Plant | Edição 5

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Para quem pensa, decide e vive o agribusiness

ORGÂNICOS, O DEBATE Uma tendência que veio para mudar a agropecuária ou apenas um nicho lucrativo? TOP FARMERS AGROECOLOGIA, SUSTENTABILIDADE E PRESERVAÇÃO DO SOLO: OS MODELOS DE PEDRO PAULO DINIZ E FRANKE DIJKSTRA

CAFÉ NA CALIFÓRNIA? Os americanos querem repetir com o grão o que fizeram com o vinho

ESPECIAL AVIAÇÃO Com mais pistas e aeronaves privadas, setor decola com o combustível do agronegócio ARTE OS PRIMEIROS PASSOS PARA COLECIONAR E INVESTIR EM UM MERCADO EM EXPANSÃO

PECUÁRIA

venda proibida distribuição dirigida www.plantproject.com.br

Criadores buscam seu caminho na encruzilhada da crise da carne PLANT PROJECT Nº5

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RECOMENDA

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Uma parceria PLANT PROJECT + HSM

O maior negócio do Brasil chega à maior plataforma de educação executiva da América Latina

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E d ito ri a l

Convencional ou orgânico? Transgênico ou não? Diante de questões que

CULTIVANDO O DEBATE

envolvem, com frequência, muito mais que argumentos científicos, nós, da PLANT, não hesitamos em tomar posição. Somos a favor da liberdade de escolha, do direito de optar e de ter acesso ao máximo de informações sobre tudo o que envolva aquilo que consumimos. Também nos posicionamos em defesa

Para quem pensa, decide e vive o agribusiness

do direito de opção do modelo de produção. Independentemente do sistema ORGÂNICOS, O DEBATE Uma tendência que veio para mudar a agropecuária ou apenas um nicho lucrativo?

forma sustentável, com responsabilidade ambiental e social. Nesse caso, não

TOP FARMERS AGROECOLOGIA, SUSTENTABILIDADE E PRESERVAÇÃO DO SOLO: OS MODELOS DE PEDRO PAULO DINIZ E FRANKE DIJKSTRA

existe alternativa. O mercado punirá quem agir de forma errada.

CAFÉ NA CALIFÓRNIA? Os americanos querem repetir com o grão o que fizeram com o vinho

PLANT não foge do debate. Nesta edição, expomos os vários lados envolvidos

ESPECIAL AVIAÇÃO Com mais pistas e aeronaves privadas, setor decola com o combustível do agronegócio ARTE OS PRIMEIROS PASSOS PARA COLECIONAR E INVESTIR EM UM MERCADO EM EXPANSÃO

em uma das tendências que mais crescem no mercado de alimentos, bebidas

PECUÁRIA

venda proibida distribuição dirigida www.plantproject.com.br

Criadores buscam seu caminho na encruzilhada da crise da carne PLANT PROJECT Nº5

adotado, porém, é mandatório que se faça usando as melhores práticas, de

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e mesmo de vestuários. Deixamos de lado os discursos apaixonados para nos focarmos nas questões racionais em torno da produção orgânica. A mais relevante delas é: será possível e viável fazer com que ganhe escala e se torne mais que um lucrativo nicho? Por outro lado, questiona-se o marketing usado para colocá-la em evidência a partir da demonização dos alimentos convencionais, produzidos com o auxílio de defensivos e fertilizantes químicos. Tanto quanto os excessos na aplicação dessas substâncias, o mal uso de informações nem sempre corretas contra eles serve apenas para confundir os consumidores e prejudicar produtores que trabalham estritamente dentro dos padrões indicados. O mercado e a fome do mundo são suficientemente grandes para abraçar as duas correntes como complementares, não como opositoras. Opção, insistimos, deve ser o nome do jogo.

Luiz Fernando Sá Diretor Editorial

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I ndi ce

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D i r etor E ditoria l Luiz Fernando Sá luiz.sa@plantproject.com.br D i r etor Comerc ia l Phelipe Krisztan Pedroso Marketing e Publicidade Multiplataforma phelipe.pedroso@plantproject.com.br

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D i r etor Luiz Felipe Nastari A rt e Andrea Vianna Projeto Gráfico e Direção de Arte Col ab o ra dores: Texto: Ana Weiss, Clayton Melo, Denize Bacoccina, Fabrícia Peixoto, Irineu Guarnier Filho, Nicholas Vital, Núria Saldanha, Romualdo Venâncio, Tiago Dupin Fotografia: Adriano Machado, Claudio Gatti, Emiliano Capozoli, Fernando Brisolla, Louie Hayward, Tiago Alves Design: Bruno Tulini, Pedro Matallo Revisão: Rosi Melo Com un i cação Eliane Dalpizol Coordenadora de Comunicação eliane.dalpizol@datagro.com Ev e n to s Simone Cernauski A d m i n i st ração e Fina nç as Cláudia Nastari Sérgio Nunes

Fo pág. 73 Fr pág. 77 W pág. 85 Ar pág. 107 FO R UM

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PLANTAÇÃO DE AGAVE-AZUL NO MÉXICO: Planta que dá origem à tequila ganha brilho com interesse de estrelas de Hollywood

G GLOBAL

O lado cosmopolita do agro

foto: shutterstock

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G

G

GLOBAL

O lado cosmopolita do agro

MÉXICO

SHOT CERTEIRO

Um trago de tequila com um amigo virou um roteiro bilionário para o ator George Clooney Poderia ser roteiro de cinema. Dois grandes amigos milionários decidem construir mansões vizinhas, em uma badalada região do litoral mexicano. Como precisam acompanhar a obra, a dupla aproveita as noites na cidade para bebericar uma tequila, sua bebida preferida. Eles provam do destilado de diferentes marcas e origens, mas nenhuma chega à perfeição. "Vamos fabricar nossa própria tequila", decidem. Depois de fechar com uma destilaria, os amigos passam quase dois anos provando amostras, quase 700, até finalmente chegarem à versão ideal. A ideia é produzir apenas para uso próprio – o que inclui algumas festas nas duas mansões –, mas acabam sendo obrigados a criar uma empresa, por determinação das autoridades locais. Com o negócio formalizado, por que não vender? As encomendas surgem e, em três anos, as vendas atingem 120 mil garrafas por ano. Nesse ponto, entra em cena um 8

grande investidor, representando uma das maiores companhias de bebidas do mundo, e oferece aos dois amigos nada menos que US$ 1 bilhão pela marca. Se virasse filme, o enredo acima seria daqueles baseados em fatos reais. A dupla em questão é formada pelo ator George Clooney e pelo empresário Range Gerber (também conhecido como marido da ex-modelo Cindy Crawford). Amigos de longa data, eles estão por trás da Casamigos, marca de tequila que acaba de ser vendida para a gigante britânica Diageo, dona também de rótulos como Guiness e Johnie Walker, por cerca de US$ 1 bilhão. "Se você tivesse nos perguntado, há uns anos atrás, se tínhamos uma companhia de US$ 1 bilhão, eu provavelmente teria dito que não", disse Clooney, por meio de um comunicado. Clooney não é o único artista a fazer sucesso além da arte cinematográfica. O ator


Leonardo di Caprio e o cantor Justin Bieber, por exemplo, estão entre os investidores do serviço de streaming de música Spotify, enquanto Kevin Spacey e o rapper 50 Cent já apostaram na Casper, startup voltada para a venda de colchões pela internet que vem crescendo rapidamente nos Estados Unidos. Outro que parece ter pego gosto pelo mundo dos negócios é o ator Ashton Kutcher, que participa de mais de 50 empresas, a maioria de tecnologia ou startups, como Airbnb e ResearchGate. Já os irmãos Donnie e Mark Wahlberg estão por trás da rede de fast-food americana Wahlburger, atualmente com 15 restaurantes. O interesse da Diageo pela Casamigos tem a ver, claro, com o poder da imagem de Clooney, que continuará como garoto-propaganda da marca. Mas a gigante britânica não comprou apenas um rosto bonito. O segmento de tequila Premium vem passando por um momento extremamente positivo e que já dura alguns anos. Nos EUA, as vendas nessa categoria cresceram 290% entre 2002 e 2016, mas a demanda também é grande em mercados como China e Rússia. Os produtores mexicanos agradecem. Isso porque a tequila é uma bebida protegida pela denonimação de origem. Só pode levar esse nome se produzida a partir da agave cultivada no estado de Jalisco, no oeste mexicano, ou em alguns pontos específicos do país. Na tequila comum, porém, os produtores costumam adicionar dezenas de outros ingredientes, enquanto a versão Premium é feita 100% a partir da agave. Sem querer, os compañeros Clooney e Gerber apostaram certo em uma mina dourada.

Clooney e o sócio, Berger, em suas andanças pelo México, e as garrafas da Casamigos: a brincadeira virou um grande negócio

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G Q ATA R

O PETRÓLEO VIRA LEITE Graças a suas ricas jazidas de petróleo e gás natural, o Qatar é o país com maior renda per capita do mundo. Mas em termos de alimentos, a população vive em permanente situação de dependência externa. Por isso, o recente embargo diplomático e comercial imposto por seus vizinhos do Golfo Pérsico, liderados pela Arábia Saudita – que era responsável por quase um terço das exportações alimentos para o país –, teve impacto direto na mesa de seus cidadãos. Sofrendo com a falta de leite e derivados, o país decidiu agir comprando vacas. Nada menos que 4 mil cabeças devem chegar ao Qatar nos próximos meses, fornecidas por Austrália, Holanda e Estados Unidos. O primeiro lote, com 165 animais, desembarcou de um avião da Qatar Airlines em Doha em meados de julho. Estão previstos mais 60 voos nos próximos dois meses para completar a entrega da encomenda, feita pelo empresário Moutaz Al Khayyat, chairman do grupo Power International Holding, dono da companhia de

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HAJA ENERGIA

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laticínios Baladna. Elas serão levadas para uma novíssima planta de beneficiamento montada nos arredores da capital. Segundo Al Khayyat, será a maior operação logística do gênero em todos os tempos e servirá para garantir 35% das necessidades do país. O plano, em médio prazo, é ser autossuficiente. Por isso, a Baladna já estuda investir petrodólares na importação de outros 10 mil animais.

De um lado, a Tesla, fabricante de baterias e carros elétricos. De outro, a Cargill, gigante do setor agrícola. As duas empresas decidiram se juntar para um projeto inovador: a construção de uma “bateria” gigante, com uma potência de 1 megawatt, que ajudará a fábrica da Cargill, na Califórnia, durante os horários de pico de energia. Para se ter uma ideia do tamanho da ousadia, as baterias da Tesla disponíveis para o segmento industrial têm 100 megawatt, ou seja, dez vezes menos. Abastecidas com energia solar e eólica, a megabateria é capaz de fornecer até 25% da energia consumida na planta e deverá resultar em uma economia de US$ 100 mil à fabricante de alimentos.


E S TA D O S U N I D O S

NASCIDAS PARA BRILHAR Como se não bastasse a beleza de algumas flores a olho nu, o fotógrafo americano Craig Burrows foi lá e provou que essas pequenas criações da natureza podem ser ainda mais espetaculares. Sua técnica consiste na aplicação de luz ultravioleta de alta intensidade, o que faz as flores emitirem ondas de luz mais longas, resultando nesse visual fluorescente. Encantado com o efeito, Craig passou a caminhar pelo bairro onde mora, na cidade de Los Angeles, em busca de novas flores para sua coleção fotográfica, que já inclui narcisos, copos-de-leite, margaridas, entre outras.

AUSTRÁLIA

Ajuda que não tem preço Nesse mercado localizado na cidade de Sydney, na Austrália, todo o estoque – incluindo verduras, enlatados, pães, materiais de limpeza – é fruto de doação. Tipo aquela latinha ligeiramente amassada que não interessa mais a uma grande rede de supermercados ou, ainda, uma banana que está muito madura para ser servida em um hotel. No caso dos pães, esses vêm de um projeto social para refugiados, que estão aprendendo uma nova profissão. Sem contar as doações, que podem ser feitas por qualquer pessoa. O resultado é um mercado inteiro onde nenhum produto tem preço: os clientes pagam o quanto quiserem pelas compras (inclusive nada, se preferirem). Com o dinheiro, os organizadores do OzHarvest oferecem refeições gratuitas a quem precisa. PLANT PROJECT Nº5

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I N G L AT E R R A

A MODA VEGANA DE STELLA MCCARTNEY Os olhos e as câmeras, claro, não tinham outro foco senão a beleza e o generoso decote de Gisele Bündchen. Mas o vestido que a modelo brasileira usou no badalado baile do Metropolitan Museum of Art, em abril deste ano, também tinha uma história para contar. Feito a partir de fios de seda orgânica importados de uma pequena aldeia na Tailândia, livre de pesticidas e aditivos químicos, o material foi o responsável pelo caimento perfeito no corpo de Gisele. A estilista por trás da peça não poderia ser outra senão a britânica Stella McCartney. Aos 45 anos, ela tem sido a grande representante (talvez a única) do luxo verdadeiramente sustentável. Matérias-primas de origem animal, como couro e peles, estão banidos de seu portfólio. A marca só usa viscose proveniente de florestas certificadas na Suécia, além de estar constantemente desenvolvendo peças a partir do reaproveitamento de materiais usados. Isso sem perder o glamour. Não à toa, Stella McCartney passou a ser a estilista preferida das famosas mais engajadas, como Gisele e a atrizes Emma Watson e Gwyneth Paltrow. No ano passado, a empresa – que faz parte do grupo Kering, dona também de marcas como Gucci e Alexander McQueen – divulgou um relatório em que monetiza suas ações de sustentabilidade. Os dados da auditoria, que duraram três anos, mostraram uma redução de 35% no impacto ambiental de suas atividades nesse período. Atualmente, a cada quilo de material usado, esse impacto é de 9,76 euros. “O consumidor está cada vez mais consciente com relação ao que ele come, a como ele viaja. Em breve ele estará também mais consciente em relação aos ingredientes do que ele veste”, disse recentemente a estilista, durante um evento sobre sustentabilidade. Conheça alguns dos projetos da marca: 12

BELEZA ORGÂNICA

Além da textura mais suave e de qualidade superior, a seda orgânica (como essa, usada no vestido de Gisele), é 100% hipoalergênica


G

SEM ROLO

LUXO NA PELE

O poliéster usado nas mochilas, por exemplo, é obtido a partir do tratamento de linhas e fios reciclados.

Durante um bom tempo, Stella relutou em aceitar até mesmo peles sintéticas. Em 2015, porém, a estilista resolveu adotar o material, mas com etiquetas bem visíveis dizendo que é falso.

PASSO FIRME

A marca foi uma das primeiras a substituir o solado de borracha de seus sapatos por um tipo de plástico 100% biodegradável e altamente resistente, o APINAT.

BICHOS, NÃO

A marca só trabalha com couro artificial, o que torna a operação nas máquinas mais difícil. A saída é trocar a máquina pelas mãos. Com isso, 70% do couro é costurado por artesãos, incluindo sapatos e roupas.

VISÃO DE FUTURO

A estilista desenvolveu, em parceria com a Luxottica, uma coleção de óculos de sol que usa um tipo de plástico feito a partir de óleo de mamona, planta que exige menos água e menos pesticidas.

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G E S TA D O S U N I D O S

CAFÉ FORTE Um bom café expresso pede um espaço confortável, xícaras de porcelana e ambiente agradável. Mas nem sempre isso é possível. Que o digam os profissionais que trabalham em locais de difícil acesso ou, ainda, que fogem do estereótipo da tranquilidade, como na construção civil. Pensando nessas condições, o designer americano Jim Doan pesquisou materiais, passou por 30 protótipos e testes, até chegar ao Coffeeboxx, uma máquina de expresso bem mais resistente que a média. Depois de arrecadar mais de US$ 350 mil por meio de um site de crowdfunding, Doan conseguiu enfim colocar a cafeteira no mercado. A Coffeeboxx custa US$ 200 e está à venda em diversos varejistas americanos, como Amazon e Home Depot.

UCRÂNIA

TEM HACKER NO CAMPO De tão informatizados, tratores de ponta chegam a parecer um computador. Sim, eles aumentam a produtividade, mas a alta tecnologia no campo também tem seus revezes. Uma reportagem publicada pela revista Vice revelou que produtores americanos estão buscando o serviço de hackers para ajudar na manutenção de tratores. Como os principais fabricantes proíbem a oferta de serviços não autorizados – e o autorizado fica a quilômetros de distância –, alguns produtores estão recorrendo a versões piratas de softwares, comprados de hackers poloneses e ucranianos que costumam circular em fóruns de internet. A questão é tão problemática que fazendeiros de diversos estados americanos criaram uma organização, a Repair.org, em defesa do direito à manutenção de tratores. 14


I N G L AT E R R A

Nuvem de Pringles Uma gaveta de escritório capaz de se reabastecer de snacks automaticamente; papel com sabor; delivery de snacks com uso de drones. Essas foram algumas das sugestões apresentadas por consumidores de snacks na Inglaterra, segundo uma pesquisa realizada pela marca Pringles. Poucos imaginavam, porém, que a fabricante de batatas fritas daria vida a alguma dessas ideias

futuristas. Em um ousado plano de marketing, a empresa expôs, no centro de Londres, máquina capaz de soltar no ar o aroma típico de uma batata Pringles. A ideia já vinha sendo prevista no segmento alimentício, mas a expectativa era de que fosse

de fato desenvolvida por volta de 2037. A Pringles, no entanto, decidiu acelerar esse processo e, depois de um ano de pesquisa, apresentou sua máquina de aroma. O escolhido foi o de cebola, o preferido entre os ingleses.

PERU

ESTRANHO NO NINHO Esqueça o serviço de shuttle. Para chegar aos dormitórios do Skylodge Adventure Suites, é preciso encarar uma escalada de 400 metros em um dos paredões do Vale Sagrado, em Cuzco, Peru. O percurso é organizado pela Natura Vive, agência especializada em turismo de aventura, que também administra o “hotel”. Este, na verdade, consiste em três cápsulas de feitas de um tipo de policarbonato ultrarresistentes, com 7,2 m de altura e 2,4 m de comprimento cada, equipadas com seis camas e banheiro privativo. Como se pode imaginar, o grande atrativo está na vista privilegiada e na sensação, segundo o hotel, de estar dormindo “em um ninho de pássaros”. O retorno à terra firme é mais suave, feito com um cabo ao estilo tirolesa. A noite na cápsula, com direito a almoço e guia na escalada, sai por R$ 850 por pessoa. PLANT PROJECT Nº5

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ÍNDIA

Ideia saborosa Para o cientista indiano Narayana Peesapaty, não basta raspar o prato: é preciso ir além e comer os talheres. A ideia não tem a ver com o combate à fome (até que poderia), mas sim com as toneladas de talheres de plástico jogadas ao lixo diariamente, sem tratamento. Já os talheres da Bakeys, startup fundada por Peesapaty, são comestíveis, e ainda livres de qualquer tipo de química ou aditivo. Os utensílios são feitos a partir de uma mistura de farinha de arroz, trigo e painço, além de alguns temperos, como cominho e pimenta, se o cliente preferir. A empresa aceita encomendas de outros países e os talheres custam em torno de U$ 5 (pacote com 100 unidades). O objetivo, porém, é reduzir o preço e tornar os talheres comestíveis mais baratos que os de plástico.

E S TA D O S U N I D O S

ESSA NÃO ESFRIA Atire o primeiro tomate quem nunca pensou em colocar a pizza entregue na porta de casa de volta ao forno, para aquela aquecidinha. Pois o americano Alex Garden, fundador da Zume Pizza, partiu desse pequeno inconveniente para estabelecer o diferencial do seu delivery. Com a ajuda de um time de engenheiros e designers, ele desenvolveu um furgão equipado com 50 fornos que vão assando a massa ao longo do caminho. Garden, que é ex-executivo da Microsoft e deixou a gigante para investir em um negócio próprio, já vinha chamando atenção com sua linha de montagem robotizada: quem coloca o molho sobre a massa e a leva ao forno não é um pizzaiolo, mas sim um braço mecânico. 16


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Produção orgânica na Fazenda Malunga, em Brasília: No Brasil, apenas pouco mais de 15 mil produtores adotam esse modelo de cultivo

Ag AGRIBUSINESS

Empresas e líderes que fazem diferença

foto: Adriano Machado PLANT PROJECT Nº5

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Ag AGRIBUSINESS

Empresas e líderes que fazem diferença

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O CAMINHO DA BOIADA Abalados por sucessivas crises, a pecuaristas vive um período de incertezas e tensão, busca alternativas e atua para construir soluções para reorganizar o mercado e a indústria da carne no Brasil Por Nicholas Vital

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as rodas de conversa, nos grupos de WhatsApp, nos eventos do setor, em qualquer momento em que se encontrem dois ou mais pecuaristas, primeiro se ouve um lamento. Talvez surja um palavrão, em seguida substituído por especulações e interrogações. Ganha uma carreta carregada de boi gordo quem conseguir bancar como será, nos próximos meses, o desenho da indústria brasileira da carne – que há não muito tempo era um orgulho nacional, depois transformada em um lamentável criatório de escândalos. Um processo de reorganização de forças, com o surgimento de novos atores e a revitalização de grupos que vinham enfraquecendo nos últimos anos, começa a despontar nos principais centros produtores. Dificilmente, porém, em escala e tempo suficiente para compensar os danos provocados pela sucessão de incidentes que, em várias regiões, paralisaram parcialmente as negociações entre criadores e frigoríficos, estremecendo ainda mais relações que normalmente já são

vistas como delicadas. Primeiro, o abalo sofrido por duas megaoperações da Polícia Federal — Carne Fraca, que revelou dezenas de casos de corrupção de fiscais agropecuários que atuavam em frigoríficos, e Carne Fria, que denunciou a comercialização de gado proveniente de áreas de irregulares no Pará. Em seguida, a delação premiada de Joesley Batista, controlador da JBS, até então a maior companhia privada do país, estremeceu de vez o mercado de carnes no Brasil. Apesar de não terem qualquer envolvimento com as denúncias, os pecuaristas têm sido os maiores prejudicados com a crise enfrentada pela empresa, que ganhou musculatura graças aos aportes bilionários do BNDES, sobrepôsse à concorrência, tornando-se responsável por mais da metade dos abates em regiões tradicionais como o Mato Grosso, Estado que abriga aproximadamente 30 milhões de cabeças de gado e é líder nacional em abates. A situação do setor, que já era PLANT PROJECT Nº5

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Ag Economia

foto: Shutterstock

preocupante após a forte queda no consumo interno e a suspensão das exportações provocada pela Operação Carne Fraca, ficou ainda mais delicada com a crise da JBS, que passou a comprar toda a sua matériaprima exclusivamente a prazo e desagradou a imensa maioria dos seus fornecedores. Poucos dias depois da divulgação dos vídeos das delações dos executivos da JBS, um seminário promovido pelo banco Santander em Cuiabá refletia o clima de incerteza vivido no setor. Convidado – e presença tida como confirmada até a véspera – o presidente da República, Michel Temer, não compareceu. O ministro da Agricultura, Blairo Maggi, fez a defesa pública do setor e, nos bastidores, tentava acalmar os ânimos. Outro nome relevante que participava do evento, o presidente do grupo Marfrig, 22

Marcos Molina, era assediado a todo instante e sumia a todo instante para participar de uma série de encontros privados com representantes das principais entidades de pecuaristas. Nos dias seguintes, a falta de perspectivas mais imediatas colocou os produtores diante de uma encruzilhada. Receosos, muitos deles deixaram de vender para a JBS e firmaram parcerias com frigoríficos menores. Outros, no entanto, não tiveram a mesma sorte. Sem alternativas devido à forte concentração do mercado, se viram diante de um dilema: ou aceitavam a venda a prazo ou retinham o gado nas fazendas. “Hoje existe uma insatisfação pela pouca opção para abater os animais”, afirma Luciano Vacari, diretor executivo da Associação dos Criadores de Mato Grosso (Acrimat), lembrando que atualmente apenas cinco grupos frigoríficos — JBS, Marfrig, Minerva, Frialto e Redentor — detém 82% do abate no Mato Grosso. Em 2008, 10 frigoríficos respondiam por 75% do abate. O próximo passo foi tentar tomar as rédeas da situação. Lideranças de todo o estado têm se reunido para discutir a criação de uma cooperativa para viabilizar o desmonte dos animais e a venda da carne diretamente ao consumidor. Um grupo de criadores esteve recentemente em Rondônia, onde já existe um projeto do gênero, que deve servir de modelo para os pecuaristas mato-grossenses. “A


fotos: Divulgação

Vacari, da Acrimat (à esq.), e Molina, do Marfrig: atores se movem para ocupar espaço aberto pela crise na JBS

ideia é que a cooperativa seja mais um player no mercado, mais uma alternativa ao produtor”, diz Vacari. “A Acrimat sempre viu isso com bons olhos. Mas é uma coisa que precisa partir dos criadores. A associação em momento nenhum vai fazer parte dessa cooperativa, até porque o nosso estatuto não permite. Mas nós temos a obrigação de ajudar o nosso associado no que for melhor para ele.” Os primeiros passos para a criação da cooperativa no Mato Grosso já foram dados. Os pecuaristas conversaram com poteciais parceiros e já até encomendaram a estruturação de um plano de negócios para instituições como Fundação Dom Cabral, Fundação Getúlio Vargas e Rabobank. As propostas devem chegar até o final de julho, quando os pecuaristas devem voltar a se reunir para decidir se seguem em frente ou não. “É preciso tratar esse assunto de forma profissional. O plano de negócio é que vai dizer se a melhor forma de colocar o projeto de pé é através do arrendamento de plantas desativadas, do aluguel, da compra ou da construção de uma nova unidade”, afirma Luciano Vacari. “É preciso ter critérios técnicos. Não é porque a cooperativa é do produtor que ele

vai vender a carne e nem receber mais por isso. O pecuarista é um cooperado, um sócio da empresa. Será um modelo de governança totalmente profissional.” Existe, porém, quem veja o negócio com certa restrição. De acordo com um executivo do setor a par do negócio, que aceitou falar sob condição de anonimato, vender carne é um negócio completamente diferente da criação de gado. Segundo ele, trata-se de uma operação complexa, que exige grandes investimentos, muito capital de giro, mas com margens de lucro menores do que na pecuária. “Apenas com a compra de gado, o gasto pode chegar a R$ 2 milhões por dia. Isso sem contar outros custos, como aluguel, funcionários, logística, impostos. Nesse mercado, qualquer deslize pode ser fatal. Não sei se isso está tão claro para eles”, diz. De acordo com o diretor da Acrimat, os detalhes financeiros serão discutidos somente após a aprovação do plano de negócio pelos cooperados. Vacari, no entanto, se mostra otimista. “O plano é que vai dizer quanto dinheiro precisa e como isso vai ser dividido entre os pecuaristas, mas acho que não será um problema, pois quando o frigorífico compra o boi com prazo de pagamento de

30 dias, ele está usando o dinheiro do próprio produtor como giro. Se o plano mostrar que é um negócio interessante, nós podemos ter mais de uma planta.” Enquanto a ideia da cooperativa não sai do papel, quem está aproveitando o momento de turbulência da JBS — e a ira dos pecuaristas — para sair do sufoco são os demais frigoríficos da região, que vinham operando com uma ociosidade média de 35% ao menos desde abril. Segundo consultores da região ouvidos pela reportagem, a redução dos abates da JBS, que chegou a 40% no início de julho, tem sido absorvida por outras empresas, como Marfrig e Frialto, dois dos maiores beneficiados com a crise do concorrente. O Marfrig anunciou recentemente a reabertura de duas plantas há tempos desativadas, em Nova Xavantina (MT) e Pirenópolis (GO), além do aumento da capacidade em outras quatro unidades nos estados de Mato Grosso, Goiás, Pará e Rondônia. Já o Frialto, que possui atualmente duas plantas em operação na região de Sinop, vinha trabalhando com 40% de ociosidade nos últimos meses. Depois da delação bombástica de Joesley Batista, este número caiu para pouco mais de 5%. “Hoje PLANT PROJECT Nº5

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Ag Economia

foto: Shutterstock

a ociosidade recaiu toda sobre apenas uma empresa, que é a JBS, e as outras empresas puderam aumentar a ocupação”, afirma Paulo Belincanta, controlador do Frialto, que passou a estudar, “com cautela”, a possibilidade de retomar as operações em outra planta da empresa na região, fechada desde 2015. “Ninguém deixa uma indústria de R$ 70 milhões parada porque quer. Eu tenho três plantas no estado e não tinha mercadoria nem para as duas que estavam rodando, seria uma incoerência, uma insanidade, colocar a outra para rodar. Neste momento, estamos com 90% a 95% da capacidade, ou seja, estão cheias, então você começa a pensar na possibilidade.” A decisão da reabertura ou não da terceira fábrica, no entanto, só será tomada no final de julho, quando o mercado já estiver mais calmo e o cenário para o futuro mais definido. “É um passo que 24

precisa ser muito bem estudado. Você não mexe em uma estrutura industrial de uma hora para outra. O custo para operar uma empresa de 750 funcionários é muito alto. Não dá para tomar uma decisão dessa magnitude no calor do momento. É preciso muita cautela”, explica Belincanta, que estima um investimento próximo de R$ 50 milhões para retomar as operações na planta com capacidade para abater até 18 mil animais por mês. O empresário também diz apoiar a criação da cooperativa do Mato Grosso. Segundo ele, a entrada de pecuaristas no ramo frigorífico ajudará a melhorar a relação, há décadas conturbada, entre criadores e indústrias. “Sempre achei isso uma coisa interessante. Seria didático se isso acontecesse. Existe uma briga antiga entre frigoríficos e fornecedores, que é uma briga burra, por falta de conhecimento,

de convivência. Ao estar à frente de um frigorífico eles poderiam com o tempo desmistificar muita coisa. Acho muito salutar e torço por isso. Acho que seria muito benéfico para a convivência entre pecuaristas e indústrias”, garante. Procurados pela reportagem, pelo menos três pecuaristas da região preferiram não dar detalhes sobre as tratativas para a criação da cooperativa em Mato Grosso. Todos alegaram receio de algum tipo de articulação por parte dos frigoríficos para impedir o negócio. Enquanto o plano não entra em ação, os pecuaristas vêm buscando outras formas para vender o seu gado. No final de junho, o governo de Mato Grosso reduziu o ICMS de 7% para 4% para a venda de gado em pé para fora do estado por 90 dias. O futuro da JBS segue indefinido. Certo mesmo é que o mercado brasileiro de carnes nunca mais será o mesmo.


