Antologia Brasil, 1890-1930

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porque para isso bastará pendurar em três ou quatro salões mais afamados uma meia dúzia dos seus admiráveis retratos. Eis aí como se salva uma classe. Nas outras profissões, é raro o amador vir a ser alguma coisa. Beirando o abismo do ridículo, perde o passo, hesita, oscila, mas rola sempre. Todo o amador se supõe um inspirado e despreza a técnica. Considera o profissional um ser mercantil ou um medalhão. Levado por esses sentimentos e convicções, comete horrores. Aqui, os amadores, os curiosos proliferam, e alguns revestidos de aspectos imprevistos. É frequente encontrar-se o advogado que, nas folgas do foro, faz os seus poemas chistosos ou os seus contos humorísticos, e publica-os, sob pseudônimo, em folhas facetas; o médico que, no intervalo de duas receitas, compõe dois compassos de música e o engenheiro que escreve sainetes para um teatrinho particular. Isso nada é, porém, porque pode ser tomado como elasticidade de espírito. De resto, no Brasil, certas profissões não se aguentam isoladas. É necessário dobrá-las, amparando-as em outras mais sólidas. Aqui nenhum artista vive exclusivamente da sua arte. A classe pior é aquela incontável, infinita e talvez eterna dos homens que se intitulam profissionais, mas que não passam de amadores definitivos. É fechar os olhos e estender a mão: agarrou um curioso ou mesmo uma curiosa, o que vem a ser ainda mais grave. De letras ou de pintura, de medicina ou de mecânica, de estatuária ou de música, de oratória, de religião ou de política, não somos, em muitas ocasiões, mais do que um vasto, perfil e variado mostruário do diletantismo. Oscar Lopes 288

A semana, 1 911


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