela expansão do pós-venda. A Grunner se estruturou com um modelo de atendimento ao cliente que suporta o aumento da prateleira de produtos da empresa, trabalhando nas regiões onde se encontram os equipamentos, de modo que se garanta a maior agilidade possível para os serviços de manutenção. Parcerias regionais também estão sendo criadas para assegurar o melhor pós-venda possível. A Grunner se preparou para crescer e tornar seus produtos cada vez mais importantes para o desenvolvimento do agronegócio brasileiro.


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Ag Cidades

Colheita de cevada em Guarapuava: município paranaense colhe mais de 70% da produção nacional 46


AS CAPITAIS DO AGRO Terra da Uva, Cidade do Tomate, Capital Mundial do Zebu e muitos outros títulos distinguem municípios recordistas na produção agropecuária, dinamizam as economias regionais e fazem com que eles desfrutem do carinho popular Por Marco Damiani

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nraizada nos costumes e positiva para os negócios, uma das mais belas tradições do campo brasileiro atravessa gerações sem perder o charme e a popularidade. Distinguidos pelo histórico, pela produtividade e pela identificação de suas populações com culturas específicas do agronegócio, dezenas de municípios rurais do País exibem, com orgulho e satisfação, títulos reconhecidos de “campeão brasileiro”, “capital mundial” e “terra” de produtos que vão da soja ao boi zebu, do milho à cevada, passando pela uva, tomate, morango, mel e tantos outros.

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Concedidos por órgãos formais como o Congresso Nacional, chancelados pelo IBGE e, especialmente, lembrados com carinho por milhões de brasileiros, esses galardões não apenas enchem de orgulho as populações locais, como servem de estímulo para a atividade econômica e o setor de turismo. Viajar pelas capitais do agro permite conhecer e entender o histórico da produção rural no Brasil e o impacto real da agropecuária no desenvolvimento do interior do País. Nas próximas páginas, fazemos um tour por algumas delas. Acompanhe:


Cidades

CAXIAS DO SUL A TERRA DA UVA

Quem não sabe, por exemplo, qual é e onde fica a Terra da Uva? Orgulhosa de obter esse reconhecimento popular há mais de um século, Caxias do Sul, município de destacada economia agroindustrial na serra gaúcha, é sem dúvida um dos maiores exemplos de cidade presente há muito tempo no imaginário de milhões de brasileiros. A forte imigração italiana, que plantou as primeiras mudas de parreiras nos arredores da cidade no final do século 19, acrescida das conquistas e do crescimento ao longo do tempo garantem a preservação de antigas tradições, com amplos ganhos econômicos. Em Caxias, a Festa Nacional da Uva e do Vinho é realizada anualmente desde a década de 1930, sempre com a presença das maiores autoridades do País, entre as quais presidentes da República, e a participação de milhares de pessoas. Há exatos 50 anos, em 1972, por exemplo, o então presidente Emílio Médici, um gaúcho, movimentou sua equipe para que a primeira transmissão de TV a cores feita no País ocorresse diretamente do evento, organizado em torno de centenas de produtores da região – e, é claro, com a sua presença. Para este 2022, depois de dois anos sem participação presencial, em razão da pandemia do coronavírus, Caxias

Ag

volta a abrir seu grandioso parque de exposições, com três pavilhões incrustados em 35 hectares, para celebrar sua cultura agrícola mais importante. Marcada para acontecer entre 18 de fevereiro e 6 de março, a festa completará 90 anos. “Vamos distribuir mais de 200 toneladas de uvas, trazidas por mais de mil produtores de Caxias e região, para as mais de 800 mil pessoas que deverão estar conosco durante os 15 dias de festa”, comemora o presidente do evento, Fernando Bertotto. A celebração cria mil empregos diretos em sua organização, enquanto toda a direção exerce trabalho voluntário. Potências da indústria local, e orgulho do setor fabril nacional, como a Marco Polo, fabricante de ônibus de padrão internacional, e a Randon, de carrocerias, irão expor seus últimos lançamentos como patrocinadoras da elegia à uva. Apenas para o comércio e a hotelaria da cidade, estima-se que os milhares de visitantes do evento deixarão R$ 250 milhões em dinheiro novo. Para a região, que forma a famosa Serra Gaúcha, a injeção de recursos promovida pela festa pode chegar a R$ 800 milhões. Sem dúvida, ser reconhecida como a Terra da Uva, com destaque para a alta qualidade do produto, é um ótimo negócio para Caxias. Viva a uva! PLANT PROJECT Nº29

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UBERABA A CAPITAL MUNDIAL DO ZEBU

Nos últimos cem anos, o município de Uberaba teve um foco: o desenvolvimento de uma raça de gado tipicamente brasileira. Deu tão certo que, nas últimas décadas, esta rica cidade pertencente ao Triângulo Mineiro passou a ser reconhecida globalmente como a Capital Mundial do Zebu. Uma visita ao seu entorno leva à compreensão imediata deste título. Cercada por grandes fazendas, produtoras de gado de corte, de leite e de melhoria genética de animais, quase toda a economia do município gira em torno do boi. “O município se tornou um ponto de encontro global de quem promove a pecuária zebuína”, comemora o presidente de uma das entidades mais fortes do agronegócio 50

nacional, a Associação Brasileira dos Criadores de Zebu (ABCZ), Rivaldo Machado Borges Júnior. “Nos acostumamos a receber comitivas de todos os continentes, que vêm em busca de nossos exemplares e da nossa tecnologia de melhoramento genético”, completa ele. Em razão dos negócios realizados durante todo o ano, Uberaba está entre as cinco maiores economias de Minas Gerais, com um PIB superior a R$ 15 bilhões. Este ano, a concorrida ExpoZebu voltará a ser presencial e vai ocorrer a partir do mês de abril. No Parque Nacional do Zebu, exposições, premiações e leilões milionários devem reunir, em duas semanas de evento, mais de 500 mil pessoas, entre as quais a elite de

criadores de gado do País e do mundo. “Uberaba tem uma grande e importante característica, que é a sua localização geográfica”, explica Borges Júnior. “Estamos há alguns quilômetros dos principais centros comerciais e políticos do País, como também de aeroportos internacionais e portos, o que facilita o contato e acesso de criadores de qualquer parte.” Nos últimos 25 anos, as cerca de 800 fazendas de gado do município registraram mais de 400 mil nascimentos de zebuínos. A previsão da ExpoZebu é a de movimentar diretamente mais de R$ 50 milhões em negócios, com igual volume de recursos injetado na economia da cidade no circuito de hotéis, lojas e restaurantes. Êêê, boi!


Cidades

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GUARAPUAVA A CAMPEÃ NACIONAL DA CEVADA A imigração eslavogermânica ocorrida na década de 1940, após o final da Segunda Guerra Mundial, deitou raízes por todo o interior do Paraná, mas foi em Guarapuava que as primeiras famílias vindas da Europa plantaram o que hoje é a maior riqueza da região, a cevada. Trata-se, como todos sabemos, da preciosa matéria-prima do malte usado na fabricação de cerveja. O histórico cultivo faz com que o município seja reconhecido pelo Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística (IBGE) como o maior produtor da cultura do País, tornando Guarapuava a “Capital

Nacional da Cevada”. Os números impressionam. O Paraná respondeu por quase 62% da área cultivada e por 72% da produção do grão de cevada no Brasil, batendo recorde na colheita realizada em dezembro de 2021. E Guarapuava puxou esse desempenho, com 65% do volume total da produção estadual, por meio do cultivo de 45,5 mil hectares. No total, a safra atual rendeu a fábula de 279 mil toneladas do grão, contra 206 mil toneladas na colheita anterior. Considerada a maior malteria do País, a Agrária Malte, no distrito de Entre Rios, é

responsável por atender 30% da demanda nacional. “Guarapuava é uma verdadeira potência na agropecuária, e na cevada em especial, com cada vez mais pesquisas e investimento em tecnologia”, assinala o prefeito Celso Góes. “Temos orgulho de ter o reconhecimento de ‘Capital Nacional da Cevada e do Malte’. Nossa cadeia produtiva contempla desde a matériaprima até o produto final. O polo cervejeiro local fomenta o turismo e a economia de maneira muito assertiva”, acrescenta o executivo público. Um brinde!

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PATY DO ALFERES A CIDADE DO TOMATE

Na serra fluminense, a simpática Paty do Alferes, de cerca de 28 mil habitantes, tem dentro de si uma riqueza vermelha e delicada como um coração. É o tomate que domina a lavoura de mais de 500 pequenos e médios proprietários rurais da região. Eles abriram mão da cultura do café, na década de 1990, e passaram a investir num produto com baixo teor de agroquímicos e alto valor agregado. O resultado, nos últimos anos, quando os cultivos passaram a ser feitos em estufas, é um patrimônio atual de 50 mil pés de tomate, que atendem todo o mercado do Rio de Janeiro e parte da demanda nacional. Sede da Seal Hortifruti Associados, Paty do Alferes se orgulha de realizar, anualmente, a 52

Festa do Tomate, com o melhor da sua produção. A grande maioria dos produtores tem seu desenvolvimento rastreado, de modo que sejam preservados os mais rigorosos princípios de sustentabilidade ambiental. A grande festa ocorre na época do feriado de Corpus Christi e chega a atrair, durante a semana de realização, mais de 50 mil pessoas por dia, quando shows com artistas famosos nacionalmente se revezam entre concursos para o melhor fruto e os melhores pratos. “É uma festa tipicamente de roça, que junta toda a comunidade para celebrar nossa maior riqueza”, define a engenheira agrícola Mariana Otero Nogueira, ligada à prefeitura da cidade. Ela conta

que seguidas administrações do município investiram no modelo conhecido como economia circular, no qual os recursos gerados pelos produtores locais são reinvestidos na própria região. Todas as semanas, Mariana é responsável pela feira que vende produtos hortifrutigranjeiros de primeiríssima qualidade, obtidos pelo sistema de agricultura familiar, atraindo para a cidade um grande público regional. “Paty do Alferes soube se reinventar, com nossos produtores, apoiados pela Prefeitura Municipal e pela Emater, sempre investindo e lucrando com um tomate e outros minifrutos, como pimentão, abóbora e pimenta de alta categoria.” À mesa, pois!


Cidades Num estado famoso pela secular cultura cafeeira, ser reconhecida como a Capital Estadual do Café é um feito bastante especial. Assim é em São Paulo, com Espírito Santo do Pinhal, a cidade fundada por imigrantes italianos em 1849. Desde lá, o café está no centro da atividade econômica, com sua riqueza traduzida em uma série de palácios e monumentos erguidos nas épocas de ouro. O Museu do Café é um dos maiores orgulhos do município, com vasta documentação sobre o grande produto brasileiro. No passado, a cidade foi um importante centro de comercialização, e hoje se destaca pela produção que aposta na alta qualidade dos cafés especiais. Com 9 mil mudas representativas de todas as qualidades de café plantadas no

município ao longo de sua história, a Fazenda Retiro Santo Antônio, pertencente ao engenheiro Jefferson Adorno, prima pela responsabilidade ambiental. De sua área de 123 hectares, 33 são destinados à produção de café e outros 35 ficam preservados. Com a marca prime Kaynã, Adorno conquistou em 2019 o título de Cafeicultor Destaque do Brasil. “Plantamos com amor à natureza, abrindo corredores ecológicos interligando nascentes e atraindo, assim, animais silvestres da região”, explica o reconhecido produtor. Eita cafezinho bom esse, sinhô! Além das cidades citadas, muitas outras Brasil afora têm suas próprias marcas únicas e singulares. Como ponto em comum, todas elas conseguem manter uma atividade econômica diversificada a partir da forte raiz

Ag

no agronegócio. É assim que, na região Norte, a capital do Pará, Belém, foi agraciada recentemente, em projeto aprovado pelo Congresso Nacional, com o título de Capital Nacional do Açaí. Em Alagoas, o município de Arapiraca está reinventando a sua economia a partir da cultura fumageira e já ostenta o título de “Capital do Fumo no Nordeste”. Em Minas Gerais, Patos de Minas mantém há tempos o título de Terra do Leite, por sua grande produtividade neste quesito. E não há como não lembrar de Sorriso, em Mato Grosso, no coração do Centro-Oeste, a Capital Mundial do Agronegócio, com a maior produtividade de soja do mundo. Como se vê, municípios campeões do agronegócio é o que o Brasil, ainda bem, mais tem!

