Antologia Brasil, 1890-1930

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vigor que não tinha na sua forma comum, cheia de elementos insignificantes, confusos e inúteis que enfeiam a forma empobrecendo a ideia. O verdadeiro fim da Arte, a verdade do ideal, não é senão a representação das manifestações do sublime que se revelam nas concepções do espírito, nos sentimentos da dor e dos prazeres nobres e profundos da vida moral. O natural, o verosímil, a fidelidade nos produtos da inteligência não é a cópia servil e moldada do objeto que se retrata: mas sim, a representação da sua forma perfeita, despida das incorreções do finito, desenvolvida nas harmonias complexas da sua natureza, cujos traços purificados, livres das irregularidades do acaso, exprimam, com as revelações da alma, o fim da sua existência física e moral muito menos claramente que as produções da terra. Limitar a ação do artista ao pueril empenho de reproduzir nas suas obras a beleza da natureza material, sem isentá-la dos acidentes que a acompanham, era desconhecer que a melhor cópia fica sempre aquém do original; e que quanto mais exato é o transunto menor é o sentimento de admiração que por ventura causa. O que cativa, surpreende e arrasta o espectador na observação das obras da Arte, não é a verdade da cópia com o molde, senão a criação do espírito. — A precisão da cópia das belezas da natureza deleitará talvez os olhos daqueles que, no seu viver contemplativo, não podem elevar-se além da esfera da materialidade, porém, não satisfará jamais as ambições máximas da alma do poeta e do artista. Na Arte, como na poesia, não se quer a realidade material e positiva da forma fria e inerte como fim, nem o vago incompreensível da metafísica perdida no azul do espaço; ela exige, nas aparências do real, uma imagem da verdade, elevada por alguma coisa do ideal que a alma encontra dentro do seu próprio ser. Se assim não fosse, o daguerreótipo teria matado o desenho para o retrato, a perspectiva para a paisagem; e os seus escorços seriam mais perfeitos e belos, constituindo-se a rigidez do contorno um elemento de beleza; as suas imagens, porém, são frias, e a expressão fisionômica desnaturada é estúpida e hirta como a do cadáver.

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