8 erros a evitar quando se adquire um cão

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D Dicas O local onde está a ninhada deve ser seguro e confortável, e os cachorros devem estar limpos e com aspeto saudável.

8quando Erros a evitar se adquire um cão (ou… como o Nikko entrou na minha vida)

Quase todas as publicações sobre cachorros têm uma secção dedicada aos conselhos sobre como escolher um cachorro. Por vezes, uma pessoa a ler esses artigos quase que fica a pensar “claro que eles sabem o que fazer e como o fazer, afinal sempre lidaram com cães. Mas nós não sabemos quem contactar, é diferente para nós!”. Por: Carla Cruz, criadora com o afixo "Aradik"

É

certo que algumas dessas pessoas já são canicultores de 2ª ou 3ª geração, mas muitos começaram sem qualquer ligações ou contactos nesse mundo, e aprenderam com a sua experiência própria, muitas vezes “batendo com a cabeça nas paredes”. A história do Nikko, o meu primeiro cão que foi adquirido intencionalmente, é uma dessas situações. E um bom exemplo do que não deve ser feito!

O meu primeiro cão

O meu primeiro cão, o Top, foi achado na rua dois dias depois do Natal de 1985, era eu uma criança. Ninguém

No dia a dia, a mãe ensina os cachorros a como se comportarem.

o reclamou pelo que, apesar de na minha família não haver historial de manter animais de companhia, ficou connosco perto de 10 anos, até morrer de velhice. Foi ele o responsável pela minha paixão pelos animais, e pelos cães em particular. Depois da morte dele, não me foi permitido ter mais cães, apesar da minha insistência durante anos a fio. Entretanto fui crescendo, e tornei-me numa pessoa extremamente introvertida, das que prefere ficar em casa a ler um livro do que sair com os amigos.

Depois do Top

Finalmente, nos finais de 1999, quase 5 anos após a morte do Top, a minha mãe lá achou que era boa ideia eu voltar a ter um cão, para ver se começava a sair mais de casa e conhecer pessoas! Ela indicou qual o orçamento disponível, extremamente limitado, e disse-me para procurar um cão. Sabia qual o tipo de cão que eu queria: um Teckel como o Top, e de pelo cerdoso, a variedade pela qual me tinha apaixonado. Apenas queria o cão para companhia – na altura não pensava em Exposições e muito menos em criar – pelo que comecei pelo sítio que me pareceu mais lógico – vasculhámos todos os refúgios para animais que consegui encontrar na minha zona. Infelizmente, não consegui encontrar um cão dentro do tipo que gostaria. A minha mãe apaixonou-se por um Drahtaar, mas era grande e ativo demais para ter uma vida feliz num apartamento. Eu apaixonei-me por um cãozito semelhante a um Pastor Australiano miniatura, mas disseram-me de imediato que esse cão não estava para adoção em virtude de já ter sido devolvido algumas vezes – isto sem me fazerem qualquer pergunta sobre o meu historial ou aptidões com cães (espero que este tipo

um cão é para a vida! para o melhor e pior...

O primeiro dia em casa

de respostas já tenha mudado para uma avaliação prévia dos candidatos!). Portanto, que fazer? Fiz o que me parecia lógico na altura – comecei a ver os anúncios nos jornais à procura de quem tivesse Teckels para venda. Telefonava e perguntava o preço. Mas o orçamento disponível limitava bastante a escolha. Finalmente encontrei um anúncio de uma pessoa, relativamente perto, que tinha Teckels para venda. Os cachorros eram novos demais, mas queria evitar que a minha mãe mudasse de ideias quanto ao poder ter um cão! E lá fui eu e a minha mãe ver o cachorro.

Primeira paragem: veterinário. Para um check-up e saber que cuidados precisava a nível de vacinações e desparasitações. Afinal, o cão nunca tinha tido qualquer tratamento veterinário, e nem tinha ainda idade para levar a sua primeira vacina! A primeira noite – normalmente a mais temida – foi um sossego! Colocámos o cachorro no local onde iria passar a dormir, na cozinha, numa cama com um cobertor, que envolvia uma botija de água quente, e perto deixámos um relógio a fazer um sonoro tiquetaque para se sentir acompanhado. Em toda a sua curta vida, o Nikko nunca se deveria ter sentido tão quente e relaxado!