ESPÍRITO SANTO DO PINHAL O BERÇO DO CAFÉ

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Com inovações inspiradas até em tecnologias da Nasa, a Nissan Frontier é a picape ideal para suas necessidades no campo e na cidade

DO ESPAÇO AO AGRO

Todas as picapes com carroceria sobre chassi são iguais? Não. A Nissan Frontier destaca-se em seu segmento por ser única: a única com suspensão traseira multilink, a única com bancos Zero Gravity desenvolvidos com a Nasa, a única com visão 360° e a única com teto solar com acionamento elétrico. Um conjunto de características que a tornam ideal para o trabalho na fazenda, sem perder o conforto para os momentos de lazer na cidade. Tudo na Nissan Frontier foi pensado para oferecer a melhor combinação entre conforto, segurança, robustez e versatilidade. A suspensão traseira multilink é o que faz dela uma picape com dirigibilidade mais suave, confortável e segura. A Frontier oferece uma dirigibilidade superior, não apenas para o motorista, mas também para os passageiros. Os bancos dianteiros da Nissan Frontier, por exemplo, são os únicos do segmento que contam com o sistema Zero Gravity. Esses bancos foram inspirados em tecnologias desenvolvidas pela 54

Nasa e contam com 14 pontos de suporte dos quadris aos ombros. Além de garantir a postura correta para os ocupantes, os bancos Zero Gravity reduzem o cansaço em viagens ou em longas jornadas de trabalho. O banco do motorista tem ainda ajustes elétricos para oito movimentos. Para o motorista, a Nissan Frontier traz volante multifuncional com revestimento de couro. Sem tirar as mãos do volante, o motorista pode fazer chamadas telefônicas, controlar o sistema de áudio ou até deixar o carro rodando em piloto automático. A Nissan Frontier tem botão de partida e um ótimo serviço de navegação. Além da conectividade Android Auto e Apple CarPlay, o motorista conta com navegador por GPS integrado para usar em áreas remotas. Os usuários da Nissan Frontier têm a seu dispor a central multimídia Nissan Connect com tela de 8” com resolução Full HD, reconhecimento de voz e atualizações de forma remota via Wi-Fi. Para


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U M D E S I G N A D M I R ÁV E L A Nissan Frontier chama a atenção por onde passa. A picape traz linhas que seguem a identidade de design V-Motion. Os faróis contam com luzes e assinatura visual de LED e projetores. Já a grade dianteira pode ter moldura cromada nas versões S, XE e LE ou em black piano na configuração Attack. Na parte inferior do para-choque, a Frontier também conta com faróis de neblina. A Nissan Frontier também tem para-lamas destacados e estribos laterais. As maçanetas trazem acabamento na cor preta ou croma-

garantir uma excelente experiência a bordo, a Nissan Frontier conta com seis alto-falantes, três tomadas de 12 V e duas entradas USB. O arcondicionado é digital de duas zonas, com saídas de ar para os bancos traseiros. O controle de temperatura é individual nas saídas dianteiras. Há ainda teto solar com acionamento elétrico, outra exclusividade da Nissan Frontier no segmento. Versatilidade é outro foco importante da Frontier. Além da suspensão multilink, que reduz as vibrações ao dirigir e garante uma estabilidade superior com ou sem carga, o modelo foi projetado para enfrentar os mais diferentes terrenos. A picape conta com a tração 4x4, que é acionada automaticamente, com o veículo em movimento, por meio do botão de transferência de força Shift on the Fly. A Nissan Frontier tem ainda a tração 4x4 com reduzida, para rodar em terrenos mais difíceis ou até mesmo para rebocar outro veículo ou transportar carga pesada. A capacidade de reboque da Nissan Frontier é de 2.885 kg. A picape tem 241 mm de altura livre do solo, 30,6° de ângulo de entrada e 27,7° de ângulo de saída. Forte e robusta, a Nissan Frontier é equipada com um motor 2.3 turbo diesel de 190 cv de potência e 450 Nm de torque. Ele é associado a um câmbio automático de sete marchas, que oferece

do. A Frontier Attack – que adota visual mais esportivo – conta com adesivos alusivos à versão na dianteira, nas laterais e na traseira. As rodas variam de 16’’ a 18’’ e contam com acabamento diamantado nas configurações XE e LE. Na traseira, a Nissan Frontier tem lanternas que invadem a lateral, e a tampa da caçamba traz um vinco em formato de “V” abaixo do logotipo Nissan. Logo abaixo, o para-choque traseiro pode ter acabamento cromado ou na cor preta, dependendo da versão da picape.

mais praticidade e conforto ao dirigir. A transmissão também tem modo sequencial e permite que o próprio motorista tenha a opção de trocar as marchas de forma manual. Não apenas a cabine de quatro portas, mas também a caçamba da Nissan Frontier são muito espaçosas. Ela mede 1,50 m de comprimento e 1,56 m de largura. Com capacidade para 1.054 litros e carga útil superior a 1 tonelada, o compartimento traz ganchos de fixação de carga e uma tomada elétrica de 12 V na lateral, que serve para carregar ferramentas ou ligar algum equipamento diretamente no veículo. Dentre os equipamentos de segurança, a Nissan Frontier oferece até seis airbags, bloqueio de diferencial eletrônico, controle automático de descida e de partida em rampa, controles de tração e estabilidade, freios ABS com controle eletrônico de frenagem e assistência de frenagem, além do recurso de visão 360º. Única no segmento, a funcionalidade utiliza as imagens de quatro câmeras ao redor da picape para oferecer visão periférica total ao estacionar ou trafegar por terrenos off-road na tração 4x4 com reduzida. Tudo isso faz da Nissan Frontier uma picape especial e diferenciada em seu segmento. PLANT PROJECT Nº29

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Ag Finanças

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O CLIMA DOS SEGUROS Maior frequência de eventos climáticos adversos aumenta riscos no campo, inibindo apetite do mercado segurador e reforçando o peso da subvenção como elemento-chave para facilitar acesso do produtor às coberturas Por Ronaldo Luiz

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intensa estiagem que castigou lavouras da região Sul e de parte do Mato Grosso do Sul, bem como enchentes que atingiram sobretudo Minas Gerais, Tocantins, sul do Maranhão e Bahia neste início de ano, tem potencial para provocar uma importante quebra de produção do ciclo verão da safra de grãos. Além disso, pode prejudicar a semeadura da segunda safra, fazendo com que muitos produtores corram o risco de ter que plantar fora do período climatológico adequado. “Antes, a safra 2020/21 já surpreendeu muitos agricultores com uma seca prolongada nas principais regiões produtoras de soja, além da ocorrência de baixas temperaturas que provocaram perdas na segunda safra de milho. No inverno passado, observamos casos de geadas três vezes nas mesmas áreas. Alguns produtores chegaram a registrar até quatro episódios de sinistro”, diz o diretor de Agronegócio da FF Seguros, Fabio Damasceno.

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Essa maior frequência de intempéries climáticas de características mais agudas acarretou um elevado aumento no número de sinistros de lavouras que contam com seguro rural. Em 2021, os produtores rurais receberam R$ 5,4 bilhões em indenizações de seguro. O valor pago pelas seguradoras representa crescimento nominal de 115% sobre os R$ 2,5 bilhões indenizados em 2020. Uma vez mais, ficou demonstrada a necessidade de expansão da área agrícola segurada no País. Hoje, ainda são muito poucas as propriedades protegidas, somando algo em torno de 14 milhões de hectares, apenas cerca de 15% do total cultivado no País. Um estudo realizado pela Federação da Agricultura e Pecuária de Minas Gerais (Faemg) com os produtores rurais afetados pelas chuvas do início do ano no estado mostrou que 95% deles não tinham cobertura de seguro rural. Segundo a Empresa de Assistência Técnica e Extensão Rural de Minas Gerais (Emater-


Finanças

MG), 127 mil produtores sofreram algum tipo de impacto nas atividades por causa das chuvas e 119 mil hectares de lavouras foram perdidas no estado. Já um levantamento da Secretaria de Política Agrícola do Ministério da Agricultura, Pecuária e Abastecimento (Mapa) revela a dimensão dos comunicados de perdas e avisos de sinistros pelos produtores afetados pela seca. No total, 42.541 apólices de seguro rural foram acionadas e 38.906 comunicados de perdas (COPs) realizados no Programa de Garantia da Atividade Agropecuária (Proagro) na atual safra de verão até o dia 20 de janeiro, totalizando mais de 81 mil acionamentos pelos produtores. “As adversidades climáticas que temos enfrentado

ultimamente não trouxeram prejuízos somente para os produtores rurais, mas também para as seguradoras e resseguradoras do mercado. É comum vermos seguradoras que tiveram 100% de suas apólices contratadas com sinistro”, pontua o diretor de Agro da Alper consultoria em seguros, André Lins Bahia Cardoso. O DESAFIO DA SUBVENÇÃO No seguro rural, as companhias seguradoras habilitadas no Programa de Subvenção ao Prêmio do Seguro Rural (PSR) realizam o pagamento das indenizações aos produtores, que têm acesso ao benefício de subvenção ao prêmio (valor pago para contratar o seguro), que variou em 2021 de 20% a 60% do prêmio. Por outro lado, no Proagro

Ag

o produtor, geralmente ligado ao contrato de crédito rural de custeio do Programa Nacional de Fortalecimento da Agricultura Familiar (Pronaf), paga uma taxa adicional para aderir ao programa e a União arca com o pagamento das indenizações via Banco Central e as instituições financeiras que operam no Proagro. Ou seja, o Proagro garante ao produtor rural recursos financeiros para quitar dívidas adquiridas junto ao banco (crédito de custeio agrícola), caso ocorra perda na lavoura. Em 2021, o PSR liberou R$ 1,181 bilhão em apoio aos produtores. A cifra, segundo o Mapa, possibilitou que 121 mil agricultores com 217 mil apólices em 14 milhões de área segurada conseguissem proteger R$ 68 bilhões em capitais segurados. PLANT PROJECT Nº29

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O PSR mais que triplicou os resultados em relação a 2018. O programa tem 15 companhias seguradoras habilitadas e mais 3 seguradoras devem entrar no mercado em 2022, ou seja, pode chegar a 18 seguradoras, frente às 11 companhias que atuavam em 2018. Item-chave do seguro rural, a subvenção federal sofre rotineiramente com um volume de recursos muito aquém do necessário, bem como com um recorrente contingenciamento orçamentário. Para 2022, a demanda é de R$ 1,5 bilhão para o PSR. No entanto, o Projeto de Lei Orçamentária (PLOA-2022) está com o montante de R$ 990 milhões, sendo necessários ainda R$ 510 milhões em recursos complementares para que atinja o valor necessário. “Caso seja mantido apenas os R$ 990 milhões, teremos apenas 10 milhões de hectares com seguro, abaixo do que foi em 2020 e 2021. Com R$ 1,5 bilhão será possível abranger uma área segurada em torno de 15 a 16 milhões de hectares, dependendo do comportamento de contratações, preços, perfil de culturas e regiões”, adianta o diretor do Departamento de Gestão de Riscos do Ministério da Agricultura, Pedro Loyola. O Mapa deve encaminhar ao Ministério da Economia solicitação de crédito suplementar de R$ 510 milhões, que, se aceito, ainda dependerá de aprovação do Congresso Nacional. A partir deste ano, 60

o percentual de subvenção ao prêmio [valor que o produtor paga pela apólice] será fixo em 40% para todas as culturas/ atividades, exceto para a soja, cujo percentual será fixo em 20%. Para efeito de comparação, países com programas de subsídio ao prêmio mais antigos, como Estados Unidos e Espanha, subvencionam até 80% da contratação do seguro. “As entidades representativas do agronegócio e o Congresso Nacional precisam manter o PSR de uma vez por todas como um programa de Estado, com previsibilidade e crescimentos constantes. Uma renegociação de dívidas tem um custo muito maior do que uma política de gestão de riscos como o seguro rural”, analisa Loyola, que acrescenta: “O fato é que a oferta tem limitadores dados pela própria indústria do seguro rural. Em 2018, havia 11 companhias seguradoras habilitadas no PSR, agora, em 2022, vamos chegar a 18”. De acordo com o presidente institucional da Associação Brasileira dos Produtores de Milho (Abramilho), Cesario Ramalho, o seguro rural é tradicionalmente caro em todo o mundo e a subvenção, presente nos principais países produtores, é um mecanismo de gestão de riscos do qual o Brasil não pode prescindir. Ademais, segundo o diretor do Mapa, há também o desafio de continuar explicando junto ao produtor como funciona

o mecanismo do seguro rural. “O agricultor precisa entender os procedimentos e os riscos cobertos, excluídos, assim como os prazos exigidos desde a contratação, passando por avisos de sinistros e a vistoria final antes da colheita.” REAJUSTE DAS APÓLICES Edson Pierezan, gerente comercial da corretora THB Group, alerta que, diante dos mais recentes problemas climáticos, a expectativa é de que os preços dos prêmios aumentem de 10% a 25% já para o seguro do plantio de inverno deste ciclo 2021/22. “As seguradoras já estão limitando o volume de contratação de seguros, reajustando taxas, sobretudo nos estados, que tiveram grande volume de áreas com sinistros indenizados, como, por exemplo, os do Sul, e buscando direcionar esforços para outras regiões, entre as quais, o Centro-Oeste”, ressalta Pierezan. Na avaliação de Loyola, do Mapa, o custo do seguro certamente será maior que o do ano passado, haja vista que as seguradoras pagaram muitas indenizações e o mercado irá precificar o risco. “Os preços e custos das lavouras subiram demasiadamente, o que gera um valor segurado muito maior em relação aos anos anteriores. Além disso, com as indenizações nos últimos três anos chegando a R$ 9,5 bilhões (janeiro de 2019 até novembro de 2021 com valores atualizados pelo IPCA), temos


Finanças

Ag

Karina Andrade, da ItsSeg, e Loyola, do Mapa: mais subvenção e criatividade para ampliar cobertura

um ano de 2022 em que os seguros sofrerão ajustes de valor do prêmio.” O representante do ministério detalha que esse quadro leva à necessidade de maior subvenção por apólice contratada. “Ou seja, não se consegue fazer a mesma área em 2022 com o atual orçamento. E os créditos suplementares dependerão de aprovação no Ministério da Economia e no Congresso Nacional.” CAMINHOS Observa-se, então, que o mercado do seguro rural é complexo e fazer girar a roda para que ele se expanda naturalmente não é tarefa das mais fáceis. O risco é elevado tanto para quem vende (seguradoras e resseguradoras), quanto para quem, obviamente, precisa comprar (produtores). No meio,

o governo busca oferecer algum apoio, a fim de induzir o crescimento do mercado, mas o cobertor financeiro (leia-se o orçamento) é curto. Existem, porém, outros caminhos possíveis. “As cooperativas agrícolas são um bom exemplo do quanto o compartilhamento de informação sobre seguros, com uma linguagem simples, feito em grande parte pelos seus próprios engenheiros agrônomos, ajuda no entendimento dos benefícios deste instrumento de gestão de risco, resultando no aumento das vendas”, comenta a diretora comercial da corretora It’s Seg, Karina Andrade. “A maioria das operações de distribuições de seguros dentro de cooperativas é um sucesso.” Investir em tecnologia e inovação, com o objetivo de desenvolver uma gestão de risco

que entregue maior previsibilidade para ofertar taxas mais baixas sem comprometer a saúde financeira do negócio também é uma via. De acordo com Ramalho, da Abramilho, a expansão de produtos e serviços privados dedicados a fomentar novas fontes de crédito para o agronegócio também pode servir de exemplo para o seguro rural. “Nesta jornada, as ferramentas digitais têm sido relevantes para ampliar as oportunidades de financiamento agrícola. A tecnologia da informação vem permitindo a entrega de dados, que ajudam a personalizar as propostas de crédito, de acordo com o histórico e perfil do produtor. No caso do seguro rural, esta possibilidade pode ter impacto positivo para baratear o valor do prêmio das apólices e contribuir para a expansão do mercado.” PLANT PROJECT Nº29

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“A flor é um produto rural e que requer sensibilidade no trato. Além de mãos cuidadosas, entram em cena a tecnologia e a inovação para contribuir com a qualidade e produtividade do setor”

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Ideias e debates com credibilidade

