Plant | Edição 2

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Para quem pensa, decide e vive o agribusiness

A MARCA DOS

TOP FARMERS 2017 Uma homenagem inédita aos heróis da produção ESCÓCIA VIAJE PELO MÁGICO REINO DO MELHOR UÍSQUE DO MUNDO

MERCADO DE TERRAS

A lei que pode injetar US$ 20 bilhões no agronegócio brasileiro

CUBA Por que a agricultura está no centro da estratégia de abertura da Ilha PERFIL Ricardo Brennand conta as histórias e mostra os tesouros de sua usina de amor à arte

venda proibida distribuição dirigida www.plantproject.com.br

FRONTEIRAS O MAIS DIFÍCIL DESAFIO DO MATOPIBA

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As melhores refeições acontecem quando o papo rola solto. Pontos de vista diferentes deixam as refeições com um gostinho especial. É assim que a gente pensa quando o assunto é a agricultura. Plantar alimentos suficientes para um mundo em crescimento é um grande desafio - e fazer isso de um jeito sustentável exige muitas ideias e uma série de recursos. Está na hora de criar um grande debate sobre como a tecnologia pode apoiar a produção de alimentos. Participe dessa conversa em www.descubramonsanto.com.br

Monsanto and Vine Design® é marca registrada pertencente à Monsanto Technology LLC© 2017, uma empresa do grupo Monsanto. PLANT PROJECT Nº 2

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E d ito ri a l

ABRAM ALAS PARA A PRODUÇÃO Para quem pensa, decide e vive o agribusiness

TOP FARMERS 2017 Uma homenagem inédita aos heróis da produção ESCÓCIA UMA VIAGEM MÁGICA PELO REINO DO MELHOR UÍSQUE DO MUNDO

MERCADO DE TERRAS A lei que pode injetar US$ 20 bilhões no Agronegócio brasileiro

CUBA A agricultura pode salvar o futuro da ilha pós-Fidel? PERFIL Ricardo Brennand conta as histórias e mostra os tesouros de sua usina de amor à arte

venda proibida distribuição dirigida www.plantproject.com.br

FRONTEIRAS O MAIS DIFÍCIL DESAFIO DO MATOPIBA

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Para o agronegócio brasileiro, o samba atravessou logo nas primeiras semanas de 2017. A notícia de que uma escola de samba carioca levaria para a avenida um enredo com uma visão distorcida e injusta dos produtores e de seu trabalho causou indignação. Mais que isso, gerou uma onda de protestos de entidades, lideranças e muitas outras vozes do campo. É justo que se grite. O Carnaval, afinal, é uma vitrine do Brasil – e nela agricultores e pecuaristas foram expostos como vilões, quando na verdade a imensa maioria deles deveria ser vista como personagens fundamentais para o desenvolvimento do País. A questão que se coloca é não deixar que a indignação, como o Carnaval, acabe na Quarta-Feira de Cinzas. O Bloco da Produção está na passarela todos os dias. Seu enredo de crescimento, inovação, eficiência, investimento e perseverança, da mesma forma, tem de estar permanentemente em evidência, e não apenas quando um sambista cruza o seu caminho. O Carnaval é só uma festa. O agronegócio é o que sustenta o Brasil. PLANT PROJECT nasceu para fazer ecoar os sons que vêm das lavouras, dos pastos e das agroindústrias. Acreditamos que, para ser reconhecido, o trabalho duro e de excelência de nossos produtores precisa antes ser conhecido. A sociedade só dará o devido valor àqueles que estão por trás do que lhe é servido à mesa quando compreender, de verdade, a grandeza da missão de agricultores e pecuaristas. Não é algo que aconteça da noite para o dia. É preciso um esforço sistemático e duradouro de comunicação que realce os enormes benefícios das atividades associadas ao agronegócio – sem, é claro, esconder os percalços ou abandonar o debate em torno das questões ambientais, de saúde e de recursos humanos. PLANT, modestamente, coloca-se na comissão de frente dessa empreitada, levando para a avenida o prêmio Top Farmers. Damos início a um ambicioso projeto que visa a homenagear os homens e mulheres que são referência na agropecuária nacional. Você conhecerá aqui dez representantes desse bloco de bambas que trouxe produtividade, gestão, tecnologia e prestígio internacional para o campo brasileiro. Nos próximos meses, quando as baterias das escolas de samba já estiverem em silêncio, continuaremos na mesma batida, detalhando as histórias de cada um deles. Ao longo de todo o ano de 2017, os Top Farmers desfilarão – um a cada mês – pelas nossas passarelas digitais e impressa de conteúdo, mantendo no ar as mensagens positivas e as lições que o mundo tem vindo aprender no Brasil. Muito mais que o país do samba, o Brasil é o país da produção.

Luiz Fernando Sá Diretor Editorial

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Í ndi ce

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G pág. 7 Ag pág. 19 Fo pág. 53 Fr pág. 57 W pág. 71 Ar pág. 89 S pág. 97 M pág. 118 G LOB A L

D i r etor E ditoria l Luiz Fernando Sá luiz.sa@plantproject.com.br D i r etor Comerc ia l Phelipe Krisztan Pedroso Marketing e Publicidade Multiplataforma phelipe.pedroso@plantproject.com.br D i r etor Luiz Felipe Nastari A rt e Andrea Vianna Projeto Gráfico e Direção de Arte Col ab o ra dores: Texto: Ariosto Mesquita, Catarina Guedes, Clayton Melo, Costábile Nicoletta, Fiona Rintoul, Flora Guedes, Irineu Guarnier Filho, Jim Patrico, Maximiliano Tozzini Bavaresco, Núria Saldanha, Romualdo Venâncio, Ronaldo Luiz Fotografia: Alcione Ferreira, Claudio Gatti, George Steinmetz, Konrad Borkowski, Rui Rezende, Zezinho Peres Ilustrações: Bruno Tulini, Caio Borges Revisão: Rosi Melo Com un i cação Eliane Dalpizol Coordenadora de Comunicação eliane.dalpizol@datagro.com Ev e n to s Simone Cernauski A d m i n i st ração e Fina nç as Claudia Nastari Sérgio Nunes

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A produção sob outro ângulo Granja para criação de perus no estado de Iowa (EUA) produz até 150 mil aves por ano

G GLOBAL

O lado cosmopolita do agro

foto: George Steinmetz PLANT PROJECT Nº 2

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GLOBAL

O lado cosmopolita do agro

E S TA D O S U N I D O S

O AGRO VISTO DE CIMA O premiado fotógrafo americano George Steinmetz viaja o mundo atrás das mais impressionantes e desconcertantes imagens sobre a produção de alimentos. E tem uma visão única sobre o setor Por Luiz Fernando Sá

As cabanas acima são um berçário para fazendas leiteiras no estado americano de Wisconsin. Bezerras recém-nascidas passam nelas seus primeiros 180 dias de vida, antes de seguirem para a vida produtiva. A área tem 4.896 estábulos individuais, divididos em 72 ruas, por onde passam caminhões que trazem leite e água para os animais 8


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eorge Steinmetz já perdeu as contas de quantas vezes subiu em um avião e decolou para os mais distantes países do mudo em busca de paisagens e histórias impressionantes sobre a vida na Terra. Apenas para a consagrada revista britânica National Geographic esse fotógrafo americano de 59 anos produziu mais de 40 grandes ensaios, com os quais foi recompensado com alguns dos mais importantes prêmios fotográficos do planeta. Ao chegar a seu destino, Steinmetz embarca em novos voos. A bordo de um paraglider ou de ultraleves, sobrevoa grandes extensões de terra em busca de ângulos inéditos, permitindo que suas fotos revelem uma nova visão de aspectos físicos, econômicos e sociais. Nos últimos anos, o agronegócio tornou-se alvo recorrente de suas câmeras. Do alto, ele tem apontado as lentes para a produção em larga escala, mostrando a grandeza e os desafios do chamado agronegócio industrial. Por duas vezes esteve no Brasil e recentemente cruzou os Estados Unidos para um impressionante ensaio sobre o que chama de Big Farming para o The New York Times. A PLANT, o fotógrafo voador conta por que escolheu esse tema e diz que o trabalho de mostrar ao mundo de onde vem o alimento que ele consome ainda não terminou.

Os primeiros voos. “Comecei a voar em 1998. Fiz uma reportagem para a National Geographic no Saara. Precisava fazer fotos aéreas, mas não havia aviões para alugar. Então aprendi a pilotar um ultraleve. Com ele, podia dirigir enquanto fotografava. Achei interessante. O motor não era muito confiável, mas no deserto achei que era seguro, pois podia pousar em qualquer lugar. Era um motor de dois tempos e eu mesmo sabia como consertar. Gostei da experiência e decidi repeti-la em outros desertos. Em 15 anos fotografei todos os desertos do mundo, em 27 países.” Por que voar. “Mais recentemente, me pediram uma reportagem sobre o novo milênio, mais especificamente sobre como faríamos para alimentar a grande demanda da humanidade, já que até 2050 teremos 9 bilhões de habitantes. Em países como China e Índia e na América Latina, há uma demanda crescente por carne e outros produtos agrícolas. Teremos de dobrar a oferta de alimentos. A pergunta era como fazer isso sem esgotar os recursos naturais. Assim, o projeto que me pediram era mostrar em imagens como fazer para alimentar o planeta. Eu disse a eles que imaginava que, com minha fotografia aérea, poderia dar uma perspectiva única sobre o tema. Aprendi fotografando vida selvagem na África, PLANT PROJECT Nº 2

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Na Califórnia, cenouras saem da fábrica. Ou melhor, são processadas. Depois de colhidas, elas chegam inteiras à unidade, são lavadas e cortadas em pedaços tamanho “baby” e inspecionadas por câmeras. As defeituosas viram suco ou ração para gado. Uma das maiores unidades do mundo, a Grimmway produz 11 milhões de quilos por semana

em que era preciso pelo menos mil girafas para dar uma ideia de escala às imagens. Então propus uma história que eu chamei de Extreme Farming (Agricultura Extrema, em tradução livre). Disse: ‘Vamos procurar os maiores que conseguirmos’. Eles gostaram da ideia. Trabalhei nisso por um ano. Corri os Estados Unidos, Brasil, China. Minha ideia era ter os Estados Unidos, por serem os maiores exportadores de alimentos e por terem um agronegócio muito maduro; o Brasil, por ser onde a produção cresce mais rápido; e fui para a China, por ser o mercado consumidor que mais cresce também. Recomecei cerca de um 10

ano atrás e logo fui contatado pelo The New York Times, que pagou pela minha viagem pelos EUA. Voltei para a China pela National Geographic. Agora quero continuar fotografando a produção de alimentos em países como Tailândia, Indonésia, Índia. E, é claro, voltar ao Brasil.” A visão do Brasil. “Nos últimos três anos, estive duas vezes no País. Achei impressionante. Vocês utilizam a mesma tecnologia que está disponível aqui nos Estados Unidos, mas a tratam como quem desenha em uma folha em branco. Tudo aí tem uma escala diferente, o que é muito interessante. Lembro de quando estava no norte do Mato Grosso, próximo a Sorriso e Sinop. Praticamente não havia cidades por lá, era preciso percorrer grandes distâncias para chegar a uma concentração um pouco maior. Nos Estados Unidos há uma série de pequenas cidades que agora estão morrendo por causa da mecanização, que acaba com

empregos e afugenta as pessoas. Aqui, o que acontece é que aos poucos as pequenas propriedades estão sendo consolidadas em grandes propriedades, enquanto no Brasil as propriedades já nascem grandes, com uma pequena casa no centro e a cidade mais próxima a mais de uma hora e meia de distância. Também escolhi o Brasil porque queria fotografar a indústria da carne, e nos EUA ela é extremamente fechada. É quase impossível entrar em um frigorífico aqui, assim como em qualquer outra planta que lida com animais, como galinhas, por exemplo. No Brasil vocês não têm toda essa loucura. Aí vocês se orgulham de ter equipes e instalações de qualidade internacional.” Fotógrafo ou espião? “Quando voo, por exemplo, com um avião não tenho que pedir autorização para sobrevoar e fotografar. Com um helicóptero, em um voo mais baixo, também


não é tão complicado. Mas com um paraglider, que é basicamente um motor preso às minhas costas, não dá para voar rápido. Então, se você tenta bisbilhotar alguma coisa, é fácil ser pego pelos donos da propriedade. A primeira vez que fui preso trabalhando foi quando estava voando para esse projeto nos Estados Unidos. Fui preso por sobrevoar um confinamento no Kansas. Já sobrevoei países como Iêmen e Líbia. No Irã, fui detido algumas vezes acusado de espionagem, mas nunca me puseram na cadeia. Mas aqueles malditos caipiras do Kansas, sim. Isso só me fez pensar: o que esses caras estão tentando esconder?” O desafio da transparência. “Acho estúpido quando as companhias tentam manter a imprensa longe ou procuram esconder parte dos seus processos. Isso é muito ruim, aumenta a desconfiança do público. Nunca vou fotografar uma fazenda ou

planta industrial com uma atitude ou uma visão negativas. Quando fui a um frigorífico da JBS, o maior da América Latina, em Campo Grande, me disseram que abatiam algo como 10 mil animais por dia, fiquei impressionado. Disse: ‘Isso é um trabalho enorme. Como vocês fazem isso?’ Tempos depois uma revista americana me procurou querendo fazer uma matéria na linha "Auschwitz do Gado". Queriam comprar minhas imagens. Pode parecer tentador, pois custa caro fazer esses projetos e preciso de dinheiro para sobreviver. Mas acho complicado. Não considero justo com aqueles que me deixaram entrar e me mostraram seu trabalho. Fotografar o agro mudou seus hábitos alimentares? “Não, de forma alguma. Quando estive no Brasil, no frigorífico de Campo Grande, fui comer em ótimas churrascarias. Mas muitas vezes penso a respeito disso, na forma como alguns produtores que

Em Sorriso (MT), porcos recém-nascidos são vacinados no confinamento de um frigorífico. Eles passam ali grande parte de sua vida adulta. Steinmetz esteve duas vezes no Brasil fotografando a produção agropecuária em larga escala

conheço tratam seus animais ou em como determinados produtos são industrializados. Eu como carne e, para ser sincero, o que mais me preocupou no Brasil foi quando estive no Mato Grosso e vi como a Amazônia está sendo ilegalmente devastada por grandes projetos de soja. Sei que o governo tem tentado impedir, com patrulhas florestais por terra e aéreas. Eles fazem o que é possível. Mas acho que é muito importante tentar preservar o que ainda temos de natural e selvagem no mundo. A agricultura tem de tentar produzir de maneira mais eficiente, reduzindo as áreas plantadas sem perder o volume produzido e até aumentando. Os produtores têm um grande trabalho a fazer.” PLANT PROJECT Nº 2

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ALEMANHA

PORTO DA MÚSICA O local já foi a porta de entrada de toneladas de cacau e café no continente europeu. Agora, é a espetacular casa da música clássica construída sobre antigos armazéns em pleno Porto de Hamburgo, na Alemanha -- um dos mais movimentados do mundo e ainda hoje um centro de comércio de commodities agrícolas fundamental para a Europa. A um custo (quase 800 milhões de euros) dez vezes maior que o previsto e com seis anos de atraso, a megalomaníaca Elbphilarmonie, sede da orquestra filarmônica da cidade, foi entregue em janeiro de 2017, mas antes disso já impressionava pela arquitetura arrojada, que transformou o edifício – que conta também com hotéis, apartamentos residenciais, lojas e centros culturais -- em um marco. A imensa estrutura de vidro desenhada pelo escritório suíço Herzopg & de Meuron e sustentada por 1,7 mil pilares de concreto não foi exatamente uma unanimidade entre a população local, e as constantes quebras do orçamento geraram desconfiança e protestos. Os primeiros acordes na grande sala de concertos, com acústica projetada pelo japonês Yasuhisa Toyota, parecem ter abafado os ruídos dos descontentes, assim como o som dos navios passando ao lado. Conheça alguns detalhes do projeto:

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Hotel – a rede Westin opera uma unidade na parte superior ala Leste do prédio, com 244 quartos e suítes, restaurante, spa e área para eventos.

Sala de Recitais – com capacidade para até 550 pessoas, é um espaço flexível para múltiplas configurações, apropriado para grupos de câmara, pequenos grupos e solistas.

Plaza – uma grande praça suspensa, a 37 metros do solo, dá acesso a todas as atrações do prédio, do hotel às salas de concerto. Vistas deslumbrantes do porto de Hamburgo, lojas e restaurantes fazem do local um passeio obrigatório na cidade.


Grand Hall – o principal auditório da Elbphilarmonie tem o palco no centro de uma série de terraços que acomodam 2.100 espectadores. Sobre o palco, um enorme refletor de sons é responsável pela acústica impecável.

Restaurantes – no alto da rampa do Tube, um espaço com três andares oferece várias opções gastronômicas e de bares, onde é realizada uma série de eventos, como degustações de cervejas.

Tube – a rampa rolante curva com 82 metros de comprimento é o principal acesso à Plaza. O arrojo arquitetônico faz dela uma atração à parte.

Kaistudios – na base do novo edifício, o antigo armazém hospeda o espaço interativo “World of Instruments”, e salas para programas de educação musical, seminários, workshops e ensaios.

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Globetrotter

CHILE

O robô que produz leite A utilização de sistemas automatizados de ordenha já é uma realidade em milhares de propriedades de pecuária leiteira ao redor do mundo, inclusive no Brasil. Mas é no Chile que os robôs ordenhadores passarão por seu maior teste de escala a partir do início de 2017. Nada menos que 64 sistemas de ordenha voluntária (Voluntary Milking System – VMS), como são chamados pelo fabricante sueco DeLaval, devem operar simultaneamente na fazenda Fundo El Risquillo, próxima da cidade de Los Ángeles, a 500 km ao sul de Santiago. Com isso, o trabalho de extração do leite de

4,5 mil vacas será feito sem nenhuma interação humana, transformando-a na maior planta do gênero em todo o mundo. As máquinas são instaladas em currais aos quais as vacas têm livre acesso para serem ordenhadas quando sentirem necessidade. Elas aprendem a rotina e, em poucos dias, vão sozinhas para os cochos, onde suas tetas são limpas, higienizadas e estimuladas individual e automaticamente. Então, os robôs utilizam scanners, que detectam a posição das tetas e acoplam nelas as ordenhadeiras. Ao mesmo tempo, equipamentos monitoram a saúde dos animais.

E S TA D O S U N I D O S

OS CÃES DE GUARDA DA AGRICULTURA Qualquer pessoa que desembarca nos Estados Unidos está sob vigilância. Discretamente, os agentes se aproximam e... sniff! Com olfato apurado, eles são capazes de identificar na bagagem dos passageiros alimentos de vários tipos, crus ou industrializados. Descoberto o produto, eles se sentam ao lado do alvo e aguardam até que uma revista mais detalhada seja feita. É assim que trabalha a Beagle Brigade (Brigada Beagle), grupo com 114 equipes de cães e 14

adestradores, que nos últimos 20 anos tem sido fundamental para o setor de defesa vegetal e animal nos aeroportos internacionais americanos. Dóceis e alertas, os cães da raça beagle são a grande maioria do time – daí a denominação. Mas há também labradores, que transitam em meio à multidão em busca de pistas que possam evitar a entrada no país de pragas e espécies invasivas, que podem trazer bilhões em prejuízos às lavouras e criações nas fazendas americanas. Uma

vez identificados, os produtos – de maçãs a frutas secas ou embutidos -- são confiscados e incinerados no próprio aeroporto. Cães e seus adestradores ficam juntos durante toda a carreira, criando um grande laço de amizade. Após anos de trabalho, os beagles são adotados por seus treinadores.


AUSTRÁLIA

SOL, MAR... E TOMATES! Vinte e quatro mil espelhos apontados para uma torre de 127 metros. Cerca de 20 hectares de estufas construídas sobre solo árido e abastecido com água retirada do mar. Para Philipp Saumweber, ex-executivo do banco Goldman Sachs e membro de uma família alemã abastada, é com esses ingredientes que se faz uma boa e lucrativa fazenda. Pelo menos foi com essa receita que ele transformou uma propriedade estéril da costa Sul australiana, às portas do deserto, em uma fértil lavoura capaz de produzir 350 toneladas de tomates por semana – cerca de 15% do que é consumido no país. Fez tudo isso em apenas sete anos, começando por uma pequena estufa e painéis solares caseiros. Hoje, em grande escala, a tecnologia desenvolvida por sua empresa, a Sundrop Farms, utiliza a energia solar para manter a temperatura perfeita nas estufas e para dessalinizar a água marinha, depois utilizada como base para a produção hidropônica. Os espelhos refletem a luz solar para o alto da torre, onde o calor gerado é transformado em energia, que abastece tanto a planta de dessalinização quanto as áreas climatizadas de produção.

A ideia do produtor Saumweber – cuja lavoura solar está hoje avaliada em US$ 175 milhões -era desenvolver um projeto que atendesse às necessidades da produção moderna de alimentos. “Queria criar um novo modelo de negócios para a agricultura, com base em um conceito de fazer mais com menos e crescer de forma mais sustentável.” O modelo parece estar dando

frutos. A Sundrop abriu em 2016 duas novas fronteiras de produção, uma em Portugal e outra nos Estados Unidos.

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VIAGEM

EM CASA, NA FAZENDA O conceito de hospedagem em casas alugadas por curta temporada cativou milhões de viajantes de todo o mundo e fez do Airbnb – empresa criada em São Francisco, nos Estados Unidos – uma opção para quem quer fugir do padrão impessoal e, às vezes, frio das grandes redes hoteleiras. Sucesso nas grandes cidades, o modelo também chegou às áreas rurais de vários países e permite aos turistas a experiência de passar uns dias em fazendas, conhecendo o estilo (e até o luxo) da vida no campo estrangeiro. Para quem quiser experimentar, PLANT pesquisou a plataforma Airbnb e fez uma seleção eclética de propriedades para todos os estilos, de uma cabana em uma fazenda orgânica na Inglaterra a uma luxuosa villa na Toscana. Boa viagem.

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ROSE MOON (Bali, Indonésia) A piscina e as tendas para relax debruçam-se sobre os arrozais nessa propriedade sofisticada, próximo de vilas onde se pode conhecer o melhor das tradições locais. Com dois quartos, acomoda quatro pessoas. THE COTTAGE AT BOM TERRA FARM (Texas, EUA) O estilo country-rústico-chique é a marca desse antigo haras, que ainda hoje cria cavalos da raça Irish Sports. A 45 minutos de Dallas, a cabana de madeira e pedra para quatro hóspedes é totalmente equipada. As cocheiras, cenário perfeito para festas.

VILLA GOURMET EM ORENTANO (Toscana, Itália) Datada do século XVIII, a propriedade foi totalmente renovada pelo proprietário, um legítimo chef. Assim, os 14 hóspedes encontrarão, além de paisagens típicas da região, acesso ao melhor da gastronomia local, além de vinhedos e árvores de várias espécies, a poucos quilômetros de cidades históricas como Lucca e Florença.


MAS ESTELA (Catalunha, Espanha) Com serviços de hotel, a fazenda do século XVI está a poucos quilômetros da Costa Brava e dos Pirineus. Mas as belas paisagens, com pomares de oliveiras, lagos e florestas, convidam a permanecer no local. Acomoda luxuosamente até 18 pessoas.

THE BLUE YURT (Powys, Reino Unido) A Oeste de Londres, no País de Gales, um refúgio único em meio a uma comunidade voltada à agricultura orgânica. A acomodação para até seis pessoas é em uma cabana no estilo mongol, com decoração típica. A cozinha, um antigo ônibus adaptado. A propriedade possui vacas Jersey e ovelhas e produz seus próprios queijos e vinhos. Para quem busca uma opção, digamos, bastante alternativa.

H O L A N DA

É como uma viagem de intercâmbio. Pode até ser um estágio em terras bem distantes. O objetivo? Conhecer como produtores rurais de terras distantes lidam com seus problemas, conhecer novas experiências, descobrir maneiras de incrementar a produtividade com os melhores em cada cultura. Para cerca de 2 mil membros da Global Farmers, uma comunidade digital criada pelo banco holandês Rabobank, projetos como esses tornaram-se bem mais viáveis. Agricultores, pecuaristas e executivos dos mais variados setores do agronegócio podem se conectar a seus pares nos cinco continentes e buscar – ao vivo ou através da plataforma – conhecimento sobre sua atividade e novas oportunidades. Criada há menos de dois anos, a comunidade é restrita aos clientes do banco e conta também com amplo conteúdo sobre temas relevantes para a maioria, como sucessão, melhoria da eficiência e lucratividade na produção, inovação e sustentabilidade.

Intercâmbio para produtores O networking na rede Global Farmers corre solto, sem necessariamente contar com a intermediação do banco. Trocas de experiências e visitas a propriedades são combinadas diretamente entre os produtores, sem determinação de tempo médio ou roteiro. O mais interessante é que os encontros acontecem pelas duas vias, física ou digital. Tanto entre clientes que se conhecem em eventos internacionais do Rabobank e depois se conectam na plataforma ou clientes que descobrem afinidades produtivas na rede e combinam de se conhecerem no ambiente de suas fazendas. Um grupo de 80 especialistas do departamento de pesquisas setoriais banco também faz parte da rede, apoiando as discussões da comunidade com informações. PLANT PROJECT Nº 2

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E S TA D O S U N I D O S

O homem de Trump para o campo Foram 50 dias de espera desde as eleições. A indicação foi feita apenas na véspera da posse, fazendo da Agricultura a última pasta a ser preenchida. Para muitos, foi uma demonstração de desprestígio do setor, embora grande parte da vitória de Donald Trump para ocupar a Casa Branca nos próximos quatro anos se deva aos votos vindos dos estados com grande força agrícola, como os do Meio-Oeste americano. E a opção do novo presidente por Sonny Perdue, ex-governador da Georgia, não ajudou a dissipar as dúvidas sobre como será a sua relação com o setor que faz dos Estados Unidos os maiores exportadores de alimentos do mundo. Trump e Perdue tem muito em comum. Assim como o agora presidente, o ex-governador não tinha história política e era tido como uma grande zebra quando foi escolhido para o governo do seu estado em 2002. Populista, governou por dois mandatos e deixou um legado controverso. A seu favor, agora, pesou a extensa relação com o mundo agro. Perdue 18

nasceu e cresceu em uma fazenda da Georgia. Tem doutorado em medicina veterinária e larga experiência como criador de gado. Teve várias na área, de fazendas a tradings. É também, a exemplo de Trump, afeito a gestos, digamos, heterodoxos. Em 2007, quando a Georgia atravessava uma grave seca, transformou a sede do governo do estado em um templo e liderou uma corrente de orações pela volta das chuvas. Um dia depois, elas caíram sobre o estado. Assim como o novo chefe, Perdue defende a redução dos entraves legais que regulam a atuação dos produtores americanos, seja do ponto de vista burocrático, seja no ambiental. Ambos têm como alvo a agência ambiental americana (EPA), que na gestão Obama ganhou força e impôs uma série de atos de proteção aos rios e a matas em áreas agrícolas. Mas há evidentes discordâncias. O secretário é a favor, por exemplo, do acordo comercial Transpacífico, que Trump ameaça detonar. Perdue se alinha aos produtores, que acreditam que uma maior abertura comercial com a Ásia pode ampliar as exportações agrícolas americanas. Outro ponto de atrito pode ser a questão da imigração. Trump quer restringir o trabalho de imigrantes, fundamental para o meio rural. Perdue, que chegou a assinar uma lei com esse teor quando no governo da Georgia, hoje é mais flexível nesse tema. Terá coragem para enfrentar essa batalha?


