Mídias Sociais e Eleições 2010

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Editorial Publicação 2011. Marcel Ayres, Renata Cerqueira e Tarcízio Silva

Título: Mídias Sociais e Eleições 2010 Autores: Adriana Cristina Omena Dos Santos Ana Brambilla Ana Maria Bicca Andreia Martins Anna Paula Castro Alves Carlos Manhanelli Carolina Tomas Batista Claudiana Silva Danila Dourado Eliane Fronza Fernanda Fabian Gabriela da Fonseca Gil Castilho Larissa Oliveira Leandro Mazzini Luiz Marcos Ferreira Júnior Marcel Ayres

Mariana Oliveira Martha Gabriel Murillo de Aragão Natália de Oliveira Santos Nina Santos Patrícia Rossini Renata Cerqueira Ruan Brito Samantha Shiraishi Sueli Bacelar Tarcízio Silva Direção de arte: Caio Sá Telles Danila Dourado Rodrigo Lessa

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Nina Santos é assessora de comunicação política e pesquisadora do Centro de Estudos Avançados em Democracia Digital e Governo Eletrônico (CEADDUFBA). Atua especialmente com estratégias políticas online, gerenciamento de perfis online, assessoria de comunicação online e campanhas online.

Ruan Carlos Brito é publicitário (UFPA), mestre em Comunicação e Cultura Contemporâneas (UFBA), especializado em Comunicação e Política (UFBA). Atua nas áreas de Marketing Eleitoral, Assessoria de Comunicação Política, Gerenciamento e Monitoramento de Mídias Sociais.


Apresentação

Em um momento em que qualquer pessoa com acesso a determinadas tecnologias e habilidades técnicas tem a possibilidade de registrar e compartilhar suas impressões de mundo, opiniões, gostos, desejos e satisfações, também surge outra possibilidade de se construir a história. De forma colaborativa, cada usuário de internet realiza, em menor ou maior grau, um grande registro dos acontecimentos de seu tempo.

Expectativas e comparações com as eleições americanas de 2008 foram inevitáveis, mas, entre os extremos do otimismo e do pessimismo, profissionais e cidadãos brasileiros fizeram sua própria história. Este ebook, organizado e escrito por pesquisadores teóricos e práticos de comunicação política e/ou comunicação digital, é uma iniciativa para registros referentes às eleições de 2010, servindo de insumo às diversas classes de atores sociais envolvidos no Em 2010, foi a vez de uma grande massa de processo: assessores, marketeiros, consulcidadãos, individualizados em seus usos da tores, jornalistas, políticos e cidadãos. internet, observar, criticar e interferir nas eleições brasileiras. Com as possibilidades e A proposta deste e-book é reunir diferentes as restrições de uma legislação eleitoral que olhares daqueles interessados em examinar não podia mais ignorar os avanços na des- e refletir sobre o papel que as mídias sociais centralização da comunicação, novos desa- podem exercer nos processos eleitorais. fios e oportunidades se apresentaram para Com isso, pessoas com diversas formações os brasileiros. e trajetórias, profissionais e estudantes, au-

tores convidados ou selecionados por Chamada de Trabalho, apresentam neste material suas formulações, entendimentos ou estudos de casos que relacionam as tecnologias online às eleições brasileiras. Reunimos aqui variadas e ricas abordagens sobre esta temática tão fascinante e desafiadora para qualquer pessoa que se proponha a compreender as características de nossa sociedade e de nossa época. Esperamos que este e-book funcione como um apanhado teórico e prático, diversificado e amplo, que contribua com o debate acerca das mídias sociais e dos processos políticos no Brasil.


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Mídias Sociais e Eleições 2010 Convidados 06. Redes sociais e eleições em 2010 08. De @Candidato para @Eleitor. Enter! 11. Mídias Sociais e as Eleições Brasileiras de 2010 14. A influência da campanha Obama nas eleições brasileiras de 2010 21. Comunidades do Orkut sobre Presidenciáveis nas Eleições Brasileiras de 2010 29. O papel da militância através das redes sociais durante as eleições 38. Democracia, eleições e redes sociais online: uma possibilidade de pluralização do diálogo 45. Branded Content nas Eleições 2010 57. Interface entre Jogos Sociais e Política: Oportunidades e Estratégias de Diferenciação 66. Monitoramento de Conversações sobre Políticos: prática, limites e possibilidades 71. Blog do Terra sobre Mídias Sociais e Eleições 76. A cobertura da primeira campanha on line na redação de A TARDE 81. Controle e Espetáculo - Privacidade & Transparência na Política e Eleições

Selecionados 89. A interação e a mobilização nas redes sociais dos três princiais presidenciáveis 97. Candidatos Virtuais: O oficial e o oficioso no ciberespaço 104. O papel do blogueiro e o engajamento espontâneo nas eleições 111. O Twitter e as Campanhas Políticas: Uma Análise da Conversação dos Presidenciáveis 117. O Uso do Twitter pelos Presidenciáveis 126. Participação política na Era Digital: um estudo de caso das #Eleições2010 135. Midias sociais e a aproximação do eleitor com o candidato 142. A campanha virtual pode ser igual para todos os candidatos? 148. Política? “E eu com isso?” 151. A relação entre redes sociais na internet e o certame eleitoral no Brasil


Redes sociais e eleições em 2010 Por Murillo de Aragão

Advogado, jornalista, cientista político e presidente da Arko Advice Pesquisas e sócio da Aragão-Osório Advogados Associados. É Formado em Direito pela Faculdade de Direito do Distrito Federal, é mestre em Ciência Política pela Universidade de Brasília e doutor em Sociologia (estudos latino-americanos) pelo Ceppac – Universidade de Brasília. Em 2007, foi nomeado pelo Presidente da República para o CDES – Conselho de Desenvolvimento Econômico e Social. É ainda articulista em vários veículos de imprensa, por exemplo: jornal O Tempo (Belo Horizonte), jornal O Liberal (Belém), Blog do Noblat, revista Conjuntura Econômica (FGV), entre outros. www.arkoadvice.com.br www.blogdomurillodearagao.com.br www.twitter.com/murillodearagao

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inalmente, a internet e as redes sociais tiveram um papel mais relevante nas eleições brasileiras. Porém, como bem disse Pedro Doria em artigo no Estadão (31/10/10), ninguém venceu na rede. O empate entre os candidatos nesse meio de comunicação revela que, no limite, as redes sociais não favoreceram ninguém nem foram decisivas para o resultado final. O Brasil de 2010 ainda é um país em que a penetração da internet é baixa, apesar da vocação do brasileiro para a rede e do seu potencial de crescimento explosivo. Sendo assim, não houve qualquer episódio nas redes que modificasse de modo claro e decisivo as tendências do processo eleitoral. No futuro, no entanto, não deverá ser assim. Alguém diria, de pronto, que a campanha de desinformação em torno de Dilma Rousseff e o tema do aborto podem ter-lhe roubado votos na reta final do primeiro turno. Mas o estrago causado pela ação na web foi bem menor, por exemplo, que a maciça cobertura da mídia eletrônica em torno do caso Erenice Guerra.


Mídias Sociais e Eleições 2010 A situação seria diferente se tivéssemos um empate técnico, no qual “detalhes” como as redes sociais poderiam pender em favor de um ou de outro candidato. Ao pontuar tais aspectos volto a dizer que a internet e as redes sociais foram importantes, mas não decisivas. A campanha teve aspectos interessantes ligados à internet e às redes sociais e que merecem destaque. O fato que mais me chamou a atenção foi o uso do twitter na mobilização da militância partidária e de simpatizantes dos candidatos. No caso brasileiro, é o que importa: mobilizar enormes contingentes eleitorais em favor de uma candidatura. O twitter também serviu para informar eventos e antecipar direções. Em especial, para repercutir as prévias das pesquisas, abundantemente comentadas na rede. Um segundo fato é que o uso da internet na disseminação da informação teve no anonimato o seu pior e mais perverso aspecto. Nesse sentido, alinho-me a Arthur Schopenhauer, que dizia que o anonimato serve para tirar a responsabilidade daquele que não pode defender o que afirma. O anoni-

mato na internet é um grave problema que trução de tendências e, claro, para a definitermina por minar a própria credibilidade ção de resultados eleitorais. do meio. No futuro, vejo a credibilidade das redes sociais sendo avaliadas por seu grau de transparência. Na prática, o Código Penal não vale na internet e, de forma esperta, alguns grandes sites e redes se escudam nas legislações mais complacentes do mundo para não atuar de forma enérgica contra a prática de crimes que envolvem a honra. Aos românticos, o anonimato tem um doce sabor libertário. Quando se está a favor, tudo é lindo e maravilhoso. Porém, quando se é vítima de difamação e calúnias é como sofrer de bullying sem saber a identidade de seus agressores e sem ter a quem reclamar. Como há complacência nas redes, poderemos ter, como efeito colateral, ações restritivas no âmbito regulatório. Não devemos esquecer que vai haver uma discussão sobre o marco regulatório da internet no Brasil. Eleitoralmente falando, a questão é importante, já que no futuro as redes sociais e a disseminação de informações por outras mídias terão peso ainda maior para a cons-

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De @candidato para @eleitor. Enter!

á duas verdades incontestáveis sobre a relação entre internet e política depois das eleições de 2010. Ela veio para ficar e vai ganhar mais importância; e, da forma como foi usada, atrapalhou mais que ajudou.

Por Leandro Mazzini

É fato que as mídias sociais ganham espaço a cada dia, a cada momento, a cada minuto em que você atualiza uma página do Orkut, Facebook, YouTube, Twitter e afins. Há poucos anos, era inimaginável um político trocar o seu famoso “santinho” por uma boa foto sorridente em uma página pessoal criada especialmente para a campanha. Aconteceu, como num clique. Primeiro, porque a minirreforma eleitoral realizada em 2007 mudou muito as campanhas, limpou as ruas de faixas e folders e outros materiais publicitários. Segundo, porque a inclusão digital cresceu incrivelmente – e ainda ocorre, neste momento – com a demanda por computadores, os investimentos das telefônicas em internet e transmissão de dados, e o projeto do próprio governo federal em implantar banda larga (para valer).

Dez anos de experiência no jornalismo on-line e impresso, em coberturas políticas no Rio de Janeiro (2000 a 2006) e Brasília (2007 até hoje). Desde 2007, assina o Informe JB, hoje no Jornal do Brasil Digital – coluna distribuída para diários do Paraná, Sergipe, Pará, e blogs de todo país. Comentarista da Rádio Digital News e da REDEVIDA de Televisão, no Jornal da Vida, em rede nacional, com boletins direto do Congresso ou do Palácio do Planalto. Apresentador do programa de debates semanal Tribuna Independente, ao vivo e em rede, na mesma emissora. Autor do livro “Corra que a Política Vem Aí” (2010). www.leandromazzini.com.br www.jblog.com.br/informejb.php www.twitter.com/leandromazzini


Mídias Sociais e Eleições 2010 Todos esses fatores colaboraram, então, para que nas últimas três eleições (e isso conta os pleitos municipais) os candidatos trocassem o papel pela tela, o comício pelo spam, o discurso pela mensagem online, e até o corpo a corpo por trocas de emails, comentários no blog, além de postagens no Twitter. É o novo modus operandi das campanhas eleitorais, um irreversível avanço na comunicação e no elo entre o político e o eleitor – embora a internet possa, por outro lado, iniciar um processo de distanciamento entre o candidato e o cidadão. Acredito que isso vá acontecer, e poderá tomar rumos ainda misteriosos se a sociedade não cobrar a aproximação, ou seja, o aperto de mão e os olhos nos olhos. A internet é um mundo virtual maravilhoso que também tem suas armadilhas. Obviamente, em muitos casos ela nos priva da realidade. Mora aqui, logo, o fato de, em 2010, a rede eletrônica ter sido usada de tal forma maléfica – por maledicentes ocultos, publicitários e inclusive políticos mal intencionados – para prejudicar adversários. Não foram poucas as mensagens de falso conteúdo disparadas por e-mail para milhões de eleitores, disseminando inverdades

sobre presidenciáveis, candidatos a governadores e deputados. Tudo em nome do dinheiro, a mentira pelo poder. Gasta-se com esse método – marqueteiros renderam-se a este mecanismo –, há invasão de privacidade – seu endereço eletrônico é distribuído ilegalmente não se sabe como –, e quem perde é toda a sociedade. Além dos próprios candidatos, que, em vez de focarem o discurso propositivo, perderam valiosos minutos em programas de rádio, TV, nas ruas e na própria internet para desmentir cenários e citações falsas que se renovavam a todo dia. Perdeu o eleitor, por acreditar nelas e espalhá-las para seus contatos. Esse é o lado ruim da internet no país. Paga-se um preço por isso: não há uma lei que regulamente o uso da rede no Brasil. É um assunto delicado, os parlamentares sabem. Qualquer citação disso numa tribuna de plenário e vira-se alvo de ataques que remetem a uma palavra perigosa numa democracia: censura. Por ora, vê-se o que vê na internet porque não houve um debate sério, dedicado e minucioso sobre as redes sociais. E, pelo que se viu na campanha, não interessa a ninguém por ora. Cria-se um fato para prejudicar um adversário e, até que se pro-

ve o contrário, o sujeito perde uma eleição. É a nova guerra política, a virtual. Dentre todos os websites, inegável apontar o Twitter como o mais avassalador neste cenário político. Em todos os sentidos. Para o bem ou para o mal. O Twitter virou um meio de comunicação social, em que encontramos comunicados oficiais de governos e políticos antes mesmo que estes anunciem nos meios tradicionais. Vê-se o exemplo deste poder do canal nos números de seguidores – na primeira quinzena de dezembro de 2010, eram 1,3 milhão de seguidores para os três principais presidenciáveis que disputaram o pleito. Obviamente, um número pequeno, 1% dos eleitores, mas significantemente forte, por se tratarem de multiplicadores de opinião na rede social e na internet como um todo. Se, antes, um “santinho” passava por poucas mãos, agora uma mensagem virtual chega a centenas, talvez milhares de eleitores, em apenas um clique e em poucos minutos. A urna eletrônica e sua apuração acelerada foram um avanço. Mas já é pouco diante do crescimento da internet e suas redes sociais, com sua conectividade acelerada e a essen-

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cial interatividade. Chegará um dia, e será breve, em que o cidadão poderá votar numa eleição seguramente pela internet, ou pelo celular – via torpedo ou voz. Como existem vantagens e desvantagens, o perigo desse mundo novo que engole as campanhas é que a relação entre o candidato, o eleitor e a democracia se torne tão virtual quanto a tecnologia que já domina a política.

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Mídias Sociais e as Eleições Brasileiras de 2010 Por Carlos Manhanelli

Jornalista, Publicitário, Radialista, Administrador de empresas. Especialista em Propaganda e Marketing pela ESPM, em Ciências Políticas pela FESP, MBA em Marketing pela USP e Mestre em Comunicação Social pela Universidade Metodista de São Paulo. Professor titular na cadeira de Comunicação Política e Marketing Eleitoral no curso de pós graduação (Maicop) da Universidade Pontifícia de Salamanca na Espanha. Presidente da ABCOP - Associação Brasileira dos Consultores Políticos e Assessores Eleitorais. Autor de livros como Estratégias Eleitorais e Marketing Político (1988), A Propaganda Política no Brasil Contemporâneo (2009) e Marketing Eleitoral o Passo a Passo do Nascimento de um Candidato (2010). Palavras-chave: Marketing, Campanhas, Candidatos, Mídias Sociais www.manhanelli.com.br www.marketingpolitico-manhanelli.blogspot.com www.twitter.com/manhanelli

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maginavam que no Brasil o sucesso das mídias sociais seria proporcional ao que ocorreu nos Estados Unidos. Pensavam que o povo iria correr para seus celulares interativos, computadores e notebooks atrás de informações sobre seu candidato preferido, como se este fosse um ídolo do futebol, ator famoso ou um rockstar. Acharam que a dona Maria e o tio Zé – que assistem novelas, o jornal por embalo e desligam a TV quando a conhecida tela azul com letras em branco anuncia que a lei número 9.504/97 entra em ação com seu horário eleitoral gratuito – se dariam ao trabalho de buscar motivos para acreditar e votar em um candidato na internet. Aliás, dentro desse contexto, no de acreditar, foi um dos motivos pelo qual deu tão certo a campanha virtual de Obama: a esperança. Foi o que alimentou e, principalmente, moveu as pessoas naquele país a trabalhar em prol do candidato democrata e acessar a internet e até colaborar financeiramente com débitos em cartões de crédito. Sendo a primeira vez que se usaram, na sua plenitude, as ferramentas da internet


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em uma campanha eleitoral aqui no Brasil, nada se tem de muito concreto sobre como funcionam – se funcionam – as mídias sociais por aqui no âmbito político ou eleitoral. Houve partido que fez desembarcar por essas terras o norte-americano Ben Self, sócio da Blue State Digital, responsável pela movimentação na rede de computadores da campanha de Barack, acreditando naquela antiga máxima “O que é bom para os E.U.A é bom para o Brasil”. Ledo engano.

ções. Estamos vivenciando um grande laboratório virtual nas campanhas eleitorais no nosso país.

Só faltou levar em conta que eram realidades distintas, e avisar essa turma que nem tudo que serve lá serve aqui também. Entretanto, uma experiência pioneira que se mostrou muito acertada foi o debate online entre presidenciáveis na internet brasileira que ocorreu dia 18 de agosto de 2.010 no teatro da PUC-SP, em uma parceria entre o portal UOL e o jornal Folha de São Paulo.

Outro motivo foi que a maioria das pessoas que tinham acesso à internet era contrária as candidaturas que se apresentavam, apesar da penetração dos candidatos serem muito forte entre os jovens. Por receio de entrar com mais intensidade nesse meio, não se aplicou muito empenho e dinheiro às mídias sociais durante essa campanha.

Foi algo que realmente movimentou as redes sociais e quem se interessava por política, o que converteu a contenda em algo de alto nível. Algo de grande interatividade e dinâmica. Este é ainda um ano de experiências para o Brasil no campo das mídias sociais e suas aplicações na política e elei-

O mesmo temor houve em uma campanha para deputado estadual no interior do Estado de São Paulo. Por preferir não se arriscar nesse plano, direcionou-se a verba para outras esferas da campanha e simplesmente ignorou-se a “moda” das mídias sociais.

No Amapá, foi minguada a implantação da campanha virtual para o cargo de governador. Isso ocorreu, pois, entre outras coisas, nesse Estado não há conexão por Banda Larga, o que torna pouco atrativo passar o dia brigando com a lentidão do velho modem discado.

Em outra mão, outro aspirante a um cargo na Assembléia Legislativa de São Paulo, um senhor, na casa dos 70 anos idade, que não tinha boa penetração entre o eleitorado jovem, decidiu entrar nesse campo. Foi criado um perfil no Orkut na tentativa de aproximá-lo desse público. Resultado: em dois meses dois perfis do candidato ficaram cheios, lotam de acessos e geram interatividade com o deputado. Surpresas de campanha eleitoral. Há, inclusive, campanhas e candidatos que se tornam um dos assuntos mais comentados na rede. Isso se passou com um candidato a deputado federal por São Paulo (Tiririca), que se tornou, pelo menos durante uma semana, o nome mais comentado no Twitter. No Youtube, os vídeos desse mesmo candidato com seus pedidos de voto no horário eleitoral gratuito são campeões de audiência na categoria. Outros apelaram para o SPAM causando indignação entre os eleitores pelo número recebidos, de todos os lados, vindos de amigos, parentes, colegas de trabalho em uma militância mal-direcionada, dos próprios candidatos comprando maillings e


Mídias Sociais e Eleições 2010 disparando a torto e a direito sua “propaganda virtual”. Na rede social Twitter, por exemplo, há uma profusão de protestos nesse sentido. Algumas pessoas reclamam de receber até 50 emails por dia com esse teor. É caso clássico para analisarmos por que envio de email não solicitado, também chamado de SPAM, simplesmente não funciona. Utilizando o email marketing político da maneira certa, ele até pode ser vantajoso, pois estreita e deixa mais intimo o contato entre candidato e eleitor e serve como fonte de notícias e avisos sobre datas de comícios, debates, pesquisas, etc. principalmente aos militantes. Em outras palavras, é útil para quem se interessa. Por outro lado, quando emails não solicitados com teor político chegam às caixas de entrada quase sempre são mal-recebidos. A não ser que você concorde plenamente com o conteúdo daquela mensagem eleitoral e, detalhe importante, não se importe nem um pouco de receber spam, você não vai mudar seu voto baseado no conteúdo de um email. Isso quer dizer que na grande

maioria dos casos aquele simples email só vai causar incomodo. Sabemos que as pessoas enviam esse tipo de mensagem, com a melhor das intenções, mas, de bem intencionado a detenção está lotada, esta mensagem continua sendo spam. O conceito de Spam é: todo email não solicitado e enviado em massa. Curto e grosso. Você pode presumir que todos na sua lista compartilham das suas idéias, mas é bastante provável que isso não seja verdade, principalmente em se tratando de assuntos eleitorais. Só vamos obter o verdadeiro resultado do uso dessas ferramentas durante as campanhas, e fazer com que elas se tornem votos ou doações para campanhas, quando todas as ferramentas forem testadas aqui no Brasil. Como tudo ainda é muito novo, e mais da metade da população brasileira não tem acesso à internet, qualquer conclusão será apressada, provavelmente incerta e provavelmente incorreta. Ainda estamos no laboratório. O remédio pode matar se aplicado, sem os devidos testes, em campanhas eleitorais.

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A influência da campanha Obama nas eleições brasileiras de 2010 Por Mariana Oliveira

Mariana Oliveira é Analista de Pesquisa e Métricas na Talk Interactive e formanda em Comunicação pela Universidade Federal do Rio Grande do Sul Atuou na campanha presidencial de 2010 como parte da equipe digital do candidato José Serra, na área de Monitoramento e Métricas em Mídias Sociais. Palavras chave: campanha política, mídias sociais, monitoramento, democracia digital marianarrpp@gmail.com twitter.com/marianarrpp marianarrpp.wordpress.com google.com/profiles/marianarrpp

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quase impossível falar sobre a influência das mídias sociais nas eleições sem que a palavra “Obama” venha à cabeça. A estratégia digital da campanha realizada pela equipe de Barack Obama em 2008, nas eleições norte-americanas, se tornou parâmetro de sucesso para qualquer campanha política que a sucedesse. Palestras, livros, documentários, entrevistas, posts em blogs, artigos acadêmicos: a campanha digital norte-americana foi retratada, discutida e analisada em inúmeras instâncias, sendo considerada por especialistas como uma das grandes responsáveis pela vitória do candidato democrata nos EUA. As estratégias adotadas foram minuciosamente estudadas por profissionais do mundo inteiro, como modelo a ser exportado. E é aí que entra o Brasil na história, a disputa presidencial de 2010 e as mídias sociais. Como se daria essa relação? A expectativa era grande – bem como as responsabilidades, também. E antes de qualquer definição oficial sobre candidaturas ou coligações, já circulavam questionamentos de analistas do cenário político e principalmente dos especialistas de comunicação: como o Brasil,


Mídias Sociais e Eleições 2010 com seus milhões de usuários de Internet, vai utilizar esse potencial de audiência, compartilhamento e relacionamento nas estratégias das campanhas? Repetirá o sucesso da campanha de Barack Obama? Os eleitores terão acesso a mais informações sobre seus candidatos, ajudando no processo transparente de escolha do voto? Estes eleitores poderão se auto-organizar em movimentos políticos através da web? Os candidatos vão usufruir do potencial de troca e conversação da web que, além da quebra de barreiras geográficas, possibilita uma aproximação maior do político com sua base eleitoral? Todas estas questões circundavam não só a cabeça do estrategista de campanha política, mas também a do eleitor conectado e interessado em saber como a internet contribuiria para a consciência política do país, ambos se deparando com um ambiente novo de construção de relacionamentos e conversação com eleitores. É possível comparar as campanhas? Como dito anteriormente, a estratégia digital da campanha Obama já foi revista e debatida muitas vezes, em diferentes de formatos. Desde a simples criação e alimentação de

perfis oficiais nas principais mídias sociais (e uma dedicação especial para a conta oficial do candidato no Twitter, o que chamou a atenção de muitos descrentes no poder da ferramenta) até a criação de uma rede social online própria - a MyBarackObama.com que possibilitava a interação entre seus participantes, a estratégia digital da campanha de Obama é a maior referência de sucesso de ferramentas de mídias sociais em uma campanha política. O problema de adotar esse modelo cegamente é que desconsideraríamos as diferenças estruturais entre o processo político do Brasil e o dos EUA, ignorando questões fundamentais, como: a não-obrigatoriedade do voto nos Estados Unidos e a consciência política da população; a estrutura político-partidária dos países (que é completamente diferente, principalmente pela dicotomia presente nas eleições norte-americanas) e o processo de escolha dos candidatos dos partidos, já que no Brasil estes são decididos apenas pelos membros políticos das coligações e, nos Estados Unidos, são eleitos nas prévias com voto popular dos filiados aos partidos; o sistema de financiamento das campanhas e os recursos para propaganda eleitoral (as cotas

televisivas gratuitas, por exemplo, inexistem na campanha norte-americana, o que exigiu maior atenção aos investimentos em estratégias para o mídia digital). A lista de diferenças fundamentais entre o processo político no Brasil e nos Estados Unidos é extensa e, por si só, já seria justificativa para que a campanha digital de Barack Obama não servisse de parâmetro para a campanha digital dos candidatos a cargos públicos no Brasil. Mas outros fatores também devem ser destacados nessa análise comparativa: não bastam as diferenças entre os processos políticos nos países, ainda devemos considerar o enorme abismo digital entre Brasil e Estados Unidos. Os norte-americanos somam mais de 2401 milhões de usuários conectados à internet, enquanto no Brasil somos 67,52 milhões de usuários, menos de um terço. Outro exemplo é a velocidade média da banda larga: nos EUA é de 4,6 Mbps, enquanto no Brasil a média3 é de 1,36 Mbps. E, muito além dos números, destacam-se também as facilidades de acesso à web, o investimento em 1 Internet World Stats - www.internetworldstats.com/am/us.htm 2 Internet World Stats - www.internetworldstats.com/sa/br.htm 3 Akamai, 2010. http://www.akamai.com/stateoftheinternet/

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tecnologia na educação, os hábitos culturais Para exemplificar, podemos identificar mada população em relação ao uso da web, croestratégias da campanha de Barack Obadentre tantas outras questões. ma que foram adotadas e readaptadas pelas campanhas dos três principais candidatos à Como esperar que as estratégias de campa- presidência do Brasil: Dilma Rousseff, José nha adotadas pela equipe de Barack Obama Serra e Marina Silva. sejam compatíveis com a realidade brasileira? Como exigir a mesma importância da Centrais de boatos internet no pleito eleitoral, sendo que os Centralizar possíveis inverdades em uma Estados Unidos contam com 3/4 da po- página do site oficial, com todas as inforpulação com acesso à internet, enquanto mações para desmentir o ocorrido, foi uma essa proporção é de 1/3 no Brasil? Como das principais estratégias da campanha de trabalhar de maneira semelhante com pú- Barack Obama, já que o candidato era blicos tão heterogêneos (culturalmente e relativamente desconhecido pela grande politicamente) como a audiência brasileira maioria da população norte-americana e e a norte-americana? atraiu uma série de histórias consideradas caluniosas sobre seu passado. No Brasil, a Partindo destas considerações, percebemos influência foi clara: os três candidatos adoo quanto perderemos tempo ao comparar taram postura semelhante em seus sites apressadamente as estratégias digitais das oficiais de campanha. Marina Silva, candicampanhas políticas destes países, ao invés data pelo PV, possuía uma área reservada de tentar identificar quais foram as influên- (porém tímida) no site para as Perguntas cias que foram adaptadas à realidade elei- Frequentes, em que respondia questões toral brasileira com sucesso, sem o peso de polêmicas como sua posição sobre aborto, que tenham os mesmos resultados. É pre- religião, casamento homossexual, dentre ciso olhar o processo de forma mais ampla, outros alvos de boataria. Dilma Rousseff, não se limitando a observar ações e ferra- candidata do PT, e José Serra, candidato mentas, mas sim os pilares estratégicos da do PSDB, dedicaram espaços e esforços campanha digital. maiores para o assunto – já que eram os

dois principais candidatos e, consequentemente, os mais atingidos. O site oficial de José Serra também contava com uma área de Perguntas Frequentes, que respondia dúvidas de eleitores como políticas para concursos públicos, privatizações, meio-ambiente, entre outros. Além disso, uma seção mais específica, chamada Combata a Mentira, trazia textos que esclareciam histórias mais elaboradas, como o suposto aborto de sua esposa Mônica Serra, desmentido em nota oficial no site. A central de boatos se tornou uma das áreas mais visitadas e compartilhadas do site oficial do candidato. Já a campanha de Dilma Rousseff criou uma força-tarefa semelhante para combater boatos a respeito da candidata: o Espalhe a Verdade. Além dos desmentidos, a página também contava com orientações a militantes sobre como disseminar a informação verdadeira para suas redes sociais. O Espalhe a Verdade também contava com uma central telefônica para receber as denúncias, com números específicos para cada capital do país. Na campanha de Obama, o uso de centrais telefônicas foi intenso e, como se pode ver, também influenciou a campanha brasileira.


Mídias Sociais e Eleições 2010 Estas páginas focadas em esclarecer boatos foram de suma importância para o processo eleitoral brasileiro, principalmente para dois tipos de eleitores: o indeciso (ajudando a conhecer melhor os candidatos) e o militante (fornecendo argumentos que o ajudavam a convencer outros eleitores). Em ambos os casos, a existência de páginas centralizando desmentidos em caráter oficial é uma das influências diretas da campanha norte-americana que também alcançou o sucesso em terras brasileiras. Doações pela internet Osite oficial de Barack Obama foi um dos grandes responsáveis pelas arrecadações de donativos para a campanha. A chamada para doação ocupava posição de destaque na página inicial – e o processo para doar era facilitado em poucos cliques. No Brasil, infelizmente não repetimos este sucesso. A candidata Marina Silva, que dispunha de um orçamento menor de campanha, foi a que mais investiu neste sistema de doações pela internet. A chamada também ocupava posição de destaque na página inicial do site, e o processo para doação se realizava em pouco mais de alguns cliques. A campanha da candidata Dilma também possuía um

sistema de doações com destaque no site oficial – um pouco mais complexo que o de Marina, já que exigia mais passos e cliques. O site de José Serra não disponibilizou o recurso de doação via web. Primeiramente, devemos considerar as questões de financiamento de campanha eleitoral: culturalmente falando, o brasileiro não tem o hábito de contribuir para campanhas políticas como pessoa física. E, ainda falando sobre hábitos: é injusto comparar a quantidade de pessoas que fazem transações financeiras na internet (compras, pagamentos, doações) no Brasil e nos EUA. Ainda que a cada ano essa estatística cresça e cada vez mais brasileiros passem a “confiar” no sistema de pagamentos online, esse número ainda é baixo. Ao somar estes fatores (pessoas que não fazem transações financeiras na internet e que não doam para campanhas políticas), temos um cenário em que a arrecadação online de doações não obteve o mesmo sucesso que a campanha de Obama. Ainda assim, é possível que estes primeiros passos de incentivo à doação online ajudem a tornar o hábito cada vez mais comum entre os cidadãos brasileiros.

Militância digital e cobertura colaborativa Uma das iniciativas de maior sucesso da campanha digital norte-americana foi a criação da rede social MyBarackObama. com, que centralizava conteúdo, orientações e ferramentas para eleitores que apoiavam o candidato, os “militantes” da campanha. A rede oferecia possibilidades como a criação de seu próprio blog de apoio (com o domínio “yourname.barackobama.com”), e incentivos aos militantes para que participassem da cobertura de eventos em tempo real enviando seus vídeos e fotos para o site. Além de estimular o compartilhamento de conteúdo pró-candidato nas redes sociais, esta rede também se tornou ponto de encontro de militantes e discussão de estratégias para ajudar na campanha, uma incubadora de idéias e sugestões vindas diretamente dos eleitores. Este reconhecimento dos cidadãos como parte do processo eleitoral faz parte da estratégia de relacionamento com o público, valorizando o conteúdo e participação do usuário e possibilitando a transformação dos eleitores em, de fato, militantes da causa.

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No Brasil, esta estratégia foi adotada com sucesso pelos principais candidatos à Presidência: as áreas reservadas para a “militância digital” ocupavam posições de destaque nos sites oficiais, oferecendo diversos recursos para os eleitores que desejassem participar ativamente da campanha: espaços de participação e colaboração (em que os eleitores poderiam discutir os planos de governo), fóruns e postagens de comentários, tutoriais de como usar determinadas ferramentas (transmitir eventos, participar de movimentos no Twitter), e ambientes de interação entre os próprios eleitores. As chamadas “coberturas colaborativas” também tiveram grande importância para as estratégias digitais das campanhas brasileiras, pois forneciam conteúdo exclusivo em tempo real dos eventos – que, além de ser disseminado nas redes sociais, reforçavam o relacionamento com estes ativadores que enviavam o material. Twitter oficial Um dos maiores destaques na estratégia de campanha norte-americana, Barack Obama - o político com o maior número de seguidores do mundo - se tornou referência de boas práticas no uso da ferramenta – e

não só entre os políticos. A integração com outras redes sociais também fez do Twitter um dos principais agregadores de notícias sobre a campanha: nos posts do microblog, eram referenciadas as fotos do Flickr, os vídeos do Youtube, a página oficial no Facebook, fazendo que os outros canais também se fortalecessem. Entretanto, pouco depois da vitória nas eleições, Obama declarou que nunca usou o Twitter de fato: as postagens eram coordenadas por uma assessoria responsável. E até isso influenciou o posicionamento dos perfis no Twitter dos candidatos à Presidência. O perfil oficial de Marina Silva no Twitter, criado em janeiro de 2010, contava com mais de 270 mil seguidores no dia da eleição. Através dele, a candidata informava agenda, plano de governo, opiniões, concedia respostas a questionamentos de eleitores, entre outros. As postagens eram realizadas pela própria candidata e por sua assessoria. O perfil de Dilma Rousseff, criado em abril de 2010, contava com mais de 240 mil seguidores no dia 3 de outubro. Os tweets tratavam basicamente sobre a agenda da candidata, além de posições sobre acontecimentos do dia e agradecimentos públicos. A

candidata também direcionava mensagens a outros usuários, mas com menor freqüência do que os outros candidatos. Ainda assim, o conteúdo postado no perfil oficial era intensamente distribuído pelas redes de apoio à candidata, como os perfis @dilmanarede e @dilmanaweb. Já o perfil de José Serra, criado em maio de 2009 (cerca de 1 ano e meio antes do pleito eleitoral), teve destaque pela quantidade de seguidores (mais de 470 mil em 03/10, quase o dobro das outras candidatas), e também pela peculiar forma de atualização do perfil: geralmente nas madrugadas adentro, rendendo o apelido de “indormível”. O perfil tratava de assuntos como agenda, plano de governo, opiniões, respostas a eleitores e, não se limitando a assuntos políticos, comentários sobre música, filmes, livros. O presidenciável fez questão de mostrar a pessoa além do candidato, ainda que nos últimos dias de campanha o perfil tenha adotado uma postura mais eleitoreira. Neste quesito, a comparação dos perfis dos candidatos à presidência do Brasil com o perfil do candidato à presidência dos Estados Unidos também incorre em um erro: o Twitter teve um peso maior na estratégia


Mídias Sociais e Eleições 2010 digital das eleições brasileiras do que nas norte-americanas, e acabou muitas vezes por pautar a mídia chamada “tradicional”. Declarações dos candidatos em seus perfis acabavam ultrapassando os limites da internet: apareceram como tópicos em entrevistas televisivas e ganharam páginas em jornais e revistas. Comparativamente falando, no sentido de conversar com o eleitor, os candidatos brasileiros deram um passo além da estratégia Obama, que raramente respondia eleitores e se limitava a distribuir informação em formato de broadcasting. Conteúdo oficial da campanha x conteúdo do eleitor Para enriquecer a discussão, uma das principais diferenciações que devem ser feitas é a de que a estratégia de campanha oficial dos candidatos, principalmente a digital, não responde pela campanha como um todo. Por exemplo: a campanha do candidato X adota uma política responsável em relação a envios de e email-marketing. Entretanto, não há como se ter controle sobre as correntes de e-mails e spams que são enviados pelos próprios eleitores, militantes ou simpatizantes do candidato –

que evidentemente não seguem a política contatos, valorizando seu candidato ou dede envios da campanha oficial. negrindo a imagem do adversário - e esse e-mail pode ser repassado muitas vezes, Em uma associação precipitada, os eleito- atingindo milhares de pessoas. res acabaram por confundir e declarar que “a campanha do candidato X está pratican- Assim, a linha que separa a campanha “ofido spam” – ainda que por muitas vezes os cial” da campanha “não-oficial” é muito estrategistas nem tivessem conhecimento tênue: além dos eleitores, muitos analistas sobre esta ou aquela corrente de e-mails. É e pesquisadores também não fizeram essa apenas um exemplo, mas existem dezenas diferenciação, o que acaba limitando a anáde situações em que as campanhas oficiais lise da estratégia de campanha digital em si são facilmente confundidas pelas campa- mesma, e seus resultados diretos. Em alnhas “naturais”, feitas pelos próprios elei- guns casos, a campanha oficial absorve este tores. É um reflexo da democratização das conteúdo gratuito e adota como parte da ferramentas de produção de conteúdo, estratégia; em outros, o material não pode como câmeras digitais, webcams e programas ser utilizado por conteúdo vetado pela lede edição de áudio e vídeo, da populariza- gislação eleitoral. Mesmo assim, a esta asção do uso de e-mail e redes sociais onli- sociação entre as campanhas existe e tem ne e da possibilidade de compartilhamento suas conseqüências positivas (como vídeos em tempo real na web. Não é novidade que de apoio e sugestões) e negativas (caso o cada vez mais as pessoas produzem conteú- conteúdo não-oficial ofenda o outro cando (textos, fotos, vídeos, áudios), publicam didato). em seus perfis e enviam para seus amigos. No processo eleitoral não foi diferente: Considerações finais eleitores queriam participar ativamente da O que se pode perceber ao analisar a influcampanha de seu candidato, seja enviando ência da campanha de Barack Obama nas material próprio, seja distribuindo informa- eleições brasileiras é que, apesar de realidação. Qualquer pessoa pode fazer um e-mail des distintas, algumas ações enriqueceram o com um vídeo amador e enviar para seus processo político como um todo, trazendo

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mais informação e conteúdo para o eleitor conectado e abrindo espaço para que este se expressasse e participasse ativamente da campanha do candidato. No que concerne às ações pontuais (como jogos, aplicativos para iPhone e outros artefatos técnicos), as diferenças são evidentes e refletem o “insucesso” das estratégias digitais brasileiras perante à campanha Obama. Mas, considerando as macroestratégias da campanha Obama que foram adotadas e readaptadas, obtivemos resultados expressivos para a realidade política brasileira.

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A intenção aqui não é afirmar que a campanha digital brasileira foi melhor ou pior do que a norte-americana, e sim apontar as diferenças básicas que devem ser consideradas neste ato de comparação. De fato, a influência da campanha Obama proporcionou uma série de benefícios e aprendizados para o processo político brasileiro, mas os principais resultados vieram de tentativas e experimentações aliadas à realidade do Brasil, o que com certeza irá influenciar as próximas eleições, quem sabe até de outros países. Dizer que o Brasil não agregou bons resultados em mídias sociais nas eleições de 2010 é injusto e precipitado: mesmo com

tanta disparidade cultural e intelectual, recursos financeiros menores e uma situação política desgastada como a nossa, as campanhas digitais do país avançaram importantes passos em direção a um pleito em que o eleitor é convidado a se informar, debater e realmente participar do processo eleitoral brasileiro. Os próximos passos irão refletir essas primeiras iniciativas de aproximar candidatos, eleitores e política através da web, tornando a decisão pelo voto cada vez mais bem informada, participativa e transparente.


Uma Análise das Comunidades do Orkut Voltadas para Presidenciáveis nas Eleições Brasileiras de 2010 Por Ruan Brito

Graduado em Comunicação Social – Publicidade pela Universidade Federal do Pará; mestre em Comunicação e Cultura Contemporâneas pela Universidade Federal da Bahia (na linha de Cibercultura); especializando em Comunicação e Política pela Universidade Federal da Bahia; pesquisador do GITS – Grupo de Pesquisa em Interação, Tecnologias Digitais e Sociedade. Palavras-chave: Comunidade, Orkut, Eleições, Presidenciáveis. www.crapula-mor.blogspot.com www.twitter.com/CrapulaMor

Uma Abordagem sobre a Vida Coletiva Contemporânea

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a Contemporaneidade, a vida coletiva pode ser compreendida a partir de características bastante específicas, e que se contrapõem de maneira marcante ao que foi predominante na época moderna. A partir das últimas décadas do século XX, uma série de estudos e formulações teóricas relevantes aponta para mudanças profundas em processos sociais e culturais. De maneira geral, vivemos uma época marcada pela instabilidade institucional e pela reconfiguração de conceitos centrais segundo o paradigma da Modernidade. O processo de globalização das últimas décadas provoca um conjunto de permanentes fluxos – de natureza comercial, financeira, informacional e humana – os quais desestabilizam noções tradicionais e demandam a revisão de figuras clássicas, em torno das quais a sociedade organizou-se por muitos séculos. Instituições que funcionaram como referências centralizadoras – Família, Escola, Igreja, Estado etc. – entram em crise, e


a sociedade revela-se heterogênea e fragmentada. Para Stuart Hall (1999), trata-se de uma mudança estrutural que fragmenta elementos culturais de classe, gênero, etnia, raça, nacionalidade, que no passado circunscreviam nossas individualidades e nossas identidades pessoais.