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QUAL É O CHEIRO DA INOVAÇÃO? AS FLORES E O AROMA DAS NOVIDADES POR RICARDO CAMPO Num simples vaso de flor, onde se vê um arranjo decorativo ou uma muda que está sendo cultivada, há muito mais do que a gente possa imaginar. Como parte de uma cadeia produtiva altamente tecnificada, pétala por pétala, as flores trazem ao nosso dia a dia uma riqueza de cores e aromas que contribuem para o bem-estar, seja por evocar emoções em momentos especiais ou pela beleza estética ao decorar e dar vida ao ambiente em que vivemos. O segmento das flores é dinâmico e conectado ao nosso cotidiano, sendo sensível a qualquer variação de mercado puxada por tendências e hábitos dos consumidores, colocando os demais agentes do setor em atenção ao cheiro do que é novo para continuar produzindo, inovando e encantando. Segundo o IBGE – Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística, existem no País cerca de 8 mil produtores responsáveis por cultivar mais de 2,5 mil espécies e 17,5 mil variedades de flores e de plantas ornamentais. São flores de corte – as utilizadas para arranjos e decoração de eventos sociais como os casamentos –, flores e plantas de vaso, assim como produtos para paisagismo à venda em garden centers, floriculturas, redes de varejo e e-commerce. O setor gera mais de 200 mil empregos e movimentou R$ 9,5 bilhões em 2020, de acordo com o Ibraflor – Instituto Brasileiro de Floricultura. O estado de São Paulo mantém uma liderança no ranking nacional da produção (só a região de Holambra concentra 45% do volume produzido no País), que também conta com a participação de produtores de Minas Gerais, Ceará, Rio de Janeiro e Rio Grande do Sul. Composto em grande parte por pequenas propriedades familiares, mesmo com as dificuldades impostas pela Covid-19 o segmento manteve sua essência inovadora para continuar desenvolvendo novas variedades e produzindo em estufas

com estruturas de cultivo protegido, sistemas de climatização e irrigação, práticas de controle biológicos de pragas e logística refrigerada para manter a qualidade dos produtos finais. Home office mais colorido e diverso No âmbito mundial, as exportações de flores são lideradas, respectivamente, pela Holanda, Colômbia, Equador, Quênia e Etiópia, como mostra o relatório “A Mixed Bouquet of Developments in Floriculture: World Floriculture Map 2021”, publicado em janeiro de 2022 pelo Rabobank em cooperação com a Royal Flora Holland, maior cooperativa holandesa de flores. O Brasil é um grande produtor e figura entre os 15 maiores do mundo, mas a exportação acaba não se mostrando muito atraente frente aos custos logísticos, alta do câmbio e um mercado interno que acaba suportando a oferta apesar de ainda haver espaço para aumento do consumo per capita – na média de R$ 42,00 (Ibraflor), o que chega a ser quatro a cinco vezes menor do que o consumo nos Estados Unidos. Parece, no entanto, que durante a pandemia isso já começou a mudar. Com os modelos híbridos de trabalho, onde home office e anywhere office passaram a ser considerados pelas empresas, houve um aumento de consumo de flores e plantas por pessoas que não as consumiam e que, ao passarem mais tempo confinadas, buscaram uma conexão com algo mais natural e orgânico dentro de sua residência ou novos locais de atuação. Com o fechamento do comércio e o isolamento social, o setor passou por dificuldades a ponto de alguns produtores mudarem para outras culturas como legumes e vegetais. Porém, como a necessidade é a mãe da invenção (obrigado pela dica, Platão!), o segmento precisou se reinventar e conseguiu manter o fôlego com a


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Campanhas do Ibraflor e da Cooperativa Veiling Holambra já dão o tom de como as flores são opção múltipla para diversos momentos e públicos

virada para as vendas on-line e a ampliação dos serviços de delivery para atender aos consumidores com novos hábitos e que demandam produtos frescos e com maior frequência. As flores também ganharam mais espaço nos supermercados, mas, como indica a Confederação da Agricultura e Pecuária do Brasil (CNA), 40% do faturamento anual do setor ainda é gerado no primeiro semestre, com as vendas para o dia das mães e dia dos namorados. Se ainda considerarmos que, no Brasil, popularmente o mês de maio é conhecido como o mês das noivas, essa concentração das vendas na primeira metade do ano pode ser ainda maior. Essa sazonalidade é importante e relevante, mas pode representar um risco como o que se viu nos últimos dois anos, com a redução de eventos sociais e baixa atuação de decoradores e paisagistas. Nesse ponto, investir em ações de marketing para mudança de comportamento e a ampliação da percepção de que as flores podem ser uma opção para diversas ocasiões – independentemente da orientação de gênero, religião e idade – pode ser a chave para manter o ritmo das vendas ao longo de todo o ano. Nossa sociedade está evoluindo bastante em relação à diversidade e em estabelecer um lugar seguro para a expressão dos sentimentos. Entretanto, como em toda mudança cultural, é preciso sensibilidade para reduzir as barreiras de comportamento e favorecer um reconhecimento coletivo das diferenças. Essa é uma semente que provavelmente só irá florescer no longo prazo, mas quem a cultivar certamente terá um buquê de oportunidades nas mãos.

mais cultivada e consumida no País. Não é de se estranhar que a rosa tenha se tornado um símbolo e isso fica nítido com a sua presença nas artes plásticas, música, literatura e cinema. Das pinturas e penteados de Frida Kahlo ao som de Cartola com As Rosas Não Falam, a Vinícius de Moraes com A Rosa de Hiroshima, folheando páginas com Umberto Eco em O Nome da Rosa até chegar às telas com Woody Allen e A Rosa Púrpura do Cairo. A rosa é uma das personagens emblemáticas do O Pequeno Príncipe, de Saint-Exupéry, mas é de outra fábula, A Bela e a Fera, escrita por Madame Leprince de Beaumont, que veio a inspiração para o case de marketing que mostra o quanto um conceito é capaz de inovar e aumentar o valor de um produto agrícola. Precursora do comércio eletrônico de flores no País, a Giuliana Flores pegou carona no lançamento da segunda versão live action do filme da Bela que se apaixona pela Fera, em 2017, para lançar a “Rosa Encantada”, produto que apresenta um botão de rosa colombiana preservada em redoma de acrílico e que, graças a uma técnica com aplicação química, pode durar até dois anos. E a história teve um final feliz. Tanto que a empresa iniciou um modelo de venda física com quiosques em shoppings e esse produto, sozinho, chegou a representar 25% do faturamento da companhia em 2019. Hoje há uma variação de cores e tamanhos, além de kits com itens complementares que podem fazer um ticket variar de R$ 160 para um único botão de rosa até R$ 500 para uma versão “Jardim”, com dois botões.

Em nome da rosa Apesar do bom desempenho dos crisântemos, astromélias, lírios e lisianthus, pelo que informa a CNA, a rosa é a flor de corte

Um jardim no metaverso A flor é um produto rural e que requer sensibilidade no trato. Além de mãos cuidadosas, entram em cena a tecnologia e a PLANT PROJECT Nº29

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A influencer virtual “Lu do Magalu” promovendo a “Bosta em lata” e o detalhe do perfum.AR, da Natura e startup Noar

inovação para contribuir com a qualidade e produtividade do setor. E aqui vale citar o desenvolvimento de insumos e substratos como sementes e bulbos, micro e biofertilizantes, além de sistemas e dispositivos para controle do clima em estufas e melhor uso de recursos naturais como o solo e a água. Dado que é um produto perecível, a logística também é um ponto crítico e, a depender do destino, hoje já se utilizam caminhões ou aviões climatizados para garantir o frescor dos produtos. Rastreabilidade e otimização das entregas também fazem a diferença e isso fica evidente no exemplo da Cooperflora (Holambra-SP), que utiliza um sistema patenteado com radiofrequência para controlar 130 mil cestos que circulam em suas entregas aos clientes. Outra inovação de nome curioso e no mínimo engraçado é a “Bosta em Lata”, empresa de adubos e substratos orgânicos que segue o conceito da economia circular para desenvolver uma linha de produtos à base de esterco animal, casca de árvores, cama de aviários e cinzas. A empresa se posiciona como uma alternativa sustentável para quem quer cuidar de suas plantas, oferece um produto que é pet friendly e espera faturar R$ 10 milhões em 2022. Merda acontece e nesse caso aconteceu. Tanto que o negócio chamou a atenção do Grupo Holandês Ter Steege Internacional, que produz vasos para plantas e passou a deter 66,7% da empresa de adubos em outubro de 2021. Ainda no campo das invenções está a “Flower Machine”, vending machine de flores com sistema de telemetria para controle remoto da operação e estoque. Desenvolvida pela Esalllabs, startup do grupo de floriculturas Esalflores (Curitiba-PR), a máquina possui sistema de refrigeração e

umidificação para que os botões de rosa e outros arranjos florais vendidos durem por mais tempo. Se todas essas inovações já dão um cheiro do que está rolando no setor, o que podemos aguardar para as novas fronteiras de mercado que se abrem com as experiências digitais e o tão falado metaverso? Se depender da startup Noar e de sua tecnologia inovadora, esse jardim já está em desenvolvimento. Startup brasileira fundada pela engenheira Claudia Galvão, a empresa cria formas de experimentação olfativa 100% digital como o MultiScent 20, produto que parece um tablet e permite interação com catálogos on-line de perfumes e teste de fragrâncias. Com cartuchos inseridos no aparelho, é possível testar até 20 fragrâncias com refis que fazem até 100 disparos, sem gotículas, em alternativa a catálogos impressos e mostruários físicos. A Natura apostou nessa tecnologia e já a utiliza em sua rede de lojas com o “Natura perfum.AR”, desenvolvido em parceria com a startup, para oferecer uma experiência multissensorial, em que, além de sentir a fragrância, o usuário pode ainda navegar pelo conceito e pela imagem do produto. Os jogos em 4D e aplicações no metaverso já estão na mira da Noar. Se alguns perfumes e cosméticos são capazes de sintetizar os aromas de flores e elementos da natureza, parece que o “cheiro digital” poderá ser uma forma das flores seguirem vivas e perfumadas nos ambientes de realidade virtual. O futuro é logo ali e sempre será bem desafiador. Mas, indiferente ao meio, se físico ou digital, desejo que você continue comprando e enviando flores para tocar o coração de alguém e apoiar o setor!

*Ricardo Campo é coordenador de inovação da Raízen e gestor do Pulse Hub. É técnico em artes gráfi cas pelo Senai Fundação Zerrenner, graduado em Propaganda e Marketing pela Universidade Mackenzie, especialista em Marketing de Varejo pelo Senac e possui MBA em Marketing pela Fundação Getulio Vargas (FGV)


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O PAPEL DO PROGRAMA FAZENDAS VIVAS NA DESCARBONIZAÇÃO DA AGROPECUÁRIA BRASILEIRA POR SUSIAN MARTINS COORDENADORA TÉCNICA DA RADICLE BRAZIL

O Programa Fazendas Vivas (PFV) nasceu da vontade de desacoplar a produção de alimentos do desmatamento e focar na melhoria da produtividade, promovendo maior rentabilidade ao produtor e uma série de cobenefícios socioambientais. Assim, a proposta do PFV é ajudar o produtor a reduzir a pegada de carbono de seu produto final, a aumentar sua competitividade no mercado internacional e a gerar excedentes econômicos que possam garantir maiores níveis de bem-estar social. O início dessa jornada consiste em uma boa mensuração do balanço de carbono da propriedade, a qual gera informações valiosas para a tomada de decisão do produtor, valoração do produto e prestação de contas às partes interessadas. Esse é o trabalho que vem sendo implementado pelo Grupo Roncador na fazenda Roncador (Querência-MT), incluindo em sua agenda as questões climáticas, de forma a se preparar para os riscos e identificar as oportunidades. Assim, buscou-se reconstruir o histórico de emissões e remoções nessas fazendas. A Fazenda Roncador tem extensão de 147.462 hectares, dos quais praticamente a metade é vegetação nativa

(transição Cerrado e Amazônia). Antes de 2008, a área produtiva da propriedade era praticamente ocupada por pecuária de ciclo completo extensiva sob pastagem degradada. A partir desse ano, foi iniciado o plantio de soja e um processo de intensificação na produção. Os resultados obtidos retrataram as consequências da transição intensa no uso do solo implementada na propriedade. Em um período de aproximadamente 12 anos, a propriedade reduziu drasticamente a sua dependência da pecuária e zerou a sua área de pastagens degradadas. Com isso, aumentou a sua produtividade por hectare, a diversidade de produtos e, concomitantemente, a remoção e fixação de carbono no solo, demonstrando que o carbono pode ser utilizado como um importante indicador de bom manejo por representar uma intensificação sustentável no campo. No período avaliado, o balanço das emissões apresentou um perfil conforme figura abaixo. Note que, à medida que o balanço de GEE se torna mais negativo (isso equivale a menor emissão), a produção de carne e grãos cresce significativamente ao longo dos anos safra.

Figura 1. Balanço de GEE versus dinâmica de produção na Fazenda Roncador PLANT PROJECT Nº29

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Assim, o Grupo Roncador caminha para um cenário com múltiplos benefícios para o produtor e para a sociedade: - Ao implementar sistemas integrados, aumentam a produtividade por unidade de área e tornam-se mais resilientes aos impactos das mudanças climáticas, por ter maior diversidade produtiva. Este processo aumenta também a rentabilidade do agricultor, o qual se torna mais resiliente financeiramente; - Com o aumento de produtividade e rentabilidade, há menor pressão pela abertura de novas áreas de vegetação nativa, mantendo uma gama de serviços ambientais locais (recursos hídricos, polinização, beleza cênica) e globais (redução do desmatamento e das emissões de GEE atreladas); - Neste processo, passam a remover uma quantidade substancial de carbono da atmosfera, contribuindo para os

esforços globais de mitigação da crise climática. Desta forma, os resultados obtidos comprovam o potencial das boas práticas agropecuárias, em especial nos sistemas integrados, de produção de alimento aliada à remoção de quantidades consideráveis de carbono da atmosfera. A continuidade no acompanhamento do balanço de emissões é recomendada para fortalecer essas evidências, identificar com maior precisão a correlação entre as decisões de manejo com a remoção de carbono no solo e a intensificação sustentável, influenciar positivamente outros atores do setor a incorporar essas práticas, ser reconhecido pelo mercado pelo diferencial de sustentabilidade dos produtos do Grupo Roncador e criar as bases para que, em breve, possa transformar esse ativo ambiental em ativo financeiro através do mercado global de créditos de carbono.