Trator prepara terra para plantio Os

caminhos e as

lições dos campeões da produção

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Empresas e líderes que fazem diferença

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Ag AGRIBUSINESS

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Empresas e líderes que fazem diferença

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A MARCA DOS

TOP farmers Por Romualdo Venâncio e Ariosto Mesquita | Ilustrações Caio Borges

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Ag TopFarmers 2017

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esponsáveis por produzir os alimentos que chegam à mesa de bilhões de pessoas em todo o mundo, os agricultores e pecuaristas brasileiros são heróis anônimos da humanidade. Eles fazem do Brasil uma potência global da comida e formam a base de uma enorme cadeia produtiva que movimenta mais de 25% do PIB nacional. Tamanho esforço merece um reconhecimento à altura. Para fazer justiça a esse trabalho quase missionário, a plataforma PLANT PROJECT criou o projeto TOP FARMERS, que visa a homenagear, premiar e dar visibilidade aos produtores rurais de diversas culturas e segmentos e às melhores práticas utilizadas para dar eficiência e produtividade às suas propriedades. O projeto inédito – nenhuma outra premiação antes se propôs a cobrir de forma tão ampla a produção agropecuária -- vai identificar a cada ano, os melhores produtores em cada cultura e contar as suas histórias, em reportagens impressas e em canais digitais durante todo o ano, mantendo a produção em evidência por um longo período, e não apenas em uma cerimônia de premiação.


Em sua primeira edição, o projeto TOP FARMERS inicia esta homenagem por dez produtores que se tornaram referência em suas culturas ou área de atuação. Eles foram escolhidos pelo corpo editorial da PLANT, após consultas a lideranças de entidades agropecuárias, produtores, empresários e aos conselheiros do Global Agribusiness Forum (GAF), principal evento do agronegócio mundial. Ao relacioná-los, procuramos fazer um mosaico diversificado do enorme e eficiente universo agropecuário nacional. Nas próximas páginas, conheceremos dez histórias fascinantes pela competência de seus protagonistas, cada um a seu modo. Há gente de longa tradição familiar no campo, inclusive no comando de grupos centenários. Há desbravadores, homens que ajudaram a abrir e consolidar fronteiras agrícolas. Também estão na lista, representando seus pares, produtores com a marca da persistência, lado a lado com jovens que, em pouco tempo dedicado à agricultura, incorporaram novos modelos de gestão vindos de outras áreas de atuação e construíram uma reputação de inovação e qualidade ou buscando novas formas de produzir com sustentabilidade e foco na preservação ambiental.

Nesta edição, PLANT traz um resumo da atuação da primeira turma dos TOP FARMERS. Ao longo dos próximos meses, seus cases serão detalhados em reportagens mais extensas, vídeos, entrevistas. Suas lições e exemplos, além das perspectivas dos segmentos que representam, serão debatidos com outros produtores, promovendo a difusão das melhores práticas de gestão e produção e reforçando a real imagem empreendedora e desenvolvimentista do agronegócio brasileiro. Os TOP FARMERS 2017 não formam um clube fechado. Com eles, PLANT dá o primeiro passo de uma longa jornada em busca da valorização dos produtores rurais. Ao longo deste ano, trabalharemos em conjunto com o Conselho do GAF, acadêmicos e especialistas, no desenvolvimento de uma metodologia que transformará, a partir de critérios objetivos de eficiência, inovação e produtividade, o projeto TOP FARMERS no mais amplo prêmio do setor agropecuário do Brasil. PLANT PROJECT Nº 2

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Ag TopFarmers 2017

ISMAEL PERINA JÚNIOR

LIDERANÇA POR NATUREZA E POR CONVICÇÃO Referência dentro da fazenda e fora dela, Ismael Perina Júnior sempre está na linha de frente das conversas que levam às decisões do setor sucroenergético

Agricultura Cana

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Enquanto a produtividade média dos canaviais brasileiros não chega a 80 toneladas por hectare, na Fazenda Belo Horizonte, em Jaboticabal (SP), esse índice foi superior a 110 t/ ha em 2016. A notória eficiência resulta, em grande parte, do trabalho realizado pelo engenheiro agrônomo Ismael Perina Júnior, que desde 1980, ano em que se formou na Unesp de sua cidade, está à frente da gestão da propriedade de sua família. Sua atenção é cada vez maior com detalhes que podem gerar ganhos significativos, seja nas lavouras, seja no balanço econômico da atividade. “Como no macro já estamos bem re-

solvidos, procuramos olhar com cuidado o que é micro, usando tecnologias e produtos mais novos”, observa Perina. “Todo ano procuramos, por exemplo, administrar cada um dos talhões dentro de um novo modelo de utilização de insumos.” A programação de reforma dos canaviais é outro bom exemplo dessa gestão. Do total de 670 hectares da propriedade, cerca de 580 são dedicados ao plantio da cana. Anualmente 20% dessa área passava por reforma – com um custo de R$ 8 mil por hectare – e no lugar da cana entrava o cultivo de amendoim, soja ou até feijão. “A cada cinco anos, toda a área estaria reformada e dávamos início a um novo ciclo”, explica Perina. Agora, o processo é feito em apenas 10% das terras e o tempo para fechar o ciclo é de dez anos. "Dá para ter uma ideia da redução de custo.” Perina consegue colocar em prática essas melhorias dedicando apenas entre 25% e 30% de seu tempo à fazenda, pois está sempre envolvido com alguma outra atividade. Ele é presidente da Organização de Plantadores de Cana da Região Centro-Sul do Brasil (Orplana), diretor financeiro do Sicoob/Coopercredi e esteve por dois anos à frente da Câmara Setorial do Açúcar e do Álcool do Ministério da Agricultura. Constantemente é convidado para debates, palestras, congressos e vários outros eventos do setor. “Gosto muito desse ambiente, de poder discutir, ouvir, palpitar”, afirma.


O nome de Frank Dijkstra está intimamente relacionado com o plantio direto, pois há mais de quatro décadas o produtor utiliza – e dissemina – essa tecnologia, com resultados significativos em seus campos de milho

Franke Dijkstra é um dos pioneiros e, até hoje, um dos principais propagadores do plantio direto sobre a palha no Brasil. E um dos motivos pelos quais tem sido tão eficiente ao difundir essa tecnologia é poder comprovar sua base teórica com o que acontece em seu próprio quintal – as terras pertencentes a sua holding familiar somam mais de 2 mil hectares. Há mais de 40 anos todas as lavouras da Fazenda Frank’Anna (Carambeí, PR) são cultivadas dessa forma. “O impacto sobre a terra é muito positivo e a produtividade melhora ano a ano”, afirma o produtor, que já emenda com os resultados atuais dos campos de milho: “O índice médio é de 12 toneladas por hectare, mas há algumas áreas em que chega a 15”. A média brasileira é de 5,3 toneladas por hectare. O tema tecnologia, de maneira geral, deixa Dijkstra empolgado. Ele lamenta, no entanto, que muita gente ainda não entenda bem o quanto o plantio direto protege o solo. Vem daí sua preocupação com a formação técnica dos profissionais que

passam a atender os agricultores nas fazendas. “Precisamos de pessoas com visão de médio prazo, pelo menos”, observa. “É uma questão cultural. Nada vem pronto, é necessário ir aprendendo, mudando quando for o caso. Comigo também foi assim.” Esse desafio de transformar informação em conhecimento certamente aumentou o valor que Dijkstra dá ao planejamento de longo prazo. Para ele, essa preparação, somada a tecnologia e ferramentas de gestão, é fundamental para que não precise ficar correndo atrás do mercado. “Tecnologia é produtividade, e é assim que se consegue boas negociações”, analisa. “Na safra passada, ao contrário de muita gente, apostamos ainda mais no plantio de milho, e foi uma ótima escolha.”

FRANKE DIJKSTRA

A PROTEÇÃO DO SOLO EM PRIMEIRO LUGAR

Agricultura Milho

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UMA HISTÓRIA CONSTRUÍDA COM FIBRA A trajetória de Walter Horita se confunde com a abertura de uma nova fronteira agrícola no Oeste baiano e na sua transformação no principal polo de produção de algodão no Brasil

Quando chegaram ao Brasil, em 1938, para trabalhar em lavouras de café e algodão, a intenção dos avós do empresário Walter Horita era retornar ao Japão assim que conseguissem juntar dinheiro suficiente para isso. Os rumos mudaram. “Hoje, nosso empenho está na consolidação de toda a estrutura de produção, na gestão profissionalizada do negócio, com implantação de governança corporativa, e na sucessão familiar”, diz o homem que comanda o grupo que, cerca de 80 anos depois, é quase um sinônimo de algodão no País. Walter Horita administra, ao lado dos irmãos Ricardo e Wilson, um dos empreendimentos que mais cresceram no agronegócio brasileiro. A área inicial de 1,2 mil hectares, adquirida no Oeste da Bahia, em 1984, já passa de 140 mil. Desse total, 98 mil estão cultivados com soja (62 mil) e algodão (36 mil), o carro-chefe do Grupo Horita. “É muito gratificante saber que fiz parte do crescimento e do desenvolvimento do Oeste da Bahia, ajudando a transformar uma região que há 30 anos não tinha nenhuma expressão agrícola em referência de produti26

vidade e utilização de tecnologia, conciliada à preservação ambiental”, comenta o empresário. Ao longo dessas três décadas, a adoção de técnicas inovadoras, sob a orientação de profissionais especializados, permitiu que as lavouras chegassem a uma produtividade de 15% a 25% acima da média regional. “Credito essa evolução à experiência na aplicação de insumos e recursos no momento certo”, explica Horita. E a expectativa para a próxima colheita é bastante positiva, sobretudo por causa do clima, que tem ajudado, conforme diz o produtor. “Diferentemente da temporada anterior, quando sofremos com falta de chuvas, até o final do ano passado vínhamos contanto com uma regularidade, o que torna esta safra muito promissora.”

WALTER HORITA

Ag TopFarmers 2017

Agricultura Algodão


JOSÉ ANTONIO GORGEN Agricultura Soja

OLHAR AMPLO E ATENTO DENTRO E FORA DA PORTEIRA Foi dessa forma que José Antonio Gorgen abriu fronteiras de produção, inovação tecnológica e conquista de mercado com a produção de soja nos estados do Maranhão e Piauí

Segundo um dito popular do meio agrícola, siga a trilha da expansão das lavouras de soja pelo Brasil e sempre encontrará um gaúcho. Folclore à parte, a verdade é que na região do Matopiba, um dos nomes mais representativos na cadeia produtiva de grãos é originário de Não-Me-Toque (RS). José Antonio Gorgen, titular do Grupo RISA, chegou à cidade de Balsas (MA) na década de 1980 em busca de novas fronteiras para plantar soja e milho. Começou

com 400 hectares. Essa área foi crescendo e hoje chega a quase 70 mil hectares, distribuídos em seis fazendas. “Exclusivamente com soja, temos mais de 52 mil hectares plantados”, comenta o produtor. Além da expansão em área plantada, o Grupo RISA também cresceu em diversidade de negócios, abrangendo, além da produção agrícola, defensivos, máquinas, fertilizantes, logística e trading. Segundo Gorgen, essa ampliação foi impulsionada por uma necessidade de dar mais sustentabilidade à produção e reduzir custos, mas impactou também na produção agrícola de toda a região, a exemplo da implantação da primeira fábrica de fertilizantes de Balsas. A meta em termos de produtividade é manter o índice médio próximo de 50 sacas por hectare. Problemas climáticos nas últimas três safras não desanimaram o desbravador. Ele agora avança com outro projeto, o de produzir soja transgênica com preparação do solo, adubação e controle de pragas orgânicos. Estruturas próprias estão em construção para armazenar exclusivamente esses grãos. “Teremos um produto diferenciado”, comenta Gorgen. “Mas será necessário que o porto tenha estrutura para segregar o embarque dessa soja, sem o risco de contato com o grão convencional”. A trajetória da família Gorgen tem uma participação relevante na história da formação e do crescimento do Matopiba. Há dois anos o empresário tem se dedicado a um projeto de Parceria Público Privada para a construção de um aeroporto regional em Balsas. A área para essa obra foi doada por ele. “A cidade se desenvolve, a região se desenvolve e todos ganham”, explica. PLANT PROJECT Nº 2

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JULIANA ARMELIM E PAULO SIQUEIRA

Ag TopFarmers 2017

Agricultura Café

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ENTRE UM CAFÉ E OUTRO, ELES ACUMULAM DÓLARES Em sua curta jornada na lavoura, Juliana Armelim e Paulo Siqueira implantaram um modelo de eficiência e qualidade que tem rendido prêmios e vendas no exterior

O sabor de uma xícara de café jamais será o mesmo para o casal paulistano Juliana Armelim e Paulo Siqueira. No início desta década, ambos deixaram a carreira profissional, construída em setores sem relação direta com o campo – ela, em consultoria gerencial; ele, em fundos de investimento – para se tornarem cafeicultores. Em um curto espaço de tempo, passaram de aprendizes de agricultores a produtores premiados e exportadores, expoentes de uma nova geração de produtores. O plantio na Fazenda Terra Alta, em Ibiá (MG), começou em janeiro de 2011,

com apenas 50 hectares. O zelo com a qualidade em cada processo logo rendeu reconhecimentos como o título de Campeã Nacional e 1º Lugar da Região do Cerrado Mineiro no 25º Prêmio Ernesto Illy de Qualidade do Café para Espresso (2015). O interesse do casal pela cafeicultura surgiu como uma ajuda ao pai de Juliana, que havia comprado a propriedade para investir em produção de madeira. O café já era tradicional na região, então seria um pecado ignorar a atividade. Conforme a análise avançava, mais eles se interessavam pelo assunto. A decisão de trabalharem somente com terreiros suspensos chama a atenção de outros produtores. A experiência do casal em gestão ajudou no desenvolvimento de um projeto bem estruturado e preparado para avançar, o que aconteceu de forma rápida. Atualmente, são 210 hectares de café, tudo irrigado e com colheita mecanizada. “A produtividade média que buscamos é de 55 sacas/ha”, diz Juliana. Esse resultado foi alcançado na safra passada, mas para este ano deve ser menor, em torno de 40 sacas/ha, devido a problemas climáticos. “Quando o rendimento no cafezal não vai tão bem quanto esperamos, temos de buscar negociações mais vantajosas.” Praticamente toda a produção da fazenda é exportada, e para buscar melhores preços o casal partiu para a venda direta e abriu uma empresa em Orlando, nos Estados Unidos. “É uma satisfação muito grande ver nosso café sendo consumido lá”, diz Juliana.


A CORRIDA AGORA É PELO MEIO AMBIENTE

Quando resolveu mudar seu estilo de vida, deixando para trás toda a badalação a que estava acostumado, o empresário e ex-piloto de Fórmula 1 Pedro Paulo Diniz realmente levou essa decisão muito a sério. A regeneração ambiental passou a fazer parte de suas prioridades. Em 2009, ele fundou a Fazenda da Toca, empreendimento que no ano passado produziu cerca de 3 mil toneladas de alimentos orgânicos – sucos, ovos e molhos. Além de toda a infraestrutura diretamente relacionada com essa atividade, a propriedade de 2,3 mil hectares, instalada na cidade de Itirapina, no interior de São Paulo, abriga também matas nativas, vilas de moradores e áreas de pesquisa agrícola regenerativa. Aliás, essa é uma palavra que tem destaque no negócio: regenerar. Por meio de atividades agroecológicas, a Toca investe em pesquisa e desenvolvimento de sistemas agroflorestais em larga escala que regeneram e nutrem um solo rico, vivo e diverso. Nessas condições, as plantas crescem saudáveis para produzir frutos mais nutritivos e com mais sabor,

de acordo com a empresa. A produção de ovos – 100% própria – é outro exemplo do equilíbrio com o ecossistema. As galinhas vivem soltas e recebem uma alimentação orgânica variada e balanceada, contendo folhagem, frutos e grãos. Quando precisam de algum medicamento, são tratadas com homeopatia, florais e extratos vegetais. O trabalho desenvolvido na Toca incentiva o debate sobre o paradigma de não ser possível produzir alimentos orgânicos em escalas maiores, o que até poderia reduzir os custos para o consumidor final. E se a ampliação da distribuição desses produtos anima quem espera ver mais opções nas gôndolas e geladeiras do varejo, também é um estímulo aos produtores locais, que veem aí uma oportunidade de alcançar diversas localidades nas regiões Sul e Sudeste do Brasil.

PEDRO PAULO DINIZ

Mesmo distante dos holofotes, a agenda de Pedro Paulo Diniz continua disputada. Suas ambições com o universo de produção orgânica e a desenvolvimento de uma consciência ecológica trazem lá suas milhas de compromissos

Agricultura Orgânicos

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OFERTA DE BOI O ANO INTEIRO Com tecnologia e sinergia com a agricultura, Victor Campanelli confina 55 mil bois por ano, garante a oferta mensal de animais certificados para atender o mercado europeu e ganha pontos nas negociações com a indústria

Sinergia é uma palavra que se usa com frequência na Agro-Pastoril Paschoal Campanelli S/A, empresa familiar de Altair (SP). “Cada um de nossos negócios começa onde o outro ainda não terminou”, diz Victor Campanelli, um de seus sócios, fazendo referência à forma como as divisões da companhia se integram: gado de corte, cana-de-açúcar, milho e nutrição animal. São vários negócios que, no fundo, convergem para um principal: o confinamento, que tem 25 hectares e reúne 55 mil cabeças por ano. A alimentação desses bovinos vem de uma fábrica de rações própria, complementada com palha da cana. O milho, utilizado na produção de silagem de grão úmido, também entra na reforma dos canaviais. Os resultados dessa verticalização, feita com a mais moderna tecnologia disponível para o setor, fizeram de Campanelli uma referência na pecuária de corte e serviram de estímulo para a construção de uma nova unidade de negócios, uma fábrica de rações e sal proteinado. “Por enquanto ela atende a nossa própria demanda, mas em breve vai abastecer cria30

dores da região”, explica Campanelli, que faz uma rigorosa seleção do gado que entra em seu confinamento. “Nossa compra de bois é feita de duas maneiras. Uma delas é adquirindo animais com cerca de nove arrobas, que passam quatro meses na recria, em uma propriedade que temos em Araçatuba, e depois entram no confinamento. A outra envolve bovinos mais pesados, já com 12 arrobas.” O gado é abatido com menos de 30 meses de idade e pesando em torno de 21 arrobas. Todo o rebanho é rastreado e certificado para atender o mercado europeu. Essa condição rende bonificações na remuneração. Mas há ainda outra característica altamente favorável para as negociações com a indústria. “Temos oferta de boi o ano todo”, ressalta Campanelli, e acrescenta: “Soltamos 5 mil bois todo mês”. A frequência no fornecimento e a padronização do rebanho elevam a conversa com os frigoríficos para outro patamar.

Pecuária de corte/ confinamento

VICTOR CAMPANELLI

Ag TopFarmers 2017


UMA FÁBRICA DE TOUROS DE CAPIM

Em 2018, a Agro-Pecuária CFM completará 110 anos. Deve haver muita festa nas propriedades da empresa, distribuídas nos estados de São Paulo, Mato Grosso do Sul e Bahia. Nelas, a CFM conta com um rebanho de 30 mil cabeças de bovinos Nelore. O criatório é todo voltado à produção de animais melhoradores para atender fazendas com sistemas pecuários totalmente a pasto, conceito que ajudou a fazer da empresa uma referência na geração de touros comerciais para as condições brasileiras. “O projeto Nelore CFM é o pioneiro na seleção para características econômicas”, diz Geraldo Toledo Martins, presidente da empresa. Gestão e investimento em inovação ajudam a explicar a vitalidade de uma empresa com tanta história. “Somos extremamente profissionais na condução da pecuária e da agricultura, sempre avaliando custos e retorno dos projetos”, afirma Martins. Exemplo de como a CFM procura estar à frente da demanda está no fato de ser dela o primeiro projeto de Nelore aprovado pelo Ministério da Agricultura, Pecuária e Abastecimento para emissão do Certificado

Especial de Identificação e Produção, o CEIP. O padrão de qualidade desse gado, reconhecido pelo mercado e pela comunidade científica, é resultado de um programa de seleção que já dura mais de 35 anos, produz cerda de 2 mil touros por ano e tem o maior banco de dados individual de avaliação genética da raça, com mais de 467 mil informações de animais desmamados. A partir dessa conquista, a CFM multiplicou as oportunidades de ne-gócios, saindo na frente com a comercialização de reprodutores com 24 meses e a realização de remates com grande volume de animais avaliados e certificados, os Megaleilões. “Já ultrapassamos a marca de 35 mil touros Nelore negociados desde o início da seleção desses animais”, comenta Martins. Entre o material genético para uso próprio ou vendido ao mercado, já são mais de 1,5 milhão de doses de sêmen.

GERALDO MARTINS

Como manter uma empresa centenária na ponta do competitivo mercado da pecuária comercial? Com gestão, inovação e ciência, Geraldo Martins, da CFM, tem dado respostas efetivas a essa pergunta

Pecuária de corte a pasto

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Ag TopFarmers2017

JONAS BARCELLOS

O EMBAIXADOR DO NELORE NO CAMINHO DA ÍNDIA

Pecuária Melhoramento Genético

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Jonas Barcellos é o principal responsável por uma renovação que está em curso na base das linhagens do Nelore brasileiro. Além de reduzir os riscos de consanguinidade, esse processo certamente vai impactar na produtividade dos rebanhos

O melhor Nelore do mundo pode evoluir ainda mais. A seleção realizada com a principal raça de corte no Brasil está passando por uma importante renovação, baseada em novas importações de diferentes linhagens diretamente da Índia, país de origem do zebuíno. O nome forte por trás dessa onda de aquisições é Jonas Barcellos, dono do Grupo Brasif e da Chácara Mata Velha, um dos nomes mais tradicionais no segmento de genética bovina. O empresário liderou o processo de abertura de mercado

para a vinda desses produtos e a concretização das negociações propriamente ditas. “Foram mais de vinte anos de luta, desde que começamos a fazer a seleção nas aldeias da Índia”, conta Barcellos. A saga toda é longa e difícil. Além do mercado fechado para importação de gado vindo da Ásia, o grupo de pecuaristas liderado por ele enfrentou questões de estrutura e até religiosas na terra de origem das raças zebuínas. Antes desse esforço, as últimas importações de material genético indiano havia sido em 1962, quando chegaram ao Brasil touros como Karvadi, Taj Mahal e Godhavari, que ajudaram a formar a base do Nelore no País – apenas 7 mil matrizes genéticas estão na origem de um rebanho de mais de 180 milhões de cabeças. Dois anos depois, a porteira das operações com a Índia voltou a ficar fechada, sendo reaberta somente em 2009. Assim que terminou esse período de quase 40 anos, Barcellos já estava de prontidão. Ele chegou a investir na construção de um laboratório na Índia para a produção de embriões. Em dois anos, conseguiu trazer para o Brasil cerca de 1,7 mil produtos. Por aqui, o investimento em infraestrutura deu origem à Geneal, empresa da Brasif que tem parceria com a norte-americana ViaGen para desenvolver processos de clonagem. Em 2016, levou ao mercado os primeiros animais com o novo sangue indiano. “Nosso trabalho agora é incentivar que esse novo material genético, com mais rusticidade e fertilidade, ajude a melhorar o rebanho de produção”, afirma Barcellos.


Carlos Alberto de Souza herdou a Fazenda Colorado e o posto de “Rei do Leite”. E, no comando de um processo de modernização da produção na propriedade, bate recordes e mostra que esse reinado pode durar muito tempo

Em 1964, com nove anos de idade, Carlos Alberto Pasetti de Souza assistiu ao começo da Fazenda Colorado, em Araras, no interior de São Paulo. Eram 266 hectares que abrigavam um diminuto rebanho de vacas mestiças. A produção mal passava dos 50 litros de leite/dia. Ao longo dos anos, ele acompanhou a luta, a determinação e o empreendedorismo do pai, Lair Antônio de Souza, que transformou a propriedade em referência na produção, processamento e envasamento de leite Tipo A no Brasil (marca Xandô). Mais do que isso: ao superar a marca dos 53.000 litros/dia, em 2013, “seu” Lair passou a ser considerado o maior produtor brasileiro e não escapou mais da chancela de “Rei do leite”. Com a morte do patriarca, em janeiro de 2015, Carlos Alberto assumiu a empresa e o título. Ele preside hoje o Conselho de Administração da Grupasso (holding que controla os negócios da família, envolvendo também seis outras fazendas produtoras de laranja e unidades industriais), formado ainda pelos irmãos Luiz Antonio, Célia Maria e Regina Helena e a mãe, Maria Pasetti de Souza. Primogênito, graduado em Administração, Carlos Alberto viveu de perto e auxiliou o trabalho do pai ao longo dos anos. Ao assumir, deu sequência ao plano de modernização da produção de leite deflagrado no início da

atual década. Em setembro de 2016, a Colorado bateu em 73.700 litros/dia, mantendo o título de maior produtora brasileira. A modernização envolveu a implantação de uma moderna estrutura de ordenha (sistema carrossel), a construção de pavilhões e de uma rede climatizadora (para garantir o conforto do ambiente para os animais) e a elaboração e execução de um plano de melhoramento genético (sob a consultoria da Alta Genetics, de Uberaba, MG). Focada em qualidade, a Fazenda Colorado usa apenas 600 dos seus atuais 1.700 hectares para a produção de leite. Nesta área estão todas as estruturas, um rebanho médio de 2.050 vacas, lavoura de milho para silagem, residências (cerca de 200 funcionários) e o laticínio para processamento e envasamento do Leite tipo “A” Xandô (capacidade para até 10.000 litros/hora). Entre os próximos saltos vislumbrados pela Colorado com o leite Xandô está o possível investimento na produção de derivados como queijo e bebida láctea.

