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Uma história de Conversão, Amor e Missão

No dia 25 de Janeiro, Conversão de São Paulo, Apóstolo, justamente nessa mesma data, há onze anos, eu faria uma viagem que, como Paulo, mudaria totalmente a visão do mundo em que vivia. Como o apóstolo, foi uma conversão a partir da Luz. Movida pelo amor ao Evangelho e à missão, me coloquei a caminho da travessia para um outro continente. Atravessei o Oceano Atlântico para chegar ao Índico. Minha viagem foi bem diferente dos meus ancestrais. Vim confortavelmente de avião e outrora eles(as) num porão de navio… Com esse pensamento latente a cada segundo, fiz toda a viagem. Cheguei em Moçambique pela primeira vez em 26 de Janeiro de 2012, mas lembrome da primeira ideia de viajar para o país, provocada pelo Pe. Pedro Léo Eckert, como se fosse hoje. Ainda vejo nitidamente em minha memória aquela imagem da savana africana a partir do avião ao pousar. Sinto aquela mesma emoção ao pisar no solo africano como se fosse agora.

Como descrever ao leitor(a) desse texto a experiência vivida em longos 11 anos de missão em Mecubúri? Pois bem… diante de uma realidade tão controversa, como leiga missionária, ouso partilhar alguns elementos constituintes da missão que a minha memória amou e agora é eterna.

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A Acolhida: Cheguei em solo moçambicano. Um choque de realidade nua e cruel logo se apresenta, porém tudo era tão familiar e, ao mesmo tempo, diferente. Mas afirmo que me encontrei entre “os meus”. Me senti em casa. Na cor e na raça. Na vida sofrida e querida. Na festa e na dor! Ser esperada e acolhida por gente tão especial ao meu coração me deixa confortável para dizer: “é aqui que eu amo… é aqui que eu quero ficar”. E ainda hoje, em todos os dias, ser acolhida em diferentes lugares com sorrisos fáceis e aquele olhar que envolve e comove, fortalece a vontade de ficar por aqui e fazer da missão minha razão de existir!

O encontro: Experimentar o encontro africano foi determinante para minha entrega na missão. Aqui o Encontrar não é só estar perto, não é só passar um pelo outro. É ter a preocupação de parar e cumprimentar, saudar e perguntar pela saúde, pela família e pelo trabalho. Um encontro moçambicano desconcerta o jeito apressado e corrido que os latinos trazem no corpo. Um encontro moçambicano promove o cuidado e a forma de estar com outra pessoa!

Os sentimentos: Ser estrangeira e estranha na terra do(a0) outro(a) provocaram-me diferentes sentimentos ao longo desses 11 anos. Porém, o mais forte ainda é o Amor. Testemunhar a luta pela sobrevivência do povo macua em Mecuburi me fez crer no Amor Maior que se faz presente em qualquer situação de vida e de morte. “Sim, é por amor à vida que encaramos de frente” todas as formas de ameaça à vida. Aqui, por amor doei e ainda doarei a saúde, a inteligência e a coragem de estar neste chão sagrado!

A comunidade: Desde que cheguei, tive que aprender, dentro de casa, o estilo da vida comunitária em sua mais escancarada forma de ser. Ser mulher com toda intensidade que carrego em mim junto com os homens padres que trazem tanta vida e entrega missionária. Todo dia aprendo com eles. À toda comunidade foi necessário se adaptar às restrições alimentares, de saúde e higiene impostas pela realidade social e econômica do lugar. Mas percebi também que, fora da nossa casa, tudo neste lugar é comunitário. A dimensão comunitária me fez aprender e acolher um novo jeito de ser e estar em grupo. É na comunidade que a pessoa se faz e refaz. É também na comunidade que a pessoa existe e sobrevive. Ter um lugar na comunidade é referência de vida segura.

A cultura: Para acolher a missão é preciso se fazer cultura neste lugar. As nossas diferenças não nos afastam da cultura local, basta vivê-las de coração aberto. Saber inculturar-se fez toda a diferença na minha escolha de viver aqui. A cultura com suas crenças de valores familiares move toda gente neste lugar. Cerimônias e cerimoniais que me emocionam de maneira única sempre me deixam surpresa. Sempre ouço: “É nossa cultura africana”… Enfim, para mim essa frase tem um força enorme e diz muito!

A paisagem: A savana africana me prendeu a atenção logo no primeiro olhar. Os relevos das imponentes montanhas, em que cada uma tem seu nome. A fauna e flora desse lugar possuem uma das energias mais fortes que experimentei. Me sinto envolvida por essa paisagem e à ela me entrego todos os dias, pois a vejo como obra amorosa de Deus para a humanidade que aqui vive. A estrada de chão que me faz sair da casa da missão e ir para o trabalho me reconecta todos os dias com a paisagem que faz esse lugar ser tão especial.

As pessoas: Cada ser é único neste coração africano. Quem me fez gente de cá foram as pessoas que me acompanham desde o primeiro dia que aqui cheguei, até as pessoas que conheci depois e permanecem ainda hoje e para sempre em meu coração. “Toda pessoa sempre é a marca das lições diárias de outras tantas pessoas”. Eu aprendi a sentir as pessoas dessa missão como um coração de Deus que bate todos os dias me acordando para a vida. São elas e suas vidas e realidades que me constroem e reconstroem cotidianamente. Por essas pessoas simples e importantes que venho partilhar os dons para que o mundo seja melhor, ao menos nessa parcela da humanidade em que estou missionária.