Lavoura de soja na Campanha gaúcha: Expansão dos grãos muda paisagem e modelo de produção na região

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As regiões produtoras do mundo

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As regiões produtoras do mundo

Rebanho em pastagem natural no sul do Rio Grande: pecuária vê concorrência da soja como principal atividade econômica 70


PAMPA EM TRANSIÇÃO A cultura da soja ganha espaço na porção meridional do Rio Grande do Sul, ocupando o lugar de atividades tradicionais que forjaram a imagem do gaúcho

foto: Divulgação

Por Evanildo da Silveira

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Pampa não é mais o mesmo. A imagem da Campanha Gaúcha – a metade sul do Rio Grande do Sul – com suas grandes planícies onduladas, coxilhas, pastagens naturais e rebanhos de gado bovino, ovinos e de cavalos pastando está ficando no passado. Essa conhecida e difundida paisagem vem sendo substituída, há cerca de 20 anos, por lavouras de soja. Os gaúchos mais tradicionais, que há gerações cresceram montados em um cavalo, cuidando dos rebanhos, criados extensivamente em grandes propriedades, costumam dizer, em tom de lamento ou blague, que não há mais estâncias (grandes fazendas), mas só granjas (propriedades rurais dedicadas à agricultura). Nas últimas duas décadas, a área plantada com soja praticamente triplicou na região, promovendo transformações econômicas, sociais e ambientais que alimentam debates no estado. Ao mesmo tempo que promove ganhos de renda para um grupo de produtores, a mudança,

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em larga escala, do modelo produtivo local traz impactos nem sempre positivos para a população e para o bioma pampeiro. DO SUL AO SUL A história da soja é antiga no estado. No Brasil, foi no Rio Grande do Sul que primeiro ela se estabeleceu e se expandiu como cultura comercial. “A leguminosa foi introduzida no País no fim do século 19, e chegou por meio de uma variedade trazida dos Estados Unidos”, conta o geógrafo Felipe Leindecker Monteblanco, do Instituto Federal de Educação, Ciência e Tecnologia Sul-Rio-Grandense (IFSul), campus Santana do Livramento. “Ocorre que esse cultivar americano, adaptado a altas e médias latitudes, ficou restrito, não por acaso, ao clima subtropical da região Sul, tendo como berço e celeiro o noroeste gaúcho, sobre terrenos ondulados de solos profundos, típicos do Planalto rio-grandense.” Por causa dessa característica da variedade importada, a soja permaneceu circunscrita a essa região no Rio Grande do Sul enquanto teve importância, digamos, secundária. Era cultivada por agricultores familiares visando, por exemplo, a obtenção de forragem e grãos para produzir ração para criações de aves e suínos do mercado interno. “A partir dos anos 1970, no entanto, uma grande pressão de demanda no mercado internacional começou a levar a uma extraordinária valorização do produto, iniciando um processo de expansão a partir dessa zona pioneira e que segue, entre oscilações, até hoje”, diz Monteblanco. De acordo com ele, com essa demanda global crescente, o cultivo foi se tornando cada vez mais atrativo a agricultores e


investidores e considerado estratégico pelo governo brasileiro. A expansão em extensão e em produtividade foi se tornando imperativa. Uma miríade de atores públicos e privados, tais como Embrapa (Empresa Brasileira de Pesquisa Agropecuária), institutos estaduais de pesquisa, universidades, além de fundações, empresas e corporações do agronegócio movimentaram significativos processos de pesquisa, desenvolvimento e inovação com o intuito de expandir a soja sobre variadas condições de clima e solo. Com isso, a ciência conseguiu “tropicalizar” a leguminosa, e os antigos cultivares de latitudes médias e altas vindos dos Estados Unidos, que não possibilitariam a pretendida expansão às vastidões de baixas latitudes do Cerrado, foram sendo substituídos. “Ao mesmo tempo, foram sendo desenvolvidas tecnologias para a correção das características

químicas dos solos e construção de fertilidade, a fim de produzir as condições nutricionais ideais para o cultivo em diferentes geografias”, explica Monteblanco. Nas décadas de 1980 e 1990, continua ele, inovações como a substituição do revolvimento do solo com o arado pelo sistema de plantio direto, além da transgenia e da evolução das técnicas de manejo, foram tornando o cultivo viável em parcela cada vez maior da diversidade de solos e climas do Brasil, abrindo novas fronteiras ao mesmo tempo que possibilitaram maior produtividade por área. Primeiro, ela se expandiu para o CentroOeste, principalmente no Cerrado, e depois chegou ao Norte e Nordeste. Agora, do início dos 2000 para cá, a soja vem ocupando a Campanha Gaúcha. “Seu avanço no Rio Grande do Sul, especialmente na metade sul, que caracterizamos como bioma Pampa, se deu, especialmente, a partir dos anos 2000, mais

Tradição X rentabilidade: Produtores têm buscado ganhos maiores com os grãos

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precisamente de 2005 para cá”, conta o zootecnista e doutor em Agronegócio, João Garibaldi Viana, da Universidade Federal do Pampa (Unipampa). “Ele tem como motivação diversos fatores. Inicialmente, foi a valorização e a política dos biocombustíveis no Brasil, que alavancaram a produção do grão e, depois, a valorização das commodities no mercado internacional, especialmente durante a primeira e segunda década dos anos 2000.” TERRAS MAIS BARATAS Aliado a isso, a diminuição de áreas em regiões já tradicionais de soja, na metade norte do Rio Grande do Sul, fez com que muitos produtores buscassem áreas em fronteiras agrícolas, antes destinadas à pecuária, como a metade sul do estado, especialmente terras com menor valor de aquisição e de arrendamento. Também contribui o avanço tecnológico dos cultivares da planta, que favoreceram o seu plantio em áreas com menos recursos hídricos e menor profundidade de solo. Então, todos esses fatores favoreceram um avanço das áreas na metade do sul, que é caracterizado como o bioma Pampa. Em termos de números, para se ter uma noção da expansão, no ano 2000, a área plantada de soja em municípios da Campanha era de 686.175 hectares. Isso saltou, em 2019, para 2.678.348 hectares, um avanço de 290% no período. “Isso 74

dá uma taxa de crescimento de 6,57% ao ano”, explica Garibaldi. “Em contrapartida, na região norte do estado, o crescimento foi de apenas 1,53% ao ano. Outro dado mostra que 70,8% do crescimento de área plantada no Rio Grande do Sul de 2000 a 2019, ocorreu dentro do Pampa, especialmente avançando sobre áreas de pecuária.” Há mais dados que mostram a expansão da leguminosa na Campanha Gaúcha. Segundo o Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística (IBGE), em 2011, os cinco municípios gaúchos com a maior área plantada de soja eram todos do Planalto: Tupanciretã, Palmeira das Missões, Cruz Alta, Júlio de Castilhos e Joia, nessa ordem. Em 2019, no entanto, menos de dez anos depois, três dos cinco municípios com maior área plantada já eram do Pampa, sendo dois deles da Campanha (São Gabriel e Dom Pedrito), empatados na segunda posição, e Cachoeira do Sul, ocupando a quarta. As causas dessa expansão são tanto internas como externas. No caso do Rio Grande do Sul, não se pode dizer que a soja esteja voltando, porque ela nunca deixou de estar presente. “O que ocorre é uma espécie de transbordamento da tradicional região produtora, ao norte do estado, onde as possibilidades de expansão vão se esgotando, para regiões antes tidas como impróprias ou marginais ao

cultivo”, explica Monteblanco. “O caso mais emblemático é o da porção sul do estado, que corresponde ao Pampa brasileiro.” Além disso, acrescenta ele, a associação entre mercado global, ciência, tecnologia e informação vai tornando cada vez mais diminutas as áreas em que as condições naturais preexistentes ainda impõem barreiras ao plantio da soja a ponto de inviabilizá-lo. “Enquanto as terras com condições mais propícias ao cultivo da leguminosa vão se esgotando, os incrementos técnicos a estendem a terrenos de segunda ou terceira alternativa”, diz. Isso ocorre porque os solos superiores dos Cerrados nas áreas mais altas e planas já estão ocupados. No Rio Grande do Sul, por sua vez, as terras elevadas e de solos profundos, com predomínio de texturas argilosas, da tradicional região produtora do Planalto, ao norte, alcançam preços de mercado exorbitantes, expressando a baixa disponibilidade frente à demanda crescente na esteira da valorização do grão. A consequência desse cenário, de acordo com Monteblanco, é que em todo o Brasil o avanço da soja se volta agora a regiões até então marginais, em movimentos semelhantes ao que inicialmente a levou do Sul para o CentroOeste, a partir da década de 1970. “No Rio Grande do Sul, portanto, o correspondente desse movimento é exatamente a expansão da


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leguminosa dos domínios de solos argilosos do norte para os arenosos e franco-arenosos do sul”, explica. Ela chega ao Pampa brasileiro e agora marca presença em quase todo o País. Também contribui para essa expansão rumo ao sul o alto preço das terras no Planalto, que são melhores e mais produtivas. De acordo o IBGE, o rendimento médio delas chega a ultrapassar os 4 mil kg/ha. Mas por isso são mais escassas e caras. “Nessa região, em zonas com condições de alta produtividade para a soja, o valor médio do hectare ultrapassa os R$ 58 mil, enquanto em municípios como Passo Fundo chega a ultrapassar os R$ 60 mil, segundo dados do Incra”, conta Monteblanco. “Mesmo as áreas aptas de baixa produtividade para o grão rondam, no mínimo, os R$ 30 mil o hectare, de acordo com a mesma fonte.” Na Campanha Gaúcha, as terras são menos produtivas. Por isso, há a necessidade de grandes investimentos em fertilizante e corretivos do solo, material genético e maquinário adaptados e em manejo de proteção, dada sua maior fragilidade. Mesmo assim, sua produtividade é baixa. Apenas uma minoria das terras chega a 2 mil kg/ha. Apesar dos altos gastos necessários e do baixo rendimento, a aquisição delas compensa por seu baixo preço relativo. As melhores valem em média R$ 14,3 mil, e as com aptidão de baixa produtividade, R$ 11,5 mil. Entre as causas externas da

expansão da soja na Campanha Gaúcha, uma das principais é o apetite quase insaciável da China pelo produto. O país asiático absorve a maior fatia da oferta do mercado internacional e impacta na alta dos preços do grão. De acordo com Monteblanco, a China passa por um processo de acréscimo da renda per capita, urbanização e aumento da classe média, que hoje tem a dimensão equivalente a cerca de duas populações brasileiras inteiras. Esse fenômeno leva a uma importante mudança de hábitos alimentares relacionados à classe social, cuja expressão é o aumento do consumo de carne, neste caso, notadamente a suína. “Essa demanda leva a uma industrialização da produção

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Pastagens cultivadas lado a lado com as cultivadas: integração com agricultura pode trazer ganhos

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Áreas cultivadas com soja no RS: antes concentradas mais ao norte, lavouras se espalham pelo sul

chinesa de porcos, que, por sua vez, tem no farelo de soja um importante insumo, principal componente da ração dada aos animais”, diz Monteblanco. “Com essa demanda internacional constante, sobretudo a asiática, e com a permanência do valor do grão em um patamar atrativo, ainda que entre oscilações, a expansão em extensão e produtividade segue sua marcha mundial.” CONFLITO CULTURAL O avanço da soja no Pampa não está mudando apenas a paisagem local. Ele também tem impactos ambientais, sociais e econômicos, alguns que poderiam ser considerados negativos e outros, positivos. “No primeiro caso, pode-se citar uma especialização produtiva, ou seja, uma tendência de concentração em termos de produção em uma única atividade, reduzindo-se a produção de outros tipos de alimentos”, diz Garibaldi. “A entrada do cultivo da leguminosa em áreas de agricultura e pecuária familiares leva ao fim outras atividades de produção de alimentos como leite, 76

hortifrutigranjeiros, frutas, legumes, carne ovina e carne bovina, por exemplo.” Do ponto de vista social, há um esvaziamento dessas regiões, dessas comunidades rurais, devido à menor intensidade de mão de obra na produção de soja em comparação a atividades mais intensivas, como a de leite e arroz, por exemplo. Em razão disso, muitos agricultores e famílias se mudam para a periferia das cidades. Em relação aos impactos ambientais, Garibaldi ressalta que o bioma Pampa se caracteriza pelas pastagens naturais, que apresentam uma grande biodiversidade de fauna e flora. “De certa forma, a soja contribui para a redução dessa biodiversidade, tanto por causa do manejo do solo, como do uso de agroquímicos nessas regiões”, diz. Quanto aos impactos positivos da cultura, eles são principalmente econômicos. Segundo Garibaldi, o aumento do valor do grão no mercado internacional fez com que os ganhos por área cultivada aumentassem em relação à pecuária. “É isso que estimulou

muitos pecuaristas a arrendarem suas áreas para produtores de soja”, diz. “Ou seja, obtendo o maior ganho por hectare, há uma circulação maior de capital nesses municípios, em atividades de comércio e de serviços vinculados à agropecuária.” Em alguns casos, a própria pecuária pode se beneficiar do avanço da leguminosa. Os sistemas de criação extensivos estão se modificando e a integração lavoura pecuária surge como uma alternativa de renda para muitos produtores. “A segunda se intensifica com a chegada da soja, pois esta traz a possibilidade do uso mais intensivo de pastagens cultivadas”, explica Garibaldi. “No verão é a safra do grão e no inverno pastagens cultivadas, especialmente de aveia e azevém. O que amplia e qualifica o manejo nutricional da pecuária, aumentando a sua produtividade e levando a ganhos nesse sentido. Então, de certa forma, tem ocorrido em algumas regiões uma atividade de ganha-ganha entre as duas frentes de exploração, soja e criação de gado.”