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É possível dizer que, enquanto a proposta da Modernidade contempla relações sociais estáveis, finalistas, contratuais, e um sujeito racionalizado e individualista; o estilo de vida contemporâneo, por sua vez, é marcado por interações mais efêmeras, afetivas e voltadas para o presente, o sujeito pósmoderno demonstra-se plural e afeito as diversas formas de agregações sociais. Neste cenário, temos que o sujeito atual define-se menos por uma identidade – definida, unidimensional e já acabada, e mais por identificações – múltiplas, diversificadas e não necessariamente coerentes entre si, uma vez que tal sujeito circula por uma diversidade de grupos, estilos, experiências e formas de expressão. A figura do indivíduo isolado e ego-centrado, central nas formulações sociológicas, históricas, psicológicas e políticas da Modernidade, cede espaço a

uma persona contemporânea, eminentemente relacional, de tendência comunitária, e que só pode ser compreendida em relação ao outro (MAFFESOLI, 1996). Este novo cenário favorece agregações sociais caracterizadas pela afetividade, empatia e espontaneidade. Podemos mesmo falar em uma espécie de sinergia coletiva, uma atração social que se dissemina pela vida contemporânea. Mesmo as situações mais cotidianas ou banais podem conter este vitalismo criativo. Trata-se de um movimento coletivo que compele as pessoas a se reunirem nas mais diversas ocasiões, para compartilhar seus pensamentos e emoções. As experiências, as sensações e os prazeres passam a adquirir maior sentido quando compartilhados com o grupo. Assim, ganham destaque as práticas denominadas comunitárias. “É a comunidade, ou melhor, as comunidades particulares, onde se despedaça o arquétipo tönnesiano, que sucede à sociedade moderna, em uma fase marcada pela crise do paradigma estatal e pela difusão do conflito multicultural. Nesse caso, a comunidade não é mais entendida como um fenômeno residual no que diz respeito às formas socioculturais adotadas pela

modernidade, e sim como uma réplica à insuficiência do seu modelo individualístico-universalista: é a mesma sociedade dos indivíduos, já destruidora da antiga comunidade orgânica, que agora gera novas formas comunitárias como reação póstuma à própria entropia interna” (ESPOSITO, 2007, p. 16).

O sujeito da contemporaneidade pode ser considerado como componente, a parte que precisa encontrar seus pares para formar o todo, numa permanente busca pela alteridade. Aqui, a ênfase está na troca, na partilha, na simbiose entre os diversos integrantes dos grupos sociais, ainda que de modo informal e sem maiores engajamentos em projetos ou ideologias mais sólidas. Este traço sociológico é definido por Maffesoli (1996) como um novo tipo de interação: a socialidade. Enquanto a sociabilidade, moderna, vinculou-se a uma concepção de mundo produtivista e objetiva; a socialidade diz respeito às práticas mais frívolas e efêmeras. Com esta noção, o autor refere-se a micro-ligações cotidianas, atividades triviais de socialização, espécies de ‘neotribos’, despretensiosas, freqüentemente recreativas e aparentemente sem importância, mas que moldam nossa época e nossa cultura.


Mídias Sociais e Eleições 2010 Com isto, várias esferas da vida em sociedade passam a ser influenciadas por esta lógica da tribalização. Desde reuniões de moradores de uma localidade, de estudantes, trabalhadores, simpatizantes de uma causa, manifestantes, praticantes de uma atividade ou de um esporte, admiradores de uma arte ou celebridade, até as festas, concertos, shows, raves, exposições etc., por mais passageiras que sejam, e ainda não produzam um resultado formal, todas refletem esta tendência socializante típica da Contemporaneidade, que reúne aqueles com um pensamento, um sentimento comum ou algo a compartilhar. Na música, no entretenimento, na religião, nos meios profissionais, na política, enfim, em diversos ambientes, surgem reuniões temporárias, agrupamentos espontâneos, ou ainda, Comunidades nos moldes contemporâneos. Nesta perspectiva, as características comunitárias não refletem mais os valores clássicos de profundo comprometimento, compartilhamento de experiências marcantes, laços humanos significativos e duradouros, projeções de longo prazo, dentre outros. Esta definição tradicional de Comunidade não é compatível com os

traços sociológicos atuais, em que se veri- mais complexos e heterogêneos, provocam fica uma atração social descomprometida e a falência da própria ação política, e muitas afetuosa. vezes conseguem encontrar saídas que driblam as instâncias decisórias. Os mecanisA política, em específico, ilustra um con- mos políticos e burocráticos permanecem junto de mudanças típicas desta conjuntu- em inúmeras esferas da vida cotidiana, mas ra atual. Conceitos clássicos como os de exercem uma função cada vez mais protoEstado, República, Democracia, campos colar e apontam para um esvaziamento de ideológicos bem definidos, como direita e sentido social. Para Maffesoli, “a sabedoria esquerda, parecem não se adequar mais a mortífera de nossos dinossauros modernos este novo cenário sócio-cultural mais flui- deixa de estar em sintonia com aqueles que do e disperso. O contrato social, proposto dizem sim à vida; sim, apesar de tudo, à vida! pela lógica política moderna, calcado em Pois é disso que se trata: da extraordinária uma conotação racionalista e produtivista, defasagem das elites intelectuais e políticas já não dá conta das demandas, dos confli- em relação às coisas da vida” (2009, p. 18). tos e dos fenômenos da sociedade de hoje. A própria idéia de uma identidade nacional É partir desta concepção que Maffesoli ou de um “Estado-nação” em que tudo é (1997) propõe o que denomina de “transfiregulado por um seleto grupo precisa ser guração do político”, ou seja, uma mutação rediscutida. de ordem social e cultural, em que a imagem tradicional da política apóia-se sobre uma A crise da política racionalizada provoca figura existente para tornar-se outra coisa. um grave descompasso entre os discursos Segundo esta visão, a política, nos termos oficiais, institucionalizados e a vida coleti- contemporâneos, apresenta elementos forva popular. Aqueles que concentram poder temente comunitários. Os grandes projetos (político, econômico ou simbólico) e ocu- e ideários são progressivamente suprimidos pam os espaços de tomada de decisão ca- por uma predisposição à associação, a um recem de legitimidade social. As demandas conexionismo, à formação de Comunidapopulares, elaboradas de modos cada vez des pós-modernas.

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O Papel das Comunidades Virtuais em Nossa Época Nesta cadeia de mudanças do tipo mais profundo que vivenciamos, verifica-se que a Comunidade adquire relevância e precisa ser compreendida em novos termos. E, naquilo que se refere à tendência gregária da Contemporaneidade, é necessário ressaltar o papel das tecnologias digitais. Na ambiência online, temos mais uma maneira de proporcionarmos encontros e associações, as mais diversas, de acordo com preferências, afiliações, hábitos, identificações etc. sem a necessidade de co-presença física. André Lemos (2004) reporta-se à noção de cibersocialidade para referir-se ao tipo de interação descrita por Maffesoli, mas que se dá por meio das tecnologias do ciberespaço. Para este autor, o vitalismo social de nossa época pode ser potencializado pelas tecnologias digitais, as quais favorecem as situações lúdicas e os processos comunitários. Por sua vez, Pierre Lévy (1999) compreende que não é possível compreender o técnico e o social como pólos desassociados. Para que determinada ferramenta tecnológica torne-se disseminada e profícua na sociedade, é necessário que os sujeitos apropriem-

se destas ferramentas, ou seja, que haja um ambiente social que torne pertinente o uso das ferramentas técnicas. No caso, a internet configura-se como uma tecnologia altamente adequada para nossa época, uma vez que promove processos de colaboração, criação e conexão entre as pessoas. Assim, estes autores enfatizam o papel socializante do ciberespaço, a possibilidade vinculada às tecnologias digitais de satisfazer o desejo coletivo pelos agrupamentos, pela livre expressão e circulação das idéias, pela comunicação recíproca, ainda que mediada pelo computador. Para Lévy, “uma das idéias, ou talvez, devêssemos dizer, uma das pulsões mais fortes na origem do ciberespaço é a da interconexão. Para a cibercultura, a conexão é sempre preferível ao isolamento. A conexão é um bem em si” (1999, p. 127). Após participar da Comunidade WELL – Whole Earth ‘Lectronic Link (http://www. well.com/), Howard Rheingold relatou uma experiência com forte envolvimento emocional. O autor afirma: “Eu me importo com estas pessoas que eu conheci por meio do meu computador, e eu me importo profundamente com o futuro do meio que permite a nossa reunião” (RHEIN-

GOLD, 1993, online). Nesta abordagem, uma Comunidade Virtual implica discussões públicas entre pessoas, permeadas por suficiente sentimento humano e relações de cunho pessoal. Porém, observa-se que os grupamentos online apresentam variados formatos e graus de envolvimentos entre os membros, traços que não podem ser antecipados ou generalizados. Mais recentemente, nos últimos anos da década de 90 e principalmente nos anos 2000, ganhou força outra forma de socialização na web: os Sites de Redes Sociais (SRSs). As pesquisas científicas voltadas a estas plataformas online adotam atitude diferente daquela com a qual as primeiras Comunidades Virtuais foram tratadas. As formulações teóricas e os estudos acadêmicos sobre os SRSs têm mais foco sobre o indivíduo, seu perfil e sua navegação nas redes de conexões, do que sobre práticas comunitárias. Segundo Boyd e Ellisson, e possível definir um Site de Redes Sociais como: um serviço baseado na Internet que permite aos indivíduos (1) construir um perfil público ou semi-público dentro de um sistema conectado, (2) articular uma lista de outros usuários com os quais compartilham uma cone-


Mídias Sociais e Eleições 2010 xão, e (3) visualizar e mover-se por sua lista de conexões e pelas dos outros usuários, no mesmo sistema (BOYD e ELLISSON, 2007). Notadamente, o conjunto destes sites apresenta variadas propostas e segmentações – muitos se voltaram para grupos específicos (asiáticos, negros, religiosos, fãs de anime, simpatizantes de determinado candidato etc.), outros priorizaram determinados usos (profissional, amoroso, musical etc.); alguns deram certo e tornaram-se bastante populares, enquanto outros tiveram de encerrar suas atividades. De todo modo, guardadas as características particulares, as Redes Sociais atraem um contingente expressivo de usuários do mundo inteiro, e configuram-se como uma forma relevante de socialização na atualidade. Em nível global, o Facebook (http://www.facebook.com/) atrai o maior número de usuários, com mais de 500 milhões de perfis ativos. Já no Brasil é o Orkut (http://www.orkut.com. br/) que faz maior sucesso de público, com dezenas de milhões de participantes. Neste último, as Comunidades são ferramentas importantes, reunindo pessoas com as

mais diferentes motivações e finalidade. Ainda que o foco deste tipo de site esteja sobre o perfil dos usuários e suas listas de contatos, o Orkut proporciona também a possibilidade da reunião de pessoas com algo a compartilhar. Obviamente, os usuários do site de relacionamentos poderão apenas vincular seus perfis à Comunidade, tornando-se um dos membros, ou ainda desenvolver forte envolvimento com outros participantes, aproximando-se do processo relatado por Rheingold. A este respeito, é preciso examinar cada caso, respeitando as dinâmicas e os princípios específicos de cada agrupamento online.

Silva – PV”2 e “José Serra Presidente”3. No caso das Comunidades dedicadas à Dilma e à Marina, tratam-se das maiores páginas sobre as presidenciáveis existentes no Orkut, à época da pesquisa. Por este motivo, foram selecionadas para compor o artigo. No caso de José Serra, há outra Comunidade com maior número de participantes, a “José Serra – Presidente”4. No entanto, esta Comunidade foi criada originalmente para vídeos do site Youtube. Por isso, ela não faz parte deste estudo. Considerou-se mais conveniente comparar três páginas que estavam, originalmente, voltadas à temática eleitoral.

Para os propósitos deste artigo, interessam especificamente Comunidades Virtuais voltadas aos candidatos à presidência da república nas eleições brasileiras de 2010, as quais serão abordadas no próximo item.

O período designado para a análise, de 15 a 30 de agosto de 2010, foi definido a partir de marcos importantes na disputa eleitoral: neste mês houve a primeira rodada de entrevistas com os principais candidatos no Jornal Nacional, da Rede Globo – nos As Comunidades do Orkut e as dias 9 (Dilma), 10 (Serra) e 11 (Marina); Eleições Presidenciais além disso, no dia 17 teve início o horário Para este trabalho, foram observadas três eleitoral gratuito. Tais eventos ajudaram a Comunidades do Orkut sobre os principais agendar o tema eleitoral perante a populapresidenciáveis nas eleições de 2010: “Votamos Dilma Presidente – PT”1, “Marina 2 http://www.orkut.com.br/Main#Community?cmm=11934095 1 http://www.orkut.com.br/Main#Community?cmm=1583686

3 http://www.orkut.com.br/Main#Community?cmm=22482901 4 http://www.orkut.com.br/Main#Community?cmm=355236

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cano, que enfrentava queda nas pesquisas, foi a que apresentou menor crescimento. É interessante verificar que, embora as candidaturas de Dilma e Serra tenham sido maiores em estrutura eleitoral e intenção de votos, ao longo de toda a campanha, foi a Comunidade voltada à Marina que sustentou o maior número de participantes, de 15 a 30 de agosto. Isto mostra que a lógica mais geral das eleições não necessariamente é reproduzida em determinada mídia social. No caso, a candidatura de Marina não esteve em patamar inferior às outras duas, no que diz respeito à concentração de participantes em Comunidades do site Orkut.

26 ção, agregando maior visibilidade às campanhas, o que tendia a favorecer a procura por Comunidades dos presidenciáveis no Orkut. No gráfico abaixo, temos as evoluções das quantidades de membros nas três Comunidades. Como podemos constatar pelo gráfico, as três Comunidades apresentaram crescimento uniforme nas suas quantidades de membros, no período observado. A Comunidade da candidata Dilma cresceu em

torno de 24% em quantidade de membros; a Comunidade da candidata Marina, 16%; e a de Serra, 9%. De fato, com o decorrer da disputa, mais pessoas ingressaram nas Comunidades dos presidenciáveis analisadas. O crescimento foi permanente e estável ao longo dos 15 dias, nos três agrupamentos. A página da candidata petista, que já assumia a dianteira nas pesquisas de intenção de votos naquele mês, foi a que apresentou maior incremento na quantidade de membros. Já a página voltada ao candidato tu-

Com relação aos tópicos criados no período, temos que, na Comunidade “Votamos Dilma Presidente – PT”, dentre os mais comentados estiveram: “Dilma”, criado pelo usuário Brasil; “cai fora ‘Brasil’ de araque”, criado pela usuária Fabiane; “Dilma Presidente? Leia esse topico com atençao”, da usuária Letícia; “Dilma abre 17 pontos sobre Serra e venceria no 1º”, do usuário Soldado; e “DEFINAM SERRA EM UMA PALAVRA?”, de Werley.


Mídias Sociais e Eleições 2010 Na Comunidade “Marina Silva – PV”, os tópicos mais comentados, no período analisado, foram: “Aquecimento Global não existe”, criado pelo usuário Emerson Avelar; “QUARTA-FEIRA TEM DEBATE NO UOL / FOLHA”, do participante Fernaиdo; “MARINA APÓIA DILMA NO 2° TURNO”, de Uzias; “DEBATE DOS PRESIDENCIÁVEIS – AGORA!”, criado por DU { }; e “ADESIVE SUA FOTO COM O NOME DA MARINA 43”, de Marina Silva. Já na “José Serra Presidente”, os tópicos com maior número de mensagens foram: “Novo Ibope”, criado pelo usuário Dionísio, “1º debate online entre presidenciáveis hoje”, da participante MARGARIDA; “Lula no programa de Serra”, de João; “Datafolha : Dilma 17 pontos na frente”, de Rodrigo Guedes; e “Quem foi expulso injustamente?”, de Holger.

denominado “cai fora “Brasil” de araque”. O usuário que não era partidário de Dilma foi visto pelos outros membros como um estranho, um intruso. De modo similar, tópicos como “Aquecimento Global não existe” ou “Lula no programa de Serra” questionavam bandeiras ou estratégias das respectivas campanhas.

Percebemos que alguns dos tópicos causavam divergência nos grupos, como o tópico “Dilma”, em que o usuário Brasil criticava a candidata petista em sua própria Comunidade. Este tópico recebeu forte hostilidade dos outros membros, com a postagem de mensagens e com a criação de outro tópico

Considerações Finais A despeito da intensidade do envolvimento pessoal entre os membros, Comunidades Virtuais como as formadas no Orkut podem refletir um padrão de interação típico de nossa época. Segundo um conjunto de autores referenciados neste artigo, a

Porém, a maior parte dos tópicos e das interações existentes nas Comunidades consistia em convergência entre os participantes. As páginas colaboravam para a sedimentação social das candidaturas homenageadas e desqualificação dos adversários, ainda que em certos momentos assumissem tom crítico. Os participantes estavam majoritariamente preocupados em trocar percepções e debater os encaminhamentos das campanhas, os eventos eleitorais e as informações gerais da disputa.

compreensão da Comunidade nos termos contemporâneos prevê que tais associações sejam efêmeras, informais e sem maiores engajamentos. As Comunidades Virtuais voltadas a presidenciáveis analisadas neste artigo funcionaram, durante as eleições de 2010, principalmente como fóruns abertos e espaços de encontro entre partidários dos respectivos candidatos. Os conteúdos oficiais das campanhas eram apropriados pelos participantes, adquirindo novos contornos e novos olhares, eventualmente críticos. As interações nas páginas do Orkut estavam em função do apoio aos candidatos, com predomínio da convergência de pensamentos e emoções.

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Referências Bibliográficas BOYD, D.; ELLISON, N. Social Network Sites: ______________ No Fundo das Aparências. Definition, history, and scholarship. Journal of Petrópolis: Vozes, 1996. Computer-Mediated Communication, 13(1), ReRHEINGOLD, H. The Virtual Community: trieved December 10, 2007. Homesteading on the Electronic Frontier. ReaESPOSITO, R. Niilismo e Comunidade. In: ding. Massachusetts: Addison-Wesley, 1993. PAIVA, R. (Org.). O Retorno da Comunidade: os novos caminhos do social. Rio de Janeiro: Mauad X, 2007. HALL, S. A Identidade Cultural na Pós-Modernidade. Rio de Janeiro: DP&A, 1999.

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LEMOS, A. Cibercultura: Tecnologia e Vida Social na Cultura Contemporânea. 2º Ed. Porto Alegre: Sulina, 2004. LÉVY, P. Cibercultura. São Paulo: Editora 34, 1999. A República dos Bons Sentimentos. São Paulo: Iluminuras, 2009. MAFFESOLI, M.

______________ A Transfiguração do Político - A Tribalização do Mundo. Porto. Alegre: Sulina, 1997.


O papel da militância através das redes sociais durante as eleições

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o final de julho de 2010, uma simpática avó de Minessota, nos Estados Unidos, dirige-se à unidade de uma rede de hipermercados e usa seu poder de compra como forma de protestar contra a empresa. Logo em seguida, um ator britânico envia uma mensagem sobre o assunto pelo Twitter. Tempos depois, no início de setembro, em Moçambique, África, cidadãos saem às ruas, em protesto contra o aumento do preço do pão.

Por Gil Castillo

Publicitária e consultora política, desde de 1992 atua no marketing político nas áreas de planejamento estratégico e criativo. Ao longo de sua carreira, vem trabalhando em diversas campanhas eleitorais e projetos de comunicação, tanto na área pública, quanto na área privada, no Brasil, América Latina e África. Especialista em Propaganda Política, rádio, TV e novas tecnologias de comunicação, é Diretora de Relações Públicas da ABCOP-Associação Brasileira de Consultores Político, membro da ALACOP - Associação Latino-Americana de Consultores Políticos e editora do blog MarketingPolitico.com Palavras-chave: Marketing Político, Eleições, Internet, Cidadania, Política www.marketingpolitico.com.br gil@marketingpolitico.com.br www.twitter.com/gilcastillo www.twitter.com/MktPol

Entre uma coisa e outra, no Brasil, em plena campanha eleitoral, humoristas fazem passeata, em Copacabana, contra a censura ao humor nas eleições. A avó, o ator, o povo moçambicano, os humoristas. O que todos têm em comum? São consumidores e cidadãos, com uma causa na cabeça e a tecnologia nas mãos.


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A Avó e o ator Eden Prairie, indignada com a informação de que a rede Target havia doado US$ 150,000 para a campanha de Tom Emmer, candidato ao Governo do Estado de Minessota (EUA), entra em uma loja da rede, faz tranquilamente uma compra de US$ 226. Em seguida, procura pela gerência, devolve a compra, explica seus motivos e destroi o cartão de crédito da empresa. Motivo: o candidato do Partido Republicano era declaradamente anti-gay e Eden estava agindo em defesa de seu neto, gay. Esse protesto poderia ter caído no esquecimen-


Mídias Sociais e Eleições 2010 Não cabe (e nem há aqui elementos científicos para) uma análise profunda sobre as eleições 2010 em Minessota, mas é fato que Tom Emmer perdeu para Mark Dayton, do DFL - Democratic Farmer Labor Party. E, obviamente, a Target, que embora afirme ter uma política favorável à contratação de funcionários gays, teve uma imensa exposição de sua marca relacionada, no mínimo, à intolerância.

to se o site de jornalismo colaborativo www. TheUpTake.org não houvesse gravado um vídeo1, mostrando toda a ação, a declaração emocionada da avó e postado em seu canal no Youtube. Enquanto isso, no Velho Continente, o ator, jornalista e tuiteiro britânico Stephen Fry2, defensor da causa gay, envia uma mensagem sobre o vídeo com a hashtag #boycottTarget, imediatamente retuitada em massa. 1 Vídeo: Consumer Vents At Target For Right-Wing Donation: http://www.youtube.com/watch?v=2SipXbgyi68 2 Site: http://www.stephenfry.com/

Essa foi apenas uma das frentes de protesto que, com a rapidez da conexão de cada um, ganhou as páginas do HuffingtonPost3 e um vídeo4 - nos moldes dos comerciais de liquidação da Target -, produzido pelo MoveOn.org, dizendo que “a democracia não estava à venda”, direcionando as pessoas à página específica da ação, a www.TargetBoycott.org, entre outros tantos atos e coberturas da mídia. 3 Notícia - Huffington Post - “MoveOn.Org Calls For Target Boycott In New Ad”: http://www.huffingtonpost. com/2010/08/17/boycott-target-commercial_n_684815.html 4 Vídeo: Boycott Target: http://www.youtube.com/watch?v=nAuJj7twMI

Os moçambicanos Do outro lado do mundo, no belo país banhado pelo Índico, cuja renda per capita é de US$ 75.005 ao mês, o governo anunciou o aumento de produtos básicos, entre eles o pão. Indignado, o povo utilizou-se do melhor meio de comunicação disponível, o SMS6. Assim como se combina um encontro entre amigos, o povo combinou data para sair às ruas e protestar. Infelizmente, não sem uma repressão violenta, que resultou em 10 mortos, cerca de 400 feridos e na suspensão dos serviços de envio de SMSs7 5 The World Fact Book: https://www.cia.gov/library/ publications/the-world-factbook/geos/mz.html 6 Notícia - Estadão.com - 08/09/2010 - “Greve é articulada pelo celular em Moçambique”: http://www.estadao.com.br/ estadaodehoje/20100908/not_imp606550,0.php 7 Notícia - Tek - 13/09/2010 - “Mensagens SMS bloqueadas em Moçambique”: http://tek.sapo.pt/noticias/

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pelos dias seguintes. Não fosse a rapidez da tecnologia, talvez as manifestações não tivessem acontecido, nem haveria um olhar da mídia mundial para o assunto. O Jornal moçambicano “O País”8, chegou a usar uma plataforma colaborativa, em sua versão online, para que os cidadãos reportassem os focos de protestos e de repressão tanto na capital, Maputo, quanto nas províncias. Foi essa exposição, antes improvável num mundo analógico e sem a participação do cidadão como produtor de informação, que forçou o governo moçambicano a recuar, naquele momento, cancelando o aumento dos produtos e serviços, preocupado com uma exposição negativa de sua “marca institucional”, já que tenta posicionar-se internacionalmente como um governo democrático e progressista, distanciando-se da imagem totalitária de um grupo que está no poder há mais de 40 anos.

da se não representasse a grande pérola no quesito “legislação eleitoral ultrapassada”, principalmente nas questões relativas à comunicação.

Os Humoristas No “país da piada pronta”, humoristas saem às ruas para terem o direito de fazer humor9. A questão pareceria até engraça-

Os três episódios citados, num mar de casos que poderiam ilustrar este texto, servem para nos fazer refletir sobre a dinâmica da descentralização do poder da

telecomunicacoesmensagens_sms_bloqueadas_em_ mocambique_1091826.html 8 Site: http://www.opais.co.mz 9 Notícia - O Globo - 22/08/2010 - “Humoristas fazem passeata

Depois de anos de lutas, discussões, emendas e remendos na Lei Eleitoral, com um atraso de uns 10 anos, houve uma maior abertura para o uso da internet nas eleições. Mas, num completo contra-senso, o texto da nova Lei manteve a proibição de se fazer piadas com candidatos no rádio e na TV, fato que há muito já havia se tornado obsoleto na internet. E foi pela própria internet, através do Twitter e das redes sociais, que o evento ganhou força, sensibilizou a opinião pública e deu aos humoristas o direito a usar tanta matériaprima valiosa para nos fazer rir e sermos críticos com aqueles que são pagos pelos nossos impostos.

em Copacabana contra a lei eleitoral”: http://oglobo.globo. com/pais/eleicoes2010/mat/2010/08/22/humoristas-fazempasseata-em-copacabana-contra-lei-eleitoral-917452251.asp

informação e do grande potencial mobilizador que as novas tecnologias nos colocam à disposição. Para o sociólogo francês Dominique Wolton, que cunhou o conceito de “sociedade individualista de massa”10, apesar de compartilhar sobre a importância da internet para a comunicação, não se diz um fascinado por ela como construtora da democracia, porque “só funciona para formar comunidades (...) e não sociedades”11 onde, afirma, é preciso conviver com as diferenças. Ao rádio, à TV e à imprensa estariam destinados os papéis de coesão social. Apesar de não concordar cegamente com Wolton, acredito que seu pensamento é uma das peças para explicar o papel que as novas tecnologias estão desempenhando sim na constituição das sociedades, sobretudo quando usadas nos processos eleitorais. Para explicar-me melhor, busco a ajuda do antropólogo Néstor Gacía Canclini, que

10 Livro: “Internet, E Depois? Uma Teoria Critica Das Novas Midias”, Wolton.Dominique, Editora Sulina 11 Entrevista - Folha de São Paulo - 09/11/2010: http://www1. folha.uol.com.br/equilibrioesaude/827509-facebook-so-disfarcafalta-de-relacoes-humanas-diz-sociologo.shtml


Mídias Sociais e Eleições 2010 em seu livro “Consumidores e Cidadãos”12 alerta que a globalização não é um mero mecanismo de homogeneização, mas na verdade um reordenamento das diferenças e das igualdades. Nesse processo, vamos deduzir, para desenvolvimento de nosso questionamento, que o papel de um consumidor cada vez mais crítico, que estabelece relações racionais e emocionais com marcas, produtos e serviços, seja uma imensa escola para o exercício da cidadania global e da própria discussão política, sobretudo através do uso das novas tecnologias.

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O uso das redes sociais digitais e das ferramentas de interação têm proporcionado ao consumidor-cidadão a oportunidade de informar-se, comparar, trocar idéias e expressar suas preferências políticas, mobilitos entre seus grupos diversos, de maneira zando-se por causas nas quais acredita. cada vez mais global, como nos diz Canclini. Numa licença poética, mesclando os dois E é essa dinâmica que nos leva à militância, pensamentos, temos as pessoas que procu- ao engajamento, características fundamenram e se organizam em grupos afins e ponto, tais para se entender a comunicação política como afirma Wolton, mas que também es- na rede. Características essas que nos fazem tão exercitando suas semelhanças e diferen- assinarmos um manifesto pela libertação de 13 ças, através de confrontos e questionamen- Sakineh , no Irã, com a mesma convicção com que tuitamos nossas hashtags e aderimos 12 Livro: “Consumidores e Cdadãos”, Canclini, Néstor García, Editora UFRJ

13 Site: http://www.liberdadeparasakineh.com.br/

ao abaixo-assinado pelo Ficha Limpa14. Ou com que algum intolerante na Catalunha, Espanha, joga um game online15 em que é preciso eliminar imigrantes, ou outro intolerante, na Alemanha, prefere destruir mesquitas, através de um game chamado “Moschee Ba ba!”16 14 Site: http://www.fichalimpa.org.br/ 15 Notícia - UOL - 17/11/2010: http://forum.jogos.uol.com. br/game-que-elimina-imigrantes-causa-polemica-em-campanhaeleitoral-catala_t_1172434 16 Site: http://www.moschee-baba.at/


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E as eleições no Brasil? Em junho de 2010, num artigo para a Revista Campaigns & Elections en Español, escrevi sobre aspectos que considerava muito claros sobre as eleições no Brasil com o uso da internet: primeiro que, embora o caso Obama fosse uma grande referência, provavelmente não teríamos uma repetição dos fatos por aqui, por motivos óbvios; segundo, que seria um grande laboratório para todos nós, cidadãos, políticos, profissionais de comunicação, profissionais de TI, consultores etc. Terceiro, que a estratégia da campanha deveria ser única e integrada: existe marketing eleitoral e seu planejamento deve contemplar todas as frentes; por último, que 2010 seria a eleição da militância on-line, que já vinha se destacando, através de projetos muito interessantes, bem antes do período eleitoral. No artigo, cheguei a citar três exemplos: a rede de blogs de apoiadores de Dilma, o www.Dilma2010.blog.br, posteriormente - e sabiamente - incorporada pela campanha do PT; o caso do “Mobiliza PSDB” (www.mobilizapsdb.org. br), que durante a campanha tornou-se o “Mobiliza”, com ótimas ações interativas e agora está fora do ar; e o site de Marina

Silva, espelhando-se num perfil parecido ao de Obama, o www.minhamarina.org. br, que continua no ar e atualizado, ponto importantíssimo para quem ganhou a exposição e votação expressiva de Marina, mas ficou sem mandato. À época da publicação do artigo, algumas pessoas torceram o nariz, umas porque enxergavam a internet como protagonista isolada destas eleições e com potencial muito maior na conquista do voto, outras porque subestimavam sua importância, entendendo o ambiente como um veículo de massa, estático, de monólogos e não segmentado, dinâmico e para o diálogo, como na realidade é. Na prática, o que vimos pelo Brasil afora foi realmente esse caldeirão experimental, onde algumas ações dos candidatos foram positivas e uma grande parcela, principalmente das candidaturas proporcionais (salvo boas exceções), tiveram uma performance sofrível. Houve casos, inclusive, de candidatos caídos de pára-quedas no Twitter, que chegaram a comprar listas de seguidores. Ou seja, não entenderam absolutamente nada. Em termos gerais, ganharam ou destacaram-se as candidaturas nas quais as estra-


Mídias Sociais e Eleições 2010

35 tégias de marketing e comunicação foram tratadas de forma integrada entre o off-line e o on-line, numa sábia releitura da Lei da Propaganda Política17, categorizadas por Jean-Marie Domenach. As estratégias de envolvimento e construção de imagem de Dilma, a militância engajada de Marina Silva, o tuiteiro de sucesso José Serra e o “hacker” Plínio Sampaio foram, sem dúvida, pontos de destaque das 17 Livro: “A Propaganda Política” - Jean-Marie Domenach


campanhas majoritárias. E, em todos eles, houve o envolvimento do eleitor. Se informação é poder... Um dos grandes méritos da estratégia de Obama - finalmente vou citá-lo - foi o de aprender a administrar uma grande quantidade de conteúdo produzido fora da campanha oficial. O caso Obama Girl18 é o maior exemplo, pois tornou-se o vídeo online pró-Obama mais assistido.

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No Brasil, algumas das ações que melhor entenderam o espírito da rede também nasceram fora dos comitês e longe do controle da coordenação das campanhas, seja para nos ajudar a fiscalizar o processo eleitoral, seja para nos fazer rir pela irreverência de seus conteúdos, provando que o cidadão entendeu melhor que alguns estrategistas e políticos que, se informação é poder, a sua descentralização também muda o eixo de tudo. Foram projetos feitos no varejo, conquistando adeptos a cada nova postagem nos blogs, a cada tuíte, a cada publicação no 18 Vídeo: “Crush on Obama”: http://www.youtube.com/ watch?v=wKsoXHYICqU


Mídias Sociais e Eleições 2010 Youtube, a cada plataforma colaborativa de- @Exilado27, para citar apenas uns poucos senvolvida. casos. Projetos de relevância para o exercício da cidadania e da participação crítica no processo eleitoral, dos quais não é possível honrar a todos, mas devo citar alguns, como o Projeto Excelências, da Transparência Brasil19, o Movimento Voto Consciente20, a plataforma Eleitor 201021, o Vote na Web22, Projeto Twiticos23 e, logicamente, o Ficha Limpa,24 responsável por tantas hashtags e assinaturas pelo país. No campo da irreverência foi onde a internet nos proporcionou os melhores momentos. A criatividade e a liberdade de expressão produziram algumas peças inesquecíveis como o impagável vídeo “Serra come todo mundo”25, o @DilmaBoyOficial26 e os vídeos muito bem editados do 19 Site: http://www.excelencias.org.br/ 20 Site: http://www.votoconsciente.org.br/site/ 21 Site: http://eleitor2010.com/ 22 Site: http://www.votenaweb.com.br/ 23 Site: http://twitter.com/twiticos 24 Site: http://www.fichalimpa.org.br/ 25 Vídeo: “Serra come todo mundo” http://www.youtube.com/ watch?v=5rqc6NCIQik 26 Vídeo: “Dilmaboy”: http://www.youtube.com/watch?v=3shtL AbhHHo&feature=fvsr

Nesta viagem pelos exemplos citados, infelizmente não foi possível fazer jus a todos os aspectos das eleições de 2010 no Brasil e o uso da internet, mas foi possível ressaltar o papel fundamental exercido pela militância espontânea, genuína, que vinha perdendo seu espaço no cenário eleitoral. Como disse Canclini, somos tanto consumidores, quanto cidadãos, lutando por direitos numa sociedade cada vez mais globalizada. Frente às novas tecnologias, como consumidores estivemos exercitando nossos direitos na última década, mas como cidadãos, reprimidos por uma Lei Eleitoral retrógrada, só agora pudemos mostrar a que viemos. E essa foi uma experiência extremamente valiosa. Merecemos mais. Em tempo: depois das eleições, tivemos a deflagração da polêmica sobre o Wikleaks, a promessa de um ex-presidente Lula blogueiro e as perspectivas de uma inclusão digital crescente, provando que, de fato, nada será como antes. 27 Canal de vídeo: “Exilados na rede”: http://www.youtube.com/ user/exilados?blend=2&ob=1

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Democracia, eleições e redes sociais online: uma possibilidade de pluralização do diálogo Por Nina Santos

Nina Santos é mestranda no Programa de Pós-Graduação em Comunicação e Culturas Contemporâneas da Universidade Federal da Bahia - UFBa e aluna da especialização em Comunicação e Política desta mesma instituição. Formada em jornalismo, Nina tem experiência em assessoria de comunicação política, tendo trabalhado nas eleições de 2010. Ultimamente tem focado seus trabalhos na área de comunicação digital, sobretudo nas suas interfaces com o campo da política. Sobre esse assunto ela mantém o blog Mundoutro. Nina é diretora de planejamento da Multiverso Comunicação, que atua na área de assessoria de comunicação em Salvador. Palavras-chave: mediação, twitter, hashtag, eleição ninocasan@gmail.com www.twitter.com/ninocasan ninasantos.com.br/mundoutro linkedin.com/in/ninasantos http://buscatextual.cnpq.br/buscatextual/visualizacv.jsp?id=K4240129P9

O ambiente online e a mediação

O

ambiente online traz uma série de reconfigurações aos processos de comunicação. Desde a comunicação instantânea até as ferramentas de auto-publicação, muitas são as possibilidades que a comunicação passa a ter no mundo online. No campo da comunicação e política, a internet traz uma miríade de novas questões que passam pela possibilidade de aumento da participação e do engajamento cívico, da comunicação direta entre Estado e cidadãos e da governança eletrônica através de eleições e plebiscitos via rede. Pretendemos aqui, partindo da noção de mediação, buscar entender que transformações ela sofre com o ambiente online e de que maneira isso impacta o poder do cidadão comum. Se no ambiente offline podemos identificar o papel central dos meios de comunicação de massa como mediadores – mesmo que não possamos tratar essa categoria de forma homogênea -, no ambiente online essa situação se torna mais complexa, com a inserção de novos media-


Mídias Sociais e Eleições 2010 dores e a convivência dessas mediações em um mesmo ambiente. A disponibilização de conteúdos provenientes de mediações diversas, a coexistência de mediações profissionais e não-profissionais e como esse contexto leva a um evidenciamento da mediação são algumas das questões que exemplificam a complexificação dos processos de mediação. É importante ressaltar que reconhecemos a importância dos meios de massa e, especificamente, do jornalismo para a democracia. Consideramos a existência desse campo profissional extremamente relevante no sentido de organizar fluxos de informação que circulam socialmente além de vigiar e denunciar ações do sistema político. O que pretendemos aqui é averiguar as modificações que os processos de mediação (sejam deles profissionais ou não) sofrem no ambiente online e não desqualificar um tipo de mediação em detrimento de outro. Por outro lado, vale dizer também que não se pretende aqui tratar do conceito de mediação com uma acepção negativa, como se a sua existência fosse um malefício à democracia. Pelo contrário, acreditamos que

a mediação dos meios de comunicação tem um relevante papel social dentro da democracia, daí a importância de se buscar compreender a relação daquela mediação com outras mediações do ambiente online e como isso se relaciona com o poder do cidadão.

mação circular. Começando com a imprensa de corte e passando pela imprensa de opinião burguesa e a imprensa de partido, a comunicação chega ao século XX como um campo social formado, profissionalizado e complexo, caracterizado pela indústria da informação. A formação dessa indústria se dá basicamente pela demanda por uma Interessa-nos aqui falar de um tipo especí- informação imparcial, objetiva e atualizafico de mediação1, aquela que “resulta da da. evolução de processos midiáticos que se instauram nas sociedades industriais [...] e Esse campo se desenvolve e passa a ter um que chamam atenção para os modos de es- protagonismo social porque “a vida e dinâtruturação e funcionamento dos meios nas micas dos diferentes campos são atravessadinâmicas sociais e simbólicas” (FAUSTO das, ou mediadas, pela tarefa organizadora NETO, p.90, 2008). tecno-simbólica de novas interações realizadas pelo campo das mídias” (FAUSTO Esse processo de mediação industrial, que NETO, p.90, 2008). O campo dos media traz os meios de comunicação para o cen- passa a ser um grande responsável por dar tro do debate, começa no momento em existência pública aos fatos, pessoas e insque se torna cada vez mais difícil capturar tituições. todos os acontecimentos relevantes apenas com os cinco sentidos. Então, a imprensa Dessa forma, os media passam a ter um surge como uma forma de fazer a infor- papel central nas discussões públicas. Os cidadãos informam-se a partir dos media e pautam sua agenda de debates e opiniões a 1 O conceito de mediação já foi desenvolvido por diversos autores e assume uma miríade de possibilidades ao longo do seu partir deles. Para Maia (2008), os media têm desenvolvimento. Por falta de espaço não desenvolveremos aqui um importante papel na pré-estruturação toda complexidade desse conceito, falaremos apenas daquela acepção que será usada no trabalho. Para aprofundar as discussões da esfera pública. Isso porque, apesar de sobre esse conceito, ver Davallon, 2007

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“Em outras palavras, os media não criam não configurar-se por si só enquanto esfea accountability, mas ajudam a adicionar ra pública, eles municiam os cidadãos com esforços para criar uma sociedade mais uma grande quantidade de informação, vigilante e crítica. Ao se desenrolar na pré-requisito absolutamente essencial ao cena pública, a dinâmica de prestações de contas permite ao público julgar o defuncionamento de uma esfera pública desempenho dos representantes políticos e mocrática. E embora essa informação foravaliar a efetividade das instituições que necida pelos media seja sempre uma determonitoram abusos e perpetram sanções aos transgressores” (MAIA, p.23, 2009). minada representação parcial da realidade, os usos que se pode fazer desses insumos Se, por um lado, os media expandem o são absolutamente diversos. acesso à informação, por outro eles tamÉ indiscutível o importante papel que os bém limitam esse acesso. Limitam no senmedia têm na sociedade atual. José Marques tido de que o espaço de que se dispõe para de Melo destaca como funções desempe- a divulgação pública de informações não é nhadas pela mídia o fornecimento de in- ilimitado, o que exige que se faça uma seformações para discussões, a contribuição leção daquilo é publicamente exibido. Essa para as competências comunicativas e para seleção, que é feita pelos próprios meios de qualidade dos argumentos formulados por comunicação, deixa de fora uma série de incidadãos bem informados, bem como o formações e acontecimentos que poderiam provimento de tópicos em torno dos quais ser de interesse público, mas que, em comse estruturam esferas privadas e públicas de paração com outras notícias, acabam por conversação cotidiana (MELO, 2007). Além ficar fora da página do jornal impresso ou disso, podemos dizer que os media, sobre- da programação do jornal televisivo. tudo através do jornalismo, muitas vezes Como bem sabemos, os media não são dão visibilidade a uma informação que, de meros canais neutros para outras fontes, outro modo, poderia ficar desconhecida do mas, sim, organizações que controlam o grande público, em virtude da distância dos acesso dos atores sociais aos seus canais e regulam os fluxos de comunicação. Os espectadores ou da ação de outros atores profissionais da mídia selecionam e edisociais no sentido de mantê-la oculta. tam eventos e discursos, enquadrando

significados a partir da própria lógica e de seus modos operatórios (MAIA, p.7, 2009)

Além disso, todo material exibido pelos media precisa de uma adequação técnica, estética e, muitas vezes, linguística para que se torne inteligível ao público. “[...] o discurso mais competente (do campo político) para que seja entendido como competente, terá de ser submetido às modalidades de funcionamento, custos financeiros e a estética exclusivas da comunicação de massa.” (WEBER, p.4, 2004). A operacionalização do conteúdo a partir desses critérios influenciará também no destaque que ele poderá vir a ter. Nesse sentido, a existência de outros mediadores da realidade, que se configurem como alternativas a processos de seleção e adequação dos grandes media, torna-se algo extremamente relevante para a democracia. Não se trata de uma desqualificação da informação provida pelos grandes media, mas do entendimento de suas limitações e da necessária pluralização dos atores da esfera de visibilidade pública. É preciso ter formas de difusão de informação que utilizem outros critérios para a seleção da-


Mídias Sociais e Eleições 2010 quilo que merece ser informado – já que, independente do veículo, uma seleção terá sempre que ser feita -, critérios que não se baseiem apenas na lógica industrial da produção de informações. Diante da seleção de notícias feita pelos media e da dependência da comunicação política dos grandes media, torna-se necessário pensar alternativas a isso. Diferentemente de outros campos sociais, a política – dentro de uma democracia - depende diretamente da comunicação com os cidadãos, tanto no sentido de prestar contas do que está sendo feito quanto no sentido de construir uma imagem positiva que se reflita nos pleitos eleitorais. “O debate público está submetido à mediação de um instrumento movido pelo interesse privado, ao mesmo tempo em que não existem canais de comunicação permanentes entre o cidadão e as instituições criadas para a representação popular e a deliberação institucional. A sociedade brasileira teria ainda à frente o desafio de construir duas pontes para alcançar a democracia deliberativa. A primeira seria instituir mecanismos que estabelecessem livre fluxo de comunicação entre os cidadãos na esfera pública. A segunda ponte está relacionada à possibilidade de comu-

nicação das instituições formais de poder com as múltiplas esferas públicas, permitindo interferências da sociedade nas tomadas de decisão” (RENAULT, p.13, 2003).

de massa continuam a ter uma importância central na construção dessa esfera, o que muda é que agora aumenta a disputa desse espaço com outras fontes de informação. Falamos de ambiente online considerando não apenas a ferramenta técnica que permite seu funcionamento, mas, sobretudo, os usos e apropriações que são feitos dela. O objeto técnico em si abre possibilidades múltiplas que apenas tornam-se efetivas a partir da apropriação que se faz delas. Portanto, quando citamos aqui “ambiente online” o fazemos para referenciar os processos comunicacionais que efetivamente acontecem nesse ambiente.