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Ag Reportagem de Capa

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ODDOISLEMA S O C I N ORGA

O mercado cresce em ritmo forte e desperta a atenção nas cidades e nas lavouras. Mas a falta de escala e de cadeias produtivas estruturadas comandadas por grandes empresas mostram que ainda levará tempo para que eles deixem de ser apenas um lucrativo nicho Por Denize Bacoccina

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Ag Reportagem de Capa

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N A G R O IC bilionário americano Jeff Bezos é um empresário ousado, que consegue enxergar tendências e criar novos mercados. A Amazon, fundada por ele nos anos 1990, tornou-se a maior livraria do mundo, transformando o mercado a ponto de provocar o fechamento em massa das lojas físicas. Depois expandiu-se para outras áreas do comércio eletrônico, abalando cada mercado em que põe os pés. Há alguns anos, ele comprou e reergueu o lendário jornal The Washington Post e, mais recentemente, lançou um serviço de vídeos sob demanda para concorrer com Netflix e Apple. A última ousadia de Bezos foi a entrada no varejo de alimentos. Como sempre, usou uma porta surpreendente. Por nada menos que US$ 13,7 bilhões, comprou a cadeia de supermercados Whole Foods, com 460 lojas nos Estados Unidos e forte posicionamento em orgânicos e na chamada comida saudável e de qualidade. Habituado a antecipar tendências, ele moveuse em direção a um mercado que cresce em todo o mundo. Bezos aponta agora seus bilhões para um consumidor mais preocupado com seu corpo e que busca o máximo de informações sobre os alimentos

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Joe Valle, da Fazenda Malunga, no DF: “Existe uma ecologização do sistema de produção agrícola no Brasil”

que consome. O bilionário também indica que, nos próximos anos, muita coisa deve mudar no mundo dos orgânicos -- que, a despeito de todo o barulho gerado por seus defensores, está longe de ganhar escala suficiente para tirá-lo da condição de nicho. É bom prestar atenção nos movimentos de Bezos. Cada passo seu a partir de agora preocupará gigantes do varejo como Walmart. Pode, da mesma forma, provocar efeitos nas lavouras em todo o mundo, gerando demanda e abrindo oportunidades para quem busca formas de produzir orgânicos em larga escala. Esteja certo: o debate em torno da produtividade e dos benefícios reais desses produtos em relação aos convencionais deve esquentar. Um dos poucos consensos hoje em torno do tema é o de que haverá mais oferta de produtos orgânicos e, portanto, mais opções nas gôndolas dos supermercados. No Brasil, essa certeza promove ações em empresas mais antenadas, que agem para ganhar espaço na sacola de consumidores em busca de produtos alternativos. Fabricantes de refrigerantes lançam linhas de bebidas com menos açúcar e até de sucos naturais, cadeias de fast-food

incluem saladas nos cardápios e companhias aéreas distribuem bolachinhas integrais em seus voos. Esse novo consumidor cozinha mais em casa e, quando vai a restaurantes, opta por cardápios mais saudáveis. No supermercado, lê os rótulos em busca de dados nutricionais. Não à toa, produtos ligados a saúde e bem-estar são uma das tendências do varejo para 2017, segundo pesquisa da consultoria Bain & Company. Grupos como Unilever, Nestlé (leia quadro ao longo dessa reportagem) e Kraft, líderes globais na produção de alimentos, devem ampliar seus investimentos nessa área e buscar fornecedores nas fazendas do mundo todo. O prato está cheio para o setor de orgânicos que, atendendo a essa demanda, cresce em média 25% ao ano desde 2009 – enquanto o faturamento total dos supermercados aumentou 7,1% no ano passado, 0,8% em termos reais. Apesar disso, o segmento ainda representa apenas 1% do mercado brasileiro de alimentos, com um giro estimado em R$ 3 bilhões no ano passado – incluindo a produção agrícola, o varejo e as vendas em feiras locais. Em todo o mundo, os orgânicos movimentam


cerca de US$ 85 bilhões. Nos Estados Unidos já respondem por 3% do mercado de perecíveis. Dados do Instituto de Pesquisa de Agricultura Orgânica (FiBL) mostram que em 2015 havia 2,4 milhões de produtores de orgânicos em todo o mundo, 7,2% mais do que no ano anterior. A área destinada a essas lavouras somava 50,9 milhões de hectares, uma alta de 14,7% sobre 2014. Na União Europeia, a agricultura orgânica ocupa 11,2 milhões de hectares, o equivalente a 6,2% de toda a área agricultável da região. No Brasil, o número de produtores mais que dobrou entre 2013 e 2016, de 6,7 mil para 15,7 mil, principalmente por causa da adesão de agricultores familiares a programas de incentivo adotados nos últimos anos, como compras locais para merenda escolar e financiamentos. Apesar do crescimento, a parcela de terras dedicadas à agricultura orgânica ocupa 750 mil hectares, apenas 0,3% do total. Uma fatia muito pequena, mas que pode expandir, a julgar

pela crescente demanda do consumidor. Uma pesquisa feita pela GfK para a Associação Paulista de Supermercados (Apas) mostra que 48% dos brasileiros consideram importante o uso de ingredientes orgânicos. Outro estudo, realizado pela Organis, entidade que reúne produtores e indústrias do setor, indica que apenas 15% dos compradores ouvidos haviam comprado orgânicos nos 30 dias anteriores à pesquisa, embora 84% tenham declarado que gostariam de consumir esses produtos. Ou seja, ainda existe uma distância grande entre o que o consumidor considera importante e o que ele faz quando vai às compras. O que falta para que o mercado brasileiro deixe de ser um nicho e torne-se um segmento importante da produção agrícola e da indústria alimentícia – e também de higiene, cosméticos e limpeza? É possível ganhar escala para que os preços deixem de ser um obstáculo? Entre os que já consomem, os fatores limitadores

foto: Adriano Machado

NOS C

para a ampliação das compras são o preço (62%) e falta de locais de venda próximos (32%). Entre os que não consomem, 41% citam o preço como impeditivo para mudar seus hábitos. Como ampliar a oferta para supermercados de todo o País? Para alguns, o mercado está destinado a se manter como um lucrativo nicho. Mas a experiência em outros países mostra que ainda há muito espaço para crescer. DOIS ESTÁGIOS O mercado de orgânicos no Brasil se divide basicamente em dois, com estágios de maturação bem diferentes. O de hortifrútis está avançado e as hortaliças, principalmente, são facilmente encontradas e com preços bem próximos aos dos produtos convencionais. Já o volume de grãos ainda é muito pequeno, o que acaba impactando também o mercado de carnes, porque os criadores têm dificuldade em encontram milho e soja orgânicos como insumos. As grandes PLANT PROJECT Nº5

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foto: Cláudio Gatti

foto: Cláudio Gatti

Ag Reportagem de Capa

empresas do setor ainda não foram atraídas para a novidade. E esse é justamente o gargalo para um crescimento mais acentuado. Companhias como Monsanto, por exemplo, ainda não se interessaram – pelo menos não com suas marcas principais e seu poderio de distribuição. Outras, como Cargill, já trabalham com orgânicos fora do Brasil, mas ainda não trouxeram seus insumos para o País. Uma das poucas a fazer isso foi a holandesa Bejo. No Brasil há 15 anos, será a primeira fabricante de sementes a vender suas variedades orgânicas por aquil – outros fornecedores, como a Korin Agropecuária, atuam em menor escala. A empresa certificou variedades produzidas na França e Holanda e está importando o primeiro lote de sementes de hortaliças, que serão vendidas em uma loja on-line, por um preço 20% a 50% maior do que o convencional. “Percebemos que o orgânico vem crescendo muito e, quando a lei obrigou a usar sementes orgânicas, vimos que havia aí uma oportunidade”, diz o gerente comercial da Bejo no Brasil, Ricardo Góes. Na prática, a lei já foi flexibilizada e os certificadores aceitam alimentos originários de sementes convencionais, desde que não tenham recebido aplicação de agrotóxicos. Na avaliação dos cientistas que atuam na área, falta pesquisa para mostrar as vantagens de cada tipo de cultivo e para desenvolver tecnologias e maquinários que

elevem a produtividade e a competitividade dos orgânicos. E isso acontece justamente porque as grandes empresas não investem no segmento. “O convencional e o transgênico se desenvolveram através das grandes multinacionais, porque em todo o mundo são elas que financiam a pesquisa”, diz Luiz Carlos Demattê Filho, coordenadorgeral do Centro de Pesquisas da Fundação Mokiti Okada, que homenageia um dos precursores da agricultura natural, no Japão, ainda no século 19. Demattê, que também é presidente da Câmara Temática de Orgânicos do Ministério da Agricultura, diz que no caso dos grãos, além da falta de sementes e de pesquisas, há uma dificuldade adicional: a ausência de uma cadeia completa, que já existe e funciona muito bem no convencional e no transgênico, com fabricantes e traders que financiam a produção e garantem a compra da safra. As grandes empresas vendem sementes e insumos com financiamento, garantem a compra a pagam antecipado pela safra, formando uma cadeia da qual o produtor acaba se tornando dependente e não vê motivos para deixar. Afinal, o grão orgânico vale um pouco mais, mas não o suficiente para abrir mão da segurança de um sistema que oferece também assistência técnica. “Convencer o produtor a fazer o processo de transição é difícil. Ele já vem numa pedalada financeira de safra e não consegue esperar um ano

INICIA

Demattê, da Câmara de Orgânicos do Mapa, e Liu, da Organis: falta de cadeias organizadas dificulta convencimento de produtores. A Native, na cana, é uma das exceções

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foto: divulgação

ATIVA para fazer os ajustes no campo e mudar”, diz Ming Liu, presidente da Organis, entidade que representa 48 associados de todos os elos da cadeia. A falta de grãos, por sua vez, impacta a produção de carne orgânica. Os criadores têm dificuldade em encontrar grãos na quantidade desejada. “A cadeia de animais orgânicos depende da existência da cadeia de vegetais orgânicos”, afirma. INICIATIVAS ISOLADAS Na falta de uma cadeia liderada pelas gigantes do setor, as pequenas e médias montaram sua própria rede. A Korin Agropecuária, maior produtora brasileira de orgânicos de origem animal, busca fazer sua parte. A empresa produz frangos, carne bovina, ovos, arroz, café, mel, e tem uma cadeia de criadores integrados para os quais fornece ração orgânica a partir de insumos comprados de parceiros que, por sua vez, receberam as sementes desenvolvidas em seu centro de pesquisa. Das 2 mil toneladas de milho que usa por mês, a Korin compra até 5% do tipo orgânico, que usa para alimentar o frango orgânico. Teria demanda para ampliar a produção para 30% do total, se tivesse mais grãos. “Não conseguimos aumentar por falta de ração”, diz o diretor da

empresa, Reginaldo Morikawa. Para estimular o mercado, a Korin também vende sementes não transgênicas e insumos como o Fert Premium Bokashi, um fertilizante natural que aumenta a produtividade em 25% a 30% e reduz a necessidade de insumos em 50%. Ainda assim, a colheita é menor do que com o milho transgênico, o que acaba desanimando muitos agricultores, pois a diferença de preço é de apenas 5%. “O produtor tem que estar no espírito de mudança, não só pelo aumento do preço”, diz Morikawa. Algumas experiências bemsucedidas, no entanto, mostram que é possível ganhar escala e se tornar referência, pelo menos em alguns setores. A Native, maior fabricante de açúcar e álcool orgânicos do mundo, produz 113 mil toneladas de açúcar por ano e responde por 28% da produção mundial. De Sertãozinho, no interior de São Paulo, exporta para 67 países. A empresa, subsidiária do Grupo Balbo, foi criada em 2000, mas o embrião começou em 1987, quando Leontino Balbo Jr., hoje diretor agrícola da companhia, decidiu mudar a técnica então utilizada de queimar a cana antes da colheita e cortar a cana verde, deixando a palha residual no solo como adubo, além de

não usar insumos químicos na fertilização do solo. O resultado é que, hoje, além do ganho de 27% na produtividade, a Usina São Francisco tornou-se uma ilha de biodiversidade, com 348 espécies de vertebrados, servindo de morada para espécies que vão de gato-domato a onça-parda. Para completar a linha, que tem mais de 40 itens e está presente em 20 mil pontos de venda, a empresa faz parcerias com outros produtores e entrega sucos, achocolatados, cereais matinais, azeites e bebidas de soja, que são acompanhados desde a produção e levam a marca Native. Assim, cria sua própria cadeia de fornecedores e estimula o mercado. “Temos um novo perfil de consumidor no mercado, e ele quer produtos que sejam sustentáveis do ponto de vista ético, ambiental e econômico”, diz o gerente comercial, Helio Silva. A Native foi uma das inspirações do empresário Pedro Paulo Diniz para criar a Fazenda da Toca, que também busca o desenvolvimento de um modelo agroecológico em escala para a produção (leia reportagem da série Top Farmers na pág. 58), mas tem consciência de que isso pode ainda levar algum tempo para ser obtido. “Não é de hoje para amanhã. É preciso trabalhar numa transição”, afirma Diniz. Há empresas fazendo PLANT PROJECT Nº5

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foto: divulgação

R O OP I N

essa transição em praticamente todas as culturas. No café, por exemplo, que já desenvolveu um modelo de marcas com valor agregado, há várias experiências nas principais regiões produtoras, como a Alta Mogiana, em São Paulo. A família Minamihara, tradicionais cafeicultores de Franca, hoje são referência na produção de grãos especiais orgânicos, colhidos de plantas cultivadas sob a sombra de abacateiros. Projeto semelhante é utilizado hoje para viabilizar a cafeicultura no estado americano da Califórnia (leia na pág. 78). No algodão também há agricultores investindo no nicho, mas a produção orgânica no Brasil é de apenas 22 toneladas de plumas, quase nada diante da produção nacional total, de 1,2 milhão de toneladas. Assim, maior visibilidade acaba ficando mesmo em segmentos específicos da indústria de alimentos, com empresas como a Jasmine, outra 32

que cresceu a partir da formação de uma rede de fornecedores. Criada em 1990 pelo casal Christophe e Rosa Allain como uma opção para oferecer produtos saudáveis, desde 2014 integra o grupo francês Nutrition&Santé, líder em alimentação saudável no mercado europeu e subsidiária da japonesa Otsuka Pharmaceutical. Com uma linha de 150 itens, os orgânicos respondem por 10% do portfólio, que tem ainda integrais, sem glúten e zero açúcar. “Incentivamos a cadeia de produção por meio de certificações e associações”, diz o CEO da Jasmine, Jean-Baptiste Cordon. “E mantemos contratos de longo prazo com os fornecedores para garantir a saúde dos negócios.” Em junho, durante a feira de orgânicos Biofach, em São Paulo, a empresa anunciou um programa de aceleração de projetos nas áreas de food tech, educação alimentar e soluções de design para alimentação saudável.

OPORTUNIDADES É no varejo, no entanto, que as mudanças estão mais aceleradas. De olho no mercado em expansão, três novas casas foram abertas na capital paulista nos últimos meses. Em Brasília, onde o mercado de orgânicos está mais consolidado, já existem 42 feiras de venda direta do produtor, além de inúmeros empórios e boas seções de orgânicos nos supermercados. O vice-presidente do Sindicato dos Produtores Orgânicos do Distrito Federal e fundador e diretor financeiro da Agro-orgânica, que reúne os produtores do Cerrado, Eber Diniz Alves de Lima, dá a receita. “Conseguimos criar um sistema em que o produtor só se preocupa com o cultivo e fazemos todo o restante”, diz ele. A associação recolhe o produto nas lavouras e leva para as feiras, permitindo que o agricultor permaneça cuidando da plantação. Com uma maior organização da cadeia, a parcela


foto: Shutterstock

TR U S E D A ID dos orgânicos na capital do País é de 2%, o dobro da média nacional. Somente a Fazenda Malunga, uma das pioneiras na produção de hortifrútis e laticínios orgânicos em larga escala, produz 5 toneladas de hortaliças e 900 litros de leite por dia, e está disponível na rede Pão de Açúcar e em outros supermercados da região, além de uma loja própria. A expansão do mercado de varejo, não apenas com lojas especializadas, mas com o aumento do espaço dedicado às categorias de orgânicos e saudáveis nos supermercados, foi o que motivou o empresário Alberto Gonçalves Neto a criar uma startup de distribuição de produtos orgânicos e saudáveis, a Mondial Brands. Ele montou a empresa há quatro anos, como distribuidora de itens premium, como café gourmet. “Em 2015, quando começamos a distribuir a linha da Fazenda da Toca, vimos a oportunidade de mercado e pivotamos para orgânicos”, diz Gonçalves. Com atuação no atacado, com entrega para supermercados e compradores institucionais, como hotéis e escolas; e no varejo, por meio de uma loja on-line, a empresa

faturou R$ 1,6 milhão no ano passado e está em busca de novos investidores para dobrar a receita neste ano.

NÃO É PARA TODOS As oportunidades de mercado não significam, no entanto, que a produção orgânica seja a melhor opção para todos os produtores. É preciso ter certeza de que se está bem amparado tecnicamente, já que vai sair da receita oferecida pelas grandes fornecedoras de insumos. Como diz o consultor de Tecnologia da Confederação da Agricultura e Pecuária do Brasil (CNA), Reginaldo Minaré, quem pode responder se vale a pena é a planilha. “É preciso fazer os cálculos e ver se os custos, que podem ser mais altos, serão compensados na hora de vender a produção”, alerta Minaré. Para fechar essa conta, diz ele, é preciso ter um contrato de venda do produto, com um preço vantajoso. Sem essa garantia, o produtor corre o risco de não ver os seus custos cobertos. “O produtor não tem como dizer: amanhã vou plantar orgânico. Não é viável, especialmente para uma grande produção”, afirma. Na avaliação do agrônomo Mateus Mondin,

(à esq.) Lobo em meio a canavial da Usina São Francisco, da Native: lavoura voltou a abrigar biodiversidade

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Ag Reportagem de Capa

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foto: Adriano Machado

O N C E T professor do Departamento de Genética da Esalq, Escola Superior de Agricultura Luiz de Queiroz, a falta de escala é uma questão difícil de solucionar. “O problema é que ninguém demonstrou ainda que é capaz de produzir nesse sistema em larga escala”, diz. O paranaense Ivo Arnt Filho, presidente da Comissão Técnica de Cereais, Fibras e Oleaginosas da Federação da Agricultura do Estado do Paraná (Faep) e produtor de soja em Tibagi, encontrou uma solução para ganhar mais sem se adequar totalmente às exigências dos orgânicos ou arcar com a produtividade menor imposta pela limitação dos insumos. Ele tem uma trade e exporta diretamente cerca de 5 mil toneladas para o mercado bio da Ásia – que não é transgênico nem orgânico, mas uma semente convencional produzida de acordo com práticas sustentáveis, usando de preferência insumos biológicos, mas permitindo o uso de defensivos químicos quando necessário. Para isso, ele conta com uma equipe que faz monitoramento de campo e recomendações de agroquímicos necessários a cada momento.

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“Tem que ter mais cuidado, mas é mais desafiante, porque eu não trabalho com uma commodity”, diz ele. O custo de produção para os plantadores de soja do Paraná, segundo ele, é menor do que o do transgênico, já que a produtividade é semelhante, enquanto o custo da semente é menor e o de venda é maior. Arnt é parte de um movimento que já ganhou força em outros países e começa a crescer no Brasil: o dos produtores que deixaram de lado a soja transgênica, por conta da rejeição do produto no mercado e dos altos custos, e voltou a plantar a semente convencional. Nos Estados Unidos, onde o mercado de soja transgênica já chegou a 90%, a participação diminuiu para 75%. “Isso já está crescendo no Brasil, os produtores já perceberam as vantagens.” Outro fenômeno que ganha força no Brasil, impulsionado por esse novo comportamento do consumidor, é o uso cada vez maior de insumos biológicos. “O Brasil é o país que mais utiliza o controle biológico no mundo”, diz Demattê. Empresas como Bug e Promip, no interior de São Paulo, que produzem insetos para controles

de pragas, estão ganhando mercado. A tecnologia também vem ajudando. Produtores de arroz, conta Demattê, estão aprendendo a manejar as áreas para ganhar produtividade e usam tecnologia de micro-ondas, em vez de inseticidas, para acabar com as pragas no arroz estocado e evitar perdas. “Existe uma ecologização do sistema de produção agrícola no Brasil, que faz com que na prática tenhamos uma produção muito maior do que esse 1%”, diz Joe Valle, fundador da Fazenda Malunga, que produz orgânicos há 30 anos. Ricardo Cerveira, diretor do Instituto BioSistêmico (IBS), tem a mesma percepção. “Pelo que eu acompanho, o mercado sustentável já passa de dois dígitos. Não é orgânico certificado, por isso está fora das estatísticas, mas já está no meio do caminho”, afirma. Deve demorar um tempinho, mas essa parece ser uma tendência sem volta: a busca dos consumidores por produtos mais saudáveis e a rejeição aos transgênicos, a exemplo do que já acontece na Europa, pode transformar profundamente o mercado num futuro não muito distante. É bom ficar de olho.


O

o p m Te e o r i e id nh

Nem mesmo a maior empresa de alimentos do mundo consegue driblar o tempo. Disposta a entrar com força em um mercado potencialmente lucrativo, a Nestlé terá de esperar ainda mais dois anos para que os primeiros litros de leite orgânico com sua marca cheguem ao mercado brasileiro. O projeto para que isso aconteça está em pleno desenvolvimento, mas formar uma cadeia de fornecedores aptos e confiáveis, capazes de entregar o produto na escala necessária, requer o cumprimento de uma série de processos que demandam mais que apenas investimentos. Somente a conversão das fazendas do modelo convencional para orgânico pode levar de 18 a 24 meses. Os primeiros passos foram dados no ano passado, na região de Araraquara (SP). Foram identificadas 11 propriedades, que iniciaram, com o apoio da empresa e parceiros como a Embrapa Sudeste, o Instituto Mokiti Okada e o IBD Certificações, o processo de conversão. Hoje, há outras 30 interessadas em aderir ao programa, que tem como meta

Os ingredientes da Nestlé para produzir leite orgânico no Brasil

obter cerca de 30 mil litros diários de leite orgânico em 2019. É um volume ínfimo se comparado aos quase 600 mil litros convencionais diários comprados pela companhia atualmente. Para estimular os produtores, a Nestlé fecha contratos de três anos e, durante o período de conversão, todo o leite adquirido é pago com o preço do orgânico, embora ainda utilizado nas linhas convencionais. Além disso, a empresa arca com os custos da certificação e auxilia na compra de ração adequada, duas vezes mais cara que a tradicional. A empresa tem ajudado a desenvolver também outros elos da cadeia, como a produção de milho orgânico para alimentar os animais. Para receber a certificação, não basta o produtor fazer a substituição de insumos químicos por orgânicos, biológicos e ecológicos. Há uma série de exigências de manejo ambiental e de bem-estar animal. As fazendas passam por auditorias periódicas, recebendo ainda suporte técnico da Nestlé e do Instituto Mokiti Okada durante esta fase de conversão.

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Ag Reportagem de Capa

O QUE É ORGÂNICO? Para ser considerado orgânico o produto precisa seguir uma série de requisitos desde a semente até a produção, sendo proibido o uso de insumos químicos. Uma lei regulamentada em 2011 regula o setor.

SEM CERTIFICAÇÃO, DÁ PRA TER CERTEZA? Não. Por isso lojas especializadas em produtos orgânicos só vendem produtos certificados.

E COMO ESTÁ O MERCADO? Especialistas dizem que muitos produtores não são totalmente COMO RECONHECER UM PRODUTO ORGÂNICO? orgânicos, mas já estão em transição Existe uma certificação e um selo que para um modelo mais sustentável, com atesta que o produto é orgânico e foi o uso de insumos biológicos em vez de produzido dentro da legislação. químicos e podem fazer uma virada com certa rapidez. A ampliação da produção COMO SE CONSEGUE ESSA CERTIFICAÇÃO? depende de mais insumos orgânicos, O processo é complexo e envolve visitas especialmente sementes de grãos. técnicas e acompanhamento. Custa em torno de R$ 5 mil por isso nem todos os produtores, especialmente familiares, são certificados.

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E O CONSUMIDOR? O consumidor vem demandando cada vez mais produtos saudáveis e buscando saber a origem do que consome.

15%

DOS BRASILEIROS CONSUMIRAM ALGUM ALIMENTO OU BEBIDA ORGÂNICA NO ÚLTIMO MÊS

84% GOSTARIAM DE CONSUMIR MAIS PRODUTOS ORGÂNICOS


Orgânicos no Brasil FAT U R AM E NTO

R$

DE

3 Bilhoes em 2016

20%

C RESC IMENTO

750 MIL HECTARES DE ÁREA PLANTADA EM 2017 22,5 MIL MUNICÍPIOS 15,7 MIL UNIDADES DE PRODUÇÃO EM 2016 FONTE: ORGANIS E MINISTÉRIO DA AGRICULTURA

sobre 2015

EX PORTAÇÕES

2,4 milhoes

7,2%

MAIS DO QUE EM 2014

5,9 milhoes

14,7%

MAIS DO QUE EM 2014

D E

Us$ 145 milhoes

Quais são os fatores limitadores?

PREÇOS 62% FALTA DE LUGARES PRÓXIMOS 32% FALTA DE CONHECIMENTO 11% FALTA DE CONFIANÇA 4%

Orgânicos no Mundo D E P RO DU TO R ES E M 2 015

D E

Gasto anual por pessoa com alimentos saudáveis (EM 2016)

Produtos mais consumidos

VERDURAS 63% LEGUMES 25% FRUTAS 25% CEREAIS 12%

D E HE CTAR E S E M 179 PAÍ S E S

BRASIL US$ 119 EUA US$ 513 REINO UNIDO US$ 473 CANADÁ US$ 445 CHILE US$ 167 FONTE: EUROMONITOR INTERNATIONAL

Maiores mercados consumidores

Maiores produtores

Maior proporção de orgânicos

ESTADOS UNIDOS US$ 40 BILHÕES ALEMANHA US$ 9,5 BILHÕES FRANÇA US$ 6,2 BILHÕES

AUSTRÁLIA 22,7 MILHÕES DE HECTARES ARGENTINA 3,1 MILHÕES DE HECTARES ESTADOS UNIDOS 2 MILHÕES DE HECTARES

LIECHTENSTEIN 30,2% ÁUSTRIA 21,3% SUÉCIA 16,9%

(EM ÁREA PLANTADA)

FONTE: INSTITUTO DE PESQUISA DE AGRICULTURA ORGÂNICA (FIBL) BASEADA EM DADOS NACIONAIS

O que o consumidor quer? CARACTERÍSTICAS IMPORTANTES PARA ESCOLHER O QUE COMER E BEBER -------------

PRODUTO ORGÂNICO FEITO COM INGREDIENTES ORGÂNICOS BRASIL 48% MUNDO 45% -------------

NÃO CONTER INGREDIENTES TRANSGÊNICOS BRASIL 46% MUNDO 52%

Por que consumir orgânicos

64% 18% 9%

É MAIS SAUDÁVEL _______

PROTEÇÃO AMBIENTAL _______

Consumo de acordo com a região NORDESTE 15% CENTRO-OESTE 21% SUL 34% SUDESTE 10%

CURIOSIDADE _______

FONTE: PESQUISA GFK PLANT PROJECT Nº5

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Ag Debate

o a n os e c o v r a t a vao m agrotoxicos

O

s mais radicais chamam de veneno. Os neutros se referem a eles como agroquímicos ou pesticidas. Para a indústria, são defensivos agrícolas. No meio científico, são tratados como praguicidas. Mas no Brasil – e só no Brasil – esses produtos são popularmente conhecidos como agrotóxicos, nome que acabou oficializado no País pela Lei nº 7.802, de 11 de julho de 1989. Sancionada pelo ex-presidente José Sarney, a legislação diz que são considerados agrotóxicos “os produtos e os agentes de processos físicos, químicos ou biológicos, destinados ao uso nos setores de produção, no armazenamento

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Um livro que acaba de chegar ao mercado mostra como, por desconhecimento científico ou como consequência da avalanche de notícias negativas relacionadas ao assunto, a imagem dos defensivos foi distorcida em um debate que chegou às mesas do mundo inteiro. Confira, a seguir, um resumo da obra Por Nicholas Vital

e beneficiamento de produtos agrícolas, nas pastagens, na proteção de florestas, nativas ou implantadas, e de outros ecossistemas e também de ambientes urbanos, hídricos e industriais, cuja finalidade seja alterar a composição da flora ou da fauna, a fim de preservá-las da ação danosa de seres vivos considerados nocivos”. O texto é claro: os agrotóxicos têm como função proteger a fauna e a flora dos ataques de espécies consideradas nocivas. Eles são usados contra o ataque de insetos e lagartas ou no tratamento de doenças causadas por fungos e ácaros. Ou seja, os agrotóxicos são

os remédios das plantas. Fazendo um paralelo com os humanos, fica mais fácil entender essa relação. Imagine que você está passando as férias na praia. Ao voltar para casa, já no meio da tarde, constata que o seu filho pegou uma micose nos pés. Já a sua filha não para de reclamar dos ataques incessantes dos pernilongos. A não ser que você seja adepto da homeopatia, terá de ir a uma farmácia e recorrer aos “humanotóxicos”, já que para acabar com a micose, que é uma infecção causada por fungos, será preciso um fungicida; e para resolver o problema dos pernilongos, que são insetos indesejados, só com inseticidas.