Páginas do livro Manihot Utilissima, coordenado pelo chef Alex Atala: A mandioca ganha status de estrela

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A grande feira mundial do estilo e do consumo

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A grande feira mundial do estilo e do consumo

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ODE À MANDIOCA O chef Alex Atala lidera, em livro luxuoso, o resgate da planta como ingrediente autêntico da culinária brasileira Por Suzana Barelli

Cena de processamento da mandioca em aldeia indígena no Alto Xingu: riqueza de imagens que mostram a diversidade dos usos do tubérculo

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o menu de 20 anos do D.O.M., o restaurante estrelado do chef paulista Alex Atala, a mandioca foi a estrela. Em um dado momento dos jantares, as toalhas eram retiradas da mesa e os garçons colocavam em seu lugar uma esteira de palha com nove preparações diferentes a partir da planta. Bala de cachaça, com uma base tão translúcida de polvilho que tinha até uma formiga içá, com seu gosto de erva-doce, dentro; tapioca frita com queijo da Canastra e beiju de mandioca eram algumas das receitas. Para quem acompanha a carreira desse cozinheiro, entre os brasileiros mais premiados em sua atividade, criar um menu com muita técnica e pensado em torno de um ingrediente originário do Brasil era o mínimo a se esperar, não apenas no menu especial (esses jantares foram preparados no ano de 2019), mas em toda a sua trajetória. Assim como parece

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quase óbvio que ele seja o chef a liderar o estudo da mandioca, que ganha história agora nas mais de 400 luxuosas páginas da recém-lançada obra Manihot utilissima Pohl: Mandioca (editora Alaúde). A proposta do livro se revela já no seu título. Manihot utilissima é como o botânico Johann Baptist Emanuel Pohl classificou o tubérculo, termo considerado pelos autores como mais compatível com a versatilidade do ingrediente, pelo termo utilíssima – mesmo que o nome científico mais referido à mandioca seja Manihot esculenta, do botânico Heinrich von Crantz. “A culinária brasileira tem a sua espinha dorsal, que é a mandioca. É um ingrediente que esteve presente em todos os momentos do Brasil, desde antes da chegada dos portugueses, e que é onipresente, de norte a sul do país”, defende Atala. O chef não está sozinho nesta homenagem, ou melhor seria, neste resgate da mandioca. A convite de Atala, o


Gastronomia

livro conta com textos de cozinheiros, historiadores, indigenistas e fotógrafos sobre as histórias ao redor do tubérculo. Um exemplo vem da polivalente Neide Rigo, nutricionista de formação, que traz diversas histórias sobre sua busca pelas origens das farinhas. “Em cada viagem que faço por estes rincões do Brasil, descubro, maravilhada, diferentes subprodutos da mandioca ou nomes regionais para um mesmo produto”, escreve ela. Uma delas é a tentativa, em Nazaré das Farinhas, no Recôncavo Baiano, de descobrir como a baiana faz a farinha de copioba, que todos acham a melhor, mas não sabem explicar

exatamente por quais razões. Há também receitas de chefs que valorizam o ingrediente em criações únicas. O barreado, talvez a mais saborosa receita da chef Mara Salles, do restaurante Tordesilhas, em São Paulo, está lá, assim como os biscoitos de polvilho, que ganharam outro formato e até mais sabor na inquietude de Helena Rizzo, que, não por coincidência, lidera a cozinha do restaurante Maní e do Manioca. Ou as criações do saudoso Paulo Martins (1946-2010), hoje preservadas pela sua mulher e filhas, que fornecem o tucupi para o D.O.M. Com mais de 150 fotos – com destaque para aquelas tiradas pelo premiado Pedro

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Martinelli, outro autor da obra –, o livro defende a tese de que a permanência da mandioca, em seus diversos formatos, é um forte fio condutor entre a tradição – e esta raiz é uma herança das nossas tribos indígenas – e os modos atuais de compor os pratos da nossa mesa. A questão é que a raiz vem sendo colocada em segundo plano na valorização da nossa tradição alimentar. “A mandioca nos desperta um sentimento nativista e foi elevada ao posto de rainha do Brasil por Câmara Cascudo, um dos intelectuais mais importantes da alimentação. Ainda assim, e a despeito de sua relevância histórica, econômica e científica,

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Gastronomia

não foi tratada com a dignidade que merece”, afirma a jornalista e curadora gastronômica Luiza Fecarotta. Assim, o livro é quase o pagamento de uma dívida histórica com a mandioca. No clássico Casa Grande e Senzala, Gilberto Freyre destaca que, mesmo presente no cotidiano, a mandioca entra na nossa história não como uma iguaria, mas renegada a segundo plano, como comida de pobre, algo que enche a barriga e dá sustância. Por azar talvez, dos quatro ingredientes nativos nas Américas, como milho, batata, tomate e, claro, a

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mandioca, só os três primeiros foram adotados pelos europeus, o que se traduziu em receitas amplamente divulgadas mundo afora. A mandioca e seus derivados não tiveram essa sorte na história da alimentação do homem moderno. O resgate da mandioca no livro nos leva ao início da colonização do Brasil, mas pontuando que seu cultivo já existia aqui antes da chegada dos portugueses. Se eles aprovaram suas receitas, então mais rústicas, e levaram as farinhas em suas expedições para a África e a Ásia, a diversidade dos preparos da

mandioca começou a ser divulgada com detalhes a partir do século 18, com a chegada dos viajantes e das expedições científicas. E assim as questões da mandioca-brava, venenosa; as farinhas, o tucupi e a maniçoba, para citar algumas faces de sua versatilidade, passaram a ser mais conhecidas. As tribos indígenas também trouxeram diversas lendas sobre o surgimento dessa raiz. Uma delas, linda, narrada por Rita Carelli, escritora e filha de indigenistas, conta que uma menina indígena, Atoló, pediu para ser enterrada em uma área


de terra fofa, fresca e ensolarada (esta terra é um dos segredos para uma mandioca de qualidade, como se aprende no livro). A mãe a enterra e o pai vai ao local lhe dar comida, e o corpo da menina dá origem a ramas verdes, cada uma uma espécie diferente de mandioca. Independentemente das lendas, são os povos indígenas os principais responsáveis por preservar as variedades e manter os modos de processamento dessa raiz praticamente intactos. É esse saber que o livro recupera. Ou, como diz Luiza Fecarotta, “embora recorra à historiografia e à arqueologia, a obra é fresca, atual e provoca o mercado a um interesse pela importância dessa raiz, que ajuda a contar a história do Brasil”.

G L O S S Á R I O Aipim: mandioca-mansa, macaxeira, mandioca de mesa. Goma: fécula ou amido de mandioca, usada para fazer beiju ou tapioca, sagu e para engrossar caldos. Maniçoba: receita da culinária da região Norte, feito com a maniva, a folha da mandioca moída, que deve ser cozida por longo período para retirar o ácido cianídrico da planta, que é venenoso.

Mandioca-brava: mandioca que possui alto teor de ácido cianídrico, que é tóxico aos homens e aos animais. Tipiti: cilindro flexível feito do talo vegetal dentro do qual é colocada a massa da mandioca ralada e crua para a retirada do seu sumo tóxico. Tucupi: caldo amarelo, aromático e ácido, extraído da raiz da mandioca-brava, ralada e espremida. Depois de separado do amido, é cozido com temperos.

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A APOSTA NAS GIGANTES Montadoras apostam nas picapes de grande porte para seduzir os consumidores do agro Por Sérgio Quintanilha

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foto: Divulgação

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e o agro é gigante, as picapes também precisam crescer. O pensamento parece ter se instalado em parte do segmento automotivo de picapes, que entende que tamanho é documento quando se trata de acompanhar a pujança do agronegócio brasileiro. As opções de modelos de grande porte ainda são poucas, mas, com a concorrência acirrada entre as pequenas e as médias – mercado liderado por marcas tradicionais como Nissan, Chevrolet, Ford, Fiat, Renault e Mitsubishi –, já há indícios de que elas podem se tornar o próximo trunfo de algumas marcas para seduzir o público rural, capitalizado com sucessivas safras recordes e com a valorização dos preços das commodities agropecuárias. A corrida das gigantes apenas começou. A marca que mais aposta nesse filão é a Ram, que pertence ao grupo Stellantis (dona de grifes como Jeep, Fiat, Citroën e Peugeot). Ainda este ano a Ram vai lançar sua terceira picape de grande porte no Brasil: a 3500 HD. Será a mais potente à venda no País. A 3500 HD (de Heavy Duty ou Trabalho Pesado) terá 12 cavalos a mais do que a Ram 2500 Laramie,

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ou seja, 377 cv de potência. Ela também terá mais força – 65 Nm de torque a mais e um total de 1.150 newton-metros. Essa combinação de potência e torque permite que ela carregue 1.752 kg e reboque até 9.021 kg. São números incomparáveis para o mercado brasileiro. Em relação à picape Ram 2500, a Ram 3500 terá 664 kg a mais na capacidade de carga e 1.160 kg a mais na capacidade de reboque. A nova aposta mostra que os consumidores brasileiros estão pensando cada vez maior quando se trata de picapes. De 2016 a 2020, a única opção no segmento de picapes grandes era a 2500, com motor 6.7 turbodiesel de seis cilindros em linha. Com 365 cavalos, 1.085 Nm, câmbio automático de seis marchas e tração integral temporária, a Ram 2500 só pode ser conduzida por motoristas que tenham carteira de motorista da categoria C. Também há algumas restrições para circulação na cidade. A mesma regra vai valer para a Ram 3500. Por causa dessas restrições, em 2021 a Ram trouxe o modelo 1500 Rebel, que pode ser conduzido por motoristas com CNH da categoria B. Mais leve e mais esportiva, a Ram 1500


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A Ram, da Stelantis, e a Silverado, da GM: estratégias distintas para o público rural

Rebel significou uma virada no mundo das picapes grandes. Já no primeiro ano houve uma corrida pelo modelo, que tem motor a diesel 5.7 V8 aspirado de 400 cavalos. Mais de 500 unidades foram vendidas. Com uma aceleração digna de carro esportivo (5,7 segundos para ir de 0 a 100 km/h), a Ram 1500 Rebel fez tanto sucesso que aumentou também a procura pela Ram 2500 Laramie. As vendas subiram de 1.475 para 2.227 unidades em apenas um ano. Mas se a Ram faz tanto sucesso com suas picapes importadas dos Estados Unidos, por que está sozinha no mercado? Questão de prioridade das marcas para atuar no Brasil. Tanto a Ford

quanto a GM têm picapes que competem com os modelos da Ram – e são mais tradicionais do que elas! Do lado da Ford, as picapes F-Series (F-150 e F-250) são as mais vendidas do mercado americano há 48 anos. A Ford também foi a primeira marca a responder à Tesla, que apresentou uma picape 100% elétrica, a Cybertruck. A Ford F-150 Lightning estreou em grande estilo como primeira picape elétrica de grande volume e foi conduzida por ninguém menos que o presidente Joe Biden. Desde 1948, a Ford já vendeu 40 milhões de picapes F-Series. Para o Brasil, entretanto, as ambições da Ford são outras. Depois que encerrou a produção

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Ford Ranger e Nissan Frontier: disputa acirrada entre as médias

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no País, a Ford deu prioridade a dois projetos: a nova geração da Ranger (picape média produzida na Argentina) e a inédita Maverick (picape compacta produzida no México que estreia no Brasil para ser uma espécie de anti-Fiat Toro, posicionada abaixo da Ford Ranger). Para além disso, a Ford teve um certo desencanto com a F-250, que foi produzida no Brasil e na Argentina de 1998 a 2012. A Ford não tem planos imediatos de entrar na briga das picapes grandes – talvez o faça quando o mercado estiver maduro para receber a F-150 Lightning (elétrica). A General Motors, por sua vez, também está envolvida no desenvolvimento de uma anti-Toro, a nova geração da

Chevrolet Montana, que vai crescer de porte. Há também investimentos na Chevrolet S10, com novas versões, como a recente Z71, mais esportiva. Quanto às suas picapes de grande porte, dificilmente a GM apostará em marcas na marca GMC. Faz sentido ficar só com a Chevrolet. Afinal, com exceção da Hummer EV – uma picape capaz de andar de lado, como caranguejo, que ataca diretamente a Tesla Cybertruck –, as picapes GMC Canyon e GMC Sierra não passam de variações dos modelos da Chevrolet. Na linha Chevrolet, a GM tem os modelos Colorado (similar à nossa S10), Silverado e Silverado HD. Para não ficar atrás da Ford Lightning, a GM apresentou


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recentemente a novíssima Chevrolet Silverado EV (sigla de Electric Vehicle). A picape Silverado totalmente elétrica terá autonomia de 640 km, aceleração excepcional (0 a 100 em 4,5 segundos), 590 kg de carga útil (não é muito) e 4.535 kg de reboque. A Chevrolet Silverado EV chega ao mercado norteamericano em 2023. Mas a Stellantis não quer ficar atrás da Ford e da GM neste eldorado dos carros, por isso já anunciou que também terá uma picape

totalmente elétrica, baseada na Ram 1500, a partir de 2024. Ainda em relação à GM, a Chevrolet Silverado tem a vantagem de ter algumas versões produzidas no México, que possui livre-comércio com o Brasil e a Argentina. A GM chegou a anunciar a chegada da Silverado para o mercado argentino, mas depois preferiu focar em outros projetos. Por isso, pelo menos por enquanto, as três picapes da Ram – 1500, 2500 e 3500 – têm campo aberto

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para explorar a sede de consumo dos apaixonados por picapes no agronegócio brasileiro. Uma nova classe de consumidores surgiu nos últimos anos, formada por empresários que atuam no agro, mas que moram em grandes cidades. É a este público que se destina a Ram 1500 Rebel e os modelos mais esportivos das tradicionais picapes médias (Toyota Hilux, Chevrolet S10, Ford Ranger, Nissan Frontier, Mitsubishi L200 e Volkswagen Amarok). PLANT PROJECT Nº29

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SUA REDE DE

CONEXÃO

COM O AGRO DO FUTURO

Todo dia é uma oportunidade de criar novas e relevantes histórias no campo. Com a Plant é assim: desenvolvemos conexões inteligentes, consistentes e decisivas entre o agro do futuro e as grandes marcas através de projetos transformadores. /PlantProjectBrasil

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J. Borges finaliza gravura em seu ateliê em Bezerros (PE): Obra popular reverenciada em todo o mundo

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Um campo para o melhor da cultura

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Um campo para o melhor da cultura

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CULTURA GRAVADA EM MADEIRA Aos 86 anos, o xilógrafo J. Borges continua produzindo as ilustrações que levaram os costumes populares do Agreste ao resto do mundo, receberam elogios de Ariano Suassuna e o transformaram em Patrimônio Vivo de Pernambuco

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onsiderado o maior de todos os gravuristas por ninguém menos que o escritor, poeta, dramaturgo e professor Ariano Suassuna (1927-2014), José Francisco Borges ajudou a transpor para as artes visuais alguns dos significados do imaginário nordestino. Tanto que é difícil definir exatamente o que mais chama a atenção em suas obras. Se são as cores vivas, o traço simples, mas imediatamente reconhecível, ou as representações do cotidiano do homem do campo, de costumes populares e de lendas regionais. De qualquer maneira, é impossível não se encantar por seu trabalho. O que J. Borges, como o artista é conhecido, registra nos blocos de madeira que cria como matrizes para suas obras – uma técnica conhecida como xilogravura – está intimamente ligado a sua experiência de vida. Seu pai, Joaquim Francisco Borges, era um homem do campo e logo colocou o filho para ajudar no trabalho pesado. J. Borges trabalhou em lavouras brancas e colheu cana. Também foi carpinteiro, pedreiro, oleiro e vendedor de colheres de pau que ele mesmo produzia. Conheceu a realidade do Agreste, mas também sua riqueza cultural e as histórias fantásticas que seu pai lhe contava antes de dormir.

