Antologia Brasil, 1890-1930

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Deveremos nos submeter passivamente aos caprichos dos industriais e, servis, auxiliá-los na propaganda de seus produtos reproduzindo-lhes os anúncios: ― guardar em nosso arquivo uma paisagem aviltada com os rabiscos insólitos dos fios condutores que absorvem toda a beleza, roubando-lhe o caráter local, a espontaneidade e a poesia? Devemos sujeitar-nos sem reação às intempestivas colaborações com que certas autoridades pseudo-artísticas insultam os sítios mais formosos da nossa cidade, enxertando os clássicos troncos falsificados em cimento junto a cascata travessa ou sob as copas majestosas da floresta virgem, e cuja presença basta para conferir ao todo o aspecto postiço dos cenários das apoteoses das "féeries" do Phenix? Num momento de êxtase vemos no espelhado das águas tranquilas os novelos nevosos das nuvens que servem de anteparo à folhagem plumosa das palmeiras, e, sem mais demora, gravamos na placa a cena que nos arrebatou. Mas, terminadas as operações da câmera escura, quando examinamos o quadro que tanto nos havia empolgado, eis nos desiludidos: se a nossa objetiva era corrigida de qualquer aberração, teremos a plumagem macia das palmeiras transmutada em agressivos feixes de lanças e o tapete vicejante da relva tornou-se em solo amaldiçoado, forrado de espinhos e punhais, de uma cor escura como a desilusão do artista; se usamos de placa ortocromática com o filtro compensador, os raios de sol que aqueciam a relva transformam-se em camadas de neve; se apelamos para as objetivas anacromáticas, aparelho opticamente defeituoso que desenha as imagens com uma faixa de arco-íris, obteremos a suavidade da paisagem, mas estamos atentando contra a verdade fotográfica, intervindo opticamente, e demais os valores falseados por falta de ortocromatismo... ― E apesar de tudo, no nosso exame que exige insatisfeito a reprodução do quadro que a nossa fantasia vestiu de sonho, sentimos a falta de uma luz petulante sobre o espelho das águas, e não nos agradará a escuridão do fundo..., e abandonaremos a fotografia, braços cruzados, concordando com o estigma de E. Bayard? "La photographie n'est jamais émue, voilá pourquoi elle n'émeut pas"... Não! ― A arte exige uma seleção que não é feita só com os olhos, mas principalmente com a alma, e nem a lanterna de Aladim poderá materializar a máquina que reproduz a natureza tal como a nossa

Os meios de expressão, 1 927


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