É óbvio que se os produtos destinados aos humanos se chamassem “humanotóxicos”, haveria um grande preconceito em torno deles. Para evitar qualquer tipo de rejeição, são chamados de remédios. Os praguicidas, no entanto, não tiveram a mesma sorte. Mesmo contendo em suas fórmulas princípios ativos semelhantes aos dos medicamentos, viraram agrotóxicos. O nome, pejorativo, ajuda a explicar o preconceito e o medo dos cidadãos comuns em relação aos produtos fitossanitários – um temor injustificado, diga-se de passagem, como veremos a seguir. Existe, em todo o mundo, um sério problema de percepção do risco em relação aos pesticidas. Essa teoria foi comprovada pelos pesquisadores Jerry Cooper e Hans Dobson, do Instituto de Pesquisas Naturais da Universidade de Greenwich, no estudo “The benefits of pesticides to mankind and the environment” [Os benefícios dos pesticidas para a humanidade e o meio ambiente, em tradução livre]. Segundo os autores, pesando os riscos e os benefícios da utilização de agrotóxicos, observa-se que a análise é prejudicada pela escassez de informações sobre seus benefícios e também pelo fato de que a maioria das pessoas não é capaz de fazer um juízo dos riscos relativos à utilização de agrotóxicos. Com base em dados dos Estados Unidos, foram classificados os 30 maiores riscos

no critério do número de mortes por ano, com o número 1 sendo o maior número de mortes, e o número 30, o menor. Os agrotóxicos foram classificados no número 28, atrás de conservantes de alimentos (27), eletrodomésticos (15), natação (7), além de fumo e álcool (1 e 2, respectivamente). No entanto, a percepção do público era muito diferente. As mulheres os classificaram como número 9 na lista, enquanto os estudantes universitários os colocaram como número 4. Ambos os grupos classificaram erroneamente os riscos relativos apresentados por uma lista dos perigos, talvez devido à publicidade negativa que os agrotóxicos recebem. No Brasil, não é diferente. De acordo com dados do Sistema

Nacional de Informações Tóxico-Farmacológicas (Sinitox), ligado ao Ministério da Saúde, os agroquímicos foram responsáveis por somente 4,53% dos 42.127 casos de intoxicação humana por agentes tóxicos em 2013 (último dado disponível). Importante destacar que, dos 1.907 casos envolvendo os defensivos agrícolas, 971 foram tentativas de suicídio, ou seja, mais da metade dos incidentes não está relacionada com o seu uso na agricultura. Outro ponto que chama a atenção é que, entre as 971 pessoas que tentaram se matar ingerindo agrotóxicos, somente 64 conseguiram. Os números do Sinitox indicam ainda 621 acidentes individuais e outros 214 casos de intoxicação ocupacional por agroquímicos, com apenas

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Ag Debate

s o e x o t o r g a sete óbitos registrados. Não existe nenhum caso de intoxicação por resíduos de pesticidas nos alimentos. O perigo de verdade está em casa e na maioria dos casos é ignorado. Ainda de acordo com as informações do Sinitox, a principal causa de intoxicação no Brasil são os medicamentos. Foram quase 12 mil casos apenas em 2013 (28,45% do total), sendo 4.800 acidentes envolvendo automedicação. Outra ameaça são os saneantes domissanitários, também conhecidos como produtos de limpeza, com 3.601 casos (8,55%). O que fazer diante dessa situação? Proibir a venda de remédios e produtos de limpeza no País? Se seguirmos a lógica dos que defendem o banimento dos agrotóxicos, a resposta é sim. Na prática, como sabemos, esses produtos nunca serão proibidos. O mesmo vale para os agrotóxicos. Existem inúmeros motivos pelos quais os pesticidas não podem ser retirados do mercado — ao menos até que se descubram defensivos biológicos tão eficazes quanto os químicos. Dois deles, no entanto, são suficientes para ilustrar o cenário atual e ajudar o nobre leitor a tirar as suas próprias conclusões. O primeiro diz respeito à representatividade. A maioria esmagadora dos consumidores busca alimentos bonitos, grandes, sem manchas nem furos. Os orgânicos, em geral, nem sempre cumprem esses requisitos, apesar de custarem até 270% mais. No Brasil, a relação custo-benefício

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faz com que 99% das pessoas optem pelos convencionais. Divulgados pelas celebridades e cobiçados pelos consumidores de alto poder aquisitivo, os orgânicos não passam de produtos de nicho, geralmente vendidos em feiras descoladas, empórios ou supermercados chiques. Mesmo nos países onde o segmento de orgânicos é mais desenvolvido, como a Dinamarca, a participação desses alimentos nas vendas totais não chega a 8%. O outro fator que tem ajudado a desconstruir o discurso dos detratores é a falta de evidências científicas que comprovem a superioridade, seja em termos nutricionais ou de segurança alimentar, dos alimentos orgânicos. Em 2012, um grupo de pesquisadores da Universidade de Stanford, nos Estados Unidos, divulgou uma revisão detalhada de 237 estudos comparativos entre alimentos orgânicos e convencionais publicados em todo o mundo nas últimas quatro décadas. A conclusão foi que, apesar de mais caros, os orgânicos não eram mais nutritivos nem mais seguros do que seus similares produzidos de forma convencional. “Quando iniciamos este projeto, nós imaginávamos que encontraríamos alguns resultados que confirmassem a superioridade dos produtos orgânicos sobre o alimento convencional”, disse Dena Bravata, pesquisador responsável pelo trabalho, em entrevista ao jornal The New York Times. “Nós ficamos totalmente surpresos com

os resultados.” Apesar da avalanche de notícias exaltando os benefícios dos orgânicos, quando submetidos a testes laboratoriais sérios, esses alimentos quase nunca conseguem comprovar as suas vantagens. Em 2016, o Instituto de Tecnologia de Alimentos (Ital), entidade vinculada à Secretaria de Agricultura e Abastecimento do Estado de São Paulo, fez uma revisão de milhares de trabalhos científicos comparativos publicados em todo o mundo desde os anos 1950. O resultado? Mais uma vez os produtos orgânicos e os convencionais foram considerados tecnicamente iguais. De acordo com os autores do trabalho, existem hoje em dia dois argumentos principais que sustentam todo o discurso dos defensores dos orgânicos — ambos puramente ideológicos. O primeiro é a ideia de que os vegetais cultivados sem pesticidas seriam mais saudáveis pelo simples fato de não conterem aditivos artificiais ou resíduos químicos, mesmo estando em conformidade com a legislação. Essa alegação faz com que os consumidores tenham a falsa impressão de que os orgânicos são mais seguros para o consumo. O segundo mito é o de que esses produtos teriam qualidade superior em função do sistema de produção agrícola, o que induz o consumidor a acreditar que as frutas e hortaliças orgânicas são superiores quanto às características nutricionais e sensoriais. “Ambos os argumentos


s ? s ix co contribuem fortemente para que tais produtos possam ser precificados com valores acima dos produtos convencionais, trazendo prejuízos para os consumidores e também aos produtores. Na maioria das revisões, revisões sistemáticas, metanálises e artigos, não foram encontradas diferenças significativas na qualidade nutricional e sensorial de alimentos produzidos em sistemas orgânicos comparativamente àqueles produzidos em sistemas convencionais, o que permite afirmar que orgânicos e convencionais são iguais nesses quesitos”, afirma o relatório do Ital. Ainda assim, seja por desconhecimento científico, seja como consequência da avalanche de notícias negativas relacionadas

ao assunto, a questão dos resíduos de agrotóxicos nos alimentos segue atormentando os consumidores. Um dos principais responsáveis pelo cenário atual de insegurança é o Programa de Análise de Resíduos de Agrotóxicos em Alimentos (Para), um trabalho de avaliação dos vegetais à venda no País realizado pela Anvisa há quase duas décadas, mas que só ganhou notoriedade depois de 2008, quando passou a servir de fonte para publicações sensacionalistas sobre a qualidade dos alimentos vendidos no Brasil. Graças a uma série de divulgações deturpadas, que colocava produtos com agrotóxicos acima do limite ao lado de outros flagrados pelo uso de substâncias não

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agra a c e d regulamentadas para a cultura (o que não traz nenhum risco à saúde), foram criados vilões da alimentação, como o pimentão, o mais famoso deles. Em uma de suas divulgações mais polêmicas, a Anvisa afirmava que mais de 92% dos pimentões estariam “intoxicados” por resíduos de agrotóxicos, fato destacado pelo então ministro da Saúde, José Gomes Temporão, que fez questão de elevar o tom de alarmismo: “Já mandei tirar o pimentão lá de casa”, disse aos jornalistas presentes. A notícia, evidentemente, ganhou as manchetes dos principais jornais no Brasil, mas não deixava claro para o consumidor que apenas 6,8% das amostras (um número elevado, é verdade, mas muito distante dos 92% divulgados) estavam, de fato, impróprias para o consumo humano por conterem resquícios de pesticidas acima do Limite Máximo de Resíduos (LMR) estabelecido pela Anvisa. Todas as outras amostras constavam como irregulares devido ao uso de inseticidas registrados apenas para uso em lavouras de tomate, mas que são eficazes e amplamente utilizadas no pimentão. Neste

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caso, trata-se de um problema estritamente burocrático. Na última avaliação do Para, concluída em 2016, com nova metodologia e divulgação menos ideológica, ficou comprovado que 99% dos alimentos avaliados estavam próprios para consumo. Aí você me pergunta: mas e aquele 1% considerado irregular? Mesmo sendo um percentual pequeno, esses alimentos acabam na mesa dos brasileiros. Não pode fazer mal? Na teoria, até pode. Na prática, porém, é muito difícil que algo aconteça, já que os níveis de resíduos de agroquímicos atualmente tolerados pela Anvisa são extremamente baixos. O exemplo do pimentão nos ajuda a entender melhor como esse cálculo funciona na prática. Uma das substâncias químicas mais detectadas nas análises do Para, o clorpirifós é um inseticida cuja Ingestão Diária Aceitável (IDA) é estipulada em 0,01 mg/kg de peso corporal. No caso de um homem de 85 quilos, portanto, a IDA é de 0,85 miligramas ao dia. Já o Limite Máximo de Resíduos para o clorpirifós no pimentão é de 0,04 mg/kg, o que significa que seria necessário ingerir pouco mais de

21 quilos (0,85 dividido por 0,04) de pimentão “contaminado” por clorpirifós no limite máximo, todos os dias, por toda a vida, para sofrer uma intoxicação crônica – algo que, convenhamos, nunca vai acontecer. Mesmo supondo que uma pessoa de 85 kg consiga comer quase um quarto do seu peso corporal somente em pimentões em apenas 24 horas, essa experiência dificilmente passaria do primeiro dia, já que ela muito provavelmente teria problemas causados pela ingestão de outras substâncias presentes no vegetal, como o magnésio – elemento químico natural que aparece em uma proporção de 110 mg/ kg do produto. Em 20 quilos de pimentão, são nada menos do que 2.200 miligramas de magnésio, ou dez vezes mais do que a dose letal média estimada para esse ingrediente, mais do que o suficiente para uma intoxicação aguda. Agora, me diga, quanto pimentão você come diariamente? Entre os brasileiros, a média de consumo é de apenas 4,6 gramas por dia. Portanto, fique tranquilo. Você não vai morrer por causa dos eventuais resíduos de agrotóxicos na sua comida.


Plant + Azul

A companhia atende mais de 100 destinos no Brasil. Em destaque no mapa, as cidades com maior participação no PIB agropecuário conectadas por voos da Azul e as principais culturas de cada região

a

SÃO PAULO CURITIBA

PORTO ALEGRE

www.voeazul.com.br PLANT PROJECT Nº5

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Plant + Azul apresentam

as cidades do

AGRO NEGÓCIO

CUIABÁ

Negócios, natureza, gastronomia e lazer se misturam na capital do Mato Grosso

O agronegócio brasileiro tem várias capitais. Para cada cultura, cada região, cada época do ano há uma cidade sediando oportunidades e bons negócios. No centro do mais pujante polo produtor do momento, Cuiabá, a capital do Mato Grosso, vive uma permanente transformação. Impulsionado pela chegada de grandes empresas do agronegócio, um boom imobiliário que teve seu ápice três anos atrás mantém seu vigor. Os principais investimentos estão no entorno do Centro Político Administrativo, onde estão a sede do governo do Estado, a Assembleia Legislativa e entidades do setor produtivo, como Famato, Aprosoja, Ampa e Acrimat. E, agora, modernos edifícios comerciais, que hospedam os escritórios de bancos, consultorias e escritórios de advocacia que prestam serviços aos grupos do agro. E também um dos maiores shoppings da Capital. Há prédios novos e condomínios horizontais sendo construídos nos quatro cantos. Cuiabá não para de crescer. Novos espaços públicos impulsionam o movimento das pessoas em busca de lazer. A Orla do Porto, uma tentativa ainda tímida de se ter um "Porto Madero" cuiabano, ainda não deslanchou, mas promete. O Parque das Águas é um bom exemplo, já que tem atraído um número cada dia maior de pessoas e novos bares e prédios estão surgindo na região. A capital mato-grossense reserva surpresas que podem agradar quem busca as delícias de uma boa mesa, aventura ou mansidão do cenário paradisíaco da vizinha Chapada do Guimarães.

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VEJA COMER & BEBER 2017 como o melhor da região, o Atmã oferece razões de sobra para tirar o fôlego: além da paisagem deslumbrante, a culinária que aguça os sentidos é feita para ser degustada calmamente, sem pressa. As opções variam de R$ 29,90 a R$ 80,00.

O SABOR

Mistura gastronômica Comandado pela chef Ariane Malouf, o restaurante Mahalo tem como marca a cozinha contemporânea e mistura receitas da culinária francesa, italiana e libanesa, incorporando sabores de iguarias brasileiras como castanha de caju e peixes do Pantanal. Uma mágica que tem conquistado paladares exigentes sem onerar o bolso do cliente. No almoço, o preço do menu executivo vai de R$ 55,00 a R$ 98,00 de segunda a quinta-feira. Sexta a sábado fica em R$68,00. No jantar, à la carte, o preço vai de R$ 75,00 a R$ 140,00. Rua Presidente Castello Branco, 359, Quilombo • Aberto de segunda a sexta, 11h30-14h30 e 19h-0h. Sábado até 15h30 e na quinta-feira tem chá da tarde, entre 16h30 -19h • Tel.: (65) 3028-7700 / 9912-6157 mahalocozinhacriativa.com.br

Banquete no céu Feche os olhos e imagine o céu azul bem perto de você. No Atmã esta é uma cena que pode ser vista da janela, no alto dos paredões da Chapada dos Guimarães. Apontado pelo guia

Estrada do Atmã, Caminho Casa do Sonho, S/N - Bairro Lavrinha – Chapada dos Guimarães • Aberto de segunda-feira a domingo das 11:00 - 16:30 • Tel.: (65) 9998-23345 facebook.com/atmarestaurante

Corte uruguaio Na capital do Estado com maior rebanho bovino, o atual nome da carne vem de fora. Desde que chegou à cidade, em maio passado, o Uruguayo Parrilla tornou-se o endereço preferido de executivos e famílias em busca de cortes nobres. Com ambiente requintado e serviço sofisticado, também oferece carnes de ovinos, aves, suínos e, como não pode faltar em Cuiabá, peixes de água doce e salgada. O restaurante tem especialidades exclusivas como o Steak Uruguayo Parrilla, a Tapa de Cuadril


Guimarães, uma picanha uruguaia de gado britânico Angus e as Costillitas Montevidéu, costelas de javali. Preços variam de R$ 78,00 a R$ 134,00. Av. José Rodrigues do Prado, 47 - Trevo do Santa Rosa • Aberto de segunda a sábado – Almoço a partir das 12h.jantar a partir das 19h. Domingo – Almoço a partir das 12h. Tel.: (65) 2129-2660 facebook.com/UruguayoParrillaCba

O tempo e o prato Poucos restaurantes conseguem manter a tradição da melhor cozinha cuiabana como o Regionalíssimo. O restaurante resiste ao tempo e à modernidade, mantendo o atendimento por meio do sistema buffet, em que o cliente serve à vontade. Lá, serve-se o que cativa os chamados paus rodados, as pessoas que para cá vieram e se apaixonaram pela Maria Isabel com farofa de banana, o feijão empamonado, a piraputanga assada e a mojica de pintado. De sobremesa, um furrundum -- e depois é só deitar na rede e descansar. Museu do Rio - Av. Manuel José de Arruda Porto • Almoço de terça a sexta por R$ 49,90 por pessoa, sábados, domingos e feriados, 52,90 por pessoa, incluindo a sobremesa Tel.: (65) 3623-6881

O DESCANSO

Ar fresco Depois de enfrentar o calor cuiabano, nada melhor do que conforto. Bem localizado e com uma estrutura diferenciada, o Gran Odara proporciona a quem vai a Cuiabá, a trabalho ou a passeio, centro de eventos, restaurante internacional, piscina, academia e spa/salão de beleza. Entre os destaques, a suíte presidencial com 70 m². Preço médio por noite, R$ 250,00. Av. Miguel Sutil, 8344 - Ribeirão da Ponte Tel.: (65) 3616-2014 www.hotelgranodara.com.br

O mar da Chapada Um lago com a dimensão da Baía de Guanabara, cerca de 10 mil quilômetros quadrados de extensão,

dá clima de praia ao Malai Manso Resort Iate Golf Convention & SPA. Considerado um dos mais completos resorts do País, oferece bangalôs e casasbutiques e complexo com campo de golfe (nove buracos), esportes aquáticos e radicais. Nos meses mais secos do ano - entre junho e outubro - surgem verdadeiras ilhas no meio do lago. Tudo isso tendo o famoso Morro do Chapéu, na Chapada, como testemunha. Conta com heliporto, aeródromo homologado com pista asfaltada de 1.200 metros (para jatos executivos e pequenas aeronaves) e marina com píeres. Diárias entre R$ 1.060 e R$ 1.560. Rodovia MT 351, km 67. Lago do Manso, Chapada dos Guimarães Central de Reservas: segunda a sextafeira 07h30 às 20h. | sábado 07h30 às 15h. | domingo 08h às 12h. Fone (65) 2193-9999 GERAL (65) 2193-9100 www.malaimansoresort.com.br

PARA PRESENTEAR

Joia ribeirinha Peças que traduzem a beleza da cultura cuiabana podem ser encontradas na Casa do Artesão, fundada em 1975. Tombada pelo patrimônio histórico, o casarão tem uma boa mostra da produção dos artesãos da terra feita em madeira, cerâmica, biojoias, tecelagem, doces e licores. Destaque para objetos como a viola de cocho e as redes confeccionadas nos teares das rendeiras que vivem na comunidade ribeirinha de Limpo Grande, em Várzea Grande. Rua 13 de Junho, 315 - Porto, Cuiabá Segunda a sexta 8h30 às 17h30. Sábados 8h30 às 13h30 • Tel.: (65) 3611-0550 sescmatogrosso.com.br/casa-do-artesao

SÓ PASSEAR...

Luzes e águas Um dos mais visitados da cidade, tem como principal atração o espetáculo das fontes luminosas, em dois horários distintos, às 20

horas e às 21h30. Um show que atrai a atenção de atletas, crianças, jovens e adultos. Com 270 mil m², o parque tem pista de corrida e caminhada com 1.500 metros, 1.600 metros de ciclovia, quiosques, duas academias ao ar livre, parque infantil e mirante. Conta com policiamento até as 22horas. Bares e restaurantes funcionam até mais tarde. Av. Hermina Torquarto da Silva - Centro Político Administrativo, Cuiabá Tel.: (65) 3645-6263

Passado e futuro O bairro do Porto, às margens do rio Cuiabá, se transformou em um espaço de lazer e saudosismo de outros bons tempos da capital de Mato Grosso. A Orla do Porto foi revitalizada e agora possui pista de caminhada, quiosques, mirante, banheiros e arborização. Passear pelo local é uma oportunidade para quem quer conhecer um pouco da história da capital. Fachadas coloridas dos casarões e fotos estão em exposição permanente. Wi-fi gratuito, bares, restaurantes e estacionamento completam a estrutura do espaço às margens do rio Cuiabá. Praça Luiz de Albuquerque Av. Beira Rio - Porto, Cuiabá

A AZUL LEVA VOCÊ Cuiabá é um hub estratégico para o agronegócio. De lá, partem voos para destinos exclusivos da Azul, cidades como Alta Floresta, Sorriso e Barra do Garças, no Mato Grosso, e Vilhena, Cacoal e Ji-Paraná, em Rondônia. Também a partir da cidade é possível ganhar o mundo, passando por Campinas, Porto Alegre ou Recife, de onde partem os voos internacionais da Azul com destino aos Estados Unidos (Orlando e Fort Lauderdale), Uruguai (Montevidéu e Punta Del Este) e Portugal (Lisboa).

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Ag Plant/Nuffield

LONGE DE TUDO, PERTO DO MUNDO Vivendo com a mulher e as quatro filhas em uma fazenda isolada no Outback australiano, um ex-empresário do ramo de helicópteros encontrou uma oportunidade em meio a uma terrível seca, adotou o modelo orgânico de pecuária e descobriu que era possível cruzar fronteiras sem mudar de vida

fotos: Acervo de Família

Por Fred Appleton, de Alpha (Austrália)

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Fred Appleton em sua fazenda, no Outback: “De certa forma, vivemos isolados. Mas apenas tão isolados quanto queremos estar”

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Ag Plant/Nuffield

A

té 2005, eu tinha um negócio de helicópteros. Havia trabalhado três anos fazendo voos comerciais para uma empresa na região de Queensland, na Austrália, depois mais três em minha própria companhia. Sonhávamos em comprar nossa propriedade, mas era difícil dar esse passo sem uma reserva financeira. Então enxergamos a oportunidade de nos juntarmos com a própria família. Eu e meu irmão tínhamos algumas cabeças de gado na fazenda de nossos pais. Vislumbramos que podíamos construir algo maior juntos. E então formamos nossa empresa familiar. Meus pais, Dale e Kris, são majoritários, com 60%. Eu e minha mulher, Anna, meu irmão, Loid, e a mulher dele, Zaviera, temos 20% cada um. Os pais deixaram o cotidiano da operação, embora ainda mantenham um pequeno rebanho próprio. Mas contribuem nas decisões mais relevantes, como adquirir mais terra. É assim que temos crescido nesses 12 anos. Começamos com a compra de 30 mil acres (cerca de 12 mil hectares) e arrendando áreas de nossos pais. Ali, criávamos, em 2005, 8 mil cabeças. Hoje, são 35 mil, sendo que 15 mil delas usadas para reprodução. Continuamos crescendo da mesma maneira, comprando mais áreas. Na verdade, adquirimos e vendemos algumas fazendas nesse período. O crescimento do valor dos nossos ativos nos permitiu ter áreas cada vez maiores. Hoje, esse rebanho está espalhado por seis ou sete propriedades, que somam 480 mil acres (quase 195 mil hectares). Somos proprietários de tudo, nada é arrendado. Loid e Zaviera cuidam de duas fazendas, um terço da área total. Vivem a 300 quilômetros ao norte da nossa casa. As áreas não são contínuas. Do ponto mais

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Operação na fazenda: com 35 mil cabeças em quase 200 mil hectares, todos ajudam. Até as filhas acompanham de perto

ao norte ao mais ao sul de nossas terras percorre-se 450 quilômetros de estrada. A operação, no entanto, continua simples: criar, engordar e vender o gado no final do período. Trabalhamos basicamente com três raças: Droughtmaster (típica da região de Queensland), Brahman e Charbray. A empresa tem dado bons resultados, mas não temos retirado dividendos dela – ainda! Continuamos a reinvestir tudo. Gostamos muito do que fazemos e, quando vemos uma boa propriedade, fazemos o possível para comprar e continuar a expandir no negócio. A OPORTUNIDADE BROTOU NA SECA Entre 2012 e 2013, vivíamos um período terrivelmente seco na Austrália. Os preços do gado e da carne estavam lá embaixo. Tínhamos de fazer alguma coisa. Naquela época, o preço da carne convencional estava em torno dos 3,10 dólares australianos por quilo. Já o produto orgânico era vendido a 5,50. Então fizemos algumas contas. Dar uma guinada para a criação de gado orgânico poderia acrescentar 500 dólares por cabeça. E, com a receita proveniente de melhores preços de venda, poderíamos buscar melhoramentos genéticos para o nosso rebanho e, assim, compensar as perdas que teríamos no peso dos animais pelo fato de deixarmos de aplicar hormônios. A transição de um modelo para o outro foi razoavelmente simples. E aí, o fato de vivermos em um clima seco, ajudou. Diferentemente do Brasil, essa condição nos traz menos preocupações com doenças no gado do que as que se enfrentam em países tropicais como o


Brasil. Basicamente, a grande adaptação que tivemos de fazer foi retirar os hormônios da dieta do rebanho. Além disso, há cinco ou seis companhias apenas fornecendo animais criados no modelo orgânico. Com isso, há boa condição para obtermos bons preços. Atualmente, conseguimos um adicional de 180 dólares por cabeça, acima das cotações pagas no mercado orgânico, por termos conseguido certificações demonstrando que usamos práticas de bem-estar animal no manejo. O bom foi que, para chegar lá, não tivemos de mudar muito o que já fazíamos, apenas cuidar de mais papelada.