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Com pouco estudo formal, descobriu sua aptidão artística meio sem querer. Com 20 anos, em uma de suas muitas empreitadas, passou a revender o cordel de outros autores. Participava de feiras, dormia em hotéis e acabou se acostumando com a vida um pouco mais tranquila. Tanto olhou para as palavras dos outros que decidiu colocar no papel as próprias histórias. Escreveu O Encontro de Dois Vaqueiros no Sertão de Petrolina, que cativou um editor local e foi publicado em 1964. O original se perdeu, mas o sucesso daquela história, com capa desenhada pelo mestre Dila, apelido de José Soares da Silva (1937-2019), o motivou a escrever mais. Já no segundo cordel, O Verdadeiro Aviso de Frei Damião Sobre os Castigos que Vêm, como forma de economizar dinheiro sem abrir mão da ilustração, decidiu arriscar. Pegou um pedaço de madeira e, usando uma faca – e os conhecimentos adquiridos como carpinteiro –, baixou o relevo, desenhando uma igreja, inspirada na matriz de Bezerros, sua cidade natal, no interior de Pernambuco. Levou a peça a uma gráfica, viu a tinta ser aplicada e o desenho ser transposto para o papel. Gostou do resultado. Mandou


imprimir o cordel ilustrado e foi vender, ele mesmo, as próprias histórias. Continuou escrevendo e ilustrando até que chamou a atenção de outros cordelistas. Passou a aceitar encomendas e produzir gravuras. Foi assim que aperfeiçoou sua arte, desenhando pessoas, animais, seres imaginários, naturezas-mortas… Tudo o que os outros autores precisavam. Vendia as matrizes em madeira a preços baixos e conquistava uma clientela crescente. No início dos anos 1970, uma série de coincidências fez com que sua obra alcançasse uma projeção inédita. José Maria de Souza (1935- 1985) e Ivan Marquetti (1941-2004), dois artistas plásticos do Rio de Janeiro que ficaram encantados pela arte de J. Borges, apresentaram suas gravuras para Suassuna. O escritor chamou o artista para a Universidade Federal de Pernambuco, onde lecionava, com o objetivo de conhecer de perto o homem por trás daqueles desenhos. Lá, armou uma entrevista coletiva improvisada com alguns jornalistas como forma de divulgar seu trabalho, apresentando-o como o melhor xilógrafo do Nordeste. Foi assim que J. Borges deu entrevista para veículos impressos e para redes de TV. Logo na semana em que as reportagens foram veiculadas, ele começou a receber compradores interessados em seus desenhos. “E depois disso PLANT PROJECT Nº29

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nunca mais tive sossego na vida”, brinca ele. Passou a produzir gravuras maiores e adicionou cores aos desenhos, uma verdadeira mudança, já que nos cordéis as ilustrações são monocromáticas. Em plena ditadura, participava de feiras, escapava da censura e das patrulhas em busca de materiais subversivos ao explorar temas mais amenos e pouco ligados à política. A fórmula deu certo e ele participou de exposições e foi convidado por galerias a mostrar seu trabalho. J. Borges nunca abandonou sua cidade natal, Bezerros, no interior de Pernambuco. Mas sua arte ganhou o mundo. Suas gravuras já foram expostas em museus internacionais, como o Louvre, em Paris, na França, o Museu de Arte Popular do Novo México, em Santa Fé, e o Museu de Arte Moderna de Nova York, ambos nos Estados Unidos. E continuam viajando por aí. Até o final de fevereiro, o Museu de Arte do Rio (MAR) exibiu 40 xilogravuras, sendo dez obras inéditas, dez matrizes 96

inéditas e as 20 obras mais importantes da sua carreira. Em 2002, J. Borges tornou-se o único brasileiro a participar do Calendário da Organização das Nações Unidas. Foi tema de reportagem do The New York Times. E também coleciona reconhecimentos e prêmios nacionais e internacionais, como a medalha de honra ao mérito da Fundação Joaquim Nabuco, em 1990, e o Prêmio de Gravura Manuel Mendive, na 5ª Bienal Internacional Salvador Valero, na Venezuela, em 1995. Suas obras já estamparam capas de livros – de títulos de Eduardo Galeano (1940-2015) e José Saramago (1922-2010) a edições comemorativas de Dom Quixote e dos Contos dos Irmãos Grimm. E continuam ganhando novos significados. No dia 19 de fevereiro, uma obra original, com desenhos que remetem às feiras livres, foi aplicada em um modelo de tênis pela marca Ous, conhecida pelos modelos para skatistas, em uma parceria com a loja Guadalupe, de São Paulo. A edição, limitada a 240 pares,

marcou a estreia de seus desenhos em um calçado. É um exemplo da versatilidade e do apelo universal de seus traços. Em mais de 60 anos de carreira, J. Borges produziu 314 folhetos de cordel e um número muito maior de xilogravuras. Continua produzindo, embora em um ritmo menor. Os cordéis, que ele chama de “jornalismo da zona rural”, são feitos apenas sob encomenda. Continua escavando os blocos de madeira sozinho, em seu ateliê, em Bezerros, em um amplo espaço em que fica cercado pelas matrizes. Conta com ajudantes para colocar a tinta e aplicar o papel nos moldes originais, e tem ainda gente para cuidar de suas redes sociais e vender os desenhos pela internet. Além do ateliê, o Memorial J. Borges conta com espaço para oficinas e um museu. E as reproduções são vendidas a preços acessíveis – uma exigência do artista. Mais do que uma obra de um dos maiores artistas do mundo, cada colecionador leva para casa um pedacinho da cultura popular brasileira.


Produção de hortaliças na Pink Farms, em São Paulo: Fazendas verticais ganham impulso com apetite do mercado

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As inovações para o futuro da produção

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As inovações para o futuro da produção

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FAZENDAS À LUZ DE LED Projetos de agricultura vertical em ambientes fechados conquistam investidores e recebem bilhões para alavancar a produção Por Bruno Cirillo

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m um galpão alugado na Vila Leopoldina, zona oeste de São Paulo, a Pink Farms colhe os frutos, ou melhor, as hortaliças de uma inovação na agricultura: a fazenda vertical urbana. Trata-se de um dos primeiros negócios do tipo no Brasil. Todos os dias, às 7 horas, a engenheira agrônoma Luana Borges chega ao trabalho e, com dez trabalhadores “rurais”, cuida de uma produção mensal de 3 toneladas de alface e até 150 quilos de folhosas altamente nutritivas, os microgreens. Fazendas verticais continuam sendo uma novidade no País. Lançada em 2017 por três sócios, a Pink Farms tem pelo menos uma concorrente, a 100% Livre, capaz de produzir mensalmente 13 toneladas de hortaliças de alto valor agregado no Ipiranga, zona sul paulistana. Porém, em razão do sucesso em outros países, investidores do agronegócio não descartam o modelo dentre suas opções. Em cinco anos, a unidade visitada pela PLANT PROJECT recebeu R$ 8 milhões em aportes, realizados por meio de crowdfunding, anjos e fundos de investimento. Nos Estados Unidos, Japão e Europa, o segmento tem recebido aportes generosos e já formou seus primeiros unicórnios. Grandes investidores de risco têm feito cheques gordos para startups especializadas na produção indoor: a Google Ventures investiu US$ 90 milhões na Bowery Farming, a sueca Ikea se comprometeu a injetar US$ 115 milhões da AeroFarms e o Softbank, fundo gigante de origem japonesa, reservou US$ 200 milhões para a Plenty, todas americanas. Na Europa, a holandesa

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Infarm também levantou US$ 200 milhões em uma rodada de captações, tornando-se a primeira do continente a ser avaliada acima de US$ 1 bilhão. Segundo a revista americana Forbes, o mercado global de agricultura vertical deve atingir US$ 40,25 bilhões este ano, o que justificaria tamanho frenesi. Os recursos têm financiado a implantação de novas “lavouras” em edifícios em vários países. A líder AeroFarms, por exemplo, inaugurou um prédio de 6,5 mil m² em Nova Jersey (EUA), e a dinamarquesa Nordic Harvest possui uma instalação de 7 mil m² em Copenhague. Os próximos projetos, anunciados em janeiro, incluem uma nova fazenda da americana Upward Farms na Pensilvânia, com 23,2 mil m² para entrar em operação em 2023, e uma aposta de US$ 400 milhões do Walmart na startup Plenty, já famosa no ramo, para abastecer a rede de supermercados na Califórnia. SOB CONTROLE Se a agricultura sempre foi definida como uma indústria a céu aberto, sujeita a variáveis como pragas e clima, os bilhões despejados nas fazendas verticais se propõem justamente a promover uma era da produção sob controle total. “A grande diferença é o sistema hidropônico, que não usa nada de terra. Também é uma lavoura fechada, indoor, então não há nenhum fator climático que atrapalhe o crescimento das plantas”, descreve Luana, da Pink Farms. “É um ambiente perfeito em termos de controle de temperatura, fitossanidade e umidade. As plantas ficam mais bonitas, com


Produção na Pink Farms: mais de R$ 8 milhões em aportes de investidores

produtividade maior e qualidade excepcional”, acrescenta ela. Para entrar na área produtiva, é preciso colocar avental, uma touca e cobrir os sapatos. Às 8 horas de uma terça-feira, início de fevereiro, na antessala da fazenda, os funcionários finalizam as alfaces já prontas, cortando as partes murchas antes de embalá-las para serem remetidas a uma série de supermercados, restaurantes e food service. A produção é feita sob demanda e a oferta ainda é inferior à procura, com o Pão de Açúcar, Carrefour e hotel Hilton na carteira de clientes. Aos sábados, eventualmente, há visitas guiadas no local. Num futuro próximo, os visitantes poderão conhecer uma nova unidade, onde devem produzir um volume 40 vezes maior de alface e brotos de hortaliças, com

acesso especialmente desenvolvido para eles (uma ponte no interior da fazenda para que possam passear pelas instalações sem ter contato direto com o “chão de fábrica”, segundo Luana). O projeto está previsto para 2023, em Jundiaí (SP), e como o dinheiro para torná-lo possível ainda está sendo captado, a Pink Farms não revela o montante. No ano passado, a empresa dobrou de faturamento. Procurada pela reportagem, a 100% Livre não se manifestou até o fechamento desta edição. Mas sabe-se que o negócio é resultado de um contrato de dois anos, firmado em setembro de 2020 com a Embrapa Hortaliças (DF). A empresa informa em seu site que produz alface, rúcula, tomate, pimentão, manjericão, coentro, salsa, sálvia, brotos, microgreens e morango. Tem 150 clientes. De PLANT PROJECT Nº29

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plantas pequenininhas ainda, ficam prontas em até 15 dias, com uma carga de nutrientes maior que as adultas – até 400% mais”, explica Luana. “Não é exclusividade de fazendas urbanas, dá para plantar em casa e na terra. Era bastante usado para a decoração de pratos. Há uns anos, o consumo aumentou nos restaurantes e o portfólio foi ampliado”, acrescenta, pontuando que a demanda caiu na pandemia.

resto, assemelha-se à concorrência em termos de instalações, economizando 90% de água e 70% de adubos na produção, se comparada a uma lavoura tradicional. “A ideia das fazendas urbanas verticais é trazer a agricultura de volta para os centros urbanos através da tecnologia, criando um processo de cultivo mais produtivo, eficiente e sustentável. E através desse tipo de cultivo, oferecemos um alimento mais 102

saudável, de melhor qualidade, com maior tempo de validade e sem a necessidade de utilizar agrotóxicos”, explica o CEO da Pink Farms, Geraldo Maia. Numa sala contígua do galpão na Vila Leopoldina, prateleiras dão suporte a bandejas com mudas de hortaliças diversas. Entre os chamados microgreens, produzse alecrim, tomilho, alho-poró, cenoura, repolho, rabanete, mostarda e rúcula. “São as

A COR DO FUTURO A produção de alface se concentra numa área mais ampla, em duas torres iluminadas pela luz LED rosa que deu origem ao nome da empresa. Cada estrutura tem 7 metros de altura e dez longos patamares repletos de plantas em germinação, mudas e folhas prontas para a colheita. No sistema hidropônico, cuja água é constantemente reaproveitada, as alfaces são cultivadas em esponjas especiais e acabam sendo 170 vezes mais produtivas do que as convencionais. Os produtores injetam adubos próprios nas raízes das plantas e dispensam o uso de defensivos. O ciclo até a colheita dura 40 dias. A Pink Farms trabalha com cinco tipos de verdura. Típico do vertical farming, o uso de lâmpadas LED em prédios comerciais deve crescer a uma taxa anual de 6,9% até 2028 – índice que pode chegar a 32% entre produtores de alimentos –, segundo um estudo de 2019 da consultoria americana Navigant