A visita ao “criador”

Uma vida cheia, mas complicada

A ninhada fazia 6 semanas nesse dia. Num dos invernos mais frios da altura, os cachorros estavam num vão de estada no quintal da casa, só com um trapo para se abrigarem. Segundo o “criador”, estavam separados da mãe desde as três semanas de idade, pois alegadamente ela não tinha leite, pelo que estavam a papas de pão. Já só lá estava um casal de cachorros, os restantes tinham morrido até então. A conversa, conduzida pelo “criador”, girou toda à volta do desempenho dos pais na caça. O “criador” indicou que se quiséssemos os dois cachorros faria um desconto. Os cachorros não estavam registados (não tinham pedigree), pois alegadamente os pais eram importados e tinha havido problemas com o pedigree da mãe, que não estava a ser aceite em Portugal. Lá acertamos o preço do machito e fui para casa com o meu novo cachorro.

O Nikko foi o meu companheiro praticamente inseparável durante 10 anos, até morrer, e sentirei sempre a sua falta! Mas nem tudo foi um mar de rosas. Sempre foi um cão muito complicado na sua relação com outras pessoas. Desde que o adquiri que ele mostrou medo de pessoas – não é normal num cão de 6 semanas já apresentar reações de medo, a menos que tenha sido seriamente traumatizado. Havia algumas poucas pessoas de quem se via que gostava e com quem tentava brincar, mas nunca se aproximava a menos de 1 a 1,5 m. Quando o passeava, procurava evitar que as pessoas se aproximassem dele para lhe fazer festas, a menos que fosse ele a procurar o contacto, mas quando a minha mãe o passeava, se alguém queria mexer nele ela pegava-lhe ao colo para não fugir – claro que isso não ajudou em nada a que ele perdesse o medo de pessoas, muito antes pelo contrário. Demorou anos até ele estar à vontade no meio de pessoas.

A primeira fotografia do Nikko. 18 Cães&Companhia

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A mãe deve ter uma alimentação equilibrada e sempre à sua disposição.

O que está errado?

O que está errado nesta história toda? Tanta coisa! Vejamos algumas delas e as suas razões, com base na descrição da aquisição do Nikko.

Erro nº3

não gosta das condições? dê meia volta e saia!

Erro nº0

“A minha mãe lá achou que era boa ideia eu voltar a ter um cão, para ver se começava a sair mais de casa e conhecer pessoas” Pus esta frase como razão 0 porque apesar de não ser propriamente uma razão para não adquirir um cão, é uma chamada de atenção para as razões porque se adquire um cão. Para mim, é inconcebível viver sem um cão, mas arranjar um cão para se encontrar um(a) companheiro(a) não será provavelmente a melhor razão para o fazer! No caso de pessoas mais idosas, pode ser um bom argumento, mas possivelmente neste caso será melhor optarem por um cão mais velho, pois um cachorro será possivelmente demasiado ativo e energético.

Erro nº1

“Ela indicou qual o orçamento, extremamente limitado, e disse-me para procurar um cão” Um cão deve ser uma aquisição ponderada e, apesar do orçamento naturalmente ser importante, não deve ser o fator limitativo. Aproveite o tempo em que está a pensar adquirir um cão, a estudar as características do cão que quer e a contactar vários criadores dessa raça, para ir poupando para adquirir o melhor cachorro possível num criador que lhe inspire confiança.

Erro nº2

“Fiz o que me parecia lógico na altura – comecei a ver os anúncios nos jornais” Pesquisar os anúncios dos jornais e dos sites de classificados é provavelmente a forma mais comum de procurar cachorros. Mas é provavelmente a mais ingrata. Qualquer um anuncia nesses sites, quer bons criadores (mais raramente) quer pessoas que por uma qualquer razão têm uma ninhada da sua cadela de estimação ou de trabalho (a esmagadora maioria). Ou seja, a nível de qualidade pode encontrar-se de tudo, a nível de cuidados prestados aos cachorros também e a nível de 20 Cães&Companhia