CARLOS ALBERTO DE SOUZA

DNA DE CAMPEÃO EM LEITE

Pecuária Leiteira

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Ag Finanças

TERRA À VISTA, INVESTIMENTO SEM PRAZO fotos: Shutterstock

Flexibilização das restrições à compra de imóveis rurais por estrangeiros poderia injetar US$ 20 bilhões por ano no campo Por CostáBile Nicoletta

N

o segundo semestre de 2010, quando presidia a Associação Brasileira de Marketing Rural e Agronegócio (ABMRA), o empresário Maurício Mendes, sócio-fundador da consultoria Agriplanning, encomendou à Agroconsult e à MB Associados um estudo sobre o impacto do Parecer LA-01, da Advocacia-Geral da União (AGU), emitido em agosto daquele ano e aprovado pelo então presidente da República, Luiz Inácio Lula da Silva. O parecer determinou rigorosas restrições à compra de terras agrícolas por estrangeiros. Afugentou, segundo os consultores, investimentos da ordem de US$ 15 bilhões em 2010 e 2011. Levantamentos mais recentes indicam que a cifra subiu para US$ 20 bilhões ao ano, somente com projetos de plantio a ser bancados por empreendedores de fora do Brasil. Tamanho volume

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de capital externo potencialmente pronto para ingressar no País foi suficiente para chamar a atenção da equipe do presidente da República, Michel Temer. Tanto que ele estaria se movimentando para que a AGU reveja o parecer e tudo volte a ser como antes. O próprio ministro da Agricultura, Blairo Maggi, já se manifestou publicamente favorável ao fim das restrições. A AGU confirma que o Parecer LA-01 voltou a ser discutido, porém não a pedido da União, e sim por demanda do governo do Rio Grande do Sul, igualmente ávido por novos recursos, a ponto de ter de declarar-se em estado de calamidade financeira no final de novembro. Enquanto a AGU não conclui a reanálise, as restrições continuam vigentes. Trata-se de uma questão sensível e complexa, que afeta diretamente o futuro de culturas importantes


no País. A atual legislação restringe a compra de terras agrícolas por estrangeiros a uma extensão que varia de 5 a 100 hectares (50 mil a 1 milhão de metros quadrados), conforme o município. Essa limitação praticamente inviabiliza o interesse de investidores estrangeiros por imóveis rurais. Segundo o deputado federal Irajá Abreu (PSD-TO), integrante da Comissão de Agricultura, Pecuária, Abastecimento e Desenvolvimento Rural (CAPADR), fábricas de papel e celulose, por exemplo, necessitam de, pelo menos, 200 mil hectares de eucalipto para seu suprimento de matéria-prima. O deputado federal Marcos Montes (PSDMG), presidente da Frente Parlamentar da Agropecuária (FPA), reforça: só no plantio de florestas, grandes empresas investiram US$ 21 bilhões em 2015. A Indústria Brasileira de Árvores (Ibá) – associação que reúne 60 empresas e nove entidades do setor de produtos florestais – calcula que a área total de árvores plantadas no Brasil seja de 7,8 milhões de hectares e que 10% dessas terras sejam de propriedade de fundos de investimento, a maior parte deles estrangeira. “Muitos setores podem se beneficiar com a liberação da venda de terras para estrangeiros, como reflorestamento,

sucroenergético e grãos”, enumera Maurício Mendes, da Agriplanning. “Há uma série de vantagens relacionadas à vinda de recursos financeiros do exterior, como geração de empregos, melhoria de infraestrutura das regiões, aumento de faturamento das empresas fornecedoras de insumos, equipamentos e serviços da área de influência.” Para Mendes, deve-se considerar ainda que boa parte dos investidores externos, por serem grandes empresas, traz tecnologia de produção, governança e gestão. “No entanto, entendo que deva haver limites para a aquisição de imóveis por estrangeiros, como áreas de fronteira e percentual máximo por município ou mesorregião”, afirma. “Uma nova interpretação da AGU, com menos restrições, resolveria a questão por um período, mas, para haver maior

FIGURA CRAS1 (vai por email) inserir

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Ag Finanças

segurança para os investidores estrangeiros, deveria ser aprovada uma lei específica sobre o tema.” Projetos nesse sentido não faltam. Desde 2012, tramita no Congresso Nacional o Projeto de Lei 4.059, que atenua significativamente as restrições para a aquisição de imóveis rurais por estrangeiros no País. É de autoria da Comissão de Agricultura, Pecuária, Abastecimento e Desenvolvimento Rural da Câmara Federal e conta com o apoio da FPA, que em abril deste ano entregou ao presidente Temer uma lista de assuntos considerados prioritários para o setor, entre os quais a aprovação do PL 4.059. A opinião de que é preciso uma discussão mais ampla sobre o tema é compartilhada por Antônio Carlos Lima Nogueira, pesquisador do Pensa, centro de estudos avançados de agronegócios da Fundação Instituto de Administração (FIA). Mas ressalva que a atual restrição para a aquisição de terras por estrangeiros não chegou a provocar prejuízos ao agronegócio. Em termos agregados, diz ele, a produção e 36

principalmente a produtividade do setor mantiveram taxas de crescimento positivas na última década, resultantes da estabilidade de regras nos planos Safra e da oferta de crédito oficial, mecanismos privados de financiamento por meio de títulos do produtor, sistema financeiro sólido, tecnologia nas diversas etapas da cadeia produtiva e capacitação dos recursos humanos. A julgar pelo estudo encomendado por Mendes, esse crescimento poderia ter tido impulso ainda maior com o incentivo do capital estrangeiro que deixou de entrar no País. Algumas regiões poderiam, segundo o levantamento, ser especialmente beneficiadas. O trabalho aponta o CentroOeste como grande alvo de interesse de investidores estrangeiros, em função da produção de grãos e também porque a região ainda permite ganhos com valorização em áreas de fronteira agrícola. Mesmo regiões mais maduras do ponto de vista de valor de terra, como os estados do Sul e do Sudeste, diz Mendes, podem atrair grupos estrangeiros interessados nas áreas de

açúcar, frutas, madeira, papel e celulose. O consultor cita várias empresas de capital estrangeiro que atuam no agronegócio como exemplo de empreendimento bem-sucedido para elas e para o Brasil. Entre elas, destaca Brookfield (fundo de investimento, Canadá), Land O’Lakes (laticínios, EUA), Leitíssimo (laticínios, Nova Zelândia), Dreyfus (commodities, França), Bunge (commodities e alimentos, EUA). Em sua opinião, caso seja liberada a venda de terras para estrangeiros, investidores de países asiáticos, sobretudo da China e da Índia, deverão ser os mais incisivos. “Mas norte-americanos, canadenses e europeus também se farão presentes”, afirma. Nogueira, da FIA, aponta um estudo recente do Pensa sobre as corporações agrícolas de alta escala na produção de grãos que constatou a existência de pelo menos sete grupos estrangeiros operando 1,25 milhão de hectares, enquanto existem ao menos 12 grupos nacionais administrando 2,09 milhões de hectares: “Portanto, o capital estrangeiro preserva um papel relevante na produção de grãos no Brasil”.


As restrições impostas pela Lei 5.709/71

O que propõe o Projeto de Lei 4.059/12

• A aquisição de imóvel rural por pessoa física estrangeira não poderá exceder a 50 Módulos de Exploração Indefinida (MEI), em área contínua ou descontínua. A dimensão do MEI varia entre 5 e 100 hectares, de acordo com a Zona Típica de Módulo (ZTM) do município de localização do imóvel rural.

• Revogação da Lei 5.709/71, porém com a manutenção da exigência de que a escritura dos imóveis rurais adquiridos por estrangeiros seja pública e de que os cartórios de registro de imóveis mantenham cadastro específico e detalhado dessas vendas.

• A soma das áreas rurais pertencentes a empresas estrangeiras ou controladas por estrangeiros não pode ultrapassar 25% da superfície do município.

• As restrições à venda de imóveis a estrangeiros recaem a:

• Pessoas jurídicas estrangeiras só poderão adquirir imóveis rurais destinados à implantação de projetos agrícolas, pecuários, industriais ou de colonização vinculados aos seus objetivos estatutários. • Os projetos a serem desenvolvidos nos imóveis rurais adquiridos por estrangeiros deverão ser analisados pelo Ministério da Agricultura ou pelo Ministério da Indústria, conforme a finalidade do empreendimento. • A escritura dos imóveis rurais adquiridos por estrangeiros tem de ser pública. Os cartórios de registro de imóveis devem manter um cadastro específico e detalhado dessas vendas, além de informá-las trimestralmente ao Instituto Nacional de Colonização e Reforma Agrária (Incra).

- Organizações não governamentais com atuação no território brasileiro que tenham sede no exterior ou estabelecidas no Brasil cujo orçamento anual seja proveniente, na sua maior parte, de uma mesma pessoa física estrangeira, ou empresa com sede no exterior ou, ainda, proveniente de mais de uma dessas fontes quando coligadas. - Fundações particulares, quando os seus instituidores forem pessoas enquadradas no item anterior ou empresas estrangeiras autorizadas a funcionar no Brasil com sede no exterior. - Fundos soberanos constituídos por outros países. - A proibição não se aplica às companhias de capital aberto com ações negociadas em bolsa de valores no Brasil ou no exterior.

Número de processos de aquisição de imóveis rurais por estrangeiros (pessoas físicas e jurídicas) sob análise no Incra até novembro/2016:

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A AGRICULTURA E O FUTURO DE CUBA A expectativa de uma abertura econômica e a morte de Fidel levam empresas de vários países a estudar o potencial de produzir e vender equipamentos na ilha. Quem esteve lá viu que existe mercado e até mesmo o que aprender com os agricultores cubanos

foto: Melanie K. Reeed, USDA

Por Jim Patrico, de Havana*

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Política

O

falecimento de Fidel Castro em 25 de novembro passado suscitou uma rodada de especulações sobre o futuro de Cuba, que poderia ter implicações para os fazendeiros americanos ansiosos por promover o comércio com aquele país insular. Raul, o irmão de Fidel, vinha conduzindo os negócios da família nos últimos anos, enquanto a saúde de Fidel definhava. Nesse meio tempo, os cubanos e o resto do mundo não sabiam se Fidel estava controlando as coisas nos bastidores. Eles observaram como Raul permitiu mais a livre-iniciativa. Ele incentivou um maior número de cubanos nas atividades agrícolas, abriu as portas para os Estados Unidos promoverem mais negócios em Cuba. Agora que seu irmão – o ditador com o charuto e a farda militar – se foi, Cuba seguirá o caminho da liberalização iniciado por Raul Castro? Essa é a principal questão para Cuba e para os EUA. A incerteza aumenta com a mudança das administrações após as eleições americanas. O Presidente Barack Obama apertou a mão de Raul em março passado e por dois anos despachou ordens executivas para iniciar o fim do embargo de quase 60 anos. Enquanto isso, o presidente eleito, Donald Trump, tem afirmado que deseja mais concessões dos cubanos antes de poder avançar nas relações entre os dois países. O jornal USA Today mencionou uma citação de Mike Pence, vice-presidente de Trump, a uma plateia em Miami um pouco antes da eleição: "Vou fazer uma promessa a vocês. Quando Donald Trump assumir a presidência dos Estados Unidos,

revogaremos todas as ordens executivas de Obama sobre Cuba”. O que irá substituir essas ordens executivas e qual será o engajamento da administração Trump em relação a Cuba? As respostas interessam aos fazendeiros e às empresas americanas que desejam vender açúcar, carne e insumos agrícolas para Cuba. A serviço do provedor de serviços de informação DTN/The Progressive Farmer, visitei Cuba no terceiro trimestre para avaliar se os interesses agrícolas cubanos e americanos podem ser conectados. Sob alguns pontos de vista, parece que a agricultura cubana ficou aprisionada em uma cápsula do tempo. Um dia, no município de Melena del Sur, logo ao sul de Havana, um trator russo com 50 anos de idade roncava e fazia muito barulho enquanto se esforçava para se deslocar em uma via rural. Tinha chovido na noite anterior, e a via tinha se transformado em um atoleiro formado por água e barro vermelho. Seus pneus derrapavam e escorregavam, porém o trator seguia teimosamente em frente. Em um pasto ao lado da via, três grupos de bois pastavam. Se o trator não pudesse seguir em frente por si só, o fazendeiro Yomar Baez Gonzalez usaria esses bois para desatolá-lo. Esse velho trator russo e os bois de reserva são indicativos da antiguidade da maioria dos equipamentos agrícolas em Cuba. Por outro lado, próximo a Havana, cientistas trabalham em vacinas avançadas para evitar doenças transmitidas por carrapatos no gado, soja transgênica resistente à ferrugem

Ag

Fazenda de produção orgânica no distrito de Alamar, em Havana: alternativa para alimentar a população

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fotos: Lydia Barraza, USDA

O então secretário de Agricultura dos EUA, Tom Vilsack, visita horta urbana na capital cubana: de olho na abertura do mercado para produtos americanos

asiática e compostos que ajudam a desenvolver as defesas das laranjeiras contra o greening. O velho e o novo contrastam nesse país por causa de um embargo de meio século imposto pelos Estados Unidos. Os cubanos se referem a ele como "bloqueio", pois tem sido muito eficaz no isolamento de Cuba do comércio e do crédito com a maior parte do mundo. Porém, os cubanos também culpam o sistema socialista, que até mesmo Fidel Castro admitia ter falhado com o povo. Enquanto isso, os cubanos improvisam. Eles mantêm velhos tratores e carros circulando, buscando soluções modernas para problemas antigos. As coisas estão mudando. Dois anos atrás, o Presidente Obama e o Presidente Raul Castro anunciaram a retomada das relações diplomáticas entre os dois países. Apesar de o Congresso ter a chave para destravar o embargo, alguma 40

liberalização da política americana por meio de ações de Obama – agora sujeitas às políticas do presidente eleito, Trump – permitiu vislumbrar um mundo pós-embargo. Os americanos agora podem viajar mais facilmente para Cuba. Grupos de commodities agrícolas, por exemplo, têm enviado dezenas de missões comerciais para iniciar o planejamento para o dia em que o embargo for encerrado. Eles estão ansiosos para comercializar com um país que importa atualmente 70% de sua comida. Ao mesmo tempo, o regime de Castro tem afrouxado algumas das amarras socialistas sobre a economia cubana. O governo agora incentiva alguns tipos de empreendimentos empresariais. Ele também tem buscado facilitar aos cubanos realizarem atividades agrícolas em novas terras e para que os fazendeiros sejam os proprietários dessas terras algum dia. Na realidade, o

governo busca transferir os moradores das cidades para o campo e as fazendas. No entanto, como o trator de Gonzalez, o progresso é lento. UMA FAZENDA FAMILIAR A família Gonzalez lida com atividades agrícolas por três gerações na zona rural de Melena del Sur. Ela é dona de cerca de 54 acres, que é uma coisa incomum em Cuba, onde o governo detém de 70% a 80% das terras agriculturáveis da nação. Alguns donos de terras particulares – como a família Gonzalez – mantiveram o controle de suas propriedades após a Revolução de 1959, que transformou Cuba primeiro em um país socialista e, a seguir, em um regime comunista. Yomar Gonzalez e seu pai, Miguel Angel Baez, plantam tomates, arroz, feijão-preto, yucca, vários tipos de tubérculos, pimentas e frutas. Com uma idade em torno de 40 anos, esposa e dois filhos adolescentes, Gonzalez tem


Política

uma sólida casa nas cercanias da cidade. Ela tem uma varanda na frente, dois dormitórios, uma espaçosa sala de estar/ jantar e uma TV de 24 polegadas constantemente ligada, que exibe vídeos musicais quase todo o tempo. Ele parece tranquilo com sua vida e resignado com algumas de suas limitações. Ele está ciente, por exemplo, de que pode tomar suas próprias decisões sobre o que plantar a cada ano. O governo, porém, é quem vai ditar como ele comercializará suas colheitas. Muito provavelmente, ele terá que fazer isso por meio de um sistema centralizado, a um preço estabelecido pelo governo. Em alguns anos, ele terá colheitas excedentes para vender no mercado aberto para uma renda extra. No entanto, esses anos são raros. A falta de recursos de Gonzalez implica no seu "casamento" com aquele trator russo de 1967. Quando perguntado se tem planos para substituí-lo algum dia, ele balançou a cabeça. "Temos somente que mantê-lo funcionando", afirmou com a ajuda de um tradutor. Ele seria afetado com o fim do embargo? Gonzalez fica pensativo. Este é um país comunista, acima de tudo, e o intérprete trabalha para o governo. "Somente após o fim do bloqueio haverá possibilidade de podermos aprender e compartilhar [com

Ag

os EUA] tecnologias [agrícolas]", afirmou Gonzalez. INDEPENDÊNCIA O governo cubano incentiva as conversações sobre importação de produtos agrícolas americanos. Porém, seu objetivo de longo prazo é tornar a nação mais independente em termos de alimentos. A abertura da agricultura às cooperativas agrícolas é uma forma aprovada pelo governo para aumentar a produção geral de alimentos. Dirigimos por algumas milhas do centro de Havana até a província de Mayabeque e uma cooperativa orgânica. O presidente-fazendeiro Miguel Angel Salcines Lopez é o responsável pela cooperativa. Um senhor alto e distinto, com cabelo grisalho, olhos castanhos brilhantes e um chapéu elegante de aba mole, esbanja charme e uma confiança de gestor bem-sucedido. A cooperativa tem cerca de 62 acres cultivados nesta localidade. Seus 120 empregados plantam mais de 300 espécies de plantas ornamentais e hortaliças e legumes, destinados aos mercados de Havana. A fazenda é uma vitrine para a qual o governo leva os visitantes estrangeiros. Lopez tem igual orgulho de seus trabalhadores e de suas plantações. Cerca de 40 são mulheres e abre um sorriso ao afirmar isso por meio de PLANT PROJECT Nº 2

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Ag Política

Necessidade e solução: criado para suprir uma emergência, modelo de produção urbana do país hoje é estudado por estrangeiros

um intérprete, "Elas são mais inteligentes e confiáveis do que os homens". Outro grande percentual de trabalhadores é formado por homens mais velhos. “Eles acumulam cultura e ânimo”, que não são fáceis de encontrar nos mais jovens, afirmou Lopez. Esses homens são aposentados, porém trabalham para incrementar a renda e pela diversão que o trabalho proporciona. Lopez também se orgulha ao comentar que a terra utilizada era um depósito de lixo. Nos últimos anos, a cooperativa ressuscitou o terreno e adubou com esterco de origem animal, sem fertilizantes químicos. Lopez afirmou que a operação é de fato orgânica: “Tínhamos que ser orgânicos ou morrer”. Os bois puxam os arados para trabalhar o solo vermelho. Os trabalhadores se curvam para arrancar ervas daninhas manualmente entre as linhas de plantio. Ocasionalmente, eles efetuam a aspersão de 42

produtos biológicos para o controle de insetos. Lopez afirmou que o grande número de plantações no local cria uma biodiversidade que é importante no controle de todos os tipos de pragas. Algumas das plantas ornamentais aqui servem apenas para distrair os insetos e afastálos das plantações. Amplas armações de redes suspensas amenizam a brutalidade do sol tropical. A irrigação por gotejamento e pequenos aspersores dão garantia de umidade. Microrganismos estimulam o crescimento e aumentam as colheitas, afirmou Lopez. Muita coisa aqui é moderna. Recentemente, Lopez voou até a Califórnia para participar de uma conferência de agricultura orgânica, algo impensável antes do aperto de mãos entre Obama e Castro. Ele constatou que sua fazenda era tão avançada como muitas outras na conferência. "Porém, não temos uma rede varejista como a Home Depot",


foto: GENSCH. Cuba

ele brincou. "Se tivéssemos um contrato com a Home Depot, seríamos tão avançados como qualquer um dos fazendeiros americanos." O fim do embargo poderia não só trazer a Home Depot para Havana, mas poderia trazer a tecnologia e os equipamentos de produção agrícola americanos. FRUTAS E TURISTAS Um trator Ferguson 1958 é a primeira coisa que Elevterio Cordoba mostra aos visitantes em sua fazenda de frutas. O trator de 30 HP era pintado de vermelho quando foi fabricado nos EUA há quase 60 anos. Porém, Cordoba pintou seu "bebê” de azul para cobrir a ferrugem e para dar alguma personalidade a ele. Ele também tem "doutorado” sobre o equipamento por causa dos anos que o mantém funcionando, fazendo o que os cubanos fazem: improvisar. Por exemplo, o interruptor

de ignição do trator deixou de funcionar há muito tempo. Desse modo, Cordoba substituiu-o por um interruptor de luz monopolar, que traz a inscrição "Made in U.S.A." estampada sobre ele. Cordoba é um felizardo. Sua família é proprietária desta fazenda de 50 acres na cidade de Remedio desde antes da Revolução. Como resultado, eles puderam permanecer em posse da terra. Eles foram capazes de prosperar mesmo quando o restante do país entrou no "Período Especial", que é como os cubanos descrevem o desastre econômico que resultou da retirada dos soviéticos. Cordoba também é felizardo pelo fato de que sua cidade, cerca de quatro horas a leste de Havana, está próxima à costa. Isso é importante, pois as praias na região atraem turistas como abelhas para as árvores frutíferas. As bananas, goiabas, papaias, mameys e laranjas de

Cordoba são muito populares entre os turistas de climas frios, aonde as frutas tropicais nunca chegam tão frescas e doces. Finalmente, Cordoba é um felizardo, pois, ao contrário da família Gonzalez em Melena del Sur, ele não tem que comercializar seus produtos por meio do governo. Por um capricho nas regras, ele pode vender a maior parte de suas colheitas aos hotéis turísticos. Ele pode negociar preços com base na demanda dos hotéis. Os turistas canadenses e europeus têm se regalado com as frutas de Cordoba há anos. Ele espera que os americanos logo se juntem a eles e aumentem bastante a demanda e os seus lucros. Enquanto isso, ele segue tentando manter seu velho trator Ferguson funcionando.

*Jim Patrico é editor sênior da The Progressive Farmer. Texto republicado sob autorização. Copyright 2016, Telvent DTN LLC

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Ag Marketing

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QUERO SER O HIPERMERCADO DO MUNDO Chegou o momento de ser mais business do que agro, mas sem perder a essência. E aprender com quem sabe, inspira e faz acontecer Por MaXimiliano Tozzini Bavaresco* Ilustrações Bruno Tulini

S

im, quero iniciar um processo de transformação pelo qual, ao longo dos próximos anos, vou me preparar, estudar, planejar e me reposicionar como o lugar das maiores, mais variadas e, acima de tudo, mais valorizadas marcas do mundo em termos de agribusiness. Estou convencido de que é preciso mudar. E chegou o momento de ser mais business do que agro, mas sem perder minha essência – afinal, lá se vão décadas e décadas sendo reconhecido por aquilo que sempre fiz com excelência, competindo de igual para igual com os melhores. E, se os meus governos não atrapalhassem tanto, eu estaria ainda mais à frente dos meus competidores, mas isso é outra história… De minha parte está decidido: vou valorizar meus produtos, know-how, processos, inovações e diferenciais competitivos, oferecendo soluções – combinando produtos aos serviços,

com inteligência e tecnologia – fazendo com que cada vez mais haja desejo pelas marcas que representam os seus respectivos propósitos e a mim, nacional e internacionalmente. Você deve estar se perguntando, a este ponto, do que trata afinal este artigo? Eu lhe direi com mais detalhes a seguir, mas de forma simples e objetiva estou convocando todos os que fazem parte da minha cadeia de valor no agribusiness a pensar como rede, como ecossistema, e assim construir dezenas, centenas de marcas nacionais e globais. E não apenas a minha marca como sinônimo de agrobusiness. A diferença parece sutil, mas o valor capturado é incalculável. Vejam o que acontece, por exemplo, com a Apple; você se importa ou sabe onde seu iPhone, iPad, Macbook, entre outros tantos equipamentos dessa marca, são produzidos? Não. E a Apple faz questão de deixar claro onde está o valor PLANT PROJECT Nº 2

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e por que você paga mais caro em cada um de seus produtos – “Designed by Apple in California. Assembled in China”. No fundo, seu notebook e celular da Apple, ou de qualquer outra empresa, seriam commodities se não estampassem uma marca. Sim, a tecnologia, as fábricas e até mesmo os designers estão no mercado acessíveis a qualquer um que queira fazer o que a Apple e as empresas dos mais variados setores da economia dos países desenvolvidos criaram e seguem recriando para vender ao mundo e a mim mesmo. Enganam-se aqueles que pensam estar comprando apenas mais um produto ou serviço. Estão comprando marca -- e pagando o devido valor percebido. Agora vou deixar de lado esse rótulo sem marca, essa analogia de que sou o celeiro do mundo e propor outra: a de que vou me transformar no hipermercado de marcas. O primeiro passo é dado em direção ao autoconhecimento e ao conhecimento profundo 46

das alavancas e motivadores intrínsecos do ser humano. Suas necessidades e desejos. Transcender as questões comerciais e transacionais, ir além, mais fundo, e destilar o verdadeiro propósito ao mesmo tempo que se compreende onde há valor para os indivíduos e para a sociedade, a exemplo do que faz a Natura. Isso ecoa pelos quatro cantos e atrai a atenção e o respeito até daqueles que nem sequer consomem seus produtos. A partir desse conhecimento, gerar insights de como desenhar modelos empresariais que sejam capazes de capturar esse valor com cada um dos envolvidos. Esses dois pontos, proposta de valor e modelo de negócio, já envolvem o segundo passo: planejamento. Muitas vezes não é preciso possuir ativos físicos, mas sim um novo olhar sobre as coisas e as relações que podem mudar o status quo, criando novos mercados até então inexistentes. Assim como fizeram Airbnb, Uber, e a própria Apple e sua Apple Store. Ainda nessa etapa

de planejamento, é preciso criar uma identidade de marca. Isso significa muito mais que um nome empresarial e um logotipo. Quer dizer que as nossas empresas trazem algo único e irreplicável para o mercado e que seu logotipo é a representação visual e verbal de tudo o que pode ser lembrado e vivenciado em contato com os stakeholders, a exemplo do que consegue fazer a Bang & Olufsen com sua inconfundível combinação entre design e performance de seus equipamentos de som – considerados peças de arte. Ainda nessa etapa, precisamos definir onde haverá a captura de valor por meio do apreçamento em combinação com a proposta de valor, não somente daquilo que pode ser quantificado e mensurável, mas daquilo que desejamos ser parte de nossa vida, da representação de uma ideia ou conceito aos quais desejamos ou pretendemos nos conectar. Denomino esse aspecto de "posicionamento mercadológico". Poucas empresas conseguem um posicionamento mercadológico tão distintivo quanto a Chanel. O conjunto de pilares estratégicos que irei trabalhar em prol do meu grande objetivo de me tornar um gestor de marcas é composto ainda de outros três pilares: cultura, comunicação e relacionamento. Vejamos. Se para alguns as cervejas são todas iguais e não existe


Marketing

unanimidade nacional, em um aspecto quase todos concordam: a Ambev criou uma cultura organizacional tão poderosa que estamos exportando executivos e adquirindo empresas nas vizinhanças globais sem distinção de origem, porte e praticamente sem limites. Assim eu terei de fazer conosco, redefinir e disseminar a minha cultura de marcas, da eficiência, do olhar de longo prazo, da livre e saudável concorrência, onde somente os melhores se perpetuam, assim como suas marcas. Para falar de comunicação e relacionamento, não há povo melhor que o meu. Agora quem dá a bola sou eu! Falarei com propriedade de quem é craque. Será? Será que sou bom o bastante para comunicar e me relacionar como fazem o Itaú e a Porto Seguro respectivamente? O banco que aprendeu e sabe comunicar-se como nenhum outro no meu território compreendeu que é preciso ter foco e fazer escolhas, que as coisas acontecem da noite para o dia em digamos, cinco ou dez anos... talvez 20, mas somente com a mensagem certa, segmentada, para quem interessar e de maneira absolutamente distinta a cada dia, a cada geração. E a Porto Seguro, imagina se relacionar com alguém que está comprando uma promessa. Sim, quando você adquire um seguro de qualquer natureza,

por exemplo, tem a expectativa de que pode contar com aquela marca, mas, apesar disso, torce todos os dias para que, se der tudo errado, tudo dê certo no final. Preciso aprender sobre isso com a Porto Seguro. A companhia que ano após ano cria formas novas e, às vezes, inesperadas de se relacionar com seus clientes e até mesmo com os clientes dos seus concorrentes, arguta e consciente de que um vínculo emocional é muito mais forte que qualquer desconto adicional. Agora que sei tudo o que há a fazer, pronto! Só falta fazer tudo. Conhecimento, planejamento não são nada

Ag

sem execução. Prometo que vou acabar com essa história de que planejar não adianta nada, de que o que vale é executar, ou seja, bola rolando. A gente precisa planejar e executar, aprender com os erros e acertos. Nossos e dos outros. Mas precisa olhar para o futuro e decidir como eu decido que não vão me rotular. Nós faremos juntos essa transformação, e com isso traremos mais riqueza para mim e para os que vivem em mim, prosperando e sustentando as atuais e futuras gerações. Assinado: Brasil, o país das marcas do businessagro. *CEO da SONNE Consulting.

