Conheça os nativos digitais

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O TEMPO Belo Horizonte

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DOMINGO, 22 DE ABRIL DE 2012

Perfil. Eles trocamdo celular parao tablet, do tabletpara aTVe daTVpara o computador 27 vezes a cada hora

Conheça os ‘nativos’ digitais SAMUEL MIRANDA

Característica tem lado positivo e negativo, alertam os especialistas ¬ LUIZA ANDRADE ¬ Uma pesquisa

norteamericana indica que os jovens de até 20 anos, considerados “nativos” digitais, trocam de suporte de mídia (do celular para o tablet, do tablet para a TV, da TV para o computador...) cerca de 27 vezes a cada hora livre. Isso significa que, durante um programa de meia hora na TV, os nativos digitais trocam de mídia mais de 13 vezes. Comissionada por uma rede de entretenimento midiático – a Time Warner –, a pesquisa, foi conduzida pelo instituto Boston Innerscope Research. O objetivo do estudo era revelar hábitos dos consumidores mais jovens com relação ao uso de conteúdo midiático, mas ele acabou indicando uma tendência comportamental da nova geração que pode mudar não só o mercado de marketing digital, mas também as esferas educacionais, social e até psicológica. Para Priscila Augusta Lima, professora da Faculdade de Educação (FAE) da Universidade Federal de Minas Gerais (UFMG), a mudança no estilo de atenção – de concentrada para difusa – na qual se baseia a nova geração “pode alterar, inclusive, a percepção de urgência, de espaço e tempo”. Segundo a especialista em educação, o fato de os jovens terem um leque muito extenso de informação disponível em vários meios e em alta velocidade faz com que a percepção de tempo seja transformada. “Para quem é ‘nativo’ digital, existe até a gíria ‘demorô’. Tudo é muito rápido. Se passa de poucos minutos, já é tempo demais”, afirma a professora. Além disso, a noção de espaço sofre uma reviravolta. “O que antes ocupava uma biblioteca hoje cabe em um pen drive. O que isso diz sobre o espaço?”, questiona. Para Priscila, essa geração já nasceu no ritmo digital. TECNOBERÇO. A

pesquisa foi feita com jovens com 20 anos ou mais. Contudo, as gerações que vieram ainda depois dessa já se desenvolveram além do ‘desktop’. Gilsemar, por exemplo, tem apenas 8 anos,

Exemplo. Gilsemar tem apenas 8 anos, mas já tem um notebook, um telefone celular e um tablet; “Acesso é limitado aos fins de semana”, conta a mãe dele, Patrícia DARREN HAUCK/THE NEW YORK TIMES

mas já conta com um notebook, um telefone celular e um tablet. A mãe do garoto, Patrícia Reggiani de Abreu, 45, gerente administrativa, conta que o filho sabe mexer em praticamente tudo que diz respeito à tecnologia. “Mas o acesso é limitado aos fins de semana, para que não haja interferência nos estudos e no desenvolvimento pessoal da criança”, diz a mãe. Ela conta que o garoto já nasceu tecnológico e, desde muito novo, entra em sites para brincar com jogos que o interessem. “Ele é bem mais rápido que a mãe e o pai”, explica Patrícia. Pudera, afinal, os pais cresceram apenas com rádio e TV. A internet chegou às casas da classe média brasileira só mesmo na década de 90 – pelo menos 14 anos antes de Gilsemar nascer. “Não tínhamos computador em casa, eram outros tempos”, afirma Patrícia. Atualmente, mesmo quando Gilsemar não pode acessar a internet, ele não fica desligado da tecnologia. “Ele brinca com jogos no celular. Esse não dá pra evitar”, justifica Patrícia, em tom de brincadeira.

Smartphone Simultâneo. Uma pesquisa recente feita pela Ericsson, empresa de aparelhos para telefonia móvel, revela que mais de 40% das pessoas que assistem à televisão fazem o uso de internet ao mesmo tempo.

“Quem nasceu na época dos nativos digitais não ‘está’ conectado. Ele ‘é’ conectado. É preciso ter em mente que não existe mais a distinção entre off-line e online.”

Geração

Publicidade sofrecoma mudança

Leandro Kensky CEO DA MEDIA FACTORY E ESPECIALISTA EM MARKETING DIGITAL Pais e filhos aprendem juntos sobre as mais variadas plataformas

Coordenação

Habilidade pode ser positiva Estudos sobre a forma como os jovens dividem a atenção entre as diversas plataformas midiáticas atualmente são relativamente novos na academia. Por isso, segundo especialistas em educação, não é possível concluir se essa mudança vai gerar mais consequências positivas ou negativas. Para Ivana Montandon Soares Aleixo, professora da Escola de Educação Física, Fisioterapia e Terapia Ocupacional da UFMG (EEFFTTO), a atenção difusa pode ser considerada positiva à medida que permite que os jovens desenvolvam a habilidade de

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Além de gerar muita polêmica entre os temas educação e coordenação motora, a transformação que a geração de nativos digitais traz com seus novos hábitos de consumo de conteúdo midiático preocupa os marqueteiros. Segundo Leandro Kensky, CEO da empresa Media Factory e especialista em marketing digital, as marcas têm que descobrir o tipo específico de conteúdo que elas vão precisar disponibilizar para que as pessoas acompanhem as plataformas. “É preciso chamar atenção o tempo todo, mas de forma que o consumidor não se canse da marca”, explica. Para Kensky, que não é da geração de nativos digitais, a evolução das mídias aconteceu mais rápido do que o esperado. “Com o desenvolvimento da internet, a minha geração passou a divulgar o conteúdo dos sites na televisão. Já a geração dos nativos não tem mais que se preocupar em fazer chamadas na TV. Eles já estão presentes em todas as mídias ao mesmo tempo”. Para o especialista, é preciso ter em mente que os nativos digitais não estão conectados, eles são conectados. “Não há a distinção entre offline e online”, explica. (LA)

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realizar diversas tarefas ao mesmo tempo, de forma natural. “Para a coordenação motora, essa habilidade é ótima”, afirma. Contudo, a professora explica que, por outro lado, “a atenção mais concentrada traz uma qualidade maior nas respostas motoras de atividades específicas”. Para Ivana, é preciso fazer mais pesquisas para se dizer precisamente o que pode acontecer. No entanto, a professora afirma que, mesmo se a atenção difusa predominar as atividades dos jovens, isso não vai significar que eles não serão capazes de se concentrar. “A prática de es-

portes, por exemplo, é um ótimo estímulo à concentração. Tudo pode ser balanceado. Não é porque os jovens usam muito os aparelhos eletrônicos que essa vai ser a única coisa que eles vão fazer durante a semana”, conclui a professora. Para Priscila Augusta Lima, professora de psicologia da Faculdade de Educação da UFMG, a atenção difusa pode ser vir a ser um problema para a educação. “Para se aprofundar em algo, é preciso isolar o resto e concentrar em um só elemento. “É o que o pensamento científico exige”, exemplifica. (LA)


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