Nesse sentido, as novas tecnologias de informação e comunicação, sobretudo aquelas próprias do ambiente online, podem nos trazer importantes possibilidades. A facilidade na criação de veículos de comunicação próprios, como blogs, perfis no Twitter, perfis no Orkut e a facilidade de acesso a essas fontes de informação – sem limites temporais ou espaciais tão rígidos – cria um novo tipo de relação comunicacional entre personalidades e instituições e os cidadãos. Agora, torna-se possível falar diretamente a um coletivo, prescindindo dos meios de Não queremos aqui colocar a diversidade comunicação de massa. de mediações como um fato exclusivo do ambiente online, é certo que mediações de Se, em um determinado momento, o po- diversos tipos estão também presentes no der de mediar as informações estava cres- ambiente offline. Entendemos, no entanto, centemente nas mãos dos grandes media, que há características desse novo ambiente hoje podemos dizer que esse processo que modificam a relação de visibilidade e está se reconfigurando. É importante disseminação entre os vários tipos de meressaltar que, apesar da pluralização dos diação. atores na esfera de visibilidade pública, não podemos, de forma alguma, igualar O ambiente online complexifica de forma o poder deles. Os meios de comunicação considerável as dinâmicas de mediação. A

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internet possibilita que as diversas mediações – muitas delas já pré-existentes em ambientes offline – convivam e disputem por visibilidade de forma mais direta. Nesse contexto, torna-se possível não apenas ter acesso a diversas mediações, como compará-las de forma muito mais fácil (dado que os dados estão disponíveis online). Essa possibilidade de comparação, além de evidenciar a existência do processo de mediação, acaba por gerar críticas e questionamentos à forma como determinadas mediações são feitas.

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O que nos parece importante aqui é perceber não apenas os diversos conteúdos que passam a conviver online e suas diferentes características e status, mas também como o contato e a inserção nesse complexo ambiente de mediação reconfigura nossa forma de pensar e lidar com as mediações tradicionais. Essa nova configuração dos fluxos comunicacionais sem dúvida complexifica o próprio processo de mediação, já que se torna possível ao consumidor de informação – de representações da realidade – selecionar não apenas o tipo de informação a consumir, mas também o tipo de mediação que lhe é mais adequado para certo tema,

além de ter a possibilidade de produzir seu ículo de comunicação já era grande devido próprio conteúdo. à insistência do jornal em fazer críticas à candidata do partido. O case da hashtag Não nos interessa aqui julgar o mérito da #dilmafactsbyfolha posição do jornal e dos partidários de DilDepois de compreender as linhas gerais das ma, mas sim compreender como ocorreu mudanças observadas no conceito de me- o processo comunicativo sobre o tema e o diação no ambiente online vamos analisar que ele nos permite observar. Consideranum caso específico em que podem ser no- do a manchete da Folha de São Paulo uma tadas algumas das questões levantadas an- acusação absolutamente absurda contra teriormente. Dilma, alguns internautas resolveram, na própria noite do dia 05, ridicularizar o jornal O case abordado aqui aconteceu em 2010, no Twitter através da utilização da hashtag durante o período de campanha eleitoral #dilmafactsbyfolha. Essa hashtag2 sugeria para presidência da república. Em meio a manchetes para a Folha de São Paulo que uma quantidade infindável de notícias e in- os internautas consideravam tão absurdas formações sobre os candidatos à presidên- quanto aquela divulgada pelo veículo. Abaicia da república, o jornal Folha de São Paulo xo seguem alguns exemplos de tweets: publicou, no dia 05 de setembro, a seguinte manchete “Consumidor de Luz pagou R$ @Fatimacarmo: E acende velas pra “Anjos 1 bi por falha de Dilma”. Esse era o título e Demonios” RT @alansilva1974: Manchede uma matéria que acusava Dilma, candi- te da FOLHA: Dilma revela O Código Da data do Partido dos Trabalhadores (PT) e Vinci. #DilmaFactsByFolha ex-ministra de Minas e Energia, de ter feito um erro de cálculo na tarifa social de energia elétrica que teria prejudicado milhares de consumidores. Essa manchete foi divul- 2 Hashtag é uma forma de classificar determinada postagem ao tema e de facilitar sua localização em mecanismos de gada em um contexto onde o descontenta- quanto busca. Ao clicar em uma hashtag, o usuário pode ver todos os mento dos partidários do PT com esse ve- tweets que a utilizaram, o que permite uma visualização mais ampla da utilização daquela hashtag e de sua popularidade.


Mídias Sociais e Eleições 2010 @lelo13: Nero era filiado ao PT e colocou Fogo em Roma a pedido de Dilma #DilmaFactsbyFolha @gustavoamigo: #DilmaFactsByFolha Folha teve acesso a documentos que comprovam que Dilma lutou com Darth Vader durante governo militar. @JesusDivino: Folha revela #Dilma incentivou Eva dizendo: “Come boba, emagrece!” #DilmaFactsByFolha Essa campanha contra a Folha de São Paulo acabou sendo bastante grande, atingindo uma grande quantidade de usuários e perdurando por alguns dias no Twitter. Por um lado, esse caso nos mostra como a possibilidade de divulgação de informações sem o filtro dos media noticiosos permite uma articulação feita pela sociedade civil com uma pauta escolhida por ela própria. Essa vontade de criticar um jornal visto como mentiroso encontra respaldo em tecnologias hoje disponíveis na internet, como o Twitter, que vão possibilitar a disseminação do conteúdo e a formação de uma rede de pessoas em torno do tema proposto.

Sem as ferramentas da internet, uma campanha como essa provavelmente teria ficado restrita a muito menos pessoas e teria tido muito menos atenção (a campanha de uso da #hashtag foi noticiada por vários portais de notícias online). Portanto, é interessante observar no caso como a insatisfação de uma parcela da população conseguiu se articular e se expressar publicamente ganhando visibilidade com uma simples ferramenta gratuita, disponível na web. Outros dois aspectos podem ser notados. O primeiro é o tom de ironia e humor presente nessa ação. Essas duas características tem se mostrado como importantes para a potencialização da disseminação de conteúdo em campanhas políticas. Em um contexto onde as notícias e campanhas costumam ter um tom sóbrio e sério, um conteúdo com uma pitada de humor parece se diferenciar e ganhar mais facilmente amplitude.

partiu de um usuário. Ele escolheu as palavras, usou a expressão e ela se disseminou atingindo outros usuários. Não se trata de algo plenamente previsto pela ferramenta, mas sim de uma apropriação específica dos usuários. Falando em usuários e em campanha política, é crucial fazer uma ressalva: o usuário que começou o uso da hashtag pode sim ter sido alguém envolvido na própria campanha da candidata Dilma. Isso tem sido algo bastante comum em campanhas políticas online – inclusive com uso de fakes3 - mas é algo que não descredibiliza o movimento. É preciso sim ter noção dessa possibilidade, mas é importante perceber que independente de onde começa, a força do movimento está no seu crescimento, na amplitude que consegue ganhar.

Contudo, se por um lado o movimento tem grande validade no sentido de permitir a crítica aberta a um meio de comunicação, por outro não há nenhum resultado efetivo A outra questão seria o uso da própria fer- da campanha. O jornal não publicou errata ramenta. O próprio uso de hashtags no ou se desculpou publicamente nem sequer Twitter já foi algo que surgiu dos usuários divulgou qualquer nota sobre a campanha para depois ser incorporado pela ferramenFakes são perfis falsos, que não são de pessoas reais. Em ta, mas, nesse caso específico, é preciso 3campanhas políticas, eles são criados geralmente para divulgar observar que a criação da hashtag utilizada mensagens de apoio a um candidato ou de repúdio a seus adversários.

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que foi feita contra ele. Além da crítica, o que o movimento pode ter tido de mérito foi a possibilidade (isso teria que ser propriamente medido) de atingir pessoas que poderiam ter lido a Folha de São Paulo e que talvez, ao lerem os tweets com a hashtag poderiam problematizar o posicionamento do jornal. Isso é possível de acontecer sim, contudo estudos mostram que esse tipo de campanha política na internet tende a ficar muito restrita aos chamados “like-minded”, aqueles que já têm simpatia com a causa e que apenas a reforçam a partir de ações como essa.

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SANTOS, Nina. Esfera de visibilidade e comunicação desintermediada: uma análise do blog Fatos GOMES, Wilson; MAIA, Rousiley C. M. Comu- e Dados. 2010. 85 f. Trabalho de Conclusão de nicação e Democracia. São Paulo: Paulus, 2008. Curso - Faculdade de comunicação da Universidade Federal da Bahia. Coleção Comunicação. MAIA, Rousiley (coord.). Mídia e deliberação. Rio WEBER, Maria Helena; PEREIRA, Marcos V.; de Janeiro: Fundação Getúlio Vargas, 2008. COELHO, Marja P. O voto, a rua e o palco. In: MAIA, Rousiley. Mídia e diferentes dimensões da XIII COMPÓS, 2004, São Bernardo do Campo. Portanto, o contexto online traz sim mudanAccountability. Revista da Associação Nacional Disponível em: <http://www.compos.org.br/ ças significativas aos processos de mediados Programas de Pós-Graduação em Comuni- data/biblioteca_598.pdf>. Acesso em: 31 jan. ção e de comunicação de forma geral. Esse cação, n.2, 2009. Disponível em: <http://www. 2010. novo contexto impacta e deve ser levado em conta na idealização e no planejamen- compos.org.br/seer/index.php/ecompos/article/ viewFile/113/112>. Acesso em 31 jan. 2010.

to de campanhas online. É preciso, porém, compreender os limites e possibilidades desse contexto para calcular de forma mais MARQUES DE MELO, José . A Utopia Brasileira da Mídia Cidadão. Comunicação & Educação, v. 1, precisa os impactos que ele pode gerar. p. 25-30, 2007.

RENAULT, Letícia. Comunicação: um instrumento de política?. In: XXVI Congresso Anual em Ciência da Comunicação, 2003, Belo Horizonte.


Branded Content nas Eleições 2010 Por Danila Dourado

Doutoranda em comunicação digital pela Universidade Carlos III de Madri, pesquisa os novos modelos de negócios nas mídias sociais. Atualmente é gerente de monitoramento e análise da PaperCliQ, agência baiana de comunicação e estratégia digital. Palavras-chave: Branded Content, estratégia do conteúdo, mídias sociais, entretenimento, licensing, product placement, advertising, advergaming. www.daniladourado.com www.twitter.com/daniladourado www.slideshare.net/daniladourado

O

s cidadãos, saturados com o excesso de impactos publicitários a que são expostos constantemente, criaram um bloqueio a anúncios abertamente impostos. Esse tipo de divulgação pode ser constatada na técnica publicitária que utiliza o recurso de textos no imperativo, se assemelhando a uma ordem, o que acaba transmitindo a ideia de uma quase “obrigação” em seguir aquela recomendação. No entanto, é impossível abortar os espaços comerciais dos meios de comunicação, já que eles continuam sendo a principal fonte de financiamento da mídia. Sem a publicidade, possivelmente, a audiência teria que abonar uma taxa para poder desfrutar de conteúdos que possuem uma qualidade aceitável. Somado ao problema da saturação vem o fato da fragmentação dos usuários, que provem do excesso de ofertas midiáticas, e desperta grande inquietude por parte do setor de comunicação. Como respostas a essas falácias do mercado, nasceram novas práticas que implicam oferecer conteúdos


que sejam relevantes aos usuários, entre elas está o branded content. Contudo, essa é uma estratégia que objetiva sanar o problema da economia da atenção dos cidadãos, e que, por isso, pode ser aplicada à propaganda eleitoral, como se constatou na eleição de 2010 no Brasil. A propaganda possui suas particularidades, principalmente por não divulgar uma marca corporativa, tendo como fim propagar uma ideiaidéia, opinião ou doutrina.

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ceito político de verdade: verdade é tudo o que nos faz mais livres. Analogamente, nas redes, verdade é tudo o que nos faz mais cooperativos.”1

A composição de um padrão social sem hierarquia gera uma diferença sistêmica do modo como a sociedade está construída. Nesse sentido, encontra-se dificuldade de articulação em um cenário onde rege a cultura participativa, totalmente divergente da exposição midiática imposta até então. Pode-se afirmar com veemência que ocorreu uma transformação do que “era quase um Campanhas eleitorais e internet oligopólio na criação e produção de inforA internet possibilitou grandes mudanças mação a uma situação em que qualquer pesno processo comunicativo. Não só por im- soa pode se converter em um ente emissor plantar uma série de novos recursos, como e criador de opinião” (Flores Vivar, 2006). também por dispor uma nova organização do padrão social, viabilizando a aplicação A crescente participação dos usuários reda democracia na sua máxima extensão. verbera na ascensão da Web como plataEsse novo modelo organizativo se dá com a forma para debates democráticos. Partidos, quebra da hierarquia, evidenciam-se, assim, políticos, especialistas, militantes e eleitoas redes sociais distribuídas, que segundo res; dispõem de um canal aberto para exAugusto de Franco: por seus pontos de vistas. Sendo assim, os ambientes interacionais online servem de “Redes sociais distribuídas são sempre redes de cooperação: tal como a liberdade, a cooperação é um atributo do modo como os seres humanos se organizam e nada mais. Nas democracias vale um con-

1 Franco, A. Por que falamos tanto de redes sociais e temos tanta dificuldade de articulá-las. Disponível em: http://augustodefranco. locaweb.com.br/cartas_comments.php?id=343_0_2_0_C (Acessado 13/03/2011)

suporte para movimentos cidadãos como, por exemplo, o flashmob em frente ao MASP2 que os ativistas políticos do Partido Verde organizaram para sua candidata à presidência, ou o twittaço #euvotomarina3, planejado por um dos membros da comunidade do Orkut “Marina Silva – PV”, objetivando inserir a mencionada hashtag nos trending topics4 Brasil. São movimentos descentralizados como esses que corroboram a convergência midiática defendida por Jenkins, onde todos os meios convergem para transmitir conteúdos através de múltiplas plataformas, dispostos a ir quase a qualquer parte em busca de oferecer aos usuários o tipo de experiência desejada. Esse mesmo autor ressalta que “o emergente paradigma da convergência assume que os velhos e novos meios interagem de forma cada vez mais complexa” (Jenkins, 2008).

2 http://noticias.terra.com.br/eleicoes/2010/fotos/0,,EI15311OI131776,00.html (acessado 13/03/2011) 3 http://eleicoesnarede.blog.terra.com.br/2010/07/20/ twittaco-coloca-marina-nos-trending-topics-do-brasil/ (Acessado 13/03/2011) 4 Sistema integrado ao microbloging Twitter que identifica os assuntos mais mencionados dessa mídia social.


Mídias Sociais e Eleições 2010 “A estrutura da comunicação em rede que caracteriza a internet, por exemplo, traz diferenças fundamentais para cada elemento do processo comunicativo. Tratase de emissão dispersa e capilarizada, fundamentalmente não-hierárquica, em que emissores alternativos e atores políticos marginais podem tentar produzir eventos noticiáveis, procurando atrair a atenção dos jornalistas e, consequentemente, espaço valioso no noticiário”.5

candidatos que possuem menos recursos no processo político; e (d) incremento das alternativas disponíveis para mobilização dos votantes e da participação cívica. Na última eleição de 2010, a colaboração esteve presente em todas as instâncias, principalmente na campanha eleitoral digital, possuindo como suporte base as mídias

sociais. Mesmo enfrentando a proibição pela Lei 9.504 de fazer propaganda política na internet anteriormente à data estipulada pela Justiça Eleitoral (06/06/2010), muitos candidatos mantinham presença digital antes mesmo desse período e continuaram a utilizar os recursos de interação no decorrer do processo eleitoral, como mostra o quadro abaixo:

Se por um lado é inegável a colaboração direta dos cidadãos nas campanhas eleitorais através da internet, por outro, pode-se aferir que esse entorno dilui o peso da propaganda como forma de interferir na diversão, já que a internet oferece inúmeros recursos para entreter e informar os internautas ao mesmo tempo.

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Além disso, Corrado & Firestone (1997 in Anduiza, Cantijoch & Cristancho) alertam para quatro possíveis conseqüências que uma campanha eleitoral na internet pode ter: (a) o fortalecimento do vínculo dos cidadãos com os candidatos; (b) uma melhora na informação política dos eleitores; (c) uma maior acessibilidade e visibilidade dos 5 Alé, Alessandra. Jornalistas e internet: a rede como fonte de informação política. IV Encontro dos Núcleos de Pesquisa da Intercom. Porto Alegre, 2004.

Candidatos a presidente nas redes sociais - Mapa Digital.


Segundo Brian Solis “os links são a moeda da Web”, a partir dessa afirmação pode-se fazer uma analogia aferindo que a atenção é o grande negócio da comunicação. Dessa forma, a participação dos candidatos em diversas plataformas demonstra o desafio que é reter o interesse dos cidadãos. A partir disso, nasce a necessidade de utilizar recursos alternativos que apresentem os valores ideológicos dos políticos, oferecendo conteúdo relevante para os usuários.

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Branded Content: advertainment, product placement e licensing O branded content é uma estratégia que apresenta a marca em forma de conteúdo, ou seja, “busca integrar os valores da marca em um conteúdo que pode ser entretenimento, informação ou educação” (Aguado, 2009). No entanto, é mais comum que essa estratégia esteja associada a recursos lúdicos. Por isso, de um ponto de vista mais amplo, pode-se afirmar que é uma resposta do âmbito do entertainment marketing a determinados problemas da comunicação atual, como os já mencionados anteriormente.

usada há décadas para a divulgação e criação de identidades de marcas, por meio da inserção de mensagens em seu conteúdo”. Sendo assim, é possível converter a marca em parte do entretenimento, “conseguindo que os consumidores se relacionem com as marcas e criando ao seu redor um mundo de valores emocionais, conduzindo-os até as últimas conseqüências do processo de convergência” (Aguado, 2009).

meio a um informativo ou uma novela se menciona alguma marca. Essa prática também é chamada erroneamente de merchandising. Esse é um equívoco trivial, porém circunspecto, já que merchandising ocorre exclusivamente no ponto de venda.

Para Gabriel (2010) o product placement é a “inserção de produtos adequadamente no enredo ou narrativa do entretenimento de forma a alavancá-los”. Um exemplo dessa Para que essa fusão seja efetiva, é preciso categorização, aplicada a uma campanha realizar um cuidadoso trabalho de posicio- política, ocorreu em um episódio da série namento da marca. O mesmo ocorre com americana The Simpsons. o marketing político, é praticamente impossível defender os valores ideológicos de um O patriarca da família, Homer Simpsons, candidato se o mesmo não tiver bem de- realiza algumas tentativas para votar no seu finido o conceito que deseja transmitir ao candidato à presidência dos EUA em 2008, seu eleitorado. Barack Obama. No entanto, há um problema de comunicação entre a urna eletrônica Dentro da categorização do branded content e o citado personagem da série, acarretanexistem três modalidades específicas, são do em equívocos sucessivos na votação. elas: product placement, advertainment e licensing. Apesar das inúmeras diligências, o voto Abaixo, apresenta-se um maior aprofunda- acaba sendo computado para o candidato mento de cada uma dessas categorias. da oposição, John McCain.

O product placement ocorre quando há a men- Já o advertainment é a integração da publiciDe acordo com Gabriel (2010), o “entre- ção à marca dentro de conteúdos não pu- dade com entretenimento. Como manifesta tenimento é uma plataforma estratégica blicitários, como, por exemplo, quando em Bob Isherwood, diretor criativo mundial da


Mídias Sociais e Eleições 2010 Saatchi & Saatchi: “A nova filosofia da publicidade é que ela seja invisível. Devemos entreter os consumidores se não queremos perder-lhes”. Até pouco tempo essa era uma prática utilizada apenas em filmes, seriados e outros formatos de ficção, mas também existem outras vias para oferecer aos cidadãos informações do candidato mescladas a conteúdo relevante, criando uma experiência benéfica, culminando no estreitamento do relacionamento entre o político e seus eleitores. Em um dos episódios da websérie Pequeño Tirano, exposta abaixo, constata-se a utilização do advertainment para transmitir aos usuários críticas ideológicas aos excessos do atual presidente da Venezuela. Uma derivação do advertainment a que muitos candidatos vêm recorrendo bastante é o advergaming na sua versão 2.0, como alguns autores definem. O advergaming é uma integração das mensagens publicitárias a jogos online. Em um sentido mais amplo, trata-se de uma ferramenta de marketing e comunicação que serve para

Episódio The Simpsons, onde o Homer Simpsons tenta votar em Barack Obama Canal Deebold08 Youtube.

Websérie animada que utiliza o advertaiment para expor determinadas imposições do governo de Hugo Chávez - Canal do Youtube Piensa em Lentejas.

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Membros do Partido Liberal da Áustria lançaram o game antimuçulmano como parte de uma campanha política no estado de Styria, onde as eleições parlamentares aconteceram no final de setembro. Segundo o Portal G1, “no game, os jogadores precisam parar a construção de minaretes6 e mesquitas, usando um sinal de “parar”. Se o jogador não conseguir cumprir a meta de impedir a construção, um muçulmano chama todos para rezarem em frente a uma paisagem típica da Áustria”.

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Game Mosche Bab - Portal G1.

promover um produto através de um jogo interativo que permite exposição contínua do usuário àquilo que se publica. Ou seja, um novo horizonte a ser desbravado não só no marketing político, como para o posicionamento de marcas de todos os segmentos.

Evidencia-se em campanhas eleitorais a utilização desse recurso interativo para atrair uma nova demanda de eleitores e fidelizar a já existente. É possível constatar um exemplo límpido da utilização do advergaming durante as eleições da Áustria, no segundo semestre de 2010.

Evidencia-se a modalidade licensing quando há a concessão da licença da marca para aplicação por terceiros a um produto completamente diferente da marca de origem, como personagens de animação, séries e filmes. De acordo a Aguado (2009), o licensing “aporta sinergias positivas aos anunciantes, de maneira que a marca atua como agente dinamizador da venda para estimular decisões de compra de todas as categorias dos produtos”.

6 Pequenas torres de onde se anuncia à hora das orações


Mídias Sociais e Eleições 2010 descritas no tópico anterior, na competição pelos cargos políticos elegíveis nesse momento. O presente artigo observa algumas das aplicações do product placement, advertainment e do licensing na corrida eleitoral do país nesse ano.

Uso de licensing em campanhas eleitorais.

Aplicando esse conceito a campanhas eleitorais, corrobora-se que essa modalidade acarreta um efeito recíproco. A fama dos produtos licenciados reverbera na difusão da imagem do político através de uma ampla gama de benefícios ofertados, fazendo com que os cidadãos acompanhem o candidato continuamente, sem associar a exposição contínua da sua imagem a algo pejorativo. Nesse caso, é possível evidenciar a utilização abrangente desse recurso na campanha do atual presidente dos EUA, Barack Obama7. Além disso, a campanha de Hugo Chávez, presidente da Venezuela, também 7 http://www.flickr.com/photos/ barackobamadotcom/2260801445/ (Acessado em 06/04/2011)

se beneficiou do uso dos produtos licenciados8.

Como ponto de partida da análise, pode-se aferir que o filme “Lula, o filho do Brasil” foi aplicado como um viés para divulgar os valores do ex-presidente do país, configurando, assim, como um produto licenciado9. Inclusive, logrou ir um pouco mais além, chegando a transmitir a ideologia do Partido dos Trabalhadores (PT), desde a sua concepção até a conquista do maior cargo democrático do Brasil.

Através dessas três modalidades do branded content evidencia-se o poder ideológico do entretenimento, como argumento persuasivo para influenciar na decisão do voto. Sendo assim, há a necessidade de trabalhar ponto a ponto as conexões sociais para po- O filme, lançado no início de 2010 e dirigido tencializar o fluxo de ideias, opiniões, ver- por Fábio Barreto, retratou cenas protagonizadas por Luís Inácio Lula da Silva durante sões, e, por fim, decisões. todo o processo de politização, que o então líder sindical percorreu. Através da narrativa de incidentes ocorridos em sua trajetória de Eleições 2010 e o uso do sindicalista, aborda fatos reais que tiveram branded content Durante as eleições de 2010 do Brasil, ve- lugar durante a ditadura militar. rificou-se a utilização das categorizações 8 http://www.flickr.com/photos/charliemoon2007/1133237253/ (Acessado em 06/04/2011)

9 Essa percepção é decorrente da função exercida pelo filme “Lula, o filho do Brasil”, segundo a autora desse artigo. Não entrando no mérito de realizar uma análise da intenção da concepção do mesmo.

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é concebida ao ser aplicada a plataformas de conexões sociais, como, por exemplo, as mídias sociais. Nesse sentido, ao propagar os valores de um candidato e/ou partido em um game social, evidencia-se a utilização da estratégia de advergaming. Partindo desse pressuposto, expõe-se o game batizado de Um mundo lançado pela candidata a presidência do Partido Verde, Marina Silva. O jogo transmitia os valores do PV a partir da construção de um mundo melhor, organizado pelos próprios usuários.

52 Imagem comparativa entre cena do filme “Lula, o filho do Brasil” e um retrato real do ex-presidente no momento que foi detido durante a ditadura militar - Montagem elaborada a partir de imagens divulgadas no Sindicato dos Metalúrgicos do ABC.

Dessa forma, mesmo que indiretamente, o PT conseguiu vincular a história do então presidente à trajetória da candidata Dilma Rousseff. A referida presidenciável, em alguns momentos da sua campanha, rebateu a falta de experiência em cargo eletivo, enfatizando a mensagem que possuía uma história de luta política, demonstrando uma conscientização e acompanhamento das problemáticas do país.

Na verdade, os telespectadores do filme, independente de opção partidária, “foram tocados pela pontinha da estrela” (Mendonça, 2001), após assistir essa grande obra cinematográfica. Como segundo caso de análise, considerase os games sociais que foram divulgados durante a campanha eleitoral de 2010 ocorridas no Brasil. Essa modalidade de game

O aplicativo versava sobre os conceitos defendidos durante a campanha da Marina Silva. Os usuários eram direcionados a escolher os valores prioritários para começar seu próprio mundo. Conforme fossem se desenvolvendo no jogo, eles poderiam optar por novos valores, tais como: desenvolvimento sustentável, educação de qualidade, saúde em todos os sentidos, empregos de qualidade, natureza bem cuidada, cidades seguras e sustentáveis, sustentabilidade no campo, valorização da cultura e da arte, cultura de paz e cidadania plena e Amazônia viva.


Mídias Sociais e Eleições 2010

Jogo denominado Um mundo lançado pela candidata Marina Silva - Eleições 2010 – Portal R7.

Game bolinha de papel, protagonizado por José Serra - Revista Info.

Propaganda eleitoral do candidato a deputado federal Jeferson Camillo - Blog Entre o céu e o inferno.

O PV se beneficiou do advergaming para projetar mensagens intrínsecas à campanha da sua candidata, no entanto, o presidenciável José Serra claramente não obteve o mesmo direcionamento por parte de sua equipe de marketing.

Nas eleições de 2010, também houve alguns casos que estiveram em pauta na mídia por se acercar ao escárnio, como é possível evidenciar nas campanhas de advertainment dos candidatos a deputado Jeferson Camillo e Tiririca.

do cenário político, apostando em novos nomes.

O tucano protagonizou o game em reverência ao suposto ataque sofrido durante sua campanha política, quando hipoteticamente atiraram um rolo de durex e uma bolinha de papel em sua cabeça. Esse jogo apresenta Serra na bancada do Jornal Nacional, meio de comunicação acusado pela oposição de supervalorizar o episódio para manipular a opinião do eleitorado. O objetivo do jogador é acertar as bolinhas de papel a cada aparição do candidato.

Os vídeos adquiriram caráter viral na rede, ampliando o alcance do conteúdo exposto para milhares de pessoas. Apesar de ter conquistado esse buzz com muita destreza, Jeferson Camillo utilizou o horário político o candidato não foi eleito, somando apenas e seu canal do Youtube para promover a sua 1.884 votos, segundo o Tribunal Superior proposta de governo através de vídeos que Eleitoral (TER-SP)10. visavam atrair a atenção dos eleitores potencias. A partir desse formato, foram pro- Se por um lado o candidato do Partido duzidas uma série de propagandas eleitorais Progressista (PP) não obteve êxito com sua que mesclavam sensualidade e os valores do campanha, por outro o palhaço Tiririca uticandidato, tais como: apoio a diversidade e lizou uma fórmula similar e conseguiu ser liberdade de expressão. Dessa forma, eram eleito o deputado federal mais bem votado transmitidas mensagens ousadas que instigavam o público a tentar driblar a mesmice 10 http://www.tre-sp.gov.br/eleicoes/2010/arquivos/resultados/ votacao_partido_coligacao_df.pdf (Acessado 03/04/2011)

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do Brasil. O representante do PR, com vídeos divertidos, abarcou 1.353.820 de votos nas urnas11, possibilitando ao seu partido a quinta maior bancada na Câmara dos Deputados.

Com o slogan “vote no Tiririca, pior que tá não fica”, o candidato conquistou o eleitorado - Canal do Youtube 2222 Tiririca.

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Vinheta 45 anos da Rede Globo comparada ao discurso do candidato José Serra - Canal do Youtube Abra los ojos channel,

Muitos analistas atribuem à quantidade de votos do Francisco Everardo Oliveira Silva a uma espécie de voto de protesto, representando uma via que o eleitorado encontrou para manifestar sua insatisfação com os políticos do Brasil. No entanto, supõese que a identificação da população com o candidato pode ter arrebatado uma série de eleitores indecisos. Essa afirmação é corroborada por Mendonça (2001), quando o autor explicita que “se o eleitor começa a gostar do programa, o próximo passo é gostar do candidato”. Contudo, essas estratégias podem ser facilmente confundidas com a publicidade encoberta que está terminantemente proibida pela legislação brasileira. Já que a linha que difere a exposição de uma marca em forma de conteúdo é muito tênue e pode ser ultrapassada sem parcimônia. Como denuncia o professor da ESPM, Raul Santa Helena, em 11 Ibdem.


Mídias Sociais e Eleições 2010 um texto12 que analisa a vinheta comemorativa dos 45 anos da Rede Globo, comparando o vídeo ao discurso do candidato José Serra durante o processo eleitoral. Segundo Santa Helena:

com a marca, possibilitando a transmissão de conceitos e valores, através de advergamings que utilizam a interação e a diversão como bases principais de contato com os internautas. • No Brasil, não existe a cultura da prática “A vinheta da Globo de 45 anos trazia do licensing em campanhas eleitorais. Essa mensagens estranhas para uma campanha estratégia é visualizada com abrangência de aniversário de TV (“mais educação, na política americana, onde o voto não é mais saúde, o Brasil mais”) e estava coincidentemente (sic) alinhada com o slogan obrigatório e os candidatos necessitam de Serra “O Brasil Pode Mais”. Globo reutilizar recursos mais efetivos para motirou do ar em menos de 24h depois da bilizar os civis para se dirigirem até as polêmica estourar no Twitter”. urnas. Por outro lado, a população brasileira não possui o hábito de “financiar” Considerações finais campanhas políticas mesmo que indire• A partir da análise realizada nesse artigo, tamente, como ocorre nos Estados Unipode-se aferir que as estratégias de brandos através da venda de produtos licended content potencializam o alcance das ciados e de doações dos cidadãos. mensagens. Principalmente, pelo fato desse recurso não ser percebido de for- • O product placement é regulamentado pela Diretiva Européia de Televisão sem ma intrusiva pelos usuários, alcançando Fronteira. No entanto, essa prática está o status de parte do entretenimento. restringida por lei na Europa em espaços Dessa forma, o branded content consegue informativos e programas infantis. No atrair uma pré-disposição dos cidadãos Brasil, até o momento, ainda não existe em ouvir a mensagem, deixando-os mais uma lei que regulamente essa prática. receptivos ao conteúdo exposto. • Os games sociais, geralmente, aumen- • Apesar dos exemplos citados no decorrer do artigo, evidencia-se que a estratam o tempo de contato dos usuários tégia de branded content não foi bem ex12 Santa Helena, Raul. Eleições 2.0. Disponível em http://www. plorada pelos candidatos nas eleições de blogpulso.com.br/2010/07/eleicoes-20/ (Acessado 03/04/2011)

2010. Mesmo inspirando-se fortemente na campanha digital de êxito do Barack Obama, ainda não existe a cultura nos políticos do cenário nacional em aplicar práticas com esse nível de engajamento. A tradição parlamentar ainda apresenta certo receio com a totalidade dos recursos interacionais online.

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Referências Bibliográficas

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Interface entre Jogos Sociais e Política: Oportunidades e Estratégias de Diferenciação Por Marcel Ayres e Renata Cerqueira

Diretor de Planejamento da PaperCliQ | Comunicação e Estratégia Digital. Faz parte, como pesquisador, do Grupo de Pesquisa em Interações, Tecnologias Digitais e Sociedade (GITS – UFBA). É co-organizador do ebook #MidiasSociais: Perspectivas, Tendências e Reflexões. Atualmente, desenvolve uma pesquisa sobre o Gerenciamento de Impressões na Comunicação Organizacional em Mídias Sociais.

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Diretora de Monitoramento e Análise da PaperCliQ, agência de Comunicação e Estratégia Digital. É formada em Jornalismo, na Universidade Federal da Bahia, e pós-graduada em Gestão da Comunicação Organizacional Integrada, na Escola de Administração da mesma universidade. É co-organizadora do ebook #MidiasSociais: Perspectivas, Tendências e Reflexões.

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Palavras-chave: eleições, jogos sociais, monitoramento

S

Introdução egundo Manhanelli1, técnicas de marketing político e comunicação social são integradas, com o objetivo de conquistar a aprovação e simpatia da sociedade, construir uma imagem sólida do candidato e transmitir confiabilidade e segurança para a população. Contudo, conquistar a simpatia das pessoas em um mundo onde atenção é artigo raro, não é algo simples - é preciso criar um ambiente favorável para a construção de laços entre políticos e eleitores. Em sintonia com as mudanças de comportamento e consumo de tecnologias e informações na web, estrategistas de comunicação digital passam a ver nas mídias sociais, e em recursos como os games, meios propícios para uma aproximação entre internautas e políticos/candidatos, oferecendo diferentes atrativos, como serviço, informação, entretenimento, relacionamento etc... Hoje, o diálogo entre mídias sociais e games é algo que permeia diferentes setores do mercado, inclusive o político, gerando 1 MANHANELLI, Carlos Augusto. Eleição é Guerra.

São Paulo: Summus, 1992.


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oportunidades que vão além de práticas tradicionais no campo. Pensando nisso, o presente artigo busca realizar um breve olhar sobre os games, mais particularmente os Jogos Sociais (Social Games), enquanto uma oportunidade estratégica de diferenciação, de estreitamento de laços e de engajamento na web, refletindo sobre como esse fenômeno pode ser mais aproveitado no campo da política e das eleições. Para isso, trazemos alguns exemplos, dados e possibilidades estratégicas que podem ser incorporadas em campanhas e, também, mostraremos, ao longo do texto, como o monitoramento online de marcas e conversações pode evocar informações e insights para a otimização de estratégias e para a compreensão dos anseios, desejos e comportamentos dos públicos de interesse. Games e Política: alguns exemplos e usos em campanhas A relação entre os games e a política não é uma novidade no contexto das eleições, contudo ainda é um tipo de prática, em geral, pouco explorado nas estratégias de comunicação digital. As possibilidades e os modelos variam muito, como mostraremos em alguns exemplos a seguir:


Mídias Sociais e Eleições 2010 a) Primeiro Jogo Político na Web (Ho- cos (com outdoors, banners, etc.), contudo, utilizando os espaços virtuais. A compra ward Dean - 2003) desses espaços pode ser fixa, ou seja, comEm 2003, Gonzalo Frasca, doutor em Game pra-se um espaço fixo em um determinado Studies pela Universidade de Copenhagen e local do jogo, ou pode ser alugada, paga-se editor do site www.ludology.org, foi res- um valor para anunciar temporariamente ponsável pela criação de um dos primeiros em ambientes de jogos online. games eleitorais disponíveis na web - “The Durante a campanha de 2008 para a preHoward Dean Game for Iowa2”. sidência dos Estados Unidos, a equipe de O game, criado para o candidato democrata Barack Obama resolveu apostar nos jogos Howard Dean, nos Estados Unidos, tinha online e anunciaram por quase um mês, em como principal objetivo conquistar o elei- 10 estados americanos, a campanha “Eartorado mostrando práticas de engajamento ly Voting”. Os usuários dos jogos da EA cívico em prol do candidato. Para conquis- (Eletronic Arts), no console XBOX Live, tar pontos e avançar no jogo, era necessário visualizaram anúncios do candidato, que os percorrer todo o estado de Iwoa e utilizar convidava para conhecer melhor sua pladiversas estratégias para recrutar o maior taforma de campanha. Ao longo da ação, número de eleitores possível. Veja, a cima, foram gastos US$ 94 mil nestes anúncios alguns exemplos. in-game3.

brasileiros, a equipe da então candidata do Partido Verde (PV), Marina Silva, criou um game baseado em temas e valores defendidos na plataforma de campanha. A lógica do jogo era semelhante à de games de sucesso nos Sites de Redes Sociais, facilitando a adesão dos internautas. Basicamente, o jogo propunha que cada usuário construísse seu próprio mundo e compartilhasse causas sociais com seus amigos. Para isso, ao acessar a página, o usuário selecionava o tema de seu mundo, como, por exemplo: desenvolvimento sustentável, educação, saúde, empregos, natureza, segurança etc.

O ponto-chave da iniciativa era o poder de recomendação e compartilhamento dos usuários na web, afinal, para que o mundo escolhido crescesse, os internautas deveriam visitar e receber visitas de outros jogadores para acumular pontos e trocar presentes. b) Publicidade In-Game (Barack Obama c) Game e Mídias Sociais – Marina Sil- Para ampliar seu poder de alcance e disse- 2008) va (2010) minação, o jogo disponibilizava opções para compartilhamento em mídias sociais como A Publicidade dentro de jogos (In-Game Já no Brasil, em 2010, aproveitando o for- Twitter, Facebook, Orkut, além de contar com Advertising) consiste, basicamente, na utili- talecimento do uso de mídias sociais pelos conteúdos explicativos no YouTube. zação de espaços de mídia dentro dos videogames, assim como se faz em espaços físi- 3 Fonte: Politics 2.0 - http://www.slideshare.net/tarushijio/ 2 http://www.deanforamericagame.com/play.html

politics-20-a-campanha-online-de-barack-obama-em-2008

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60 Jogos Sociais como oportunidade estratégica para a Política A iniciativa vinculada à Marina Silva, citada anteriormente, chama a atenção, particularmente, para o fenômeno dos Jogos Sociais – que, por serem ainda pouco utilizados na interface com a política, representam uma oportunidade de diferenciação em corridas eleitorais.