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LIDERANÇA MUNDIAL EM EFICIÊNCIA A gaúcha SLC Agrícola, uma das maiores empresas de produção rural do País, estabeleceu uma meta ousada para os próximos anos. E tem motivos para acreditar que ela é factível Por Romualdo Venâncio

I

mpactar positivamente as próximas gerações, sendo líder mundial em eficiência e com respeito ao planeta. O conceito parece um tanto vago, mas foi adotado como meta nos escritórios da SLC Participações em Porto Alegre. Ali, batizado de “Sonho Grande”, ele começa a ganhar formas palpáveis na mente do empresário Eduardo Logemann, cujas decisões são distribuídas rapidamente para vários pontos do Brasil. O que ele

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determina deve ser seguido à risca em 15 propriedades que, espalhadas por seis estados brasileiros, fazem do SLC um dos mais relevantes grupos do agronegócio brasileiro. Para eles, tamanho não é documento. “Não estamos preocupados em ter a maior área plantada em 2050, mas sim em sermos a liderança global em eficiência”, declara Logemann, presidente executivo da holding e que também preside o conselho


Perfil

Ag

foto: Agência IstoÉ

Eduardo Logemann, presidente executivo da holding: “Não estamos preocupados em ter a maior área plantada”

administrativo de todas as empresas do grupo – SLC Agrícola, SLC Alimentos, SLC Comercial e FG-Ferramentas Gerais. “Acreditamos muito no agronegócio e no Brasil, e queremos estar sempre em crescimento.” Eduardo Logemann é um homem de estratégias e usa os números apenas para

referendá-las. Para 2016, por exemplo, a expectativa do grupo era atingir um faturamento de R$ 3 bilhões. Entre 55% e 60% desse montante viriam do braço na agricultura, a SLC Agrícola. Em suas 15 fazendas, a empresa soma cerca de 394 mil hectares plantados na safra 2015/16 (quase 90% de área própria), 20 mil hectares

a mais do que na temporada anterior. As principais culturas são a soja (230 mil ha), o algodão (90 mil ha) e o milho (70 mil ha). Há outras lavouras, como trigo irrigado, girassol e sorgo, mas em escala bem menor. A produtividade está entre as maiores virtudes desse negócio. E é nela que o executivo centra seus esforços, buscando resultado e celebrando avanços grão a grão. Segundo Logemann, nesse terreno o avanço nas lavouras tem sido de 1% ao ano, considerando a média de cinco anos. “E isso é muita coisa”, acrescenta. O executivo prefere não descer aos detalhes, até porque todas as culturas sofreram bastante com problemas climáticos, chegando a perdas em torno de 20% no período 2015/16. Mas deixa claro entender que o negócio tem seus riscos e que estão estruturados para isso. “O resultado mais importante é a última linha do balanço, que envolve produtividade e resultado econômico.” É aí que faz a diferença o planejamento de longo prazo e a gestão estratégica, algo que PLANT PROJECT Nº 2

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Ag Perfil

Imagens da produção: diversidade de culturas e presença em várias regiões ajudam a reduzir exposição a risco

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acompanha o grupo desde a sua fundação, em 1945. “O desempenho da produção agrícola sofre impacto dos ciclos de clima, câmbio e mercado, mas conseguimos compensar de outras formas e vamos fechar o ano com lucro”, analisa Logemann. Entre essas “outras formas” está a distribuição geográfica das lavouras. A soja e o algodão, por exemplo, são divididos entre Bahia, Maranhão e Mato Grosso, um terço em cada estado. “Em termos de clima, isso nos dá uma variedade importante.” A opção pelo cultivo do algodão, em 1998, veio também como estratégia para melhorar a lucratividade, pois rende mais por área. Hoje, 55% da receita da SLC Agrícola vem dessa cultura. O uso de tecnologia é outro fator que dá sustentação para o aumento da produtividade e, principalmente, para a correta tomada de decisões. Em todas as

fazendas da SLC Agrícola há um campo de pesquisa, um espaço reservado para a experimentação de sementes, fertilizantes, agroquímicos e equipamentos. “Fazemos testes de adaptabilidade e prazo de desenvolvimento, entre outros itens, sempre com o acompanhamento dos fornecedores e de nossa equipe técnica”, afirma Logemann. Dessa forma, há uma escolha personalizada de insumos para cada propriedade, o que garante mais qualidade e eficiência. Para aproveitar ao máximo esses benefícios, o parque de máquinas tem de ser moderno e tecnologicamente compatível com as metas do grupo. A SLC conhece a fundo esse mercado. O grupo foi um dos mais ativos fabricantes de equipamentos agrícolas do Brasil até 1999, quando essa divisão foi adquirida pela gigante americana John Deere – que hoje, naturalmente, é a fornecedora da companhia. “Trabalhamos sempre com equipamentos atualizados e de grande porte, pois temos de ser ágeis para não desperdiçar as janelas de colheita”, diz Logemann. A velocidade é uma vantagem, mas precisa de controle. “Toda a nossa operação, onde quer que aconteça, é transmitida imediatamente à nossa sede, no Rio Grande do Sul. No momento da colheita, temos condições de saber os resultados


foto: divulgação

de rendimento e produtividade e, se necessário, fazer correções imediatas. Inclusive em relação a como vamos despachar a produção”, explica o executivo. Considerando que praticamente toda a colheita de soja e algodão atende o mercado externo, tal facilidade torna-se ainda mais significativa. Quanto mais tecnologia nas lavouras, mais bem capacitados devem ser os profissionais do campo. Esse é outro trunfo da SLC Participações, que conta com 5.422 funcionários. Na SLC

Agrícola, são 3.489, equipe que ganha o reforço de 500 a 600 trabalhadores temporários no início da safra. “Em qualquer tipo de indústria, e a agricultura é uma indústria, você pode encontrar no mercado quase tudo de que precisa, como equipamentos e insumos. Mas o segredo está em como utilizar tudo isso”, observa Logemann. “Boa parte de nosso sucesso vem da maneira como preparamos e treinamos nossos profissionais. Temos ainda plano de contratação, de retenção e

de participação nos resultados, algo que implantamos em 1990. Somos uma das primeiras empresas a adotar essa participação.” A relação direta entre os planos de metas e de carreira e o desempenho de cada profissional evita a confusão entre boas condições de trabalho e paternalismo. No caso da SLC Agrícola, há ainda a preferência pela contratação de mão de obra local, ou seja, das proximidades onde está instalada cada fazenda. Para encurtar as PLANT PROJECT Nº 2

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Ag Perfil

As sementes do negócio: primeira sede do grupo, em Horizontina (RS), em 1950, e a primeira colheitadeira automotriz, de 1965

LOCALIZAÇÃO E DIVERSIFICAÇÃO ESTRATÉGIA DAS FAZENDAS

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distâncias, os executivos da empresa, inclusive de setores teoricamente mais afastados da produção, como financeiro e comercial, visitam as propriedades para explicar aos colaboradores como funciona a empresa e quais são os planos. O caminho inverso também ocorre, com a visita dos profissionais à sede da empresa. Logemann conhece bem essa rotina, e não apenas pela posição que ocupa hoje no grupo, mas por ser o funcionário mais antigo. Neto do fundador da SLC, Frederico Logemann, ingressou na companhia na década de 1970. Perguntado sobre o que traz de seu avô para sua gestão, Eduardo Logemann afirma que, apesar de o grupo ser uma referência em

inovação, não há invenções. “Avaliamos permanentemente os resultados, tomamos as medidas necessárias e direcionamos os investimentos para nossa evolução. A melhor maneira de ter sucesso na empresa é se dedicar a ela.” O valor dos setores em que atua também parece ser fundamental. “É no agronegócio brasileiro que reside a oportunidade de crescimento em produtividade preservando o meio ambiente. Somos o único país que consegue fazer duas safras”, diz o executivo. “O setor está bem, mas ainda há muito a ser feito, sobretudo da porteira para fora. Quando a soja é colocada no caminhão, por exemplo, perdese muito dinheiro por causa dos gargalos em logística.”


Alimentos sob ataque Protesto de agricultores na Grécia: questões políticas, ambientais, de saúde e de mercado preocupam produtores em todo o mundo

Fo FORU M

Ideias e debates com credibilidade

foto: Ververidis Vasilis / Shutterstock, Inc. PLANT PROJECT Nº 2

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Fo

Recuperar terras para alimentar as pessoas e a biodiversidade JASON CLAY Vice-presidente para Alimentos e Mercados do World Wildlife Fund (WWF)

Usamos mais das áreas não congeladas da Terra para agricultura — 40% — do que para qualquer outro propósito individual. Entretanto, apesar disso, ainda não fazemos um grande trabalho para alimentar o planeta. De acordo com a ONU, quase 800 milhões de pessoas em nível mundial são subnutridas, uma grande parte delas sendo crianças raquíticas. Imagine agora o que acontecerá quando a população aumentar em mais 2 ou 3 bilhões de habitantes – algo previsto em torno do ano 2050. Não somente haverá mais pessoas, como essas pessoas terão 2,9 vezes a renda per capita atual e consumirão ainda mais. O desafio será atender a essa crescente demanda por comida sem destruir o planeta. A expansão agrícola contínua não é a resposta. Antes de tudo, não há muita terra sobrando para o crescimento. A vasta maioria das terras já está ocupada ou não é a mais apropriada para a produção de alimentos. Os humanos praticam a agricultura há 12.000 anos e as melhores terras já foram convertidas. Em segundo lugar, e o motivo pelo qual tenho dedicado minha vida à solução desse problema, uma vez perdida a biodiversidade que evoluiu ao longo de

A guerra contra o açúcar ROBERTA RE Diretora-Geral da World Sugar Research Organisation (WSRO), Reino Unido

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milhões de anos, será muito difícil trazê-la de volta. As terras degradadas não podem ser recuperadas ao seu estado original. Porém, essas terras apresentam uma imensa oportunidade para a agricultura. A Organização para a Alimentação e a Agricultura (FAO), da ONU, estima que 24% de todas as terras estão exauridas. Isto pode ser causado por conta da agricultura intensiva ou excesso de seu uso para pastagem e remoção da vegetação, provocando a erosão do solo. Essas terras se tornam menos produtivas e são então abandonadas e trocadas por pastagens mais verdes. No entanto, as terras degradadas podem ser reabilitadas. A reversão da degradação com a construção de terraços, plantio de árvores e substituição de grama e vegetação é um processo lento, porém crítico. A reabilitação da terra começa com a reconstrução da matéria orgânica, que é a base de solos saudáveis e férteis. Em termos globais, deveríamos estabelecer uma meta para reabilitar 100 milhões de hectares até 2030 e 250 milhões até 2050. Os esforços que estão sendo conduzidos no Platô de Loess, na China, nas terras altas da Etiópia e no Cerrado brasileiro mostram que a reabilitação de terras degradadas para agricultura funciona. Melhor ainda, mesmo com as tecnologias atuais, nem todas as terras degradadas são adequadas para a produção de alimentos. Podemos devolvê-las à natureza. Essas terras — áreas ribeirinhas, encostas íngremes ou hábitats críticos de vida selvagem — nunca deveriam ter sido convertidas em primeiro lugar. Apesar de não podermos recapturar toda a biodiversidade que foi perdida para a produção de alimentos, a devolução das terras à natureza tornará o planeta mais hospitaleiro a longo prazo, proporcionará redução de carbono e armazenamento de águas subterrâneas, e restabelecerá espaços abertos para a vida selvagem.

O sobrepeso e a obesidade reconhecidamente representam fatores de risco para inúmeras doenças crônicas, entre elas o diabetes tipo 2, doenças cardiovasculares e algumas formas de câncer. Segundos dados (2014) da Organização Mundial da Saúde (OMS), a obesidade atingiu proporções epidêmicas no mundo todo, mais que dobrando desde a década de 1980, com mais de 1,9 bilhão de adultos com sobrepeso e mais de 600 milhões obesos. Uma causa reconhecida do ganho de peso é um desequilíbrio energético entre o excesso de calorias


consumidas e o baixo número de calorias gasto. Contudo, o açúcar foi taxado como a causa “número um” no combate à obesidade. Mas a causa da obesidade deve ser focada em somente um ingrediente da alimentação? Dados do Departamento de Agricultura dos Estados Unidos (USDA) mostram que o consumo per capita de açúcares livres (definidos pela OMS como “monossacarídeos e dissacarídeos adicionados a alimentos e bebidas pelo fabricante, cozinheiro ou consumidor, e açúcares naturalmente presentes no mel, xaropes, sucos de fruta e concentrados de suco de fruta”) caiu nos últimos anos, mas as taxas de obesidade continuaram crescendo. Onde está o consenso científico? Uma organização como o Comitê de Consultoria Científica sobre Alimentação (SACN, 2015) e a OMS (2015) revisaram as evidências disponíveis sobre carboidrato e saúde. Ambos concluíram que a qualidade das evidências científicas, além das cáries dentárias, nem sempre é conclusiva. Contudo, atualmente tem-se dado uma atenção considerável à identificação de intervenções para reduzir ainda mais o consumo. Órgãos nacionais e internacionais publicaram recomendações para reduzir o consumo de açúcares livres. Diversos países estão intervindo por meio da introdução de políticas para aumentar a conscientização do público, tais como a revisão de diretrizes alimentares, alteração de regulamentos de rotulagem nutricional e introdu-

Em busca do consumo perdido IBIAPABA NETTO

Diretor executivo da CitrusBR

Era o mês de setembro quando nos defrontamos com os primeiros dados de uma ferramenta chamada “Sonar”, plataforma que agrega notícias, artigos, menções em redes sociais e calcula o número de impressões, ou seja, quantos usuários se depararam com aquele assunto, no caso, sucos de fruta. Sua implantação custou US$ 500 mil de um

ção de medidas fiscais, como a taxação, para desestimular o consumo. Mas o que há de tão singular no açúcar em relação à saúde? As pesquisas nessa área ainda são relativamente escassas. Até hoje, a maioria das pesquisas sobre açúcares livres é voltada a bebidas adoçadas com açúcar, ao passo que faltam pesquisas mais atuais sobre o consumo de açúcar em si e padrões alimentares, além do consumo de bebidas. É necessário suprir as lacunas nas evidências científicas relacionadas ao consumo de açúcar e suas consequências sobre a saúde, para podermos implementar estratégias e abordagens voltadas a toda a população que tenham por base fatos científicos conclusivos. Com as atuais lacunas na literatura científica, alcançar uma abordagem baseada em evidências para a saúde pública é um desafio difícil. A indústria do açúcar tem um papel a exercer, contribuindo para suprir algumas dessas lacunas de conhecimento. A causa e a solução da obesidade são complexas e multifacetadas, e a alimentação como um todo exerce um papel importante, mas ele não é exclusivo, assim como a causa da obesidade não pode ser tão simples como focar em um único ingrediente. Se o objetivo for verdadeiramente virar o jogo em relação à obesidade, é hora de mudar o diálogo e abordar todos os fatores que contribuem para o seu desenvolvimento.

total de US$ 7 milhões disponíveis no primeiro ano do projeto Fruit Juice Matters (suco de fruta importa), dividido 50% pelas empresas associadas à Associação Nacional dos Exportadores de Sucos Cítricos (CitrusBR) e 50% entre outras 34 empresas entre os principais engarrafadores do mundo. No time, companhias como Coca-Cola, PepsiCo, Eckes-Granini, Refresco e outros gigantes do mundo do suco, além de empresas de embalagem como Tetra Pak. O motivo de tanta expectativa é simples: entre os anos de 2003 e 2015, o mundo deixou de consumir o equivalente a 500 milhões de caixas de suco ao ano e mais de 50% dessa perda caiu sobre as costas de produtores e indústrias brasileiras. A título de comparação, a safra brasileira 2016/17, finalizada em janeiro de 2017, está em torno de 244 milhões de caixas. É verdade que um clima inóspito durante um período importante fez dessa safra a menor em PLANT PROJECT Nº 2

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28 anos. Mas ainda assim é perturbador pensar que, se tivéssemos ao menos mantido o consumo, precisaríamos do dobro da produção corrente. O motivo para essa perda, que também se estendeu a outros sabores de sucos integrais, é uma enxurrada de matérias negativas na mídia europeia associando consumo de suco de fruta a diversos problemas e que fez consumidores migrarem para outras bebidas, principalmente águas saborizadas. O resultado mostrado no Sonar não poderia ser pior. Ao longo de 14 mercados na Europa, incluídos os três principais países (Alemanha, França e Reino Unido), apenas 25% das menções eram positivas, diante de 55% negativas e 20% neutras. O massacre midiático vinha acompanhado de toda sorte de mitos sobre sucos, numa verdadeira orquestra de horrores. Entre os títulos mencionados em grandes veículos estavam: “Por que frutas são mais saudáveis do que sucos?”; “Mantenha crianças longe de sucos de frutas”, entre outros. Em comum essas reportagens traziam opiniões de profissionais de saúde que associavam o consumo de suco de frutas com bebidas adoçadas sem se dar conta de que adicionar açúcar a suco 100%, além de proibido, é um crime passível de severas sanções. A confusão decorre, portanto, do não esclarecimento da diferença entre produtos distintos que podem ser feitos a partir do suco como, por exemplo, néctares e refrescos. Néctares, segundo o Codex Alimentarius, guia de alimentação das Nações Unidas, são bebidas que possuam pelo menos 50% de suco de fruta e que, em alguns casos, podem receber aditivos como açúcar, espessantes, entre outros. Há duas aplicações para os néctares: sucos em que o consumo da bebida em sua forma integral não seja possível, como limão, manga e pêssego. Ou como uma forma mais barata de levar uma porção de fruta líquida a quem não pode pagar pelo suco integral. O néctar, portanto, deve ser entendido como um produto de entrada da categoria suco e não como um concorrente, como acontece devido à desinformação. Os refrescos, bebidas que possuem em média 10% de suco, estão voltados justamente para ser o que o nome diz: um refresco. Afora tecnicidades, o grande problema está, mesmo, na associação do suco de fruta 100% aos chamados açúcares livres ou adicionados. Sucos de fruta são ricos em frutose e, segundo ensina a professora titular do Departamento de Nutrição da Unesp de Araraquara, Thais Borges César, a conver56

são de frutose em gordura em humanos é de apenas 5% ante 65% em camundongos sujeitos aos estudos que ajudaram a, literalmente, engordar os mitos. O jeito, portanto, é levar a luz da ciência a quem se interessa pelo assunto e é isso o que temos feito. Desde o pontapé inicial da campanha, um grupo de especialistas formado por cientistas de renomadas universidades mundo afora tem apresentado estudos que mostram qual o lugar do suco na nutrição. Essa turma estuda suco de frutas há décadas, mas por alguma razão suas descobertas não ganharam notoriedade. Nos últimos meses, foram mais de 50 congressos e algumas tímidas abordagens pela mídia, o que já rendeu uma significativa mudança de patamares. Enquanto em agosto passado estivemos diante de 420 artigos publicados, dos quais 35% eram negativos e 30% positivos, em novembro a curva mudou e dos 779 artigos publicados em 14 países, 47,8% das menções foram positivas e “apenas” 17% negativas. No acumulado, entre junho e dezembro, foram publicadas 3.354 reportagens, que resultaram em 34.126 compartilhamentos em redes sociais (o que não é muito) e um total de 164 milhões de impressões, ou seja, de pessoas que tiveram contato com o tema (o que é uma enormidade). A boa notícia é que, diferentemente do começo dessa jornada, o sentimento da mídia em relação aos sucos de fruta parece estar um pouco mais doce. A maior parte das menções (43%) são positivas e 25% são negativas, o que ainda é muito. Neutras correspondem a 32%. Essa virada de humor em relação aos benefícios do suco de fruta se deu de forma orgânica. O próximo passo será levar todo esse conhecimento científico de uma forma simples e agradável aos consumidores. E, quando isso acontecer, falaremos especificamente de suco de laranja, produto em que o Brasil é líder mundial devido à sua vocação natural e empenho de produtores e indústrias. Não sabemos quando as boas notícias chegarão ao consumo, mas sabemos que essa é uma estrada longa e que a frequência é a chave do sucesso. Outros setores como o de leite nos Estados Unidos, de amêndoas na Califórnia e de lã na Austrália fizeram programas semelhantes e tiveram êxito. Se tudo der certo, veremos os primeiros sinais de retomada no médio prazo, o que trará novo ânimo para a cadeia do suco de laranja, que tanto sofreu nos últimos anos. Indústrias e produtores têm sede de crescimento. Saúde!


Sistema de pivô central em propriedade no matopiba Região que engloba quatro estados do Norte e do Nordeste vive seu maior desafio, depois da pior seca das últimas décadas

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FRONTEIRAS

As regiões produtoras do mundo

foto: Rui Rezende PLANT PROJECT Nº 2

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FRONTEIRAS

As regiões produtoras do mundo

Emas atravessam lavoura de soja irrigada com pivô central: convívio de tecnologia com cuidado ambiental é marca da região 58


O DESAFIO DO MATOPIBA Com plantio da safra de verão concluído, produtores da região que engloba terras de cerrado na junção dos estados de Maranhão, Tocantins, Piauí e Bahia trabalham para superar as dificuldades da primeira grande seca em 40 anos Por Catarina Guedes | Fotos Rui Rezende

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Matopiba

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Brasil tem 26 estados mais o Distrito Federal. Isso todo brasileiro aprende na infância há muito tempo. O que só há poucas décadas se conhece é o território de 73 milhões de hectares, 337 municípios e 31 microrregiões formado pelas áreas de cerrado do Maranhão, Tocantins, Piauí e da Bahia, o Matopiba, fronteira agrícola – quase um 27° estado – que começou a ser aberta em meados dos anos 1980. De colonização mais recente que a do cerrado de Goiás e Mato Grosso, tornou-se à época das primeiras ocupações uma alternativa mais acessível para muitos desbravadores por causa dos preços menores das terras, em função da grande oferta e da infraestrutura então incipiente. Logo a região se estabeleceu como um dos maiores polos produtores de grãos do País e, desde 2003/04, ocupa o ranking de segundo maior produtor nacional de algodão, provedor de mais de 30% da produção brasileira da pluma. Nos últimos quatro anos, contudo, um revés climático, inédito em quase 40 anos, freou a escalada de crescimento do Matopiba. A situação foi agravada pelas crises econômica e política pelas quais passa o País, que contribuíram para reduzir a oferta de crédito e afastar investidores. Para enfrentar as dificuldades, os agricultores reviram a matriz produtiva, diminuindo as áreas plantadas com culturas de custo mais alto de implantação, como o algodão, e aumentando outras mais baratas e

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de boa rentabilidade, como a soja. A estratégia incluiu segurar investimentos em novas áreas, mas não deixar de plantar, mantendo a soma das lavouras em torno de 5,7 milhões de hectares. De olho no céu e torcendo pela influência de la niña, os agricultores já semearam, ou se preparam para plantar, a soja e o algodão para 2016/17. De acordo com o chefe do 4º Distrito de Meteorologia do Instituto Nacional de Meteorologia (INMET), Itajacy Diniz Garrido, o verão de 2017 será marcado pela atuação fraca do fenômeno oceânico-atmosférico la niña. “De modo geral, a ocorrência deste fenômeno, com fraca intensidade, é favorável às chuvas na região Nordeste e desfavorável ao Sul”, afirma. O trimestre de janeiro a março se anuncia como de normalidade em volume de chuvas para o Matopiba, mas a irregularidade na distribuição não pode ser descartada. “A recomendação é a gestão minuciosa dos recursos hídricos”, prescreve. CHOVER, CHOVEU O problema em 2016 foi justamente a distribuição irregular das chuvas, com excesso e escassez em estágios cruciais do desenvolvimento das plantas. Com propriedades no Tocantins, na Bahia e no Piauí, a agricultora Isabel da Cunha conta que a fazenda do Piauí foi a que registrou os maiores volumes de chuva e as menores produtividades. “Quando precisava, faltou”, diz, referindo-se, principalmente, ao mês de janeiro. Para man-


ter a mesma área plantada das últimas safras, Isabel da Cunha diminuiu em 42% as lavouras de algodão, incrementando com esse mesmo percentual as de soja. Em média, o custo de implantação dessas culturas é de R$ 8 mil e R$ 3 mil por hectare, respectivamente. “Ninguém, em lugar nenhum, está livre de uma catástrofe natural ou de uma condição desfavorável de clima em uma atividade a céu aberto como é a agricultura. Por isso, temos de ter estratégia. Não reduzimos em nada os custos com tecnologia e manejo, mas paramos de investir em aquisição de novas áreas até essa crise passar”, revela Isabel, que chegou ao cerrado da Bahia em 1983, aos 20 anos. Marcelino Flores é produtor rural e, junto com o irmão Olmiro, também é concessionário John Deere no Matopiba. Sua

revenda, a Agrosul, tem cinco lojas na Bahia, com sede em Luís Eduardo Magalhães, e uma em Bom Jesus do Piauí. Na safra 2016/17, Flores plantou 21 mil hectares de soja, 4 mil de milho e 2 mil de algodão. “Começamos com um ótimo estande nas três culturas e a expectativa é de safra cheia. Não nego que atravessamos um período muito difícil, mas os riscos fazem parte da nossa atividade. Se somarmos os 32 anos de Bahia, veremos que foram altamente positivos, com grandes colheitas e ótimos preços”, afirma. Quanto ao comércio, sua análise é semelhante. “É um negócio diretamente ligado à agricultura, por isso foi de certa forma impactado. Mas nós somos todos programados para anos bons e anos não tão bons, e estamos preparados para isso. Se fosse fácil, todo mundo estaria na agricultura”, conclui.

Vista aérea de colheita de milho no Sul do Maranhão: revés climático afetou escalada de crescimento que durava 30 anos

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Aplicação de defensivo agrícola em plantação de algodão: região é responsável por mais de 30% da produção nacional

MUITO CONFIÁVEL Ter relevo, vegetação e algumas características socioeconômicas semelhantes, como o fato de haver sido colonizado majoritariamente por sulistas, nem de longe faz do Matopiba uma coisa só. Dentro de cada sílaba do acrônimo, a diversidade já é grande o suficiente para não permitir generalizações. No Maranhão, por exemplo, se pode delimitar pelo menos três áreas de perfis distintos, segundo o produtor Idone Luiz Grolli. No extremo Sul, onde as altitudes variam de 500 a 600 metros, o plantio começa por volta do dia 15 de outubro. Cerca de 50% das lavouras estão nessa microrregião, que tem janela de plantio suficiente para fazer duas safras por ano. Em Balsas e entorno, situada a cerca de 350 metros de altitude, o plantio começa em meados de novembro, e só se faz uma safra ao ano. A microrregião responde por, aproxima62

damente, 35% da área plantada do cerrado maranhense. Já em Chapadinha, a 100 metros de altitude, o plantio da única safra anual, equivalente a 15% do total produzido no estado, se dá em torno de 15 de janeiro. O Maranhão tem em média 750 mil hectares de soja e 10 mil hectares de algodão, cultivados pela SLC Agrícola. “Cada lugar tem uma característica específica e é preciso saber lidar com isso. Não tenho dúvida alguma de que, desde 1975, a seca de 2016 foi a pior de todas. Mas uma seca em 40 anos só quer dizer que o local é muito confiável. Estou muito satisfeito aqui e progredi como agricultor nesse período. O produtor rural está preparado para enfrentar esse tipo de situação, ao contrário de especuladores”, ressalta. Grolli se define como um desbravador por natureza. “É a minha quarta fronteira agrícola”, diz o gaúcho, que,

após passar pelo Oeste de Santa Catarina, Oeste da Bahia e Maranhão, está plantando também em Macapá (AP). No Maranhão, Idone Grolli, que é sementeiro, cultiva 5,2 mil hectares, parte deles irrigados. Em Macapá, 1,15 mil. O sofrimento afetou a muitos nas últimas safras, mas produtores como João Carlos Jacobsen Rodrigues, um dos precursores da cotonicultura no Oeste da Bahia, reafirmam a fé no Matopiba. “Todo mundo aqui começou do zero. Essa terra deu a milhões de pessoas um nível patrimonial fantástico. A agricultura mudou a história do lugar, trouxe um contingente gigantesco de imigrantes e transformou o cerrado numa grande potência”, diz. “Agora o Matopiba não pode ser considerado ruim por causa de um ciclo. Mas é fato que o período difícil deixa lições importantes para o produtor, que vai enfrentar o


Matopiba

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RAIO X

MATOPIBA EM NÚMEROS

MA

Área total: 73 MILHÕES DE HECTARES Área utilizada pela agropecuária: 33,9 MILHÕES DE HECTARES Estados: 4 Área ocupada em cada estado TOCANTINS: ..........................38% MARANHÃO: ..........................33% BAHIA: ...................................... 18% PIAUÍ: .......................................... 11%

PI TO

BA

Municípios: 337 Estabelecimentos Agrícolas: 324 MIL Unidades de conservação: 46 Terras indígenas: 35 População (2010): 5,9 MILHÕES DE HABITANTES

PRINCIPAIS CIDADES

PRINCIPAIS CULTURAS

MARANHÃO: Balsas (aeroporto apenas para pequenas aeronaves).

Participação na produção nacional

PIAUÍ: Baixa Grande, Bom Jesus, Uriçuí, Santa Filomena e Ribeiro Gonçalves.