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mas infelizmente muitos clubes demoram muito tempo a responder aos contactos e solicitações. É também importante referir que em qualquer raça há sempre criadores (incluindo de qualidade) que, por razões diversas, não estão filiados no clube de raça, pelo que não serão referenciados por estes. A imprensa especializada em canicultura (como a revista que tem nas mãos) é um meio de excelência para encontrar criadores. A maior parte dos anúncios são pagos, ao contrário da publicidade em sites de anúncios, pelo que isso, só por si, já serve como um primeiro crivo de triagem do criador empenhado relativamente ao que apenas quer despachar os cachorros que lhe apareceram em casa ao menor custo possível. Muitos criadores possuem sites, que podem ser encontrados através dos seus anúncios ou por uma pesquisa em qualquer motor de busca. No entanto, não se fie apenas num website bonito, nunca se sabe o que se esconde por trás! Visite sempre o criador que lhe interessou, veja as suas condições e os seus cães, antes de tomar qualquer decisão!

“Os cachorros eram novos demais, mas queria evitar que a minha mãe mudasse de ideias quanto ao poder ter um cão” Uma vez mais, evite as pressas quando adquire um cão. Pense bem se tem condições para adquirir o cachorro, aguarde que ele tenha a idade adequada para deixar o resto da família e se possa integrar adequadamente no seu novo meio.

Erro nº4

“Os cachorros estavam num vão de escada no quintal da casa, só com um trapo para se abrigarem. Segundo o “criador”, estavam separados da mãe desde as três semanas de idade, pois alegadamente ela não tinha leite, pelo que estavam a papas de pão”

O criador desempenha vários papéis, como o de ensinar o cachorro a brincar sem magoar.

preços idem idem aspas aspas. Poderá ter-se a sorte de se encontrar bons cães, mas mais provavelmente serão cães de qualidade duvidosa. Os melhores sítios para procurar um cachorro serão o Clube Português de Canicultura, os Clubes Caninos e a imprensa especializada. O Clube Português de Canicultura (CPC) fornece, a pedido, listagens de criadores de determinada raça. Atenção que o facto de aparecer na listagem não é uma garantia de qualidade, significa simplesmente que uma determinada pessoa ou entidade criou com dois cães registados (com pedigree) e que registou a ninhada. Compete depois à pessoa interessada entrar em contacto com o criador e usar o seu bom senso para o visitar e decidir se quer ou não adquirir o seu exemplar a essa pessoa. Mas pelo menos indica que a pessoa se preocupou o suficiente para manter a rastreabilidade dos seus exemplares, através do registo da sua ascendência Os Clubes de Raça (pode encontrar a listagem no website do CPC, em: www.cpc.pt) são também uma fonte de referências quanto criadores. Frequentemente, têm a vantagem de conhecerem melhor os criadores de cada raça (normalmente são geridos por criadores),

Se não gosta das condições em que os cães estão, dê meia-volta e vá-se embora. Levar um cão porque o coitadinho não está bem não é salvar o cão, é perpetuar o ciclo. Se a pessoa consegue vender os cães sem se preocupar com as condições em que o faz, porquê mudá-las? A própria circunstância de a maioria dos cachorros ter morrido nas primeiras semanas de vida é indicador que algo de errado se passa. Adicionalmente, os cachorros devem estar com a mãe o máximo de tempo possível, para saberem como se comportar, para aprenderem as regras de comportamento canino. Se a mãe não tem leite para os alimentar, existem numerosas alternativas, mas não devem ser removidos da sua companhia por causa disso! Claro que isso custa dinheiro, mas o criador sério e responsável irá preocupar-se antes de mais com o bem-estar dos seus animais, e não no dinheiro que irá obter ou perder ao providenciar cuidados melhores.

Um produtor apenas se interessa por vender os cães, um criador sério irá preocupar-se por avaliar o potencial das pessoas em cuidar adequadamente de um exemplar seu, irá apoiá-lo e poderá mesmo recusar-lhe a venda se achar que não é a combinação certa.

Erro nº6

“O “criador” indicou que se quiséssemos os dois cachorros faria um desconto” Isto, para mim, hoje em dia, é sempre um fator de alerta, principalmente quando a “oferta” parte do criador. É sinal que está mais interessado é em despachar os cachorros. Quando vai a uma loja comprar dois pares de calças (passe a comparação!), não está à espera que lhe façam um desconto, pois não? Pois ao comprar dois cães não está a fazer nenhum favor ao criador (como muitas pessoas acham!), merecedor de um desconto. Muito antes pelo contrário, poderá é estar a meter-se numa carga de trabalhos. Criar dois irmãos ao mesmo tempo é muito mais trabalhoso que criar um cachorro de cada vez, pois eles vão estar mais ligados entre si que aos seus novos donos e, tal como ocorre no caso das crianças humanas, dois jovens juntos lembram-se de coisas de que nenhum deles sozinho se lembraria... Normalmente com resultados desastrosos!