Em geral, os Jogos Sociais são aplicativos criados para Sites de Redes Sociais (SRS), que possuem elementos de jogos eletrônicos e possibilitam: a criação de perfis; o compartilhamento de regras e signos; a experimentação de narrativas ou recursos; a competição por recompensas baseadas no desempenho dentro do jogo entre outras características. Esses jogos superam o seu sistema interno de regras e dinâmicas; eles transbordam do jogo, afetando, também, o dia-a-dia das pessoas e a forma como interagem umas com as outras. Criam-se, assim, Sistemas Sociais4. Para entender a expressividade dessas iniciativas, em matéria divulgada na F. de São Paulo5, estima-se que existam, em 2011, no Brasil, cerca de 25 milhões de jogadores de Jogos Sociais – o que representa 73% dos usuários de Sites de Redes Sociais acima de 15 anos no país. Entre os grandes players deste mercado estão empresas como Zynga (EUA), responsável pelos hits de sucesso no Facebook, a PlayFish (UK), comprada pela gigante dos games, a EA Games, e a Vostu (Brasil), famosa pelos Jogos Sociais no Orkut. 4 Fonte: http://www.slideshare.net/tarushijio/analise-e-

desenvolvimento-de-jogos-sociais?from=ss_embed

5 Fonte: http://www1.folha.uol.com.br/tec/879782-games-emredes-sociais-giram-r-200-mi-no-brasil.shtml


Mídias Sociais e Eleições 2010 Os dados acima são animadores, contudo, quais são as vantagens que os Jogos Sociais oferecem para uma campanha eleitoral ou ação política? Para responder essa questão, levantamos abaixo alguns pontos que ilustram razões para investir nessas iniciativas: a) Crescimento acelerado e público-alvo

Quando o assunto é faturamento, nos Estados Unidos, segundo pesquisa da eMarketer, a projeção é de que os Jogos Sociais alcancem a marca de US$ 61 milhões em 2012, crescimento de 29% comparado a 2011, principalmente devido a investimentos publicitários e compra de bens virtuais.

b) Capacidade de disseminação e reOs Jogos Sociais fazem parte, cada vez tenção mais, do dia-a-dia das pessoas, atingindo a diferentes sexos/idades e angariando um A maioria dos Jogos Sociais utiliza as coneenorme potencial de crescimento. xões e os dados fornecidos pelos usuários dos Sites de Redes Sociais para fornecer diEm 2010, segundo estudo realizado pela em- ferentes tipos de interação social e exprespresa Flurry – empresa de análise de aplicati- sões. Para ampliar o poder de disseminação, vos móveis-, 26 milhões de usuários únicos esses jogos envolvem o jogador em uma gastaram em torno de 25 minutos diários experiência na qual ele possa compartilhar em jogos de Sites de Redes Sociais como ações variadas com seus amigos/contatos, Orkut e Facebook. Só no Facebook, segundo como, por exemplo, oferecer bens virtuais, estatísticas divulgadas pelo Blog All Face- competir por pontos, alcançar status/visibook6 em outubro de 2010, os 265 milhões bilidade etc. Essas práticas são favorecidas de jogadores que acessaram o site passaram pelo ambiente onde os jogos estão: nas mí927 milhões de horas por mês nos Jogos So- dias sociais, as pessoas naturalmente inteciais. Em relação aos dados demográficos do ragem e compartilham informações. Desse público, enquanto os jogadores homens se modo, a chave desses jogos está no poder concentram em idades entre 18 a 24 anos, as de recomendação, que poderia potencialimulheres se concentram entre 26 e 34 anos. zar ainda mais o alcance de uma campanha política. 6 http://www.allfacebook.com/

61 c) Simplicidade de uso Os Jogos Sociais oferecem ao público, em sua grande maioria, games gratuitos que podem ser experimentados em momentos livres e casuais (seja em casa ou no escritório), sendo de fácil uso, o que explica, em parte, a sua forte adoção na web. Ou seja: em geral, são jogos com baixa complexidade, facilidade de obtenção de recompensas e que pedem pouco investimento de tempo. Para a política, isso permite dialogar com usuários com diferentes graus de familiaridade com a internet, do soft ao heavy user,


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ampliando a chance de interagir diretamen- sertiva. O monitoramento de marcas e conte com seus variados públicos de interesse. versações, nesse sentido, traz subsídios relevantes para diferentes momentos: desde a d) Viés educativo análise do cenário, avaliando a viabilidade e adequação de desenvolver um Jogo Social, Além da função lúdica, os Jogos Sociais até ao lançamento do produto, analisando também podem ser utilizados como forma a receptividade e a repercussão entre os inde aprendizado. Através deles, é possível ternautas. negociar com os usuários práticas e situações do cotidiano que podem ser assimila- Refinando estratégias políticas: das e compartilhadas na rede. A própria ca- união entre Jogos Sociais e racterística de sociabilidade presente nesses Monitoramento de Marcas e jogos pode ser explorada para a construção Conversações coletiva de conhecimento em uma cidade, Entende-se aqui o monitoramento enquanto estado ou país - o que é vital, por exemplo, a prática de coletar, classificar, categorizar e para o aprofundamento das plataformas analisar menções a produtos, marcas ou pesdefendidas pelos candidatos. soas na internet. Ou seja: conforme as pessoas compartilhem informações na rede, as Conhecer as vantagens e estar em um ce- organizações podem se apropriar desses manário favorável aos Jogos Sociais, por ou- teriais para antecipar movimentos de mertro lado, não garante a assertividade dessas cado, desenvolver e aperfeiçoar produtos, ações. Os Jogos Sociais permitem atuali- planejar ações de comunicação e marketing, zações mais constantes, devido às caracte- aprender sobre hábitos de consumo etc. Na rísticas da web 2.0, e, com isso, é preciso interface entre Eleições e Jogos Sociais, desenvolver estratégias que acompanhem a por exemplo, é possível pensar o monitoravelocidade que marca as mudanças na in- mento a partir das seguintes possibilidades: ternet e as apropriações dos usuários – o que permite aos desenvolvedores refinarem a) Concorrência – Ao longo de uma corseus produtos de forma sempre veloz e as- rida eleitoral, cabe aos candidatos acompa-

nhar os movimentos realizados por outros atores políticos, com o intuito de identificar oportunidades e ameaças. Estariam eles atuando com estratégias envolvendo games? Como eles estão se aproveitando da sociabilidade nos Sites de Redes Sociais? Há alguma iniciativa especificamente com Jogos Sociais? Como ela se configura? b) Público – Antes de lançar um Jogo Social, é preciso estudar a viabilidade de desenvolver esse produto, avaliando a probabilidade de eficácia da iniciativa. O público de interesse de um candidato demonstra abertura a ações assim? Que concepções e práticas estão presentes entre os internautas almejados e que atestam contra ou a favor dos Jogos Sociais? c) Setor – Monitorar o que o mercado de games em geral, e o de Jogos Sociais em específico, tem realizado, traz informações que podem fomentar diferenciais competitivos. Analisar a repercussão de cada uma dessas iniciativas traz, ainda, aprendizados que poderão reduzir riscos e otimizar esforços na produção de divulgação de um Jogo Social. d) Temas – os Jogos Sociais no campo político podem ser temáticos, ilustrando


Mídias Sociais e Eleições 2010 bandeiras defendidas por algum candidato (como o exemplo de Marina Silva). Com isso, monitorar menções feitas a temas como ‘Sustentabilidade’, ‘Educação’, ‘Segurança’, por exemplo, pode trazer insumos relevantes para a abordagem dos jogos.

que as pessoas compartilhem dúvidas, falem sobre o atendimento do desenvolvedor, manifestem apreços por bens virtuais etc. Tudo isso permite, citando possíveis aplicações entre parênteses: • Localizar demandas interacionais mais freqüentes (e propor uma área no site com respostas aos usuários); • Identificar assuntos mais comentados (e compreender o que gera mais repercussão boa e ruim em torno do produto); • Mapear ambientes onde as menções são mais realizadas7 (para realizar ações customizadas nesses espaços); • Encontrar os emissores mais recorrentes (e observar quem poderia ser advogado/detrator do Jogo Social).

Após essas etapas preliminares, com o lançamento de Jogos Sociais voltados para uma corrida eleitoral, é preciso buscar alternativas para que cada iniciativa tenha o máximo de alcance, engajamento, influência e adequação junto aos seus públicos de interesse. Assim, o questionamento que passa a vigorar é: como tornar um Jogo Social cada vez mais relevante para seus usuários? Uma resposta possível está justamente com o quê o monitoramento ensina: a partir de informações coletadas sobre eles. Além desses recursos mais básicos, os Jogos Sociais podem se aproveitar do moniAlém de dados que podem ser obtidos no toramento de marcas e conversações para próprio sistema por trás jogo, como hábi- identificar algo essencial para sua gestão tos de navegação e o cadastro realizado no e melhoramento: a apropriação dos usuásistema, é possível usar a internet para co- rios. Trata-se, na verdade, de acompanhar letar menções trocadas sobre as práticas e e analisar os impactos na adoção, uso e/ou experiências em torno do Jogo Social lançado. Aproveitando-se de um contexto for- 7 É necessário realizar uma filtragem das menções realizadas temente interacional na internet, é comum por perfis fakes para, dessa forma, evitar ruídos na análise dos dados coletados no monitoramento.

compartilhamento dessas iniciativas. Com base nessas informações, cruzadas com o estudo do comportamento dos internautas enquanto jogam, é possível entender que tipos distintos de jogos causam impactos diferentes na apropriação e nas práticas sociais dos internautas. Ou seja: somente com um estudo apurado, é possível personalizar estratégias a cada Jogo Social e otimizá-lo rumo a uma experiência cada vez mais pertinente às expectativas de cada usuário e em cada tipo de jogo. Tendo em vista essas observações, propomos aqui acompanhar e avaliar como se configuram, em tipos diferentes de Jogos Sociais: a) Processos de descobertas – sabe-se que os internautas costumam descobrir Jogos Sociais através das atualizações dos amigos ou do recebimento de convites. Contudo, com exceção dos casos em que as notificações são automáticas, como são feitos os convites? Onde? Que argumentos são usados no processo de convencimento para a entrada de outros usuários? Qual a percepção sobre os atributos dos jogos? Da mesma forma, qual o feedback dos usuários

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que se depararam com a mensagem? Destina-se a mensagem a alguém? É perceptível o critério adotado para as pessoas escolhidas? Fazer referências diretas a amigos gera impacto positivo entre os internautas que recebem os convites?

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novas práticas e ‘regras’ aos Jogos Sociais, extrapolando as características técnicas da iniciativa em si, e distanciando o jogo de algo mais casual?

e) Curva de adoção – quem são os “desbravadores” (early adopters), que adotam os b) Compartilhamento de informações – jogos sozinhos? Como eles passam a proalém do convite, os usuários expressam as curar parceiros de jogo? Como é o processuas vivências nos jogos. Qual a percepção so de disseminação? presente sobre elementos como regras, avatar, cenário, narrativa, obstáculo, recurso, Considerações finais customização? O que é mais destacado? Há Como vimos nos exemplos e dados citados o estabelecimento de conversações sobre o ao longo deste artigo, um Jogo Social pode tema? Como é a percepção sobre os bens ser utilizado de diferentes formas em uma virtuais? Quais são mais desejados? Como campanha ou ação política: divulgar ideias é avaliado o esforço para obtê-los? e a plataforma de um candidato, fortalecer sua presença e lembrança no eleitorado, esc) Experiência em grupo - como os usu- timular o engajamento dos internautas em ários, ao interagirem uns com os outros, torno de uma causa, arrecadar doações para convivem com a dualidade entre competi- a campanha etc. Tudo isso é beneficiado ção e cooperação, usualmente presente nos por um cenário que, ano após ano, aponJogos Sociais? O que reforça a manutenção ta o uso crescente dos Jogos Sociais: seja do interesse dos usuários ao longo desse pela cada vez maior participação de usuáprocesso? Como eles socializam os resulta- rios de diferentes sexos, idades e países, seja dos obtidos nos jogos? por organizações que vêem essas iniciativas como uma forma de se projetar, criando d) Complexificação de processos – progressivamente seus próprios jogos ou como os usuários se articulam para agregar anunciando em outros já existentes.

Ao longo do artigo, também se buscou destacar que a internet, com ênfase nas mídias sociais, traz possibilidades de pesquisa que auxiliam e são pertinentes a todo o ciclo de um produto: da concepção à análise dos resultados. No caso dos Jogos Sociais, que, como visto anteriormente, representam uma oportunidade para o posicionamento diferenciado de atores políticos, o monitoramento de marcas e conversações pode ser especialmente útil. Conhecendo mais o eleitorado, a partir de suas manifestações nas mídias sociais, é possível traçar estratégias para lançar iniciativas que conquistem um público mais engajado e envolvido no compartilhamento de experiências ligadas, direta ou indiretamente, ao universo político – missão altamente desejada em tempos de corrida eleitoral.


Mídias Sociais e Eleições 2010 Referências Bibliográficas A Evolução dos Games Sociais - http://fonte.

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AYRES, Marcel; FALCÃO, Thiago; SILVA, Tarcízio. Jogos e o Fluxo de Capital Simbólico no Facebook: um estudo dos casos Farmville e Bejeweled Blitz. ABCiber 2009: http://www.

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eMarketer - http://www.emarketer.com/ Games e Marketing Eleitoral: http://www. slideshare.net/vincevader/games-e-marketing-eleitoral

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monitoramento-online-e-vigilancia-nas-eleicoes-2010

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Monitoramento de Conversações sobre Políticos: prática, limites e possibilidades Por Tarcízio Silva

Pesquisa e Desenvolvimento da PaperCliQ | Comunicação e Estratégia Digital. Mestrando em Cibercultura (Bolsistas CNPQ) no PPGCCC-UFBA, onde desenvolve pesquisa sobre a relação entre o processamento dos traços informacionais e interações em sites de redes sociais. Faz parte do Grupo de Pesquisa em Interações, Tecnologias Digitais e Sociedade (GITS – UFBA). É coorganizador do ebook #MidiasSociais: Perspectivas, Tendências e Reflexões. Palavras-chave: monitoramento, mídias sociais, opinião, planejamento, eleições eu@tarciziosilva.com.br www.tarciziosilva.com.br/blog www.slideshare.net/tarushijio www.twitter.com/tarushijio www.midiassociais.blog.br

A

web como fonte de opiniões expressas espontaneamente é, hoje, já um lugar-comum. Durante os últimos quinze anos configurou-se uma convergência de diversos fatores sociais, políticos, tecnológicos e econômicos que possui como subprodutos novas práticas da pesquisa de marketing. Uma delas é o que chamamos de Monitoramento de Marcas e Conversações, comumente chamado também de Monitoramento de Mídias Sociais, Buzz Monitoring e outros termos. Retomando uma definição utilizada em outro artigo, o Monitoramento de Marcas e Conversações pode ser definido como “a coleta, armazenamento, classificação, categorização, adição de informações e análise de menções online públicas a determinado(s) termo(s) previamente definido(s) e seus emissores, com os objetivos de: (a) identificar e analisar reações, sentimentos e desejos relativos a produtos, entidades e campanhas; (b) conhecer melhor os públicos pertinentes; e (c) realizar ações reativas e pró-ativas para alcançar os objetivos da organização ou pessoa de forma ética e sustentável.”1 1 SILVA, Tarcízio. Monitoramento de Marcas e Conversações:


Mídias Sociais e Eleições 2010 Através deste ebook, pode-se entender como as pessoas utilizaram as mídias sociais em maior ou menor grau para expor suas opiniões, realizar protestos e tentar influenciar umas às outras. O monitoramento de marcas e conversações é o processo pelo qual o comunicador pode diagnosticar diversos fatores para planejar suas ações, identificar oportunidades e prever ameaças. No caso do monitoramento voltado ao processo das eleições, algumas particularidades podem ser apontadas. Em outro artigo também disponível online2, já apresentamos algumas reflexões sobre o monitoramento voltado às eleições. O que se observou na última eleição foram iniciativas múltiplas de utilização destes softwares e técnicas, por parte de políticos, equipes de comunicação e agências de políticos, jornalistas, militantes e eleitores comuns.

alguns pontos para discussão. In: DOURADO, Danila; SILVA, Tarcízio; CERQUEIRA, Renata; AYRES, Marcel (orgs.). #MidiasSociais: Perspectivas, Tendências e Reflexões. E-book. Disponível em: http://www.issuu.com/papercliq/docs/ ebookmidiassociais 2 SILVA, Tarcízio; SANTOS, Nina. Monitoramento Online e Vigilância nas Eleições 2010. In: IV Simpósio da Associação Brasileira dos Pesquisadores em Cibercultura, 2010, Rio de Janeiro. Anais do IV Simpósio da Associação Brasileira dos Pesquisadores em Cibercultura, 2010.

O objetivo do presente artigo é fornecer, associado aos dois artigos supracitados, uma base para o profissional de comunicação política entender as possibilidades do monitoramento de marcas e conversações para seu setor.

Aqui estamos falando de pessoas geralmente. Valores e temas relativos a afetos e opiniões levarão em conta realmente a “personalidade” da marca que, neste caso, não é apenas uma metáfora para o relacionamento multidirecional online. Boa parte dos cidadãos vê e pensa os políticos Monitorando políticos a partir do que pressupõem que são suas Uma primeira particularidade de se monito- intenções. rar políticos é que são pessoas. Os termoschave, assim como no caso de celebridades Com um sistema político ainda extremada música e cinema, por exemplo, são no- mente individualizante, o monitoramento mes comuns. Dois entraves se apresentam de menções a partidos brasileiros é muito de imediato: um entrave econômico e outro interessante, porque mostra o substrato da operacional. O primeiro entrave econômico heterogeneidade que compõe os partidos. é que, ao utilizar um software de monitora- Outra vez é preciso lembrar que os usuámento pleno, os custos estão baseados na rios de internet, e principalmente os proquantidade de buscas e/ou menções. Uma dutores de conteúdo online, representam busca a um hipotético político chamado apenas uma parcela ínfima de população “João Silva” pode resultar em milhares de nacional. Não se deve ainda pressupor remenções que não se referem ao político em presentatividade dos dados coletados onquestão. line em relação à população total de eleitores do país ou de uma região. O segundo entrave, mais grave, é o entrave operacional. A depender do software utili- Ainda assim, o monitoramento de marzado e das especificações possíveis na bus- cas e conversações é um tipo de pesquisa ca, boa parte do tempo dos analistas pode de marketing altamente valoroso, espeacabar por ser perdido apenas limpando as cialmente pras iniciativas de comunicamenções indesejadas. ção digital.

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Principais Aplicações 1. Proximidade a Termos-Chave. A absurda popularidade do presidente Lula trouxe algumas particularidades nestas eleições, especialmente nos estados em que a base de apoio à Dilma estava dividida. Alguns adversários em certos embates estaduais concordavam em um ponto: apoiar Lula e, mais que isso, mostrar que apoiavam Lula. Em muitos casos foi uma briga pra mostrar quem era mais amigo do presidente. Mesmo políticos como Serra, em certo momento, decidiram mostrar que não eram “adversários” do atual presidente, mas sim políticos que continuariam esta boa gestão. Informação e desinformação, baseada em declarações reais ou falsas, atuais ou passadas, foram utilizadas por diversos candidatos para mostrar que apoiavam Lula e que os adversários nem tanto. Um dos recursos do monitoramento que serviu para analisar isto, por exemplo, foi o que permitiu analisar proximidade das marcas em questão (políticos e seus adversários) a toda poderosa marca “Lula” e, em alguns casos, “Dilma”. A mídia espontânea, assim como a mídia jornalística online pode, então, ser analisada em termos de percepções dessa proximidade.

2. Análise de Sentimento. De longe, o tipo de análise de monitoramento mais utilizado foi a análise de sentimento. Este recurso consiste em contar o número absoluto de menções positivas, negativas, neutras e mistas às palavras-chaves: nomes dos candidatos, partidos e adversários.

3. Temas Comuns e Influentes. As opiniões expressas no ambiente online são mais espontâneas do que as opiniões ofertadas a um pesquisador de prancheta. E os interesses de parcelas da população podem ser identificados através de web analytics, tendências de buscas, produção de conteúdo. As formas de apropriação desse conteúdo, Nos meses imediatamente anteriores e du- ainda, podem ser percebidas através de corante as eleições, diversas iniciativas sur- mentários e recomendações. giram de programas de monitoramento e análise de sentimento que prometiam reali- Dentro das opções de posicionamento de zar análise automática de conteúdo. Quase um político, para quais ele está mais prepasempre tweets. A maioria dessas iniciativas rado? E para quais pode melhor se prepapecava em três fatores básicos: 1) focava a rar? Alguma temática nociva está associada coleta apenas em uma única mídia social; 2) ao político? É possível analisar tudo isto no fazia análise automática de sentimento, que ambiente web através de declarações esé imprecisa; 3) davam ênfase total a este pontâneas. Este pode ser inclusive um dos aspecto, subestimando o valor de análises principais indicadores de performance da mais aprofundadas. comunicação online. Porém, a análise longitudinal da variação do sentimento permite associar eventos online (publicações, conteúdo) e semiexógenos (declarações na televisão, debates, cobertura jornalística, comícios) à expressão dos eleitores conectados. O que faz com que os ânimos fiquem aflorados na web?

4. Relacionamento com o Eleitor. Um dos principais recursos do Monitoramento de Marcas e Conversações é o fator imediato do monitoramento em si. Menções a candidatos, quer citando as URLs e @’s dos perfis ou não, são coletadas em tempo real. Uma equipe rápida de comunicação, que esteja preparada o suficiente, pode respon-


Mídias Sociais e Eleições 2010 der a críticas, esclarecer mal-entendidos, desmentir boatos e agradecer o apoio de cidadãos assim que estes expressam suas opiniões. Evidentemente, é preciso definir linhas de ação e respostas integradas. Algumas plataformas de monitoramento possuem recursos de CRM e a tendência é que todas as grandes do mercado incorporem estes recursos. 5. Planejamento da Comunicação. O Monitoramento de Marcas e Conversações não deve ser utilizado para coletar menções apenas ao nome dos candidatos e concorrentes. Ao coletar menções a assuntos que estão positivamente ou negativamente associados aos políticos e/ou com potencial de disseminação positiva ou negativa, os comunicadores podem identificar os melhores modos de se abordar determinados assuntos e mesmo perceber se estes devem ser abordados. Por exemplo, a coleta de menções a termochave do posicionamento de algum político serve para a definição e otimização da linha editorial e até discursos na comunicação do

candidato. Por exemplo, monitorar o que as pessoas falam sobre “pedofilia” permite à equipe de candidato engajado na luta contra este problema: identifique quais notícias sobre o tema ganharam mais repercussão nos últimos meses; prepare conteúdo atualizando o candidato sobre eventuais debates e anseios populares em torno do problema; evite temáticas consideradas sensíveis demais pela moral média etc.

da Web5 e o experimento da JWT6 tentaram observar correlações entre o volume de citações e as intenções de voto. Ainda muito longe de serem precisas (e talvez nunca o serão), a previsão de ações através da coleta de dados relativos a comportamentos é uma tendência e promete movimentar o mercado da comunicação política em 2012, para o bem e para o mal.

Recepção do Mercado Outra vez é preciso chamar atenção para a necessidade de se buscar um mercado ético e sustentável. Diversos projetos nas últimas eleições foram lançados para atingir os partidos, políticos e equipes em polvorosa com as eleições, buscando resultados, mas sem tempo de avaliar corretamente as oferA identificação de padrões em todas ati- tas de serviços. vidades humanas tem chamado a atenção também de pesquisadores consagrados das Cada empresa, agência, profissional, conredes sociais, como Albert László-Barabási4. sultor ou analista deve agir de forma resA cobertura de diversas iniciativas públicas ponsável para buscar um mercado que seja de monitoramento como o Observatório justo e seguro para todos os envolvidos, do político ao publicitário e o eleitor como prioridade. Apenas assim o cliente médio do 6. Previsão de Resultados. Talvez a aplicação mais polêmica do monitoramento de conversações. Algumas iniciativas3 de monitoramento de dados na web têm avaliado a previsibilidade de ações (como votos) a partir da análise do que as pessoas falam sobre determinados temas.

3 Ver http://www.psfk.com/future-of-real-time 4 Ver vídeo do autor sobre sua pesquisa em http://www.youtube. com/watch?v=7YFNf1ix_yY

5 http://www.observatorio.inweb.org.br/eleicoes2010/destaques/ 6 http://www.adnews.com.br/internet/109107.html

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setor polĂ­tico que, com o passar dos anos, estarĂĄ cada vez mais digital, vai realizar seu trabalho eleitoral e, principalmente o polĂ­tico, pensando, entendendo e aproveitando as possibilidades da inteligĂŞncia coletiva.

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Blog do Terra sobre Mídias Sociais e Eleições Por Ana Brambilla

Ana Brambilla é jornalista, mestre em Comunicação e Informação e dedica-se ao estudo e ao mercado de práticas colaborativas em mídias digitais. Trabalhou na Editora Abril, em São Paulo, como editora de conteúdo colaborativo, lecionou em cursos de graduação e pós-graduação no Paraná, em Minas Gerais, São Paulo e Rio Grande do Sul e atua como editora de Mídias Sociais do portal Terra Brasil. Entre os anos de 2004 e 2009 foi cidadã repórter do noticiário sulcoreano OhmyNews, tendo participado do Fórum Internacional de Cidadãos Repórteres em Seul, em 2005 e 2006. Ana é blogueira desde 2003, entusiasta das redes sociais e do jornalismo cidadão.

Quando a gafe e o esforço marcam ações em mídias sociais

A

ntes de conquistar as urnas, os candidatos nas eleições de 2010 tinham outro objetivo em comum: chegar aos Trending Topics do Twitter.

A corrida eleitoral de 2010 começou com uma única certeza: a de que esta seria a primeira campanha política com uso real de mídias sociais no Brasil. A despeito das críticas sobre o modo como plataformas colaborativas foram apropriadas por candidatos e partidos, fato é que Twitter, Orkut, Facebook, YouTube, Flickr e outras ferramentas de user generated content experimentaram o seu ápice na história das eleições até então.

Palavras-chave: mídias sociais, eleições, blog, buzz, campanha. eleicoesnarede.blog.terra.com.br/ www.twitter.com/terra_eleicoes www.anabrambilla.com www.twitter.com/anabrambilla

A seriedade com que o assunto foi tratado pelas organizações de campanha foi tanta que o time de assessores dos principais presidenciáveis contou com estrategistas de mídias digitais ou sociais. Pelo lado dos tucanos, Soninha Francine respondeu pelas iniciativas ligadas a José Serra. Os petistas tiveram em Marcelo Branco o guru dos ambientes co-


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laborativos. Marina Silva contou com Caio • para serem aperfeiçoados Túlio Costa e com Juliano Spyer para posi- • para termos motivo para dar risada cionar a campanha verde nas redes. • para evidenciarem como funcionam as redes sociais Registrar este período sob um olhar analítico foi o desafio a que o time de Mídias So- Eu quero defender toda aquela ciais do portal Terra Brasil se lançou desde corrupção o final do mês de abril até o resultado do O embargo da candidatura de Joaquim Rosegundo turno. Durante estes sete meses, riz ao governo do Distrito Federal levou dez jornalistas pesquisaram, produziram sua esposa, Weslian Roriz, a substituí-lo. e publicaram, diariamente, situações que Porém, como ligações “parentais” nunpontuaram a apropriação das mídias sociais ca foram suficientes para garantir preparo vinculada às eleições. Fomos: Willian Araú- político, Weslian se atrapalhou durante o jo, Nanni Rios, Gisele Ramos, Renuska Ce- primeiro debate que participou na televisão lidônio, Ivan Guevara, Ana Maria Bicca, e disse uma das frases que, possivelmente, Giane Laurentino, Filipe Speck, Guilherme melhor refletem a política brasileira: “Eu Carrion e eu. quero defender toda aquela corrupção”. Alguns episódios se tornaram célebres, como os tuitaços, a briga xenófoba provocada no caso “Nordestisto” e a paródia da música Beat It, de Michael Jackson, por Lindolfo Pires, candidato a deputado estadual na Paraíba. Aqui, selecionamos alguns cases que não devem ser esquecidos por algum dos três propósitos: • para nunca serem repetidos • para servirem de exemplo

com uma representação junto ao TRE-DF, solicitando a retirada de quatro vídeos postados por usuários no YouTube, contendo o hit “Eu quero defender toda aquela corrupção”. A alegação é que aquele conteúdo era ofensivo à honra da candidata.

Escaldado pelo caso Cicarelli, o usuário brasileiro tratou de se mobilizar para replicar aquele vídeo de modo que qualquer ação judicial fosse inócua. Além da notícia se espalhar pelo Twitter, outro vídeo também postado no YouTube explicava por meio de um tutorial como baixar o hit de Weslian e subir por outra conta. Em uma semana, cerca de 15 vídeos remixando a fala da candidata estavam disponíveis no YouTube. E mesmo que a plataforma de Obviamente, a candidata embaralhou as vídeos do Google saísse do ar, a remixagem ideias e formulou mal a frase que gosta- estaria a salvo em outros serviços de conteria de dizer, distorcendo o sentido em 180 údo colaborativo, como o SoundCloud. graus. A gafe virou hit ao ser remixada com fundo musical e publicada no YouTube. O episódio consolidou o caráter viralizador da rede, o potencial de mobilização ágil dos O nome de Weslian figurou nos Trending usuários e, sobretudo, mostrou que a pulTopics Brasil durante vários dias seguin- verização de nós destas plataformas sociais tes ao debate na Globo. Na ilusão de aba- pode atrapalhar muito uma decisão judicial far tamanho buzz, no dia 8 de Outubro a quando ela for favorável à retirada de alcoligação à qual Weslian pertencia entrou gum conteúdo do ar.


Mídias Sociais e Eleições 2010 @naoehamor Do dia para a noite, um perfil com mais de 32 mil followers, integrante de 1.364 listas de Twitter e com apenas um tweet surpreendeu a timeline de tantos seguidores. Quem lembrava de ter começado a seguir o perfil do candidato a deputado federal por Pernambuco, Jorge Corte Real? O episódio aconteceu no dia 7 de Julho, um dia depois de ter sido dada a largada oficial para a campanha eleitoral.

A hipótese da compra de followers foi a primeira a ser levantada por tuiteiros que não demoraram em criticar o candidato por prática inadequada à dinâmica da rede. No Twitter, é possível trocar o user de um perfil, mantendo seus followers, mas isso só pode ser feito com a senha do usuário original. O buzz foi tamanho que, em questão de poucos minutos, uma atualização de página mostrou o perfil já sem o avatar do candidato, renomeado por @naoehamorr (um nome muito semelhante ao anterior) e com a seguinte mensagem: “A ideia foi nossa, do perfil @naoehamor. Mas Dr. Jorge pediu para retirar”.

Atentos, os tuiteiros perceberam que o perfil humorístico @naoehamor havia “desaparecido”. Ao mesmo tempo em que receberam o único tweet do agora perfil @ jorgecortereal, o montante de seguidores que a conta reunia passou a diminuir, conforme mostrou o serviço de medição de A transferência de followers estava confirmada; a compra, no entanto, foi negada pela followers TwitterCounter. assessoria do político, que emitiu nota no dia A mensagem tuitada pelo candidato não seguinte, via Twitpic, ressaltando que “em trazia viés eleitoreiro, ao contrário. Ele dis- nenhum momento houve compra de perse: “Acompanhando a Copa do Mundo. fil no Twitter, uso de scripts maliciosos ou Continuo apostando na Espanha”. Foi o quaisquer atividades de caráter malicioso”. suficiente para os 32 mil seguidores per- De acordo com o comunicado, “se houve ceberem aquela presença estranha em suas alguma falha, foi por total desconhecimento das regras de conduta do Twitter”. timelines.

O caso serviu de alerta para quem estivesse pensando em aproveitar os followers do perfil de um amigo. Por mais que fosse um gesto de consenso, no Twitter isso não é jogar limpo. Pegando carona em campanha do governo Apesar de a Lei Eleitoral proibir “a utilização de materiais ou serviços custeados com dinheiro público em benefício de quaisquer candidaturas”, o deputado estadual candidato à reeleição na Bahia, Euclides Fernandes teve a “grande sacada” de aplicar o seu nome e logotipo de campanha ao final de vídeos institucionais produzidos e assinados com a marca gráfica do Ministério da Saúde, do Governo Federal e do Governo do Estado da Bahia. As campanhas falavam do combate à violência contra a mulher e ao uso de drogas. Ao fim das produções a voz de um locutor radiofônico anunciava: “Apoio: Deputado Euclides Fernandes”. Os vídeos não infringiam apenas a Lei Eleitoral, mas também a Lei de Direitos Autorais.

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A Procuradoria Regional Eleitoral da Bahia foi procurada para falar sobre o caso, que desconhecia. Conforme foi publicado no blog #eleicoes2010, o procurador Sidney Madruga explicou que os vídeos seriam analisados. Caso se caracterizasse propaganda ilegal, o candidato poderia ser multado e até ficar inelegível na próxima eleição. No mesmo dia, ao fim da tarde, tanto canal do candidato no YouTube quando seu site oficial já não dispunham dos vídeos institucionais assinados com o seu “apoio”.

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Plínio na Twitcam O candidato à Presidência da República mais velho no páreo foi o que mais usou, de longe, o streaming ao vivo da Twitcam. Plínio de Arruda Sampaio iniciou suas atividades neste formato durante o primeiro debate eleitoral, em que Plínio não teria sido convidado. O candidato do PSol encontrou no meio online uma maneira de suprir sua ausência e, conforme as perguntas eram direcionadas a José Serra, Marina Silva e Dilma Rousseff, ele também as respondia, só que para os followers. A diferença ficava por conta do aspecto informal de Plínio diante da webcam: vestido

descontraidamente, em casa, chegou a apa- Nordestisto recer comendo biscoitos durante algumas Um dia após o veredicto das urnas apontar transmissões. Dilma Rousseff como presidente da República, as comemorações no Twitter ceQuem imaginou que a derrota de Plínio no deram lugar a uma guerra entre paulistas e primeiro turno fosse afastar o octagenário anti-nordestinos. A discussão nasceu de um dos streamings se enganou. Durante o de- tweet infeliz da estudante de Direito, Mayabate realizado pela TV Record, no dia 25 ra Petruso, em que dizia: “Nordestisto (sic) de outubro, Plínio enfrentou dificuldades não é gente, faça um favor a Sp, mate um técnicas e pediu ajuda aos tuiteiros. “Estou nordestino afogado!”. em apuros. Não consigo falar com Luciana. Alguém pode me assessorar via Twitter?”. A ira de Mayara contra os brasileiros daqueLuciana é a assessora de imprensa de Plínio e seria responsável por ajudá-lo nos aspectos técnicos. A tuiteira Cássia Menegaz (@cassiamenegaz) explicou ao então já ex-candidato o passo a passo para o “broadcast”: “1-Entrar no site twitcam.com 2-clicar em Login with twitter to Broadcast live (em vermelho) 3-digitar login e senha (segue)...”.

la região se justificava pelo fato de a maior parte dos votos a Dilma terem vindo das regiões Norte e Nordeste do pais. O erro de digitação - “nordestisto” - caracterizou ainda mais o tweet, que foi parar nos TTs Br.

Assim que a mensagem viralizou, Mayara tratou de apagar não apenas o tweet, mas sua conta na rede de microblogs. Tarde demais. O printscreen já circulava na rede, Em alguns streamings, Plínio chegou a so- para provar e não esquecer do ocorrido. mar 7 mil visualizações, provando que idade não é sinônimo para ficar de fora das Entre críticas e apoios (embora muito mais mídias sociais. críticas do que apoios), o case “nordestisto” teve desdobramentos na criação do perfil de Twitter @Nordestisto - dedicado


Mídias Sociais e Eleições 2010 ao combate à xenofobia -, a hashtag #orgulhonordestino chegou aos TTs Br no dia seguinte e foi criado um Tumblr intitulado “Diga não à xenofobia”. O escritório onde Mayara Petruso estagiava demitiu a estudante. Além disso, a OAB de Pernambuco, Estado da tuiteira, abriu um processo contra a “futura” advogada.

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A cobertura da primeira campanha on line na redação de A TARDE Por Larissa Oliveira

Larissa Oliveira tem 24 anos e é jornalista formada pela UFBA desde janeiro de 2010. É também repórter de redes sociais e interatividade do portal A TARDE On Line e pós-graduanda da especialização em Comunicação e Política da UFBA. Interessada ainda em de cultura pop, cultura juvenil, teatro, música e cinema. Palavras-chave: jornalismo, portal a tarde, cobertura, eleições. www.twitter.com/larissaolv br.linkedin.com/pub/larissa-oliveira/2a/727/a64 www.blip.fm/leury

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o primeiro ano em que o uso massivo da internet foi liberado por lei para as eleições brasileiras, as principais redações do País lançaram-se à cobertura eleitoral na web. Este é o mote principal deste artigo que pretende relatar, através minha experiência como repórter, como foi feita a cobertura da primeira campanha eleitoral on line no principal portal de notícias do estado da Bahia, o A TARDE On Line. Nos próximos parágrafos, tentarei, de forma sucinta, relatar o processo produtivo do núcleo de eleições, alguns entraves enfrentados em uma redação onde o carro-chefe é um jornal impresso, e os resultados obtidos nesta empreitada. À semelhança de outros portais de notícias, como Terra e UOL, foi criado, dentro do portal A TARDE On Line, um hotsite específico para a cobertura das eleições, o Eleições 2010. Para tal, foi também criada uma equipe específica, formada inicialmente por mim, como repórter, Danielle Villela, como repórter-estagiária e por Andreia Santana, subeditora do portal A TARDE On Line e


Mídias Sociais e Eleições 2010 coordenadora do projeto especial. No meio era a relevância dos assuntos para ambos os do processo, Alan Ramos, também estagiá- veículos e, no caso do portal, a possibilidario, foi adicionado à equipe. de de antecipar a cobertura com mais espaço e profundidade que no meio impresso. O hotsite foi mantido no ar de julho a outubro de 2010 com o objetivo de cobrir e Foram também exceções a cobertura das acompanhar, única e exclusivamente, o an- Sabatinas A TARDE, que, durante cinco damento da campanha eleitoral na inter- semanas, entrevistou os principais candinet, ou seja, o desempenho dos candidatos datos ao governo da Bahia. Como o even(em âmbito estadual e nacional) na rede e o to foi promovido pelo Grupo A TARDE, comportamento dos eleitores-internautas. foram mobilizados repórteres de outras editorias, da editoria de política e da equiAos repórteres do jornal impresso coube a pe de eleições do on line, que fazia a coabordagem de assuntos não relativos à in- bertura em tempo real via Twitter. Assim ternet, como recursos para as campanhas, como na cobertura dos debates, a equipe quais as necessidades de cada município do on line publicou um texto completo baiano — assunto que foi tema de uma ao final de cada sabatina no hotsite. Os longa série no jornal — ,irregularidades nos jornalistas do impresso faziam o mesmo registros de candidatura, dentre outros. para a edição do jornal do dia seguinte.

Este foi apenas um dos entraves para a cobertura da campanha on line em uma redação em que o centro das atenções é o jornal impresso — que foi líder por décadas em número de circulação e vendas na Bahia. Este assunto, no entanto será tratado com mais detalhes à frente.

Uma das exceções nesta separação setorial foi a cobertura dos debates entre candidatos ao governo do Estado e à Presidência. Enquanto a equipe do portal realizava a cobertura em tempo real dos debates via Twitter e publicava um texto final completo no hotsite após os confrontos, o impresso também produzia material próprio. A justificativa para a cobertura mútua, neste caso,

No caso da campanha eleitoral deste ano, enquanto os repórteres do jornal impresso tinham como rotina acompanhar, por exemplo, a propaganda eleitoral veiculada nos meios de comunicação tradicionais, como TV e rádio, e o desenrolar de alianças partidárias, a rotina do repórter de política na internet passou pelo acompanhamento da campanha nas mídias digitais. Não que

Contudo, apenar da nítida setorialização, em diversos momentos da cobertura, o núcleo de eleições do on line foi deslocado para cobrir assuntos específicos do jornal impresso, como fiscalizações de propaganda irregular do Tribunal Regional Eleitoral (TRE-Ba) nas ruas ou pautas relacionadas a prestações de contas dos candidatos.

Rotina Se, no jornalismo político tradicional, os repórteres são pautados pelos próprios políticos nos bastidores dos seus afazeres, por assessores de imprensa, pela divulgação de dados oficiais (como números do Tribunal de Contas do Estado ou união) — e por denúncias de órgãos como TRE, Tribunal Superior Eleitoral (TSE) e Ministério Público, a cobertura de política na internet teve — e ainda tem — uma rotina diferenciada.

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o acompanhamento dos noticiários locais e nacionais não fizessem parte da rotina, até porque, ao menos em teoria, campanhas eleitorais zelam pela unidade nos mais diversos veículos. No entanto, para a cobertura on line, especificamente, a principal fonte de informações e pautas foram as redes sociais digitais.