SOJA ..................................... 11% MILHO .................................... 5% ALGODÃO ...........................32% ARROZ .................................. 8%

TOCANTINS: Palmas (aeroporto), Araguaína (aeroporto), Dianópolis, Paulo Afonso, Campos Limpos, Porto Nacional (aeroporto), Gurupi e Aragominas. BAHIA: Luís Eduardo Magalhães, Barreiras (aeroporto), Formosa do Rio Preto.

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Os produtores Isabel da Cunha, Idone Grolli e João Jacobsen: adaptação e mudança para lavouras de manejo mais simples para enfrentar o momento mais difícil

problema reduzindo área e buscando aumentar a capitalização”, argumenta Jacobsen, que acaba de concluir o segundo mandato como presidente da Associação Brasileira dos Produtores de Algodão (Abrapa). Segundo o produtor, só nesta safra 2016/17, a atividade deve aportar em torno de R$ 2,2 bilhões na Bahia. “Isso não é desprezível. O problema não foi só a seca. Foi uma conjuntura econômica, política e climática”, conclui. A Associação de Agricultores e Irrigantes da Bahia (Aiba) já concluiu a primeira estimativa para a safra 2016/17. Em uma área total de 2,36 milhões de hectares, 4% a mais que em 2015/16, o estado deverá colher, aproximadamente, 8 milhões de toneladas de grãos. A soja ocupa 1,6 milhão de hectares, contra 1,52 milhão na safra passada. O algodão, 192 mil hectares, 15% a menos que no ciclo anterior. O milho, após dois anos de recuo de área, cresceu 33% em relação a 2015/16, ficando em 180 mil hectares. MERCADO VENDEDOR La niña está chegando tímida, mas promissora. A expectativa pelas chuvas que o fenômeno costuma garantir às lavouras nordestinas não se restringe aos agricultores e comerciantes ligados ao agro, mas também aos prestadores de serviços. Corretores de imóveis

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rurais são alguns dos mais ansiosos. “Se a safra 2016/17 corresponder à expectativa, começa a retomada de crescimento. Com mais uma safra boa, em 2018 voltaremos aos patamares normais”, pondera o corretor de imóveis Marcelo Thomas, da Fragatta Consulting, na Bahia, que negocia terras em todo o Matopiba. Thomas explica que os preços do hectare subiram muito alguns anos atrás, sobretudo por volta de 2010 e 2011. “Hoje o mercado não é comprador. A primeira atitude dos produtores em situações de crise é parar de adquirir terras. Quem nunca comprava e guardou dinheiro agora está encontrando algumas boas oportunidades, mas isso é raro. As terras, de um modo geral, não baixaram de preço no Matopiba, salvo naqueles casos de um ou outro agricultor que quebrou, o que acontece todo ano em qualquer região”, afirma. Hectares no Matopiba são indexados em sacas de soja e a valorização varia de acordo, principalmente, com os índices pluviométricos e a disponibilidade maior ou menor de infraestrutura, como acesso a estradas e energia. “Uma terra boa para plantio, com regime pluviométrico de 1,2 mil milímetros por ciclo, no cerrado do Piauí pode custar de 50 sacas a 600 sacas de soja, a depender da infraestrutura. É complicado falar em valor médio”, diz o corretor.


MATOPIBA: CRESCIMENTO DA PRODUTIVIDADE E CONSOLIDAÇÃO TECNOLÓGICA

André Nassar, engenheiro agrônomo, diretor da Agroicone e sócio da Conext Partners.

O baixo desempenho da produtividade de soja e algodão na safra 2015/16 nos estados do Matopiba tem levado analistas e alguns veículos de imprensa a questionar a viabilidade da produção instalada naquela região e a colocar em cheque o seu potencial de expansão. Faço, a seguir, uma análise fria da situação. Não incluí o milho porque a perda de produtividade foi igualmente intensa por lá e no Cerrado do Centro-Oeste (cerca de 30% de redução). Os produtores que estão há anos no Matopiba argumentam que a perda na safra 2015/16 foi um fato isolado, quando comparada com o histórico. Neste artigo, respondo a três perguntas. Todas as comparações são feitas com os estados do Centro-Oeste, uma vez que ambas as regiões são aquelas com maior potencial de crescimento da produção de grãos. A primeira pergunta é: a região está ou não no seu limite de produção? Somadas as áreas disponíveis nos quatro estados do Matopiba, ainda há 12,7 milhões de hectares que podem ser convertidos para produção de lavouras anuais, sendo 1,8 milhão ocupados com pastagens e 10,9 milhões com áreas de cerrado (evidentemente, que podem ser abertas legalmente). Embora o Centro-Oeste ainda possua maior potencial (22,2 milhões de hectares), o do Matopiba é muito elevado. A segunda: a afirmação dos produtores de que 2015/16 foi um evento isolado se confirma? Baseado nos dados históricos, conclui-se que os produtores da região têm razão. A variabilidade da produtividade, medida pelo CV (coeficiente de variação) dos estados do Matopiba cai muito quando a safra 2015/16 é excluída da série de dados, comprovando que o filme é diferente da foto. O mesmo não ocorre no Centro-Oeste. É necessário salientar, no entanto, que a variabilidade no Centro-Oeste é menor do que no Matopiba. Isso ocorre porque o risco climático é maior no Matopiba, mesmo olhando o filme, e porque algumas regiões menos consolidadas da região ainda estão em fase de aumento de produtividade. A terceira pergunta: o Matopiba é uma região mais dinâmica do que o Centro-Oeste, ou seja, se

produção e área crescem mais? O dinamismo é medido pela taxa de crescimento anual. As taxas de crescimento anuais da produção e da área do Matopiba (medidas no agregado) são maiores do que no Centro-Oeste. Por estado, observa-se que há estados em grande expansão, como Tocantins e Piauí, e estados mais consolidados, como Maranhão e Bahia, sendo que este último tem dinamismo igual ao do Mato Grosso (estado mais dinâmico do Centro-Oeste). O Matopiba tem se mostrado uma região mais dinâmica do que o Centro-Oeste. Porém, e isso é mais uma medida de risco que precisa ser mencionada, os estados do Centro-Oeste apresentam taxas de crescimento da produção maiores do que as da área, ao passo que o inverso ocorre nos estados do Matopiba. Ou seja, o Matopiba é uma região mais dinâmica, mas que oferece muito mais risco porque sua expansão passada ocorreu por meio da abertura de áreas novas. A forte queda de produtividade no Matopiba na safra 2015/16 criou uma percepção nos agentes de mercado de que o risco produtivo é, hoje, maior do que se avaliava há um ano. Mas o histórico da região comprova que o evento 2015/16 foi extemporâneo. Avaliar o risco da região com base apenas na safra 2015/16 é um erro que analistas e mídia não deveriam cometer. O resultado da safra 2015/16 eleva, entretanto, o nível de risco da região, mesmo quando se avalia o histórico. Maior nível de risco vai promover mudanças no padrão de expansão da região. A primeira fase, que poderá já ocorrer em 2016/17, é a recuperação da produtividade. A segunda fase será investir em tecnologias que aumentem a produtividade nas áreas já consolidadas. Esse processo de consolidação tecnológica, que já está em curso nas áreas mais consolidadas da região, ficou pouco aparente por causa da forte expansão em área observada nos anos recentes. Assim, podemos esperar uma redução nas taxas de crescimento da área plantada, com os produtores focalizando seus investimentos nas áreas de menor risco, ou seja, aquelas já abertas e bem trabalhadas. Não deixa de ser uma mudança relevante para a região. PLANT PROJECT Nº 2

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Análise

Cidades agrícolas se firmam como alternativas de desenvolvimento às saturadas metrópoles Por Ronaldo Luiz

O

agronegócio brasileiro vem sendo há muito tempo um teimoso. A despeito da queda pontual do Produto Interno Bruto (PIB) da agropecuária – considerando apenas a produção física dentro das fazendas – no terceiro trimestre de 2016, devido principalmente a intempéries climáticas, a expectativa é de uma nova supersafra de grãos no ciclo corrente 2016/17, com a produção podendo superar 210 milhões de toneladas. Em outro setor seria de se esperar que números negativos acarretassem o pé no freio, mas não é o que vem acontecendo com o agronegócio, que, nos últimos 30 anos, puxado pela crescente demanda global por alimentos, fibras e energia de base agrícola, vem sendo a exceção positiva. É inegável que o agronegócio é o segmento da economia brasileira

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que tem mais carimbos no passaporte e o gerador de importantes divisas, que vêm garantindo, há anos, a segurança alimentar, as exportações e a balança de pagamentos do País. Isso é nítido e claro. O que, ainda, não é tão visível – especialmente aos olhos dos grandes centros urbanos – é que o crescimento do agronegócio vem promovendo pelo interior afora ilhas de prosperidade, mostrando que investir cada vez mais na atividade rural pode ser uma alternativa de desenvolvimento socioeconômico mais interessante do que direcionar olhos – e recursos – às já saturadas metrópoles. Uma série de estudos comprova que cidades pequenas e médias cuja atividade econômica principal é o agronegócio têm apresentado altos Índices de Desenvolvimento Humano

foto: Alex Pereira - Prefeitura de Nova Mutum - MT

PLANTANDO CONTRA A MARÉ


Monumento ao agricultor em Nova Mutum (MT): em uma década, município saiu da rabeira para se tornar um dos dez maiores IDHMs do Centro-Oeste

Municipal (IDHM) e um padrão de empreendedorismo e autoestima superiores ao da média nacional. Além da riqueza, emprego e renda proporcionados pelos negócios atrelados à sua cadeia produtiva, o agronegócio vem tendo efeito multiplicador ao gerar externalidades positivas para a indústria, o comércio e o segmento de serviços. “A atividade agropecuária está entre as que mais distribuem a renda entre seus agentes, e essa renda acaba ficando, em boa parte, no município, refletindo no comércio e nos serviços”, afirma Ciro Antônio Rosolem, professor da Faculdade de Ciências Agrícolas da Universidade Estadual Paulista “Júlio de Mesquita Filho” (FCA/Unesp-Botucatu). Segundo Rosolem, que também é vice-presidente do Conselho Científico para a Agricultura Sustentável (CCAS), a agropecuária é uma das atividades que mais geram emprego por unidade de capital aplicado. Os dados estatísticos, como os números de 2016 do Atlas do Desenvolvimento Humano nas Macrorregiões Brasileiras, publicação do Programa das Nações Unidas para o Desenvolvimento (Pnud), são a base dessa constatação. Mato Grosso, principal estado

produtor agrícola da região Centro-Oeste – a maior em grãos –, registrou significativo avanço de IDHM no período de 1991 a 2000. Em 1991, 94% dos municípios mato-grossenses estavam na faixa de muito baixo desenvolvimento humano. Em 2010, nenhum continuava nessa faixa, e 97% já estavam na faixa de médio e alto. De 1991 a 2010, municípios de expressiva produção agropecuária passaram a figurar entre os dez que têm os maiores IDHMs da região Centro-Oeste, comoLucas do Rio Verde, Sorriso e Nova Mutum do Mato Grosso; Ceres, Catalão e Jataí de Goiás; bem como São Gabriel do Oeste e Chapadão do Sul do Mato Grosso do Sul; entre outros. Estudioso do tema, o professor e sociólogo Paulo Eduardo Cabral cita outro exemplo, o da cidade de Maracaju, no Mato Grosso do Sul. “Era uma localidade, nos anos 1970, ancorada na pecuária antiga, que mudou radicalmente com a implantação da agricultura de grãos a partir dos anos 1980. Hoje, Maracaju exibe taxas de crescimento bastante significativas”, destaca Cabral, que também é presidente do Instituto Histórico e Geográfico de Mato Grosso do Sul (IHGMS). Outros estudos já mostraram a associação entre agronegócio e desenvolvimento

socioeconômico, sendo o mais clássico deles feito pela consultoria Kleffmann, em 2014. O trabalho assinalou que as regiões essencialmente agrícolas deveriam manter um crescimento mais acelerado do IDHM que as não agrícolas ao menos pelos próximos dez anos. Segundo o documento, entre 1970 e 2010 os polos agrícolas registraram um crescimento de 69% no IDHM, enquanto os não agrícolas avançaram 57%. Outra pesquisa, desta vez da Empresa de Assistência Técnica e Extensão Rural de Minas Gerais (Emater-MG), feita em 2013, também foi nessa linha ao mostrar que os municípios mineiros que têm no café a base de sua economia registraram IDHM maior que a média do estado. Ambos os estudos, tanto da Kleffmann quanto da Emater-MG usaram como base dados brutos do Pnud. LAVOURA MOVIMENTA O VAREJO Agora, em 2016, dois novos estudos reforçam a tese de que o agronegócio promove desenvolvimento socioeconômico. O primeiro deles, intitulado “Ilhas de Oportunidade: Como Navegar no Mercado Consumidor Brasileiro Durante a Crise?”, aponta que o impacto da crise econômica no consumo está longe de se comportar PLANT PROJECT Nº 2

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foto: Folhapress

de modo homogêneo no País. Apesar do cenário de retração, existem áreas geográficas e setores que vêm driblando a recessão, com destaque para regiões e atividades ligadas ao agronegócio, acentua o relatório elaborado pela Cielo e o Boston Consulting Group (BCG). Segundo a pesquisa, as cidades situadas nas regiões agropecuárias apresentaram um crescimento, em termos reais, de 1,3% no desempenho do varejo em 2015 contra queda de também 1,3% na média nacional. “O grupo de cidades que classificamos como Zona Agroexportadora, caracterizado pela importância do agronegócio em suas economias, teve o maior crescimento pré-crise do Brasil, bastante acima das demais regiões”, afirma 68

Daniel Azevedo, sócio do BCG, e um dos responsáveis pelo estudo, que acrescenta: “O bom desempenho destes municípios se deve ao grau de ‘blindagem’ destas economias, pelo fato de possuírem grande participação do setor agrícola, o que beneficia, por exemplo, o comércio regional, pelo fluxo crescente de recursos girando”. Coautor do relatório, Gabriel Mariotto, gerente de inteligência da Cielo, frisa que o estudo revela que os principais polos de produção agropecuária, que se encaixam no grupo Zona Agroexportadora, são, ao lado do interior do Nordeste, as regiões que têm as maiores taxas de crescimento no período de 2013 a 2015, 4,2% e 3,3%, respectivamente. Na avaliação de Cabral, do IHGMS, estimular o avanço de regiões agrícolas é uma maneira

de diversificar territorialmente o desenvolvimento socioeconômico, e assim contribuir para fixar populações em suas regiões, inibindo fluxos migratórios para as metrópoles. Segundo o sociólogo e professor, as pessoas começam a tomar consciência de que as grandes cidades podem não ser mais aquilo que elas imaginavam, e, mais que isso, que o campo também pode ser vantajoso em termos de oportunidades. EXPANSÃO DA CANA MELHORA INDICADORES SOCIAIS “A atividade agrícola, pelo potencial de geração de emprego e irrigação econômica dos municípios, é a que tem maior capacidade de proporcionar desenvolvimento regional”, salienta Rosolem. “Quando se cria maiores oportunidades


Lavoura de soja disputa espaço com condomínio residencial na cidade de Lucas do Rio Verde (MT): polos agrícolas mantiveram índices positivos de vendas no varejo apesar da crise

de emprego e renda, há uma tendência de maior fixação no território”, reforça Leandro Gilio, economista, especialista em agronegócio e doutorando pela Escola Superior de Agricultura “Luiz de Queiroz” (Esalq-USP). Gilio participou de estudo e é autor de outro no qual destaca que a expansão da agroindústria canavieira provocou impactos positivos nos indicadores sociais do País. Intitulado “Impactos Socioeconômicos da Indústria

Brasileira de Cana-de-açúcar”, o documento mostra que os trabalhadores envolvidos com a cana-de-açúcar recebem salários maiores, são mais escolarizados e têm uma proporção maior de emprego formal quando comparados com a média desses indicadores para outras culturas agrícolas. “Foi possível ainda verificar que os descendentes dos empregados da lavoura canavieira apresentam indicadores socioeconômicos

melhores, além de terem uma mobilidade maior para outros setores fora do agrícola”, pontua a autora principal, Márcia Azanha Ferraz Dias Moraes, do Departamento de Economia, Administração e Sociologia da Esalq. “Os municípios canavieiros em todos os estados apresentam melhores indicadores de distribuição de renda e de acesso aos serviços de infraestrutura, principalmente acesso a instalações sanitárias”, conclui Márcia.

ÂNCORA DO CONSUMO

Quanto maior a participação do agro no PIB, maior o crescimento do comércio

• Share Agropecuário no PIB: 9,6% • Renda mensal per capita: R$ 375 • PIB per capita: R$ 16 mil • Taxa de crescimento do consumo

Cinturão Amazônico

Interior Nordestino • Share Agropecuário no PIB: 6,5% • Renda mensal per capita: R$ 432 • PIB per capita: R$ 12 mil • Taxa de crescimento do consumo

• Taxa de crescimento do consumo

• Taxa de crescimento do consumo

2010-2013: 11,4%

2013-2015: -0,6%

Zona Agroexportadora • Share Agropecuário no PIB:18,2% • Renda mensal per capita: R$ 677 • PIB per capita: R$ 23 mil • Taxa de crescimento do consumo 2010-2013: 11,1% • Taxa de crescimento do consumo 2013-2015: 4,9%

Áreas Metropolitanas

2010-2013: 6,1%

2013-2015: 3,3%

Interior do Sul-Sudeste • Share Agropecuário no PIB: 3,4% • Renda mensal per capita: R$ 873 • PIB per capita: R$ 33 mil • Taxa de crescimento do consumo 2010-2013: 2,7% • Taxa de crescimento do consumo 2013-2015: 7,1%

Conurbações Nacionais

• Share Agropecuário no PIB: 0,5% • Renda mensal per capita: R$ 935 • PIB per capita: R$ 27 mil • Taxa de crescimento do consumo

• Share Agropecuário no PIB: 0,1% • Renda mensal per capita: R$ 1.233 • PIB per capita: R$ 43 mil • Taxa de crescimento do consumo

• Taxa de crescimento do consumo

• Taxa de crescimento do consumo

2010-2013: 3,2% 2013-2015: 1,3%

2010-2013: 1,8%

2013-2015: 0,5%

Fonte: Análises do Índice Cielo do Varejo Ampliado e do BCG. Nota: Dados calculados com 1.617 cidades selecionadas que representam ~90% do PIB brasileiro e ~80% da população do país.

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Destilaria de Port Ellen, na EscÓcia: Porta de entrada para uma jornada na Ilha de Islay, o mundo encantado do scotch

W WORLD FAIR

A grande feira mundial do estilo e do consumo

fotos: Divulgação PLANT PROJECT Nº 2

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W WORLD FAIR

A grande feira mundial do estilo e do consumo

A ILHA DO UÍSQUE A magia e os sabores das destilarias de Islay, na Escócia, de onde saem alguns dos melhores uísques do mundo Por Fiona Rintoul | Fotos Konrad Borkowski, de Islay (Escócia)

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CATEDRAL DO Uร SQUE: Os seis alambiques gigantes da Caol Ila, com as grandes vidraรงas emoldurando as montanhas de Paps de Jura PLANT PROJECT Nยบ 2

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W Destinos

E

stávamos na cozinha do albergue da juventude de Port Charlotte, mirando Loch Indaal, a grande enseada que, juntamente com Loch Gruinart, quase divide a Ilha de Islay -- e uma vez realmente dividiu. "Sinto kiwis, chocolate amargo, temperos orientais”, disse um visitante australiano, com o nariz enfiado em um cálice de malte puro de Islay. “E também algas marinhas, salinidade, salmoura. Um sopro muito forte de salmoura.” "Sim", resmungou o diretor do albergue, um sisudo nativo de Kilmarnock, “a janela está aberta”. Estive em Islay por algumas semanas, tendo percorrido as ruas de Islington e trocado um trabalho como editora em uma revista de investimentos por um cargo de meio período como assistente de albergue

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na ilha mais ao sul das ilhas Hébridas. Esse havia sido meu primeiro, mas não o último, encontro com o que pode ser chamado de mística do uísque: a submersão quase orgástica em paladar, aroma e sensação, que é a comunhão de um amante de uísques com um bom exemplar da produção local. É claro, você pode rir. Isso exige que você ria. A janela estava realmente aberta. Os nativos de Islay não vão se importar se você rir. Em nenhum momento, em todas as minhas visitas às oito diferentes destilarias da ilha, eu conheci alguém que se levasse a sério demais ou fosse muito preciosista com o seu trabalho. Em Laphroaig, que fica em uma baía reluzente na costa sudeste da ilha e talvez seja a mais famosa destilaria de Islay, eles cobrem as paredes com descrições


de seu uísque de 200 anos coletadas em uma campanha que incentivava opiniões. Elas variam de estáticas a, digamos, instigantes, desde “parece que a boca e a garganta se cobrem com cashmere” até “como um cachorro molhado em uma terrível tempestade lá fora entrando todo coberto com alga marinha”. As destilarias de uísque de Islay não precisam ser arrogantes ou melindrosas. Porque, esteja você notando toques de kiwi ou não, esses são os melhores uísques do planeta e todo mundo sabe disso. A mística tem seu auge nas destilarias recuperadas de Ardbeg e Bruichladdich. Ardbeg chegou ao espaço sideral e o mais turvo de todos os maltes de Islay está disponível na forma de vapor como Ardbeg Haar. Bruichladdich criou uma tremenda força turquesa de marketing com os métodos tradicionais de produção em sua planta vitoriana e sua crença em terroir – o termo das vinícolas para as características atribuíveis ao local de origem. Ambas as destilarias são muito brincalhonas quando falam sobre serem mais selvagens que um elefante, no caso de Ardbeg, ou serem investigadas pela CIA, no caso de Bruichladdich. Mais ainda, elas sustentam a hipérbole com exemplares superlativos. E, poxa, elas têm direito de sentirem-se satisfeitas consigo mesmas. Ambas ressuscitaram

nos anos 1990 após a crise do uísque da década de 1980, isso para o benefício não apenas de si mesmas, mas das comunidades vizinhas. "Tantas coisas são afetadas pelas destilarias em Islay”, comenta Mickey Heads, que assumiu como gerente da destilaria Ardbeg em 2007, deixando uma destilaria da Ilha de Jura. Em 1997, quando a Ardbeg foi recuperada pela antes concorrente Glenmorangie, estava decrépita e quase extinta. Hoje, emprega 25 pessoas e atrai multidões de visitantes ao centro de visitação e seu café Old Kiln, que é, entre outras coisas, uma ótima parada a caminho da Cruz de Kildalton, uma das primeiras cruzes cristãs da Escócia. A Bruichladdich passou uma década em produção parcial e fechou completamente em 1994, antes de ser adquirida pela engarrafadora Murray McDavid, em 2000. Hoje, é a maior empregadora privada de Islay, com 65 funcionários na ilha e, em 2003, alinhada à crença no terroir, reintroduziu a cevada de Islay à produção de uísque. Um quarto da cevada que a Bruichladdich utiliza anualmente é cultivado em Islay, trabalhando com 15 fazendeiros da ilha. A cevada de Islay não rende tanto quanto a cevada cultivada em, digamos, East Lothian, mas a Bruichladdich acredita que o custo adicional é compensado

Vista de Port Charlotte e garrafas de puro malte prontas para serem distribuídas: destilarias com mais de 200 anos de tradição

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Turistas australianos degustam uísque em Port Charlotte e vista interna da destilaria de Ardbeg

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pelo sabor. "Os sabores que você obtém com a cevada cultivada em Islay em campos fertilizados com alga marinha e que recebem o ar marinho são diferentes de qualquer outro lugar”, diz Adam Hannett, destilador-chefe da empresa. Os “destiladores progressistas das Hébridas”, como se autoclassifica a Bruichladdich, parecem ter começado uma tendência. Kilchoman, a mais jovem destilaria de Islay, fundada em 2005 na região da Baía de Machir, banhada pelo Atlântico, e a única destilaria de fazenda da ilha, também utiliza cevada de Islay em parte de sua produção. Duas novas destilarias planejadas, uma em Gartbreck, perto de Bowmore, e outra em Ardnahoe, entre Bunnahabhain e Caol Ila, pretendem utilizar cevada cultivada em Islay em suas produções. O proprietário de Gartbreck, Joan Donnay, que opera a Glann ar Mor Distillery na Bretanha, também pretende aquecer seus alambiques de cobre com fogueiras. Essa ênfase contemporânea em métodos tradicionais e o aspecto artesanal marcam o ciclo completo da produção de uísque de Islay, que foi industrializada na década de 1880 com o advento do Clyde Puffer. Os Puffers permitiram às destilarias utilizarem carvão para aquecer os alambiques -- em vez da muito menos

eficiente turfa -- e também exportarem suas distintas bebidas para o mundo inteiro. Uma nova onda de maltes puros de Islay alimentou o desejo do apreciador moderno de uísque por algo especial e artesanal, mas que de forma alguma substituía a produção industrial. Ambos caminham lado a lado. Quando saí de Londres e me mudei para Islay, em 2005, em uma espécie de experiência louca, dirigindo até lá em uma Mercedes 250 marrom de 1970, amigos londrinos vieram se despedir de mim com uma garrafa de Caol Ila. Logo depois da mudança, visitei as baías reservadas da costa noroeste de Islay, acessadas por estradas sinuosas e estreitas, onde o Caol Ila e o Bunnahabhain são destilados. Eu não sabia na época -- e você nunca imaginaria mirando das estradinhas os pequenos vilarejos de destilarias --, mas, com uma capacidade de 6,4 milhões de litros, Caol Ila produz duas vezes mais uísque que qualquer outra destilaria em Islay. Somente dentro do salão de alambique da Caol Ila – que se assemelha a uma catedral -- é que você consegue imaginar a escala do lugar. Os seis alambiques gigantes de cobre parecem diminuir as rochosas Paps de Jura, que estão enquadradas pelas enormes janelas do salão do alambique. Da mesma


forma, Caol Ila, assim como Bunnahabhain – ambas já utilizaram cavalos para agitar a mistura – sabem bem como responder à demanda por bebidas especializadas. É engarrafando o mais puro malte suavemente defumado e introduzindo três expressões complementares. Bunnahabhain, enquanto isso, ganhou fãs com um malte maduro, turvado com cevada, destilado usando água de nascente, que insulta o convencional queima-língua fenólico de Islay. Simplesmente não existe um uísque de Islay ruim. Cada bebida destilada na ilha tem suas próprias qualidades e cada destilaria tem algo único para oferecer ao visitante. Em Laphroaig, pode ser o tradicional piso de maltagem, onde a cevada germina para se tornar malte; em Bunnahabhain, as enormes lavadeiras de pinho, onde a

cerveja conhecida como wort é fermentada; em Lagavulin, os incomuns alambiques altos e em formato de pera; em Bowmore, os antigos Galpões nº 1, o armazém de maturação mais antigo da Escócia, que fica parcialmente abaixo do nível do mar. Nos Galpões nº 1, você pode encontrar barris que datam de décadas atrás e outros que se encaminham para o futuro: uísque sendo finalizado em barris Mizunara feitos de carvalho japonês, introduzido pelo atual proprietário da Bowmore, Beam Suntory. No salão dos visitantes, no andar de cima, resplandecente em uma criação de vidro soprado manualmente salpicado com platina está a última garrafa de Bowmore 1957. Meu próprio caso de amor com os brilhantes destilados castanhos nessa ilha cheia de praias com umas 3.200 almas começou com a paisagem e as

pessoas, antes do uísque -- esse é, acredito, o caminho certo. O uísque não define Islay, mas Islay e suas pessoas definem essa coisa especial que é o uísque puro malte de Islay. É claro, você pode saborear um gole de puro malte de Islay em um bar em Nova Iorque, Londres ou Berlim sem nunca ter atracado em Port Askaig em um glorioso dia de sol ou voado pelos ares em um turboélice Saab com 34 lugares partindo de Glasgow. Eu fiz isso muitas vezes antes de minha estada em Islay. Mas, para apreciar inteiramente essas bebidas finas, você precisa respirar o ar marinho, mirar um reluzente forno de turfa e deixar os sons da ilha, o vento, as ondas, as vozes, encobrirem você. A primeira vez que vim a Islay foi em 4 de julho de 2005. Lembro-me claramente da data porque alguns dias depois eu telefonei desesperadamente para meus amigos em Londres, PLANT PROJECT Nº 2

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W Destinos

campos produzindo malte com o tempero da maresia

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depois de ver notícias do atentado de 7 de julho na televisão no café do aeroporto de Islay. Era um lindo dia. O mar brilhava sob a luz do sol e o céu azul era imenso. Ainda sentia meus amigos bem próximos – muitos deles me visitaram naquele verão em Islay – e todos os meus sentimentos estavam com os londrinos. Mas Londres, em si, embora eu estivesse vivendo lá

menos de uma semana antes, parecia muito distante – um borrão urbano irrelevante. Eu já sabia que nunca mais voltaria. Quando não estava trabalhando no albergue naquele verão, eu explorava Islay. Caminhava além de Bunnahabhain até o farol de Rhuvaal e nas incríveis areias cor de creme de Bagh an Da Dhorius (baía de duas portas). Seguia a trilha costeira até a belíssima cabana de pedras em An Cladach on the Sound of Islay, nadava na baía e tomava chá vendo o pôr do sol atrás do Paps de Jura. Visitei Jura também, um lugar bem mais selvagem que Islay, com apenas 200 habitantes, 6 mil veados e um magnífico interior de pântano e costa coroada pelos três montes de quartzito do Paps de Jura. Dirigi minha Mercedes em uma das estradas de Jura até Road End, com o escapamento soprando pesado na superfície deteriorada da estrada. Então atravessei o pântano até a inabitada costa oeste com suas reluzentes baías, praias elevadas e acidentado litoral. Quando meu chefe de Londres me visitou, ele corajosamente atravessou campos enlameados de vacas na chuva para ver as luzes brincarem nas ondas quebrando na Baía de Lossit. À noite, ele me levou para jantar no Port Charlotte Hotel e ficou surpreso que era tão


bom – talvez melhor que um restaurante londrino. No caminho, fui provando os diferentes maltes puros de Islay e fiquei maravilhada com como refletem as qualidades sensoriais da paisagem: brilhos do sol na água; o doce aroma medicinal de murta do pântano; o toque salgado da brisa do mar. Havia mais alguma coisa de que eu gostava. Ao mesmo tempo em que fugi do ritmo insano de Londres, vim para o norte para me afastar de um relacionamento condenado com um alcoólico incorrigível. Uma ilha com oito destilarias poderia parecer um lugar estranho para fazer isso. Mas descobri que beber grandes goles de um complexo puro malte de Islay é o oposto de se embriagar. Essas são bebidas em que é necessário apenas saborear um ou dois goles e deixar o resto para a próxima vez. Não sou de Islay – na verdade, sou de East Kilbride –, mas Islay e suas incríveis

bebidas me trouxeram para casa. É um lugar encantador, com praias de areia prateada, esvoaçantes luzes do oeste e um céu enorme. E os uísques, que variam de leves e florais a fenólicos e oleosos, são imbatíveis. São feitos com muito cuidado e habilidade por pessoas que carregam seus conhecimentos e capacidades com muita naturalidade. Em 1990, em The Other British Isles, Christopher Somerville escreveu: "As destilarias de malte de Islay estiveram em baixa desde a década de 1960”. Felizmente, esses dias já eram. As destilarias de Islay, colocadas contra as cores em constante mudança do oceano, agora prosperam, ajudando essa mágica ilha, que está gravada em cada molécula, a prosperar também.