Research, de Colorado. Erik Runkle, cientista de plantas industriais da Universidade de Michigan (EUA), estima que há 40 ou mais fazendas verticais no país. Um dos maiores negócios, a AeroFarms, com sede em Newark, arrecadou US$ 40 milhões no ano passado. A Plenty, baseada em São Francisco, levantou US$ 200 milhões em 2017 para uma rede global de negócios do tipo – um dos patrocinadores é uma empresa de capital de risco criada pelo fundador da Amazon, Jeff Bezos. Um dos grandes motivos para o sucesso desses empreendimentos é a procura por novas formas de se fazer agricultura, e mais produtivas, sem expansão de área no campo, de acordo com Maia, o CEO da Pink Farms. “Nos últimos anos, a quantidade de terra utilizável diminuiu muito devido a vários fatores, como crescimento

populacional, erosão do solo, contaminação de rios e nascentes, queimadas etc.”, explica. “E, se pensarmos, a maior parte do planeta Terra é de oceanos. Então, o espaço para se produzir os alimentos é reduzido”, ele diz. Segundo a FAO-ONU, 200 milhões de pessoas no mundo produzem vegetais no meio urbano, gerando alimentos para 800 milhões de pessoas em hortas nas cidades, produção doméstica, criação de animais, além de lavouras cultivadas na cobertura de prédios, mais comuns em Nova York. Sem falar em fazendas verticais. Considerado o maior projeto nesse modelo até hoje, a nova unidade da Upward Farms prevê para suas torres o uso da aquaponia, uma simbiose entre o cultivo hidropônico de folhosas e tanques para a criação de peixes. O sistema de produção vertical é, sobretudo, sustentável. Luana,

da Pink Farms, lista uma série de motivos. “As fazendas verticais são sustentáveis, pois usam menos fertilizantes (cerca de 60% a menos comparado ao campo), otimizam o espaço de área de luz, reduzem o uso de água em 95%, e podem utilizar painéis solares para a energia”, ela diz. Outra razão, acrescenta a engenheira agrônoma, está no delivery oferecido aos clientes, além do aproveitamento, essencialmente, de espaços urbanos subutilizados. “Pelo fato de nossas entregas serem feitas num raio pequeno, emitimos menos carbono no meio ambiente. Também temos a possibilidade de utilizar espaços impróprios para moradia, mas úteis para a produção de alimentos”, observa. Para completar, a próxima fazenda da Pink Farms deve contar com um sistema mecanizado de colheita, revela Luana. PLANT PROJECT Nº29

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O PONTO DE ENCONTRO DA INOVAÇÃO A fórmula do Agtech Garage, de Piracicaba, para conectar grandes empresas e startups e se transformar no maior hub voltado para a tecnologia do agro na América Latina

Evento no Agtech Garage: Espaço se transformou em polo de atração de empreedendores, investidores e grandes empresas do agro 104


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á alguns motivos para Piracicaba (SP), a 200 km de São Paulo, ser considerada “o Vale do Silício caipira”. O principal é que, desde 1901, a cidade hospeda a Escola Superior de Agricultura Luiz de Queiroz (Esalq-USP), uma das principais instituições voltadas para as ciências agrárias do mundo e a universidade que, em 1994, lançou a primeira incubadora brasileira de startups do agronegócio. Mas não é só por isso. A cidade também é sede de uma série de empresas voltadas para a inovação do setor e tem a maior concentração de iniciativas de estímulo ao desenvolvimento de novas tecnologias voltadas para o campo. Estão lá, entre outros, a Esalqtec, que deu origem a todo esse movimento, o Pulse, criado pela gigante do setor sucroenergético Raízen, e o AnimalsHub, com foco na pecuária. Nenhum deles, entretanto, consegue congregar tantas marcas quanto o AgTech Garage, criado em 2016 e que, desde então, se tornou o grande

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ponto de encontro entre as grandes empresas do agro e aquelas que se propõem a mudar o futuro do setor. O Garage é apontado hoje como o maior hub de atividade agropecuária na América Latina. Idealizado pelo engenheiro químico José Tomé e o empresário Marcelo Carvalho, ele nasceu como um pequeno coworking no centro de Piracicaba. Em apenas três anos ocupava um moderno prédio de 1,5 mil metros quadrados no Parque Tecnológico da cidade, junto à sede da Raízen e do Pulse. “A evolução do hub está sendo fantástica, pensando que a gente está fisicamente no local há três anos, sendo que dois foram de pandemia”, afirma Carvalho. “Só no ano passado, a gente cresceu por volta de 130% e nesse ano devemos dobrar de tamanho, então o sucesso está sendo muito grande. O número de parceiros e startups mapeadas está crescendo todos os meses, então


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entendo que o hub está cumprindo o papel de ser um catalisador da inovação aberta no agro.” A base de startups conectadas à comunidade virtual do Garage, de fato, mais que dobrou em 2021, de 400 para quase 900. Cerca de 100 delas são residentes ou residentes virtuais do hub, participando diariamente ou com frequência de atividades oferecidas ou interagindo com a rede de mentores e investidores. São potenciais prestadoras de serviço, sobretudo na área de tecnologia, à procura de clientes como agroindústrias, corporações e fazendeiros. Na outra ponta, a meta é chegar a 100 investidores neste ano – partindo de 58 em 2021, ante 30 em 2020. Mais que números, porém, o que impressiona é o calibre das marcas que buscam ali essa conexão com a inovação. Bayer, Bunge, John Deere, Koppert, Sicredi, Suzano, Cargill... A lista cresce a todo momento, em diferentes formatos de associação. John Deere e Bayer, por exemplo, estão entre os chamados Innovation Partners, aquelas que investiram para desenvolver, dentro do Garage, seus próprios hubs, com maior engajamento em programas de inovação desenvolvidos sob medida para suas necessidades, de forma mais estratégica. Nessa categoria há apenas uma empresa por vertical de negócios – são sete atualmente. Já a categoria Ecossystem

Partners, que hoje conta com 45 empresas, sem exclusividade por vertical é voltada para aquelas que buscam interação com o ambiente do hub e ao contato com as startups em busca de parceiros e agilidade para desenvolver inovação. Existe ainda uma terceira categoria, a Membership Bayer, criada sob demanda da fabricante de insumos, que tem como objetivo proporcionar a experiência do hub para cooperativas e revendas estratégicas para seu negócio. O acesso e as entregas são semelhantes ao que é oferecido aos Ecossystm Partners, mas financiado pela Bayer. “É um ganha-ganha”, diz Tomé, CEO do Garage. “Por um lado, a cooperativa ou a revenda recebem uma oportunidade de ter contato com o ambiente de inovação. De outro, a Bayer as ajuda a estar mais preparada para receber as inovações da empresa.” Essa flexibilidade para encontrar modelos customizados é um dos trunfos do hub. “A gente usa o hub pra fazer conexões com startups e as startups como fornecedoras de serviços e tecnologias”, conta a líder de Inovação Aberta da Suzano, Beatriz Souza. Com mais de 1 milhão de hectares de florestas de eucaliptos no Brasil, a fabricante de papel e celulose trabalha com cerca de 50 startups em diversas áreas. Sete delas foram contratadas na AgTech Garage, de dois anos para cá. Foi graças a uma delas, a

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SciCrop – especializada em monitoramento e análise de lavouras –, que a Suzano identificou uma taxa de reflorestamento natural estimada em 17% das terras mapeadas, dispensando o manejo. Outra parceria na área de silvicultura gerou um ganho de 3,5% na eficiência operacional. Além das florestas, a cliente tem 11 fábricas e produz mais de 3 milhões de toneladas de celulose por ano. Agora, está prospectando outras duas startups para contrato no hub de Piracicaba. “A gente tem nossas ‘dores’ internas. Nosso sonho é sempre ganhar produtividade. Uma das questões é reduzir o consumo de diesel”, conta Beatriz, adiantando qual deverá ser a próxima parceria e explicando que essa fase de procura se chama “screaming”. “É quando convidamos as startups para resolver os nossos problemas. O hub serve muito para isso: conexão. Esse foi o diferencial de procurar o AgTech Garage. Se eu fosse buscar sozinha uma startup para reduzir o uso de diesel, seria muito mais moroso do que pedindo ajuda para um hub”, diz. Já a empresa de soluções biológicas para a agricultura Koppert identificou no Garage o parceiro para desenvolver um projeto próprio, o Gazebo, primeiro hub voltado para o desenvolvimento de tecnologias para o controle biológico. O PLANT PROJECT Nº29

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objetivo é promover parcerias, seja com startups, empresas ou instituições de pesquisa, que desenvolvam soluções aplicadas aos bioinsumos e serviços relacionados, com foco em inovação e sustentabilidade. AMBIENTE FÉRTIL “A gente está conseguindo colocar em contato startups e corporações, academia e stakeholders, gerando relacionamentos e levando conhecimento, informação e tecnologia em gestão e inovação para essa comunidade. Tem muito ainda a ser construído, mas o que a gente já fez até agora é muito relevante”, afirma Carvalho. Dedicado à pesquisa, desenvolvimento e inovação do agronegócio, José Tomé, o CEO, é responsável pelas parcerias firmadas no âmbito do AgTech Garage. Ele mesmo teve uma startup em 2011 e em 2013 abriu o primeiro coworking do agronegócio, voltado para a cana-de-açúcar, que predomina em Piracicaba. Dois anos depois, foi procurado por fundos de 108

investimento e pela Esalqtec, com a qual realizou o primeiro censo das startups agropecuárias no Brasil, lançado em 2016. “O estudo fez a gente entender qual seria o nosso papel: seríamos o player que traria as pequenas empresas para o jogo. De 2017 pra cá, evoluímos muito. A inovação aberta não é só startups, são projetos também. O ecossistema amadureceu”, observa Tomé. Segundo ele, o País está na liderança mundial das práticas de inovação aberta, como as promovidas pelo hub, que vê como um “ambiente fértil” para negócios cada vez mais diversificados. “Existe uma diferença grande entre um hub e uma incubadora. O hub é um ambiente plural, com iniciativas que dependem de público e acesso a investidor”, diz o empresário. “O hub atrai investidores. O investidor-anjo está mudando, com uma diversificação maior, inclusive produtores que estão investindo em startups. Profissionais que eram investidores-anjo, cinco anos atrás, hoje são fundos de

investimento. Toda essa rede está conectada ao hub e pode ser acessada pelos empreendedores”, acrescenta. Tomé observa que empreendedores “de garagem”, sozinhos, perderam a competitividade. A missão do AgTech Garage é promover parcerias que evitem o prejuízo. Os interessados podem, segundo ele, ater-se a um relacionamento virtual ou se tornarem residentes, com seus funcionários acompanhados por gestores. “As empresas mais preparadas sabem se relacionar com startups sem perder tempo”, afirma o executivo. “São partners choices, que atraem os melhores, gerando serviços de forma mais competitiva”, defende. “Trabalhar nesse ramo é estar na fronteira, o que é desafiador porque são negócios que se encontram num limiar. A gente faz um trabalho muito forte de RH para atrair empresas de diferentes áreas e mudar o ambiente de negócios. Se bem explorado, o RH pode se beneficiar, o marketing também”, comenta Tomé. “Estamos ganhando muita força em relacionamento. O hub é um ambiente fértil para isso”, ele diz. O executivo vê com otimismo o ambiente de negócios no Brasil atual – no caso do hub, os negócios foram de alguma forma beneficiados pela pandemia – e acredita que, “de norte a sul”, há gente e empresas qualificadas tal qual se vê em São Paulo ou Piracicaba.


Startups

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GARAGEM DE PORTAS ABERTAS

Os números do AgTech Garage Innovation Partners: ...................................7 Ecossystem Partners: ..............................45 Membership Bayer: ......................................8 Startups conectadas: .............................900 Startups membros: .................................100

CADERNO DE CAMPO Segunda maior instituição financeira do agronegócio no Brasil, o Sicredi é um dos innovation partners e cofundadores do AgTech Garage. Com uma carteira de crédito rural que atualmente supera os R$ 50 bilhões, a instituição financeira cooperativa firmou, por meio do hub, uma parceria com a Elysios Agricultura Inteligente. Especializada em serviços de sensoriamento e automação de lavouras, a startup viu sua base de clientes aumentar exponencialmente após fechar negócio com o Sicredi. “Hoje, essa parceria já beneficia mais de 600 produtores ligados a diferentes cooperativas do Sicredi. Além disso, a Elysios tem a possibilidade de desenvolver em paralelo projetos mais ambiciosos junto às cooperativas, personalizando o atendimento

para oferecer serviços de acordo com a singularidade de cada uma”, conta a líder de Inovação do Sicredi, Jéssica Tambalo. Presente em 17 estados, a Elysios realiza o sensoriamento remoto de 100 mil hectares de área plantada, em 2,6 mil propriedades rurais, com foco em fruticultura. Para apresentar o resultado aos produtores, a startup tem um aplicativo chamado Caderno de Campo, no qual informações sobre o plantio ficam disponíveis no celular, facilitando o trabalho nas fazendas. O foco da empresa gaúcha é, portanto, a digitalização do setor. “O nosso trabalho é desenvolver sistemas de sensoriamento e automação para cultivos protegidos. Hoje, a gente atende a cultivos abertos e desenvolvemos um braço de software que atende desde

pequenos produtores até a agroindústria”, resume o diretor financeiro da Elysios, Frederico Brito. Ele lembra que o projeto com o Sicredi, por meio do AgTech Garage, começou com 30 produtores gaudérios, em Flores da Cunha, Bom Princípio e Farroupilha (RS). Rapidamente, chegou a centenas de membros de sete cooperativas que fazem parte do grupo de crédito agrícola. “Tivemos um ótimo sucesso”, afirma Brito. “Estamos estudando como crescer ainda mais com essa ferramenta. O legal do hub é justamente quando ele é o facilitador, claramente empregando uma metodologia de inovação aberta e fazendo que seus grandes parceiros encontrem as startups, que são mais ágeis e conseguem ajudar – e, nesse sentido, já está colhendo frutos”, observa. PLANT PROJECT Nº29

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UM PILOTO NA CORRIDA DOS FERTILIZANTES Ernani Judice deixou as pistas para acelerar no agro com uma inovação na área de nutrientes para o solo

Laboratório da Agrion: tecnologia proprietária para criar produto inovador 110


Negócios

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tecnologia certa na hora certa. Ex-piloto de automobilismo e empreendedor carioca, Ernani Judice acredita que tem as condições perfeitas para acelerar um projeto que vem aperfeiçoando há mais de uma década. “Dois aspectos tornam esse momento extremamente favorável: o marcado de fertilizantes com preços em alta e a dificuldade de abastecimento e a necessidade das empresas do agro de se adequarem à agenda ESG”, afirma. “A solução que desenvolvemos na Agrion entra muito forte nessas duas vertentes.” Judice hoje pilota a Agrion AgriSolutions, empresa que aposta em uma tecnologia proprietária na produção de fertilizantes organominerais. A Agrion foi criada há apenas dois anos, mas o executivo já aposta no setor desde 2009, quando, ao lado de outros sócios, lançou no mercado a ideia de usar resíduos da produção de cana como veículo para a aplicação de fertilizantes nitrogenados (NPK) no solo. A novidade trazida pela nova companhia é o modelo de produção com fábricas descentralizadas, localizadas ao lado de usinas parceiras. Com isso, garante, solucionou alguns dos entraves que emperraram o projeto anterior. A cronologia dessa inovação ajuda a entender o entusiasmo de Judice. Os fertilizantes organominerais – que, como o nome diz, combinam elementos orgânicos e minerais – são regulamentados já há muitos anos e formam uma categoria ampla, que inclui produtos feitos à base de resíduos vegetais e animais. O empreendedor começou a analisar esse mercado na primeira década do século quando, ao ver as portas da Fórmula 1 se fecharem para ele (que foi campeão