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através do site de Marina Silva, por exemplo, que fiquei sabendo que sua campanha promoveria o primeiro twittaço da campanha — uma espécie de panelaço virtual. Como a nota publicada no site oficial dizia que o movimento surgiu a partir de uma comunidade no Orkut, fui até lá e localizei quem tinha começado a mobilização. Entrei em contato com a fonte também pelo Diariamente, coube ao núcleo do hotsi- Orkut e, minutos depois, consegui realizar te Eleições 2010 monitorar a página dos a entrevista por telefone. candidatos no Twitter. Para isso, foi criado, inclusive, uma espécie um perfil no O hotsite, contudo, não era alimentado Twitter, o @deolhonaseleicoes, que tinha apenas por pautas originadas na internet. como único objetivo seguir os candida- Os desdobramentos destas pautas viraram tos, como Luiz Bassuma (@bassuma), matérias especiais, que tinham prazos de até ex-candidato ao governo do Estado; po- uma semana, a depender da complexidade líticos influentes como Roberto Jefferson do assunto, para ficarem prontas. E ainda, (@blogdojefferson), presidente do PTB e como em todo portal de notícias, fazia parum dos principais envolvidos no escândalo te da rotina a produção de hard news, ou do mensalão em 2005; ou coordenadores seja, de matérias ou notas factuais. de campanha, como Marcelo Branco (@ marcelobranco), responsável pela campa- Para isso, eram “puxadas” matérias de nha de Dilma Rousseff nas redes sociais. agências de notícias como Reuters, Agência Brasil e Agência Estado, ou editadas notas Monitorar outras redes , como comuni- com informações provenientes de sites insdades no Orkut e contas no Facebook, titucionais, como TSE e TRE. (também foi também fez parte da rotina, que incluiu considerado hard news notas com resultados o acompanhamento dos sites oficiais. Foi das pesquisas eleitorais. Estas tinham que ir

ao ar pouco tempo depois da divulgação dos resultados nos telejornais). Para dar conta da demanda, havia uma espécie de revezamento de rotinas — quando Danielle tinha alguma pauta especial, eu e Alan que cuidávamos do hard news e quando eu tinha a pauta, a rotina se invertia. Quem cuidava do hard news ainda tinha outra atribuição: a montagem de galerias de fotos dos candidatos ao governo e à Presidência. As galerias eram montadas e publicadas diariamente a de acordo com as fotos disponíveis no Flickr de cada candidato. Também coube à equipe de eleições do A TARDE On Line reunir dados para a produção de infografias para o portal. Algumas foram feitas especificamente para matérias do impresso, mas outras auxiliaram diretamente a cobertura do hotsite, como uma sobre o comportamento dos candidatos nas redes sociais. Em cada mês, foram reunidos dados referentes a números de seguidores no Twitter, de comunidades no Orkut ou de amigos no Facebook para compor tais infográficos.


Mídias Sociais e Eleições 2010 Por fim, as matérias do dia do impresso, mesmo sem tratar de assuntos relacionados à internet, eram publicadas na virada do portal, entre 22h e 00h. Entretanto, quando havia alguma matéria especial, cobertura de sabatina ou de debate feita pela equipe do hotsite, não era preciso publicar também na internet alguma matéria do impresso — o espaço de destaque no hotsite ficava por conta da produção própria. Seleção de pautas Como já foi dito mais acima, a grande maioria das pautas que originou matérias especiais surgiu das redes sociais, em específico, do Twitter. Um exemplo disso foi a matéria “Internautas fazem campanha pelo voto nulo para protestar nas eleições”, publicada no dia 23 de setembro. Vi alguns amigos com o avatar do Twitter em referência a um monstro fictício, Ctulhu, apontado pelo autor como melhor opção dentre os verdadeiros candidatos à Presidência. Ao pesquisar um pouco mais sobre o assunto, vi que havia, na web, em vários níveis, protestos e brincadeiras favoráveis ao voto nulo — e que o movimento era muito mais forte online que offline. A

partir deste mote, levando em conta a relevância daquela discussão e a quantidade de informações esclarecedoras que poderiam ser oferecidas aos leitores, a pauta foi aprovada.

Online x impresso Apesar do esforço de integração entre cobertura online e cobertura impressa, foi possível detectar alguns problemas de logística ou até mesmo de visão editorial que acabaram tornando-se entraves ao longo da Outras pautas foram escolhidas simples- campanha. A primeira delas foi a própria mente porque estavam entre os assuntos rotina de produção do impresso. mais comentados do Twitter, ou seja, ocupando alguma posição dos Trending To- Os jornais trabalham com gavetas, ou seja, pics, como as hashtags #boladepapelfacts e guardam reportagens não factuais para se#orgulhodesernordestino, ambas já no final rem publicadas ao surgir de um momento da campanha. Outras, no entanto, levaram oportuno — por vezes, um buraco na páem conta o novo e suas possíveis implica- gina. Na internet, entretanto, o conceito de ções, como o vídeo do publicitário Paulo gaveta não existe. Ao trabalhar essencialHenrique Reis, o Dilmaboy — primeiro fa- mente com o que é factual ou, no máximo, vorável a um candidato e que, rapidamen- com matérias especiais que dizem respeito te, tornou-se um webhit — ou o pioneiro a determinado assunto que foi o mais cogame lançado no site de Marina Silva, “Um mentado na rede durante aquela semana, Mundo”, semelhante ao FarmVille do Fa- ou a matéria é publicada, ou o assunto ulcebook. trapassa a “data de validade”. Em resumo, os critérios de noticiabilidade foram os mesmos dos meios impressos, a exemplo de “novidade”, “inusitado” e “relevância”, com a diferença de que esses critérios, principalmente “relevância”, levaram em conta não o leitor comum, mas leitor-internauta.

Em diversos momentos durante a cobertura, principalmente pelo fator publicidade, matérias que estavam previstas para serem publicadas de maneira conjunta “caíram” no impresso, e foi preciso muita negociação para a reportagem sair em outra data. Em outros momentos, houve negociação

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até um prazo limite e, ultrapassado o prazo, mesmo tempo. Com o deadline do impresso a matéria foi publicada apenas no portal. apertado, a cobertura no Twitter deixou a desejar e a matéria final pouco acresceu ao Outra questão fundamental foi a prioridade texto curto do impresso. dada ao jornal impresso. Por vezes, a equipe de eleições precisou ir às ruas para repercu- Dentro do que se propôs realizar, a cobertir algum assunto surgido na internet, mas tura de eleições no A TARDE On Line foi poucas foram às vezes que a estrutura da bem sucedida, e isso pode ser comprovado redação deu suporte para o cumprimento no número de acessos ou no teor dos codas pautas. Nestes casos, foi preciso fechar mentários dos leitores do portal. No entana matéria com as informações disponíveis. to, é preciso pontuar que as prioridades Voltando ao caso específico das matérias do jornal impresso precisarão ser revistas de publicação conjunta, também havia para o sucesso da cobertura conjunta nos prioridade. Quando os editores precisavam próximos anos. escolher entre uma matéria nos moldes do impresso e outra que abordava um assun- Resultados to oriundo da internet, a matéria escolhida, Como pontuaram alguns especialistas, nesgeralmente, não era a de internet. ta primeira campanha online brasileira, não houve um efeito Obama, com a ampla moA impossibilidade de deslocar um repór- bilização do eleitorado através da internet. ter do impresso para cumprir determinada No entanto, o fato de a grande maioria dos demanda — como no caso das blitzes do políticos terem se predisposto a interagir TRE citadas mais acima ou até mesmo na com o eleitorado já significou um grande cobertura de debates eleitorais — prejudi- avanço para a sociedade brasileira. cou, por vezes, a produção para o hotsite. Em determinado momento, por exemplo, Independente se esta primeira campanha eu cobri um debate pelo Twitter, escrevi o eleitoral na web foi bem sucedida ou não, texto para o jornal impresso e ainda com- o fato é que o jornalismo pôde se reinvenpletei a cobertura para o portal quase ao tar e aprender a apurar e pesquisar assuntos

a partir de sites e redes sociais digitais. Se eu fiz entrevistas por meio de livestreaming e contactei fontes via Orkut e Twitter em quatro meses de campanha, muitos outros jornalistas aprenderam e souberam aproveitar as vantagens da internet. O jornalismo online feito nesta campanha levou o debate político para um patamar mais alto. Sem as amarras de espaço ou de linguagem características do jornal impresso, foram dados ao eleitor abordagens diferenciadas, textos leves e informações que não se reduziam a números e a leis, por vezes, difíceis de compreender. Ainda não é possível saber até quando o núcleo dos jornais impressos insistirá em fechar os olhos para as mudanças que acontecem a passos largos. Ao menos, assim como os políticos que criaram perfis no Twitter, a cobertura desta primeira campanha on- line em uma redação tradicional como a de A TARDE já foi um avanço.


Controle e Espetáculo: Privacidade & Transparência na Política e Eleições Por Martha Gabriel

Martha é Engenheira (Unicamp), pós-graduada em Marketing (ESPM), pós-graduada em Design Gráfico (Belas Artes, SP), mestre e doutoranda em Artes (ECA/USP). CIO da NMD New Media Developers, ganhadora de 11 Prêmios iBest entre 1998 e 2005 como desenvolvedores web. Professora dos cursos de MBA da BSP Business School São Paulo e coordenadora do curso Estratégias de Marketing Digital na ESPM. Palestrante internacional e autora de artigos em diversos congressos na área de tecnologia, marketing e arte nos USA, Europa e Ásia, tendo apresentado mais de 45 palestras no exterior e recebido três prêmios de melhor palestra em congressos nos USA (2003, 2004 e 2008). Artista com trabalhos participando de exposições no Brasil e exterior, como: FILE, Videobrasil, FIAT Mostra Brasil, Nokia Trends, SIGGRAPH, CHI, UPA, Chain Reaction, ISEA, Bienal de Florença (premiada), Technarte, entre outros. Reviewer da LEA Leonardo Electronic Almanac, MIT, 2005, e do Networked Book, Turbulence.org, 2009. Colunista do IDGNow! e do portal Cidade Marketing sobre Redes Sociais. Autora de três livros de marketing digital, sendo o mais recente “Marketing na Era Digital “, Ed Novatec, 2010. Agraciada com o patrocínio “Intelecto Digital” em 2010 e 2011 pela Locaweb. Palavras-chave: privacidade, transparência, sociedade de controle, sociedade do espetáculo, mídias digitais. www.martha.com.br twitter.com/marthagabriel br.linkedin.com/in/marthagabriel www.slideshare.net/marthagabriel www.facebook.com/marthagabriel

"Os homens criam as ferramentas, as ferramentas recriam os homens.” – Marshall McLuhan

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s termos “Sociedade do Espetáculo” (Debord, 1967) e “Sociedade de Controle” (Foucault, 1975 & Deleuze, 1990) têm origem no século XX, mas as transformações sociais que eles discutem vêm sendo observadas de forma cada vez mais significativa nos dias atuais conforme o tecido social se torna mais conectado. A gradativa evolução e disseminação das tecnologias de informação e comunicação nos conduziram para um cenário de conexão global. No entanto, até a década final do século XX, essa conexão privilegiava principalmente as instituições - governos, empresas de mídia, multinacionais etc. No entanto, a partir dos últimos anos do século XX e principalmente no início do século XXI, a penetração da internet e das tecnologias digitais no cotidiano do cidadão comum alavancou uma incrível mobilidade e ubiqüidade comunicacional e informacional no nível do indivíduo - e não mais apenas no nível das organizações -, catalisando assim, tanto o controle e a transparência,


quanto as possibilidades de auto-exposição em níveis inéditos na nossa história. Esse processo redefine a distribuição do poder e transforma a sociedade, o modo como vivemos e nos relacionamos, inclusive nos processos políticos e eleitorais. Bem-vindo à sociedade de controle e do espetáculo.

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Sociedade de Controle No artigo “Post-Scriptum sobre as Sociedades de Controle”, seguindo as análises de Michel Foucault (1975) sobre sociedades disciplinares, Gilles Deleuze (1990) apresenta alguns aspectos mostrando que estaríamos passando de uma sociedade disciplinar para uma sociedade de controle. As sociedades disciplinares se estendem do século XVIII até a Segunda Grande Guerra, sofrendo declínio desde então até o final do século XX dando simultaneamente lugar à ascensão da sociedade de controle. A sociedade disciplinar se caracteriza pelo enclausuramento no espaço fechado (escolas, hospitais, indústrias, empresas, prisão etc.), e na ordenação do tempo de trabalho. Os dispositivos disciplinares favorecem a constante observação dos indivíduos, que se tornam transparentes a quem está no

poder. Por outro lado, o poder está fora do alcance e da observação dos indivíduos, tornando-se opaco a eles. Assim, as sociedades disciplinares são marcadas por uma polarização entre a opacidade do poder e a transparência dos indivíduos. A sociedade de controle, por outro lado, é propiciada pelas tecnologias de comunicação e informação em rede e, portanto, é regida pela interpenetração dos espaços devido à ausência de limites definidos (a rede) e a instauração de um tempo contínuo que permeia os espaços. Ocorre, assim, uma mudança de natureza do poder, que deixa de ser hierárquico, e passa a ser disperso e difuso numa rede planetária. A polarização de opacidade-transparência entre poder e indivíduo não é mais aplicável, pois o poder se torna cada vez mais disseminado e disperso entre os nós das redes, e sua ação torna-se horizontal e impessoal (Costa, 2004). O poder de controle e a transparência se distribuem na rede. Simultaneamente à sociedade de controle, vimos florescer a “Sociedade do Espetáculo” (Debord, 1967), que revela outros aspectos importantes das transformações

sociais que têm impactado o relacionamento humano. As reflexões originais sobre a Sociedade do Espetáculo foram feitas à luz das mídias eletrônicas imagéticas, como a televisão, discutindo a alienação decorrente do “viver por meio das representações imagéticas”. Acreditamos aqui que as novas mídias digitais atuam em duas direções opostas nesse fenômeno - ao mesmo tempo em que elas têm o poder de acentuar o espetáculo e a alienação, por outro lado, elas também têm o poder de iluminar e permitir o “viver diretamente”, ampliando o contato direto do indivíduo com a realidade. No primeiro caso, as novas tecnologias de comunicação e informação possibilitam uma super-exposição do indivíduo numa imensa acumulação de espetáculos, transformando tudo o que era vivido diretamente em uma representação, e os fluxos contínuos de informação agem na capacidade de percepção dos indivíduos e dificultam a representação do mundo - a contínua reprodução da cultura é feita pela proliferação de imagens e mensagens dos mais variados tipos, o que torna cada vez mais difícil separar-se ficção de realidade. Ao mesmo tempo, no segundo caso, as novas tecnologias digitais permitem a proliferação de informações


Mídias Sociais e Eleições 2010 geradas por indivíduos comuns (e não mais apenas por uma fonte centralizadora filtrante, como a televisão tradicional), relatando os mais diversos aspectos da realidade, sob os mais diversos ângulos, além de colocarem à disposição de qualquer um todo tipo de informação imaginável, como bibliotecas, videotecas, filmes, documentários etc., permitindo que se amplie o cenário informacional, iluminando e aumentando a capacidade de discernimento para controlar. Dessa forma, no ambiente digital o controle e o espetáculo encontram o meio propício para seu desenvolvimento na sociedade, e nesse cenário, a privacidade é elemento regulador, e a transparência, efeito resultante. Privacidade na Era Digital A palavra “privacidade” deriva do latim (privatus) e significa ‘separado do resto’ e, de modo mais amplo, é a habilidade dos indivíduos ou grupos de afastar a si próprios, ou as informações sobre si próprios, e consequentemente revelar-se seletivamente. No Manifesto Cypherpunk (Hughes, 1993), Eric Hughes declara que “privacidade é o poder de uma pessoa seletivamente revelar suas informações ao mundo”. Apesar do

uso da privacidade variar de cultura para cultura, entre indivíduos dentro da mesma cultura e ao longo do tempo, a privacidade é, e continuará sendo, um princípio seletivo de revelação de informações pessoais em função do contexto (ambiente, situação, pessoas ao redor etc.). Privacidade é um conceito diferente de segredo, que está relacionado a uma informação que não deve ser compartilhada com ninguém, em nenhum contexto. A privacidade regula mais o “para quem” se revela uma informação do que com “o que” se revela em si, ou seja, está intimamente ligada ao contexto. O que se fala em um bar talvez não se fale em uma igreja. O que se revela a um amigo íntimo talvez não se revele a um desconhecido. Fornecemos o número do nosso cartão de crédito em um site de comércio eletrônico, mas não o fornecemos para outras pessoas que conhecemos. Um aspecto muito importante para ser possível o exercício da privacidade é que as pessoas detenham algum tipo de controle sobre o contexto em que estão inseridas em cada momento para poderem, assim, escolher que informações pessoais desejam

revelar ou não. Nos ambientes analógicos, os contextos são mais facilmente reconhecíveis e delimitados e, portanto, controláveis. As pessoas sabem quando estão no trabalho, na rua, na escola, em uma festa e quem está simultaneamente nesse mesmo ambiente podendo ouvi-las e gravá-las. No entanto, nos ambientes digitais, é muito mais difícil reconhecer o contexto em que se está inserido ou quem está simultaneamente nele – por exemplo, quando as pessoas conversam em redes sociais como no Twitter, cada uma está em um contexto analógico diferente, mas ao mesmo tempo, estão todos no mesmo ambiente digital que envolve diversos contextos simultaneamente - tantos quantos for a quantidade de pessoas conectadas naquele ambiente. Nesse cenário, o controle da privacidade torna-se muito mais complexo e difícil, pois exige conhecimento dos contextos e pessoas no ambiente digital e requer ferramentas que possibilitem o controle seletivo de revelação da informação. Além da questão dos contextos, as tecnologias digitais permitem tanto a disseminação mais rápida das informações, como, principalmente o seu registro imediato e cumulati-

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vo. Assim, enquanto nos ambientes analógicos, muito do que se revela é compartilhado com poucos ao redor e normalmente está sujeito apenas ao registro humano naquele ambiente, nos ambientes digitais, o que se revela pode estar sendo compartilhado com milhares ou milhões de pessoas e está à mercê do registro computacional -- por meio das tecnologias digitais, no momento em que a informação é revelada, ela está disponível para a disseminação instantânea, sem necessidade de esforço humano de memorização, não se tornando mais passível de deleção. Dessa forma, os ambientes digitais, por sua própria natureza são desfavoráveis à manutenção da privacidade. Portanto, o ambiente digital é o paraíso para a proliferação de dados, causando uma verdadeira avalanche de informações pessoais que os indivíduos fornecem em suas atividades diárias - surfar na internet, usar cartão de crédito, fazer uma assinatura de revista ou newsletter etc. As pessoas fornecem toda sorte de informações pessoais de inúmeras maneiras, tanto conscientemente (como no caso em que compartilham seus dados, fotos, preferências, aversões, localização etc. voluntariamente nas redes so-

ciais digitais) quanto de forma inconsciente (como no caso de quando fazem compras com cartão de crédito, navegam, buscam e clicam na web). Apenas uma pequena parcela das pessoas lê os contratos de uso de sites e as suas políticas de privacidade. Apesar de declararem que se importam com a privacidade, elas não estão realmente interessadas ao ponto de gastar tempo para ler os contratos, deixando seus dados pessoais à mercê dos outros.

A obtenção e análise de dados sobre indivíduos permitem conhecer seus comportamentos, preferências, aversões, e inúmeros mais aspectos das suas personalidades, e, essas informações dão poder a quem as detém, tanto para auxiliar como para manipular esses indivíduos. Isso não é novidade e tem sido usado estrategicamente há séculos. Uma frase de Napoleão Bonaparte, general estrategista francês do século XIX, expressa a essência desse poder: “Duas alavancas movem o homem: o interesse e o medo”. Os interesses e medos das pessoas são as forças motrizes de suas existências. Todos os dias, levantamos da cama apenas se tivermos interesse em algo (como fazer uma atividade que nos deixa feliz) ou medo de algo (como perder o emprego e a fonte de subsistência, ou morrer).

Independentemente de as pessoas estarem abrindo mão da sua privacidade consciente ou inconscientemente, intencional ou ingenuamente, por interesse ou por preguiça, o fato é que o grau de privacidade tem diminuído conforme as tecnologias digitais passam a mediar os relacionamentos. Em consequência, a redução dos níveis de privacidade tende a favorecer o aumento dos Se na época de Napoleão era difícil obter níveis de controle, como discutiremos a se- informações sobre os interesses e medos guir. das pessoas, hoje, elas mesmas esparramam constantemente essas informações sobre Privacidade e Controle dos si. A cada clique que fazemos, cada telefoIndivíduos nema, cada compra com cartões de crédito, Conforme o grau de privacidade usado por estamos fornecemos dados pessoais que um indivíduo diminui, mais ele se expõe pu- engrossam nosso dossiê digital à disposição blicamente e fornece informações pessoais. dos outros. O aplicativo online SPOKEO


Mídias Sociais e Eleições 2010 (2010), por exemplo, permite que por meio do endereço de email de uma pessoa se obtenha um mini-dossiê digital sobre ela. O livro Numerati (Baker, 2009) relata de forma muito interessante exemplos de como a análise dos rastros dos dados das pessoas permite controlá-las - os fragmentos das informações pessoais (hábitos de compra e preferências) são analisados para transformar e personalizar as experiências diárias dessas pessoas. Assim, o conhecimento de informações pessoais de um indivíduo outorga um poder não formal, mas inquestionável, a quem as detém, e o uso desse poder, de forma ética ou não, é o que o torna benéfico ou não. Conhecer os interesses e medos das pessoas nos permite saber os fatores que motivam essas pessoas a agir, e possibilita: a) influenciar essas pessoas – tanto para o bem (melhorar serviços, produtos, tratamento dessas pessoas) como para o mal (manipulando-as) e; b) prever ou analisar seus comportamentos. Essas ações de obtenção e análise de dados dos indivíduos para se alcançar determinados objetivos por meio deles é chama-

da, de uma maneira mais ampla, de Engenharia de Relacionamento (ou Engenharia Social). Existem diversas definições para Engenharia Social, incluindo desde a mais ampla como disciplina pertencente às ciências políticas até uma definição mais restrita associada à tecnologia e à segurança da informação. No âmbito desse texto, podemos definir Engenharia Social como sendo práticas que se referem a esforços para influenciar atitudes e comportamentos dos indivíduos por meio da obtenção e análise dos dados pessoais desses indivíduos (independentemente de como esses dados foram obtidos). A intenção por detrás da Engenharia Social pode ser benéfica ou manipulativa. Como exemplo do primeiro caso, em que se usa a Engenharia Social para servir e beneficiar os indivíduos envolvidos no processo, podemos citar o Behavioral Targetting, que tem como objetivo conhecer o comportamento dos consumidores para genuinamente oferecer-lhes os produtos, serviços, experiências que lhes possam ser mais adequados. Ainda como uso benéfico da engenharia de relacionamento, podemos citar os casos relatados no livro Freakonomics (Steve Levitt,

2005), que por meio da análise de dados e interesses de pessoas consegue desvendar fraudes e resultados que aparentam ser contra o senso comum. No segundo caso -- o uso da engenharia social de forma manipulativa (ou negativa para os indivíduos envolvidos no processo) --, ela pode acontecer de duas maneiras: a) obtenção ilegal dos dados pessoais dos indivíduos; ou b) uso manipulativo de dados pessoais obtidos de forma legal. Podemos citar como exemplo aqui, a ação de hackers e crackers, que para invadir sistemas conseguem e usam dados pessoais de indivíduos para manipulá-los de forma a colaborarem em processos nos quais prejudicam alguém ou uma instituição. Na maioria das vezes, o termo engenharia social é usado de forma pejorativa justamente por essa conotação manipulativa. Um caso muito famoso e interessante para ilustrar o uso de engenharia social dessa forma é narrado no livro Takedown (e no filme homônimo, cujo título em português é “Caçada Virtual”), que conta a história da prisão do hacker Kevin Mitnick em 1995 pelo FBI. Logicamente um hacker domina tecnologia e programação de sistemas, e o interessante na história de Mitini-

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ck é verificar a sua habilidade para obter a colaboração das pessoas, manipulando-as, por meio da engenharia de relacionamento, de forma a conseguir o que ele desejava. Podemos dizer, portanto, que a diminuição no grau de privacidade que os meios digitais propiciam, favorece o controle por meio da engenharia social.

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Focando em marketing eleitoral, pode-se argumentar que o aumento da facilidade de aplicação de engenharia social focada na população pode ser usada por parte de um candidato político tanto para o bem quanto para o mal. Um exemplo de uso benéfico seria o desenvolvimento da sua campanha política e proposta eleitoral baseando-se no conhecimento das necessidades dos cidadãos, indivíduos, os eleitores. Isso alinharia as necessidades da população com a plataforma eleitoral, o que provavelmente aumentariam as chances de vitória eleitoral. No entanto, esse tipo de ação seria genuinamente benéfico apenas se, e unicamente se, o candidato realmente implementasse, após eleito, a proposta política que usou para se eleger. Caso contrário, teríamos um exemplo de manipulação das pessoas, cujas informações foram usadas apenas para que

o político conseguisse se eleger e não para • Conhecer melhor as ações do governo e legitimamente representá-las e melhorar dos candidatos eleitos - após tomar possuas vidas. se, as atividades de governo também são registradas na rede. Existe um questioAssim, inegavelmente, os ambientes diginamento e uma pressão cada vez mais tais favorecem o controle para os candidaforte sobre os governos para disponitos eleitorais, podendo ser usado de forbilizar também de forma consistentes e ma ética, ou não. No entanto, esse mesmo por meios de APIs, os dados públicos, controle pode ser usado também pelos insem prejuízo da privacidade individual divíduos, cidadãos, tendendo a causar um dos cidadãos, para que possam ser usaconseqüente aumento de transparência podos pela população em geral. lítica. • Expor fraudes ou comportamentos inadequados/anti-éticos - o controle disControle e Transparência dos tribuído entre os indivíduos permite que Candidatos qualquer um tenha o poder de expor as Acreditamos que o potencial das novas míações dos candidatos ou políticos eleidias está disponível do lado do indivíduo, tos. Um exemplo interessante disso é o cidadão, durante qualquer situação política, vídeo gravado por um rapaz de 17 anos inclusive eleições, num processo de controem agosto/2010, Leandro, questionanle auto-regulatório da sociedade, permitindo o Presidente da República na época, do: Lula, sobre alguns acontecimentos em sua comunidade - (http://www.youtube.com/ • Conhecer melhor o candidato eleitoral watch?v=KOKS_apCwzA). No vídeo, ele reao longo de toda sua vida política - os gistra a reação do Presidente e a expõe políticos também possuem diversas inna rede. formações esparramadas na rede que possibilitam a construção de um dossiê Em decorrência, o controle distribuído nos digital sobre eles; nós da rede entre todos os indivíduos gera uma transparência das ações dos candida-


Mídias Sociais e Eleições 2010 tos políticos. Torna-se cada vez mais difícil todo mundo está sempre e em todo lugar, se criar estratégias de opacidade para suas mais ou menos conscientemente, interpreações. tando um papel... É nesses papéis que conhecemos uns aos outros, é nesses papéis O estudo “Blogs and Bullets” (Aday, 2010) que conhecemos a nós mesmos.” - Robert traz importantes reflexões esse impacto que Ezra Park1. as novas mídias -- como os blogs e as redes sociais online (Twitter, Facebook, Youtu- Outro aspecto muito importante nas relabe, etc.) -- têm tido em episódios de ação ções sociais (principalmente eleitorais), e política litigiosa, mais especificamente. Eles que é intimamente afetado pela habilidade são frequentemente descritos como ferra- dos indivíduos e instituições de controlarem mentas importantes para ativistas buscan- a sua privacidade, é a reputação. Segundo do substituir regimes autoritários e promo- Goffman (1959) em “The Presentation of Self ver liberdade e democracia. Apesar de essas in Everyday Life”, as pessoas apresentam-se ferramentas estarem disponíveis tanto do publicamente de modo a atender as expeclado do indivíduo quanto dos governos e tativas dos outros, a desempenhar um papel de pouco se ter provado realmente sobre significativo no palco que é a vida social. sua eficiência, as novas mídias têm o potencial de modificar como os cidadãos pensam Como nos lembra Sales (2010), “Nesse ou agem, atenuar ou agravar conflitos de processo de representação do eu, se o degrupos, facilitar ação coletiva, induzir trans- sempenho do ator social é criticado pelo formações entre regimes e angariar atenção público, se ele deixa de ser reconhecido como gostaria de ser após expor determiinternacional para um dado país. nado detalhe de sua vida íntima ou opinião pessoal, muito provavelmente ele passará a Privacidade e Reputação “Provavelmente não é mero acidente histó- restringir o acesso das pessoas a tal dado, rico que a palavra ‘pessoa’, em seu primeiro significado histórico, seja ‘máscara’. Ao invés, é o reconhecimento do fato de que

1 Tradução livre feita pela autora. Citação extraída do texto de Sergio Missana sobre “The Presentation of Self in Everyday Life”, disponível online em [http://ishkbooks.com/presentation_ of_self.pdf]

ou então o reconstruirá, representando-o de uma forma que lhe pareça socialmente mais aceitável”. Em um jogo de revela/esconde, as pessoas selecionam que informações pessoais devem ser apresentada em cada contexto para construir sua reputação desejada. Assim, a única forma de controlar a reputação é por meio da privacidade, que permite que uma pessoa/entidade revele seletivamente os aspectos sobre si que construam sua imagem. Com a dificuldade da manutenção da privacidade e o simultâneo aumento do controle na sociedade devido à proliferação das tecnologias digitais, torna-se cada vez mais difícil para os candidatos eleitorais construírem uma imagem fabricada, uma reputação forjada. Um exemplo disso é o fenômeno Wikileaks, que aconteceu em 2010. Vazamentos de informações governamentais sempre ocorreram, mas nunca encontraram um ambiente tão propício quanto o digital para torná-las públicas rapidamente impactando milhões de pessoas.

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Considerações finais Provavelmente, as faces públicas e privadas de nossas vidas (tanto de indivíduos comuns quanto de políticos) nunca estiveram tão confrontadas quanto no momento atual. Acredito que nos próximos anos, conforme as mídias sociais e ambientes digitais evoluam e adquiram maturidade, veremos muita discussão sobre a privacidade (do lado do indivíduo) e transparência (do lado das empresas, marcas, instituições, políticos, governos etc.). Compreender essas transformações sociais é essencial para desempenharmos nosso papel com responsabilidade e ética no novo cenário que se apresenta, com suas relações complexas e instigantes, marcadas tanto pelo controle e espetáculo, quanto transparência e possibilidade de iluminação.

Referências Bibliográficas ADAY, Sean et al. (2010). Blogs and Bullets: New GOFFMAN, Erving (1959). The Presentation of Media in Contentious Politics. [http://www.usip.org/ Self in Everyday Life. publications/blogs-and-bullets-new-media-incontentious-politics] HUGHES, E. (1993). Manifesto Cypherpunk. [http:// www.activism.net/cypherpunk/manifesto.html] BAKER, Stephen (2009). Numerati. ARX. SALES, Heber (2010). Quem se importa com a priCOSTA, Rogério (2004). Sociedade de Controle. In: vacidade on-line? [http://campidigital.ning.com/foSÃO PAULO EM PERSPECTIVA, 18(1): 161- rum/topics/quem-se-importa-com-a] 167. Disponível publicação em [http://goo.gl/ SPOKEO (2010). Spokeo’s reverse email search TXTwf] engine. [http://www.spokeo.com/email] DEBORD, Guy (1967). A Sociedade do Espetáculo. [http://goo.gl/m1JpI] DEBORD, Guy (1988). Comentários sobre a sociedade do espetáculo.

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A interação e a mobilização nas redes sociais dos três princiais presidenciáveis Por Ana Maria Bicca da Silva e Eliane Fronza

Jornalista formada pela PUCRS. Trabalha com mídias sociais e jornalismo online. Tem interesse por redes sociais, em especial o Twitter, cibercultura e personalização de conteúdos. www.twitter.com/aninhabicca anambicca@gmail.com

Jornalista formada pela PUCRS. Trabalha com mídias sociais. Tem interesse em cibercultura, redes sociais, cultura livre e direito autoral. Palavras-chave: Interatividade, eleições, redes sociais, plataformas, multimídia. www.twitter.com/elianefronza elianefronza@gmail.com maseobvio.wordpress.com

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á alguns anos, a World Wide Web vem passando por transformações significativas em suas formas de uso. O que se convencionou chamar de Web 2.0 coloca o usuário no centro da comunicação mediada pelo computador. As práticas ratificam a eliminação de hierarquias de produção, estimulando e proporcionando participação, interatividade e circulação, cada vez maior, de materiais, antes restritos pelas dificuldades físicas. Essas trocas, possibilitadas apenas pela existência do ciberespaço, norteiam as transformações nos modos de comunicação e de acesso ao saber. O termo ciberespaço foi inventado em 1984 por William Gibson em seu romance de ficção Neuromancer. De acordo com Lévy (2000), o ciberespaço reúne a infraestrutura material do meio digital e a comunicação que circula, assim como os seres humanos que compõem esse universo. Interação e mobilização são duas questões-chave para se entender o ciberespaço. Dentro deste espaço ciber, muitas são as formas utilizadas para se comunicar. Um dos ambientes são as redes sociais, que podem ser definidas como um grupo de pessoas compreendido


em uma metáfora de estrutura, no caso, a estrutura de rede. Sendo assim, os nós da rede representariam os indivíduo e suas conexões, os laços sociais que integram os grupos (DONATH, Judith in RECUERO, 2009). No entanto, as redes sociais na Internet só existem porque são construídas em sites que as abrigam, como é o caso do Orkut e do Facebook, por exemplo. São plataformas onde as pessoas se encontram por interesses comuns, ambientes de troca e compartilhamento de informações, locais onde as pessoas estão em constante construção e expressão de identidades.

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Para que essas redes existam, a interação entre os participantes é fundamental. É através dessa interação que acontecem os processos de viralização e difusão das informações, como explica Santaella, “cada vez menos, a comunicação está confinada a lugares fixos” (2007, p.25). As informações percorrem o ciberespaço de acordo com a importância que as pessoas dão e podem chegar aos mais variados pontos da rede, que também possibilita a reunião e difusão de conteúdo para estimular a mobilização de seus participantes (JENKINS, 2009).

A partir dos processos caracterizados acima, optou-se pelo estudo da interação e da mobilização nas redes dos três principais candidatos que concorreram à presidência da República no ano de 2010. O trabalho não tem por objetivo analisar o uso que as pessoas fizeram das redes. O foco está na possibilidade de interação e mobilização que as plataformas proporcionaram aos usuários. No Brasil, 2010 foi o primeiro ano em que se permitiu veicular publicidade eleitoral na Internet (resolução 23.191 na lei nº 9.504/97). Baseados nas eleições norteamericanas de 2008, os políticos decidiram buscar seus eleitores no meio digital. Das mais variadas formas escolhidas pelos políticos brasileiros, fez-se um recorte que compreende apenas as redes criadas pelas campanhas dos candidatos Dilma Rousseff (dilmanarede.com.br), José Serra (redemobiliza.com. br) e Marina Silva (movmarina.com.br). Nestes espaços, foram analisados os processos de interação e de mobilização estimulados e disseminados entre os integrantes da rede. Dilma na Rede é a rede social criada para unir usuários simpatizantes, militantes e apoiadores da candidata do PT. O principal objetivo é ter uma rede social própria em

que o usuário possa criar um perfil, ter amigos, participar de comunidades, enviar conteúdo e ficar atualizado com informações da campanha. A plataforma utilizada foi o Noosfero, ferramenta open source para criação de redes sociais. A rede é apresentada como um espaço de apoio, ou seja, quem participa está colaborando com esse objetivo. Cabe salientar, ainda, que a rede propõe que todas as discussões ali surgidas possam ser debatidas dentro do site. O Movimento Marina foi criado na plataforma para redes sociais Ning, sendo um espaço que se aproxima do Dilma na Rede. É uma rede de campanha apenas para militantes e simpatizantes da candidata Marina Silva. Também possibilita ao usuário interagir com outros através de grupos de interesse, buscar material de campanha para criar mobilização online e offline e produzir seu conteúdo. A Rede Mobiliza foi criada em plataforma WordPress e, como o próprio nome alerta, serve de espaço para o militante ou simpatizante buscar informações sobre a campanha de José Serra e, a partir de então, mobilizar-se on e offline. O forte da rede é o blog


Mídias Sociais e Eleições 2010 e a comunicação em cima dele, que fornece material para o usuário. Diferentemente das outras redes, aqui a interação entre os internautas se dá nos espaços de conversação do blog, e o perfil é limitado para caracterizar essa forma de comunicação. A militância é instigada a ir além dos limites da Rede Mobiliza e partir para outros espaços de discussões na Web. Para observar os níveis de mobilização e interação presentes, escolheu-se o método da análise de conteúdo como condutor do estudo, norteando-se através de categorias. De acordo com Bardin (2002) a análise de conteúdo é composta por três fases: préanálise, neste caso com tópicos de estudo; exploração do material e o tratamento dos resultados, onde chega-se a um resultado. Como a análise de conteúdo se constitui em um conjunto de instrumentos metodológicos que asseguram a objetividade, a tabela ao lado mostra a sistematização aplicada ao estudo. Interação e mobilização nas redes sociais dos candidatos As comunidades virtuais são constituídas por pessoas que, através do ciberespa-

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ço, mantém uma relação. Segundo Lemos e Lévy, elas “começaram a se desenvolver há mais de vinte anos antes da aparição da Web. Hoje, elas constituem o fundamento social do ciberespaço e uma das chaves para a futura ciberdemocracia.” (LEMOS; LÉYY, 2010, p.101). Na categoria “Comunidade” encaixam-se apenas os sites Dilma na Rede e Movimento Marina, com os grupos contidos nos sites, unidos por um assunto em comum. As comunidades que integram a rede da candidata petista estão divididas em três categorias: as mais recentes, as mais ativas e as mais populares. Para a análise, foram estudas as duas comunidades mais ativas na plataforma, segundo a classificação do site. Com mais de 9100 artigos e mais de 6700 integrantes, a comunidade “Onda Vermelha” é considerada a mais ativa. Apesar da quantidade de posts e da possibilidade de interação que a maioria das comunidades apresenta, quase não há comentários e, quando há, eles se restringem a opiniões e incentivo, mas não interagem entre si, não há conversação entre os integrantes. Com mais de 3530 artigos e mais de 200 integrantes, a comunidade “Blogueiros com

Dilma” seria considerada a segunda mais ativa. A comunidade é apresentada como uma central de conteúdo dos blogueiros com Dilma. Além de posts e fotos, há também conteúdos que podem ser utilizados pelos blogueiros que apoiam a candidata, como widgets, selos, links e códigos para as transmissões ao vivo, entre outros. Mas, assim como a comunidade “Onda Vermelha”, quase não há comentários nos posts publicados, não havendo interação entre os integrantes. No site da candidata Marina Silva, as pessoas não se encontram em comunidades, mas em “grupos” que assumem esse papel. Um pouco mais simples que as comunidades, os grupos são propriamente fóruns de discussão. Para a análise, foram escolhidos os dois grupos categorizados como destaque e que possuem o maior número de integrantes. Com 623 membros, o grupo “Juventude Brasileira” apresenta 17 tópicos. Apesar dos menores números quando comparados aos da candidata petista, no site de Marina os comentários são mais reflexivos e detalhados. Mesmo assim, são poucos e ainda não chegaram ao nível de “conversarem” entre si, mais uma vez, eles “falam” aos autores dos textos. O segun-

do maior grupo de destaque, “Defensores das Águas”, tem mais de 250 membros e 20 posts. E assim como o anterior, a mesma prática se repete: poucos comentários e sem interação entre os membros do grupo. No entanto, não são apenas as comunidades que permitem interação entre as pessoas. Os blogs também são espaços onde há conversação. De acordo com Primo e Rezeck, “a conversação em blogs ocorre quando um post motiva o feedback de outros internautas” (2006, p.5). No Dilma na Rede, são apresentados como oficiais os blogs Blogueiros com Dilma, Blogs Amigos, Dilma 13, Mulheres com Dilma, Galera da Dilma, blogs da comunidade oficial Onda Vermelha. Na página inicial, por exemplo, há um link para o “Blogueiros com Dilma”. O espaço é destinado aos blogueiros que apóiam a candidata e que têm por objetivo promover discussões na Web. A seção dispõe de mais de 200 links para blogs de apoiadores. Além disso, o site disponibiliza a todos os blogueiros posts recomendados, transmissão ao vivo, selo que os identifica como “blogueiros de Dilma”, “vídeos bacanas”, setor que explica o “espalhe a verdade”, banners, imagens e widgets para os blogs.


Mídias Sociais e Eleições 2010 No Mobiliza, o blog “Radar da Mobilização” representa um dos grandes pilares do site, já que as discussões e notícias ocorrem ao redor deste. Recuero (2009) afirma que blogs podem ser usados de forma variada. Criação de um espaço pessoal, geração de interação social, compartilhar conhecimento e gerar popularidade são algumas das características encontradas nos blogs presentes nos três sites. No exemplo do candidato tucano, até pela plataforma utilizada (WordPress), o blog é conector dos demais integrantes das redes que se formam pelo Mobiliza. Vários conteúdos como vídeos, fotos, clipagem e mensagens de incentivo e mobilização são publicados nesse espaço. As principais tornam-se referência na página inicial. Diferentemente deste, o blog no Movimento Marina não é o conector dos outros atores no ciberespaço, é apenas mais um espaço para conversação. Aqui, cada usuário registrado tem a opção de enviar uma mensagem para o blog, que fica na página inicial da rede. As mensagens de blog não se limitaram em falar sobre a militância do PV. No segundo turno, surgiram tópicos discutindo a posição de Marina e do eleitorado e o futuro da rede após as eleições.