Nosso rebanho atualmente é quase 100% orgânico certificado. Restam apenas poucas matrizes convencionais. Ainda serão necessários alguns anos para que possamos substituir todas as vacas usadas para reprodução, conforme elas vão envelhecendo. Um trabalho importante que fazemos é a rastreabilidade de todo o gado, muito difícil em propriedades de larga escala. Toda a carne resultante de nossos animais é exportada para os Estados Unidos e a Coreia do Sul. O mercado de orgânicos está crescendo lentamente também na China. Existem cinco ou seis

criadores em nossa mesma região que trabalham com gado orgânico. Nós começamos todos mais ou menos no mesmo período, mas como ficamos muito distantes e ocupados, não nos conectamos muito. Ultimamente temos tentado colaborar mais com ideias e recursos. Mantemos nosso foco no que fazemos melhor. Temos um gerente em cada fazenda e, acima deles, eu e meu irmão. Eu, na parte sul, com Anna, dois dos gerentes e mais quatro rapazes realizando o trabalho com o rebanho. Aqui fazemos a marcação, desmame e os testes de prenhez. As vacas PLANT PROJECT Nº5

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A esposa Anna com as quatro meninas e o helicóptero atuando no manejo do gado: estilo de vida único

sem prenhez seguem para o abate. Os animais desmamados, para as áreas de engorda. Contando com Loid, Zaviera e sua equipe, toda a operação é feita por 12 a 15 pessoas. OLHOS PARA O MUNDO As mudanças para nós não se limitaram à adoção da produção orgânica. Quando fui selecionado para a bolsa da Fundação Nuffield, tive a oportunidade de abrir meus olhos para o mundo e fazer muitos contatos em vários países. Nunca havia viajado para o exterior antes. Foi fantástico poder ver a diversidade nos estilos de vida e de fazer negócios. Com a Nuffield, visitei cerca de 15 países. Estive também no Brasil. Você fica impressionado com tantas áreas férteis e a alta produtividade. Quando você olha de longe, parece que é fácil produzir qualquer coisa no país. Mas de perto você entende os 50

desafios da infraestrutura e os custos internos. Todo país tem suas vantagens e desvantagens. Passei a entender que também há muitas vantagens aqui, coisas que eu antes achava serem normais. Cada lugar que estive me impressionou de uma maneira diferente. “A experiência com a Nuffield nos permitiu ter uma visão mais ampla do mundo, não apenas o mundo que já conhecíamos”, diz Anna. “Nos ajudou a ter novas ideias, como a carne orgânica”. Isso é fundamental, sobretudo se considerarmos o ambiente em que eu e Anna vivemos. De certa forma, vivemos isolados. Mas apenas tão isolados quanto queremos estar. Nossas quatro filhas, que têm entre 12 e 6 anos, estudam em casa. Nós contratamos um professor, que vem até a fazenda. Há uma escola em Emerald, que fica a 200 quilômetros de


Plant/Nuffield

Ag

Alpha Emerald Brisbane

distância. A cada período nós passamos uma semana lá. Todas as crianças vêm de suas fazendas para frequentar a escola no modelo tradicional. Nós organizamos e apoiamos eventos, há uma porção de atividades se você se dispuser a fazer um esforço e pegar a estrada. Você só fica isolado se quiser. A cidade mais próxima é Alpha, de 200 habitantes, a 70 quilômetros da fazenda. Lá existe um mercadinho, padaria e uma pequena loja de ferramentas. Compramos comida pelo sistema delivery. Ela é entregue junto com o correio, duas vezes por semana. Emerald é bem maior. Tem cerca de 15 mil habitantes e

todo tipo de comércio. Sempre há alguém conhecido indo para lá. Quando é preciso trazer algo, uns contam com os outros. E depois há Brisbane, a maior cidade da região. São 12 horas de carro até lá, uma hora de avião a partir de Emerald. Assim, acabamos aprendendo a ser quase autossuficientes. Mudamos de vida, mas os helicópteros continuam em nosso cotidiano. Como temos poucos funcionários e muita terra, ter um aparelho ajuda muito e poupa tempo. Se fôssemos usar cavalos ou veículos, teríamos de ter provavelmente mais seis ou sete pessoas para ajudar.

Com o helicóptero, podemos monitorar os pastos mais distantes e até trazer o gado para o processamento. Sem ele, não poderíamos ter tantos animais. Loid também tem o seu helicóptero, pelos mesmos motivos. Amamos nosso estilo de vida. Nossas filhas estão crescendo perto da gente, vão para o trabalho conosco. Tudo na nossa vida é fantástico. Elas podem até mesmo dirigir dentro da fazenda. É uma experiência de vida maravilhosa para elas também. É seguro, ninguém quer nos tirar daqui. “Estamos aqui porque amamos esse lugar. É tudo muito especial aqui”, diz Anna.

O QUE É A NUFFIELD Ao longo dos seus 70 anos, a Nuffield vem reunindo empresários rurais e demais profissionais do agronegócio capacitados e comprometidos com o “fazer melhor”. Anualmente, a Nuffield seleciona talentos do setor e os premia com recursos para que pesquisem um tópico determinado por ele que seja relevante para o agronegócio de seu país. Durante 16 semanas, distribuídas ao longo de 18 meses, o "Nuffieldiano" viaja de forma orientada para conhecer experiências de sucesso e desafiadoras em diversos países. Os resultados podem variar de práticas de produção melhoradas a novas oportunidades de crescimento e liderança no setor. Após a conclusão do programa, os Nuffieldianos continuam ativos, interagindo com membros da rede internacional e orientando novos empreendedores com contatos relevantes para suas pesquisas. A Nuffield é uma entidade internacional sem fins lucrativos que, junto com seus parceiros investidores, contribui para o desenvolvimento do agronegócio de diferentes países, como o Brasil. PLANT PROJECT Nº5

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Ag Finanças

foto: Cláudio Gatti

BANQUEIROS COM PÉ NA TERRA A estratégia do Santander para cravar sua marca no agronegócio passa por dois executivos com história no setor e uma série de inovações para levar mais serviços aos produtores – inclusive um banco digital só para eles Por Luiz Fernando Sá, de Cuiabá

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"A

gente não tem medo de barro.” Vinda de um banqueiro, poderia ser uma frase de efeito solta em um evento urbano para agradar potenciais clientes do meio rural. Na voz de Sérgio Rial, presidente do Santander Brasil, ganha credibilidade. O economista, com vasta experiência em instituições financeiras, já sujou as botas de lama em pelo menos dois momentos de sua bem-sucedida carreira – em mais de oito anos na americana Cargill, onde chegou a vice-presidente de Finanças, e outros dois anos e meio no grupo brasileiro Marfrig, como CEO. Estava, portanto, à vontade entre produtores e autoridades mato-grossenses ao proferir a declaração na abertura de um grande seminário sobre agronegócio patrocinado pelo Santander em Cuiabá, em maio passado. A frase também não soaria estranha na voz de Carlos Aguiar, o homem a quem Rial delegou a missão de executar a estratégia de transformar o banco espanhol em uma marca relevante no campo brasileiro. Superintendente de Agronegócio do Santander desde 2015, ele também construiu reputação no lado financeiro do agro, tendo ocupado posições de comando na BrasilAgro S/A e no fundo Macquarie Agricultural. Nos últimos dois anos, a dupla vem

foto: divulgação

articulando uma série de movimentos para dar visibilidade à marca nos principais centros de produção agrícola brasileiro. “Vim para mudar a imagem de que banco não ajuda o agro”, afirmou Aguiar a PLANT na mesma tarde em que uma boa parte do PIB rural se reunia, sob as expensas do Santander, no Mato Grosso. A primeira parte da estratégia começou a ser implantada no ano passado, silenciosamente, longe das grandes capitais. Para ser mais preciso, a uma distância de pelo menos 300 quilômetros de qualquer outra agência do banco, nas regiões Norte e Centro-Oeste. Primeiro, a equipe de Aguiar mapeou os municípios com maior atividade agrícola que não eram alcançados pelos serviços do Santander. Em seguida, estabeleceu um cronograma de abertura de lojas especializadas no atendimento a produtores nessas cidades. Até junho passado, oito já haviam sido inauguradas. Outras oito estão previstas até o final de 2017. Mais de 40 agrônomos foram contratados para reforçar as equipes, inclusive nas 300 outras agências já existentes, mas que foram identificadas como “vocacionadas ao setor”. Esse foi apenas o princípio, no entanto. O processo de “interiorização

Carlos Aguiar, superintendente de Agronegócio e a loja agro de Campo Novo dos Parecis (MT): “O cliente tem de ver um banco com a mesma naturalidade com que vê um supermercado”

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foto: divulgação

Sérgio Rial, presidente do Santander: carreira com vários postos de comando em empresas do agronegócio, como a Cargill e a Marfrig

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do banco”, como define Aguiar, envolve toda uma reorganização das carteiras. Em 150 das agências vocacionadas, por exemplo, os produtores foram isolados dos demais clientes e passaram a ter atendimento de times específicos. O processo se repetirá em todas elas. Um exemplo claro desse processo acontece em Ribeirão Preto. O banco possui 16 endereços na cidade, mas as operações do segmento agro foram concentradas em apenas três. “Queremos ser mais ágeis e ter uma visão mais clara do status de cada cliente e de cada operação”, explica Aguiar. No interior paulista, o Santander vai beber da experiência do antigo Banespa (comprado em 2010 pelos espanhóis) no segmento agro. Em outras regiões, como o Centro-Oeste, a construção do banco especializado será feita a partir do zero. Em ambos os casos, a ideia é fazer dele um espelho do banco de varejo, oferecendo aos clientes/

produtores todas as linhas de serviços existentes. Mais de cem gerentes receberão formação focada no setor. “O agro não é apenas crédito rural”, afirma Aguiar. Outra missão que ele assumiu foi mudar os conceitos de atendimento aos produtores. As novas lojas exclusivas não lembram uma agência bancária. “O cliente tem de ver o banco com a mesma naturalidade que vê um supermercado”, diz. Na verdade, a analogia preferida de Aguiar é com o chamado “atacarejo”, modalidade que se popularizou por oferecer aos consumidores do varejo a possibilidade de comprar em quantidades maiores e com preços mais acessíveis, condições oferecidas pelo atacado. “Vamos trazer as experiências do varejo bancário para clientes que precisam de operações um pouco mais complexas”, explica. Em outra frente, o banco fará parcerias com revendas agrícolas, grandes empresas do setor e tradings, que hoje


Finanças

50 mil deles fazem pouco ou nenhum negócio com o banco. Trata-se de uma ótima base para crescimento. Aguiar quer atraí-los criando um sistema mais amigável e simples, em que o produtor contrate serviços de forma direta, com menos burocracia. Para isso, ele e sua equipe impuseram-se outro objetivo: transformar o Santander em um banco agrodigital em dois ou três anos. “Outras áreas do mercado já são inteiramente digitais. A rural também deveria ser assim.”

A LAVOURA DO SANTANDER Presença do banco no agronegócio

R$ 40 bilhões é o valor total da carteira do banco para o setor

3,8%

é a participação do banco no mercado de agronegócio. Em 2016, eram 3,0%

20

Total de correntistas do banco: milhões

Número de agências vocacionadas para atender o agro:

300

68%

foi o crescimento da carteira de crédito rural do banco no primeiro semestre de 2017, comparando com o mesmo período do ano passado. Os financiamentos somaram R$ 10,6 bilhões

8

Número de lojas exclusivas para o setor: 8 inauguradas até junho de 2017. Mais 8 serão abertas até o fim do ano

Produtores clientes do banco:

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MIL

financiam e levam soluções aos produtores. “Eles querem dividir o risco dessas operações”, diz. Com o comércio das cidades com economia baseada na agricultura, por exemplo, o crédito ao consumidor tem de entender os ciclos de renda dos clientes, associados à safra. Para as cooperativas, o banco quer oferecer a possibilidade de ampliação de crédito aos associados. Adaptar soluções de outros mercados ao agro é um dos caminhos que Aguiar pretende utilizar para cumprir a meta de fazer sua área ter, nos resultados do Santander, a mesma relevância que a agropecuária tem para a economia brasileira. Hoje, a carteira expandida do banco para o segmento soma R$ 40 bilhões, cerca de 8% a 10% do total de crédito fornecido pelo banco, enquanto o agronegócio representa mais de 25% do PIB brasileiro. Há muito trabalho a ser feito, mas os resultados começam a aparecer. No primeiro semestre de 2017, a carteira de crédito rural do Santander cresceu 68% em relação ao mesmo período do ano passado, chegando a R$ 10,6 bilhões. Também a participação de mercado do banco no segmento de agronegócio aumentou, passando de 3% para 3,8%. Qual a meta? “Queremos ter 15% em 2020”, afirma Aguiar. O Santander tem 20 milhões de correntistas. Apenas 60 mil são produtores. Cerca de

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OS TRÊS ELEMENTOS DA SUCESSÃO

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á poucos dados sobre a participação de empresas familiares no agronegócio. Qualquer observador notará, porém, que elas são imensa maioria no universo das propriedades rurais brasileiras. E que, por isso, são frequentes os casos de conflitos e divisões quando é necessário falar em sucessão. A boa notícia é que empresa rural não é diferente de qualquer outra quando o tema é gestão familiar. “Olhando de fora, o que se vê são os mesmos desafios”, afirma Luís Augusto Lobão Mendes, um dos maiores especialistas brasileiros em negócios familiares. Conferencista internacional e diretor da HSM Educação Executiva, ele participou de processos de formação, orientação e sucessão em mais de uma centena de grupos nacionais e estrangeiros. E, com a criação do projeto FUTURO FÉRTIL, uma parceria da HSM com a PLANT e sua plataforma STARTAGRO, ele estará ainda mais próximo dos principais casos de gestão também no agronegócio. O tema sucessão familiar será um dos tópicos abordados

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nas jornadas de conteúdo que, nos próximos meses, estarão disponíveis na página do projeto dentro da plataforma HSM Experience e, em novembro, no HSM Expo, maior evento de educação executiva da América Latina. Segundo Lobão, autor de seis livros e próximo de lançar o sétimo (com o título provisório Herdeiros – Manual do Proprietário), a discussão da passagem do bastão não se resume à sala do conselho da empresa. Ela engloba pelo menos três elementos que devem ser mapeados e discutidos pelos herdeiros: 1) A liderança no negócio: definir quem continuará a tocar a empresa. A vontade é que seja alguém da família. Mas é preciso ter clareza de que essa nem sempre é a melhor escolha. E de que, seja quem for o escolhido, terá de saber trabalhar com a família. 2) A liderança do patrimônio: quando se pensa em partilha, há uma espécie de mudança de regime. O fundador era um monarca, que comandava tudo, inclusive quem seria seu substituto. Com a suces-

são, cria-se um presidencialismo ou até um parlamentarismo. Há mais pessoas envolvidas nas decisões. Mas precisa haver alguém que represente a família em negociações, por exemplo. 3) A liderança na família: em geral, a mãe é quem mantém a família unida. É uma espécie de Chief Emotional Officer. É preciso haver sempre uma figura que mantenha as conexões afetivas. A partir dessas reflexões, Lobão propõe a estruturação de um processo de desenvolvimento de um plano estratégico familiar, que enfrente cada uma dessas questões. “Um negócio familiar é um grande paradoxo, cheio de verdades opostas”, afirma. “Meritocracia e equidade, profissionalismo e lugar para a família, haverá sempre visões diferentes. Aprender a gerir esse paradoxo é o grande segredo.” Essa e outras reflexões estarão presentes também no evento Family Business – Gestão de Alta Performance, que a HSM organiza em Campinas no dia 27 de setembro próximo.


Sustentabilidade Carro da reportagem do projeto TOP FARMERS na Fazenda da Toca: novo modelo produtivo comeรงa a mostrar resultados

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As histรณrias dos melhores produtores do Brasil

foto: Emiliano Capozoli

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TOP FAR ME R O R G Â N I COS

NA PISTA DA AGRICULTURA ORGÂNICA Pedro Paulo Diniz trocou o circo da Fórmula 1 pela fazenda da família e decidiu replicar na produção agrícola as mudanças que vinha realizando em sua própria vida. Agora sonha em ver esse conceito espalhado por lavouras e pomares do Brasil todo Por Romualdo Venâncio | Fotos Emiliano Capozoli

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uando comecei a pensar nes-se projeto, eu não entendia nada de agricultura.” É assim que Pedro Paulo Diniz descreve seu primeiro desafio para fundar, em 2009, a Fazenda da Toca. O empreendimento surgiu pelo desejo do empresário de produzir alimentos orgânicos em grande escala, para que se tornassem mais acessíveis aos consumidores. O que naquele momento era um fator limitante acabou facilitando um pouco as coisas. “Exatamente por eu ser leigo no assunto me permitia fazer as perguntas mais óbvias, como, por exemplo, se o processo de esterilização das terras com inseticidas, fungicidas e herbicidas não causaria algum problema”, comenta Diniz. A dedicação ao aprendizado de técnicas agrícolas, biodiversidade e sistemas agroflorestais, entre outros temas, tem ajudado a construir algo inspirador. Localizada no município de Itirapina, no interior de São Paulo, a Fazenda da Toca tem 2,3 mil hectares e já pertencia à família de Diniz desde 1970. Mas foi só em meados dos anos 2000 que ele passou a ter uma nova percepção sobre o lugar, certamente motivado pelas mudanças que já vinham acontecendo em sua própria vida. Filho de Abílio Diniz, um dos mais influentes empresários do País, foi piloto e até dono de equipe de Fórmula 1, gozou dos prazeres proporcionados pelo circo do automobilismo até que veio a necessidade de desacelerar. Com isso, surgiram também questionamentos a respeito da relação da humanidade consigo mesma e com o planeta. Em meio a tais indagações, estavam os sistemas de produção de alimentos. A princípio, Diniz decidiu investir na fruticultura orgânica, pois na fazenda já havia pomares de laranja, limão e tangeri-

na, cultivados no sistema convencional. O negócio tomou outras dimensões e, além do plantio das frutas, envolveu a produção de sucos, molhos, lácteos, ovos e grãos. As linhas de produtos finais destinados ao varejo estavam em processo de expansão, mas os rumos mudaram no final do ano passado e, em dezembro, foi definida uma nova reestruturação. “O desenvolvimento desses itens exigia de nós uma energia que acabava faltando em nosso core business”, explica o empresário. Segundo ele, a equipe de campo até já cobrava mais atenção por parte da direção, que andava bastante envolvida com as questões comerciais.

Por eu ser leigo no assunto, me permitia fazer as perguntas mais óbvias”

Obrigatoriamente, a decisão também passou pela análise do retorno financeiro. Diniz não revela os números, mas assegura que a margem de lucro é muito maior na comercialização da polpa de frutas para a indústria do que na venda de uma garrafinha de suco no varejo. “Concretizada a mudança, a empresa trocou de forma rápida e considerável de patamar financeiro”, afirma. “Mas é difícil tomar esse tipo de decisão. Tivemos, por exemplo, que desfazer toda uma equipe de marketing e desenvolvimento de produto.” Agora, os negócios da Fazenda da Toca estão concentrados em fruticultura e avicultura. Os grãos permanecem, mas exclusivamente como insumo para a divisão avícola, que tem hoje a maior representatividade em termos de receita. PLANT PROJECT Nº5

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Criar sistemas produtivos que regenerem é o que me move, virou meu lema pessoal"

O VOO DAS GALINHAS A Fazenda da Toca produz cerca de 60 mil ovos por dia e tem como meta chegar a 100 mil até o final deste ano. Hoje, são aproximadamente 80 mil aves da raça Large Brown distribuídas em oito aviários, que ocupam 68 hectares da propriedade. O tempo de vida produtiva de cada galinha na propriedade é de 90 semanas. Os ovos compõem a única linha que a empresa ainda comercializa com a sua marca diretamente em lojas de varejo, autosserviço e feiras de produtos orgânicos, em São Paulo e no Rio de Janeiro. Há também o fornecimento para outras marcas, como a Taeq, do Grupo Pão de Açúcar (GPA), a Sentir Bem, do Walmart, e a Granja Mantiqueira. O bem-estar animal é primordial na unidade produtiva, por isso boa parte do manejo é automatizada. As aves são criadas soltas no ambiente, têm espaço para ciscar, caminhar e até correr. Na área inter-

na dos aviários, contam com duas linhas de fornecimento de água, poleiros nas laterais, ventilação e casinhas para postura. Os ovos caem em uma esteira que absorve o impacto e os transporta até o local onde um funcionário faz a separação. Ali, passam por uma criteriosa avaliação quanto ao padrão de qualidade e tamanho, para melhor definir o rumo, ou seja, para qual mercado se destinam. A ração oferecida às aves é toda fabricada na própria fazenda. Aliás, boa parte dos insumos também. Cerca de 80 hectares da propriedade são destinados às lavouras de milho, grão que é produzido em um sistema de parceria. Um agricultor que já foi funcionário da Toca é quem responde pela gestão agrícola dos milharais. Este é um setor bastante desafiador em termos de manejo, sobretudo no controle de pragas e plantas daninhas, pois exige muito da mão de obra. É o caso da corda-de-viola, pois o


sistema de produção orgânica não permite o uso de herbicidas químicos, e a retirada dessa trepadeira tem de ser feita manualmente. A fábrica de ração da fazenda produz até 3 mil toneladas por dia. Os principais insumos são armazenados em três silos. Dois deles, com capacidade para mil toneladas, são destinados ao milho, enquanto que um terceiro (três mil toneladas) é utilizado para soja. Na formulação da dieta das galinhas também entram ingredientes homeopáticos e fitoterápicos, pois o manejo sanitário não permite medicamentos convencionais. Por conta disso, é grande a atenção com problemas respiratórios e verminoses. Já a vacinação segue as normas do Ministério da Agricultura, Pecuária e Abastecimento. Teoricamente, a produção de ovos não teria conexão com a produção de frutas. Mas um dos conceitos centrais da Fazenda da Toca é que nada que se produz na pro-

priedade tem apenas uma função. As atividades devem estar integradas para que se consolide a produção agropecuária de regeneração. “Todo o material orgânico residual dos aviários é utilizado para nutrir as áreas de plantio de frutas”, observa Diniz, que complementa: “O conceito inicial sempre foi termos unidades de produção que tivessem sinergia com as outras”. O MODELO IDEAL Uma das primeiras providências para a implantação da fruticultura orgânica na Fazenda da Toca foi a substituição dos pomares convencionais. Conforme avançava, a transição revelou quanto trabalho Diniz teria pela frente. “A produtividade não foi tão boa, pois o desenho anterior era de pomares monoculturais, e já havia muitas doenças instauradas, como o greening”, lembra o empresário. A solução foi erradicar as árvores antigas e substituí-las por outras

já com um novo modelo agrícola. Desde o início, Diniz sabia que para produzir alimentos orgânicos em grande escala era preciso e otimizar ao máximo os processos, até para reduzir os custos. Foi durante o processo de pesquisa, implantação e desenvolvimento da fruticultura orgânica nesses moldes que vieram à tona os sistemas agroflorestais (SAF). Eram esses os modelos que se encaixavam perfeitamente à concepção de uma atividade agrícola de regeneração, em que tudo se conecta e se complementa. “Passamos a olhar bastante para como a natureza lida com os problemas, como uma floresta nativa próspera sem nenhuma intervenção, produzindo e gerando biodiversidade”, comenta Diniz, que acrescenta: “Essa inspiração se tornou um diferencial”. A implantação dos sistemas agroflorestais começou, de fato, há cinco anos, e tende a se expandir pela fazenda. “Este ano estamos PLANT PROJECT Nº5

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foto aérea: Fernando Brisolla

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implantando nosso último modelo, que é para citricultura de limão, consorciado com árvores nativas, bem diversificado”, descreve Diniz. Segundo ele, são 400 hectares com o SAF citros, já implantado de forma mecanizada. Aliás, a ideia é que o manejo seja cada vez mais mecanizado, para ampliar a escala e fortalecer o retorno financeiro. Uma das principais linhas de negócio da Toca é a de polpas de frutas orgânicas, e nesse segmento o limão é o carro-chefe, inclusive atendendo o mercado externo. O limão é exportado, principalmente para a Europa, na forma de suco não concentrado e congelado. Ainda há produção de laranja, embora em uma escala bem menor. Outras frutas, como banana, goiaba e manga, também vão como polpa para os mesmos destinos internacionais, com destaque para Alemanha e França. Uma parte menor desses itens abastece o mercado nacional, suprindo a demanda de indústrias de sucos e outros subprodutos. É em uma fração desses pomares que estão sendo avaliados os SAF que podem ser a plataforma para a produção também de madeira. As árvores estão sendo plantadas em escala experimental para que venham a ganhar maior relevância nos negócios da empresa.

Em áreas onde antes havia pomares convencionais de laranja-bahia, hoje são realizados experimentos com limão, banana e árvores para produção de madeira. As linhas de plantio são formadas com banana ou limão e mogno, eucalipto ou cedro, tudo irrigado por aspersão. Entre os talhões, há o plantio de crotolária e capim-mombaça para a formação de adubação verde. O melhor consorciamento é definido a partir de análises de solo e da matéria verde realizadas pela equipe técnica do setor agrícola. A avaliação determina ainda a integração das plantas de forma que uma complemente o cultivo da outra. “Criar sistemas produtivos que regenerem é o que realmente me move. Isso virou meu lema pessoal”, comenta Diniz, fazendo uma referência aos SAF. Segundo ele, é fundamental aproveitar o que a natureza oferece de forma gratuita para otimizar a produção agropecuária. “Quando você proporciona condições para o desenvolvimento da biodiversidade no solo, passa a contar com milhões de microrganismos que vão trabalhar a seu favor 24 horas por dia e de graça”, explica Diniz, que completa: “Ao colocar um adubo químico ou aplicar um herbicida, acaba prejudicando o que esses fatores gratuitos fornecem”.


“ PEDRO PAULO DINIZ 47 anos

Fundador e CEO da Fazenda da Toca, empreendimento especializado em produção de alimentos orgânicos Ex-piloto e ex-sócio de equipe de Fórmula 1 Divisões de negócios: Produção de ovos e fruticultura Área total da propriedade: 2,3 mil hectares - 68 hectares para avicultura - 400 hectares para fruticultura - 21 hectares de áreas experimentais (Pesquisa e Desenvolvimento) Produção: - Ovos: 60 mil ovos/dia (meta é chegar a 100 mil ainda este ano) - Limão: 260 toneladas - Manga: 125 toneladas - Goiaba: 50 toneladas - Banana: 30 toneladas - Laranja: 40 toneladas Outras atividades: Criador do Instituto Toca, organização sem fins lucrativos voltada à disseminação da cultura do “viver orgânico”; diretor da Península Participações e do Instituto Península, braço social dos negócios da família Diniz que tem como foco a formação de professores. Desejo: Sonha em ver a agricultura regenerativa em todo o Brasil.

Para servirmos de inspiração, temos de ser financeiramente saudáveis, socialmente justos e regenerativos para o planeta”

O APRENDIZADO CONTINUA Diniz faz questão de afirmar que o projeto da Fazenda da Toca não está concluído. Na verdade, longe disso. No entanto, os objetivos são muito claros, e isso é o que dá direção ao desenvolvimento e aumenta a confiança de alcançar novas conquistas. O empresário garante que a cada projeção financeira dos sistemas agroflorestais a surpresa é sempre positiva em relação à rentabilidade, à remuneração do capital. “O sucesso para nós é influenciar o máximo de pessoas que pudermos com o que fazemos, mas para servirmos de inspiração temos de ser financeiramente saudáveis, socialmente justos e regenerativos para o planeta”, analisa. O empresário não faz a menor cerimônia para dizer que ainda há muito o que fazer, inclusive na estruturação para o crescimento do empreendimento. Mas desde o começo da Fazenda da Toca vem trabalhando para multiplicar o conceito de regeneração e o sentimento de compromisso com a preservação do planeta. É essa ideia que tem sido transmitida na escola da fazenda, uma instituição

de ensino que abriga 40 crianças, entre filhos de funcionários (cerca de 70%) e alunos que vêm dos municípios nos arredores. “Os princípios são os mesmos, ajudar essas crianças a entenderem de forma sistêmica como o mundo opera”, diz Diniz. O ensino aplicado na escola da fazenda favorece a autonomia e o desenvolvimento da maturidade das crianças. Para os alunos com até 7 anos, por exemplo, fase em que a linguagem típica é brincar, não há um modelo com regras preestabelecidas para as atividades. A prioridade é estimular a criatividade, e os educadores observam as investigações das crianças e exploram isso da melhor maneira possível. Sempre tendo a natureza como mestra, como uma grande sala de aula. “A educação é fundamental para fazermos uma mudança cultural e de paradigmas”, ressalta Diniz. Quando pequeninos, em seu momento de brincadeiras, fazem questão de explicar à reportagem o que é um meliponário, isso é sinal de que há uma alfabetização ecológica em andamento.

foto aérea: Fernando Brisolla PLANT PROJECT Nº5

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produtividade média das lavouras brasileiras do milho de primeira safra chegou a quase 5,5 mil quilos por hectare na temporada 2016/17. É o que mostra o levantamento feito em junho pela Companhia Nacional de Abastecimento (Conab). Esse é o maior índice já registrado na série de estudos da instituição. Na Fazenda Frank’Anna, localizada na cidade de Carambeí, na região dos Campos Gerais do Paraná, esse índice passou de 13 mil quilos por hectare, e a meta é chegar a 15 mil, volume já alcançado em parte das áreas destinadas à produção de grãos. “A combinação das características de cada área com as variedades de milho que utilizamos gera resultados diferentes, inclusive de uma safra para outra”, explica Franke Dijkstra, o fundador da Frank’Anna. Dijkstra nasceu na Holanda, mas já está no Brasil há 70 anos. “Cheguei aqui com 5 anos de idade”, diz o produtor, que veio para o lado de cá do Oceano Atlântico em companhia dos pais e de seis irmãos. A família trouxe ainda seu criatório de gado de leite, naturalmente, da raça Holandesa. “Naquela época havia poucos exemplares puros de origem. Meu pai inclusive retornou à Holanda três vezes para buscar mais animais”, recorda Dijkstra. A exemplo de diversos outros grupos de imigrantes, a saída da Europa foi motivada pelas consequências da Segunda Guerra Mundial. A definição do destino geográfico deu-se porque um tio do agricultor já estava no Paraná desde 1938, e havia gostado muito da região. O projeto agropecuário da Frank’Anna começou em 1958, em 90 hectares de terra. Hoje, a fazenda é uma holding familiar, que já está sob os cuidados de Richard e Elisabeth, os filhos do casal Margaretha Anna e Dijkstra. Os negócios agora ocupam 2 mil hectares próprios e mais 400 arrendados e 64

estão divididos em dois segmentos: o agrícola, que é dirigido por Richard, e o pecuário (gado de leite e suínos), que tem à frente Maurício Greidanus, o marido de Elisabeth. A produção de grãos ocupa 600 hectares e, na safra de verão, é dividida 50% com milho e 50% com soja. Embora ainda acompanhe de perto os passos e os resultados da empresa, o patriarca diz que a gestão não depende mais de sua participação. “O grande êxito da fazenda hoje é resultado do trabalho deles, que entendem muito mais das atuais tecnologias e soluções.” Por mais correto que esteja Dijkstra em sua colocação, boa parte da evolução de suas terras em termos de produtividade vem exatamente de uma inovação que ele implantou na fazenda em 1976. Foi naquele ano que, desafiando opiniões contrárias e olhares desconfiados, o produtor abraçou o plantio direto. Primeiro, em uma pequena área, mas logo em seguida passou a utilizar a técnica em toda a propriedade. Como lhe é peculiar, a decisão não foi tomada ao acaso. Muito pelo contrário.