Barris cobertos de neve na Baía de Lagavulin: em cada ponto da ilha, uma característica única

Texto originalmente publicado no The Herald, Scotland. O livro Whisky Island, de Fiona Rintoul e Konrad Borkowski, foi publicado em outubro pela Freight Books. O preço original é £20. PLANT PROJECT Nº 2

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Wg Gastronomia A Perfil

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O CAPITÃO DA LAGOSTA Conheça Manoel Vidal Filho, o carioca que comanda as exportações brasileiras do crustáceo Foto de Claudio Gatti Agradecimento: Restaurante Rufino’s SP

A

ntes de convidar o economista carioca Manoel Vidal Filho para jantar, certifique-se de ser rigoroso na escolha do restaurante. Se o cardápio for frutos do mar – mais especificamente lagosta –, convém consultá-lo antes. Nesse tema, Vidal é exigente. Mais que isso, é um especialista, talvez a maior autoridade brasileira sobre a qualidade dos crustáceos. Trabalhando com eles há mais de 30 anos, hoje Vidal capitaneia a abertura de portas para as lagostas brasileiras, enfrentando a concorrência de países com tradição em colocar seus produtos nas cozinhas dos principais chefs do mundo, como Canadá, Austrália e Estados Unidos. “Já participei da Boston Seafood Show (EUA) umas 15 vezes e posso dizer que nossa lagosta tem qualidade superior e pode conquistar qualquer mercado”, afirma.

Não há mares que detenham Vidal. O mercado americano é seu foco principal para a venda de cauda de lagostas. Para Ásia (Japão, Taiwan, Singapura e Vietnã) e Europa (França e Espanha), ele envia lagostas inteiras, cruas ou cozidas. Somente em 2016 suas vendas incluíram dois contêineres de 18 toneladas com caudas de lagosta, inclusive para um de seus maiores concorrentes, a Austrália. “Eles sempre foram grandes produtores e ainda são, mas com o maior controle do governo na preservação da espécie, diminuíram as cotas de pesca”, explica Vidal. “Além disso, como a lagosta australiana é tida como a de melhor qualidade, seu preço de exportação gira em torno de US$ 100 por quilo para os mercados asiáticos. Eles exportam muito e importam do Brasil a um terço desse valor para suprir o mercado interno.”

Vidal no restaurante Rufino’s, em São Paulo: “Lagosta brasileira tem qualidade superior e pode conquistar qualquer mercado”

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W Gastronomia

O capitão da lagosta aproveita a oportunidade, mas não se coloca em posição de inferioridade. “Nossa qualidade é tão boa quanto a deles, até melhor”, diz. Vidal costuma acompanhar de perto a produção, com constantes visitas ao Ceará, onde estão as empresas que respondem por 70% dos animais vendidos por aqui, sobretudo para clientes externos. Menos de 10% das 1,7 mil toneladas pescadas em mares brasileiros acabam em nossas mesas. “O custo é muito alto, principalmente quando comparado com o de outro crustáceo que caiu no gosto dos brasileiros, o camarão”, analisa Vidal. Não é raro vê-lo circulando pelas plantas de processamento de empresas como a Netumar ou a Compex, esta uma das principais produtoras de lagostas para exportação. “Em termos de tecnologia de processamento, ela está uns oito anos na frente de seus competidores”, diz. A preocupação com o produto se inicia, segundo o economista, com a pesca da lagosta cumprindo todas as 82

normas exigidas pelo Ministério da Agricultura, como as licenças de captura que são exigidas das embarcações de pesca. A lagosta chega viva ao frigorífico. Frágil, exige um grande cuidado no transporte vindo da praia. Imediatamente após a sua chegada, ela é inspecionada e classificada conforme tamanho e gramatura. As melhores são destinadas à exportação. Uma vez selecionadas, são congeladas a uma temperatura de – 40 graus Celsius, embaladas uma a uma em sacos plásticos e colocadas nas caixas que serão embarcadas para seus clientes no exterior. “A cada safra, que vai de 1º de junho a 30 de novembro, a Compex tem conseguido aprimorar a qualidade do seu produto, melhorando a sua imagem no exterior. Hoje, é uma marca de grande procura, principalmente na Ásia e Europa, onde os consumidores são mais exigentes.” A lagosta é o principal item da pauta brasileira de exportação de pescados. No ano passado, as vendas do crustáceo renderam ao Brasil o valor de


US$ 66 milhões. Além do Ceará, há exportadores instalados nos estados do Rio Grande do Norte, Pernambuco e Bahia. Embora tenha conquistado espaço no mercado externo, a produção brasileira de lagostas tem caído nos últimos anos. Para Vidal, questões climáticas são parte da explicação para essa queda. “A falta de chuvas faz com que ocorra o aumento da salinidade no seu hábitat. Então, elas migram para outras áreas. Além disso, a falta de fiscalização pelo governo também é um fator importante, pois muitos pescadores não respeitam o período de defeso, que vai de dezembro a maio, e pescam predatoriamente. Mesmo que as empresas de pesca não recebam esses produtos, eles são colocados irregularmente no mercado nacional.” A comercialização ilegal e problemas com a conservação são também pontos que fazem Vidal ser tão seletivo na escolha dos restaurantes brasileiros onde comer lagosta. Eloquente e agradável, ele pode falar com propriedade também sobre camarões, lagostins, pargos, peixes-sapo, ovas de ouriço e de peixe-voador. Todos já estiveram no cardápio de exportações feitas por ele, profundo conhecedor do mercado exterior e dos mercados asiáticos. Ele atuou na área de exportação de pescados para a japonesa Mitsui & Co. antes de ser representante

no Brasil para uma das maiores empresas americanas do setor de carne, a ConAgra, que possui também investimentos relevantes na área de peixes e frutos do mar, com a marca Bubba Gump, reconhecida pela associação com o filme Forrest Gump, sucesso estrelado pelo ator Tom Hanks. Atualmente, através de sua empresa Meremit, representa a D. Collova & AS, empresa australiana que distribui lagosta nos principais mercados asiáticos. E mantém seus laços com o Japão, país em que já esteve mais de 30 vezes. Além de pescados, negocia bunker, combustível para navios de armadores japoneses, fazendo a intermediação entre a Mitsui e a Petrobras. Mesmo quando está longe da lagosta, o capitão está perto do mar. LFS

Pescador com crustáceos no Ceará: maior exportador brasileiro, estado tem as principais empresas, que respondem por 70% da produção nacional

O MAR ESTÁ PARA LAGOSTAS Produção brasileira do crustáceo (em toneladas)

2013 .................................................................. 2.300 2014 ................................................................... 1.950 2015 ................................................................... 1.650 2016 ................................................................... 1.700 (expectativa)

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fotos: divulgação

W Agroindústria

Ovelhas pastam em meio às oliveiras da fazenda Batalha: combinação saborosa que garante limpeza e adubação natural nos pomares

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OS OLIVAIS DO SUL Depois de ganhar fama mundial por seus espumantes, o Rio Grande do Sul investe na produção de azeites de qualidade ao sul do paralelo 30 Por Irineu Guarnier FilHo, de Porto Alegre

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paisagem tem mudado nos últimos anos na metade meridional do Rio Grande do Sul. Os campos suavemente ondulados, tradicionalmente ocupados por rebanhos bovinos, por plantações de arroz, de soja e, ultimamente, também por vinhedos, agora acolhem fileiras de árvores de pequeno porte, milimetricamente alinhadas. Elas começaram a surgir no início da atual década, indicando a chegada de uma nova e promissora atividade agrícola que, aos poucos, vai se incorporando ao Pampa gaúcho: a olivicultura. A produção de azeitonas para a elaboração de azeite atrai principalmente empreendedores rurais em busca de alternativas de cultivo para o tradicional binômio lavoura-pecuária – penalizado nos últimos anos pela estagnação nos preços do arroz e da arroba do boi. “A olivicultura está em forte expansão. Nos últimos anos, várias indústrias foram instaladas na Metade Sul do estado, PLANT PROJECT Nº 2

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Oliveiras ganham destaque na paisagem do Pampa Gaúcho: marcas da região já aparecem entre os melhores azeites do mundo

produzindo azeites de qualidade reconhecida em concursos internacionais”, afirma Odacir Klein, presidente do Banco Regional de Desenvolvimento do Extremo Sul (BRDE), um dos principais financiadores desse movimento. Atualmente, 150 produtores gaúchos cultivam cerca de 2 mil hectares de oliveiras, segundo a Câmara Setorial da Olivicultura, do governo gaúcho, que lançou, em julho deste ano, o Programa Estadual de Desenvolvimento da Olivicultura (Pró-Oliva). Os olivais – a maior parte ainda em fase de desenvolvimento – estão presentes em quase 50 municípios gaúchos, com destaque para Caçapava do Sul, Pinheiro Machado, Cachoeira do Sul, Santana do Livramento, Dom Pedrito, Candiota, Bagé, Encruzilhada do Sul, São Sepé e Barra do Ribeiro – vários deles localizados entre os paralelos 30 e 45, faixa onde vicejam os melhores pomares da olivicultura mundial. “Temos aqui um pouco de Itália, de Espanha, de cada país que é tradicional produtor de azeites”, afirma Luiz Eduardo Batalha, dono do grupo Chalet, o homem que trouxe a marca Burger King para o Brasil e que já plantou mais de 86

100 mil oliveiras em uma área de 300 hectares no município de Pinheiro Machado. Sua marca, a Azeite Batalha, é uma das pontas de lança para o azeite gaúcho ganhar mercado Brasil afora. Com investimentos como esse, o Rio Grande do Sul já é o principal produtor de azeitonas e azeite do País, à frente inclusive de Minas Gerais. A atividade cresce 20% ao ano, e a meta é atingir a produção de 1 milhão de litros de azeite em cinco anos. Os pomares com mais de seis anos de implantação fornecem frutos considerados de ótima qualidade para a extração de azeite extra virgem (sumo da primeira prensagem a frio) em oito agroindústrias em operação no estado, que trabalham em regime de parceria com os agricultores. As 13 marcas de óleo de oliva comercializadas atualmente destacam em seus produtos qualidades muito apreciadas pelos especialistas: acidez inferior a 8%, frescor, aroma de capim cortado, sabor frutado e, principalmente, a sua pureza. “Quem experimenta pela primeira vez o óleo fresco e puro aqui do Sul fica em dúvida: mas, afinal, azeite é isso ou é ‘aqui-

lo’ que eu consumia até hoje? A baixa acidez, o aroma de mato e o sabor picante são incomparáveis”, resume o coordenador da Câmara Setorial da Olivicultura, Paulo Lipp João. O azeite é um dos alimentos mais falsificados no mundo. Também é um produto que, sabidamente, não viaja bem. É sensível às sacolejantes viagens marítimas, à luz e ao calor. Oxida e perde boa parte de suas delicadas qualidades organolépticas quando permanece, por exemplo, por longo tempo em contêineres estacionados nos portos. Assim, azeites extra virgens 100% integrais, frescos, saborosos e elaborados próximo dos centros de consumo, como o gaúcho, podem contar com a preferência de chefs de cozinha e consumidores mais exigentes – mesmo que custem um pouco mais do que o óleo-commodity por causa da (ainda) pequena escala de produção. Tal como aconteceu com o espumante nacional, degustado hoje com orgulho pelos brasileiros que até alguns anos atrás só bebiam cavas ou champanhes (nem sempre de primeira linha), o azeite pode seguir pelo mesmo caminho, acreditam os fabrican-


Agroindústria

tes. Do ponto de vista ambiental, argumentam eles, também é mais "sustentável" temperar um prato com um produto que consome menos combustíveis fósseis em seu transporte. Como o Brasil produz apenas 0,5% das 50 mil toneladas de azeite que importa principalmente da Espanha, de Portugal e da Itália, mas também dos vizinhos Chile, Uruguai e Argentina, a produção gaúcha tem diante de si um atraente mercado potencial – sobretudo porque o consumo per capita brasileiro, de apenas 250 ml por ano, é ínfimo se comparado ao grego (26 litros), italiano (15 litros) e norte-americanos (12 litros). Mas está em alta. Nos últimos dez anos, as vendas tiveram crescimento de mais de 230%, colocando o Brasil entre os principais importadores mundiais de azeitonas e de azeite. Atentos a isso, governantes e empresários vêm, desde o início do milênio, tentando converter a olivicultura em uma alternativa rentável no mapa do agronegócio gaúcho (isso depois de várias tentativas frustradas nas décadas de 1940, 1950 e 1960). Em 2002, um grupo de produtores procurou o Governo para propor o resgate da cultura. Três anos depois, foram liberados R$ 300 mil para a importação de mudas da Espanha. O “pacote tecnológico” espanhol, no entanto, não obteve sucesso, segundo Lipp. O clima gaúcho, mais chuvoso que o da Espanha, atrapalhou. “A oli-

veira é um cacto disfarçado de árvore”, brinca Lipp. Mas a partir de 2008, com a criação de um grupo técnico formado por pesquisadores e extensionistas da Embrapa e da Emater, a atividade finalmente deslanchou. Variedades como Arbequina, Arbosana, Koroneiki e Picual, cultivadas corretamente, demonstraram boa adaptação às condições de solo e clima locais. E já em 2012 a Câmara da Olivicultura promoveu a primeira Abertura Oficial da Colheita da Oliva – evento incorporado depois ao calendário agrícola do estado. IDENTIDADE GAÚCHA Um dos pioneiros nesta fase bem-sucedida da olivicultura gaúcha, o ex-engenheiro elétrico José Alberto Aued resolveu apostar na atividade depois de aposentado, por sugestão do filho Daniel, que voltou de uma viagem à Turquia empolgado com a cultura da oliva. Aued – que chegou a acalentar o desejo de fazer vinhos – adquiriu uma área de 12 hectares na localidade de Altos dos Casemiros, em Cachoeira do Sul, e nela cultivou, em 2006, os primeiros pés de Arbequina, Arbosana e Koroneiki importados da Espanha, convencido de que teria de esperar sete ou oito anos pelos primeiros frutos. Bem antes do tempo previsto, no entanto, com apenas três anos e meio de idade, os pomares começaram a frutificar. Antes disso, porém, Aued

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se cercou da melhor literatura sobre olivicultura existente no mundo – e de orientação agronômica da Universidade Federal do Rio Grande do Sul (UFRGS). Em 2010, já com uma máquina italiana de extração instalada na propriedade, houve a primeira colheita comercial. A boa produtividade e a qualidade dos primeiros 800 litros de azeite – comercializados em apenas dois meses na pequena Cachoeira do Sul – foram tão estimulantes que a família Aued decidiu investir ainda mais no negócio. Logo, mais 13 hectares seriam incorporados à propriedade. Hoje, além dos 25 hectares em Cachoeira do Sul, a família também cultiva oliveiras em outros 90 hectares, no município de Encruzilhada do Sul. “Nossa expectativa é chegar a um total de 175 hectares com oliveiras nos dois municípios, porque o reconhecimento à qualidade do azeite que produzimos avança numa velocidade muito maior do que a esperada”, comemora o engenheiro civil Daniel Ceolin Aued, filho de José Alberto.

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José Alberto Aued, da Olivas do Sul (no alto), e Luiz Eduardo Batalha, do grupo Chalet: criando valor agregado e empregos com a indústria do azeite

Reconhecimento internacional, inclusive. Desde 2011, o azeite Olivas do Sul figura ao lado de mais de 700 marcas de alta gama do mundo inteiro no respeitado guia italiano Flos Olei. Para Daniel Aued, a tendência de valorização de produtos nobres da gastronomia – vinhos, queijos, cafés etc. – que se consolida no País deve fazer com que os consumidores valorizem cada vez mais alimentos puros, frescos, regionais, que harmonizam melhor com os pratos locais. “Não imagino um prato típico da culinária rio-grandense que não seja elaborado hoje em dia com um azeite gaúcho. A identidade local é muito importante.” ATRAÇÃO TURÍSTICA Na região central do Rio Grande do Sul, portal do Pampa, o município de São Sepé, tradicional produtor de soja, arroz e carne bovina, começa a despertar para a olivicultura. Região árida, com verões quentes e solos pedregosos, os campos locais têm se revelado apropriados à 88

nova cultura. Atualmente, cerca de 100 hectares já estão cultivados com oliveiras. O prefeito, Leocarlos Gazzoni Girardello, resume em duas frases curtas o impacto da chegada da olivicultura ao município: “Foi um choque. Lindo de se ver”. Hoje, cerca de dez produtores já se dedicam à produção de azeitonas, que são convertidas em azeite no vizinho município de Caçapava do Sul, e a tendência, segundo a prefeitura, é de expansão da área ocupada pelos olivais – que começa a disputar espaço com vinhedos implantados também nos últimos anos. São Sepé já tem a sua Festa da Uva, no final de janeiro, e pleiteia, para o ano que vem, sediar a Abertura Oficial da Colheita da Oliva. “Azeite não gosta de passear. O nosso óleo, produzido e consumido por perto, é muito melhor”, conclui Girardello. Em Pinheiro Machado, mais ao Sul, o olival de Batalha, um dos maiores do estado, se espalha desde 2010 e continua a aumentar. Nas áreas em que as árvores estão mais altas, ele experimenta uma integração com outro projeto de muitos anos, a criação de ovinos para corte. Os resultados têm sido excelentes. “Além de ajudarem na limpeza do terreno pastando entre as oliveiras, as ovelhas fertilizam o solo com suas fezes”, explica Batalha.

O clima temperado favoreceu o rápido crescimento das plantas e, já na segunda safra comercial, colhida neste ano, foram elaborados 10 mil litros de azeite, que são comercializados em grandes redes de supermercados no Rio Grande do Sul e em São Paulo. O gerente comercial da empresa, Rossano Lazzarotto, confia no potencial do mercado interno para o azeite brasileiro, uma vez que a maior parte do óleo importado é “produto de combate”, de menor qualidade, segundo ele. Um azeite importado de alta qualidade pode custar R$ 100 (garrafa de 500 ml); o da marca Batalha, do mesmo nível, é comercializado na faixa entre R$ 40 e R$ 50, compara. A olivicultura é uma atividade tão fascinante quanto a vitivinicultura para quem cozinha profissionalmente ou simplesmente gosta de comer bem. Tanto que, somente neste ano, os olivais da família Batalha receberam cerca de 400 visitantes, divididos em dez grupos, para almoços regados com os bons vinhos da região em que degustam o azeite do Pampa acompanhado de outra iguaria local – a carne de cordeiro. “Nem estamos abertos à visitação, mas mesmo assim já estamos virando uma atração turística”, comemora Lazzarotto.


O empresário Ricardo Brennand em visita ao museu que construiu no Recife Uma coleção de valor inestimável de obras de arte, armas, mobiliário e objetos adquiridos ao longo de 40 anos

Ar ARTE

Um campo para o melhor da cultura

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Ar A RTE

Um campo para o melhor da cultura

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FÁBRICA DE AMOR À ARTE Próximo de completar 90 anos, o colecionador pernambucano Ricardo Brennand revela histórias do acervo que reuniu e da própria vida Por Flora Guedes | Fotos Alcione Ferreira, do Recife

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ngenho de Açúcar é uma tela a óleo de Frans Post. Este retrato da vida pernambucana, pintado no século XVII após a expedição da comitiva de Mauricio de Nassau pelo Brasil, é uma das joias do acervo do Instituto Ricardo Brennand (IRB). A negociação que transferiu a obra ao museu do Recife, em Pernambuco, durou oito meses e foi feita na Holanda. “Comprei da família que é dona das casas C&A os dois maiores quadros de Post da nossa coleção”, recorda o engenheiro, empresário e colecionador pernambucano Ricardo Brennand, referindo-se também a Família de Senhores Rurais. Prestes a completar 90 anos, em 27 de maio, Brennand mantém o entusiasmo e o olhar atento de investidor diante de uma obra de arte. Percorrer com ele a Pinacoteca do IRB – complexo digno da realeza erguido no bairro simples da Várzea, zona Oeste do Recife --, além de rara oportunidade, é uma viagem pelas entrelinhas do rico acervo do lugar. Isso porque Brennand justifica a existência de cada obra no instituto com história.

Sem citar os investimentos feitos, ele lembra das negociações para aquisição de várias peças e coleções, ao longo de mais de 40 anos, em viagens a todos os continentes. “Quase que por acaso eu cheguei a reunir a maior coleção particular do mundo do holandês Frans Post. Comprei várias coleções, entre elas veio uma série de quadros do artista”, conta Ricardo Brennand, que, durante a entrevista, se deliciou com gomos de jaca dura levados pelo genro, o empresário Jorge Petribu – e fez questão de compartilhar a fruta com a jornalista e a fotógrafa. Existem atualmente cerca de 160 quadros de Post com paisagens da região Nordeste e, segundo Brennand, alguns cenários retratavam a própria região da Várzea, que era um antigo engenho. “Desta produção de Post, 100 telas estão em vários museus no mundo e 60 pertencem a coleções particulares, das quais 20 temos aqui. Acredito que seja um percentual apreciável”, argumenta o empresário, que, certa vez, para adquirir dois quadros de Post, foi "obrigado" a

Brennand e seu legado: “Acho que cheguei ao meu limite. O Instituto está completo agora”

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O colecionador e duas de suas obras favoritas: as peças de marfim que representam deuses chineses e a tela Engenho de Açúcar, do holandês Frans Post

comprar uma coleção inteira, com 98 telas, no Rio de Janeiro. “Hoje, o Instituto não tem condições de comprar um Frans Post pela valorização que houve das obras dele no mercado. E eu mesmo ajudei a inflacionar, pois pagava sempre a mais do que a obra custava para fechar o negócio”, informa Brennand. O IRB foi inaugurado no ano de 2002, numa área de 256 mil metros quadrados, onde foram construídos uma galeria, o Castelo de São João, uma biblioteca, o Parque das Esculturas, além da Pinacoteca. A Capela Nossa Senhora das Graças foi o último edifício construído no complexo cultural, em 2014, uma homenagem à esposa de Brennand, 92

Graça Maria Monteiro. Todo primeiro e terceiro domingo do mês, são celebradas missas no local, sempre abertas à participação da comunidade. “Essa obra (o Instituto) não custou pouco. Ela representa muitos anos da minha vida, que tornaram possível recolher essas peças maravilhosas no mundo inteiro”, explica Ricardo Brennand. “A igreja foi a última obra que fiz no Instituto, com muito carinho e capricho. Ao fazer as coisas, tenho sempre em mente fazer da melhor forma possível. Mas agora acho que cheguei ao meu limite, eu não posso pensar em ampliar mais isso aqui. O Instituto está completo agora”, disse.