Quanto à disponibilização de adesivos, apenas a Rede Mobiliza possui essa opção. No site do candidato tucano, são disponibilizados banners, adesivos com resolução para impressão, papel de parede para o computador, design de camisetas e um link para o twibbon no perfil do Twitter. No site de Marina, são disponibilizadas imagens que foram usadas em blogs; no de Dilma, imagens que podem ser usadas pelos blogueiros, além das figuras que estão na seção “Faça e vista a sua camiseta” e “Seu computador com a cara de #dilmanarede” (proteção de tela e papel de parede). Mesmo que também possam ser categorizados como redes sociais, os sites analisados possuem pontes que os ligam a outras redes já utilizadas pela maioria dos internautas. Os três sites disponibilizam link para o Twitter. Além do link que encaminha para o microblog do candidato, do vice e dos principais perfis do partido, o site do tucano contém uma página da hashtag #Serra45, constantemente atualizada de acordo com o que é tuitado com a tag. No site da petista, há um box com os últimos tuítes com a hashtag #dilmabrasil, enquanto na página de usuário de Marina, há um box com uma fra-

se que pode ser respondida pelo integrante e que permite atualização do perfil do mesmo no Twitter. Os três possuem link para o Facebook. Para comunidades no Orkut, são apenas os sites Dilma na Rede e Rede Mobiliza. A candidata petista disponibiliza também links para o canal no YouTube, para a galeria referente ao site no Flickr e para a conta no identi.ca. Além disso, há um botão de bookmarking e compartilhamento em todos os posts. Há destaque para as outras redes onde há conteúdo: Orkut, Facebook, YouTube, Flickr e Identi.ca. O Twitter também está presente, mas como um box, com as atualizações sobre o perfil @dilmanarede. Já o Mobiliza, utiliza as redes YouTube, Orkut, Facebook, Flickr, Twitter e também dispõe de Feeds. Também, há link para quatro canais no YouTube e duas galerias no Flickr. Outra característica das plataformas digitais é a convergência das mídias, habilidade muito utilizada pelos sites analisados para distribuir o conteúdo nas mais diversas formas. Jenkins descreve convergência como um “fluxo de conteúdos através de múltiplos suportes midiáticos” (2009, p.27). Ele

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também reforça que o novo paradigma da Os três sites são plataformas de redes socomunicação une todas as mídias. ciais para a mobilização e interação do internauta com outros e, principalmente, As três redes analisadas possuem vídeos com as ideias dos candidatos. Dessa forma, embedados. No site de Dilma, há vídeos todos possuem a necessidade de criação oficiais e vídeos enviados pelos próprios de um perfil para identificação do usuário integrantes da rede. Para os vídeos oficiais, para poder usar a rede. Porém, Dilma na há um link na capa que vai à seção “Se liga”. Rede e Movimento Marina disponibilizam Os demais estão presentes nas comunida- grande parte do conteúdo para qualquer des e blogs. Na rede de Marina, também internauta, sem a necessidade de cadastro. há vídeos oficias e outros que podem ser A exceção é o Mobiliza, que para visualizar enviados pelos usuários. O link para a pá- qualquer conteúdo é necessário registro. gina de vídeos encontra-se na página inicial da rede e não há separação entre os A identificação é fundamental para destacar oficiais e os enviados pelos integrantes. Na os atores, os nós numa rede. São eles que molRede Mobiliza, há também um link espe- dam as estruturas socais através da interação cífico para os vídeos já na página inicial. e da constituição de laços sociais. Sua representação identitária no ciberespaço é legitiEm relação à disponibilização de áudios, as mada pelo grupo social (RECUERO, 2009). três redes encaixam-se na categoria. Nos sites de Dilma e de Marina, no entanto, o Dilma na Rede dispõe de um chat para os conteúdo de áudio pode também ser envia- usuários manterem contato em tempo do pelos usuários. No site da candidata do real com seus amigos. Como em outras PV, os áudios possíveis de serem enviados redes, só permite conversas instantâneas são músicas. Já no de Dilma, é possível en- com outros usuários na lista de contatos. viar qualquer conteúdo, sendo oficialmente O Movimento Marina também possui um disponibilizados jingles, gravações e pro- chat, porém, todos os usuários que estão gramas ao vivo. online na rede ao mesmo momento apa-

recem na lista de contatos quando o chat está conectado. O Rede Mobiliza conta com interação em chat quando há livestream, ganhando destaque na página inicial. Com relação a materiais de campanha para estimular a mobilização dos internautas e posterior disseminação, as redes disponibilizaram um manual online. A Rede Mobiliza é a que se destaca. Com uma apresentação em SlideShare embasada em teorias de participação e mobilização, o conteúdo visa estimular a mobilização individual dos usuários para que esses possam disseminar as ideias ali contidas. Dilma na Rede e Movimento Marina não possuem uma apresentação ou organização de manual de mobilização/interação, limitam-se a destinar um espaço de “Quem somos” (Dilma) e “Guia de Mobilização” (Marina) com textos explicativos para o usuário se mobilizar. Os espaços de mobilização offline com destaque na plataforma online são os comitês virtuais (Dilma na Rede) e Casa de Marina (Movimento Marina). Os comitês virtuais são representados por um mapa (Google Maps) que identifica locais do Brasil onde


Mídias Sociais e Eleições 2010 há um comitê mais próximo do internauta. O Casa de Marina possibilita que o internauta, mediante um cadastro, possa transformar sua residência numa casa (central de apoio) a Marina Silva. A rede disponibiliza vídeos e imagens de casas e pessoas que aderiram ao movimento. Conclusão Dilma na Rede, Movimento Marina e Rede Mobiliza mostraram-se ambientes virtuais que possibilitaram espaços variados para a interação, além do leque de estratégias de mobilização. A Rede Mobiliza permitiu que os internautas se mobilizassem mais fora do site, enquanto que Dilma e Marina centraram as discussões nessas redes. Dilma na Rede tentou reproduzir um modelo clássico de rede social online já conhecido dos brasileiros para unir os militantes num só espaço. O Movimento Marina se destacou bastante pela interação entre usuários e pelo conteúdo diferenciado e disponível para a mobilização dos mesmos. A rede também manteve-se muito forte mesmo a candidata ficando fora do segundo turno das eleições. As três redes possibilitaram a visualização de documentos em áudio, vídeo e texto, já

que os recursos multimídia trabalham com mais de um sentido do usuário e participante. Apesar de todas as ferramentas disponíveis e do empenho das redes em proporcionar os mecanismos para que as pessoas entre si interagissem, se percebe que, nas redes, pouca foi a relação entre os usuários. A ideia de criar uma rede social para que houvesse interação ainda não pode ser concretizada como um todo na campanha deste ano. No que se refere a essa relação entre os usuários, pode-se dizer que a participação limitou-se ao comentário em notícias e textos nos blogs e ao envio de arquivos em diferentes meios. Este é ainda um primeiro nível de interação, ou seja, é o tipo que viraliza e difunde as mensagens. No entanto, ainda não se chegou ao um nível maior, o da discussão entre os participantes, do debate, pois, na maioria dos casos, os usuários limitaram-se ao comentário para o autor das mensagens ou para os personagens dos textos, com elogios ou opiniões que não eram debatidos entre todos.

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SANTAELLA, Lucia. Linguagens líquidas na era da mobilidade. Cidade: Paulus, 2007.

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Candidatos Virtuais: O oficial e o oficioso no ciberespaço Por Natália de Oliveira Santos, Anna Paula Castro Alves, Carolina Tomaz Batista, Adriana Cristina Omena Dos Santos

Graduanda em Comunicação Social com Habilitação em Jornalismo pela Faculdade de Educação da Universidade Federal de Uberlândia. Membro do grupo de pesquisa em Interfaces Sociais da Comunicação, que investiga sobre mídias, eleições, marketing político, plataformas virtuais e redes sociais em períodos políticos eleitorais. nataliasantoscs@hotmail.com

Graduanda em Comunicação Social com Habilitação em Jornalismo pela Faculdade de Educação da Universidade Federal de Uberlândia. Membro do Grupo de pesquisa em Interfaces Sociais da Comunicação e do grupo de pesquisa em Análise de Discurso Crítica e Linguística Sistêmico-Funcional. Bolsista de Iniciação Científica no projeto “Os usos e funções do jornal e da internet nas eleições presidenciais em Uberlândia”, que investiga sobre mídias, eleições, marketing político, plataformas virtuais e redes sociais em períodos políticos eleitorais. annapaulacastroalves@hotmail.com


Mídias Sociais e Eleições 2010 Comunicação, Política e internet

Graduanda em Comunicação Social com Habilitação em Jornalismo pela Faculdade de Educação da Universidade Federal de Uberlândia. Membro do Grupo de pesquisa em Interfaces Sociais da Comunicação e do grupo de pesquisa em Análise de Discurso Crítica e Linguística Sistêmico-Funcional. caroltomazb@gmail.com

Doutora em Ciências da Comunicação pela Escola de Comunicações e Artes da Universidade de São Paulo ECA/USP. É coordenadora e professora no curso de Comunicação Social da Universidade Federal de Uberlândia e líder dos grupos de pesquisa em Interfaces Socais da Comunicação e em Novas Tecnologias da Comunicação e Informação na mesma instituição. Tem experiência na área de Comunicação, com ênfase em Comunicação Política, Tecnologias e Comunicação, Propaganda, Marketing Político, Políticas Públicas e Cultura. Trabalha com pesquisa acerca dos usos da internet nas eleições de 2010. Possui publicações nacionais e internacionais em livros, revistas e eventos científicos correlatos à sua formação. adriomena@gmail.com

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tualmente não se pode falar em campanhas eleitorais dissociadas dos meios de comunicação. Essa utilização dos meios de comunicação pela política é baseada nos recursos contidos neles que possivelmente possam trabalhar em prol dos interesses eleitorais, com destaque dos meios que permitem maior interação entre candidatos e eleitores, sendo um desses a Internet como sustenta Romanini (2007 p. 159) “A força da internet é a capacidade de transpor obstáculos que limita o acesso a informação por parte das pessoas. Na rede informação leva ao conhecimento, que por sua vez, possibilita a contestação, em tempo real.” Para Romanini (2006), estas ferramentas digitais funcionam como cabos eleitorais virtuais que usam da argumentação para convencer o eleitor a participar da campanha eleitoral de um ou de outro candidato. O autor também comenta sobre o fato de estas mídias atuarem no sentido contrário. Algumas pessoas as utilizam como instru-

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mentos para denegrir a imagem de candidatos revelando falcatruas e corrupções.

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É possível perceber que, por meio de tais ferramentas, os candidatos configuram sua imagem de uma forma mais acessível. Basta que os políticos tenham um computador com acesso à internet e uma pessoa especializada para fazer o serviço. Além disso, o conteúdo estará disponível para que pessoas em qualquer lugar do mundo possam acessar. O candidato se torna alguém presente no ciberespaço, disposto a se expor para que sua presença seja notada. Surge assim o “candidato virtual”, estratégia contemporânea do marketing político. Por meio da apresentação das análises do microblog Twitter, de comunidades virtuais do Orkut e dos sites dos candidatos à presidência em 2010: Dilma Roussef, José Serra e Marina Silva, a intenção é mostrar os “candidatos virtuais” oficiais, aqueles retratados em seus sites construídos por toda uma equipe de assessores do próprio político, e os oficiosos, apresentados por quem desejar seja no Orkut, seja no Twitter.

A pré-campanha eleitoral presidencial brasileira no ciberespaço O recorte selecionado foi observar três variáveis das campanhas eleitorais para a presidência no ciberespaço: o site pessoal de cada candidato(a), as maiores comunidades de cada candidato(a) no site de relacionamento Orkut, além do microblog Twitter, com a ressalva de que neste último trata-se de uma análise cujos dados complementem os dados obtidos, haja vista a contemporaneidade no uso desse micro blog pelos candidatos, que ainda estão em fase de adaptação com a ferramenta. O oficial e o oficioso nos sites pessoais dos candidatos No site de Dilma Rousseff (http://www.dilmanaweb.com.br) o internauta era encaminhado uma página de cadastramento. O site em si era organizado com as cores do partido, em barras de assuntos: notícias, biografias, propostas, fotos, vídeo, rádio, contato. Tentando investigar cada uma das divisões, começa-se pelas “notícias”, que se apresentam em forma de textos extremamente longos e que exigem a utilização da barra de rolagem em demasiado. O site permitia inclusão

de comentários e oferecia links para que o internauta baixasse as logomarcas da candidata ou visse na íntegra algumas entrevistas. Sempre se mantinha no site, no topo, do lado direito, os links “conte a sua história” e “divulgue”, que chamavam a todo instante o leitor a criar uma forma de contato e divulgação com e para a candidata; e também os links para as redes sociais: Orkut, Twitter, Facebook, Flickr, YouTube e Identica. Notou-se na análise do site “Dilma na Web” que o oficioso era usado como um suporte da fala real de Dilma Rousseff, o que a candidata dizia verdadeiramente, já que, após a análise, percebeu-se que o site tornou-se uma ferramenta de divulgação das ações políticas da candidata e de apoio eleitoral. A candidata à presidência Marina Silva do Partido Verde (PV), possuía dois sites na Internet e ambos podem ser considerados oficiais devido aos acessos e atualizações. Entretanto, para definir qual de fato seria o oficial, foi constatado o link disponibilizado no site do partido da candidata, que indicava o site “minha marina” (http://www.minhamarina.org.br/) como o oficial. Considerando a popularidade do site “movimento marina” (http://www.movimentoma-


Mídias Sociais e Eleições 2010 rinasilva.org.br/)

mesmo não oficial, pretende-se destacar alguns pontos relevantes desse site. O site oficial possuía uma boa navegabilidade, por ser simples, porém notou-se a falta de destaque nas informações que dizem respeito ao seu plano de governo. Já outras que diziam respeito às formas de colaboração com a campanha na internet, através do Twitter, Orkut, Facebook, e outras redes sociais, foram repetidas em mais de um atalho. Já o site não oficial era completo ao possuir links para quase todos os tipos de informações relacionadas tanto à candidata Marina Silva, quanto a sua campanha eleitoral. No quesito imagens, notou-se uma certa deficiência na página inicial ao se comparar o site oficial com o oficioso. O primeiro apresentava apenas um quadro de fotos que não ficava exatamente no centro da página, e que dispõe de três fotos que não foram atualizadas em quatro dias de observação. Entretanto, há que se destacar que existia um link que servia de atalho para uma página exclusiva de imagens e vídeos, assim como para as diretrizes do governo, o blog da candidata, e uma parte destinada especificamente a ela e a seu vice.

Acima do quadro de fotos no início encontraram-se atalhos referentes a “Crie + 1 casa de Marina”, “Colabore como ajudar a campanha”, “12 Razões para votar em Marina” e “Doe para campanha”. Ao clicar nos atalhos a página era transferida para o site não oficial da candidata, que explica por sua vez, todos os passos para se doar para campanha, bem como o que são as Casas de Marina e como ser uma delas. Apesar das informações serem esclarecidas, a mudança de página e de site dificultava a navegabilidade. Abaixo do quadro, eram destacadas as notícias que circulavam na mídia a respeito da candidata e de sua campanha, um ponto em que a visibilidade e o marketing político eram marcantes no site. A extensão deste espaço destinado a atualizações recentes permeava do centro da página até o final, considerando-se assim, um espaço suficiente para manutenção das informações diárias. Algo que deve ser ressaltado tanto no site oficial, quanto no oficioso da candidata do PV, é que mesmo ao criar atalhos para outras ferramentas da Internet utilizadas por Marina Silva já ditas anteriormente, o site deveria ter um espaço próprio de discus-

são da campanha, e não transferi-la para outros. O site oficial do candidato José Serra do PSDB trabalhava em tons de azul e branco, as cores do partido (http://joseserra.psdb.org.br/), e como forma de organização possuía categorias divisórias como: “biografia”, “realizações”, “sala de imprensa”, “participe” e “fale conosco”. Na parte inferior, havia uma montagem de fotos com paisagens e monumentos brasileiros. O site utilizava imagens que simbolizavam o popular brasileiro, pessoas simples que moram em localidades humildes, e destacava campanhas contra as drogas, a violência, sempre ressaltando as visitas do candidato a comunidades carentes, através de fotos e vídeos. Logo abaixo das imagens da campanha anti-drogas, notou-se uma crítica à posição da candidata Dilma Roussef, sob o título “Por que Dilma foge do debate?”. Assim como nos outros sites, podia ser observado o destaque para as redes sociais. Na guia “biografia” encontrou-se as opções tanto para se saber sobre a vida do candidato à presidência, quanto de seu vice, Índio da Costa. A divisão da biografia de Serra fazia-se por “infância”, “jovem Serra”, “movimento es-

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tudantil”, “exílio”, “secretário”, “constituin- que aparecem à frente na disputa eleitoral. te”, “ministro”, “prefeito” e “governador”. Os títulos das mesmas são: “Dilma Presidenta 2010”, “José Serra - Presidente” e Notou-se na análise do site que há formas “Marina Silva - PV”. de interação com o público eleitor/internauta, contudo não são gerados espaços Todas as três comunidades possuíam a para que se mostrem as opiniões ou apoios mesma estrutura. A primeira parte do por parte dos internautas. O site servia so- layout continha informações acerca da comente como uma ferramenta para que o munidade: a descrição do que ela é, idiocandidato se apresentasse, não propiciando ma, categoria, dono, moderadores (os que a participação ativa do eleitorado, ou seja, acessam a comunidade e podem alterar os eleitores podiam dar suas opiniões, en- livremente seu conteúdo), tipo, a privacitretanto as mesmas se restringiam à equipe dade do conteúdo, local, data em que foi responsável pela manutenção do site. Des- criada e o número de membros. Logo após sa forma, notou-se que não havia a preocu- estas informações aparecem alguns tópipação de gerar uma opinião pública sobre cos dos fóruns, onde algum membro coo candidato através do site. Possivelmente a locava uma pauta em questão e os demais forma de apresentar-se de José Serra para o dão sua opinião sobre a mesma, e uma guia público se limitasse, dentro do ciberespaço, que nos permite visualizar todos os tópiàs redes sociais. cos. Na seqüência há sempre uma enquete em destaque sobre temas polêmicos, poOrkut como meio oficioso em líticos e até mesmo brincadeiras. Depois campanhas políticas desta enquete apareciam as perguntas de Com o intuito de analisar o papel do Orkut algumas outras pesquisas e uma guia para como meio de comunicação no qual são visualizarmos todas as outras presentes na divulgadas as campanhas políticas, selecio- comunidade. namos as três maiores comunidades virtuais No dia 10 de julho, no período da manhã, as dos candidatos à presidência Dilma Rous- comunidades possuíam as seguintes quantiseff, José Serra e Marina Silva por serem os dades de membros: a de Dilma 15.147, a

de Serra 66.337 e a de Marina 17.193. Seis horas após esta primeira pesquisa constatamos que o número aumentara para: 15.170 na comunidade de Dilma, 66.346 e a de Marina 17.232. Com relação ao número de fóruns e enquetes as comunidades apresentavam: a de Dilma 92 páginas de tópicos de fóruns e 2 páginas de enquetes, a de Serra 11 páginas de fóruns e 1 de enquetes e a de Marina 29 páginas de fóruns e 2 de enquetes. É necessário destacar que cada página, seja de tópicos de fóruns ou enquetes, possuía cerca de 50 tópicos. Para ter acesso ao conteúdo das comunidades de Dilma e Serra foi necessário primeiramente se tornar membro das mesmas, já a comunidade de Marina era liberada para não membros. Percebeu-se que a participação nesses grupos ficava restrita àqueles que apoiavam os candidatos. Cada um entrava apenas na comunidade do político que votaria, até na comunidade de Marina não foi encontrada a participação de pessoas defendendo outros candidatos, mesmo sendo esta liberada para não-membros. Apenas uma exceção foi encontrada, em uma enquete na comunidade de Serra em que um eleitor deixava um comentário de


Mídias Sociais e Eleições 2010 que quem ganharia as eleições seria a candidata do PT e deixava claro que torcia por ela. Desta forma, as discussões existentes nos fóruns eram apenas a de um público, por isso não foi possível afirmar que o resultado de determinada comunidade era opinião pública, tratava-se da opinião de um público em específico. Diversos fóruns existentes nas comunidades eram de ataque aos políticos concorrentes. Por exemplo, um dos fóruns da comunidade de Dilma se chamava “Pega na mentira... de José Serra!”. Outro exemplo de fórum da comunidade de Serra é “Por que não votar em Dilma e em Marina” e um tópico na comunidade de Marina se chamava “Serra propagandeia milagres e privatiza poemas”. Na análise foi possível constatar que havia certa interatividade entre os membros. Um criava um post no fórum, outro chegava e comentava aquilo, muitas vezes, se dirigindo diretamente ao autor daquele tópico ou a outra pessoa que também dera opinião. Eles interagiam por meio da comunidade. Contudo este tipo de interatividade não serve para a formação de um debate que construirá uma

opinião pública, pois, como dissemos anteriormente participavam de cada comunidade apenas aqueles que defendiam determinado candidato. Nem sequer é possível encontrar opiniões divergentes entre os membros de uma comunidade dentro de algum fórum. Todos os fóruns analisados traziam comentários que se mostram convergentes.

da candidata. Na “José Serra - Presidente” aparecem os links de seu Twitter e de uma plataforma chamada “Proposta Serra”, um local no qual os eleitores podem debater sobre diversos assuntos e sugerir propostas para o candidato. Na comunidade “Marina Silva - PV” existem os links do Twitter e de um site chamado “Minha Marina” no qual estão expostas notícias, discursos, informaNo entanto, quando analisadas as enquetes, ções sobre a candidata. nas quais os participantes podiam votar sem que os demais ficassem sabendo seu voto, O Orkut pode ser considerado um meio encontravam-se divergências. O que nos le- oficioso dos candidatos virtuais, uma vez vou a questionamentos acerca da existên- que cada comunidade que apóia determicia de certo receio de se opinar nos fóruns nado candidato não nos dá certeza de que porque ficava evidente quem estava dizen- quem a modera seja algum assessor de do o quê, pois, quando se comenta algo seu campanha ou simplesmente algum eleitor perfil do Orkut aparece junto a seu comen- que pretende votar no candidato. Por mais tário, o que não acontecia necessariamente que a comunidade indique que o candidato nas enquetes, porque nelas o membro es- seja moderador da mesma não quer dizer colhia se os outros poderiam visualizar ou que seja verdade. não seu voto. O Twitter como ferramenta Nas três comunidades existiam links que oficiosa e contemporânea levavam a outras plataformas de comuni- É no contexto de propagação da Internet cação às quais os candidatos estavam vin- como meio de influência na opinião públiculados. Na comunidade “Dilma Rousseff ca, que surgiram os blogs e os microblogs Presidenta 2010” existe os links do Twit- como possíveis ferramentas que também ter, de dois álbuns do Flickr e de um site podem ser utilizados pelo marketing polí-

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tico, dentre os últimos destaca-se o Twitter que tem conquistado um papel importante com suas diversas utilidades, sobretudo, em ano eleitoral.

propaganda feita na Internet com destaque aos microblogs, que era rápida e deveria ser clara para que a mensagem e a intenção de quem escrevia fossem efetivas.

Como o Twitter é uma ferramenta nova, sua utilização ainda passa por adaptações. No cenário eleitoral brasileiro, vê-se o uso do microblog apenas por candidatos de maior visibilidade midiática, sendo eles Marina Silva do (PV), Dilma Roussef (PT) e José Serra (PSDB). Tais candidatos interagem minimamente com possíveis eleitores que os seguem em seus perfis. É através do limite estabelecido de 140 caracteres a cada vez que os usuários escrevem algo, que o marketing político é feito. Divulgação de locais visitados, propostas de campanhas, opiniões e posições acerca de notícias em foco na mídia são exemplos do que os candidatos à presidência mais postam em seus Twitters. O microblog com sua estrutura de textos sucintos e dinâmicos intensifica o clima de opinião entre os usuários, pois a informação instantânea feita por frases curtas promove a maior aproximação dos candidatos com seus eleitores. A propaganda eleitoral extensa tornou-se repetitiva e cansativa com o tempo, ao contrário da

Considerações finais A partir da análise, concluiu-se que os três candidatos utilizados como amostra na investigação utilizaram-se de recursos dos sites oficiais para promover suas imagens e campanhas, como exemplo, fotos, vídeos, notícias referentes as suas campanhas de outros canais, geralmente jornais. Além disso, a divulgação de seus perfis, blogs, Twitters recebeu muito destaque. Outro ponto que deve ser ressaltado é a criação de atalhos que encaminhavam o navegante para outros sites dos candidatos, considerados não oficiais, haja vista a coleta desses mesmos resultados na análise dos três sites oficiais. No que diz respeito aos meios oficiosos notou-se que a disseminação de informações referentes à imagem dos candidatos recebeu mais destaque em detrimento das propostas de governo dos mesmos. Além disso, os espaços destinados a fomentações de discussões, bem como de trocas de idéias e debates políticos, que nesses sites

de relacionamentos em vista de suas estruturas deveriam ser pontos centrais, são utilizados por um público específico de cada candidato, o que de certa forma prejudica a eficácia das discussões, que não dispõem de opiniões divergentes, e com isso molda um tipo de opinião única construída a partir de uma linha de pensamento. Esta situação beneficia os interesses particulares de cada político concorrente à presidência, e prejudica a democratização e a construção do voto consciente dos eleitores, haja vista que esses deveriam conhecer todos os pontos das campanhas eleitores de todos os candidatos, isso não inclui apenas os mais visíveis na mídia. E com isso, votar conscientemente, como cidadãos de fato.


Mídias Sociais e Eleições 2010 Referências ROMANINI, Maurício Guindani. A internet como comunicação política. Guaxupé, 2006. Disponível em: http://encipecom.metodista.br/mediawiki/ images/4/4b/Mauricio_Guindani_Romanini.pdf Acesso em: 07 de julho de 2010. ______. A internet como comunicação política. In: QUEIRÓZ, Adolpho; MANHANELLI, Carlos; BAREL, Moisés Stefano. Marketing Político: do comício à Internet. São Paulo: ABCOP, 2007, p. 156-167.

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O papel do blogueiro e o engajamento espontâneo nas eleições Por Sueli Dantas Bacelar

Sueli Dantas Bacelar é tecnóloga em Processamento de Dados e especialista em Ciência da Computação pela UNIT. Atuou como professora do Departamento da Informática da UFS (Universidade Federal de Sergipe) de 1998 a 2000. Integrou a equipe de concepção do Portal de Sergipe (www.se.gov.br). Atualmente é Gerente de Governança e Inovação da EMGETIS, participa de diversos eventos e cursos na área de Marketing Digital em todo Brasil, publica artigos no Cinform, tem o blog www.suelibacelar.net.br e faz parte da comissão organizadora do Bate Papo sobre E-commerce em Aracaju. Palavras-chaves: Eleições, blogs, engajamento espontâneo, uso da web, blogueiro. www.suelibacelar.net.br contato@suelibacelar.net.br www.meadiciona.com.br/suelibacelar

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epois do efeito Obama, muito se espera do uso da internet nas eleições. São muitas as diferenças entre as eleições nos E.U.A. e no Brasil, desde a duração da campanha ao número de candidatos. Um candidato não fará a mesma campanha que outro, ou igual a uma de suas campanhas anteriores. Nos E.U.A. um dos objetivos é levar o cidadão às urnas, para votar, uma vez que lá o voto não é obrigatório; no Brasil se deseja conquistar o voto, logo existem opiniões, discussões durante toda a campanha. Diante desse panorama vários estudos são realizados para apresentar as campanhas web dos candidatos. Esse trabalho é resultado da pesquisa realizada junto aos blogs prócandidaturas de presidenciáveis nas eleições 2010, iniciada em 03 de julho deste ano. O foco do estudo é descrever o mundo desses blogs, identificando o que neles está escrito, a percepção pelas campanhas oficiais, a interação através de seus comentários e o engajamento na campanha pelos blogueiros. Quando Marcelo Branco (apud DITOLVO, 2010), responsável pela campanha digital de Dilma, diz que “os argumentos cons-


Mídias Sociais e Eleições 2010 truídos na internet podem influenciar a maneira como as pessoas enxergam a política e ajudar na argumentação durante conversas cotidianas. Nosso papel não é alterar os votos dos indecisos que frequentam a rede, mas sim promover esses debates mais consistentes”; fica demonstrado a importância dos blogs, por ser um dos locais mais apropriados para esse tipo de manifestação, pois se constituem disseminadores de informações e geram muitos debates interessantes, propiciados pelos comentários, pois são um “espaço comunicacional que a cada dia conquista um número maior de leitores de seus posts e criando um público cativo para seus conteúdos”. (PENTEADO, SANTOS e ARAÚJO, 2006). Blogs Os blogs são “práticas contemporâneas de escrita online, em que usuários comuns escrevem sobre suas vidas privadas, sobre suas áreas de interesse pessoal ou sobre outros aspectos da cultura contemporânea” (LEMOS e PALÁCIOS, 2001: pág. 44). Uma das principais características dos blogs é a forma cronológica como os textos são exibidos, mostrando primeiramente os mais recentes. Uma seção comum de se en-

contrar é o blogroll, uma lista de indicação de outros blogs, o que demonstra que não há competitividade entre si, que o mais valioso é a quantidade de informações disponíveis na web e sua proliferação. Através dos blogrolls foi possível identificar muitos blogs com o tema das eleições. “Para o blogueiro, o blogroll pode servir como uma lista de favoritos, facilitando sua visita a tais páginas. Para o visitante/participante, esse recurso pode servir como uma lista de recomendações.” (PRIMO e SMANIOTTO, 2010) .

Segundo a pesquisa Sysomos (2010), o Brasil ocupa o 4º lugar em produção de blogs, ficando atrás somente dos E.U.A., Reino Unido e Japão. Os Blogs e as eleições 2010 Foram encontrados muitos blogs que tratam diretamente da campanha presidenciável 2010. Os citados a seguir foram encontrados nos sites oficiais dos candidatos: Dilma (www.dilma13.com.br/), Serra (www.serra45.com.br/) e Marina (www.minhamarina.org.br) ou pelo seu bom posicionamento nos resultados das buscas do Google: Movimento Marina Silva (www.movmarina. com.br), #euqueroSerra (euqueroserra.blogspot.com/), Blog da Dilma (/blogdadilma. blog.br/ ) Galera da Dilma, ( www.galerada-

dilma.com.br/), Blog Dilma Rousseff 2010 (www.dilma2010.blog.br/) e Mulheres com Dilma (www.mulherescomdilma.com.br/). Foi encontrado, também, o blog Eleições Presidenciáveis 2010 (eleicoespresidenciais2010.blogspot.com/), que posta informações de interesse geral sobre as eleições, mas sempre sobre sob uma ótica pessoal. “Os blogues políticos multiplicaram-se na rede e surgiram como espaço de análise, resgate histórico e discussão política. Especialmente no segundo turno, as acusações entre Dilma Rousseff (PT) e José Serra (PSDB) encontraram nos blogues, e também em redes sociais como o Twitter, espaço não apenas para sua disseminação, mas também para sua contestação” (NATUSCH, 2010). Durante a campanha eleitoral, no período de 20 a 22 de agosto de 2010, aconteceu o “I Encontro Nacional de Blogueiros Progressistas”, em São Paulo. Participaram do evento em torno de 330 pessoas de 19 estados brasileiros, o que demonstra a vontade de interagir com pessoas que realizam a mesma atividade na web. Os blogs de política não estão separados, eles formam uma grande rede de informação, concisa e

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organizada. A Caravana Digital, promovida pela campanha da Dilma, percorreu 27 estados em 50 dias, e foi realizada com o objetivo de conhecer e engajar as pessoas para a causa, o que gerou um excelente resultado na web. A partir do encontro e da Caravana Digital, outros eventos aconteceram nos estados, com o mesmo objetivo.

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gs pró-Dilma se deve, entre outras coisas, à plataforma que o “Blog Dilma Rousseff 2010” disponibiliza facilitando àqueles que desejam criar um blog pró-Dilma com as vantagens de hospedagem grátis, domínio (http://seunome.dilma2010.net. br) e vários templates, ou seja, sem custos adicionais e aos eventos motivadores, já citados anteriormente, onde o enconMarcelo Branco (apud POLATO, 2010) tro de blogueiros é favorecido trazendo diz que apostou no envolvimento de vo- a relação virtual para real e virce-versa. luntários, principalmente autores de blogs. Marina Silva teve seu encontro com O “Blog da Dilma” pede colaboração dos blogueiros e tuiteiros em 31 de maio de internautas através de doações em dinhei2010, antes mesmo da campanha oficial ro para investir em material para manter começar e teve como tema a contribui- o site, afinal o blog tem custos, como de ção da internet na ampliação dos proces- hospedagem, domínio; na sua prestação sos de transparência das ações do governo. de contas foi verificada a aquisição de uma máquina fotográfica de qualidade, o regisRecuero (2006) define webrings como cír- tro da participação no “I Encontro Naculos de blogueiros que lêem seus blo- cional de Blogueiros Progressistas”, que gs mutuamente e interagem nesses blogs aconteceu em São Paulo; além de produção através de ferramentas de comentários. de material de campanha, como panfletos, Podemos acreditar que a ocorrência da santinhos etc., comprovando que as ações Caravana Digital e eventos correlatos no meio digital acarretam iniciativas reais. motivaram a existência desse fenômeno em torno da campanha pró-Dilma. Blogueiros e o engajamento político Blogueiro é o nome dado a quem escreve Foi observado que a proliferação de blo- para blogs. Mas não é só isso, “ser bloguei-

ro também é ter opinião sobre assuntos diversos, é ser colaborativo e disseminador de informações, podendo até entreter seus leitores com abordagens humorísticas sem ofensas nem mau gosto respeitando também o ser humano e suas diferenças ideológicas” (KARENINA, 2010). Os blogs, normalmente, são registrados em nome de uma pessoa, que chamamos de responsável, no entanto muitas pessoas colaboram encaminhando textos, imagens, vídeos etc. Algumas iniciativas são mais encorpadas como no “Blog da Dilma” que possui 28 editores e 61 correspondentes, de diversos estados, e ainda abre inscrições para outras pessoas colaborarem. Isto que faz com que as impressões sobre a candidata Dilma Rousseff tenham várias formas e tons, com óticas regionais, e os fatos possam ter cobertura nacional. Tudo o que estiver acontecendo será registrado. A maior vantagem de ter vários colaboradores/editores é que sempre existirá material novo postado no blog, sem necessariamente ter pressão para a produção de conteúdo. É importante registrar que todos os posts possuem a identificação de seus autores, que são responsáveis pela informação e opinião ali prestadas.


Mídias Sociais e Eleições 2010 No “Movimento Marina Silva” foi encontrado um fórum com o tema “Blogueiros pró-Marina”, onde muitas pessoas colocaram seus blogs à disposição da campanha de Marina, tanto publicando posts com sua opinião de voto, como também com banners que linkam para o site oficial da campanha. Esses abriram espaços em seus blogs pessoais para criar textos pró-candidatura Marina Silva, como podemos perceber em “Brasil, Amor Eterno!”, disponível em <http://brasilamoreterno. blogspot.com> de Sandra Vargas Polastre e “Todos os desejos do mundo”, disponível em <http://todososdesejosdomundo. blogspot.com/> escrito por Jane G. Rodrigues da Silva. Mostrando a possibilidade de engajamento que o meio digital oferece.

perceber que Serra tem familiaridade com a web, talvez por isso, dentre os presidenciáveis é o que tem presença mais antiga na internet, e conhece a importância em se relacionar com a comunidade tecnologicamente antenada.

sobre algo ou alguém que conhece, gosta ou entende, defender uma causa que ache nobre. Em todos os blogs encontramos informações no formato de textos, imagens e vídeos, o que podemos considerar que as informações têm caráter multimídia.

As eleições 2010 foi regulamentada pela Lei nº 12.034, de 29 de setembro de 2009, que legisla, também, sobre o uso da web nas campanhas eleitorais. Baseadas nessa legislação existiram muitas ações contra blogueiros, o Tribunal Superior Eleitoral (TSE) solicitou ao Google dados dos responsáveis de alguns blogs, entre eles: “Blog da Dima” e #euqueroSerra. Posts O principal motivo para alguém ter um blog é querer ter um espaço para se expresO candidato José Serra tem o blog “José sar. Usar a tecnologia a favor de sua opinião Serra - Blog de Notas” desde 1989. De acordo com a definição de blogueiro proposto por Karenina (2010), Serra não escreve como blogueiro, somente reproduz textos publicados em jornais, revistas etc. ou textos na íntegra de discursos, pronunciamento, entrevista etc. Ele encontrou no blog uma utilidade própria, que é a de divulgar seus escritos, no entanto, podemos

Cada blog tem uma linha editorial própria. O “Mulheres com Dilma” trabalha o apoio das mulheres à candidatura, exibindo depoimentos de mulheres que votam em Dilma, como também os planos de governo da Dilma para este público e indicando mulheres de destaque. A maioria desses blogs datam sua primeira postagem antes mesmo da campanha eleitoral oficial se iniciar (03/07/2010). A maior surpresa foi com o “Blog da Dilma” que teve seu primeiro post pu-

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blicado em 10/11/2008, e já aborda- O Instituto de Pesquisas Qualibest, em va os possíveis presidenciáveis, onde já 2008, realizou uma pesquisa no Brasil e era citado o nome da Dilma Rousseff. indica que “...12% do total de entrevistados acreditam totalmente e 86% acreditam A campanha acabou, Dilma venceu, e os parcialmente nas informações que enconblogs pró-Dilma continuam com a produ- tram em um diário virtual”. Os blogs são ção de conteúdo a todo vapor, abordando fonte de notícias e já possuem muita crenão mais a campanha eleitoral, mas temas dibilidade como demonstra Leda Ribeicomo: o ministeriado, o período de tran- ro quando diz“...foi vasculhando e copiando os sição do governo, a posse, agenda etc. As artigos contidos nos diversos Blogs que pude pupautas vão se moldando às necessidades blicar excelentes matérias no Blog do Saraiva...”. de informação. O “Movimento Marina Já a pesquisa da TEXTUAL “A mídia soSilva”, também, continua publicando tex- cial como fonte da imprensa” que entretos, mas com visível redução de posts. vistou 100 jornalistas afirma que “82% dos jornalistas usam conteúdo das mídias sociais O uso das redes sociais (blog, you tube, etc.) como fonte de informação”. Todos os blogs possuem presença em pelo menos uma rede social, como: Twitter, Fa- Comentários cebook, Orkut, Youtube, Flickr etc.; que Foi constatado, nos blogs pesquisados, que servem de apoio no armazenamento de ví- a maioria dos posts possuem comentários, deos, fotos, podcast, como também na di- eles são feitos com diversos objetivos: comvulgação dos artigos. Isso demonstra que a plementam a informação dos artigos com utilização da web é completa e comprome- números, pesquisas, estatísticas; informam tida com uma maior divulgação da infor- links para posts ou vídeos com informamação produzida, além de possuir uma or- ções correlatas; dão opiniões pessoais sobre ganização sistemática da informação, como o assunto etc., “na janela de comentários, são produzidos diversos tipos de conteú- o debate prossegue como em um fórum, do, eles são disponibilizados em suas de- oferecendo também ao blogueiro a percepvidas plataformas, que interagem entre si. ção sobre o impacto de seus posts” (PRI-

MO e SMANIOTTO, 2010). É com esses números que percebemos o envolvimento com o que está sendo lido, comentários são feitos como forma de interagir com o autor. “Pode-se até dizer que um blog não é escrito apenas pelo blogueiro responsável, já que muitos são os interagentes que participam da escrita do blog como um todo (já que os comentários fazem parte do blog)” (PRIMO e SMANIOTTO, 2010). O sucesso dos blogs se dá, entre outras coisas, pela “atualização constante, a nota no calor dos acontecimentos é parte importante da atração gerada pelos blogs em grande número de leitores ávidos por informação política – categoria que coincide com a de cidadãos de atitude forte e positiva em relação à política.” (ALDÉ, ESCOBAR e CHAGAS, 2007). É nítido que a manifestação voluntária com cunho político, no meio digital e fora dele, é grande. Existe um grande movimento de blogs em volta da candidatura pró-Dilma, nas outras é menor. A produção do conteúdo é espontânea, mas foi gerada por uma estimulação diretiva da organização da campanha, através da promoção de eventos e disponibilização de plataforma facilitado-


Mídias Sociais e Eleições 2010 ra. Considerando que esses blogs continu- Referências Bibliográficas am produzindo conteúdo, podemos criar grandes expectativas para as eleições presi- ALDÉ, Alessandra; ESCOBAR, Juliana e CHA- sul21.com.br/jornal/2010/11/blogues-podemdenciáveis de 2014. GAS, Viktor. A febre dos blogs de política. Revista ser-o-germe-de-uma-nova-forma-de-organizaFAMECOS, Edição nº 33, agosto de 2007. Dispo- cao-partidaria/> consultado em 21/11/2010. nível em <http://www.revistas.univerciencia.org/ index.php/famecos/article/view/3257/3084> PENTEADO, Claúdio Luis de Camargo; SANTOS, Marcelo Burgos Pimentel de e ARAÚJO, consultado em 29/11/2010. Rafael de Paula Aguiar. Blogs de Política: camiDITOLVO, Mariana. M & M Online. Eleições: nhos para reflexão. Trabalho apresentado no I Marcelo Branco e as campanhas na internet. 2010. Congresso Anual da Associação Brasileira de PesDisponível em <http://www.mmonline.com.br/ quisadores de Comunicação e Política. Disponível <http://www.fafich.ufmg.br/compolitica/ noticias.mm?url=Eleicoes_Marcelo_Branco_e_ em anais2006/Penteado_Santos_e_Araujo_2006. as_campanhas_na_internet&origem=home> pdf> consultado em 29/11/2010. KARENINA, ANA. Blog Escritos Ideológicos. Ser blogueiro e o dilema dos posts diários. Disponível em <http://www.escritosideologicos. com/2010/04/ser-blogueiro-e-o-dilema-dosposts.html> consultado em 18/11/2010)

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O Twitter e as Campanhas Políticas: Uma Análise da Conversação dos Presidenciáveis Por Gabriela da Fonseca

Gabriela da Fonseca é jornalista graduada pela Faculdade de Comunicação da Universidade Federal da Bahia (UFBA) e faz especialização em Comunicação Organizacional, na Faculdade 2 de Julho. Atuou em assessoria de comunicação nas áreas de política e cultura - Prefeitura Municipal de Maragojipe, em 2007; Fundação Cultural da Bahia (FUNCEB), em 2008 e 2009; e Teatro Castro Alves (TCA), 2009 e 2010 - e trabalhou em campanhas eleitorais em 2006 e 2010. Em 2011, inicia o curso de mestrado no programa de Pós-graduação em Comunicação e Cultura Contemporâneas, da Faculdade de Comunicação da UFBA, na linha de pesquisa Comunicação e Política. Palavras-chaves: Twitter, campanha política, interação, cultura política, participação. twitter.com/GabidaFonseca gabrieladafonseca@gmail.com

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mbalados pelo sucesso da campanha de Barack Obama nos Estados Unidos, partidos políticos, candidatos e profissionais de comunicação e tecnologia da informação se prepararam e investiram nesta que seria a primeira experiência de campanhas políticas online no Brasil. Assim, vimos surgir, quase que em um passe de mágica, centenas de perfis em redes sociais, sites e blogs de candidatos entusiasmados com as inúmeras possibilidades apresentadas por tantas ferramentas. Dentre as redes sociais, o Twitter foi a que ganhou maior destaque. Raquel Recuero define rede social como “um conjunto de dois elementos: atores (pessoas, instituições ou grupos) e suas conexões (interações ou laços sociais)”, e entende que os sites classificados como redes sociais são formas de expressão dessas redes (RECUERO, 2009). Wilson Gomes tem a mesma compreensão ao afirmar que as redes sociais não são redes sociais de fato, elas são ferramentas de enredamentos, formadas por inúmeras redes1. 1 Considerações realizadas durante aula ministrada pelo professor Wilson Gomes em 19 de junho de 2010, no curso


Lançado em outubro de 2006, o Twitter é considerado um microblog por se assemelhar aos blogs - publicação periódica de pequenos textos apresentados em ordem temporal decrescente -, mas ter a postagem de textos limitada a 140 caracteres. No entanto, o termo microblog vem sendo questionado, uma vez que as especificidades da ferramenta estão mais evidentes. Recuero destaca que o Twitter é “voltado para informações rápidas e conversações resumidas”, enquanto o blog “tende a ser mais analítico e personalizado em seus textos” (RECUERO, 2008).