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brasileiro de Fórmula 3, mudou-se para a Europa e chegou a ter um précontrato para a principal categoria do automobilismo), voltou ao Brasil com o sonho de criar seu próprio negócio. “Eu sempre olhei para a cadeia de alimentos, mas acabei desenvolvendo um modelo de aterros sanitários privados, numa época em que uma nova lei tornou esse mercado atrativo”, conta. O empreendimento saiu do papel e ele chegou a vender seus serviços para 12 municípios do estado do Rio de Janeiro. “Mas então percebi que não podia ficar simplesmente enterrando lixo.” Nessa época, o sogro de Judice liderava um projeto de tratamento de resíduos e o executivo enxergou uma oportunidade para construírem algo juntos. Eles fundaram, então, a Geociclo, com foco no desenvolvimento de fertilizantes organominerais de alta qualidade. O produto era resultado do tratamento da matéria orgânica residual do processo industrial nas usinas de cana, a torta de filtro. Submetido a um processo químico de bioestabilização – uma espécie de compostagem acelerada por bactérias e fungos –, esse material se torna base para receber os fertilizantes, macro e micronutrientes. “Temos uma tecnologia proprietária para fazer esses minerais entrarem nos poros da matéria orgânica, que cria uma barreira física e encapsula o NPK”, diz Judice. O resultado são pequenos grãos, de dureza bastante elevada, que podem ser aplicados no solo com muitos benefícios em relação aos fertilizantes convencionais. A barreira física proporcionada pelo material orgânico faz com que a liberação do NPK seja mais controlada, evitando que ele se perca muito rápido pela ação do PLANT PROJECT Nº29

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solo, da chuva e do calor. “Boa parte dos fertilizantes foi desenvolvida para clima temperado”, afirma o executivo. “Mais de 60% se perde muito rápido no nosso clima tropical. O nosso produto, não. Ele vai se degradando e liberando os nutrientes aos poucos. Assim, o produtor consegue aplicar menos e a planta vai absorver mais, gerando uma produtividade maior.” A própria matéria orgânica, ao se dissolver, é incorporada pelo solo, deixando-o mais rico. Além disso, o processo permite que sejam adicionadas outras substâncias benéficas necessárias para determinado terreno. Outra vantagem, segundo Judice, é a redução de custos de operações agrícolas, por permitirem a diminuição de aplicações de fertilizantes, que consomem horas de equipe, máquinas e combustíveis. “Com isso, contribuímos para a redução do impacto ambiental da cadeia em várias frentes: com a reciclagem dos resíduos orgânicos, menos emissões com queima de 112

combustível e também com a liberação de gases provenientes dos fertilizantes nitrogenados. “Além da agenda ESG, a solução é viável economicamente”, afirma Judice. “Não adiantaria resolver um problema e criar outro. A conta para o produtor é muita positiva.” De acordo com estudos realizados na Universidade Federal de Uberlândia, cidade onde fica a sede da Agrion, com o uso dos organominerais seria possível reduzir o uso de fertilizantes em 58% sem perder produtividade. “Mas nosso objetivo é aumentar a produtividade. Nossa estimativa é de que com 30% a 40% menos NPK é possível ter um ganho de produtividade de 10% nas lavouras de cana.” NOVO NEGÓCIO Se os resultados são tão favoráveis, o que fez com que Judice não tenha conseguido acelerar antes? O empresário afirma que, até dois anos atrás, o modelo de negócios estava equivocado. Ele previa a instalação de grandes fábricas


Negócios

centralizadas para processar a torta de filtro, incorporar o NPK e, então, distribuir o fertilizante organomineral. “A matéria-prima tem pouco valor agregado e o custo logístico para transportá-la, em grandes volumes e distâncias, inviabilizava a operação”, diz. Ao se desligar da Geocon, Judice se dedicou a desenvolver um modelo de fábricas menores, descentralizadas, instaladas ao lado de usinas. Assim, a um passo delas estaria não apenas a torta de filtro, mas as próprias lavouras que usariam o seu produto. “A própria usina consome de 30% a 50% da produção em seus canaviais e já viabiliza o investimento”, explica. “O restante vendemos no mercado, na própria região.” A primeira unidade com esse modelo já está contratada junto a uma usina da região do Triângulo Mineiro e está em fase de estruturação financeira para sua implantação. O investimento fica na casa de R$ 20 milhões e deve estar operando no primeiro trimestre de 2023. Uma segunda está prevista para o Nordeste e há outros dez memorandos de intenção assinados com usinas em outras regiões. Os modelos de negócios são feitos sob medida para cada parceira. A usina pode apenas atuar como fornecedora da matéria-prima e, ao final do processo, comprar o fertilizante, em um contrato de longo prazo, ou entrar como sócia no negócio, tendo acesso ao produto com custo bem menor que o de

mercado. “Outro benefício, além dos ganhos econômicos e de produtividade, é que com a redução da pegada de carbono pode haver a geração de CBios”, diz o empresário. Uma fábrica de porte médio, com capacidade de produção de 30 mil toneladas, fornece o necessário para fertilizar em torno de 45 mil hectares. Isso cobre com sobras as necessidades de uma usina e abre a possibilidade de comercialização para outros produtores, inclusive em diferentes culturas. A flexibilidade do modelo permite adaptar a consistência da matéria orgânica para que ela se dissolva no ritmo adequado a cada uma delas. A cana, como cultura mais perene, exige que a liberação do fertilizante seja mais gradual. Em culturas de crescimento mais rápido, como a soja, a resistência da “cápsula” de torta de filtro pode ser menor, permitindo uma liberação também mais rápida. A Agrion patenteou o processo de produção, que pode ser replicado junto a outras atividades que geram grande quantidade de resíduos de matéria orgânica, como a indústria de celulose ou mesmo a suinocultura. Nesse momento, no entanto, o foco está totalmente voltado para o potencial do setor sucroenergético. Há mais de 400 usinas em atividade no País, a maioria em condições de ter uma fábrica de fertilizantes ao seu lado. É uma estrada aberta para quem gosta de acelerar.

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Judice, a área de testes e os “grãos” de fertilizantes organominerais: gerando valor a partir de resíduos do setor sucroenergético

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SUSTENTABILIDADE DA AGROPECUÁRIA BRASILEIRA Po r Pl i n i o N a s t a r i A agropecuária brasileira é um exemplo mundial de sustentabilidade. Ao longo das últimas décadas, novas práticas foram desenvolvidas e implementadas com grande sucesso, como o cultivo mínimo, a fixação biológica de nitrogênio e a correção do solo, permitindo a produção em áreas antes consideradas absolutamente impróprias para a agricultura. A soja, o milho e agora até o trigo foram adaptados às nossas condições de clima e solo. O valor agregado tem sido fomentado em áreas que variam de frutas a algodão de coloração natural, que aumentam a renda e o bem-estar daqueles envolvidos com a agricultura. A Integração Lavoura-Pecuária-Floresta (ILPF) está levando à produção de proteína animal com emissão zero ou negativa de carbono e muito mais elevados níveis de sustentabilidade. Mas não é só. O Brasil tornou-se

e outros insumos) é transformada em etanol, DDG (grãos secos de destilaria, concentrado de proteína e fibra) e óleo, o seu valor dobra, estimulando produtores a aumentarem essa produção de milho tão sustentável. Além disso, a soja produzida em rotação com a cana-de-açúcar aumentou nos últimos cinco anos de 400 mil para 1,4 milhão de hectares apenas no estado de São Paulo. A integração das cadeias está permitindo a expansão do confinamento de gado bovino, que reduz o tempo de terminação do gado de 36 para 24 ou até 18 meses e, assim, libera pastagens, muitas vezes degradadas, para a agricultura – o potencial é de 90 milhões de hectares adicionais. Tem permitido também a expansão da produção de carne suína e de aves. Em 2021, a agricultura energética permitiu ao Brasil substituir 43,9% de toda a sua gasolina por etanol, 10% de seu diesel por biodiesel e 6,6% de sua energia por bioeletricidade. Muito em breve, mais gasolina, diesel e energia também serão substituídos com mais etanol de primeira e segunda geração, biodiesel, HVO (óleos vegetais hidrotratados), biogás e biometano.

transportes, 32% de todos os combustíveis e energias utilizadas, são renováveis. A motorização com etanol permite que as montadoras atendam aos mais rígidos limites de emissão, considerando o critério mais inclusivo e integral do “poço à roda”, e ainda mais quando se leva em conta o critério “berço ao túmulo”. Os veículos elétricos híbridos movidos a etanol, já disponíveis comercialmente no País, estão emitindo 29 g CO2e/km, e os veículos flex fuel, que respondem por 86% da frota total, ao utilizarem etanol emitem 46 g CO2e/km. Isso é possível utilizando a infraestrutura existente e a frota atual, de forma acessível para os consumidores, com implementação e resultados imediatos. Esta grande conquista deve ser reconhecida, pois se compara a 92 gramas obtidos pelos veículos elétricos a bateria na Europa, o que é melhor do que a média de 122 gramas/km para a indústria europeia usando gasolina. No Brasil, a solução com etanol é muito melhor do que esses mesmos veículos elétricos a bateria, que, mesmo usando nossa eletricidade altamente renovável (83%), ainda emitiriam 65 gramas por km.

um exemplo notável de !"#$%&'()"#!*&"%$$*+,*&#-./",01!#*&)*&2%"*34/& integração virtuosa de cadeias produtivas e de )#$,"#56()*&)%&%1%"2#*&)%&5#/-*$$*& %&"%$()6/$& complementaridade entre a agricultura alimentar e energética, em que esta última contribui e alavanca a produção de alimentos. Quando uma tonelada de milho safrinha produzida após a colheita da soja durante o mesmo ano (com aplicação mínima de fertilizantes

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No Brasil, 48,4% de toda a oferta interna de energia, e, no setor de

Todas as estratégias de descarbonização são necessárias. A questão é que a agricultura sustentável com

Plinio Nastari é economista agrícola, presidente da DATAGRO, foi o representante da Sociedade Civil no Conselho de Política Energética, entre 2016 e 2020.


práticas certificadas está garantindo uma solução muito adequada para o Brasil e também para vários países em situação semelhante. Tudo isso está sendo possível sem tocar em uma única árvore, em qualquer bioma protegido. Em energia para transporte, nossa política de biocombustíveis está no centro da estratégia brasileira de descarbonização. Isso foi alcançado com um mecanismo de precificação de carbono orientado pelo mercado; com uma certificação dos produtores por suas pontuações individuais de eficiência energético-ambiental que não apenas classificam, mas os recompensam por ganhos adicionais na implementação de inovações e o aproveitamento máximo do potencial energético proporcionado pela biomassa; com certificação que é realizada por empresas de supervisão reconhecidas internacionalmente, credenciadas e auditadas segundo critérios muito rígidos utilizando padrões de sustentabilidade internacionalmente estabelecidos; e com um critério de elegibilidade de desmatamento zero, ainda mais rigoroso do que o nosso já muito rigoroso Código Florestal, que garante o mais alto nível de conformidade de proteção florestal. Essa política, o RenovaBio, é o maior e mais abrangente programa de descarbonização de energia em transporte do mundo. Os biocombustíveis certificados pelo RenovaBio no Brasil em seu primeiro ano (2020) de regulamentação economizaram 14,5 milhões de toneladas, no segundo ano (2021) 24,5 milhões, e entre

2020 e 2031 terão economizado 718 milhões de toneladas de CO2e – o equivalente a toda a emissão de um país como a França. Estamos sem problemas? De jeito nenhum. O Brasil tem a enorme tarefa de monitorar uma área florestal maior que todo o território da Europa Ocidental. Os recursos são limitados, a fiscalização policial é cara e representa um desafio constante. Mas as lições aprendidas no estabelecimento de regulamentação sobre combustíveis sustentáveis podem nos dar uma dica para uma ferramenta de combate útil adicional, a certificação. O fogo em terras protegidas e em reservas federais e estaduais é completamente ilegal e classificado como crime. É praticado por criminosos e a fiscalização policial deve continuar de forma severa. Mas os controles orientados pelo mercado também podem ajudar a sufocá-los e possibilitar a separação entre a grande maioria que usa e aplica práticas sustentáveis dessas atividades criminosas, por meio de certificações iguais à aplicada no RenovaBio. As palavras essenciais devem ser certificação e escolha. Escolha dos critérios adequados de certificação. Critérios claros, baseados em Ciência, não incorporando medições enganosas, como o uso apenas de emissões de escapamento para decidir a melhor escolha no transporte, mas medidas mais inclusivas que considerem uma visão mais ampla do processo de economia de carbono. Critérios que não incluem objetivos econômicos e de distorção do comércio muitas vezes ocultos

e não admitidos. O grande desafio dos formuladores de políticas públicas reside no estabelecimento de mecanismos orientados pelo mercado que penalizem as distorções e más ações, e recompensem aqueles que praticam o bem. Com a escolha certa de critérios não distorcidos e certificação, podemos separar o certo do errado.

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O Brasil é uma vitrine viva e em evolução e tem a chance de liderar o esforço de descarbonização em todo o mundo, estabelecendo o mercado de carbono mais dinâmico do planeta. Sua experiência no desenvolvimento de uma agricultura tropical sustentável pode ser aplicada e transferida para muitos países. Sua experiência na integração de cadeias produtivas e a complementariedade virtuosa da agricultura alimentar e energética é um exemplo notável. Economias importantes como a Índia estão reconhecendo o valor dessa experiência ao decidir avançar rapidamente para misturas elevadas de etanol na gasolina, a introdução de carros flex e a distribuição de etanol puro produzido a partir de matérias-primas disponíveis, cana-de-açúcar e grãos, colocando essa política no centro de sua estratégia de descarbonização. A experiência brasileira com práticas agrícolas sustentáveis, uso de bioenergia e estabelecimento de regulamentação adequada, juntamente com a certificação aliada à escolha de critérios adequados, é um norteador de políticas que oferece oportunidades de cooperação em todo o mundo.

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