MELHOR MUSEU DA AMÉRICA O SUL Uma vez a cada mês a entrada é gratuita no IRB, que mantém três exposições permanentes na Pinacoteca, enquanto a galeria recebe mostras temporárias. Dois quadros do artista italiano Canaletto são as obras mais caras de todo o acervo, cada uma está avaliada em US$ 17 milhões. Além de Canaletto, outras obras preferidas por Ricardo Brennand, dentre as mais de oito mil peças – datadas do século II até os dias atuais - são a escultura em mármore A Mulher Reclinada na Rede, de António Frilé, além de duas peças em marfim que retratam os deuses chineses, numa espécie de “filigrana inconcebível”. O curioso do IRB, hoje o museu mais visitado no Norte e Nordeste, é que o acervo conta também com peças de mobiliário, artes decorativas e tapeçaria, como dois valiosos tapetes gobelin do século que foram adquiridos por Brennand do embaixador e banqueiro Walther Moreira Salles, em Petrópolis, no Rio de Janeiro. Do


Exposição

Ar

Mulher no Cavalo, do colombiano Fernando Botero, e a escultura Mulher Reclinada na Rede

mínimo ao gigante, o visitante percebe que tudo no Instituto tem muito valor e uma história para contar. As peças de arte decorativa e de mobiliário foram garimpadas por Brennand, muitas vezes, com o objetivo de compor um cenário, dar suporte a outra obra, ou para encaixar milimetricamente numa parede. A sensação é que toda disposição espacial do museu está claramente desenhada na sua cabeça, assim como todas as obras devem estar catalogadas. Dois portais, um entalhado em madeira e outro feito todo em uma única peça de bronze, valorizam ainda mais os ambientes internos dos edifícios da Pinacoteca e do Castelo de São João. “Calculei de olho que o portal daria aqui e não é que encaixou perfeitamente”, se orgulha o empresário. O IRB encanta também do lado de fora. O cenário bucólico

da propriedade, na Várzea, se harmoniza com a proposta do complexo cultural. No jardim da Pinacoteca, há dezenas de esculturas como a réplica de David, de Michelangelo, feita pelo estúdio Cervietti Franco e que utilizou o mesmo mármore da pedreira original, em Pietrasanta, na Itália. Mas nada chama mais a atenção do que a imponente escultura do artista colombiano Fernando Botero Mulher no Cavalo. A obra está exposta com um conjunto de peças similares, em bronze patinado, produzidas pela artista gaúcha Sonia Ebling e que retratam animais como rinocerontes e pássaros. “Não é fácil dizer quando despertou em mim o desejo de colecionar. Sei que um belo dia, passei a adquirir muitas coleções e quando já não tinha mais onde guardar em casa, senti a necessidade de encontrar um lugar próprio para abrigar mi-

Na ala conhecida como Castelo de São João, ficam em exposição mais de seis mil armas, 50 armaduras de cavaleiros e outros objetos da Idade Média

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Coleção de armas brancas é considerada a maior do mundo. “Para mim é a parte mais bonita do Instituto”, diz

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nhas armas brancas e obras de arte”, explica Ricardo Brennand, revelando o que o motivou a construir o Castelo de São João, onde ficam em exposição mais de seis mil armas, 50 armaduras de cavaleiros e outros objetos da Idade Média. Uns dos xodós de Brennand são as espadas folheadas a ouro e com pedras preciosas incrustadas que pertenceram ao rei Faruk I, o último rei do Egito. “A minha coleção de armas supera tudo, para mim é a parte mais bonita do Instituto”, pontua. A paixão por armas brancas e por coisas antigas começou ainda na infância, incentivado pelo tio Ricardo Brennand, a quem o empresário fez uma homenagem batizando o nome do instituto. Foi do pai, Antônio Luiz Brennand, que ele ganhou o primeiro canivete. O acervo do IRB ainda conta com mais de 60 mil títulos da biblioteca, entre livros, partituras, discos, documentos, mapas e folhetos do Brasil Holandês. Por dois anos consecutivos, 2014 e 2015, o Instituto foi eleito o melhor museu da América do Sul pelo Traveller’s Choice

Museums, doTripAdvisor, visto como maior site de viagens do mundo. Preocupado com a existência do IRB no futuro, Brennand tomou providências para garantir o acesso a esse patrimônio cultural pelas próximas gerações. “Nos prevenimos, com todos os instrumentos necessários, para dar continuidade à existência do Instituto. A minha família já não tem mais ingerência sobre o IRB, por essa já ser uma atividade pública. Tem dias que recebemos mais de mil visitantes aqui”, comemora Ricardo Brennand. "UM HOMEM DE FÁBRICAS" O Engenho de Açúcar de Post retrata um momento da história de Pernambuco e, de certa forma, da origem dos recursos que financiaram o sonho de Brennand. Assim como outras famílias pernambucanas, os Brennand também construíram seu império a partir da cana de açúcar. Ele inclusive nasceu numa usina, a Santo Inácio, no município do Cabo de Santo Agostinho, na Região Metropolitana do Recife. A família foi também


Entrada do Instituto, com o jardim de esculturas: réplica do David, de Michelangelo, é feita com mármore da mesma jazida da original

proprietária da Usina São João (de 1892), no bairro da Várzea, nas mesmas terras onde está sediado o IRB. “Eu nasci, cresci e trabalhei durante muito tempo da minha vida na usina. Fazia de tudo, no campo ou na indústria. Eu saí do ramo quando meu filho (Antonio) faleceu, fiquei desgostoso e depreciei o negócio”, conta ele, que teve oito filhos, 20 netos e 30 bisnetos. A partir daí, Ricardo Brennand passou a se dedicar às fábricas do ramo industrial da família: vidro, porcelana, azulejo, aço e cimento.

“Eu sou um homem de fábricas. Toda minha existência foi ligada a fábricas. A minha formação veio do meu pai, que era um industrial obcecado pelo que fazia. Ainda meninote construí a Cerâmica São João, logo que saí de Santo Inácio. Depois, fui à Alemanha, onde comprei os equipamentos para montar uma fábrica de azulejos aqui. Nos associamos à Nadir Figueiredo, do Sul do país, e fizemos a fábrica de vidros no Recife, uma das mais bonitas, com quatro chaminés bem altas (80 metros de altura)”, resgata. “Sempre que

eu digo que eu fiz, eu me refiro a mim e a meu primo Cornélio, porque sempre trabalhamos juntos”, acrescenta Brennand. O empresário contabiliza a construção de 20 fábricas, além de 17 usinas hidrelétricas de pequeno porte, em vários estados do Brasil. As fábricas mais recentes são duas de cimento, uma na cidade de Sete Lagoas, em Minas Gerais, e outra em Pitimbu, na divisa de Pernambuco com a Paraíba. Sua obra mais perene, no entanto, é uma usina de amor à arte: o Instituto Ricardo Brennand.

A Capela Nossa Senhora das Graças foi o último edifício construído no complexo: uma homenagem à esposa de Brennand, Graça Maria Monteiro

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Imagem aÉrea feita pela Nasa de lavoura no Kansas Tecnologia hoje permite que propriedades de diferentes portes tenham acesso a sofisticados sistemas de monitoramento por satélites

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As inovações para o futuro da produção

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CONECTADOS COM A INOVAÇÃO

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As inovações para o futuro da produção

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tecnologia digital tem transformado radicalmente uma série de setores da economia. O primeiro a sentir o impacto profundo da era marcada pela internet foi o fonográfico, no início da década de 2000. Desde então, mercados como o de varejo, livros, mídia, saúde, educação e, mais recentemente, o financeiro – com as fintechs – viram sua atividade passar por mudanças importantes. Agora é a vez da agricultura. Diferentemente de outras áreas, no entanto, não há motivos para temer ameaças ao modelo de negócios. Pelo contrário: para o campo, a revolução digital significa grandes oportunidades, como a melhoria da produtividade, gestão, sustentabilidade, eficiência e, em última instância, a possibilidade de dar conta do desafio de alimentar a população mundial, que deve chegar a 9 bilhões de pessoas em 2050. É nesse contexto que deve ser analisado o chamado setor AgTech, de tecnologia para o agronegócio. Ainda em formação, esse mercado começa a ganhar força no Brasil e no mundo. Mas, para que se fortaleça e cresça mais rapidamente, é importante conectar os diferentes agentes que atuam na

Evento #STARTAGRO1 reúne produtores, empreendedores, investidores e academia no primeiro grande debate sobre o movimento AgTech no Brasil Por Clayton Melo | Fotos Claudio Gatti

área, como produtores, empreendedores, academia, investidores e grandes, médias e pequenas empresas do agronegócio. É justamente com esse objetivo que chegou ao mercado a StartAgro, plataforma pioneira de networking, informação e eventos AgTech no Brasil. Um passo importante nessa missão foi dado com a realização do #STARTAGRO1, primeiro evento de empreendedorismo AgTech do País, realizado no dia 18 de novembro de 2016, no Campus São Paulo – Espaço Google, na capital paulista. A Startup Farm, aceleradora residente e oficial do Campus, e Rodrigo Iafelice dos Santos, sócio da Ennexas, foram parceiros na realização da iniciativa, que também contou com o apoio de instituições como a Esalq, a incubadora EsalqTec, AgTech Valley, ABStartups, AgriHub e a consultoria agrícola Datagro. A busca por conectar o ecossistema de inovação na agricultura já começa a se desdobrar em outras iniciativas, como a curadoria de projetos para players relevantes do mercado, como foi o Summit Agronegócio, evento internacional realizado em PLANT PROJECT Nº 2

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novembro pelo jornal O Estado de S.Paulo. Curadora da iniciativa, a StartAgro elaborou painéis que abordaram temas como Big Data e as fazendas conectadas, o fenômeno das startups AgTech e a importância de um novo tipo de comunicação para o agronegócio, mais moderno e que estabeleça um diálogo com toda a sociedade. “A StartAgro é mais do que um veículo. É uma rede. É uma ponte que se propõe a ligar dois mundos pela informação”, afirma Luiz Fernando Sá, Diretor editorial da StartAgro e da PLANT PROJECT. “É um ambiente colaborativo de negócios, reunindo experts em várias áreas, da produção de conteúdos ao marketing, da realização de eventos ao desenvolvimento de projetos multimídia”, afirma. 100

A conexão e o intercâmbio de experiências são benefícios esperados pelos profissionais da área. “Eventos com o #STARTAGRO ajudam a organizar o mercado”, afirma Antonio Morelli, CEO da Agronow, uma das startups mais bem-sucedidas do agronegócio brasileiro. “O que precisa ser feito é o que a StartAgro e o AgriHub estão fazendo. São iniciativas que traduzem o mundo high-tech para o mercado agro”, diz Alexandre “Bio” Veiga, fundador da AgVali, um marketplace para produtos agrícolas. O AgriHub é um polo de incentivo à inovação lançado no ano passado no Mato Grosso que pretende reunir produtores e startups da agropecuária. Liderado por três importantes entidades ligadas ao agronegócio no estado - a Federação da Agricultura e Pecuária do Estado do Mato Grosso (Famato), o Serviço Nacional de Aprendizagem Rural (Senar-MT) e o Instituto Mato-Grossense de Economia Agropecuária (Imea) -, o AgriHub foi um dos apoiadores institucionais do #STARTAGRO1.

“Ainda sinto um pouco a falta do desenvolvimento de tecnologias específicas para o agronegócio brasileiro”, afirma o coach Silvio Celestino, sócio da Alliance Coaching, empresa especializada em coaching e desenvolvimento de líderes empresariais. Responsável pela formação de lideranças em grandes companhias como Grupo Votorantim, AgênciaClick Isobar, Grupo Newcomm e Ajinomoto, Celestino sintetiza, em poucas palavras, o que deve guiar as ações daqueles que desenvolvem tecnologias para a agricultura. “A partir do momento em que o empreendedor tiver essa preocupação, de ir ao campo fisicamente e ver qual é a necessidade, ele terá mais chances de desenvolver um produto ou serviço que seja de fato necessário e que resolva um problema do produtor rural”, diz o coach, que também atende a empresas do agronegócio e acompanhou os debates no #STARTAGRO1. Confira nas próximas páginas como foram os painéis do evento.


Luiz Fernando Sá, diretor editorial da Plant ProJect e da StartAgro, fez a aBertura do evento. “O objetivo aqui é criar um ambiente produtivo em torno das startups. Não será um evento único. Pretendemos rodar o Brasil mostrando cases e soluções.”

A aPresentaçÃo ficou soB resPonsaBilidade do Jornalista Clayton Melo, lÍder da Plataforma e curador da StartAgro.

AleXandre Borges, CEO da GrÃo Direto, mostrou o case de sua startuP, uma Plataforma digital que conecta Produtores de grÃos a comPradores. Fundada em 2016, a emPresa venceu o Demo Day do 15º Programa de AceleraçÃo da StartuP Farm, Parceira institucional do #STARTAGRO1.

AlÉm de deBatedor em um dos Paineis, Mateus Mondim, Presidente do conselHo consultivo da incuBadora EsalqTec, tamBÉm ParticiPou fazendo Perguntas da Plateia. E usou Para isso uma divertida invençÃo do Google: o MatcHBoX, um microfone HigH-tecH que vem envolvido numa almofada no formato de um quadrado.

“É fundamental consolidar o mercado AgTech no Brasil, e isso passa por conectar todos os participantes da cadeia.”

Daniel Consalter aPresentou a Fine Instrument TecHnology (FIT), uma emPresa de Pesquisa e inovaçÃo com sede em SÃo Carlos que desenvolve soluções utilizando Ressonância MagnÉtica Nuclear (RMN). Diretor de Pesquisa e desenvolvimento da startuP, ele destacou a forte atuaçÃo no agronegócio, com equiPamentos de BaiXo custo Para a análise do teor de óleo em alimentos.

A Plateia no CamPus SÃo Paulo – EsPaço Google era formada Por lÍderes de diferentes setores do mercado AgTecH, como grandes, mÉdios e Pequenos e Produtores rurais, emPreendedores, investidores e Pesquisadores. PLANT PROJECT Nº 2

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O NEGÓCIO É RESOLVER PROBLEMAS com a participação de: Alexandre “Bio” Veiga, Fundador da AgVali Antonio Morelli, CEO da Agronow HeYgler de Paula, COO do AgriHub Mateus Barros, Líder comercial da The Climate Corporation para a América do Sul Rui Prado, Presidente da Federação da Agricultura e Pecuária do Estado do Mato Grosso (Famato) e um dos idealizadores do AgriHub Moderador: Rodrigo Iafelice dos Santos, CEO da Ennexas

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Baseado no painel “AgTech, inovação e realidade: Como aproximar grandes ideias da real necessidade dos produtores”

O mercado de tecnologia para a agricultura vem ganhando espaço nos últimos anos, o que abre uma série de oportunidades para empreendedores e investidores, muitos dos quais oriundos não do agronegócio, mas de áreas tecnológicas. Um dos resultados disso, no entanto, é que nem sempre os produtos e serviços criados por startups atendem às necessidades dos produtores rurais. Assim, o nascente setor AgTech se vê diante de uma questão: como aproximar grandes ideias da real necessidade dos produtores? “Várias empresas de tecnologia estão chegando ao agronegócio, mas sem entender direito do assunto”, afirma Antonio Morelli, CEO da Agronow, uma platafor-

ma de monitoramento agrícola. “Muitas das soluções oferecidas são de laboratório, os desenvolvedores nunca ouviram o produtor rural. Converso com muito empreendedor que não sabe distinguir uma rúcula de uma couve.” O empreendedor Alexandre “Bio” Veiga sabe o quão difícil – e necessário – é fazer uma profunda imersão do universo da agricultura quando se decide por criar um negócio nessa área. Formado no mercado de internet, com experiência em fundação, gestão e investimentos em startups de base tecnológica, Veiga ingressou no agronegócio há cerca de dois anos. Ele visitou pelo menos dez estados em 2015, ano de fundação da AgVali, para conhecer a realidade dos agricultores. “Vi no agro uma oportunidade monumental”, diz. “O que fiz foi bater de porta em porta para conhecer.”


Como se trata de um setor recente, que traz ao agronegócio uma série de inovações, conectar e informar os diferentes elos da cadeia é algo fundamental para evitar descompassos. “O que precisa ser feito é o que a StartAgro e o AgriHub estão fazendo. São iniciativas que traduzem o mundo high-tech para o mercado agro”, afirma Veiga. POLO DE I N OVAÇÃO Lançado em outubro de 2016, o AgriHub é um polo de incentivo à inovação e ao empreendedorismo que pretende reunir produtores e startups e assim facilitar a busca de soluções para problemas reais da agropecuária no Mato Grosso. A iniciativa é liderada por três importantes entidades ligadas ao agronegócio no estado, maior produtor brasileiro de grãos e de proteína animal: a Federação da Agricultura e Pecuária do Estado do Mato Grosso (Famato), o Serviço Nacional de Aprendizagem Rural (Senar-MT) e o Instituto Mato-Grossense de Economia Agropecuária (Imea).

Um dos grandes diferenciais do AgriHub é a presença de produtores no mesmo ambiente de desenvolvimento das startups. “Precisamos de diversas soluções, comolevar a internet para o interior das fazendas”, afirma Rui Prado, presidente da Famato e produtor rural. “Com o AgriHub, queremos conectar os produtores com todas as novas tecnologias.” Fazer essa aproximação é uma maneira eficiente de minimizar os efeitos das diferenças culturais entre os produtores e os empreendedores. “Por isso, se você quiser empreender no agronegócio, fale com o produtor rural e pare de fazer um pitch que foi criado para o meio urbano”, diz Heygler de Paula, COO do AgriHub. Moderador do painel, Rodrigo Iafelice dos Santos, CEO da Ennexas, reforça o raciocínio. “A gente sempre teve a impressão de que o agricultor é muito conservador, mas não é isso. Se ele perceber benefício, ele gasta o dinheiro que for preciso naquela tecnologia, muito mais que qualquer industrial no Brasil”, diz Santos. “Hoje, os produtores rurais têm um nível de digitalização impressionante.”

Mateus Barros, líder comercial da The Climate Corporation para a América do Sul, concorda com Santos. Adquirida pela Monsanto por US$ 930 milhões, em 2013, a companhia está em fase de pré-lançamento no Brasil e tem rodado o País para mostrar suas soluções – a empresa já possui clientes no Mato Grosso, Bahia e Goiás. Nas andanças, Mateus e sua equipe constataram que não adianta oferecer a melhor tecnologia do mundo, seja ela qual for, se a empresa não for capaz de mostrar, na prática, o benefício que está entregando ao dono de uma propriedade rural. “Nossa experiência tem nos deixado muito impressionados com a vontade do produtor de adotar produtos que realmente solucionem problemas”, afirma o executivo. “Se a tecnologia representar um valor e ajudar na tomada de decisão, ele a aceita”, afirma Barros. PLANT PROJECT Nº 2

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TODOS POR UM com a participação de: Alain MaX Banfi CEO da TechLeap Maikon ScHiessl, Diretor do Comitê AgTech da ABStartups Mateus Mondin, Presidente do Conselho Deliberativo da EsalqTec Renato Roscoe, Secretário de Cultura, Turismo, Empreendedorismo e Inovação do Mato Grosso do Sul Moderador: Guilherme Nastari Diretor da Datagro

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Baseado no painel “O tripé da inovação – Como conectar de vez academia, capital privado e governo para transformar ideias brilhantes em negócios inovadores"

U m dos segredos da cultura inovadora dos EUA é a aproximação efetiva daquilo que se pode chamar de tripé da inovação: academia, capital privado e poder público. No mercado americano, não há obstáculos, por exemplo, para que as universidades colaborem com a indústria – e vice-versa –, e os governos atuam de forma a manter uma atmosfera de negócios amigável e descomplicada. Infelizmente, a história do Brasil é outra. Empecilhos legais, culturais e de visão costumam tolher o trabalho conjunto entre essas partes, o que torna o caminho da inovação especialmente tortuoso. É possível mudar esse cenário? Há avanços no sentido de criar um ambiente de inovação no Brasil, particularmente no mercado AgTech?

A resposta a essas questões passam primeiramente pelo entendimento das transformações provocadas pelo nascente ecossistema de startups no País. Ao trazer para o mercado brasileiro personagens que antes não atuavam por aqui, como o investidor de risco de empresas de base tecnológica, e estimular os jovens a empreender, esse setor tem colaborado para aproximar atores capazes de fomentar o empreendedorismo e a inovação. O ponto principal para aproveitar esse cenário é não ficar à mercê dos governos, argumenta Mateus Mondin, presidente do Conselho Deliberativo da EsalqTec, a incubadora tecnológica da Escola Superior de Agricultura “Luiz de Queiroz” (Esalq). “Fico me perguntando até quando vamos depender do Estado”, afirma. Para ele, a postura deve ser outra. Quando os participantes do ecossistema tomam a iniciativa, o poder público se vê forçado a preparar medidas de estímulo à inovação. “Criar demandas é algo importante nesse processo.”


Renato Roscoe, secretário de Cultura, Turismo, Empreendedorismo e Inovação do Mato Grosso do Sul, vai na mesma linha e aponta a questão cultural como um entrave. “Existe o problema de pensar que a universidade pública não pode se relacionar com o mercado, como se a tecnologia e o conhecimento gerados na academia não fossem chegar ao cidadão por meio da iniciativa privada”, afirma. “Esse pensamento retrógrado na academia é dominante no Brasil.” No que compete ao poder público, diz Roscoe, cabe criar legislação para abrir caminhos aos inovadores. “A lei de inovação, do início de 2016, é benéfica, mas não consegue ser implementada porque, para chegar à universidade, ela tem de ser regulamentada, assim como os normativos internos também”, explica. Por isso o estado do Mato Grosso do Sul está desenvolvendo uma lei estadual para possibilitar que startups, iniciativa privada e universidades trabalhem em conjunto.

A desconexão entre a universidade e a realidade do mercado foi um dos fatores que levaram Maikon Schiessl a desistir de frequentar os campi. “Vim para São Paulo fazer mestrado na USP, mas tranquei porque me decepcionei. Não vi muito sentido na pesquisa, não era aplicada”, afirma. “Tive de optar: ou empreendia ou fazia o mestrado. Escolhi empreender.” Schiessl foi um dos fundadores da Agra, startup que participou de um programa de aceleração da Wayra, braço de fomento a novas empresas do Grupo Telefônica. Saiu de lá em razão de desentendimentos entre os sócios, o que serviu de aprendizado para a vida profissional. “Um problema que me atrapalhou e atrapalha a muitos é a falta de uma cultura empreendedora no Brasil. Eu tive de aprender sozinho.” Hoje, avalia, a situação começa a melhorar no País, com empresas e plataformas criadas especificamente para apoiar as startups. “O que a StartAgro faz, por exemplo, é atuar nesse ecossistema, conectando e mostrando o que AgTech tem. Com informação e conteúdo, é possível reduzir os riscos na hora de empreender.”

A consciência do que é empreender é um dos pontos importantes que devem ser analisados com atenção por quem atua no setor AgTech, observa Guilherme Nastari, diretor da consultoria agrícola Datagro. “Um dos erros da geração atual é querer ficar rica antes de resolver um problema”, diz. Alain Max Banfi, CEO da TeachLeap, destaca que a inovação só acontece em razão da perseverança. “O fator mais importante é não desistir”, diz. Outro aspecto relevante quando o assunto é inovar é o potencial colaborativo do mundo contemporâneo. “O ponto em comum entre as startups que hoje dominam o mercado é a capacidade de engajar os stakeholders e estimular a colaboração. Basta ver, por exemplo, como atuam o Google e o Airbnb.” PLANT PROJECT Nº 2

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NOVAS GERAÇÕES, ANTIGOS DESAFIOS com a participação de: Mariana Vasconcelos, Fundadora e CEO da Agrosmart Vinícius Lopes, Diretor Comercial da Bug Agentes Biológicos Vitor Horita, Herdeiro do grupo Horita, um dos maiores produtores de algodão do Brasil Moderador: Julio Cargnino, Diretor de conteúdo do Canal Rural

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O agronegócio brasileiro tem vivido, mais notadamente de alguns anos para cá, um movimento que pode ter reflexos importantes na dinâmica do mercado: cada vez mais jovens assumem posição de destaque no setor, seja por meio da sucessão familiar nas propriedades, seja com empreendedores recém-saídos das universidades. Diante desse cenário, a questão que se coloca é se essa nova realidade pode acelerar a adoção de tecnologia nas propriedades rurais, o que teria um efeito benéfico em toda a cadeia AgTech. O desafio de abrir espaço para a inovação na agricultura começa pela forma de abordar o agricultor. “Uma preocupação constante que nós temos, no Canal Rural, é como conversar com

Baseado no painel “Diálogo: As novas gerações e a adoção de tecnologias disruptivas”

o produtor”, afirma Julio Cargnino, Diretor de conteúdo do Canal Rural. Nesse aspecto, falar a linguagem do agricultor é o mesmo que colocar foco na solução de um problema. Mariana Vasconcelos, fundadora e CEO da Agrosmart, uma das startups da agricultura mais promissoras do País, tem uma experiência muito peculiar a esse respeito. Filha de produtor rural, ela conhece de perto – e de forma natural – a realidade de uma fazenda. Assim, viu na prática uma série de necessidades que seu pai tinha na condução dos negócios. “Eu via os problemas e sabia que havia tecnologia disponível no mercado capaz de solucioná-los”, diz. “O que fiz então foi me conectar com a universidade e os experts para me ajudarem com o conhecimento técnico para eu resolver um problema que via dentro de casa.”


A Agrosmart nasceu assim. Fundada em 2014, a empresa aposta na agricultura digital. Ela tem um sistema de monitoramento da lavoura que permite ao agricultor, por meio de uma plataforma online, acompanhar a situação da produção. O software coleta informações e faz recomendações, por exemplo, sobre manejo de irrigação. Convencer o pai sobre a eficácia do produto foi o primeiro teste de mercado para Mariana. “Ele sempre deu espaço para experimentar essa tecnologia na propriedade, mas havia uma certa resistência. Ele me perguntava: ‘Você tem certeza de que isso vai dar certo?’”, diz. Mariana então aplicou o sistema na fazenda da família, errou, corrigiu, melhorou e, por fim, o lançou no mercado. “A partir do momento que meu pai viu funcionando, passou a ser o nosso maior defensor.” A comprovação do benefício tecnológico por meio da experimentação parece ser o segredo quando o tema é convencer o produtor a abraçar uma inovação. “Quando atestada a eficiência, o dinheiro flui como num rio para uma tecnologia”, afirma Vitor Horita, herdeiro do grupo Horita, um dos maiores produtores de algodão do Brasil. “Se alguém da cidade for a uma fazenda do oeste da Bahia ou do Mato Grosso, vai se impressionar com o tanto de tecnologia embarcada por hectare.”

Isso não quer dizer, porém, que vender produtos e serviços tecnológicos para o campo seja algo trivial. Segundo Horita, um erro muito comum das startups é subestimar o conhecimento de agricultura acumulado por décadas, centenas e até mesmo milhares de anos pelas famílias de produtores. “Nós, que voltamos ao campo agora, temos uma carga de informação maior do que nossos pais talvez tenham tido”, afirma. Mas a geração anterior, continua, tem experiência, pois já errou, corrigiu e acertou várias vezes. “Tenho a visão de que devemos ser conservadores quando a intenção é atacar algum tipo de problema no campo. E isso simplesmente porque a bagagem de agricultura que a humanidade adquiriu é muito grande”, diz. “É a sensibilidade do empreendedor de entender o estado da mente do produtor que vai gerar o impacto pretendido. Isso não se consegue apenas com informação e estudo.”