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O objetivo deste artigo é analisar como o Twitter foi apropriado pelas campanhas online dos principais candidatos à presidência nas Eleições 2010 - Dilma Rousseff, José Serra, Marina Silva e Plínio Arruda - com o intuito de responder a duas questões. Primeiro, os candidatos utilizaram a ferramenta apenas como depósito de informações ou conseguiram explorar as possibilidades de interação com os internautas e, assim, contribuírem para uma cultura política de participação? Segundo, quais foram os as“Campanha Política e Marketing Online”, na Faculdade de Comunicação da UFBA.

suntos mais comentados? Enfim, o obje- dispõe de recursos como o Twitpic – espétivo é saber o quanto eles conversaram e cie de álbum de fotos – e do Twitcam – o sobre o quê falaram. usuário compartilha vídeos ao vivo através da webcam. Há ainda a possibilidade em O Twitter enviar uma mensagem direta, restrita à pesA ferramenta vem se consolidando como soa que envia e àquela que recebe. uma das mais populares e já está entre os vinte sites mais acessados na internet. O Outra prática é a hashtag, que permite reseu uso é simples e fácil. O usuário se ca- cuperar mensagens sobre um mesmo tema, dastra e cria o seu perfil, fazendo uma bre- através da utilização do sinal de sustenido ve descrição a seu respeito no campo cha- antes da palavra ou expressão que servirá mado de “bio”. A partir daí ele pode seguir como tag. Como destaca Alex Primo, este outros usuários, para ser atualizado sobre é um “fenômeno emergente, um ‘protocoo que eles estão comentando (twittando), lo social’ compartilhado pelas pessoas que e escrever as suas mensagens (tweets), que conhecem o processo” (PRIMO, 2008). também serão recebidas pelos seus segui- As hashtags mais comentadas entram para dores. Embora a questão inicial colocada o trending topics, uma lista dos nomes mais pelo site seja “What´s happening?”, poucos postados no Twitter. Essa ferramenta deu seguem o protocolo. origem aos “twitaços” (analogia dos “apitaços” realizados em manifestações e moConversas são mantidas através do uso do bilizações políticas), promovidos pelas símbolo @ junto ao nome do usuário com campanhas políticas com o intuito de fazer o qual se pretende interagir. Assim é possí- “barulho” na rede e ganhar visibilidade. vel comentar mensagens de seguidores, que saberão do comentário e poderão manter a conversa. Outra ação muito utilizada é o Internet e Participação Política retweet, ou seja, repetir algo que alguém dis- O advento da internet, no início dos anos se em seu próprio Twitter. O usuário pode 90, possibilitando que o cidadão antes esainda incluir links em suas mensagens, e pectador pudesse ser, também, um emissor,


Mídias Sociais e Eleições 2010 trouxe grande expectativa de renovação da esfera pública e da democracia participativa. Dentre as vantagens democráticas da internet são apontadas a superação dos limites de tempo e espaço para a participação política; a inexistência de filtros e controles; a interatividade e interação; e a oportunidade para vozes minoritárias ou excluídas. Para Jorge Almeida, “a Internet não é uma esfera pública, mas um instrumento que permite a interferência de indivíduos ou grupos no debate público”. O potencial democrático das ferramentas de comunicação mediadas pelo computador é enorme, por possibilitarem a abertura de canais de conversação, sobretudo, os sites de redes sociais, que “são focados em conexões, em relacionamentos construídos pela interação” (RECUERO, 2010). Apesar de a internet ser um ambiente repleto de possibilidades, ela não pode, por si só, assegurar o incremento da participação democrática. Na opinião de Gomes, “só se poderia pensar em efeitos da informação política on-line sobre práticas políticas se levássemos em conta a cultura política predominante” (GOMES, 2008). Portanto, o

potencial democrático da internet será mais bem utilizado à medida que valores da cultura política do Brasil sejam transformados e que os atores políticos também sejam capazes de imprimir mudanças em suas práticas.

ção: 1. Assuntos relacionados à campanha e às eleições, como agenda de compromissos, materiais de campanha, comitês, entre outros; 2. Conversas sobre programa de governo do candidato e suas opiniões sobre temas relevantes; 3. Conversas triviais Procedimentos metodológicos sobre assuntos diversos; 4. AgradecimenPara analisar o grau de interação dos can- tos a manifestações de apoio. didatos à presidência no Twitter durante a campanha, realizamos três etapas. Primei- Resultados ro, recortamos dois momentos distintos Dilma Rousseff - A candidata do PT teve durante a campanha para a coleta de twe- fraca atuação no Twitter, deixando claro ets dos quatro candidatos. O primeiro mo- que a ferramenta não estava entre as priorimento foi entre os dias 9 e 16 de agosto, dades de sua campanha online. No primeiou seja, depois de um mês de campanha, ro período analisado, entre 9 e 16 de agospor considerarmos que, neste momento, os to, ela twitou apenas dez vezes, e nenhuma candidatos já tinham domínio sobre a fer- mensagem foi classificada como converramenta. O segundo recorte, entre os dias sação. No segundo período, de 13 a 20 de 13 e 20 de setembro, quando a campanha setembro, a candidata postou apenas nove chegava à reta final. mensagens e repetiu o desempenho anterior, sem conversas. Depois da coleta das mensagens twittadas em ambos os períodos, foram selecionados Vale à pena destacar que, no primeiro peos tweets classificados como Conversação: ríodo, 60% das mensagens foram comen1. Respostas e perguntas direcionadas a al- tários sobre assuntos variados. A candidata guém, contendo ou não a “@”; 2. Questões lembrou o aniversário da cantora mineira direcionadas a toda a rede. Clara Nunes, que faria 68 anos, e comentou Na terceira etapa, analisamos o conteúdo sobre o Dia Mundial da Juventude, ambos das conversas, a partir da seguinte classifica- no dia 12 de agosto. Já no segundo, a pre-

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ocupação da candidata foi divulgar a sua agenda de compromissos, com 55,5% de tweets sobre eventos, comícios e viagens.

Análise das Conversações

José Serra - O candidato tucano foi usuário assíduo na rede. No primeiro período analisado, ele deixou 41 mensagens, sendo 26,8% conversações. Neste período o destaque ficou para comentários sobre assuntos diversos, como literatura, música e futebol, com 29,3%. No segundo momento, ele twittou 71 vezes, desta vez, com destaque para as conversas, com 35,2% dos tweets.

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Com relação ao conteúdo das conversas, 38,9% se referiam à campanha e questões relacionadas à eleição, seguida pelas conversas sobre assuntos diversos com 36,1%, o que demonstra a preocupação do candidato em produzir sua imagem “na intimidade”. Conversas sobre programa de governo e opiniões acerca da agenda temática do candidato somaram 25%. Marina Silva - A candidata do PV também marcou forte presença no Twitter. Analisando o primeiro momento, período

em que a candidata twittou 67 vezes, 40,3% corresponde a conversas com seguidores. No segundo momento, Marina manteve o desempenho de conversações, com 39,7%. O conteúdo da maior parte das conversas foi sobre a campanha. Respostas a questões como onde encontrar material de campanha, como montar uma “Casa de Marina”, além de convocações à militância para comícios e mobilizações corresponderam a 55% das conversas. Depois, aparecem os assuntos relacionados ao seu programa de

governo e temas da agenda política, como aborto, drogas e pesquisas com células tronco, com 35%. Outros assuntos somaram 6,7% e agradecimentos a manifestações de apoio 3,3%. Plínio Arruda - O socialista, candidato do PSOL, apresentou, no primeiro período analisado, um desempenho acima da média dos demais candidatos, tanto no número total de mensagens, como na quantidade de conversações. Entre 9 e 16 de agosto, ele twittou 134 vezes, sendo 61,2% classi-


Mídias Sociais e Eleições 2010 ficadas como conversações. No segundo momento, de 13 a 20 de setembro, sua participação caiu para 74 mensagens, sendo 33,8% de conversas.

O conteúdo das mensagens, por sua vez, evidencia diferenças entre a apropriação da ferramenta pelos candidatos. José Serra tentou uma aproximação com outros usuários a partir de conversas com conteúdo não político, comentando assuntos como futebol, filmes e livros, e falando sobre gostos pessoais. Com isso ele tenta produzir a sua imagem “na intimidade”, utilizando o artifício de parecer não ter artifício.

Opinião sobre temas e fatos políticos e informações sobre o programa de governo do partido foram os assuntos mais comentados, totalizando 41,1% das conversas. Em seguida, aparecem as conversas sobre a campanha e eleições (25,2%), agradecimentos à manifestações de apoio (20,56%) Já Marina Silva apostou na mobilização da e outros assuntos (13,08%). militância e simpatizantes, convidando os usuários a participarem de debates e evenOs resultados obtidos estão sintetizados na tos, e oferecendo informações sobre maTabela 1. teriais de campanhas, comitês e agenda de compromissos. Enquanto Plínio Arruda Considerações Finais tentou ganhar o voto dos seguidores atraEste artigo procurou analisar o uso do vés da exposição de opiniões e argumentos. Twitter nas campanhas online dos prin- O grande número de conversas do candidacipais candidatos à presidência no último to com este conteúdo se deu também pelo pleito, no que diz respeito ao grau de in- fato dele ter concedido entrevistas na rede e teração entre eles e outros usuários e ao promovido debates online no Twitter, com tipo de conteúdo das conversações. Os dia e horário previamente marcados. resultados obtidos mostram que, com Afora uma ou outra gafe cometida pelos exceção de Dilma Rousseff, os candida- candidatos no Twitter, o uso da ferramenta tos exploraram o potencial de interativi- durante as campanhas comprovou o seu podade da ferramenta, com destaque para tencial para engajar pessoas a participarem Marina Silva e Plínio Arruda. dos processos políticos. Nas mãos de um

ator político com vontade de interagir com as pessoas e promover debates, o Twitter pode ser um importante instrumento para incentivar a participação política.

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Referências Bibliográficas ALMEIDA, Jorge. Convergência tecnológica, esfera pública e democracia. In: COLÓQUIO BOGUES GLOBALISME ET PLURALISME, 2001, Montreal. GOMES, Wilson; MAIA, Rousiley. Comunicação e Democracia: Problemas & Perspectivas. São Paulo: Paulus, 2008. p. 293-326. PRIMO, Alex. A cobertura e o debate público sobre os casos Madeleine e Isabella: encadeamento midiático de blogs, Twitter e mídia massiva. Galáxia, v. 16, 2008. No prelo.

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RECUERO, R.; ZAGO, G. Em Busca das “Redes que Importam”: redes sociais e capital social no Twitter. XVIII Encontro da Compos, MG, junho de 2009. Disponivel em: <http://www.compos.org.br/data/ biblioteca_1016.pdf> Acesso em: 18 de outubro de 2010 RECUERO, Raquel. Considerações sobre o Twitter I – Definição. Publicado no dia 18 de novembro de 2008. Em: http://pontomidia.com.br/raquel/arquivos/consideracoes_sobre_o_twitter_i_definicao.html . Acesso em 18 de outubro de 2010.

RECUERO, Raquel. Mídia Social e Campanha Eleitoral. Publicado no dia 22 de abril de 2010, em: http://pontomidia.com.br/raquel/arquivos/midia_social_e_campanha_eleitoral.html . Acesso em 18 de outubro de 2010.


O Uso do Twitter pelos Presidenciáveis Por Andréia da Silva Martins

Andréia Martins é jornalista, formada pelo Mackenzie, em 2006, e com especialização em Comunicação Jornalística, com ênfase em Comunicação política, pela Faculdade Cásper Líbero. Estagiou na TV Globo e trabalhou no Portal Virgula como editora e repórter de Música e de Notícias. Foi repórter de entretenimento da Globo.com e redatora na agência Page One (comunicação corporativa). É editora e repórter do site Palco Alternativo e, atualmente, repórter da UOL. Palavras-chaves: comunicação, política, cultura, mídias digitais, cibercultura @andreia_sm www.autopromocao.wordpress.com www.palcoalternativo.com.br

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ois episódios recentes ilustraram – e provaram – que o ativismo político na internet pode mudar resultados de uma eleição, como ocorreu com o presidente Barack Obama, quebrar barreiras políticas e eliminar a censura imposta por alguns regimes ditatoriais, como ocorreu no Irã. Quando se fala em estratégia eleitoral específica para internet, não há dúvidas de que a web ganhou força e espaço nas campanhas depois que um então senador desconhecido do grande público venceu a presidência norte-americana. Obama mirou as principais redes sociais da internet para aumentar sua popularidade. No dia anterior à eleição, o então candidato do Partido Democrata arrebatou até 380% a mais de amigos, apoiadores, seguidores e assinantes do que seu adversário, o senador republicano John McCain. Quatro vezes mais pessoas assistiram a vídeos na internet produzidos pela campanha vencedora do que na do derrotado.


No caso do Irã, o Twitter foi o meio encontrado pelos militantes contrários ao governo do presidente Mahmoud Ahmadinejad para protestar contra a reeleição do político. Os militantes recorreram à internet e usaram o Twitter para divulgar para todo o mundo os protestos ignorados pela imprensa local.

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“o mais novo território de disputa e luta na sociedade” (Ferrari 2007, p. 87), um espaço público democrático. A informação, pelo caráter horizontal de circulação da web, possibilita o fortalecimento das estratégias dos movimentos e o surgimento de redes de grupos organizados. A realidade dessa esfera pública suporta que qualquer indivíduo exerça um papel relevante na nova Manifestações de apoio ao oposicionista mídia. Mir Mousavi e denúncias de fraude eleitoral, manipulação midiática eram os princi- Por outro lado, há teóricos que sustentam pais assuntos dos posts dos iranianos. O que, longe de se tornarem uma expressão próprio Twitter, enxergando a importância da democracia, o excesso de opiniões e da ferramenta naquele momento, adiou a manifestações publicadas na internet conmanutenção que faria no serviço para não duzem a uma ruína democrática em escala impedir os iranianos de protestarem. global, pelo fato de permitirem que muitos interesses diferentes ou, até mesmo contraOs dois casos mostram a força e relevân- ditórios, sejam discutidos em nível intercia da internet em um processo eleitoral. nacional sem nunca se alcançar nenhuma Mesmo sem respostas, questões como até meta - mas causando um enorme “engarraonde se pode chegar, qual o modo correto famento” de ideias e posições, nem sempre de usar essa ferramenta e se o Twitter pode, positivas (RIEFF, CLOUGH apud DEIde fato, interferir no processo eleitoral, me- BERT, 2000, p.256). recem reflexão. De modo geral, esse novo espaço também Esse conjunto de novas tecnologias pro- implica em uma nova forma de opinião púporcionando novas formas de acesso, pro- blica: uma opinião que serve de termômetro dução e distribuição da informação criou da sociedade, pois nenhum acontecimento

ou fato é passível de adquirir relevância pública se não for repercutido em larga escala (no Twitter, por exemplo, os assuntos mais falados podem ser vistos diariamente na lista intitulada Top Trends). Com base nessas constatações, pode-se observar a relevância da mídia também na área política. A importância cada vez maior da propaganda política, do marketing político e da comunicação, deixa claro que a política mudou de lugar: deixou de estar principalmente nos partidos e no Congresso para estar na mídia e, agora, nas mídias sociais. De um lado, isso amplia a possibilidade de comunicação dos candidatos - que não fica mais restrita à mídia tradicional -, e de outro, abre um canal direto para o eleitorado acompanhar e cobrar os candidatos, o que os obriga a ter ações e discursos mais transparentes. Para adequarem-se a esse contexto, os candidatos precisam inserir suas campanhas no ambiente digital, o que requer novas diretrizes, em muitos casos totalmente opostas às campanhas tradicionais.


Mídias Sociais e Eleições 2010 A seguir, divido algumas reflexões feitas com base no acompanhamento do Twitter dos principais candidatos à Presidência – Dilma Rousseff (@dilmabr), José Serra (@ joseserra_), Marina Silva (@silva_marina) e Plínio de Arruda Sampaio (@pliniodearruda), durante o primeiro turno da campanha eleitoral de 2010, avaliando-os com relação a interação, mobilização, descentralização.

datos José Serra (PSDB) e Plínio de Arruda Sampaio (PSOL), que aparecem com perfis mais personalizados, distantes do discurso técnico, apostando em um tom mais informal, próximo do eleitorado, com postagens que mostram que é o próprio candidato é quem tuita na maioria das vezes.

José Serra usou diariamente o Twitter, postando comentários que vão desde um cliInteração - tom do ma de bate-papo com os demais usuários, relacionamento com o público e críticas aos adversários e promoção de sua transparência campanha. Comparado aos demais, é o que A internet permite que, além dos comícios, mais utilizou a ferramenta como um canal do rádio e da TV, também seja possível in- de comunicação pessoal. teragir virtualmente, projetando um alcance que supera encontros presenciais. Além dis- Pelos tweets, ficava implícito que ele era o so, diante do fenômeno digital na campanha autor dos posts. No microblog o candidado presidente Barack Obama, assessores e to tucano não fala apenas sobre política, publicitários brasileiros já enxergam o Twit- mas também de música, futebol e outros ter como uma ferramenta estratégica para o temas: posicionamento dos políticos na web. “Ah, sim, ia esquecendo de contar... Quase No caso dos quatro principais candidatos à não reconheço o Aécio com a novidade daquela Presidência da República, há numa diferen- barba”(Tweet no pefil de @joseserra_ no dia 20 ça clara no perfil de cada um: com relação ao de abril de 2010) perfil, as candidatas Dilma Rousseff, do PT, e Marina Silva, do PV, usam a rede social ao Uma característica do relacionamento entre invés de estar nela, ao contrário dos candi- candidato-seguidores era interação. Serra

respondia perguntas, indicava links, mostrando sempre uma opinião sobre temas atuais ou gostos pessoais. Visto como um político sério demais, retratado pela imprensa como impaciente, e centralizador, na web ele adota uma postura de “camarada”, o que para especialistas pode ajudar a aproximá-lo do eleitorado. Outra coisa que aumentou sua popularidade na rede foi o fato de o candidato dormir tarde, passando a conversar por horas com os internautas durante a madrugada. “A liga dos indormíveis sentiu minha falta, na madrugada passada? Dormi mais cedo, @jorgeleonardo1! Tinha compromissos desde as 7 da manhã” (Postado às 2h56 em 21 de maio no perfil @joseserra_) Aos poucos, a candidata Dilma Rousseff, que quando entrou no Twitter admitiu não saber como usar a ferramenta e pediu ajuda aos seguidores, foi abandonando o excessivo discurso técnico nos posts do Twitter. Um exemplo desses tweets onde a candidata fala mais do seu dia a dia é o tweet onde ela cita o encontro no aeroporto de Congonhas, em São Paulo, com uma menina

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chamada Vitória, para quem afirmou que risco de excluir eleitores que não se identifi“mulher pode sim” ser presidente, pouco cavam com nenhum dos dois perfis. antes de embarcar para Nova York, em 20 de maio. “É muito gratificante ver que as mulheres das novas gerações estão crescendo c/a “Falei p/ a Vitória,a menininha q encontrei no confiança de que podem ocupar os mesaeroporto c/a família:quem sabe um dia você não mos espaços q os homens” (Postado no dia vira presidente da República?Mulher pode, sim” 20 de maio, no perfil @dilmabr) (Postado no dia 20 de maio, no perfil @dilmanabr) “Embarcando,em SP,encontro muito legal c/um casal jovem com crianças.A mãe fez questão de Ao longo da campanha, Dilma – ou sua me mostrar p/a menina,dizendo:¨mulher também assessoria de campanha – estabeleceu dois pode” (Postado no dia 20 de maio, no perfil @ focos para seus comentários no Twitter: dilmabr) apresentar números e textos positivos sobre o governo Lula, de quem ela era a can- “Os da dos do Caged são excelentes 266,4 mil e didata, reforçando assim o vínculo com pe- pregos com carteira assinada. No trimestre 657 tistas, militantes e simpatizantes do partido mil. Recorde em cima de recorde...” (Postado no ou do próprio presidente, e interagir mais dia 15 de abril no perfil @dilmabr) com o público, especialmente um de seus principais focos: o eleitorado feminino. “Vcs viram? Dez bolsistas do ProUni foram estudar na Universidade de Salamanca, na Espanha. No microblog ela reforçava o discurso de E ainda tem gente contra o ProUni” (Postado no “mulher pode”, já destacado em sua campa- dia 16 de abril, no perfil @dilmabr) nha de rádio e TV, e destacava pontos positivos do governo do presidente Luiz Inácio No caso de Marina Silva, o excesso de Lula da Silva. Nesse sentido, ela acertou ao links de entrevistas e informações sobre a falar diretamente àquele que acreditava ser agenda da candidata do PV dá a impressão seu eleitorado em potencial, mesmo com o de que era apenas a assessoria da candida-

ta que atualizava o Twitter da senadora, o que poderia demonstrar uma falta de personalidade no perfil de Marina. No dia 25 de maio, uma seguidora postou o seguinte comentário dirigido ao Twitter da senadora: “Candidata, twitta um pouquinho. Deixa a sua assessoria de imprensa descansar pelo menos um minuto”. A resposta de Marina foi rápida. “A minha assessoria até que tem descansado; quem não tem conseguido muito sou eu”. Na semana seguinte, no dia 10 de junho, Marina lançou um novo perfil no Twitter e fez questão de avisar que a página, apenas com informações da campanha, seria alimentada pela sua equipe de comunicação. O perfil anterior passaria então a ser administrado pela própria. Estar atento ao potencial de interação de uma ferramenta como o Twitter é um dos pontos chaves para usá-la de forma correta. A falta de diálogo e de variação de temas pode acabar afastando seguidores que poderiam se transformar em eleitores.


Mídias Sociais e Eleições 2010 No geral, mais importante que obter eleito- comentários. Depois, Marina respondeu res é agregar valor à imagem do candidato. as mensagens dos dois seguidores dizendo que “a vida é um dom dado por Deus para Marina também sentiu na pele a rapidez quem crê e para quem não crê. Louvado com que se desconstrói uma reputação no seja Deus” e que “o que aprendemos com Twitter devido a um erro de sua assessoria. Jesus é que temos que amar e respeitar toNo dia da morte do escritor José Saramago das as pessoas, mesmo as que não respei(18 de junho), a assessoria de Marina pos- tam a nossa fé”. tou o seguinte comentário no perfil da senadora no Twitter: “Morre José Saramago. Após retuitar (replicar) os comentários O mundo perde um grande escritor e os dos seguidores, a equipe da senadora pospaíses da língua portuguesa, o nosso pri- tou um recado no Twitter avisando que ela meiro prêmio Nobel”. estava reproduzindo as mensagens apenas para comentar depois. Na sequência, a candidata recebeu duas respostas criticando o seu comentário, ques- O episódio mostrou um deslize da equipe tionando o porquê de “lamentar a morte de da senadora onde ela mais aposta para subir uma pessoa que blasfemou contra Deus a nas pesquisas eleitorais: as redes sociais, e vida toda?” e outro dizendo que Saramago teve repercussão no próprio Twitter. Para não respeitava a fé alheia e, por isso, não era uns, a equipe prejudicou a imagem da se“exatamente um GRANDE escritor”. As nadora mostrando que não sabe usar a fercríticas dos seguidores da candidata devem- ramenta. se ao fato de que Saramago era declaradamente ateu, e a senadora é evangélica. O que o episódio mostra? Que com essas novas ferramentas, qualquer deslize dos Ao receber as respostas, a equipe da sena- candidatos é monitorado pelos eleitoresdora reenviou as mensagens para todos os seguidores. seguidores, dando a impressão de que ela O socialista Plínio de Arruda Sampaio estaria concordando com o conteúdo dos (PSOL), de um partido sem grandes alian-

ças e com pouco tempo de TV e de rádio, conseguiu na internet, especialmente por meio do Twitter, a igualdade de tempo e espaço frente aos adversários. Em seus tweets, Plínio divulgava seus vídeos de campanha, sua agenda e tecia críticas aos adversários. Depois de participar do primeiro debate na TV entre os presidenciáveis, na TV Bandeirantes, em 5 de agosto, Plínio viu sua popularidade na web aumentar (o episódio será analisado no capítulo 2 deste trabalho) e a partir daí, a comunicação com os internautas via Twitter ganhou um peso e importância que antes não havia sido calculado pela equipe de campanha do socialista. “Hoje eu estava vendo que estou com 68 mil seguidores. Quando entro para twittar, em meia hora tenho mais 100 pessoas. É impressionante a importância do Twitter. Claro que ele pode ser usado pela publicidade, e creio até que, com o tempo, vai substituir a TV. Mas a principal vantagem desta rede é que ela deixa a relação mais transparente, porque não tem nenhum filtro entre a comunicação de alguém e a resposta que ele recebe. Está isolado de qualquer contato. É ele e só. A resposta é muito

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espontânea, muito real. E isto é uma grande vantagem quando se trata de comunicação com figuras importantes para a sociedade”, disse Plínio em entrevista ao Meio & Mensagem Online.

eleitoral ao criar um terceiro bloco formador de opinião: a expressão multimídia das redes sociais, que soma-se aos blocos formados pelos candidatos e partidos e pelos mass media.

Descentralização - participação democrática, de eleitores e candidatos “De certa forma, a Internet estava destinada a ser um meio social desde o começo – aberta, sem regulação, extensível e imprevisível. (...) A Internet torna possível que um vibrante universo social surja impulsionado pela paixão de milhões”. (Shayne Bowman e Chris Willis, 2003)

Na campanha de 2010, os candidatos Marina Silva, terceira colocada, e Plínio de Arruda Sampaio, quarto colocado, foram os mais beneficiados do caráter descentralizador das redes em suas campanhas.

A frase acima deixa claro que com os novos meios na web, não existem fronteiras, ou pelo menos que, se existem, cruzá-las é cada vez mais fácil, já que estes meios não são institucionalizados: pertencem a quem neles participa.

Foi assim que, contrariando as pesquisas de opinião, Marina mobilizou eleitores conseguindo 20 milhões de votos no primeiro turno. A campanha da senadora apostou na internet para atingir exatamente o seu público, sendo o Twitter apenas uma das ferramentas, dentro de um novo conceito intitulado SRM (social relationship management). Dentro dessa ideia, para cada público escolheram uma rede social diferente - no Orkut, o foco foram os evangélicos. Já no Facebook, eles falaram para as mulheres, e no Twitter, com os jovens – avaliando as potencialidades individuais de cada rede.

como o Twitter pode democratizar o processo eleitoral. No debate do dia 18 de agosto promovido pela Folha/UOL entre os principais presidenciáveis, apenas três candidatos foram convidados a participar: Dilma, Serra e Marina. Pela legislação eleitoral brasileira, só é obrigatória a presença de candidatos com 10% ou mais de intenção de votos. Não era o caso de Plínio. Mesmo do lado de fora do debate, Plínio conseguiu movimentar o Twitter e chegar à primeira posição do trending topics brasileiro, e à oitava do mundial, por volta das 12h30. O candidato convocou internautas para um tuitaço e passou a comentar o debate pelo site Twitcam, uma ferramenta para transmissão de vídeos ao vivo pelo Twitter. Ou seja, usando o microblog, o socialista participou de um processo do qual estaria excluído, não só pelas limitações dos mass media, mas também pelas da própria legislação eleitoral.

Na política, a horizontalidade das redes digitais é mais benéfica para aqueles candidatos ou partidos que dispõem de menos tempo Ao final do quarto bloco do debate, Plinio na sua propaganda eleitoral. Ela vem cola- Mas é o candidato socialista, talvez o me- comemorou a mobilização. “Valeu gente! borar com a democratização do processo lhor exemplo de como uma ferramenta Conseguimos furar mais uma vez o blo-


Mídias Sociais e Eleições 2010 queio da grande mídia! Até mais tarde!”, postou o candidato.

seria, segundo Weber, o segundo tipo de se dia, o perfil da presidenciável no Twitter relação. atingiu a marca dos 100 mil seguidores.

Mobilização - entre o debate político e a militância Até o resultado da eleição, muitos não deram importância à capacidade de mobilização da internet nas eleições, pois as pesquisas confirmavam a polarização entre os candidatos do PT e PSDB. Essa descrença talvez exista porque haja certa resistência da parte de muitos em enxergar a internet não como um meio de comunicação, mas como uma ferramenta capaz de criar vínculos. Muda-se o conceito, muda-se o objetivo e, assim, os resultados.

Uma comunidade virtual é construída sobre as afinidades de interesses, de conhecimentos sobre projetos mútuos, em um processo de cooperação ou de troca, tudo isso independentemente das proximidades geográficas e das filiações institucionais (Levy, 1999). É exatamente o “sentimento de pertencimento” (Recuero, 2005), próprio dos laços de identidade ou de identificação, que modula o ponto de convergência entre sujeitos que se mobilizam virtualmente em torno de uma causa ou de objetivos comuns.

Max Weber, pegando na distinção entre comunidade e sociedade, apontou a existência de ações e relações sociais de forma comunitária – fundadas sobre o sentimento subjetivo de um sujeito de pertencer a uma mesma coletividade – e ações e relações de forma societária – baseadas no compromisso e na associação voluntária dos indivíduos para defenderem os seus interesses. Apesar de estas duas formas de ação social coexistirem em várias instituições sociais, a tendência da modernidade

Mobilização organizada - Uma das mobilizações – inédita até então em campanhas eleitorais no Twitter - na campanha presidencial de 2010 no Twitter foi o ”tuitaço”, organizado pela campanha de Marina Silva. O “tuitaço” em apoio à candidatura Marina Silva foi realizado no dia 20 de maio, entre 12h e 18h20, resultando em quase 16 mil citações de apoio à candidata do PV, segundo informações campanha da senadora. Nes-

Desde o início da campanha, Marina afirmou considerar a internet como uma boa ferramenta para a divulgação de ideias e incentivo ao debate. Uma espécie de versão online chamados “flashmobs”, a ação foi proposta por um dos participantes da comunidade Marina Silva PV no Orkut, o internauta Pedro Pongelupe, da cidade paulista de Ibitinga. Os seguidores da senadora utilizaram a hashtag #euvotomarina em suas mensagens e a completaram explicando os motivos de terem escolhido a senadora como sua candidata. No final da tarde do dia da mobilização, Marina era a única presidenciável listada nos Trending Topics do Brasil, termos mais comentados pelos usuários do Twitter. Seu nome e a hashtag “#euvotomarina” estiveram praticamente o dia todo nos Trending Topics. Entre as palavras e composições de palavras mais usadas na ação destacaram-se, além de euvotomarina: Brasil, planeta, melhor, país, política, educação, @marineirobrasil.

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Mobilizações espontânea e partidária Já Plínio, quarto colocado no resultado final da eleição presidencial, mobilizou centenas de eleitores de forma espontânea, após seu desempenho nos debates televisivos. No dia 5 de agosto de 2010, a TV Bandeirantes realizou o primeiro debate entre os presidenciáveis, com a participação de Plínio. Com desenvoltura em suas falas, chamou a atenção dos internautas que usavam o Twitter durante o evento e chegou à primeira posição entre os assuntos mais comentados do site de microblogs.

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O perfil do socialista no Twitter acompanhava a repercussão e seguiu sendo atualizado no decorrer do encontro. As frases de mais efeito eram reproduzidas no site pela assessoria do presidenciável. Em algumas horas, Plínio passou de cerca de nove mil para mais de 11 mil seguidores. Outras formas de mobilização espontânea ou feita pelos partidários foram as hashtags criadas para repercutir os assuntos da campanha no microblog. Entre elas tivemos #serracaluniador, #dilmanao, #ondavermelha (referente ao PT e à candidata Dilma Rousseff), #ondaverde (referente ao Parti-

do Verde e à candidata Marina Silva), #dil- mas que aceitam divulgar mensagens, de mabr, #BR45IL, #45, entre outras. apoio ou de críticas, através de formatos eletrônicos. A hashtag #Serracaluniador – termo usado por Dilma em um debate para justificar as de- Sendo assim.... núncias contra Erenice Guerra - alcançou o É possível enxergar as possibilidades que segundo lugar entre os assuntos mais fala- o Twitter abre para as campanhas eleitodos pelos brasileiros na rede social. O nome rais, mas que para obter êxito, os padrões de Erenice Guerra, um dos principais alvos e clichês de campanha talvez não sejam o da campanha de Serra durante o primeiro melhor caminho. Novos públicos, redes e turno, também chegou ao topo da lista dos possibilidades exigem novas estratégias de Trending Topics do Twitter Brasil. campanha, e um cuidado a mais para que a comunicação não pareça institucional ou No caso das eleições de 2010, o Twitter foi marqueteira demais. Com o Twitter e as tomado por militantes partidários, tanto da novas formas de comunicação, interação oposição quanto do governo, que se dedi- e produção de conteúdo, saber lidar com caram apenas a repetir slogans de apoio aos a transparência é, sem dúvida, um desafio seus candidatos e de críticas aos adversários. que os políticos e suas terão no mundo real Com relação à troca de ideias e debates, o e no mundo virtual. uso do Twitter deixou a desejar. Tais considerações mostram que o grande efeito do Twitter, talvez não seja sentido tanto em termos de conquista de votos, mas sim na sua capacidade de organizar militantes e reforçar a argumentação de eleitores que já apresentam uma pré-disposição para votar no candidato. Serve para ‘energizar’ grupos que dificilmente fariam campanha na rua ou iriam a um evento de campanha,


Mídias Sociais e Eleições 2010 Referências Bibliográficas DEIBERT, Ronald J. International plug’n play? Citizen activism, the Internet, and the global public policy. In: ������������������������������� International Studies Perspectives, 1, 255-272, 2000.

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BOWMAN, Shayne; WILLIS, Chris, Nosotros, el

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Participação política na Era Digital: um estudo de caso das #Eleições2010 Por Patrícia Gonçalves Rossini

Patrícia Gonçalves C. Rossini é bacharel em Jornalismo, formada em 2010 pela Faculdade de Comunicação Social da Universidade Federal de Juiz de Fora. Durante a faculdade, estagiou na Iso4 Comunicação, Rádio Solar e Portal Acessa.com, além de ter sido monitora da disciplina Técnica de Produção em Hipermídia. Iniciou na graduação sua pesquisa sobre o uso do Twitter pelos candidatos à presidência, que também é tema de seu projeto desenvolvido no mestrado do Programa de Pós-Graduação em Comunicação da UFJF - Turma 2011 - 2013. Tem interesse acadêmico nas áreas de Comunicação, Política e Cibercultura, com ênfase no uso de redes sociais, interação, campanha eleitoral e participação política. Palavras-chave: Eleições, Redes sociais, Participação Política, Twitter, Campanha Eleitoral www.twitter.com/patyrossini patyrossini@gmail.com lattes.cnpq.br/4196527872542970

Comunicação Política: Desafios Contemporâneos

A

relação entre mídia e política (GOMES, 2004) se constrói e se altera sob influência da evolução dos suportes técnicos e tecnológicos. No século XXI, com o advento da Internet, o processo comunicacional torna-se mais complexo permitindo ampla interação entre produtores e consumidores de conteúdo. Considerando-se a sociedade brasileira media centered (DE LIMA, 2007, p.187), podese afirmar que os meios de comunicação representam a principal fonte de informação para o cidadão (ALDÉ, 2004; DE LIMA, 2007; GOMES, 2004). Neste cenário já consolidado pelos meios massivos no modelo de transmissão um-todos, os computadores começam a ganhar espaço, e a arquitetura de redes impõe mudança na maneira de comunicar, produzir e consumir informação. O crescimento do acesso à Internet e a inserção da informática em escolas e empresas são fatores que demonstram a im-


Mídias Sociais e Eleições 2010 portância das redes telemáticas para a sociedade contemporânea. Segundo dados do Instituto Brasileiro de Pesquisas Geográficas (IBGE) de 2009, 27,4% da população tem acesso à web em casa - mais do que o dobro do levantado pela mesma pesquisa em 2004, de 12,2%. O uso da Internet para veiculação eleitoral, com restrições mínimas, marca um momento de readaptação da Comunicação Política nas eleições de 2010 e representa, para o eleitorado, um novo canal de informação com recursos interativos e de participação que horizontalizam o processo comunicacional. O usuário torna-se o que Bruns denomina produser (2007, P.3), à medida que assume função ativa no processo de recepção e passa a dominar os recursos produtivos, pode tornar-se também fonte de informações. Assim, tem-se no contexto das plataformas colaborativas da Web 2.01 a presença cada vez maior de usuários-produtores, que quebram barreiras entre emissão e recep1 Tipologia referente à segunda geração de serviços da Internet, caracterizada pela presença de plataformas de conteúdo majoritariamente colaborativo.

ção (produção/consumo) em modelos que permitem aos usuários também produzir informação e conhecimento - modelo todos-todos (LÉVY, 1999).

rando-se que “uma estrutura (...), dotada de fluxos multidirecionais de informação e de comunicação, é sintoma de uma estrutura política na qual se reconhece que a esfera civil tem algo a dizer e pode influenciar A Internet pode colaborar para o aumento diretamente a decisão política” (GOMES; do interesse dos cidadãos em participar ati- MAIA, 2008, p.310). vamente do processo eleitoral, pois permite a comunicação sem mediação entre repre- Não obstante o acesso à rede seja limitado sentantes e representados. A presença dos a menos da metade da população, é relecandidatos em ambientes colaborativos, vante avaliar como o uso de mecanismos como o Twitter, é reflexo desta realidade de socialização via web - como as redes so- ao participar de uma rede social, perso- ciais - podem colaborar para inserir o eleinalidades políticas se colocam no mesmo tor/usuário no discurso político. Parte-se patamar dos demais usuários do serviço. da hipótese de que, devido ao custo elevado de obtenção de informação política na Tal contexto em que se desenvolve a cam- Internet, dado que o acesso a conteúdos panha de 2010 traz à tona a discussão sobre depende do cidadão, as pessoas que utilizaa possível colaboração da web para o for- rão esse meio como quadro de referências talecimento da democracia e da cidadania. (ALDÉ, 2004) para a decisão eleitoral serão Na visão de Rousiley Maia, “a rede pode aquelas cuja aproximação com a política é proporcionar um meio pelo qual o público forte, que podem apresentar percepção poe os políticos podem comunicar-se, trocar sitiva, negativa ou tensa do processo. informações, consultar e debater de maneira direta, rápida e sem obstáculos buro- Conforme os estudos de Aldé (2004, p.71cráticos” (GOMES; MAIA, 2008, p.277), 92), grupos que apresentam atitude forte configurando uma “esfera pública virtual”. em relação à política tendem a crer que esA própria organização da rede é adequada tão em posição privilegiada diante do eleipara a participação dos cidadãos, conside- tor médio, pois possuem informações su-

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ficientes para justificar atitudes políticas e tigo - quando abordam temas correlatos estão inclinados a criticar o “povão”, que às eleições. não teria conhecimento para tomar atitudes políticas conscientes. Twitter como praça pública virtual Os indivíduos de atitude forte dividem-se O Twitter é uma ferramenta de microbloentre os que apresentam percepção positi- gs, que permite postagem e troca de inforva - acreditam nos governos e instituições mações limitadas a 140 caracteres e cresce e na política como mecanismo de mudan- vertiginosamente em todo o mundo. Nele, ça, mesmo quando criticam o sistema - e indivíduos podem compartilhar texto, imaaqueles que têm visão negativa - apesar do gens e vídeos, por meio de uma interface interesse, não se sentem representados e simplificada, e se conectar aos demais usuáacreditam que a corrupção na política se rios do serviço por meio de interações reaestende às eleições. Há, ainda, cidadãos de tivas (PRIMO, 2007). Dessa forma, é possípercepção tensa, que se sentem pressiona- vel inferir que, não obstante, o Twitter não dos “a uma participação política maior que seja, essencialmente, uma rede social, ele o espaço que vêem disponível para agir” e comporta várias redes ao interconectar seus que, por isso, não se sentem confortáveis usuários e permitir que interajam entre si. ao expressar descontentamento político. Neste quadro, encontram-se pessoas “sus- Redes sociais definem-se como um conjuncetíveis às variações percebidas no clima de to de dois elementos - atores e suas coneopinião em cuja construção a mídia con- xões -, que se constitui e se mantém ativo tribui significativamente” (ALDÉ, 2004, através das interações estabelecidas entre p.92-104). esses elementos. Tais movimentos interacionais dão origem aos laços sociais de O entendimento das premissas supracita- uma rede e podem ser reativos (unidireciodas é fundamental para que se possa iden- nais) ou mútuos (dialógicos). No Twitter, tificar como se comportam os usuários do observam-se os dois tipos, sendo o reativo Twitter - objeto de estudo do presente ar- o ato de “seguir” uma pessoa (receber as

atualizações desta na timeline2) e o mútuo, decorrente dos diálogos entre atores. (RECUERO, 2009) O emprego das hashtags (representadas por #) reflete uma característica mobilizadora da ferramenta, uma vez que, com o uso de palavras-chave precedidas pelo símbolo, é possível indexar mensagens. Tal recurso facilita a busca por tuítes que veiculam a mesma hashtag e aumenta a visibilidade do assunto, pois facilita a troca de informações de um tema. À medida em que os tuiteiros aderem a uma determinada hashtag e a replicam para seus seguidores, o alcance desta aumenta, bem como seu potencial de conquistar novos adeptos e intensificar a troca de mensagens sobre o mesmo assunto. É plausível supor que a ferramenta poderia ser espaço de debates e trocas de informações nas eleições devido à preferência dos internautas brasileiros por acessar sites de redes sociais, em detrimento de outros tipos de conteúdo na web e espaços conversacionais, como os fóruns de discussão. 2 Timeline é a página inicial do usuário do Twitter. Nela, aparecem todas as mensagens submetidas pelos indivíduos seguidos pelo perfil.