Erro nº7

“Os cachorros não estavam registados” O pedigree poderá parecer um snobismo para quem “apenas” quer um cão para companhia, mas na verdade é um indicador que o criador se interessa suficientemente pela sua raça para manter um certo nível de rastreabilidade dos seus exemplares. Há quem se queixe que o pedigree encarece o preço final dos cães, mas no cômputo geral não são os 18,50€ da declaração de nascimento da ninhada (portanto, amortizável pelo número de cachorros da ninhada) mais 17,50€ por cada registo individual (ou metade disto ou menos nas raças portuguesas) que vão fazer

É importante os cachorros sociabilizarem com outros cães.

uma diferença significativa nos custos de criar uma ninhada adequadamente. A menos que se dirija a um criador que em vez de procurar dar o melhor início de vida aos seus cachorros, procura sim cortar todos os custos possíveis, independentemente do impacto que isso possa ter na qualidade e saúde dos seus cães.

Erro nº8

“A ninhada fazia 6 semanas nesse dia (…) e fui para casa com o meu novo cachorro” O que está errado aqui? Com 6 semanas, os cães têm mais é de estar em casa com a sua mãe! Com esta idade já comem, mas ainda devem mamar. Seis semanas é a idade mínima para levarem a primeira vacina, que não cobre as principais doenças infecto-contagiosas, apenas a esgana e a parvovirose. Com esta idade ainda têm muito a aprender relativamente à linguagem canina, para que no futuro saibam interagir adequadamente com outros cães.

Claro que, vendendo cães com menos de 6 semanas, o criador tem poucos custos com a ninhada – não tem que pagar vacinas, praticamente não tem custos a nível de alimentação… Virtualmente todo o dinheiro que a venda do cachorro lhe render será lucro. Desconfie de criadores que propõem cachorros com menos de 8-9 semanas para venda e nunca compre cachorros não vacinados! O cachorro apenas deverá sair depois de ter tido pelo menos uma dose de vacinação que proteja contra as principais doenças infecto-contagiosas da espécie. Mesmo que o criador tenha a sorte de viver numa zona onde não há incidência destas doenças, pode não ser isso o que ocorre onde o dono vive. Certifique-se também que o seu cachorro foi desparasitado regularmente desde que nasceu (aproximadamente de 15 em 15 dias nos primeiros meses de idade, depois mensalmente). É virtualmente inevitável que os cachorros se contaminem regularmente no seu ambiente, pelo que uma profilaxia adequada é obrigatória. Os parasitas são das principais razões para os cachorros ficarem debilitados e ainda mais suscetíveis a outras doenças. Certamente não deseja adquirir o seu novo cachorro, e afeiçoar-se a ele, para o ver morrer passados dias devido a doenças perfeitamente evitáveis com cuidados sanitários adequados!

Olhando para trás...

Erro nº5

“A conversa, conduzida pelo “criador”, girou toda à volta do desempenho dos pais na caça” É bom o criador gabar-se dos seus cães, mostra que tem orgulho neles. Mas se o criador não se preocupar em colocar questões às pessoas interessadas, para tentar saber qual a sua experiência e projetos para o seu cachorro, desconfie.

por muito ansioso que esteja, a escolha do cachorro deve ser uma decisão calma e ponderada

A interação entre os irmãos da ninhada é muito importante para o seu correto desenvolvimento comportamental.

Trocaria o Nikko por outro cão? Nunca! Voltaria a adquirir um cão da mesma forma que o fiz com ele? Nunca! Muitos dos problemas que ele teve ao longo da vida podem ser rastreados até às suas primeiras semanas de vida, e teriam sido perfeitamente evitáveis se tivesse ido buscar o meu cachorro a um criador responsável e que se preocupa com o correto desenvolvimento físico e comportamental dos seus cachorros.D Cães&Companhia 21

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