O solo é nosso maior patrimônio. Temos de preservá-lo da melhor maneira possível”

O COMEÇO DA MUDANÇA A primeira vez que ouviu falar sobre plantio direto foi por meio de um técnico agrícola que havia lido um livro de Louis Bromfield (1896-1956), no qual o autor norte-americano sugeria não mais arar a terra. O premiado escritor e roteirista também se


TO P FA R M ER M ILHO

O EMBAIXADOR DO PLANTIO DIRETO Quando entendeu que a produção agrícola é uma relação de troca com a natureza, Franke Dijkstra abandonou o arado e iniciou um processo de reconstrução e preservação de suas terras, que se tornou modelo para o Brasil Por Romualdo Venâncio | Fotos Emiliano Capozoli

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tornou mundialmente conhecido pelos experimentos que realizou em sua propriedade, a Malabar Farm (Wichita Falls, Texas, EUA), para reverter o quadro de deterioração do solo, já muito fraco em nutrientes e com marcas de erosão. Essa era também a condição que vinha se alastrando na Fazenda Frank’Anna devido à exploração excessiva das terras. A primeira cultura plantada na propriedade foi o arroz, que por uma questão mercadológica logo deu espaço ao milho. A baixa produtividade das lavouras demandou uma busca por saídas que aquecessem os negócios. “Nos anos 1960 passamos a trabalhar também com trigo e soja, até arrendamos mais áreas para plantar. A possibilidade de compor uma rota-

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ção de culturas parecia uma maravilha. Mas não foi bem assim”, lembra Dijkstra. A movimentação para preparar o solo duas vezes ao ano acabou trazendo sérias consequências. O processo de erosão ficou quatro vezes mais rápido e acendeu a luz de emergência. “Precisávamos achar uma solução. Muitos produtores foram para o Mato Grosso, onde as terras eram planas. Mas eu não queria sair daqui.” Dijkstra até saiu de Carambeí, mas para buscar conhecimento e retornar. Em 1972, foi aos Estados Unidos para saber mais sobre o plantio direto e voltou convencido de que a resposta para sua fazenda era não movimentar mais o solo. Pouco tempo depois, uma feliz coincidência fortaleceu aquela

Você não vai colher mais do que plantou. Mas, se fizer tudo com precisão e qualidade, vai funcionar”

escolha. Em um encontro casual, outro agricultor da região, Manuel Henrique Pereira, o Nonô, lhe contou que também havia optado pelo plantio direto. Daí para a frente, a proximidade de ambos só aumentou, seja para discutir a teoria, seja para avaliar a aplicação prática. A dupla foi buscar o apoio de um especialista em efeitos de máquinas sobre o solo, o engenheiro agrônomo holandês Hans Peeten, que prestou o auxílio técnico para a implantação do sistema. Quando os resultados começaram a aparecer, Dijkstra sentiu que deveria compartilhar a experiência. “Se temos esse conhecimento e estamos convencidos de que é o caminho certo, temos de repassar”, observa. Teve início uma sequência de palestras por diversas regiões, o que rapidamente difundiu o plantio direto. O agricultor ressalta ter sido muito importante o apoio de instituições de pesquisa como o Instituto Agronômico do Paraná (Iapar) e a Empresa Brasileira de


Pesquisa Agropecuária (Embrapa). “Em 1983, o presidente da Embrapa à época, Eliseu Alves, achou que seria caro e complicado para os produtores aderirem ao plantio direto”, comenta Dijkstra, que continua: “Mas assim que mostramos o que estávamos conseguindo, quais eram os avanços e de onde tirávamos informações, ele não só ficou convencido como deixou claro o interesse em firmarmos um convênio para divulgar a tecnologia”. Por causa da peregrinação dentro e fora do País para compartilhar tal conhecimento, Dijkstra se tornou uma espécie de embaixador do plantio direto e conquistou o respeito de muita gente importante no setor. É o caso de Alysson Paolinelli, presidente da Associação Brasileira dos Produtores de Milho (Abramilho). “Franke Dijkstra foi um grande pioneiro, não só porque acreditava na tecnologia que estava implantando, mas porque fez de sua propriedade um difusor de tecnologia”, afirma o dirigente,

que também é produtor e uma das mais significativas lideranças do agronegócio brasileiro. “O impacto do sistema de plantio direto foi muito grande na redução das perdas e na conservação do solo, na diminuição de adubação e ganhos de produtividade”, acrescenta. Para Paolinelli, a população urbana, que de maneira geral desconhece até a origem dos alimentos, deveria ser informada sobre esses avanços da produção agrícola. “Se temos uma tecnologia que reduz fortemente os danos que eram causados ao meio ambiente antes dela, é de extrema importância que se diga ao homem da cidade que o campo está cuidando para que haja sustentabilidade”, comenta. E reforça que essa comunicação é responsabilidade do próprio meio rural. EFICIÊNCIA PRODUTIVA Entre as principais vantagens do plantio direto, Dijkstra ressalta a reconstrução da qualidade do solo. Segundo ele, ao longo dos

anos há um processo de capitalização da terra com matéria orgânica, e essa é a base para o armazenamento de nutrientes e água. É preciso ter paciência e ser persistente, pois a transformação ocorre de forma lenta e gradativa. Além disso, esse sistema não vai gerar os resultados esperados se utilizado isoladamente. “Há todo um sistema de produção com fatores como a rotação de cultura que o agricultor precisa aderir”, orienta o produtor. “Em áreas onde tiramos a forrageira e toda a massa verde, a cada dois anos fazemos duas coberturas só para alimentar o solo, que é o nosso maior patrimônio e temos de preservá-lo da melhor maneira possível”, acrescenta. Esse é o alicerce para se alcançar a meta de produtividade média de milho em 15 mil quilos por hectare. Mas há muito mais fatores que entram nessa equação, como explica Richard Dijkstra: “Precisamos escolher materiais genéticos superiores em termos de potencial PLANT PROJECT Nº5

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“ FRANKE DIJKSTRA 75 anos, casado

Fundador da Fazenda Frank’Anna: a empresa é hoje uma holding e os negócios foram passados aos filhos Área total da propriedade: 2 mil hectares – há mais 400 hectares arrendados Área destinada à produção de grãos: 600 hectares – na safra de verão, 50% das terras são plantadas com milho e os outros 50% com soja Produtividade O índice médio nas lavouras de milho é superior a 13 mil quilos por hectare, e a meta é chegar a 15 mil hectares Outras atividades Pecuária leiteira – 700 vacas da raça Holandesa em lactação com produção média de 37 litros por dia. A meta é chegar a mil vacas em ordenha no prazo de três anos Produção de suínos – cerca de 800 animais acabados por mês Hobbies: Velejar, pescar e ler Desejo: Espera ver a educação mais valorizada, pois entende que é o caminho para começar a reduzir desigualdades sociais. Para o agricultor, cada cidadão deve ter seu desafio e uma possibilidade de vida, de futuro

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É a necessidade que estimula a busca de soluções. Aqui, precisávamos de pesquisas próprias para definir o que de fato era melhor para nós”

produtivo, acertar na adubação e contar com a ajuda do clima”. A precisão na agricultura é outro fator decisivo para se chegar aos objetivos de colheita. “A gente deve realizar o plantio da melhor maneira possível, fazer as intervenções na hora certa e de maneira correta, organizar os talhões e trabalhar com maquinário de primeira linha”, afirma Richard, lembrando que, se o começo não for bem feito, não há como corrigir mais adiante. “Você não vai colher mais do que plantou, mas, se fizer tudo com precisão e qualidade, vai funcionar.” A adubação é outro ponto forte no manejo das lavouras da Frank’Anna. O esterco gerado pela unidade pecuária vai para um sistema de compostagem e depois segue por uma tubulação para ser distribuído nos campos por meio de fertirrigação. Com os solos já bem corrigidos por conta do plantio direto, esse material orgânico potencializa os resultados e promove economia de insumos. “Reduzimos bastante a deposição de fósforo. Entramos com uma aplicação mínima apenas para fortalecer a emergência das plantas”, explica Richard. A margem de acerto na utilização dos insumos ainda é favorecida pelo direcionamento técnico que vem da Fundação ABC, órgão de pesquisa criado pelas coopera-

tivas Frísia (antiga Batavo), Capal e Castrolanda em 1984. O objetivo era exatamente gerar conhecimento de forma transparente e sem vínculos com interesses comerciais, ou seja, analisar e definir quais os insumos mais adequados às características de cada região. Como essa independência tem custo, cada produtor associado às três cooperativas paga uma taxa de R$ 25 por hectare. Franke Dijkstra foi um dos fundadores e o primeiro presidente da Fundação ABC. “É a necessidade que estimula a busca de soluções, e aqui precisávamos de pesquisas próprias para definir o que de fato era melhor para nós”, diz o produtor. “Já são mais de 500 experimentos que nos indicam o que dá mais resultado.” Os ganhos em qualidade também ajudam a buscar melhores oportunidades comerciais. Embora o milho seja uma commodity com padrões de grão predefinidos, há a possibilidade de encontrar nichos mais atraentes no mercado externo, mesmo sendo menores e regionais. A busca por melhor rentabilidade é uma constante na Frank’Anna e, nos próximos anos, pode até mexer com a representatividade do milho nos negócios da empresa. Richard explica que, além do custo de produção muito elevado, falta uma política nacional mais apropriada para o segmento.


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OUTRAS ATIVIDADES A produtividade nos campos de soja da Frank’Anna é superior a 4,6 mil quilos por hectare. Na divisão de pecuária, o gado de leite é um destaque, e segue os mesmos princípios de qualidade em todo o processo e de busca por alta produtividade. Ao todo, são 1.430 fêmeas da raça Holandesa, das quais 700 estão em lactação com produção média de 37 litros/dia. A ideia é chegar a mil vacas em coleta de leite em um prazo de três anos. Na suinocultura, o volume é de aproximadamente 800 animais terminados por mês. Em breve, pode haver novidades nos negócios da família. Richard e seu filho do meio, que

é engenheiro agrônomo, começaram uma produção de cerveja, apenas como um hobby. “Quando ele tinha uns 19 anos, pediu de presente de aniversário algumas panelas para fazer cerveja”, conta Richard. “Na primeira tentativa, conseguimos uma pilsen razoável. Na segunda, fizemos uma weiss que ficou muito boa e empolgou”, acrescenta. “Agora, nosso carro-chefe é uma german lager.”

Enquanto isso, Franke Dijkstra procura se dedicar um pouco mais aos momentos de tranquilidade em seu apartamento na praia, onde aproveita para colocar a leitura em dia. “Leio de tudo um pouco, mas gosto muito de história. Sempre me dá um norte e ajuda a conhecer mais o ser humano e a entender melhor o que dá certo ou não na vida”, comenta o produtor.

Se temos o conhecimento e estamos convencidos de que é o caminho certo, temos de repassar”

foto aérea: Tiago Alves

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REIMAGINANDO A AGRICULTURA BRASILEIRA

O DNA TROPICAL DA OUROFINO Empresa brasileira investe no desenvolvimento de defensivos agrícolas adaptados à realidade nacional

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Plant + Ourofino

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as últimas décadas, o Brasil deixou a incômoda condição de importador de alimentos para se tornar um dos principais produtores de grãos, frutas, fibras e biocombustíveis do planeta. Essa revolução só foi possível graças à adequação de tecnologias desenvolvidas no exterior para a realidade brasileira, o que possibilitou o melhoramento dos solos no Cerrado e a adaptação de sementes para a agricultura tropical, ambos liderados pela Embrapa. Na área de defensivos, no entanto, os avanços ficaram muito aquém do potencial do agronegócio brasileiro. A defasagem é explicada pelo fato de as principais empresas do setor estarem sediadas no hemisfério Norte, onde desenvolvem seus produtos. Esta realidade, no entanto, está prestes a mudar. E a responsável por isso é a Ourofino Agrociência, empresa brasileira que, focada no desenvolvimento de produtos adaptados à realidade do agricultor brasileiro, conseguiu abrir terreno em um segmento dominado por multinacionais do setor químico. A aposta na expertise e na ciência nacional vai ganhar ainda mais força. A Ourofino resolveu transformá-la no propósito da companhia – Reimaginar a Agricultura Brasileira – e mover seus futuros investimentos. O DNA inovador da Ourofino foi forjado sob o clima quente e úmido das lavouras brasileiras, que permite produzir 365 dias por ano. Por outro lado, o Brasil sofre com a falta de um inverno rigoroso, que faz o controle natural das pragas nos países de clima temperado. Dessa forma, a necessidade de controle de invasores por aqui é muito maior. Outras particularidades da agricultu-

agrociencia

ra brasileira, como o plantio direto, também são prejudicadas com a baixa eficácia dos produtos desenvolvidos no exterior. “Enquanto nos Estados Unidos e Europa o uso de aração e gradagem do solo é usual, aqui utilizamos o plantio direto na palha. Essa palha é uma barreira física para que um herbicida chegue ao solo”, explica Luciano Galera, diretor de Marketing, Pesquisa e Desenvolvimento da Ourofino. “Quando um herbicida é aplicado no hemisfério Norte, o produto atinge diretamente o solo. Aqui no Brasil, esse produto precisa ultrapassar a palha e com isso parte do que foi aplicado acaba ficando exposto aos raios solares, o que causa fotodecomposição. Esses fatores fazem com que o pesticida perca suas características e, consequentemente, performance.” Por esses motivos, a estratégia da empresa passa pela melhoria das formulações hoje existentes no mercado, tropicalizando-as e tornando-as mais eficientes para as condições locais, contribuindo para a sustentabilidade nas lavouras. Produzidos em uma das mais modernas fábricas do gênero no mundo, localizada na cidade de Uberaba, em Minas Gerais, os defensivos da Ourofino são desenvolvidos em parceria com instituições respeitadas, como a Embrapa e a Unesp, o que garante a qualidade e a eficiência das novas formulações. As melhorias estão sendo mensuradas e validadas pela equipe liderada por Edivaldo Velini, professor titular da universidade. Os estudos realizados por sua equipe auxiliam a companhia a identificar as modificações que podem ser feitas. Depois, os profissionais também participam da avaliação dos PLANT PROJECT Nº5

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O laboratório, o armazém e a fábrica da Ourofino em Uberaba (MG): uma das mais modernas do mundo

Produzido para a Ourofino Agrociência pelo Studio Plant Conteúdos Especiais

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resultados obtidos. “O Brasil tem sido muito eficaz em criar sistemas de produção em regiões tropicais que são muito distintos daqueles praticados em outros países. Em síntese, os principais objetivos são reduzir riscos, aumentar a eficácia, racionalizar o uso e dar sustentabilidade à produção em um contexto de agricultura tropical de alta eficiência,” afirma Velini. A empresa está investindo no mercado de defensivos biológicos, no qual conta com uma parceria com a Embrapa, num acordo de cooperação entre as partes. “Estamos desenvolvendo, em conjunto com a Ourofino Agrociência, uma coleção de microrganismos que produzem toxinas para combater pragas agrícolas, transformando-os em produtos. Trabalhamos com uma metodologia de produção em larga escala e no desenvolvimento de praguicidas adaptados à agricultura tropical”, afirma Rose Monnerat, presidente do portfólio de defensivos biológicos da Embrapa. Para a pesquisadora, o principal diferencial desses produtos é a eficácia tanto em grandes lavouras quanto em culturas de menor escala, já que o registro dos defensivos biológicos é feito por pragas e não por cultura, como acontece com os químicos. “As bactérias, vírus e fungos são específicos. Eles causam doenças somente nas pragas-alvo. Dessa forma, você preserva os inimigos naturais”, explica Rose Monnerat. A Ourofino prevê a entrada nesse mercado nos próximos anos.

Um dos grandes desafios mundiais da agricultura é produzir alimentos para uma população que tem crescido de forma acelerada nas últimas décadas. O planeta abriga hoje mais de 7 bilhões de pessoas, mas, segundo estimativas da FAO, essa população deve chegar a 11 bilhões até 2050. Nesse cenário, o Brasil desponta com potencial para ser um dos grandes protagonistas para produção de alimento em todo o mundo. Mas isso não será possível sem o uso de tecnologias que possibilitem uma maior eficiência nas lavouras. “Diante desse desafio, a Ourofino Agrociência decidiu iniciar um trabalho de reposicionamento estratégico para atender aos desafios do produtor brasileiro”, afirma Everton Molina Campos, Gerente de Inteligência e Comunicação Competitiva da companhia. Com o novo propósito definido, fez-se necessário a criação de uma identidade corporativa própria e que representasse o novo momento da empresa. Foi criada uma nova logomarca para expressar o novo propósito. “O losango faz uma referência ao fechamento do diafragma da lente de uma máquina fotográfica e está relacionado a Reimaginar, um novo olhar. Já as faixas verdes presentes no logo remetem às linhas de espaçamento da Agricultura. O verde e amarelo representam as cores da bandeira do Brasil. Assim, a junção dos três elementos traz o significado de nosso propósito, que é Reimaginar a Agricultura Brasileira”, completa Campos.


Fo FORU M

Ideias e debates com credibilidade

foto: quietbits / Shutterstock.com

As grandes ideias só saem do papel quando existe ousadia e coragem para romper paradigmas”

PLANT PROJECT Nº5

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Fo

A colheita de Cannes ALBERTO MENEGHETTI Sócio-diretor da Agência e21

Mais um ano estive acompanhando o Cannes Lions e mais um ano que me pergunto o que ela, afinal, sinalizou para nós, publicitários. No Festival Internacional de Criatividade de Cannes, os prêmios em si – os famosos Leões – deixaram de ser o mais importante. São aproximadamente 600 palestras, seminários e workshops, de temas mais variados, como a realidade virtual, as novas plataformas de mídia, a inteligência artificial e as suas cada vez mais presentes aplicações, a onipresença do mobile, a diversidade, as questões sociais e o empoderamento feminino. É sobre o engrandecimento da figura feminina que eu queria traçar um paralelo entre o que vi em Cannes e o atual estágio da nossa comunicação para o agronegócio -- que ainda engatinha, mas que tem de se alinhar com as tendências globais. Na mais recente pesquisa feita sobre hábitos do produtor rural pela ABMRA, uma das grandes novidades foi exatamente a constatação de que as mulheres têm exercido um papel cada vez mais importante no agronegócio brasileiro, apontando que elas triplicaram sua importância na gestão da atividade rural, passando de 10% para 31%. O poder do smartphone, que se tornou um hub completo de informação, tanto foi destaque na pesquisa junto aos produtores como nas palestras em Cannes. Numa delas, assisti ao produtor de cinema Jeffrey Katzenberg se referir aos smartphones como a “New TV”. As novas tecnologias estão sendo aplicadas tanto à comunicação como sendo adotadas fortemente pelo campo. Na publicidade, a cada ano que passa a tecnologia fica mais “smart”, viabilizando esforços de marketing one to one de alta eficácia. Essa definição da estratégia de jornada do cliente passa, necessariamente, por ferramentas e dashboards complexos. Na ala denominada “Innovation”, pude conhecer inúmeras soluções de identificação do perfil dos usuários nas redes sociais, seus sentimentos e reações, deixados por seus rastros na grande rede. A inclusão das categorias Interactive, Mobile, Innovation e Creative Data explica o fato de que os maiores patrocinadores de Cannes deste ano tenham sido 74

grandes players de tecnologia, como Google, Facebook, Oracle e Snapchat. Que não ficaram longe de críticas, por sinal. A maior delas partiu de Marc Pritchard, CEO da Procter & Gamble, o maior anunciante do planeta. Mais uma vez ele chamou de “bagunça digital” o ecossistema montado pelos serviços de mídia on-line, que se tornaram uma força poderosa na indústria da publicidade, atuando de uma maneira independente. Repetiu, em Cannes, seu discurso dizendo que, se Google, Facebook ou qualquer outra plataforma não entregarem dados certificados por terceiros ou adotarem medidas contra tráfego fraudulento ainda este ano, está pronto para não gastar mais com eles. A grande ironia talvez tenha sido o fato de a campanha mais premiada e saudada como a big idea do ano, a icônica “Garota Destemida”, não tenha nada de inovador e tecnológico. Foi somente uma estátua de bronze de uma menina desafiadora, colocada bem em frente ao touro de Wall Street. Com foco no Dia Internacional da Mulher, a criativa ação pretendeu simbolizar a força das mulheres na liderança. O poder da criatividade se mostrou por inteiro em Cannes e aponta um caminho para uma comunicação muito mais “politicamente correta”, sem dúvida. Mas também nos mostra que as grandes ideias só saem do papel quando existe ousadia e coragem para romper paradigmas. O cineasta David Lynch, na palestra “Why We Are Creative”, definiu: “Não existe nada mais empolgante do que realizar uma ideia, tornar algo abstrato em algo material”. 5 TENDÊNCIAS APONTADAS NO CANNES LIONS #1: TECNOLOGIA + CRIATIVIDADE: A tecnologia se revelou a melhor amiga da criatividade. O somatório das duas expandiu a oferta das big ideas. #2: VR É A NOVA REALIDADE: A realidade virtual e a realidade aumentada provaram que o seu uso na publicidade é irreversível. Criar experiências imersivas aumenta o engajamento dos consumidores. #3: DIVERSIDADE É O NOME DO JOGO: Nunca se viu tanta pluralidade e multiplicidade de gêneros, perfis sociais, culturais, étnico-raciais, gêneros, necessidades especiais e orientações sexuais diferentes. #4: O EMPODERAMENTO FEMININO NA ORDEM DO DIA: o femvertising e o empowering foram destaque em campanhas que ajudam a combater o preconceito e a melhorar a igualdade de gênero. #5: MÍDIA É UM CONCEITO MUITO AMPLO: A mídia tradicional morreu. Um produto, um serviço ou uma ação podem se tornar a plataforma de comunicação da marca. Vide o premiadíssimo case “Fearless Girl”, que iniciou uma conversação global sem dizer uma única palavra.


Resiliência e evolução do produtor e da produtora rural JOÃO HILÁRIO DA SILVA JR.

Fundador e proprietário da JH Business to Farmer

Se tivéssemos que dividir o mundo em dois, sem dúvida o produtor e a produtora rural seriam o meio. Como elo central da maior, mais diversa e complexa cadeia produtiva, certamente a gama dos negócios que existem em sua função -- seja do lado do insumo, seja do lado da originação -- é a maior de todas. E isso já não é mais, digamos, uma novidade nem para o mundo urbano. A importância econômica, ambiental e social da atividade produtiva rural agrícola ou pecuária é senso comum em qualquer fórum no Brasil e pelo mundo afora. Ainda de maneira tímida e com pouca relevância, o conceito de Business to Farmer (B2F) está chegando. O B2F, ao lado dos já consagrados B2C (Business to Consumer) e do B2B (Business to Business), visa congregar os negócios de marcas, produtos, serviços e tecnologias que têm seu foco no produtor e na produtora rural. O foco do B2F é o "F". Precisamos entendê-lo e "traduzi-lo" ao mundo do "B", buscando eficiência, resultados e ganhos para ambos. Nesse sentido, recentemente, a Associação Brasileira de Marketing Rural e Agronegócios (ABMRA) trouxe a sua contribuição com a divulgação dos resultados da sua 7ª Pesquisa de Hábitos do Produtor (e da Produtora) Rural. Legítimo e meritocrático, o protagonismo da mulher está cada vez mais se fazendo destacar também na produção rural brasileira. A pesquisa nos mostra que 31% das propriedades produtivas rurais brasileiras contam com mulheres no seu gerenciamento. A presença feminina nas funções de gestão e decisão dos empreendimentos rurais triplicou desde a última enquete realizada pela entidade, em 2013. Uma boa notícia. Porque, como ocorre em todas as demais atividades, geralmente quando a mulher se envolve caem a falta de objetividade, a procrastinação, a supervalorização, as chances de corrupção e aumentam a eficiência, a objetividade e o foco nos resultados. É,

e nós, homens, temos que reconhecer. E correr atrás para não ficarmos muito distantes. O agro, que agora é pop, cada vez mais se mostra ao mundo urbano. E se revela longe daquela imaginária realidade rústica, poeirenta e pobre que se costumava pensar. Além de serem bons gestores e gestoras das finanças de sua atividade, 86% dos pecuaristas e das pecuaristas e 80% dos agricultores e das agricultoras utilizam recursos próprios ou da família para custear os insumos de sua produção e estão cada vez mais tecnológicos. Um total de 33% já utilizam recursos e tecnologias da Agricultura de Precisão e cerca de 14% fazem algum tipo de integração entre lavoura, pecuária e floresta. Cerca de 77% dos produtores e das produtoras rurais que têm acesso à internet costumam utilizar redes sociais, contra 47% registrado no levantamento de 2013. A maior utilização é do Facebook, com 67% dos que acessam a internet. Nada menos que 96% possuem celular e, desses, 61% possuem smartphones (em 2013 eram 17%). E um dado muito legal é que 96% utilizam o WhatsApp! A pesquisa traz interessantes dados que confirmam alguns aspectos percebidos no dia a dia, como a redução da idade média do produtor e da produtora. Entre aqueles que estão à frente das propriedades, a faixa etária de 26 a 35 tinha presença de 15% no levantamento de 2013. Agora, em 2017, passou a 21%. Também houve aumento no número de produtores e produtoras que passam a residir apenas na propriedade rural, não possuindo mais residência na cidade (65% dos pecuaristas e das pecuaristas e 48% dos agricultores e das agricultoras têm residência apenas no campo, frente a 59% e 43%, em 2013, respectivamente). Nesse Brasil, algumas das principais dificuldades e preocupações dos produtores e das produtoras rurais são as mesmas verificadas em qualquer outra atividade produtiva: mão de obra e gestão do negócio. Mas o mais legal é que, apesar do momento de revisão moral e ética que passamos no País, 68% estão otimistas em relação ao futuro da atividade agropecuária no Brasil e 91% têm orgulho de ser produtores e produtoras rurais. Bom para todos nós, que precisamos comer e beber, se vestir, se locomover, morar, escrever, respirar, acender e ligar, viver mais, viver melhor. No conceito do B2F, nossa missão como marcas, produtos, serviços e tecnologias voltados ao produtor e à produtora rural é estar ao seu lado ajudando-os em seus desafios e ganhar sua preferência. É o mínimo que podemos fazer por quem faz tanto. PLANT PROJECT Nº5

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Fo Colômbia, conversamos sobre a Aliança do Pacífico. No Brasil e Argentina, sobre progressos em nossa relação com o Mercosul.