O ceticismo em relação a uma nova tecnologia é algo com que Vinícius Lopes lida diariamente como diretor comercial da Bug Agentes Biológicos. Empresa especializada num tipo de produto novo e ainda não testado por muitos produtores – o controle de pragas por meio de insetos -, a empresa paulista recorre à informação para convencer os agricultores a usar seus serviços. No entanto, a ocorrência de problemas extraordinários, como a destruição em larga escala provocada há alguns anos pela lagarta Helicoverpa armigera, servem como um argumento poderoso. “Um marco para a Bug foi o caso da Helicoverpa, porque não havia um produto químico para enfrentá-la, mas uma vespinha conseguia”, diz. “O biológico era mais barato e com resultados melhores. Então, os produtores pensavam: ‘Bom, vamos falar com essa empresa’”, diz Lopes. Ao ouvir o relato de Lopes, Mariana, da Agrosmart, sintetizou como é a relação do agricultor com as novas tecnologias. “Sempre fazemos experimentos, e o produtor também testa bastante”, diz. “Ele acredita quando vê o resultado.” PLANT PROJECT Nº 2

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S

Inovação

Josh Tetrik, fundador da Hampton Creek: mais de US$ 120 milhões em investimentos de gente como Bill Gates e Eduardo Saverin, o brasileiro do Facebook 108


O OVO (QUEBRADO?) DE JOSH Ele se tornou a estrela de uma nova indústria, a dos alimentos alternativos à proteína animal, e, com uma receita de maionese sem ovos, liderou uma onda que movimenta bilhões de dólares para startups que querem usar tecnologia para reinventar a comida. Mas pode haver algo de podre nessa história de sucesso Por NÚria SaldanHa, de WasHington - Estados Unidos

P

arece até tema de ficção científica e, só de pensar no assunto, muita gente pode até perder o apetite. Mas os alimentos desenvolvidos em laboratório são a mais nova sensação do Vale do Silício, nos Estados Unidos, região conhecida pela inovação e pelo florescimento de grandes empresas de tecnologia. A onda agora é produzir alimentos muito comuns na mesa dos brasileiros como ovos, leite e carne a partir de ingredientes alternativos aos produtos animais -- e isso inclui proteínas de plantas e até fermento. É uma tendência crescente também entre investidores. Nos Estados Unidos, fundos de capital de risco como o New Crop Capital investem de 50 mil a 1 milhão de dólares em startups com essa proposta. No final de setembro passado, uma coalizão de grandes investidores institucionais, que juntos administram mais

de US$ 1,25 trilhão de dólares, avisou que vai pressionar as 16 maiores indústrias alimentícias do mundo (entre elas Kraft Heinz, Nestlé, Unilever e Walmart) a também abrirem mais espaço para produtos que busquem alternativas à proteína animal em suas cadeias produtivas. A corrida por essa dinheirama já tem alguns poucos vencedores e, por que não dizer, até mesmo os primeiros ovos quebrados. A grande estrela do mundo alternativo é a empresa americana Hampton Creek. Foi a primeira do setor a ficar à porta do ranking dos unicórnios, título dado a startups avaliadas em um bilhão de dólares ou mais. O segredo do seu sucesso estava na produção de basicamente um produto, uma espécie de maionese sem ovo. Na “Just Mayo”, ou “apenas maionese”, o principal ingrediente da receita tradicioPLANT PROJECT Nº 2

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COMIDA DE LABORATÓRIO EMPRESA

BEYOND MEAT

MEMPHIS MEAT

IMPOSSIBLE FOODS

Produtos

Maionese, cookies, molhos para saladas

Frango, hambúrguer e carne vermelha

Almôndegas suínas e bovinas

Hambúrguer

Matérias-primas

Ervilha amarela canadense e sorgo

Ervilha

Células animais

Proteína de trigo

Em substituição a

Ovo

Proteína animal

Proteína animal

Proteína animal

Investimento

US$ 120 milhões

US$ 33 milhões

US$ 5,75 milhões

Principais investidores

Bill Gates, Eduardo Saverin e Jerry Yank (fundador do Yahoo)

Bill Gates, New Crop Capital

New Crop Capital

Bill Gates, UBS. Em 2015, o Google Ventures tentou comprar a empresa por US$ 200 milhões

Fundação

2011

2009

2015

2011

Localização

San Francisco, Califórnia

El Segundo, Califórnia

San Francisco, Califórnia

Redwood City, Califórnia

Principais clientes

Whole Foods, Cotsco, Safeway, Target, Walmart

Whole Foods, Target, Safeway, Publix

Deve chegar ao mercado em 2021

Apenas o restaurante Momofuku, em Nova York

US$ 198,5 milhões

Fonte: Crunchbase, AngelList, respostas enviadas por e-mail pelas empresas, sites das companhias e reportagens da Bloomberg

nal foi substituído por proteínas da ervilha amarela canadense. Josh Tetrik, o jovem fundador da companhia, virou uma celebridade instantânea. Mas nos últimos meses também acabou se transformando em pivô de um escândalo corporativo, acusado de inflar vendas para impressionar investidores e aumentar o valor de mercado da Hampton Creek. Seria ele um verdadeiro ovo podre, capaz de estragar a receita de toda uma nova indústria? É fácil de entender o encanto dos investidores com os alimen110

tos de laboratório e seus criativos inventores. O mercado global de carne, ovos e leite movimenta US$ 700 bilhões de dólares por ano e é claro que tem muita gente de olho numa fatia desse bolo. Com a expectativa de que em 2050 a população mundial passe dos 9 bilhões de pessoas, vai ser necessário produzir muito mais proteína e buscar novas fontes para esse fim pode se transformar em um lucrativo negócio, além de agradar a grupos ambientalistas e a um crescente número de consumidores vegetarianos. “A

superdependência do modelo de fazendas para atender à demanda global por carne já se provou o melhor caminho para uma crise financeira, social e ambiental”, afirmou Jeremy Coller, coordenador da “coalizão" pró-substitutos. “Os níveis de emissão de gases e a poluição já estão muito acima do aceitável, assim como as condições de segurança e de bem-estar dos trabalhadores estão abaixo do mínimo.” Números divulgados recentemente pela empresa californiana Radiant Insights mostram que os leites à


GELTOR Leite sintético

Leite

Gelatina

Fermento e açúcar

Ervilha

Fermento e bactérias

Leite animal

Leite animal

Gelatina de couro bovino

Valor não divulgado

US$ 86,5 milhões

US$ 250 mil

Khosla Ventures, Arif Fazal

New Crop Capital

2014

2014

2015

Berkeley, Califórnia

Emeryville, Califórnia

San Francisco, Califórnia

Já disponível na fábrica para degustação. No mercado, a partir do fim de 2017

Target, Whole Foods

Deve chegar ao mercado em 2017

base de plantas (principalmente os de amêndoa e soja) já representam cerca de 8% da indústria de laticínios. Mas o mercado global dos produtos substitutos de carnes ainda é muito pequeno: deve passar de US$ 3,5 bilhões em 2015 para US$ 5,2 bilhões em 2022, menos de 1% do total da indústria da carne. Nesse mercado específico, a grande estrela ainda é a soja, que responde por quase 80% do total. Entre as empresas que apostam na substituição dos alimentos estão a Geltor, que fabrica gelatina usando bactérias e fermento, em

vez de tutano de boi, como matéria prima; a Beyond Meat, que oferece substitutos para o frango e a carne vermelha (inclusive hambúrgueres) feitos de proteína de ervilha; e a Memphis Meats, que produz carne de verdade cultivada a partir de células animais reais, sem a necessidade de abate (leia mais na tabela acima). De longe, a companhia mais badalada do momento é a Hampton Creek. Ela tem um produto de sucesso, a Just Mayo (apenas maionese), que leva ervilha amarela canadense (canadian yellow

pea) no lugar das gemas. A história da companhia tem pouco mais de cinco anos. Em 2011, os amigos veganos Josh Tetrick, de 36 anos, e Josh Balk, de 37, investiram cerca de US$ 30 mil do próprio bolso. Conseguiram convencer investidores a aplicar mais recursos nas pesquisas de laboratório. Chegaram à textura e ao sabor ideais e lançaram a nova maionese. Desde então, a startup já recebeu aportes de US$ 120 milhões (entre os investidores, estão Eduardo Saverin, o brasileiro cofundador do Facebook, e Bill Gates). PLANT PROJECT Nº 2

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Para muitos, o grande ativo da empresa é a fórmula da Just Mayo, considerada uma verdadeira reinvenção da comida, justamente por trabalhar com culturas de baixo impacto ambiental, como o sorgo, que requer pouca água no seu plantio, e a própria ervilha amarela - que só foi descoberta graças a muitos estudos na busca de um emulsificante vegetal. "Existem mais de 400 mil espécies de plantas na Terra e 92% delas têm sido negligenciadas pela indústria de alimentos. O que nós fizemos foi extrair o potencial de algumas delas", disse Tetrick em entrevista à revista Wired em outubro do ano passado. Com sua proposta de oferecer ingredientes mais saudáveis, veganos e com menor impacto para o meio ambiente, a Hampton Creek conquistou espaço em grandes redes de supermercados americanos, como Whole Foods, Target e Safeway. Além disso, fechou um contrato de fornecimento com a Compass Group, que fornece cerca de 4 bilhões de refeições por ano para clientes que incluem universidades e hospitais. De acordo com a empresa de pesquisa de mercado IRI, as vendas da Just Mayo quase triplicaram entre 2014 e 2015, passando de US$ 4,6 milhões para US$ 11,8 milhões (a maionese é considerada a rainha do setor de condimentos nos EUA e movimenta quase US$ 2 bilhões por ano no país, segundo o Euromonitor). O problema é que, mesmo sem ovos, a maionese desandou. Em agosto de 2016, a Security and Exchange Comission (SEC), órgão regulador do mercado de capitais norte-americano, e o Departamento de Justiça inicia112

ram uma investigação sobre possíveis fraudes praticadas pela Hampton Creek. A investigação revelou que, em 2014, o CEO Josh Tetrick arquitetou um plano de compra dos próprios produtos nas gôndolas dos supermercados, inflando as vendas da Just Mayo para levantar capital. Não à toa, foi nesse ano que a startup recebeu a maior injeção de capital: US$ 90 milhões. Tetrick nega qualquer irregularidade, diz que tudo não passou de um programa de recompra para garantir a qualidade do produto e que gastou apenas US$ 77 mil, mas a verdade é que pouca gente engoliu a história. Segundo a Bloomberg, os relatórios da Hampton Creek mostram gastos de mais de US$ 500 mil dólares com o programa de recompra apenas em julho de 2014, enquanto as vendas para o mês somaram US$ 472 mil. Às vésperas de fechar uma nova rodada de investimentos de US$ 200 milhões com duas empresas alemãs, Tetrick viu o apetite dos potenciais parceiros diminuir. Para os investidores, o episódio serviu para acender uma luz amarela em relação às novas empresas. Mas, mesmo com essa quebra de confiança, as apostas nos alimentos substitutos seguem em alta. "Não há nenhuma maneira de produzir carne suficiente para 9 bilhões de pessoas. Contudo, não podemos pedir a todos para se tornarem vegetarianos. É por isso que precisamos de mais opções para a produção de carne sem esgotar nossos recursos", escreveu Bill Gates, em seu blog pessoal, Gatesnotes.com, há dois anos, quando começou a investir nas startups de alimentos substitutos aos produtos animais.


PLANT PROJECT Nยบ 2

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S

Startup

Como uma jovem companhia israelense pretende transformar a gestão das fazendas com sistemas inteligentes de predição de clima e pragas e tecnologias desenvolvidas para uso militar

V

ida de fundador de startups tem dessas coisas. O casamento acontece, mas os desafios para construir a nova empresa e colocá-la de pé adiam a lua de mel. O israelense Ofir Schlam até que conseguiu uns dias na praia com a esposa, mais de um ano após a cerimônia de núpcias. Mas antes de chegar lá levou-a para um nada romântico tour por lavouras matogrossenses e escritórios paulistanos. O Brasil, afinal, é o mercado preferencial para a Taranis, a companhia que Schlam criou ao lado de três sócios com uma ambiciosa proposta de repetir, no agronegócio, o sucesso que conterrâneos tiveram nas ruas das principais cidades do mundo. “Temos tecnologia para sermos o Waze da agricultura”, disse a PLANT, pouco antes de embarcar com a mulher rumo a dias de sol e romance. Pode parecer pretensioso, mas o fato

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foto: divulgação

O WAZE DA LAVOURA

é que a Taranis já despertou a atenção de alguns investidores com históricos de grandes colheitas em suas inserções pelo terreno das startups. A companhia teve, logo de início, uma injeção financeira de dois dos principais fundos em ação no fértil ecossistema de empreendedorismo tecnológico de Israel (que, em termos de recursos e empresas inovadoras, perde apenas para o americano): o OurCrowd, maior do país, e o Eshbol Ventures. E, depois, atraiu nomes como Microsoft e Marc Benioff, fundador do SalesForce e um dos mais astutos capitalistas de risco dos Estados Unidos. O que enche os olhos dessa gente é menos a expertise agronômica e mais a intimidade com tecnologias disruptivas como o machine learning – a capacidade dos softwares de aprender e ficar cada vez mais precisos à medida que mais dados são incorporados aos seus


sistemas – dos nerds israelenses. A Taranis (assim como o Waze e o Google) afirma que é assim que seu produto funciona para ajudar o agricultor a prever, com inédita antecedência e precisão, fenômenos climáticos e a ocorrência de pragas nas lavouras. Schlam traz em sua trajetória a moderna imagem do Estado de Israel. Nascido em uma família de agricultores, desde cedo conviveu com as tecnologias de irrigação que transformaram áreas desérticas do país em oásis de produção. Ainda adolescente, envolveu-se com a emergente indústria de produção de softwares e acabou desenvolvendo programas para a área de segurança. Tornou-se líder dessa área no gabinete do primeiro-ministro israelense, até que, em 2014, deixou o governo para unir suas duas especialidades. Em sociedade com outros três jovens talentosos – Eli Bukchin, meteorologista que desenvolveu sistemas de previsão climática para as forças armadas de Israel; Asaf Horvitz, programador e especialista em engenharia de software e big data; e Ayal Karmi, criador de algoritmos para detecção de fraudes no Banco de Israel -, lançou-se na jornada de, como ele diz, “aplicar inteligência ao agribusiness”. O primeiro foco do time foi usar modelos matemáticos combinados a análise de imagens de satélite e dados coletados no solo para estabelecer sistemas

de previsão meteorológica. Nessa área, porém, viram-se diante de uma infinidade de concorrentes, alguns de peso como a The Climate Corporation, adquirida pela gigante Monsanto. Tinham na mão patentes únicas, que permitiam antecipar fenômenos climáticos com antecedência de uma semana para áreas de até 1,5 km. Mas entenderam que precisavam buscar novos diferenciais. E os encontraram em uma nova área de estudo, a fitopatologia. Com a alta resolução das imagens que conseguiam obter e a compreensão de que, para se propagarem, as principais pragas que infestam as lavouras precisam de condições específicas de temperatura e umidade, passaram a desenhar modelos preditivos que usavam os dados que recolhiam para antecipar possíveis infestações. Assim, poderiam gerar para seus futuros clientes, em aplicativos embarcados nos celulares, alertas precisos de onde e quando determinada praga atacaria as lavouras, permitindo ações preventivas localizadas e, por consequência, evitando danos e reduzindo custos de produção. Os testes iniciais foram feitos, com sucesso, em pomares de peras e maçãs em Israel. Ao final do primeiro ano de desenvolvimento, Schlam foi à procura dos grandes mercados. Rússia, Estados Unidos, Argentina e Brasil entraram em sua rota de viagens, buscando agricultores

Schlam (à dir.), com a engenheira agrônoma Franciele Burman e Jorge Winiar, sócio da empresa na Argentina, em visita ao Brasil: ao lado de Rússia e Estados Unidos, País é uma das prioridades para os israelenses

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Tela de controle da Plataforma e projeção do novo sistema que utiliza câmeras instaladas em aviões de pulverização para obter fotos em alta resolução das plantações: tecnologias utilizadas na produção de mísseis incorporadas ao manejo das lavouras

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dispostos a testar a tecnologia da Taranis em culturas com maior volume e área plantada, como soja e trigo. “Saí pelo mundo em busca das melhores opiniões”, conta. “Mostramos que, através da imagem e, assim como acontece no Waze, dos dados que os próprios produtores inseriam no sistema, a plataforma ia ficando melhor com o tempo, aumentando sua capacidade de analisar eventos e prever ocorrências futuras.” Outro trunfo do sistema, segundo Schlam, era a capacidade de integrar informações de sensores e softwares que os produtores já possuíam, independentemente do fabricante. O desenvolvimento da plataforma da Taranis em meio ao ambiente tecnológico/militar israelense permitiu avanços bem mais rápidos ao grupo do que se estivessem em outros pontos do globo. A integração de satélites, por exemplo, é uma especialidade da região. Com o auxílio deles, Schlam ajudou a criar um escudo virtual antimísseis para o país. Hoje, essa mesma expertise permite que o seu sistema agrícola integre informações vindas de mais de 100 satélites orbitando ao redor da terra – a maioria de seus concorrentes trabalha com menos de 30 –, gerando resoluções maiores para imagens de áreas cada vez menores. Recentemente, a Taranis incorporou um grupo de engenheiros aeronáuticos com mais de dez anos

de experiência no governo local. Sua missão foi introduzir tecnologias utilizadas na produção de mísseis e caças no desenvolvimento de câmeras capazes de produzir fotos de altíssima resolução, mesmo quando instaladas em aviões que sobrevoam as lavouras em alta velocidade. A ideia é substituir imagens feitas em baixa velocidade e altitude através de drones por fotos tiradas por câmeras instaladas, por exemplo, em aviões de pulverização, que cobrem áreas maiores em menor tempo. O novo sistema, já em testes, permite ver detalhes como insetos ou problemas morfológicos nas folhas de uma lavoura. “Fazemos duas fotos por segundo com resolução para 0,5 milímetro”, afirma Schlam. Com esse arsenal nas mãos, o exército AgTech de Israel tem conquistado territórios importantes em nossas lavouras. Representada no Brasil pelo executivo Rodrigo Iafelice dos Santos, ex-Agrenco e atual CEO da consultoria Ennexas, a companhia já fechou importantes contratos no Mato Grosso e deve, pelas previsões de Schlam, monitorar 2 milhões de hectares em 2017. “Nosso objetivo é entregar ao produtor e aos seus principais auxiliares informações antecipadas para tomarem as decisões e, assim, qualificarem a gestão das propriedades e aumentarem a rentabilidade das lavouras”, afirma Schlam. Nessa batalha, sabem bem os agricultores, jamais pode haver trégua. Talvez apenas uma bem rápida, para a lua de mel. LFS

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Acesse nossas plataformas digitais Os sites www.plantproject.com.br e startagro.agr.br trazem reportagens e anĂĄlises exclusivas sobre os assuntos mais relevantes do agronegĂłcio. Confira alguns destaques.

PLANT PROJECT Como o desenvolvimento da agricultura ajudou o Oeste da Bahia A evolução nas lavouras no Oeste da Bahia acarretou numa espiral de desenvolvimento em setores diversos, com a chegada das agroindústrias e o incremento na infraestrutura, tecnologia e serviços, educação e comodidades. Se a região não Ê tanto uma fronteira agrícola, no sentido mais desafiador do termo, ainda guarda oportunidades de negócios para quem, alÊm do capital e da coragem dos primeiros desbravadores, detÊm requisitos como conhecimento, capacidade de gestão e visão de mercado. h p://bit.ly/2iZH45Y

O segredo da Baden Baden O rótulo da cerveja Baden Baden 15 anos guarda um segredo. O design simplificado traz imagem da vegetação de Campos do Jordão, cidade do interior de São Paulo onde acervejaria foi criada. O detalhe, que passa despercebido por aqueles que desconhecem o processo de fabricação da bebida, estå em um dos ingredientes utilizados: h p://bit.ly/2jDjign

STARTAGRO ESPĂ?RITO SANTO ABRAÇA A INOVAĂ‡ĂƒO AGTECH O mercado AgTech no Brasil ganha novo impulso com a criação do AGROFIP, um veĂ­culo para investimentos em startups do agronegĂłcio lançado por um grupo de empresĂĄrios do EspĂ­rito Santo. A intenção ĂŠ investir R$ 25 milhĂľes nos prĂłximos cinco anos. O projeto surge no momento em que a inovação foi definida como um dos pilares do Plano EstratĂŠgico de Desenvolvimento da Agricultura Capixaba (PEDEAG 3), que projeta as iniciativas para o setor atĂŠ 2030. “Os capixabas estĂŁo antenados com a nova economiaâ€?, afirma Octaciano Neto, SecretĂĄrio da Agricultura, Abastecimento, Aquicultura e Pesca do EspĂ­rito Santo. h p://bit.ly/2ifcBBa

15 aplicativos agrícolas úteis e imperdíveis para baixar em 2017 O produtor rural brasileiro tem à disposição hoje - no smartphone e no tablet - uma sÊrie de aplicativos para agropecuåria. Os programas auxiliam em diversas åreas, entre as quais gestão de fazendas, previsão climåtica e cotação de commodities. A STARTAGRO preparou uma lista especial com 15 aplicativos que o produtor rural pode começar a usar imediatamente. h p://bit.ly/2k0wVHl

YouTube: A tecnolĂłgica Mato Grosso do Sul O Mato Grosso do Sul ĂŠ um Estado agrĂ­cola que vem passando por uma profunda transformação provocada pela inovação. “A tecnologia ĂŠ intensa nas nossas atividades agrĂ­colasâ€?, afirma em entrevista em vĂ­deo ao canal da STARTAGRO no YouTube Renato Roscoe, secretĂĄrio de Cultura, Turismo, Empreendedorismo e Inovação do Mato Grosso do Sul. Como exemplo, ele cita o rebanho no Estado. O nĂşmero vem caindo - nos Ăşltimos seis anos diminuiu 9% -, mas a produção de carne subiu 22%. “Isso ĂŠ fruto da introdução de novas tecnologiasâ€?, afirma Roscoe, que foi um dos debatedores do #STARTAGRO1. PLANT PROJECT NÂş 2

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de óleo de soja. Nos EEUU, de óleo de soja. Nos EEUU, a produção de etanol é de a produção é de 59,5 bilhõesde deetanol litros de 59,5 de litros etanolbilhões de milho, e 5,7 de etanol bilhõesde demilho, litros e 5,7 bilhões de litrosde óleo de principalmente principalmente dede óleo de soja. A produção soja. A produção bioetanol está em de expansão bioetanol emdas expansão em vários está países em vários epaíses das Américas Ásia, como Américas Ásia, como Argentina,eParaguay, Argentina, Paraguay, Colombia, Peru, Guatemala, Colombia, Peru, Guatemala, Rep Dominicana, China, Rep India,Dominicana, Paquistão eChina, Filipinas, India, Paquistão e Filipinas, e no mundo já ultrapassa a e no mundo já bilhões ultrapassa marca de 103 de a marca de ano. 103 bilhões de litros por Este volume litros por ano. Este volume já é relevante, considerando já é relevante, considerando o consumo mundial de o consumo de 1,2 gasolina, damundial ordem de gasolina, ordem de 1,2 trilhão de da litros. É relevante trilhão de litros. o potencial de É relevante o potencial de desenvolvimento da desenvolvimento dabiogás e bioeletricidade, do bioeletricidade, do biogás biometano produzidos a e biometano produzidos a partir de resíduos partir de resíduos agroindustriais, e do agroindustriais, bioquerosene. e do bioquerosene. Apesar do crescimento da Apesar do ecrescimento da produção do produção e do de suas reconhecimento reconhecimento de suas vantagens ambientais, vantagens ambientais, existe um intenso debate existe intensoe debate sobre aum validade a sobre a validade e a

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A produção de mais de 36% da oferta anual com a produção de bioetanol está em expansão do grão, Promove e representa hoje o biocombustíveis, em países das Promove renda renda local local queque produção produção de de alimentos. alimentos. recipientes, recipientes, e aumentava e aumentava a avários seu maiorimpulsiona uso. Promove Mas o essa renda local eque de alimentos. recipientes, ecom aumentava inicialmente no Brasil eprodução Ásia,inúmeros como impulsiona comércio o comércio ae a Existem Existem inúmeros dependência dependência por por ajuda. ajuda. AAméricas Aa discussãoindústria éimpulsiona ocasional, opois comércio Existem inúmeros dependência por ajuda.Argentina, A o Proálcool em meados Paraguay, indústria local, local, levando levando e a exemplos exemplos que que corroboram corroboram absorção absorção desses desses reacende apenas indústria quando local,há levando exemplos que corroboram absorção desses dos anos 70, e Colombia, Peru, Guatemala, progresso progresso este este efeito, efeito, como como o fato o fato de de excedentes, excedentes, trouxe trouxe algum progresso dedaalta de efeito, como o além fato excedentes, trouxe posteriormente nosuma Rep Dominicana, China, e aumento e aumento da capacidade capacidade queeste que Ribeirão Ribeirão Preto Preto além de de movimento inclusive inclusive uma base base mais mais preço, aumento dade capacidade Preto de independentemente inclusive uma base mais Estados Unidos a os partir India, Paquistão e Filipinas, de e de produção produção de alimentos alimentos serque ser o maior oRibeirão maior polo polo de dealém sólida sólida para para os contínuos contínuos de produção avaliação de alimentos ser maior sólida osprodutividade contínuos dos anos 80. A para decisão de e no mundo já oultrapassa onde onde se se instala. instala. produção produção de depoloa de de uma melhor aumentos aumentos de de produtividade sobre relação onde causal. se instala. produção aumentos de produtividade Jimmy que Carter, emseguiram. janeiro marca de 103 bilhõesdede é também Esse Esse modelo modelo temtem oferecido oferecido cana-de-açúcar, cana-de-açúcar, é também que se se seguiram. A verdade éEsse que modelo ademonstração tem oferecido cana-de-açúcar, é do também que se seguiram. de 1980, de penalizar a litros por ano. Este volume efeito efeito demonstração para para a maior a maior bacia bacia leiteira leiteira do É possível É possível argumentar argumentar queque transformação efeito de demonstração para a maior bacia leiteira do antiga aUnião Soviética por já é relevante, considerando países países com com igual igual potencial, potencial, estado estado de de São São Paulo, Paulo, e e É possível argumentar que produção a produção de de soja soja e e países de milho com – eigual potencial, derelevante São Paulo, excedentes e ter invadido oprincipalmente Afeganistão consumo mundial de gerando gerando impacto impacto positivo positivo temestado tem uma uma relevante a produção de soja oe de milho, milho, principalmente oo de indiretamente gerando de soja, impacto seu positivo tem uma relevante atravéssegunda do embargo de gasolina, da ordem de 1,2 na na geração geração de de emprego, emprego, produção produção de de grãos. grãos. O O milho, principalmente o de segunda safra safra no no Brasil, Brasil, e e na produção geração – emprego, produção de grãos. Osubstitutodeem grãos, na levou a umasafra trilhão de litros. É relevante de renda, renda, e na e de na redução redução da da mesmo mesmo desenvolvimento desenvolvimento segunda no Brasil, e na Argentina Argentina nãonão teriam teriam se se tem ajudado de a renda, dar mais epor napor redução da mesmo desenvolvimento sobre-oferta de milho que o potencial de dependência dependência energia energia tem tem sido sido observado observado em em na Argentina não teriam se desenvolvido desenvolvido na na mesma mesma estabilidade dependência à produção por energia tem sido observado em foi o gatilho para ose se desenvolvimento da importada. importada. outras outras regiões regiões agrícolas agrícolas desenvolvido nanão mesma intensidade intensidade não tivesse tivesse alimentos do outras desenvolvimento etanol do biogásagrícolas e de mundial de importada. onde onde a produção a regiões produção de intensidade se nãode tivesse crescido crescido a do produção a produção debioeletricidade, que o contrário. Antes do onde a produção de Plinio Nastari naquele país. biometano produzidos a energia energia de de biomassa biomassa se se crescido a produção de etanol etanol de de milho. milho. O mais O mais etanol de milho se energia de biomassa se Presidente da DATAGRO Consultoria partir de resíduos instala. instala. etanol No Brasil e nos de EEUU, oa Oa mais importante importante é milho. que é que desenvolver, os EEUU instala. agroindustriais, e do É por É por isso isso que que a a importante é que a etanol,agricultura e agricultura posteriormente o temtem energética energética resolviam o problema de É por isso que a bioquerosene. agricultura agricultura energética energética deve deve agricultura energética tem biodiesel, tem apresentado sido sido umum vetor vetor importante importante seus excedentes agricultura energética deve ser ser entendida entendida como como uma uma um vetor da importante um desenvolvimento Apesar do crescimento da de sido de capitalização capitalização da enviando-os como ajuda estratégia estratégia de de como uma de capitalização relevante. Atualmente, oumda produção eser doentendida agricultura agricultura como como um todo, todo, humanitária para países estratégia de desenvolvimento. desenvolvimento. agricultura como um todo, Brasil produz 27,5 bilhões reconhecimento de suas e desta e desta forma forma temtem dado dado menos desenvolvidos. desenvolvimento. e desta forma tem dado de litros de etanol de cana vantagens ambientais, uma uma grande grande contribuição contribuição Esta ação desestimulava o uma grande contribuição e 4,3 bilhões de biodiesel existe para para o desenvolvimento o desenvolvimento da da um intenso debate desenvolvimento de para o desenvolvimento da principalmente (78%) sobre a validade e a produtores locais nos países

PLANT PROJECT Nº 2

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R

Retrato

ORGULHO DE CRIADOR O retrato é de um touro excepcional da Fazenda Crioula, em Valparaíso (SP). É de um pecuarista de tradição, Carlos Eduardo Novaes. Melhor que qualquer descrição é citar o criador: "O maior mamífero do Brasil era a anta. Mas

importamos os capins da África e o Zebu da Índia. Os grandes espaços, o sol e a chuva do Brasil Central nos transformaram no maior exportador mundial de carne bovina. Temos hoje a tecnologia dos custos mais baixos e a possibilidade de produção em alta escala. A pecuária de corte é um sucesso nacional". Texto e foto de Zezinho Peres



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