Podemos ser uma ponte para a Ásia MIKE PETERSEN

Enviado especial para assuntos de Comércio em Agricultura da Nova Zelândia

Produtor de ovelhas em seu país de origem, Mike Petersen gasta boa parte do seu tempo viajando o mundo prospectando oportunidades de negócios. No papel de enviado especial para Assuntos de Comércio em Agricultura, ele é um representante dos interesses privados do setor junto à diplomacia e ao governo da Nova Zelândia, um pequeno país que tem na agropecuária a base de sua economia. E que, por isso, investiu na eficiência para se tornar um ator relevante no comércio global. Nessa entrevista, concedida em recente visita ao Brasil, ele explica qual seu papel e o que tem a Nova Zelândia tem a nos oferecer. A maior parte dos países não costuma abrir espaço para produtores atuarem na linha de frente de suas negociações internacionais. Qual o seu papel nesse campo? Não sou um negociador, não fico na sala no momento em que as discussões são travadas. Mas há uma série de debates prévios, em nível governamental em que estou com o ministro, atuando como consultor, aconselhando e obtendo informações sobre o progresso das negociações. Na Nova Zelândia, governo e setor privado têm relação muito próxima. No que tange a negociações de comércio exterior, o governo abre as portas. Mas é o setor privado quem tem a responsabilidade de fazer os negócios acontecerem. A visão dos empresários e produtores é muito importante para o governo entender quais são as prioridades. O que o sr. veio buscar no Brasil? A Nova Zelândia tem olhado cada vez mais para a América Latina, buscando oportunidades, em particular na agricultura. Parte do meu papel é ajudar na diplomacia agrícola e ajudar outros países a compreenderem melhor a agricultura neozelandesa. Outra parte muito importante do meu trabalho é opinar na agenda de comércio exterior. Essa é uma das principais razões pelas quais estou aqui. No México e na 76

O que mais lhe chamou a atenção na visita ao Brasil? Uma das questões que me chamaram a atenção é a de que a agricultura no Brasil é relativamente jovem. Houve muita mudança nos últimos 50 anos, e ainda mais a partir de 1990, com reformas significativas. Há um desejo de uma agricultura ainda mais eficiente e a Nova Zelândia tem interesse em contribuir para isso acontecer. Somos um pequeno produtor no mundo da comida, temos apenas 4,6 milhões de habitantes. Então, exportamos 90% do que produzimos. Como somos pequenos, temos de ser muito eficientes. Outro ponto interessante é que o Mercosul quer fazer mais comércio com o resto do mundo. Nova Zelândia e Austrália certamente estão interessados em ver como podemos ajudar com essa ambição. Não apenas aumentando o comércio entre os dois países, mas como uma ponte para a Ásia. O fato de o Brasil praticar a chamada agricultura tropical, com clima diferente do seu, é uma barreira de entrada para a tecnologia neozelandesa? Nossa pecuária é baseada em raças mais adaptadas ao clima temperado. Mas há algumas raças, particularmente de gado leiteiro como a Kiwi Cross, que têm sido criadas também em climas subtropicais. O sudeste da Ásia é um exemplo. Já estamos exportando genética também para o Brasil. Há um grande projeto leiteiro na Bahia, a Leitíssimo, que tem tido bons resultados. Lá há uma combinação de bom pasto, irrigação, a genética Kiwi Cross e o sistema de gestão neozelandês, que resulta em um sistema de produção muito eficiente. A Nova Zelândia investe muito na chamada “Diplomacia da comida”. O sr. acredita que grandes países produtores como o Brasil deveriam ser mais ativos nesse terreno? Os alimentos têm um papel fundamental na estabilidade global. A segurança alimentar é um item importante nas discussões internacionais, principalmente quando olhamos os números do crescimento populacional. Todos temos uma grande responsabilidade nessa estabilidade, ao assegurar que podemos produzir alimentos da maneira mais eficiente possível e também que as cadeias produtivas e de abastecimento funcionem de forma efetiva para evitar o desperdício. Temos de reduzir as barreiras para o comércio de alimentos para que as pessoas que precisam possam obtê-los de maneira segura e com um custo justo.


Frutos no cafezal da fazenda Good Land, em Goleta, na Califórnia Dez anos de estudos para colher os grãos

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FRONTEIRA

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As regiões produtoras do mundo

foto: divulgação PLANT PROJECT Nº5

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FRONTEIRAS

As regiões produtoras do mundo

Jay Ruskey no viveiro de mudas da Good Land: pioneiro, já conseguiu incluir seu café entre os melhores do mundo 78


Patrocínio

O SONHO DO CAFÉ NA CALIFÓRNIA O clima e o solo desaconselham, mas a tecnologia e a persistência de um grupo de produtores estão colocando o estado americano no mapa dos grãos especiais da bebida Por Núria Saldanha, de Washington (EUA)

foto: divulgação

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Califórnia

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onhecida por ser um celeiro de inovação, pelos vinhos e pelas ondas do Oceano Pacífico, que atraem surfistas e aventureiros do mundo todo, a Califórnia é também uma das principais regiões agrícolas dos Estados Unidos. O estado é responsável pela produção da metade de todas as frutas, nozes e vegetais cultivados no país e seus produtores são capazes de proezas para adaptar culturas a seu solo e climas desfavoráveis. O desafio se repete agora, com uma improvável aposta em uma das maiores paixões dos americanos, o cafezinho. De olho na demanda pela segunda commodity mais negociada no planeta, pequenos produtores de frutas estão desafiando as características da região e colhendo, acredite, café Arábica. Embora a agricultura seja muito próspera na Califórnia há longas décadas, o cultivo de café no estado surpreende por dois motivos. Primeiro, porque entre os 50 estados americanos, apenas o Havaí conseguia produzir café até então. Segundo, devido à geografia. O café é tradicionalmente cultivado nas regiões tropicais, próximas à linha do Equador, como Brasil, Colômbia e Costa Rica, que

foto: divulgação

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contam com chuvas bem distribuídas o ano todo. A cultura requer volumes pluviométricos elevados, que vão de 600 mm a 1.500 mm ao ano. Um cenário bem diferente do encontrado na Califórnia, localizada acima da linha equatorial, onde o clima mediterrâneo de verão seco e o baixo volume de chuvas no inverno (de 250 mm e 500 mm) são os principais entraves para o desenvolvimento de cafezais Mas, com a ajuda de pesquisadores, os agricultores locais parecem ter encontrado uma solução. Estão utilizando sistemas simples de irrigação e a sombra dos abacateiros, largamente produzidos na região, para cultivar cafés premium. “Vivi e trabalhei durante vários anos na região cafeeira da América Central antes de mudar para a Califórnia”, diz Mark Gaskell, pesquisador responsável pela introdução do café na região. “Mas não imaginava que a cultura pudesse ter potencial econômico na Califórnia. Foi quando eu visitei a área de Kona, do Havaí, que percebi que isso podia dar certo, já que eles têm custos trabalhistas e de terra iguais aos da Califórnia.” Os pés de café dão frutos na Califórnia mesmo quando totalmente expostos ao sol, mas é sob os largos pés de avocados, uma espécie de abacate pequeno, que nascem os cafés mais raros e saborosos. É que a sombra reduz a exposição das árvores ao sol, diminuindo a necessidade de irrigação e alongando o período entre floração e maturação para 12 meses. Isso é muito similar ao que acontece com os cafés de alta qualidade das regiões tropicais e subtropicais plantados em montanhas, como o arábica mineiro. E não é que a estratégia americana está dando certo? “Nós enfrentamos muitos desafios inicialmente, como o pH do solo elevado e a falta de água. Também testamos muitas variedades de arábica”, conta Gaskell,


fotos: Louie Hayward

“Felizmente, nesta região próxima ao Oceano Pacífico a temperatura gira sempre entre 10 e 12 graus centígrados, o que proporciona um efeito de esfriamento da terra e das culturas, gerando um cenário próximo ao dos trópicos de altitude.” Doutor em fisiologia e produção agrícola, Gaskell trabalha na Divisão de Agricultura e Recursos Naturais da Universidade da Califórnia e atua como conselheiro para pequenas propriedades rurais. Foi ele o responsável pela implementação do café arábica na região, um movimento que a imprensa americana tem comparado à expansão da produção de vinhos em Napa Valley. Esta não foi a primeira vez que o pesquisador ajudou a introduzir uma nova cultura. Em 1996, ele teve papel fundamental para iniciar a produção de mirtilos na Califórnia. Hoje, o estado é o maior produtor da fruta no país. Gaskell ajuda a elaborar projetos de pesquisa em fazendas e auxilia o gerenciamento técnico de todas as plantações. No início dos anos 2000, ofereceu sementes de café arábica trazidas da América Central para Jay Ruskey, um pequeno produtor de frutas exóticas de Goleta, na região de Santa Bárbara, incentivando-o a iniciar o cultivo. Ruskey topou o desafio e plantou mais de dez variedades de café em meio a suas pitaias, graviolas e limascaviar. Em três anos, os pés de

O músico Jason Mraz e seu cafezal na região de San Diego: plantas protegidas para vencer o clima hostil

café já estavam produzindo as primeiras floradas e os frutos na propriedade de 16 hectares, a Good Land Organics. Em parceria com Gaskell, ele passou a utilizar irrigação por gotejamento e microaspersão três vezes por semana para driblar os períodos de seca e prover a água necessária para o desenvolvimento dos grãos. “O projeto não teria saído do papel sem a compreensão de Jay”, diz Gaskell. “É um compromisso de longo prazo, porque você leva de quatro a cinco anos para começar a obter resultados significativos.” Na Good Land, que significa “terra boa”, o café gourmet é colhido, selecionado, lavado manualmente e, de lá, sai embalado e pronto para o consumo. Ruskey se tornou o primeiro produtor de café comercial da Califórnia e tem orgulho dos resultados conquistados, mas não tira os

pés do chão. Para chegar até aqui, ele diz, “foram mais de dez anos refinando práticas de cultivo e melhorando processos pós-colheita”. A safra dele ainda é pequena -- colheu cerca de 500 quilos em 2015 --, mas a qualidade do café só chamou a atenção da imprensa americana e de outros produtores em 2014. Foi quando o café de Ruskey alcançou a posição 27 entre os 30 melhores no ranking de sabor do guia mundial Coffee Review. Ganhou nota 91 de 100 e foi classificado por degustadores como “pungente, profundo, doce e tonificado”, uma bebida “excepcional”. Assustado com a fama que o pioneirismo lhe trouxe e sem muito tempo para conversa em meio à colheita de uma de suas culturas, Ruskey diz que a recente exposição na grande imprensa foi excelente, mas que não está conseguindo atender a todos PLANT PROJECT Nº5

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Fr

Califórnia

Lago Tahoe

São Francisco

CALIFÓRNIA Santa Bárbara OCEANO PACÍFICO MÉXICO RAIO X CALIFÓ RNIA AGR Í CO LA

US$ 47 bilhões

O portfólio agrícola do estado inclui mais de 400 commodities sendo as 20 mais importantes:

É o valor recebido pelos produtores agrícolas da Califórnia pela comercialização de suas safras em 2015. O estado possui a maior renda agrícola dos Estados Unidos, produz mais de um terço dos vegetais e dois terços das frutas e castanhas do país.

PRODUTO RECEITA

Maiores produtores agrícolas dos EUA ESTADO VALOR DA PRODUÇÃO (EM US$ BILHÕES)

Califórnia............................ 47,07 Iowa...................................... 27,82 Texas..................................... 23,70 Nebraska............................ 23,19 Minnesota.......................... 16,58

Pioneiros do café – 25 produtores espalhados pela região costeira, entre San Diego e Santa Bárbara

Fontes: California Department of Food Agriculture e USDA

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(EM US$ BILHÕES)

Leite e nata........................6,29 Amêndoa............................5,3 Uva.........................................4,95 Bovinos e bezerros........3,40 Alface....................................2,26 Morango..............................1,86 Tomate ................................1,71 Flores e plantas...............1,08 Nozes....................................0,97 Feno .....................................0,45


que ligam ou mandam e-mails. “A minha única maneira de ganhar dinheiro é cultivar a safra e prepará-la para a venda”, explica. “Eu tenho a chance de ganhar uma vez por ano, e agora é a hora.” Mas faz questão de deixar claro que está tentando impulsionar a produção do arábica. Além dos grãos, Ruskey vende pés de café e promove excursões à sua fazenda durante o período de colheita. “Eu acho que o café tem potencial para ser uma indústria crescente por aqui, e, se as coisas funcionarem, podemos fazer da Califórnia uma referência em cafés de qualidade para o mundo”, diz. Seguindo os passos de Ruskey, com a ajuda de Gaskell, 25 pequenos produtores localizados na região costeira da Califórnia, entre as cidades de San Diego e Santa Bárbara, estão cultivando mais de 25 mil pés de café. Muitos ainda nem começaram a produzir, como Jason Mraz. O cantor e compositor, vencedor de dois Grammys, administra a fazenda da família em San Diego, que produz avocados. Preocupado com os riscos de uma monocultura, decidiu buscar um produto mais rentável e foi aí que seu mentor agrícola sugeriu o café. Mraz, que começou carreira musical em uma cafeteria, logo simpatizou com a ideia e aceitou o desafio. As primeiras mudas de café chegaram à propriedade dele em abril de 2015 e foram levadas ao solo em outubro do mesmo ano. Em entrevista à San Diego Magazine, ele contou que

o plantio das 2.300 mudas de 11 variedades de arábica não foi fácil. “Tivemos que cavar mais de 2 mil buracos, e colocar proteção em volta de todas as árvores para que elas suportassem o primeiro inverno”, lembra o cantor. “Mas tem sido um trabalho de amor e os primeiros grãos estão começando a aparecer”, comemora. Mraz acredita ainda que a produção de cafés especiais, aliada ao agroturismo, pode ser a salvação para muitos agricultores californianos que vêm sofrendo com os altos custos da água e a escassez da mão de obra agrícola – devido às políticas de restrição imigratória iniciadas pelo ex-presidente Barack Obama e acentuadas por Donald Trump, uma vez que quase 80% dos trabalhadores agrícolas são estrangeiros. E o que não falta nos Estados Unidos é mercado para o café. De acordo com a National Coffee Association, 62% dos americanos adultos tomam pelo menos uma xícara da bebida por dia. Quem já visitou o país sabe que o tradicional “café americano” é grande, bem aguado e pouco saboroso. Mas o paladar da população parece estar ficando mais refinado e os cafés de alta qualidade ganham cada vez mais espaço. Em 2016, 59% de todas as xícaras consumidas no país continham cafés gourmet e os consumidores disseram estar dispostos a pagar mais por uma boa bebida. Os preços são realmente salgados. Ruskey vende pequenas embalagens de

Café secando ao sol da Califórnia: estado tem potencial para superar o Hawai como principal produtor americano

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Fr

Califórnia

340 gramas do seu café por US$ 65, o equivalente a R$ 216. Gaskell acredita que o cultivo do arábica tem futuro na Califórnia. “Idealmente, nossa indústria do café não será grande, com plantações pequenas e de muita qualidade para serem vendidas em pequenos volumes a preços especiais”, diz. “O maior crescimento do turismo nos últimos anos veio da Ásia e muitos compradores adoram o café da Califórnia.” Não se deve duvidar desse verdadeiro oásis agrícola que tem um longo histórico de adaptação de culturas de outras nacionalidades, como os avocados mexicanos, as tâmaras marroquinas e as laranjas brasileiras. De acordo com especialistas entrevistados pelo jornal The New York Times, a produção da Califórnia pode alcançar ou ultrapassar a do Havaí, que hoje conta com 800 cafezais e uma produção de 4,5 mil toneladas. Se depender do entusiasmo dos agricultores, as sementes lançadas pelo pesquisador ainda vão render muitos frutos. O cantor Mraz planeja sua primeira safra comercial para 2020. “Na década de 1960, as pessoas também achavam que não era possível cultivar uvas para vinho na Califórnia", lembra. "O café não só está crescendo bem na Califórnia como também está desenvolvendo seu próprio perfil de sabor e, neste momento, é um dos cafés mais raros do mundo." 84

foto: divulgação

UM GOSTO AMARGO NO BERÇO DO CAFÉ

Usar a tecnologia para vencer o clima tem sido a arma dos californianos para produzir em seu território grãos, frutos e outros alimentos que, em condições normais, não cresceriam ali. Em outras regiões do planeta, porém, acontece o inverso. O clima em mutação está derrotando os agricultores a ponto de forçá-los a abandonar culturas tradicionais. O mesmo café arábica que começa a crescer na Califórnia, por exemplo, corre o risco de ser lentamente expulso dos terrenos de altitude da Etiópia, berço das primeiras lavouras do grão que depois se espalhou pelo mundo. Um estudo divulgado em junho passado por cientistas britânicos e etíopes aponta que, em virtude dos efeitos da elevação de temperaturas médias em todo o mundo, mais da metade das terras hoje destinadas ao plantio de café arábica no país africano podem deixar de ser próprias para a cultura até o final do século. O dado é alarmante. Cerca de 15 milhões de agricultores etíopes tiram seu sustento dos cafezais e as exportações do grão representam mais de 25% das vendas externas do país, um dos cinco maiores produtores do mundo. Nos últimos anos, a Etiópia já vem enfrentando um quadro desafiador, com secas cada vez mais severas e duradouras. Segundo os cientistas, algo entre 49% e 59% das terras cultivadas com café podem ser irreversivelmente afetadas nas próximas décadas, destruindo a economia do país, a não ser que se encontre alternativas tecnológicas para mitigar esses danos. Levando-se em conta o modelo atual, a tendência é de que as lavouras sejam transferidas para terrenos ainda mais altos, mas que também sofreriam com escassez hídrica e dificilmente conseguiriam suprir o que o clima impróprio destruiu.


Especial aviação A importância das pistas privadas para o agronegócio e os aviões que serão destaque na Labace

W WORLD FAIR

A grande feira mundial do estilo e do consumo

foto: divulagação PLANT PROJECT Nº5

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W WORLD FAIR

A grande feira mundial do estilo e do consumo

PRONTO PARA DECOLAR A rota do crescimento do agronegócio passa diretamente por milhares de aeródromos privados, que garantem mobilidade e eficiência a produtores espalhados pelo Brasil Por Tiago Dupin

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foto: Santa Eliza EcoResort

Aeródromo em meio à lavoura do Santa Eliza Eco Resort, em Ribeirão Bonito (SP): rede de quase 4 mil aeródromos homologados aproxima destinos não atendidos pela aviação comercial

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W Especial Aviação

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ão há como dissociar o agronegócio e a aviação geral. Num país de distâncias continentais e produção em áreas remotas, é com as aeronaves de pequeno e médio porte que muitos empresários compram gado, acompanham a evolução da safra, transportam agrônomos, veterinários e outros profissionais que trabalham no campo. Complementar à malha atendida pela aviação comercial, uma ampla rede de pistas de pouso e uma crescente frota executiva funcionam como o pulmão das relações comerciais das cadeias produtivas agrícola ou pecuária, criando acessos para o desenvolvimento. Na primeira quinzena de julho, por exemplo, uma esquadrilha com quatro aviões fez várias escalas em pistas construídas dentro de fazendas pelo interior do País. A bordo, uma missão de compradores internacionais (a maior parte da Ásia) interessados em conhecer, de dentro da porteira, a produção brasileira de algodão. Ciceroneados pela direção da Associação Brasileira de Produtores de Algodão (Abrapa), eles estiveram em propriedades como a fazenda Pamplona, do grupo SLC, em Goiás, e uma propriedade do grupo Busato, no Oeste da Bahia. Puxado pelo ritmo das supersafras, nos últimos seis anos, a aviação geral cresceu aproximadamente 20% no Brasil. De acordo com dados da Associação Brasileira de Aviação Geral (Abag) , mesmo enquanto a economia brasileira encolhia, a frota saltou 1,1% entre 2014 e 2015, passando de 15.120 para 15.290 aeronaves. Esses números expressivos colocaram o Brasil na lista dos grandes players da aviação executiva mundial nos últimos anos. Atualmente, o país tem a terceira maior frota de jatos executivos do mundo e está no top 5 da aviação geral mundial.É claro que a instabilidade do País atrapalha o desenvolvimento da aviação geral.

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Historicamente, o setor cresce atrelado à ascensão do PIB de um país. Por outro lado, o fato de a aviação regional brasileira atender a apenas cerca de 120 das 5.570 cidades brasileiras mostra que ainda há muito espaço para crescer. Hoje, o Brasil possui aproximadamente 4 mil aeródromos (pista ou superfície destinada a pouso ou decolagem de aeronaves), dos quais 700 são públicos (aberto a todos) e o restante, privados (o proprietário escolhe quem pousa e decola, mas não pode cobrar pelo uso). Desses, 3.566 (sendo 588 públicos) são homologados pela Agência Nacional de Aviação Civil (Anac), responsável pela fiscalização do setor. No mapa nacional das pistas (veja quadro), ganham destaque as regiões agropecuárias. Estados como Mato Grosso, Mato Grosso do Sul, Minas Gerais e Goiás, onde a combinação de grandes distâncias e grandes volumes de produção torna a aviação geral ainda mais relevante, estão entre os que possuem maior número de aeródromos na lista liderada por São Paulo. A quantidade de aeródromos no Brasil é suficiente para atender à demanda. É o segundo do mundo, atrás apenas dos Estados Unidos (cinco vezes maior) e à frente do Canadá, que vem em terceiro. A qualidade do piso, porém, limita seu uso. A maior parte dos nossos aeródromos não é pavimentada. Isso explica o fato de os aviões turbo-hélices (que operam em pistas não preparadas) serem campeões de venda por aqui. É um limitador que não intimida os empresários rurais. Em vários pontos do Brasil, produtores têm se unido para construir, eles mesmos, a infraestrutura para que seus aviões e de seus parceiros e clientes possam pousar e decolar mais próximos de suas propriedades. Uma das novas fronteiras do agronegócio brasileiro, a cidade de Luiz Eduardo Magalhães, no


fotos: Carlos Rudiney

oeste da Bahia, se beneficiou desse espírito empreendedor dos agricultores locais. Até 2007, o município contava apenas com uma pista de terra. Mas eles se cotizaram para construir um aeródromo com pista de 2 mil metros, capaz de receber até aviões de grande porte, que antes tinham de ir a Barreiras, a 90 quilômetros de distância. O grupo Santa Izabel cedeu o terreno de uma de suas fazendas e as obras de base foram pagas pelos próprios empresários. O mesmo aconteceu em Balsas, no Maranhão, outro polo emergente de produção de grãos. Compensa-se, assim, a ausência de uma política pública de incentivo ao setor. Nos Estados Unidos, por exemplo, tudo foi planejado ainda no século passado. Em 1939, em um ato de defesa do território, o governo americano decidiu seguir a tendência da Alemanha na época e construiu cerca de 900 aeroportos. Todas as pistas tinham as mesmas características: 1.200 metros de extensão e pavimento-padrão. A ideia era que as tropas pudessem chegar rapidamente a qualquer ponto do país. A guerra acabou, os aliados venceram e essas pistas foram municipalizadas. Como

eram de excelente qualidade, provocaram um desenvolvimento econômico local extraordinário, pois as companhias aéreas se estabeleceram e criaram uma rede de rotas regionais, fazendo com que os empresários pudessem chegar ao seu destino. Trata-se de um cenário impossível por aqui, pois boa parte dos nossos aeródromos não comporta as aeronaves utilizadas na aviação regional e a maioria das cidades não tem força econômica para receber voos desse tipo. Segundo Francisco Lyra, da CFLY Aviation, os prefeitos dos municípios brasileiros não conseguem perceber a relação entre um bom aeródromo e o desenvolvimento econômico. O tomador de decisão (leia-se empresário) preza muito pelo tempo. Ele viaja para onde conseguem chegar. “O investimento direto, que é quando o executivo precisa ir até o local do negócio, não é recuperável se der errado, diferentemente do especulativo. Então a negociação precisa ser presencial, com uma equipe para avaliar se vale a pena. Se não tem aeroporto no munícipio, ou ao menos próximo a ele, consequentemente aquela cidade sai do mapa de investimento.

Aviões de missão de compradores de algodão na pista da fazenda Busato, na Bahia (no alto) e recepção ao grupo no aeródromo da Fazenda Pamplona, em Goiás: investimento em bons negócios

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foto: divulagação

MAIS PERTO DA FAZENDA

A malha de aeródromos para aviação geral no Brasil ESTADO

PRIVADOS

Acre

TOTAL

7 5 12

Alagoas

21 3 24

Amapá

32 3 35

Amazonas Bahia

9 23 32 134

66

200

Ceará

56 13 69

Distrito Federal

20

Espírito Santo Goiás Maranhão

2

22

13

7

20

136

34

170

62

12

74

Mato Grosso

416

28

444

Mato Grosso do Sul

366

21

387

Minas Gerais

181

79

260

Pará

127 31 158

Paraíba

5 12 17

Paraná

91 37 128

Pernambuco

52 11 63

Piauí Rio de Janeiro Rio Grande do Norte Rio Grande do Sul

23 12 35 154

11

165

7

5

12

54

54

108

Rondônia

34 9 43

Roraima

111 2 113

Santa Catarina São Paulo Sergipe Tocantins Total Fonte: Anac

90

PÚBLICOS

66

22

88

750

75

825

1 1 2 40

10

50

2968 588 3556


foto:s divulagação

Pouso em pista de fazenda: a despeito da crise, aviação geral cresceu 20% no Brasil nos últimos seis anos

E o fato é que as cidades grandes já são extremamente competitivas. E onde é mais barato não tem como chegar. Vivemos um grande dilema”, explica. A CONSTRUÇÃO De acordo com o comandante Decio Corrêa, presidente da Delta Fox, empresa de consultoria aeronáutica, o Brasil vem construindo pistas de pouso em fazendas do interior desde a década de 1920. E isso começou a ganhar ainda mais força na década seguinte, a partir da região Sul do Brasil. Para ele, mesmo com alguns problemas operacionais, temos uma ótima malha de aeródromos. “Apesar de serem pistas de fazenda, elas geralmente são de excelente qualidade para o que se propõem. Hoje já conseguimos ver empresários operando aviões monomotores e bimotores de alta tecnologia embarcada por ali”, afirma Corrêa. A questão da segurança das pistas privadas costuma ser ressaltada por algumas empresas, como a Líder Aviação, ao negociar com seus clientes. Mantê-las em boas condições é fundamental para que o investimento feito em uma aeronave não se transforme em

um futuro problema. Para construir um aeródromo, primeiramente é necessário fazer uma análise da região e submeter o pedido à Agência Nacional de Aviação Civil (Anac). Com isso, consulta--se o Departamento do Controle de Espaço Aéreo (Decea) para solicitar a chamada Zona de Proteção de Aeródromos (ZPA), assegurando que não haverá construções perto da área da rampa de aproximação. “Isso é muito importante para garantir que não haja obstáculos no futuro”, aponta Lyra. Para ele, seria muito importante padronizar os aeródromos públicos e, assim, dar condições aos empresários de chegarem às cidades pequenas também com jatos. “São poucas as pistas que comportam jatos de grande porte”, lamenta Gustavo Toledo, gerente de vendas para o Brasil da Dassault Falcon. “Muitas vezes, quando se tem a pista não há hangar ou ponto de abastecimento. Aí fica inviável. Temos ainda situações em que a cidade tem muito potencial para novas vendas, mas carece de infraestrutura.” De uma maneira geral, no Brasil a economia está migrando da cidade para o campo. Isso

beneficiou a aviação geral, criando uma demanda até então inexplorada. “Posso dizer que o agronegócio representa de 65% a 70% das nossas vendas”, afirma Philipe Figueiredo, diretor de vendas de aeronaves da Líder Aviação, que atua nas áreas de representação, fretamento, gerenciamento e manutenção de aeronaves. Aos poucos, também, a aviação geral tem deixado de ser vista como um serviço de luxo. Foi somente no fim dos anos 1990 e começo dos nos 2000 que o empresário brasileiro percebeu que na verdade a aeronave é uma máquina de ganhar dinheiro e economizar tempo. Com isso, o mercado se tornou mais profissional. Hoje, além de vender a aeronave, os fabricantes e representantes procuram elaborar uma análise de investimento para o cliente. “Precisamos fazer com que o comprador enxergue a aeronave como um investimento, e não um custo. E hoje não se compra mais um produto por impulso, pois o operador já é mais maduro e preparado. O grande fator de decisão é o tempo que se economiza em deslocamento”, finaliza Figueiredo. PLANT PROJECT Nº5

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W Especial Aviação

Novidade no ar: um dos mais modernos na sua categoria, o jato Honda Jet será apresentado na Labace 92


LUCROS QUE VOAM Aeronaves executivas despontam como um instrumento fundamental para o dia a dia do empresário brasileiro. Confira os aviões que serão destaque na Labace, maior feira do setor no País

fotos: divulagação PLANT PROJECT Nº5

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"No plane, no gain”. O trocadilho com a expressão em inglês “no pain, no gain” (sem dor não há ganho) virou uma espécie de mantra da aviação executiva. Há tempos as aeronaves privadas deixaram de ser um mero instrumento de lazer para se tornarem uma ferramenta de trabalho. A lógica é muito simples: quanto mais tempo perdido em deslocamentos para regiões distantes, menor o tempo disponível para um empresário gerar novos negócios. “Somos capazes de mostrar, na ponta do lápis, como o investimento com a aquisição de uma aeronave privada pode resultar em ganhos para as empresas”, afirma Philipe Figueiredo, diretor de vendas de aeronaves da Líder Aviação. “No mundo de hoje é indispensável o empreendedor se locomover rapidamente até o seu local de trabalho ou investimento para gerar novos negócios. E isso, em

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muitos casos, só é possível por meio da aviação geral”, comenta Francisco Lyra, da CFLY Aviation. De fato, uma das principais funções da aviação geral (que é qualquer tipo de aviação que não seja aviação comercial ou militar) é criar um ambiente favorável para fomentar a atividade econômica. Nos últimos meses, a escassez de crédito, aliada à instabilidade do real frente ao dólar, fez com que o empresário esperasse um pouco para definir o seu investimento. Operadores e fabricantes têm, no entanto, motivos para acreditar na recuperação do setor e no crescimento das vendas. Além dos bons resultados das safras agrícolas – que devem impulsionar um mercado que hoje representa, segundo a Líder, mais de 60% das vendas de aeronaves no País, há também uma perspectiva de


forte renovação da frota nacional nos próximos anos. Atualmente, mais de 30% das aeronaves que operam no País têm uma idade média de 27 anos. De acordo com o Anuário Brasileiro de Aviação Civil 2017, 26% da frota de aviação geral concentra-se no estado de São Paulo. No ano passado, 14 estados registraram crescimento no número de aeronaves, com destaque para Goiás (cuja economia é fortemente baseada na produção agrícola), com 39 aeronaves a mais. O termômetro da recuperação poderá ser sentido entre os dias 15 e 17 de agosto, quando a Associação Brasileira de Aviação Geral (Abag) organiza no Aeroporto de Congonhas, em São Paulo, a Labace (Latin American Business Aviation Conference & Exhibition), maior evento do setor da América Latina. Na edição passada, reuniu 136 marcas e 41 aeronaves na exposição estática.

Os maiores fabricantes de aeronaves, peças e serviços estiveram por lá. Ao todo, durante os três dias de feira, passaram por ali mais de 9 mil pessoas. E mesmo num cenário de crise, pelo menos cinco aeronaves foram comercializadas durante o evento e outras várias negociações foram iniciadas. A próxima edição já conta com 90% dos espaços vendidos, mostrando que o pior já passou e o momento é de retomada. Opções não faltam no mercado para quem quer adquirir uma aeronave. De helicópteros a monomotores ou bimotores a pistão, passando por turbo-hélices e jatos de pequeno, médio e grande porte. Tem de tudo um pouco. Mas o mais importante é adequar o produto ao tipo de missão a ser realizada. A seguir, alguns modelos que se destacam pelo mundo afora e que, provavelmente, estarão na Labace 2017. Confira:

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QUATRO RAZÕES PARA ADQUIRIR UMA AERONAVE EXECUTIVA Philipe Figueiredo, diretor de vendas de aeronaves da Líder Aviação Quem atua no mercado de aviação executiva sabe que o nosso papel vai além de vender uma aeronave ou um serviço relacionado ao segmento. Muitas vezes, precisamos também “educar” o mercado e ajudar os clientes a compreenderem o quanto a aviação executiva pode trazer de valor. Isso ocorre porque ainda existe, infelizmente, uma concepção equivocada de que um avião privado é apenas um “luxo”. Na verdade, aeronaves

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particulares são ferramentas de trabalho que geram negócios, renda e desenvolvimento. Sobretudo em um país de dimensões continentais como o Brasil, a aviação executiva oferece um importante diferencial competitivo para as empresas que a utilizam. Por isso, se você está pensando em formas de otimizar seu negócio, mas ainda não considerou a aquisição de um avião ou helicóptero, leia abaixo quatro razões que o farão mudar de ideia.


1.

GANHO DE TEMPO

Com a aviação executiva, você controla o seu tempo e passa a ter uma verdadeira máquina do tempo trabalhando a seu favor. Com a correta gestão da aeronave, ela estará sempre à disposição, pronta para partir em questão de minutos. É possível, por exemplo, decolar de São Paulo pela manhã, ter um almoço de negócios em Brasília, passar a tarde em um cliente ou fornecedor no Tocantins e retornar para a casa no fim do dia. E tudo isso de acordo com o seu horário e a sua necessidade.

2.

FLEXIBILIDADE E VERSATILIDADE

Num país tão grande como o nosso, só a aviação executiva é capaz de cobrir praticamente todo o território nacional. Para se ter uma ideia, dos 3.655 aeródromos brasileiros, apenas 137, ou 3,7%, são atendidos pela aviação comercial. A situação é ainda mais crítica para quem atua no agronegócio, uma vez que regiões produtoras importantíssimas ainda não contam com infraestrutura de transportes proporcional à riqueza que geram para o País. Por isso, muitos produtores têm obtido ganhos consideráveis de tempo e de produtividade ao utilizar aeronaves

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para deslocar com mais agilidade gestores e técnicos essenciais para o dia a dia da propriedade. Afinal, só um avião particular permite aterrissar na própria fazenda, executar o trabalho e retornar ao escritório num só dia. E se surgir algum imprevisto ou emergência, isso não será um problema. Basta informar a tripulação e mudar a rota.

3.

PRODUTIVIDADE A BORDO

Se você viaja com frequência, experimente calcular o tempo gasto em deslocamentos até o aeroporto, espera para embarque e desembarque,

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sem contar a própria duração do voo. Some tudo isso e perceberá que, ao longo de um ano, você terá desperdiçado muitos dias de trabalho em uma atividade nada produtiva. A aviação executiva transforma esse tempo em valiosas horas de trabalho. Com uma aeronave à disposição, você pode eliminar de sua agenda os horários reservados para enfrentar a logística da aviação comercial. Basta chegar e embarcar. Além disso, aeronaves executivas oferecem toda a privacidade e conforto de uma sala de reunião, para que você possa se reunir com a equipe e tenha, em voo, a mesma produtividade do escritório.


4.

QUALIDADE DE VIDA

Em muitas ocasiões, o dinheiro torna-se menos importante que a oportunidade de passar mais tempo com a família. E, quando a qualidade de vida passa a ser a prioridade, não há ferramenta melhor que a aviação executiva. Com uma aeronave privada, não será mais preciso passar noites desnecessárias em hotéis, ou perder eventos importantes da sua vida pessoal. Seja qual for a missão, será sempre possível voltar para a casa no fim do dia. Depois de conhecer algumas razões que o farão considerar a compra de uma aeronave, vale reforçar

uma dica essencial: buscar uma orientação especializada para ajudá-lo na aquisição. Todo investimento é mais eficiente quando feito com o auxílio de um especialista, e na aviação executiva não é diferente. Trata-se de um mercado que exige muito conhecimento técnico e expertise na hora de se escolher o modelo ideal de aeronave para cada perfil de operação. Por isso, ao contar com uma equipe especializada na compra e venda de aeronaves executivas, o cliente terá informações detalhadas e transparentes sobre as melhores opções e os custos envolvidos, para que possa tomar a decisão mais assertiva e, assim, beneficiar-se de todas as vantagens que a aviação executiva tem a oferecer.

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W Consumo SUÍTE PRESIDENCIAL: APESAR DE TODO O LUXO E EXCLUSIVIDADE DE SUA PRIMEIRA CLASSE, A ETIHAD FOI ALÉM E CRIOU UM CATEGORIA AINDA MAIS PREMIUM. BATIZADA DE THE RESIDENCE, A CABINE TEM 11 M2 E TRÊS AMBIENTES: UMA SALA DE ESTAR, ONDE FICAM DUAS POLTRONAS E UMA TV DE 32 POLEGADAS, SEGUIDO DE UM QUARTO COM CAMA, E O BANHEIRO, EQUIPADO COM CHUVEIRO. ALI, O PASSAGEIRO TEM DIREITO A SEU PRÓPRIO CHEF DE COZINHA E MORDOMO E A UMA LIMOUSINE PARA OS TRASLADOS. NÃO À TOA, A THE RESIDENCE OSTENTA O TÍTULO DE MAIS CARA DO MUNDO. O TRECHO ENTRE NOVA YORK E ABU DHABI, POR EXEMPLO, SAI POR VOLTA DE US$ 32 MIL.

DÊ ASAS AO CONFORTO Conheça algumas das melhores cabines de primeira classe do mundo Por Fabricia Peixoto

DUCHA DOS CÉUS: CADA VEZ MAIS PARECIDAS COM QUARTOS DE HOTEL, AS CABINES DE PRIMEIRA CLASSE AINDA DEVIAM UM BANHEIRO DIGNO DOS CÉUS. ISSO ATÉ A EMIRATES INAUGURAR SEU A380 COM UM SHOWER SPA. O ESPAÇO CONTA COM PRODUTOS BVLGARY E ESTÁ DISPONÍVEL PARA TODOS OS 14 PASSAGEIROS FIRST CLASS (EM ALGUNS CASOS É PRECISO AGENDAR COM ANTECEDÊNCIA). A PRIVACIDADE É OUTRO PONTO FORTE: TODAS AS CABINES SÃO EQUIPADAS COM PORTA ELÉTRICA E MINIBAR, MAS QUEM SE SENTIR SOZINHO PODE RECORRER AO LOUNGE DA PRIMEIRA CLASSE, COM BAR E MESINHAS. NA HORA DE DORMIR, NÃO DEIXE DE EXPERIMENTAR O PIJAMA, FEITO DE UM TECIDO TECNOLÓGICO QUE LIBERA UM COMPOSTO DE ALGAS MARINHAS, DE PROPRIEDADES HIDRATANTES. O TRECHO ENTRE SÃO PAULO E DUBAI (IDA E VOLTA) SAI EM TORNO DE R$ 60 MIL.

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ESPAÇO: OS PASSAGEIROS DA PRIMEIRA CLASSE DA QATAR AIRWAYS NÃO VÃO ENCONTRAR SUÍTES PRIVATIVAS COMO NAS CONCORRENTES EMIRATES E SINGAPORE, MAS NEM POR ISSO A COMPANHIA DEIXA A DESEJAR. A POLTRONA ALI, POR EXEMPLO, RECLINA TOTALMENTE E É CONSIDERADA UMA DAS MAIS CONFORTÁVEIS DO SEGMENTO AÉREO, COM 58 CM DE LARGURA. OUTRO ALVO DE ELOGIOS, O LOUNGE DA PRIMEIRA CLASSE CONTA COM BARMAN E UMA ROBUSTA CARTA DE DRINKS E CHAMPANHE KRUG À VONTADE, ALÉM DE POLTRONAS DE FRENTE PARA O BALCÃO. OS DOIS BANHEIROS NÃO TÊM CHUVEIRO, MAS GANHAM EM ESPAÇO, COM BANCOS E ARMÁRIOS PARA AUXILIAR EM UMA EVENTUAL TROCA DE ROUPA. O TRECHO ENTRE DOHA E LONDRES (IDA E VOLTA) CUSTA CERCA US$ 9,5 MIL.

PARA DOIS: NA PRIMEIRA CLASSE DA SINGAPORE AIRLINES, O PASSAGEIRO TAMBÉM VAI ENCONTRAR SUÍTE PRIVATIVA, COM PORTA, E CAMA SEPARADA, MAS O GRANDE ATRATIVO DA CABINE ESTÁ NA POSSIBILIDADE DE TRANSFORMÁ-LA EM UM AMBIENTE PARA CASAIS. QUEM QUISER VIAJAR EM CLIMA DE LUA DE MEL, POR EXEMPLO, BASTA RESERVAR DUAS PASSAGENS NA PRIMEIRA CLASSE E SOLICITAR A INTEGRAÇÃO. JÁ OS QUE VIAJAM A NEGÓCIOS PODEM, AINDA, TRANSFORMAR A CABINE EM UM AMBIENTE PARA REUNIÃO. O CARDÁPIO, POR SUA VEZ, INCLUI CRIAÇÕES DE CHEFES RENOMADOS, MAS QUEM QUISER PODE SOLICITAR UM MENU AINDA MAIS VARIADO, COM ATÉ 24 HORAS DE ANTECEDÊNCIA, E JÁ FAZER SEU PEDIDO. O TRECHO ENTRE LONDRES E CINGAPURA (IDA E VOLTA) CUSTA EM TORNO DE US$ 9,2 MIL.

MENU ESTRELADO: ALÉM DO CONFORTO DE UMA CABINE COM 3 M2, OUTRO GRANDE ATRATIVO DA PRIMEIRA CLASSE DA AIR FRANCE ESTÁ NO MENU. FORMULADO PELO ESTRELADO CHEF GUY MARTIN, O CARDÁPIO TRAZ RECEITAS FRANCESAS EXCLUSIVAS, SEMPRE RENOVADAS A CADA DOIS MESES. JÁ A POLTRONA DO LA PREMIERE TEM 53 CM DE LARGURA (NA ECONÔMICA, POR EXEMPLO, O ASSENTO TEM 45 CM), ENQUANTO A TV TEM 24 POLEGADAS. DE SÃO PAULO A PARIS, O BILHETE CUSTA A PARTIR DE R$ 29 MIL (IDA E VOLTA).

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W WORLD FAIR

A grande feira mundial do estilo e do consumo

O VINHATEIRO VOADOR O empresário paulista Luiz Carlos Sella fez dinheiro com a aviação e, com ele, passou a recuperar empresas em dificuldades para depois vendê-las. Mas, ao embarcar na centenária vinícola gaúcha Peterlongo, percebeu que esse voo pode ter um destino diferente

Sella com uma Peterlongo em seu jato privado: “O negócio do vinho é apaixonante. Posso sair dele, mas nunca mais sairei desse mundo” 102

foto: Cláudio Gatti

Por Irineu Guarnier Filho, de Caxias do Sul (RS)


U

m avião uniu dois talentosos empreendedores separados na linha do tempo por um intervalo de mais de um século: o imigrante italiano Manoel Peterlongo, fundador da Vinícola Peterlongo, em 1915, e o empresário paulista Luiz Carlos Sella, um dos atuais proprietários da tradicional cantina gaúcha. O pequeno bimotor Piper Seneca que operou essa proeza não é uma daquelas máquinas que viajam pelo tempo nas narrativas de ficção científica, como o automóvel esportivo DeLorean, do filme De Volta para o Futuro. Estava, no entanto, no lugar certo na hora certa. E, por isso, acabou aproximando os dois aventureiros de épocas distantes, mas com histórias de vida igualmente vitoriosas. Peterlongo elaborou o primeiro espumante brasileiro (ainda chamado de “champagne”) no início do século passado. Sella, ex-agricultor no interior de São Paulo, especializou-se em adquirir empresas em dificuldades financeiras, recuperá-las e depois revendê-las. Destino ou coincidência? O paulista de Pindorama, que pilota seu próprio jato Cessna Citation em suas andanças pelo País, atribui a uma incrível coincidência o modo como ficou sabendo que a Vinícola Peterlongo poderia se tornar um dos melhores investimentos de sua carreira. Sócio na fábrica de pneus Rinaldi, de Bento Gonçalves, na Serra Gaúcha, ele

intermediou para um amigo de Manaus a aquisição do Seneca, que se encontrava estacionado no aeroclube da vizinha Garibaldi. Quando o amigo foi buscar a aeronave, Sella se encontrou casualmente, no hangar, com um enólogo da Peterlongo. Conversa vai, conversa vem, enquanto o avião era preparado para o longo traslado até Manaus, o enólogo desabafou que a empresa onde trabalhava passava por graves dificuldades financeiras, e que a falência era iminente. A inconfidência acionou o instinto empreendedor de Sella, que até aquele dia nunca se interessara por vinhos – menos ainda por vinhedos, autoclaves, leveduras ou barricas de carvalho. Ali mesmo, pediu ao funcionário da Peterlongo para marcar uma entrevista com os donos da vinícola. Uma semana mais tarde, compareceu ao encontro dirigindo um vetusto Ford Escort emprestado de um de seus colaboradores na Rinaldi, pois estava sem seu carro naquele dia. A simplicidade do veículo conduzido pelo desconhecido que pretendia adquirir uma das mais tradicionais vinícolas brasileiras não deve ter impressionado positivamente os proprietários, imagina Sella. Mas a conversa evoluiu bem. E, depois de uma avaliação superficial da situação contábil da empresa, o negócio acabou sendo realizado. Aos 45 minutos do segundo PLANT PROJECT Nº5

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foto: divulagação

tempo, como relembra Sella: "Faltavam apenas cinco dias para a decretação da falência”. Era o ano de 2002. CHAMPAGNE BRASILEIRO O imigrante Manoel Peterlongo desembarcou no Brasil em 1899. Neto de um produtor de espumantes na Itália, conhecia bem a arte da elaboração de vinhos borbulhantes pelo método Champenoise (segunda fermentação em garrafa), descoberto oficialmente pelo monge francês Dom Pérignon, na Champagne do século 17. E foi por esse tradicional método francês que ele elaborou, em 1913, no município de Garibaldi, o primeiro vinho espumante brasileiro. Dois anos depois, nascia o Estabelecimento Vinícola Armando Peterlongo S/A, batizado com o nome do único filho homem da família. Em 1930, seria inaugurado o castelo ao estilo da Champagne, com as caves centenárias que recebem milhares de turistas por ano. A Peterlongo esteve sempre 104

na vanguarda da indústria brasileira do vinho. Foi a primeira vinícola a empregar mão de obra feminina e a pioneira na região a pagar salário mínimo para seus operários, já sob a gestão de Armando, na década de 1930. Conquistou o Brasil e chegou ao mercado internacional na década seguinte, tendo seus rótulos comercializados pela rede Macy’s, em Nova York. Marca onipresente em solenidades oficiais brasileiras da época, batismos de navios e aviões, seus espumantes também faziam parte do cardápio de banquetes oferecidos pelo governo Getúlio Vargas. Até a rainha Elizabeth II, da Inglaterra, elogiou o “champagne brasileiro”, quando visitou o Brasil. "Champagne", elaborado fora da tradicional região de Champagne, na França? Sim, pois em 1974 o Supremo Tribunal de Justiça julgou improcedente a queixa das casas francesas que questionavam na Justiça o uso do termo champagne (denominação de origem da região do mesmo nome) por uma vinícola brasileira, e a Peterlongo conquistou o

direito de estampá-lo em seus rótulos. No entanto, a partir dos anos 1960, ainda sob o comando da família Peterlongo, a empresa passara a produzir filtrados doces e bebidas de baixo valor agregado – e o glamour da marca desceu a ladeira. No final dos anos 1990, só os enófilos mais antigos ainda se lembravam dos dias de glória da vinícola gaúcha. PILOTO DE EMPRESAS Esse passado rico em história e, principalmente, o futuro potencial da marca despertaram o interesse de Sella pela Peterlongo. Salvar empresas à beira do abismo tem sido sua rotina profissional desde que, em 1988, adquiriu um pequeno hotel quase falido em Balneário Camboriú, Santa Catarina. Depois disso, ainda comprou uma fazenda no Paraná, uma panificadora, uma fábrica de autopeças e trabalhou com ouro, sempre exclusivamente de olho no potencial comercial de cada atividade. Com a Peterlongo, não foi diferente – embora admita que tenha se deixado envolver pelo


Perfil

W

O castelo da marca em Garibaldi (RS) e, nos vinhedos, Sella com o enólogo Marty: investimento na qualidade

encanto do mundo do vinho. O segredo do negócio? A resposta é quase singela: “Quem está do lado de fora de uma empresa vê melhor problemas que quem está dentro não enxerga". Neto e filho de pequenos cafeicultores, Sella viveu na zona rural do estado de São Paulo até os 14 anos, trabalhando na roça. Com a morte do avô e a divisão da pouca terra entre diversos herdeiros, não havia mais como permanecer no campo. Seu pai vendeu a pequena parcela que lhe coube, embarcou com a esposa e os oito filhos num caminhão, e rumou para a capital. Em São Paulo, o jovem Sella fez de tudo um pouco para ganhar a vida. Foi balconista de padaria, taxista, motorista de ônibus, mecânico. Em 1975, com 20 anos, abriu a própria oficina. Oito anos mais

tarde, decidiu tentar a sorte nos Estados Unidos. Lá, encontrou trabalho em uma oficina de manutenção de aeronaves. Apaixonou-se pelos aviões, obteve seu brevê de piloto e, algum tempo depois, já era sócio de uma oficina na Flórida e proprietário de seu primeiro avião, um Cessna 401. Como os custos de manutenção nos Estados Unidos eram bem menores do que no Brasil, começou a prestar esse serviço a proprietários brasileiros de aeronaves. Levava e trazia pequenos aviões particulares, em viagens de até dois dias pelo Caribe, enfrentando cinco escalas para reabastecimento e a meteorologia às vezes traiçoeira do temido Triângulo das Bermudas. Também comprava e revendia aviões. Era uma atividade arriscada voar sobre

a floresta amazônica com o precário auxilio à navegação da época – mas lucrativa. Foi o que lhe permitiu acumular os recursos necessários para se aventurar em outro tipo de negócio, de certo modo ainda mais perigoso: a revitalização de empresas em dificuldades. Como o hotel de Balneário Camboriú, a fábrica de pneus Rinaldi e a Vinícola Peterlongo. PATRIMÔNIO DO BRASIL Sem abrir mão do tradicional filtrado doce Espuma de Prata, best-seller no Brasil e na Colômbia, Sella vem há 15 anos investindo na revitalização de vinhedos e dos vinhos finos e espumantes do portfólio da Peterlongo. Desde a grande festa de comemoração dos 100 anos da empresa, em 2015, esse

foto: divulagação


fotos: divulagação

As caves da empresa, com o retrato do fundador Manoel Peterlongo: enoturismo também gera receitas à empresa

processo se intensificou. Os resultados começam a aparecer. Há pouco, o espumante Elegance Champagne Nature venceu o Top Ten na categoria Espumantes Nacionais da Expovinis, a maior feira de vinhos do Brasil, realizada em São Paulo. Para chegar aos mais de 4 milhões de litros de bebidas produzidos anualmente, a Peterlongo adquiriu 28 novos tanques de inox, recuperou vinhedos na Serra e em Encruzilhada do Sul e remodelou sua área industrial. Há dois anos, a vinícola exporta toda a sua linha para a China e, segundo Sella, é "a marca brasileira mais conhecida na Colômbia". Também elabora a linha Terras no Chile. A preocupação com a qualidade é a mesma desde os produtos mais simples, elaborados com uvas Isabel e Bordô, até os vinhos de alta gama, explica Sella. “O vinho de mesa, os sucos e o Espuma de Prata têm de pagar as contas. Ganho dinheiro com os vinhos de maior valor

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agregado.” Uma fórmula simples, mas que tem sido ignorada por vinícolas focadas exclusivamente em vinhos de alto preço, com mercado reduzido (o consumo brasileiro de vinho não chega a 2 litros por habitante ao ano). Além disso, cresce exponencialmente a receita do enoturismo, com visitas guiadas pelas caves centenárias, eventos gastronômicos e sessões de cinema ao ar livre. Contudo, o investimento mais vistoso da Peterlongo nos últimos anos foi, sem dúvida, a contratação da consultoria do enólogo francês Pascal Marty, responsável pelo upgrade na linha top da vinícola. Formado pelo prestigioso Instituto de Enologia de Bordeaux, na França, Marty foi winemaker da lendária Baron Philippe de Rothschild S.A. por mais de 14 anos, e responsável por alguns dos projetos vitivinícolas mais ousados e bem-sucedidos da casa francesa mundo afora. Como a parceria norte-americana com Robert Mondavi, que resultou no

icônico vinho Opus One, em 1984, ou com a gigante chilena Concha y Toro, que deu origem ao também ultrapremium Almaviva. Mesmo sem dar por concluído o trabalho de recuperação da Peterlongo, que considera “um patrimônio cultural do Brasil”, e apesar do apego sentimental ao empreendimento, Sella não descarta a possibilidade de se desfazer da empresa mais adiante por uma oferta, digamos, irrecusável. Business is business. “O negócio do vinho é apaixonante. Posso sair dele, mas não sairei mais do mundo do vinho”, diz. Seja como for, se decidir desacelerar os motores no agronegócio, o ex-cafeicultor, hoje vitivinicultor, já tem onde relaxar. Um sobrado construído no condomínio aeronáutico Campo dos Comandantes, em Itajaí (SC), que o próprio Sella idealizou, é o lugar que considera ideal para desfrutar de uma paixão antiga e de outra mais atual: os aviões e o vinho .


Obra da carioca Beatriz Milhazes Campeã de valorização, ela ajudou a popularizar o investimento em arte nos últimos anos

Ar ARTE

Um campo para o melhor da cultura

foto: divulagação D'Aloia, Fortes & Gabriel PLANT PROJECT Nº5

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Ar A RTE

Um campo para o melhor da cultura

foto: Andrew Kemp

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UM NEGÓCIO CHAMADO ARTE BRASILEIRA Como começar uma coleção, investir e até lucrar com o trabalho de artistas locais, que tem ganhado destaque e valor nos grandes leilões internacionais Por Ana Weiss

Tela Boiadeiro e rebanho, do argentino radicado na Bahia Carybé: valor de mercado chega a R$ 100 mil PLANT PROJECT Nº5

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Investimento

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ouve um tempo em que imaginar o colecionador de arte na figura do milionário excêntrico ou do decorador entendido era algo bem perto da realidade. Hoje, para colecionar arte é preciso um investimento inicial muitas vezes bem modesto e algum espaço em casa. Segundo galeristas e consultores, o perfil dos compradores de arte vem se diversificando muito. E o que está se tornando cada vez mais frequente é a presença de executivos e empresários do agronegócio em galerias de arte e leilões, escolhendo peças para levar para as suas casas, muitas vezes distantes das metrópoles. Novas galerias também têm surgido em capitais de estados com potencial agrícola, como Cuiabá (Mato Grosso) e Goiânia (Goiás), amparadas pelo crescimento do interesse pelo mercado de arte, cada vez mais estruturado como negócio – e dos bons. Trata-se de um fenômeno recente, mesmo em centros mais badalados. A holandesa Julie Belfer, que atua como consultora de arte, lembra que tanto os museus como as galerias são endereços razoavelmente jovens na história da arte. “Os grandes museus foram fundados depois do final da Segunda Grande Guerra e as galerias são adventos dos anos 1960 e 1970”, disse à reportagem da PLANT. “A prática do colecionismo como conhecemos é, portanto, nova para todo mundo.” Segundo ela, não existe mais um perfil de colecionador. “As pessoas estão descobrindo que qualquer um pode começar uma coleção”, diz. De fato, para começar a colecionar, não é preciso mais que R$ 500 em caixa. Especialistas e colecionadores advertem, porém, que, se uma peça de arte não desvaloriza, nem sempre seu preço dá saltos no valor de venda. Há algumas bem--vindas exceções ocorridas nos

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últimos anos com artistas brasileiros, caso de Beatriz Milhazes, Ernesto Neto e Adriana Varejão, hoje entre estrelas dos maiores leilões do mundo. “É preciso avaliar o potencial, a inventividade e o teor das propostas, sobretudo de artistas vivos”, adverte Paulo Darzé, dono da galeria mais prestigiada de Salvador, que leva seu nome. Para isso, existem especialistas como marchands independentes e consultores, que ajudam a separar o joio do trigo. Julie Belfer é uma dessas profissionais. Hoje muito procurada no País e também internacionalmente, ajudou a montar a coleção de gente como o banqueiro David Rockefeller, o estilista Kenzo Takada e o ex-ministro da Cultura Gilberto Gil. A primeira dica que ela dá aos interessados em começar um acervo é se inteirar do assunto. “Vá a exposições individuais, coletivas, frequente galerias, museus e descubra antes de mais nada o que você aprecia”, recomenda. “O conhecimento e o reconhecimento de potenciais de mercado vêm depois disso.” Outro conselho da especialista é ter em mente que arte é (e será sempre) uma produção subjetiva e que, se a produção iniciante é evidentemente mais barata e pode em uma década ser arrematada em lances estratosféricos, para quem tem em vista a peça como um investimento é sempre mais garantido comprar algo com assinatura consolidada e reconhecida. Não foi o que fez Paulo Darzé quando, há 30 anos, começou a montar sua galeria. “Comprei telas de Carybé pelo equivalente a R$ 5 mil”, conta o galerista. Hoje, uma pintura do artista argentino naturalizado no Brasil (como a que ilustra esta reportagem) está avaliada em R$ 100 mil. Do escultor baiano Tunga, Darzé ainda tem representantes da prestigiada série Tranças, peças que ele


fotos: divulgação

conta ter comprado por US$ 3 mil. Hoje, cada escultura dessa dificilmente é comprada por menos de US$ 100 mil. Embora existam bolsas de investimento em catálogos contemporâneos, nas quais os investidores nem sequer sabem a cara das produções em que aplicam o seu dinheiro, muitos colecionadores adquirem um gosto especial pela aquisição de obras, passando a acompanhar não só a trajetória das assinaturas que guarda em casa, mas também do cenário artístico nacional. Alguns, como João Carlos de Figueiredo Ferraz, deixam todos os outros negócios para se dedicar completamente à arte. Grande empresário do setor sucroenergético, ele contou na entrevista publicada na edição de lançamento da PLANT como transformou uma coleção, que começou modesta nos anos 1980, em um dos conjuntos mais admiráveis de arte contemporânea nacional. O Instituto Figueiredo Ferraz hoje está aberto a visitas em Ribeirão Preto, no interior paulista. O perigo de se encantar com as peças, segundo Julie Belfer, é justamente se apegar a ponto de não conseguir vender aquelas que, a princípio, haviam sido compradas como investimento. “Acabei de viver isso com um cliente. Ele comprou duas peças de uma artista bem jovem: uma por paixão e outra porque tinha tudo para valorizar. No fim, ele se encantou tanto com a segunda,

que desistiu de vender. Isso acontece bastante”, conta ela. Segundo a Agência Brasileira de Promoção de Exportações e Investimentos (Apex), a partir de 2007, o volume de vendas externas de arte brasileira tem aumentado, em média, 65% ao ano. Artistas tidos como experimentais e adeptos das instalações, como Ernesto Neto e Adriana Varejão, receberam marteladas históricas nos grandes leilões internacionais. Beatriz Milhazes, que no Brasil era mais conhecida por suas ilustrações que pelas pinturas, ultrapassou, no início da década passada, a marca de US$ 1 milhão com seu quadro O Mágico, feito inédito para artista brasileiro vivo – e continuou quebrando

O galerista Darzé e uma peça da série Tranças, de Tunga: arte brasileira virou artigo de exportação

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Investimento

foto: Jorge Miño; Coleção: Museo de Arte Latinoamericano de Buenos Aires – Fundación Constantini.

Quadro O Mágico, de Beatriz Milhazes: primeira obra de artista brasileiro a superar a marca de US$ 1 milhão

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o próprio recorde em leilões nos anos seguintes, quintuplicando o valor do arremate de suas telas. Na feira SP Arte do ano passado, a Dan Galeria, de São Paulo, fechou a venda da tela “Summer Love - Gamboa Seasons”, da pintora carioca, por R$ 16 milhões (o equivalente a US$ 5 milhões). A venda foi cancelada na sequência -- especula-se que pela divulgação do nome do comprador pela imprensa. Mas a partir de então, aos olhos do mercado, esse passou a ser considerado o valor de referência da tela. O mercado oferece hoje também opções para aqueles que preferem pular a imersão no mundo da arte e não tem

interesse em encher a casa com obras de arte. O investimento no setor pode, então, ser feito hoje por fundos coletivos, como o do banco Brasil Plural. O Brazil Golden Art foi lançado com o dinheiro de 70 investidores, que aplicaram juntos R$ 40 milhões. Para participar dessa carteira, que conta hoje com pouco mais de 600 obras de arte, o desembolso mínimo é de R$ 100 mil. Os gestores do fundo garantem que a valorização das peças varia entre 150% e 200% em dois anos. Como todo investimento, porém, é preciso estar atento às condições, taxas de administração e garantias. Um dos pontos a ser observados no mercado da arte


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razões para começar uma coleção com arte contemporânea brasileira

é a liquidez, já que nem sempre é fácil e rápido vender uma obra, mesmo que de um artista renomado. Colecionadores já com bom relacionamento com galeristas e outros colecionadores costumam ter mais sucesso nesse quesito. Outra questão que exige cuidado é a da procedência das obras. Falsificações, mesmo que não muito frequentes, costumam ser ofertadas para compradores menos experientes. Por isso, a assessoria de galerias e consultores com tradição é sempre recomendável. Mas o fato é que a grande maioria gosta mesmo do prazer de descobrir talentos novos e de conseguir medalhões para guardar em casa. O dentista Marcelo Velame, cliente de Paulo Darzé, é um desses. “Já tive três apartamentos com minhas obras e não me canso”, diz o colecionador baiano, que começou a sua coleção com uma xilogravura de Emanoel Araújo e perdeu a conta do número de obras que tem hoje em seus apartamentos. “Trabalho aqui no consultório para comprar arte”, brinca ele, que guarda no centro da sala da residência onde vive um Superman, objeto de Nelson Leirner, um dos mais provocativos artistas brasileiros, comprado de Paulo Darzé há três anos por R$ 30 mil. A peça, hoje, está avaliada em R$ 90 mil. Venderia por quanto? “Por nada nesse mundo”, diz.

Obras de artistas brasileiros recém-descobertos costumam ter um preço atraente e um potencial de valorização três vezes maior que as de profissionais no mesmo estágio na Europa ou nos Estados Unidos.

O mercado de arte contemporânea continua aquecido em casas de leilões, galerias, algo estimulado pelas feiras de arte que viraram moda e se proliferam a cada ano pelo País. Quem comprou uma pintura de Beatriz Milhazes nos anos 2000 por US$ 500 mil, vendeu, cinco anos depois, por US$ 3,5 milhões.

As obras de arte contemporânea brasileira caíram no gosto internacional a partir do final dos anos 1990, tornando-se coqueluches nas casas de leilões mais prestigiadas do planeta, como a Sotheby’s e a Christie’s. Uma vez que um artista tem a venda da obra estabelecida por esses balcões-referência em libras ou dólar, toda a obra passa a ter a mesma referência para compra e venda também no Brasil. Assim, o investimento fica protegido da desvalorização da moeda, da inflação interna e da variação do cenário econômico nacional.

Não se perde dinheiro. É muito difícil uma obra de arte se desvalorizar. Ela pode, sim, valorizar menos do que se esperava.

Depois de adquirir uma obra de arte em uma galeria estabelecida, o comprador tem na figura do galerista representante do artista que assina a peça um parceiro comercial, que continua trabalhando na circulação e valorização dessa assinatura. A exibição de uma peça aumenta o seu valor cultural e também de mercado.

O imposto cobrado pela obra nacional é de 15% sobre a valorização. Comprar uma obra de arte no exterior exige o desembolso de mais de 40% sobre o valor bruto da peça em impostos.

Guardar arte em casa é de graça e um prazer. Os que gostam de receber acabam aumentando o círculo de interessados no assunto, o que amplia a vida social e, também, a possibilidade de negócios. PLANT PROJECT Nº5

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Startagro Agrishow Com a plateia lotada na Arena do Conhecimento, evento discutiu a revolução das máquinas na maior feira do setor

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STARTAGRO

As inovações para o futuro da produção

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O SHOW DAS MÁQUINAS

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STARTAGRO

As inovações para o futuro da produção

Evento STARTAGRO AGRISHOW levou a comunidade AgTech para a maior feira de equipamentos agrícolas do País e mostrou como a agricultura digital está se tornando realidade Por Clayton Melo | Fotos Fábio Melo

oi o assunto da semana nas movimentadas ruas da fazenda onde se realiza a mais relevante feira de tecnologia agrícola do País. E o tema que movimentou a manhã da quarta-feira 3 de maio no auditório da Arena do Conhecimento, o novo espaço criado para sediar debates no coração da Agrishow, em Ribeirão Preto, no interior de São Paulo foi como tecnologias como inteligência artificial, robótica e Internet das Coisas vão revolucionar as máquinas agrícolas e, por consequência, o modo como produzimos? Com a plateia lotada, mais de 200 pessoas discutiram o tema no evento STARTAGRO AGRISHOW, principal atração do dia na Arena. No palco, especialistas, empreendedores e produtores revelaram um cenário tão desafiador como promissor. E deixaram bem claro que a “Revolução das Máquinas”, assunto que norteou os debates, não é coisa para o futuro, mas uma realidade com a qual todos os envolvidos nas cadeias produtivas do agronegócio precisam estar conectados. Uma demonstração clara disso pôde ser vista logo no primeiro painel, intitulado justamente “A máquina do futuro: quando al-

goritmos, tratores autônomos e Internet das Coisas se encontram”. Enquanto no lado de fora, a menos de 100 metros da Arena do Conhecimento, os visitantes podiam admirar um protótipo do trator autônomo Case IH, da montadora CNH, os debatedores deixaram claro que a capacidade das máquinas de executar tarefas com um bom nível de autonomia já é rotina em uma série de propriedades Brasil afora. Foi o que demonstrou Victor Campanelli, diretor da AgroPastoril Paschoal Campanelli, um dos maiores confinadores de gado do País e escolhido como um dos Top Farmers 2017 pela revista PLANT PROJECT. “Trabalhamos com tecnologias como essa há alguns anos, em todos os níveis da produção. O importante, porém, é que toda a cadeia esteja automatizada, não apenas uma máquina”, explicou. Ao seu lado, Jorge Leal, CEO da Agres, explicou que tecnologias vendidas por sua empresa permitem transformar qualquer máquina, de um simples trator a grandes colhedoras, em equipamentos autônomos, capazes de realizar sozinhos uma série de tarefas programadas pelos produtores após analisar os dados fornecidos por sensoPLANT PROJECT Nº5

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Plinio Nastari, presidente da Datagro, interagiu com os debatedores do Diálogo de Gerações e ressaltou a importância da tecnologia aplicada pelo setor de açúcar e álcool na transformação do Brasil em uma potência bioenergética

Durante o evento, duas startups tiveram a oportunidade de apresentar seus projetos. Uma delas foi a Scicrop, de José Damico, que desenvolveu um sistema de apoio à gestão das propriedades baseado em inteligência artificial

Público registra debates: mais de 200 pessoas discutiram o futuro das máquinas agrícolas. No palco, especialistas, empreendedores e produtores revelaram um cenário tão desafiador como promissor

res disponibilizados pelo sistema. Por trás dessa tecnologia, fazendo o processamento de todos os dados e gerando recomendações para o produtor está o supercomputador Watson, da IBM, uma gigante da tecnologia que, desde o início deste ano, colocou os dois pés dentro das fazendas brasileiras. “Já estávamos presentes com soluções para o agro há alguns anos, mas há cerca de um mês oficializamos a criação de uma iniciativa exclusiva para criar uma plataforma de desenvolvimento de novas tecnologias para o setor”, disse Luiz Otávio da Fonseca, líder 118

da área de Agronegócio Digital da IBM, também presente no painel. A reunião de gente com perfis diferentes, inclusive engenheiros e empreendedores que estão descobrindo as oportunidades oferecidas pela novíssima agricultura digital foi uma das marcas do evento STARTAGRO e da edição 2017 da Agrishow. Startups de base tecnológica voltadas para o agro ganharam espaços exclusivos na feira, assim como nos debates. Duas delas puderam expor seus cases no palco da Arena: a Scicrop, que desenvolveu um sistema de apoio à gestão das

propriedades baseado em inteligência artificial, e a Horus, que produz drones utilizados no monitoramento de lavouras e propriedades. Um tema recorrente do setor e que pode ser um limitador na adoção de novas tecnologias também foi debatido no evento: a conexão à internet nas propriedades rurais. O segundo painel da manhã reuniu nomes como Fernando Martins, CEO da Agrotools e ex-presidente da Intel no Brasil, Francisco Jardim, sócio da SP Ventures, e Leonardo Mariote, diretor da área de Tecnologias de Conectividade do CPqD,


Fabricio Hertz, CEO da Horus, foi outra startup a apresentar seu case: empresa, que produz drones utilizados no monitoramento de lavouras e propriedades, mostrou potencial de evolução do uso de imagens no setor

Recinto da Arena do Conhecimento: iniciativa inédita na Agrishow, espaço abrigou seminários e eventos de conteúdo durante todo o período de realização da feira, em Ribeirão Preto

sob a mediação de José Augusto Tomé, sócio da AgTech Garage. Todos foram unânimes em apontar essa questão como um desafio a ser enfrentado nos próximos anos, mas ao mesmo tempo mostraram que a limitação pode ser enfrentada com a utilização de tecnologias inovadoras, que dispensam a cobertura de sinais 3G e 4G das operadoras de telefonia nas zonas rurais. O CPqD, por exemplo, está testando um sistema de conexão baseado em antenas de rdiofrequência em conjunto com a Usina São Martinho. “As empresas que querem

Credenciamento dos participantes do StartAgro: primeiro evento a levar o ecossistema de inovação AgTech para dentro da Agrishow, em um ano em que as atrações da feira foram tratores autônomos e a inteligência artificial aplicada ao campo

prosperar nesse mercado têm de ter em mente que não podem contar com internet, precisam ser capazes de oferecer soluções que não dependam dela”, afirmou Martins. O encerramento do evento STARTAGRO AGRISHOW foi marcado por um emocionante diálogo entre duas gerações do agro. Moderado pelo diretor executivo da CitrusBR, Ibiapaba Netto, o painel reuniu um nome consagrado do setor sucroenergético, Maurilio Biagi Filho, presidente do grupo Maubisa, e uma jovem empreendedora, Danielle Fon-

seca, fundadora da startup Uller Agro, que se define como o “Uber das Máquinas”. O entusiasmo com que Danielle explicou seu modelo de negócios baseado no compartilhamento de máquinas agrícolas contagiou o veterano empresário – que se emocionou ao descobrir que havia sido amigo do avô da empreendedora, o ex-vice- presidente da República Aureliano Chaves. “É um negócio que tem tudo para dar certo”, disse Biagi, que se confessou um pouco assustado com a velocidade com que as novas tecnologias têm chegado, não apenas no campo. PLANT PROJECT Nº5

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Agrishow

AS MÁQUINAS QUE COLHEM DADOS

com a participação de: Victor Campanelli, Diretor da Agropastoril Paschoal Campanelli Luiz Otávio da Fonseca, Líder de Agronegócio Digital da IBM Jorge Leal, CEO da Agres Moderador: Luiz Fernando Sá, Diretor Editorial de PLANT PROJECT e STARTAGRO

Baseado no painel “A Revolução das Máquinas: quando algoritmos, inteligência artificial, internet e outras tecnologias se encontram aos motores no campo"

S entados na plateia da Arena de Conhecimento, produtores, executivos, e empreendedores puderam acompanhar, protegidos do sol e do calor externo, uma demonstração que acontecia, naquele mesmo momento, a centenas de metros dali. Projetada no telão do STARTAGRO Agrishow, a tela de comando de um trator autônomo mostrava as evoluções da máquina na pista de testes do evento. Uma pro-

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fusão de gráficos apontava, em tempo real, uma série de indicadores de desempenho do equipamento, de velocidade a temperatura e pressão de óleo. “É um trator de 80 cavalos, comum em pequenas propriedades em todo o País”, explicava, do palco, Jorge Leal, CEO da Agres, empresa responsável pelo sistema que transformou uma máquina normal em um equipamento de ponta. Na mesma área de demonstração, em outro momento, foi apresentada uma das estrelas da Agrishow 2017, o moderníssimo protótipo autônomo da fabricante Case, com visual futurista que se tornou sonho de consumo de muitos visitantes do evento. Entre as duas máquinas há uma grande distância em design e valores, mas ambas trafegam no mesmo conceito de transformar equipamentos em verdadeiras colhedoras de dados e trans-


formá-las em ferramentas de gestão para o produtor. “Sensores conectados a servidores na nuvem e a sistemas de inteligência artificial vão permitir que esses dados sejam interpretados com mais precisão, gerando recomendações para que os produtores tomem decisões mais assertivas”, afirmou, no painel, Luiz Otávio da Fonseca, da IBM. Ele explicou como a gigante da área de tecnologia vem se organizando para, em parcerias com grupos do setor agro e startups AgTech, criar uma plataforma que fomente o desenvolvimento de novas tecnologias específicas para a chamada agricultura digital, usando a capacidade de processamento e a inteligência artificial do supercomputador Watson. O sistema da Agres, por exemplo, seguiu essa trilha. “Mas, independentemente de as máquinas serem ou não autônomas, caberá sempre ao produtor a tomada de decisões”, ressaltou.

O crescente nível tecnológico nas propriedades pode oferecer economias importantes aos produtores. Victor Campanelli, trouxe ao debate resultados práticos obtidos com os investimentos que fez para transformar o confinamento da família, um dos maiores do País, em um modelo de automação em todos os processos. A alimentação do gado, por exemplo, é toda feita a partir de sensores, que identificam a quantidade de ração e qual depositar em cada cocho. Tudo é feito automaticamente, sem interferência humana. Antes da automação, as sobras de ração geravam um desperdício de 3% a 5%. Com o sistema implantado, caiu para 0,5%. “O primeiro benefício que se vê é o potencial de redução de custos”, explicou. “Para ter ganho de eficiência, é preciso ser muito técnico.” PLANT PROJECT Nº5

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Agrishow

A TECNOLOGIA ESTÁ PRONTA

com a participação de: Fernando Martins, CEO da Agrottols Francisco Jardim, Sócio da SP Ventures Leonardo Mariote, Diretor de Tecnologias de Conectividade do CPqD Moderador: José Augusto Tomé, Sócio da AgTech Garage

Baseado no painel “Lavoura conectada: o que é preciso para que as fazendas tenham acesso à internet (e quando isso vai acontecer)"

U cobertura das redes de telecomunicações 3G e 4G ainda é um problema no Brasil, sobretudo nas pouco povoadas e superprodutivas áreas rurais do interior brasileiro. Trata-se de um claro desafio a ser enfrentado pelas empresas de tecnologia ligadas ao agronegócio. Mas, ao mesmo tempo, pode ser um trunfo para desenvolvedores brasileiros que aproveitam modelos já existentes para conectar as lavouras ao mundo. “Já temos tecnolo gia disponível, com vertentes es-

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pecíficas para áreas agrícolas”, afirmou o especialista Leonardo Mariote, diretor do CPqD. “Pior que o deserto de conectividade é o deserto regulatório, já que há faixas em que existe tecnologia de prateleira, mas que não pode ser usada por falta de regulamentação.” A declaração foi corroborada pelos companheiros de painel, que, a despeito das dificuldades de conexão muitas vezes enfrentadas no campo, preferiram tratar a questão como uma oportunidade para empreendedores AgTech. “Podemos encarar a falta de conectividade como uma barreira de entrada para os fabricantes estrangeiros de tecnologia”, disse Francisco Jardim, sócio da SP Ventures, gestora responsável por investimentos em startups de tecnologia para o Agro. “Muitas trazem para cá soluções testadas em regiões como o Vale do Silício, que, ao chegarem aqui,


não funcionam. Então, precisam tropicalizar.” Ele citou como exemplo de “solução caseira mais adequada” os sistemas criados pela brasileiram A g r o s m a r t , que desenvolveu sensores que se comunicam entre si, independentes da presença de redes de telecomunicações. Ex-diretor-geral da multinacional Intel no Brasil e atual CEO da Agrotools, Fernando Martins referendou essa tese. Ele citou o caso de estacas digitais desenvolvidas pela Intel e pela Jacto que permitem que se obtenha dados sobre pragas nas lavouras mesmo onde não existe internet disponível. Dispostas a cada 15 a 30 quilômetros, são capazes de transportar dados gerados por máquinas até a sede da fazenda, que os enviaria à nuvem. “Não seria possível fazer tráfego de vídeos, que exigem banda larga, mas funciona bem para dados”, explica. Mesmo a banda larga, porém, pode chegar graças a soluções digitais. O CPqD, por exemplo, testa atualmente com a

Usina São Martinho um projeto-piloto de rede 4G por rádio, que tem obtido resultados. “Já fizemos transmissões de vídeo por WhatsApp de dentro da lavoura”, contou Mariote. Outro consenso entre os debatedores se deu em relação à viabilidade econômica de investir em tecnologias de conectividade. “A agricultura digital vai acontecer. Não porque é bonito, mas porque é impulsionada por uma irresistível força econômica”, concluiu Martins. PLANT PROJECT Nº5

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Agrishow

FUTURO COMPARTILHADO

com a participação de: Danielle Fonseca, Fundadora da UllerAgro Maurilio Biagi Filho, Presidente do Grupo Maubisa Moderador: Ibiapaba Netto, Diretor executivo da CitrusBR

O que acontece quando um nome consagrado do agronegócio se vê diante das ideias inovadoras de uma jovem empreendedora AgTech? No painel de encerramento do evento STARTAGRO AGRISHOW, a possibilidade de um confronto entre diferentes gerações foi substituída por um encontro proposital e até familiar. De um lado, a jovem engenheira mineira Danielle Fonseca, fundadora do aplicativo para compartilhamento de máquinas agrícolas UllerAgro, apresentou

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Baseado no painel “Diálogo de gerações"

ao veterano empresário Maurilio Biagi Filho, um dos mais importantes nomes do setor sucroenergético nas últimas quatro décadas, os conceitos da novíssima economia compartilhada. De outro, recebeu de Biagi uma injeção de ânimo para avançar com seu projeto. “Tenho visto em outros setores, como o de transporte, que o mundo moderno é mesmo compartilhado”, afirmou ele. Danielle demonstrou como o uso de seu aplicativo para que um produtor utilize a máquina ociosa de outro pode gerar valor para as duas partes envolvidas. “O valor de um bem não está necessariamente na sua posse”, afirma ela, que começou sua operação no sul de Minas, onde sua família também produz café. Apresentado como o “Uber das Máquinas”, o serviço já tinha, então, 119 fazendas e 75 máquinas cadastradas. Biagi vislumbrou potencial no negócio. “Um ser-


STARTAGRO PIRA

viço como esse pode gerar uma otimização extraordinária dos equipamentos”, afirmou. “A vantagem econômica parece bastante clara.” O diálogo foi marcado também pela emoção. Ao descobrir que havia sido amigo do avô da empreendedora, o ex-vice-presidente da República Aureliano Chaves, Biagi relembrou a relação deles e a relevante participação do político no desenvolvimento do setor sucroenergético. Danielle emocionou-se com a homenagem. Biagi também se confessou um pouco assustado com a velocidade com que as novas tecnologias têm chegado, não apenas no campo. Mas se mostrou um entusiasta delas. E, dirigindo-se à parceira de palco, observou: “Aqui está o passado. Ali, o presente”.

No final de junho, foi a vez de Piracicaba, pólo de inovação do interior de São Paulo, receber a comunidade AgTech. Com casa lotada, cerca de 400 pessoas participaram do STARTAGRO PIRA, na Usina de Inovação Monte Alegre. Na ocasião, ocorreu o lançamento da StartAgro Internacional, uma parceria entre a plataforma e a instituição portuguesa Inovisa, com o objetivo de aproximar, a partir da troca de conteúdos, startups brasileiras do ecossistema europeu. A coordenadora da Inovisa, Cristina Motta Capitão, participou de Lisboa, por Skype, de um papo que contou ainda com Márcia Malaquias, da Alluagro, e Fernando Velloso, da Mvisia, startups nacionais apoiadas pelos portugueses. Os painéis tiveram como foco a solução de problemas e a oportunidades de carreiras criadas pela chegada de novas tecnologias ao campo. No debate sobre como as startups podem auxiliar produtores e empresas do agro. moderado por Luiz Fernando Sá, participaram Daniela Coco, sênior manager para área de Agribusiness da PWC, Tiago Fischer, sócio da Stracta Consultoria, e Fábio Silva, coordenador do AgriHub. Já as discussões sobre as profissões do futuro no agro foram conduzidas por Ricardo Campo, especialista em comunicação e marketing do Rabobank, e reuniram Mateus Mondin, conselheiro da EsalqTec, Carlos Henrique. Augusto, professor da FATEC Shunji Nishimura, de Pompéia (SP) e César Braga, sócio da Hub Talent, especializado no recrutamento de profissionais para empresas do agronegócio.

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Pira

Para o painel Diálogo de Gerações, o líder da StartAgro, Clayton Melo, moderou a troca de experiências entre o professor Antonio Cesar Salibe (diretor-executivo da Udop), que falou da importância da inovação trazida pelas startups, e Cristina Tibola, sócia da Pragas.com, ressaltou a importância da aproximação entre academia e empreendedores. Um dos pontos altos da tarde foi o espaço aberto para que cinco empreendedores apresentassem o pitch de suas startups diante de uma banca de especialistas. Apresentados pelo coordenador da EsalqTec, eles tiveram apenas três minutos para mostrar aos jurados - Weber Amaral, professor da Esalq e membro do conselho da Usina de Inovação Monte Alegre; Alexandre Bio Veiga, da Inseed Investimentos; Rodrigo Iafelice dos Santos, diretor da CGG Trading; Thiago Lobão, sócio da SP Ventures; e Jardel José Busarello, diretor do SEBRAE-Piracicaba – por que merecem um lugar ao sol no ecossistema AgTech. Para saber como foram os debates, assista aos vídeos do evento na página da StartAgro no Facebook (www.facebook.com/startagro).

O auditório da Usina de Inovação Monte Alegre lotado e momentos de três paineis do StartAgro Pira: inovação e educação na pauta dos debates

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Markets

O QUE É O RENOVABIO P linio Nastari*

O Brasil é con siderado o P aís mais avançado do mundo n a área de biocombu stíveis por substit u ir 36% da ga solin a por etanol e 8% do diesel fóssil por biodie sel. E m volu me, é o se gundo maior produtor mundial de et anol e biodie sel e t em um grande potencial também através do biogás, biometano e bioquerosen e. No entanto, as bases sobre as quais esses mercados tê m se desenvolvido ainda são frágeis. A f alta de condições estáveis te m causado insta b ilidade, o que pode levar a ret rocessos indesejáveis. A ine xist ência de u ma regulação mín ima tem resultado nu m mercado com precificação ba sic amen t e à vist a, sem condições que est imulem o invest imen t o em expan são da capacidade

de produção. Ao mesmo tempo que viabiliza objetivos de políticas ambiental, industrial e de desenvolvimento econômico descentralizado, o Brasil tem a oportunidade de integrar sua política de desenvolvimento agroindustrial com sua política energética . As diretrizes do programa RenovaBio, aprovadas pelo C onselho N acional de Política Energética, visam criar um arcabouço regulatório que traga previsibilidade e credibilidade, viabilizando condições estáveis para a retomada do investimento privado sustentado nessa área. O RenovaBio é uma proposta de regulação que objetiva induzir ganhos de eficiência energética na produção e no uso de biocombustíveis e reconhecer a capacidade

de cada energético contribuir para o atingimento de metas de redução de emissões de carbono. Diferentemente de medidas tradicionais, o RenovaBio não propõe a criação de imposto sobre carbono ou de subsídios. O estabelecimento de metas de redução das emissões de carbono para o mercado de combustíveis, em sintonia com os compromissos assumidos no Acordo do Clima, vai criar um farol para o tamanho do mercado futuro de biocombustíveis, inserindo-os de forma definitiva na matriz de combustíveis. O RenovaBio não contrapõe biocombustíveis aos de origem fóssil. Não está sendo definido qual será o tamanho do mercado de etanol, biodiesel, biometano ou bioquerosene. O tamanho do mercado de

* Representante da Sociedade Civil, especialista em matéria de energia, no Conselho Nacional de Política Energética (CNPE).

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M MARKETS

b ioc o mbustí vei s est ar á re la ci onado à ambi ç ão e à ve l oci dade do a t ingi mento das me tas d e redução de emi s s õ es d e c ar bono, o que d ev e oc or rer em har monia e nt re os b ioc o mbustí vei s e o s c ombustí vei s de or i g em fós s i l . A re g ul ação pretendida me lhor a a or gani zação, c onfere previ si bi l i da de, p rom ove mai or e f ic iênci a, menores c us t o s e mai or contro le c ontr a fr audes. O R e novaBi o i ntroduz me ritocr aci a na p rodução de b ioc o mbustí vei s, p re mi ando e confer indo e s t ímul os à crescente e f ic iênci a em sua p rodução e uso. O p rog r ama Rota2030, ge rido pel o Mi ni stério do De s envol vi mento, Ind ústr i a e Comérci o Ex t er i or, tem a op ortuni dade de i nduz ir a ot i mi zação da frota fle x par a o uso de e t a nol , a i ntrodução dos h íb ridos fl ex e dos ve íc ul os equi pados co m c é lul as a combustí v el movidas a etanol .

A aplicação do R enov aB io v ai v iabiliz a r a tro ca de C er tificado s d e R edução de E m is s ão relacionados ao us o d e bio co m bus tív eis e ir á deter m inar em co ndiç õ e s de m ercado o v alo r d a tonelada de car bo no. B iocom bus tív eis s ão co ns ider ados o pção m oder na e am bientalm ente av ançada de ener g ia par a o s etor de tr ans po r tes . A s em is sõ e s de gas es do efeito es t u f a do car ro flex br as ileiro rodando a etano l s ão m eno res do que as m etas alm ejadas par a 2 0 4 0 pelo s car ro s elétr icos na União E uro peia. O R enov aB io é um a pro pos ta de regulaçã o co ns tr uída a par tir de co nceitos e do aprendiz ado o btido c o m as m ais m oder nas iniciativ as inter nacio n a i s, co m o o P adr ão de C o m bus tív eis de B aixo C ar bono e o P adr ão d e C o m bus tív eis R enov á v e i s nos E s tados Unido s , e a Diretiv a de E ner gia R enov áv el na União E uro peia. M as v ai alé m

a o i n d u z i r e p re m i a r a b u sc a p o r m a i o r eficiência energética no se t o r d e b i o c o m b u st í v e i s, conferindo eficiência e v competitividade c re sc e n t e s, o q u e d e v e l e v a r a m e n o re s c u st o s p a r a a so c i e d a d e e p a r a o s c o n su m i d o re s.

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Mais informações: publicidade@plantproject.com.br Edição: 06 (setembro/outubro 2017)

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Autorização: 24/08

Fechamento: 31/08


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O DESAFIO DA ENERGIA Uma mudança global de matriz energética está em curso e passa pelas lavouras do Brasil. Saiba por que e como o País deve se mobilizar para liderar o movimento global pela utilização de fontes renováveis na edição número #06 da revista dos líderes do agronegócio.

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Série TOP FARMERS: no café e na pecuária a pasto, mais dois episódios da série que conta as lições dos melhores produtores brasileiros.

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