Mídias Sociais e Eleições 2010 Pesquisa do IBOPE Nielsen Online3 indica que, em junho de 2010, brasileiros passaram 86,4% do tempo total na Internet em redes sociais. É importante frisar que a hipótese aqui desenvolvida não pressupõe que os usuários do Twitter se conectam à ferramenta com o objetivo de falar sobre assuntos relacionados às eleições. O que o presente artigo visa a compreender é como esses indivíduos se relacionam com o tema, supondo que têm diferentes intenções ao participar da ferramenta. #Eleições2010 Para identificar eixos temáticos representados na mobilização dos eleitores pela hashtag #eleições2010, recorre-se à Análise de Conteúdo. Tal percurso permite a inferência de conhecimentos sobre emissor ou receptor da comunicação a partir da análise da mensagem e possibilita a compreensão dos objetivos discursivos pelas deduções lógicas possíveis.

3 <http://www.ibope.com.br/calandraWeb/servlet/CalandraRed irect?temp=6&proj=PortalIBOPE&pub=T&db=caldb&comp=p esquisa_leitura&nivel=null&docid=96E76E3E6C23B8278325777 E007497D6>

Sendo o enfoque deste artigo a atuação dos eleitores, a análise engloba somente tuítes postados por perfis pessoais. Por isso, as mensagens coletadas foram divididas por tipo de perfil emissor e de acordo com o conteúdo apresentado, com base no critério semântico de Bardin4 e nos marcos de referência de Krippendorff5, que orientam as inferências.

classificação da mobilização política dos usuários. Dessa forma, serão consideradas mensagens de “campanha” aquelas cujo objetivo é a promoção de um determinando candidato - seja por meio da discussão temática, da construção de imagem ou do ataque aos adversários políticos (ALBUQUERQUE, 1999, p.70-78), e em “metacampanha” serão enquadrados os tuítes que divulgam relatos de campanha, comenForam identificadas as categorias infor- tários sobre pesquisas de opinião e apelo mação, opinião/fala e campanha, sendo a ao engajamento - recursos que enfatizam o última subdividida em “campanha” e “me- sucesso da campanha (idem, 83 - 92). tacampanha”, conforme tipologia proposta por Albuquerque (1999). Embora tais cate- O corpus analítico é composto por 350 tuígorias sejam referentes aos segmentos dis- tes, coletados6 entre 27 de setembro e 3 de cursivos observados no Horário Gratuito outubro de 2010, data do primeiro turno de Propaganda Eleitoral (HGPE), acredita- das eleições, na proporção de 50/dia. Fose que tal tipologia possa colaborar para a 4 (1988 apud FONSECA JÚNIOR, 2009, p. 298). 5 (1990, apud FONSECA JÚNIOR, 2009).

6 As mensagens foram coletadas entre 22h e 0h. Acredita-se que, dessa forma, seja possível comparar a atividade dos usuários conectados ao Twitter no mesmo horário.

Tabela 1: Categorização - perfis pessoais.

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evidente em 11 dos 20 tuítes, e apenas uma manifestação apresentou discurso positivo, de crença no potencial de mudança da eleição. Tal constatação indica a predominância de uma relação forte e negativa (ALDÉ, 2004) dos internautas.

ram identificadas 288 mensagens de perfis no segundo, @stellasoaress8 compartilha pessoais e 62 de perfis coletivos. sua indecisão com os demais usuários.

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Como pode ser observado na tabela, a maior incidência de posts aconteceu na categoria opinião/fala e, apenas em 3 de outubro, este conteúdo não foi predominante. No primeiro dia de observação, 20 tuítes revelaram opinião dos eleitores acerca do processo eleitoral e falas pessoais, como questionamentos e observações sobre a eleição. Dois casos chamam atenção: a usuária @laeliagiacon7 pede ajuda para votar e,

Também foram identificadas mensagens que discutiam o “aborto”, tema bastante debatido pelos candidatos, e comentários negativos ou pejorativos sobre os presidenciáveis e a veracidade das promessas, como o escrito por @MoacirRNeto: “nossa, depois das #eleições2010 o país vai ficar maravilhoso com tanta coisa boa que nossos políticos vão fazer #ahnãosério?”9. A impressão negativa do processo eleitoral fica

7 http://twitter.com/laeliagiacon/statuses/25730296915 (acesso: 22/11/2010)

8 http://twitter.com/stellasoaress/statuses/25728722174 (acesso: 22/11/2010) 9 http://twitter.com/stellasoaress/statuses/25728722174 (acesso: 22/11/2010)

O engajamento dos usuários na campanha, entretanto, foi alto neste dia. Juntas, as categorias “campanha” e “metacampanha” acumulam 16 tuítes. É relevante observar que, nas seis mensagens de conteúdo voltado para a campanha direta, cinco eram de ataque a candidatos. Já os tuítes enquadrados em “metacampanha” traziam, predominantemente, informações divulgadas pelos usuários sobre agenda de candidatos e testemunhos a favor de candidaturas a partir de feitos políticos no passado. Nas mensagens do dia 28, também predominam impressões pessoais. Em 10 dos 22 tuítes desta categoria, os usuários acrescentam comentários ao dar retweet em duas mensagens postadas pelo jornalista @marcelotas: “quem quer segundo turno nas #eleições2010” e outra, perguntando as vantagens e desvantagens de uma segunda etapa do pleito. Na terça, os usuários se


Mídias Sociais e Eleições 2010 mostraram menos negativos em relação à política: em alguns casos, fica clara a tentativa de orientar os demais eleitores a tomar determinadas atitudes - a exemplo de @nathyscarvalho10 e @amandabentes11. No total, quatro tuítes apresentaram conteúdos de orientação ou positivos, dois, comentários irônicos, outros dois, visão negativa, e um revelava a tensão do usuário diante da indecisão. Este resultado demonstra maior presença de pessoas de relação positiva ou tensa, em relação ao dia anterior. Já nos tuítes classificados como “campanha”, dois foram retweets12 de uma notícia veiculada pelo perfil @NewsWeek, que perguntava “Is Brazil’s Next President a Dangerous Amateur? - http://bit. ly/a7uAnk” - tentativas de desconstrução do adversário. A terceira mensagem, entretanto, é de um candidato que evidencia sua relação com uma presidenciável que recebe apoio de celebridades. Em “metacampanha”, foram indexados quatro tuítes com 10 http://twitter.com/nathyscarvalho/statuses/25829169868 (acesso: 22/11/2010) 11 http://twitter.com/amandabentes/statuses/25828467057 (acesso: 22/11/2010) 12 http://twitter.com/cacildanc/statuses/25828240518 (acesso: 22/11/2010)

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indicação de preferência (três em prol do Nesta data, 12 manifestações foram negasegundo turno), além de dois referentes a tivas e cinco apresentaram deboches e comentários humorados - que também refleeventos e propagandas. tem opiniões pessimistas. Num total de 17 O terceiro dia de amostragem revela im- dos 25 tuítes com valência negativa ou tenpressões diversas acerca das eleições, que sa. Nas mensagens de “campanha”, quatro vão do descontentamento com a falta de dos cinco tuítes fazem indicação de voto e “algum candidato que preste”13 ao apelo por em apenas dois casos não há ataque direto responsabilidade nas urnas e a comentários a adversários. Em “metacampanha”, foram observadas duas mensagens de assessoria e que revelam descrença no processo. duas de eleitores, sendo uma retweet de can13 http://twitter.com/kamillaramiro/statuses/25928545269 (acesso: 22/11/2010)


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didato e outra, comentário sobre feitos po- Em primeiro de outubro, a amostragem líticos sem apelo ao voto. apresenta uma significativa queda no total de pessoas - o menor número da semana No dia 30/9, data do debate da Rede Glo- - e aumento da postagem por perfis cobo, o evento foi comentado em oito tuítes orporativos. O impacto mais significativo de fala pessoal (tema também aparece em foi na categoria “opinião”, que apresentou informação), com tom jocoso. Em outros 16 tuítes enquanto as demais se mantivetrês casos, aparecem comentários sobre a ram estáveis. Destas mensagens, sete apredecisão do STF, que desobrigava o eleitor a sentavam comentários irônicos ou negatilevar o título; e apenas um tuíte apresenta- vos sobre o processo, três, indicações de va visão positiva14 do processo de escolha. conduta nas urnas, duas, indecisão, outras Nos demais comentários, predominaram duas informavam a preparação para o pleidiscursos apáticos, irônicos e pessimistas. to e mais duas eram pedidos de ajuda de A preferência pela “piada eleitoral”15 revela jornalista para matéria. Novamente, prevalência negativa na impressão que os cidadãos têm do pleito. Na categoria “campanha” foram indexadas duas mensagens indicativas de voto, sendo que um apelo se justificativa pelas chances de vitória - posicionamento mais incisivo diante da proximidade do pleito. Já em “metacampanha”, as manifestações destacavam momentos da carreira política de um candidato ao Senado.

14 http://twitter.com/#!/GrahCarvalho/status/26033590518 15 http://twitter.com/#!/fkyrillos/status/26033500121

dominam visões negativas. Já na categoria “campanha”, é possível observar engajamento: quatro, dos cinco tuítes, partem de cidadãos, ao passo que o perfil de um político é responsável pela mensagem restante, e mais três que se enquadram em “metacampanha”. Nas “informações”, postagem de links que direcionam para sites onde se pode conhecer candidatos, saber onde votar ou quem está concorrendo demonstra preocupação acerca da necessidade de se informar para decidir.


Mídias Sociais e Eleições 2010 Na véspera do primeiro turno, a campanha ganha força, com sete manifestações explícitas - desta vez, a maioria dos tuítes apresenta indicação de voto com reforço dos números de candidatos, e não ataques, como visto anteriormente. Em “metacampanha”, um eleitor divulga link para pronunciamento de candidato, enquanto o outro apresenta comentários sobre pesquisa de opinião.

sultados do primeiro turno. Nas falas pessoais, foram identificados nove tuítes com juízo de valor sobre resultados da eleição federal e estadual, além de críticas aos erros das pesquisas de opinião18, e sete falando do segundo turno19. Os quatro comentários restantes abordavam questões como o dia de trabalho como mesário e deboches sobre candidatos. Aqui, tem-se usuários divididos entre os que comemoram o segundo turno pela importância política e os que Nas falas pessoais, oito eleitores demons- criticam o processo e reclamam de ter que traram otimismo e preparo16 para o dia de votar novamente. eleições, três comentaram que seriam mesários17, dois reclamaram de indecisão, e ou- Considerações Finais tros sete falaram de temas diversos. Desta A participação política observada pelo movez, percebe-se atitude mais positiva por nitoramento da hashtag #eleições2010 reveparte dos tuiteiros. No que tange às infor- la interesse dos internautas em falar sobre mações compartilhadas no Twitter, obser- política no Twitter, que se apresenta, majova-se a preferência pela divulgação de pes- ritariamente, nos comentários pessoais. Tal quisas e links para notícias sobre corrupção, envolvimento comprova a hipótese de que candidatos e voto consciente. indivíduos com aproximação forte com a política utilizariam a rede para compartilhar No dia das eleições, 3 de outubro, mais da seus sentimentos. No que tange à valência metade das postagens tiveram conteúdo in- desta aproximação, o corpus revela predoformativo - todos com divulgação de links minância de cidadãos negativos, que não se para acompanhamento da apuração ou re- sentem representados e nem acreditam que

as eleições promovam mudança (ALDÉ, 2004), e que usam humor para expressar esse pessimismo no Twitter.

16 http://twitter.com/#!/AdrianoJocafe/status/26213296266 17 http://twitter.com/#!/RicXand/status/26213423851

20 http://www.transparency.org/policy_research/surveys_ indices/cpi/2010/results

18 http://twitter.com/#!/cacildanc/status/26308950503 19 http://twitter.com/#!/gitogeorge/status/26315610146

Esse resultado reflete a descrença na esfera política e a percepção de que o sistema brasileiro é corrupto. Uma pesquisa internacional20 comprova tal assertiva: em 2010, o Brasil ficou em 69o no ranking, com nota 3,7 numa escala de 0 a 10 - quanto menor a nota, maior a percepção de corrupção no país. Por outro lado, o baixo envolvimento dos tuiteiros na campanha (56 tuítes, em duas sub-categorias) revela que, embora a Internet tenha sido incorporada no rol de ferramentas para veiculação eleitoral, poucas pessoas demonstraram disposição para engajar-se na campanha e defender candidatos diante de suas redes sociais no Twitter. O ataque e desconstrução do adversário, predominante entre tuítes de campanha, reflete as estratégias presentes nos outros meios - como a TV -, incorporadas pelos entusiastas da candidatura. Esse baixo engajamento pode indicar falha nas estratégias virtuais de campanha, mas também se

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relaciona com a predominância da percep- colaborar para o desenvolvimento de estução negativa das eleições. dos sobre o comportamento político dos usuários de redes sociais e também acerca Já o empenho dos tuiteiros em divulgar in- do impacto das estratégias de campanha no formações - segunda maior adesão do cor- engajamento dos eleitores na web. pus - corrobora a afirmação de Aldé (2004) de que os grupos de relação política forte Referências Bibliográficas acreditam ser melhor informados que os demais e de que a informação é considera- ALBUQUERQUE, A. Aqui você vê a verdade na da necessária para a tomada de uma decisão tevê: a propaganda política na televisão. Niterói: consciente. Essas pessoas demonstraram Universidade Federal Fluminense, Mestrado em intenção de colaborar na difusão de infor- Comunicação, Imagem e Informação, 1999. mações sobre as eleições, repassando-as para suas redes de seguidores. ALDÉ, Alessandra. A construção da política:

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A pesquisa aqui desenvolvida comprova o potencial da Internet para incrementar a participação política, já que os internautas mais interessados no tema se relacionam, nas redes sociais, com pessoas de menor aproximação com a política e podem transmitir informações - criando um novo quadro de referências para a decisão eleitoral. A credibilidade dessas informações, por outro lado, depende da relação entre emissores e receptores - quando os laços sociais são mais fortes, interagentes tendem a acreditar mais um nos outros. Acredita-se que os resultados aqui discriminados possam

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Midias sociais e a aproximação do eleitor com o candidato Por Claudiana Santos Silva

Claudiana Silva é jornalista formada pela Unijorge e atua com assessoria política. Curiosa pela Web procura entender como os perfis políticos podem melhor aproveitar os ambientes virtuais, além de manter interesse por temas relacionados a comunicação, web, política e saúde. Palavras-chave: política, militância virtual, interatividade, redes sociais, estratégia digital, comunicação digital, mídias sociais. claudisansil@gmail.com twitter.com/negra_cau

A

pesar da utilização das mídias sociais na política não ser algo novo, as eleições de 2010 foram consideradas, antes mesmo de iniciadas, um verdadeiro marco para a política brasileira. Isso porque havia uma grande expectativa em torno do aumento e do fortalecimento das mídias e redes sociais em todo o país. Muito antes de iniciado o período das campanhas eleitorais, os meios de comunicações já cogitavam o aumento da participação dos candidatos nestes ambientes virtuais, principalmente entre os presidenciáveis. Acreditava-se que as eleições brasileiras poderiam ser semelhantes à qual Barack Obama foi eleito presidente dos Estados Unidos, em 2008. Acredito que a expectativa da imprensa era a de presenciar a transferência da acirrada disputa que historicamente acontecia na tevê, no rádio e nas ruas para a web, ou até mesmo, que tal disputa fosse abastecida com informações fornecidas pelas campanhas veiculadas na internet e amplificadas dentro e fora dela pela rede de apoiadores (os seguidores de cada candidato) obtida nas redes sociais como Orkut, Facebook e no microblog Twitter.


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Com a utilização das mídias sociais os eleitores tiveram a possibilidade de dialogar diretamente com os candidatos. O interessante é que entre o “mar” de candidatos que concorrem a uma vaga para um cargo público, haviam aqueles que eram conhecidos dos cidadãos e que já possuíam uma história. Dessa forma, pretendo discutir a possibilidade que as redes sociais dão aos cidadãos “comuns” de poder interagir diretamente com essas figuras que compõem o cenário político de um país e que são consideradas ícones. Assim, tais redes sociais, possibilitam um estreitamento entre o eleitor e candidato. É preciso deixar claro que os pontos que levantarei aqui são baseados em minha experiência em assessoria de comunicação política para um grupo político de âmbito local da Assembleia Legislativa da Bahia e observações durante a última campanha eleitoral brasileira, na qual atuei em campanhas digitais. É necessário salientar ainda que minhas observações serão restritas aos candidatos a deputado estadual, estes acompanhei através do Twitter, Facebook,

Orkut e Flickr e aos presidenciáveis acom- ainda é um mundo novo, alguns apesar de panhados através do Twitter e Facebook. aceitar participar das redes sociais, interagem raramente ou simplesmente não inInteragir e Participar teragem. Há uma máxima que diz que político muito fala e pouco ouve, mas há políticos que Algo corriqueiro entre os políticos e entre além de “falar”, “ouvem” e trocam infor- as figuras populares e famosas é a existênmações com os internautas que a ele se di- cia de um assessor como interlocutor, este rigem. Outros apenas participam das redes interage nas redes sociais como se fosse o sociais criando perfis, quando o fazem. In- próprio político, sendo que o comum é o serir uma figura política no mundo virtual e assessor deixar claro que aquele conteúdo principalmente nas redes sociais é algo di- não está vindo diretamente do candidato. fícil, e o início desse processo é a mudança Isso é muito comum no Twitter, mas quande mentalidade. do o objetivo é popularizar a imagem do candidato tal estratégia não é bem vista, já Atuei durante um tempo com assessoria que, os eleitores mais uma vez não estarão se política e observei que alguns legisladores dirigindo diretamente ao candidato. Como baianos ainda concebem a disseminação atuei diretamente com as mídias sociais, dude informação como há algumas décadas rante o período eleitoral de 2010, por vezes atrás, quando o papel era a principal ferra- agi dessa forma, alguns candidatos queriam menta. Há uma resistência destes em ade- estar inseridos no mundo virtual, mas não rir ao mundo virtual, mas percebo também tinham afinidade com o meio e tão pouco que há uma mudança, pequena, mas signi- se empenhavam para se familiarizar com ficativa. Acredito que somente pelo fato as redes, dessa forma, tínhamos que criar da existência desse tipo de campanha já conteúdo e interagir com seus seguidores. comprova que a mudança está acontecen- Já outros perceberam que a possibilidade do por aqui porém, como para eles este de ter o eleitor tão perto poderia ser um be-


Mídias Sociais e Eleições 2010 nefício e interagiam com prazer, inclusive utilizando dos vários recursos das diversas redes como o Twitcam e o Twitpic. Um exemplo bem conhecido foi a atuação do candidato a presidência, Plínio de Arruda, que apesar de não ter sido convidado a participar do primeiro Debate Online entre os presidenciáveis, promovido pela Folha de São Paulo e UOL, acompanhou ao evento em sua casa, mas não deixou de registrar sua contribuição. Utilizando a Twitcam (ferramenta para transmissão de vídeos ao vivo pelo Twitter) Arruda comentava as respostas dos candidatos e interagia com os internautas que o acompanhavam. O interessante é que até o próprio candidato ficou surpreso com a repercussão obtida com sua iniciativa e com os seus comentários. Não só ele, mas ninguém esperava que essa ação pudesse alcançar tamanha notoriedade. Ele conseguiu chegar à primeira posição do trending topics brasileiro, e a oitava do mundial, por volta das 12h30 em 18 de agosto de 2010 (http://bit.ly/bvawtP).

redes sociais, fazendo crescer signitivamen- ro lugar no trending topic mundial. Sendo te o número de seguidores de seu perfil. que as referências à “#debatefolhauol” e “Dilma” ocuparam as posição de segundo Mas esta não foi a primeira vez em que Plí- e terceiro lugar, respectivamente, no mesnio conseguiu se destacar nas redes sociais mo horário (Idem). como resultado da ação viral no Twitter. Na primeira, o candidato conseguiu angariar Ausência de estratégia digital na milhares de seguidores no seu perfil. Na- política Essa ação deu tão certo que Plínio conse- quele mesmo dia a candidata Marina Silva Diferentemente das expectativas criadas guiu ganhar popularidade no Twitter e nas (PV) ficou, por volta das 12h30, em primei- em torno das eleições 2010, a maioria dos

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candidatos brasileiros não se dedicaram a utilizar as redes de forma que engajasse ainda mais sua base eleitoral como fez Obama. Este por sua vez, utilizou brilhantemente as ferramentas disponíveis, ele conseguiu adaptar as suas mensagens para as diferentes mídias. Percebo que o uso errôneo das mídias foi freqüente entre os candidatos que concorriam aos cargos da minoritária (Deputados Estaduais e Vereadores).

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Durante a campanha online percebi que com certa frequência que alguns candidatos aos cargos citados acima realizavam ações que se assemelham às já realizadas culturalmente em campanhas políticas na vida real, como a distribuição de santinhos nas ruas. Na web a veiculação desse tipo de material deve ser realizada com cuidado, visto que para cada canal deve-se agir de uma forma. Por exemplo, o canal que percebi uma maior frequência na distribuição de “santinhos virtuais” foi no Orkut. Como as redes sociais são distintas aceitam os conteúdos de diferentes formas. Apesar do Orkut ser mais utilizado no Brasil ele tem um foco social que torna mais difícil o uso para propaganda eleitoral sem gerar uma má impressão de spam, que aborrece

os eleitores por conta da repetição de uma Já o E-mail Marketing é aceito com mais mesma informação e, consequentemente, simpatia pelos internautas\eleitores, isso desvaloriza uma campanha. por que tal recurso dá ao receptor a opção de simplesmente excluir seu endereço da Quando este mesmo material é veicula- lista de contatos do remetente. Mas sua boa do em outras redes, ele pode deixar de ser aceitação se dá principalmente pela possimal visto, como é o caso do Twitter que bilidade de falar com quem quer ouvir, seaos poucos vem mudando o foco de apro- guindo as seguintes características dos 4P´S priação, dessa forma, ele deixa de focar na do e-mail: Proposta, Pertinência, Permissão informação passando a ser tratado como e Permanência. Dessa forma, o candidato uma ferramenta de conversação e de upda- envia apenas e-mail para as pessoas que o tes (http://bit.ly/913vcV). Assim o Twitter conhecem e com sua permissão. se configura como uma importante ferramenta para o intercâmbio de informação Participação do internauta: entre candidato e eleitor. militantes online A internet surgiu como um mundo novo O que enriquece uma campanha eleitoral é para os políticos, novo não só porque é o quando tal material é distribuído nas redes canal mais recente para fazer campanhas dos candidatos e ficam disponíveis para que políticas, ele é novo principalmente por seus amigos, os supostos militantes virtuais, que houve a necessidade de traçar um novo por sua vez, as disseminem em suas respec- olhar para os eleitores. Na Web o candidato tivas redes. Porém como já dito antes, deve não deve apenas falar, como acontece na haver um cuidado com os conteúdos dis- Televisão durante o horário eleitoral polítribuídos em cada rede. O que o candidato tico, nesse novo universo virtual a converbusca é se popularizar na Web e não criar sação possui uma importância fundamental uma péssima imagem, mas quando os “san- e o mais relevante é o fornecimento de um tinhos” são percebidos como spams podem canal de conversação com as redes sociais e ter efeito contrário, afastando o eleitor do não apenas de informação. As ferramentas candidato em vez de aproximá-los. de comunicação mediada pelo computador


Mídias Sociais e Eleições 2010 têm um potencial democrático fundamental que pode ser utilizado pelos candidatos. O “fazer política” como acontecia durante o horário político, quando apenas o candidato fala e não escuta, é desperdiçar grande parte do potencial democrático dessas ferramentas (http://bit.ly/aE5m31). Já os eleitores, principalmente os militantes, ficaram com os brilhos nos olhos com a possibilidade de dialogar diretamente e em tempo real com o candidato. Presenciei situações em que eleitores, mesmo os moradores do interior do estado, realizaram verdadeiras mobilizações nas redes sociais em que estavam inseridos em prol de um candidato de sua preferência. Vejo essa mobilização como algo positivo para o candidato, já que, este além de realizar todo um trabalho em suas bases eleitorais e em seus comitês com o uso de verbas com santinhos, comícios, carreatas, etc., passaram a contar com uma intensa participação de seus eleitores. Acredito que caso esses eleitores não tivessem acesso a internet seriam mobilizadores da mesma forma, porém no âmbito de seus lares e entre seus amigos. O acesso a web não os impediu de assim fazer, mas permitiu que seu “grito” fosse

mais alto, com uma maior abrangência, já que um alerta do Orkut alcançará um maior número de pessoas, durante um maior período do que a distribuição de um panfleto. Um dos princípios que rege as campanhas online diz que um candidato não deve falar mal de outros candidatos, nem encher a timeline dos seguidores com brigas e ataques aos opositores, mas por vezes presenciei fortes campanhas idealizadas por seguidores que tinham como propósito a difamação dos opositores ao seu candidato. Na web assim como na televisão as estratégias de marketing procuram sempre fazer com que os candidatos fiquem em evidência, então seguindo a lógica de que quanto mais o seu nome é citado, mais popular ele se tornará na Web, certo? Não, errado! Um candidato deve se distanciar de tais ações, que mesmo partindo de um seguidor pode prejudicar sua imagem. Um exemplo prático de contribuição de um eleitor e que além de ganhar grande notoriedade, contribuiu para a campanha online da candidata a presidência, Dilma Rousseff, foi a iniciativa de um estudante de publicidade e propaganda, Paulo Reis, que fez sucesso com versão de Lady Gaga elogiando

candidata do PT. O vídeo do “Dilma Boy”, como ficou conhecido o estudante, tornouse uma ótima ação para a campanha digital de Dilma. Até o dia 16 de agosto de 2010, o vídeo havia sido visualizado mais de 130 mil vezes no YouTube. Utilizando o Twitter, Dilma respondeu a iniciativa mandando um “abraço” ao internauta. Aproveitando a notoriedade dessa ação, a equipe da candidata aproveitou para gerar novas estratégias, assim o Dilma Boy foi convidado para filiar-se ao partido, a filiação aconteceu quando estudante esteve na capital baiana, Salvador, a convite do governador Jaques Wagner, para participar de atividade de campanha, que reuniu mais de 300 twitteiros e blogstas (http://blogs.estadao.com. br/radar-politico/tag/dilmaboy/). Percebo que a atuação dos eleitores nas campanhas políticas possui uma importância muito grande, já que a facilidade com que as informações são disseminadas é outro fator que colabora para campanha. Essa importância se deu graças ao novo perfil do eleitor\internauta, este hoje não só absorve informação, ele também transmite, influencia, interage, opina e principalmente produz conteúdo. Durante a campanha

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online monitorei as redes sociais de alguns candidatos à deputado estadual, e pude observar que alguns de seus amigos realizavam verdadeiros levantes em prol do candidato de sua preferência. Alguns transformavam seus perfis do Orkut em verdadeiros murais com informações de seu candidato, criavam alertas, twittavam e retwittavam frases de efeitos, sempre fazendo uso de diversos recursos disponíveis nas redes. O melhor disso tudo é que entre os seguidores foram formados verdadeiros grupos de discussões, mas poucas vezes presenciei a participação de um candidato.

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Considerações Finais No âmbito local, percebi que os candidatos pouco utilizaram os ambientes virtuais para discutir seu ponto de vista, houve a criação e veiculação de conteúdo, mas não houve a realização de discussões entre eles e os eleitores, agora agentes e atores virtuais. Os candidatos se restringiram, não sei se por falta de conhecimento dos meios, em disseminar o que eles faziam nas ruas, com muita autopromoção e disseminação de nomes e números de partidos, fotografias de eventos e lançamentos de comitês, na tentativa de demonstrar e comprovar o apoio recebido.

Reconheço que mostrar seu favoritismo é importante, mas acredito que o grande diferencial seria a realização de algo inovador, como usar o estreitamento e aproximação do eleitor para discutir com ele os problemas de interesse de sua comunidade ou do grupo social a qual pertence. Apesar de existir a crença que os brasileiros, principalmente os jovens, não estão interessados em política, foi intensa a participação destes durante as eleições brasileiras de 2010. Houve uma significativa mobilização dos internautas nas redes sociais, seja através dos comentários em fotos de candidato do Flickr ou no Twitpic, seja através do curtir, no Facebook, ou quando o seguidor customiza seu avatar com os números do candidato, ou ainda quando os seguidores customizavam seu perfis. Ao final das eleições, percebo que a internet contribuiu de forma significativa para esse processo, apesar das campanhas online americana de 2008 ter influenciado as brasileiras, aqui o encaminhamento do processo eleitoral se deu de forma diferente. Apesar disso a internet ganhou força durante as eleições, inclusive este fato foi reconhe-

cido pelos coordenadores das campanhas nas redes sociais de Dilma Rousseff (PT) e Marina Silva (PV), eles acreditam que o segundo turno só aconteceu graça a web. Para eles, Marina Silva conseguiu mobilizar muitos eleitores na web, conquistando assim 20 milhões de votos.


Mídias Sociais e Eleições 2010 Referências Bibliográficas http://oglobo.globo.com/pais/eleicoes2010/ mat/2010/08/18/plinio-de-arruda-comemora-sucesso-no-twitter-apos-debate-folha-uolestou-na-parada-917421254.asp. Acessado em 28\11\2010. http://www.rafaeldesigner.com.br/blog/midiassociais/midia-social-e-campanha-eleitoral-2010no-brasil-160710. Acessado em 28\11\2010. http://www.slideshare.net/mentesdigitais/marketing-poltico-digital-por-gabrieleite-e-usurios4992154 http://www.pontomidia.com.br/raquel/arquivos/midia_social_e_campanha_eleitoral.html h t t p : / / w w w. m i d i a i n d e p e n d e n t e . o r g / p t / blue/2010/11/480722.shtml http://www.portaldomarketing.com.br/Artigos/4_Ps_do_ Marketing.htm http://www.mundodomarketing.com.br/5,2685,os-4-psdo-e-mail-marketing.htm

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A campanha virtual pode ser igual para todos os candidatos? Por Fernanda Fabian

Fernanda Fabian é estudante de Relações Públicas, trabalha com planejamento, gerenciamento e execução de projetos em mídias sociais. É redatora, pesquisadora e curiosa sobre as novas formas de comunicação. Escreve para os blogs Mídia Boom, O Cappuccino e Webwriting. Palavras-chave: Planejamento, mídias sociais, relacionamento, diálogo, eleitores fefe.fabian@gmail.com www.twitter.com/fernandaf fernanda.fabian meadiciona.com.br/ffabian

U

ma incógnita que no primeiro momento pode parecer obvia, mas que requer muito estudo, preparação e conhecimento das ferramentas a serem utilizadas.

É clássico, em época de eleições as ruas estão cheias de papéis, placas, adesivos e todas as possibilidades de tentar mostrar um pouco mais a cara do candidato. Se isso de fato funciona não é muito mensurável, mas, que desperta nas pessoas o desejo de mostrarem seu apoio a algum candidato isso sim acontece. Basta ver a exposição pública que saí das ruas e toma as casas e as conversas de rodas. De forma geral a regra de divulgação offline é a mesma para todas: gráficas faturam milhões, muitas pessoas garantem trabalhos temporários para acenarem as bandeiras e panfletarem, e alguns até arriscam no telemarketing. Mas no ambiente virtual isso faz efeito? Todos os candidatos podem adotar as mesmas posturas e copiar ações alheias? Os discursos podem ser os mesmos em todos os locais? O que presenciamos nesta última eleição foi uma tentativa de reproduzir o que ocorreu


Mídias Sociais e Eleições 2010 em 2008 nos Estados Unidos, com a vitória de Barack Obama. A estrondosa participação e mobilização dos eleitores se tornaram o sonho de qualquer candidato. Mas antes de tudo é preciso entender porque dialogamos e estudamos tanto este jeito digital de se comunicar. A regra para impactar nesta nova era é: não há regras. Aranha (apud Fernandes, 2009) indica que “a rede social 2.0 é um processo de comunicação que evolui com a tecnologia disponível no momento, que se aprende caso a caso. Não é um meio ou fim em si, reaplicável a todas as formas de comunicação” (p. 27). As pessoas querem muito mais, estão dispostas a aprender, a ouvir e, principalmente, a expressar suas opiniões seja com o mecanismo que for. Elas estão abertas a criar um novo jeito para se comunicarem. Quando falamos em comunicação nos referimos a maneira de dialogar entre dois ou mais envolvidos. E as mídias sociais surgem exatamente para ampliar este leque de possibilidades de conversação. Não somos mais apenas o emissor e receptor. Somos uma cadeia em constante mudança pronta

para explorar e reportar para outras pesso- mento de pessoas são visões, ideias, pensaas o que sabemos e ouvimos. mentos e posturas diferentes, mas com algo em comum: a vontade de compartilhar. Compostas por grupos de pessoas que possuem interesses em comum, como citado Mas o que isso tem a ver com as eleições? por Comm e Burge (2009), as mídias sociais Elementar, eleitores são os mesmos consão abrangentes e sua prática diária mostra sumidores que tanto buscamos analisar e o quanto ainda precisamos evoluir e nos descobrir como se aproximar. As mesmas preparar para encarar um processo de mu- pessoas que tantos especialistas e autores danças bruscas e repentinas. No momento buscam identificar e caracterizar são os que em que você está lendo este artigo, milhões decidem o futuro do país nas urnas. de pessoas estão falando, lendo, postando, gravando, escrevendo coisas que poderão Carolina Terra e Laís Bueno citaram ser a nova tendência daqui a dez minutos. (2009): “Mídias sociais, redes sociais onE tudo o que você sabe sobre comporta- line, conteúdo gerado pelo consumidor, mento nas mídias sociais pode sofrer uma mídia gerada pelo consumidor ou ainda migração incrível. social media são termos sinônimos que significam que o consumidor está no poder, Verdade ou não, é preciso estar sempre na Internet, com capacidade de viralizar atento. Grandes vídeos do YouTube se seus conteúdos. A Internet não é mais das consagraram como os mais vistos da sema- corporações, é de quem quer que seja. E na e do mês mesmo o autor tendo apenas pode estar a serviço da comunicação e do 30 seguidores no Twitter. Muitos erros de marketing”. Este envolvimento de muitas empresas causados no Twitter, os chama- pessoas demonstra o quanto uma palavra dos #fails, se expandiram nacionalmente escrita de forma inapropriada pode gerar mesmo a organização tendo 100 followers. verdadeiro caos. Nesta geração o espaço é Muitas empresas multinacionais têm ações de quem lançar o tweet perfeito primeiro. digitais geniais que não alcançam nem a pri- Esta nova postura fez com que as pessomeira meta. Audiência é tudo? Comporta- as exigissem muito dos candidatos a partir

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do momento que foi permitido a campanha virtual. E a partir daí foi uma festa de tentativas: selo de apoio no avatar, Twitcan, hashtags, blog... tudo para chamar a atenção. Na maior parte dos casos as iniciativas eram providas muito mais dos presidenciáveis (que contavam com uma equipe especializada) do que dos demais. Mas os deputados, senadores e governadores também faziam suas apostas, nem sempre de forma certa, e nem sempre alcançando o resultado esperado. Isso porque, muitas vezes, tentavam utilizar a mesma linguagem e técnicas de outros candidatos. No entanto, se um deputado seguia a estratégia de candidatos a presidente certamente não teve o resultado almejado. A causa? A comunicação deveria ser diferente, as conversas são outras assim como as propostas dos mesmos. Nesse caso, os deputados trabalhavam com regiões especificas e não com o país inteiro. Logo, ele deveria respeitar a cultura local e buscar se aproximar da melhor forma possível nas mídias sociais. Um exemplo: se você usar expressões como “Bah” e “Tchê” está se direcionando ao Rio Grande do Sul, vai usar no Nordeste? Não, apesar de este exemplo parecer óbvio é preciso ter muita

atenção para que detalhes assim não aconteçam.

você precisa saber como falar com elas e o que falar.

Utilizo as palavras de André Telles (2010) quando reforça que interagir e ser transparente são primordiais para se destacar. Para isso uma estratégia bem planejada é o caminho ideal. Ainda segundo o mesmo autor “o primeiro passo para o desenvolvimento de uma campanha de marketing político digital é planejar todas as ações a serem realizadas pelo candidato. O planejamento vai desde a análise swot, a qual tem por objetivo identificar forças, fraquezas, oportunidades e ameaças, a estudo dos projetos, seu público-alvo, seus principais concorrentes e seus objetivos nas redes”.

Quando me refiro que a forma de comunicação é diferente de candidato para candidato começa pelo fato de que eles não vão fazer as mesmas coisas, suas propostas são diferentes e os locais de atuação são diferentes. Em consequência a isso, encontram-se eleitores com perfis diferentes que querem a atenção, que querem saber o que aquele candidato tem para oferecer para sua região e quais as necessidades dele podem ser supridas com a atuação daquele candidato.

Essas etapas refletem exatamente os pontos que devem ser analisados antes do candidato estrear neste ambiente. As conversas não devem ser as mesmas em todas as mídias sociais, e tão pouco o discursos dos palanques aplicados nestes canais. A forma de interação no Facebook é diferente do Orkut, que é diferente do Twitter. As pessoas, no Brasil, estão concentradas principalmente nestas três, mas nem sempre são as mesmas, e para impactá-las

Para expor de forma mais clara o real valor do planejamento pensemos nos exemplos: Maria Clara tem 34 anos, 3 filhos, deixou seu emprego para cuidar das crianças, é ela quem faz as compras da casa e vive para educá-los, seu marido é o responsável por trazer dinheiro para o lar, vivem de salário mínimo e projetos do governo. Luiza tem 24 anos, não tem filhos, mora com os pais e contribui nas atividades domésticas, é formada, trabalha desde muito cedo e hoje possui um cargo importante. O que estes dois perfis tão diferentes têm em comum? As duas estão no Orkut! A primeira utili-


Mídias Sociais e Eleições 2010 za para se distrair com o “Colheita feliz”, conversar com as amigas e frequentemente olha perfis de pessoas que não são suas amigas para saber o que estão fazendo, onde foram... A segunda apenas mantém para ter contato com amigos da infância e escola, já cobraram ela do porque não atualiza seu álbum, já que sua última foto foi do ano novo passado. Você acha que a forma de falar com a Maria Clara vai ser a mesma da Luiza, apesar de estarem na mesma rede social? Elas estão em sintonia? Tem os mesmos assuntos para dialogar? Como fazer para se aproximar delas? Essas são algumas perguntas-chave para avaliar o perfil de público, que, em minha opinião, é um dos quesitos mais importantes, se não o mais importante, na hora de planejar a comunicação. Continuemos com os exemplos totalmente hipotéticos e aleatórios, a Luiza já deu sinais de que não acessa mais tanto assim o Orkut, inclusive em seu perfil está indicando o Twitter. Logo, qual a melhor forma de falar com ela?

A Maria Clara acessa todos os dias e inclusive xinga a vizinha que mora ao lado dela por não responder seu recado de bom dia. Gosta de enviar mensagens automáticas e se tiver musiquinhas então... depoimento para os filhos é clássico, toda a semana tem um novo. Um perfil que pode ser considerado mais popular? Talvez, se o candidato for um presidente pode ser mais simples encontrar pessoas assim para dialogar. Mas sendo de locais mais pontuais é necessário verificar se este estereótipo é existente. Ao falar em um amplo contexto é fácil indicar como pesquisar e identificar grupos assim e classificá-los, e até mesmo alcançar o sonhado relacionamento com o eleitor, que resultará em um carinho dele, que poderá gerar um voto a mais na urna. Mas não é tão simples assim, deve-se criar um foco e uma meta que, obviamente deva ser possível de alcançar. Um exemplo que pode ser pequeno, mas facilmente aplicável a prefeitos: atingir o bairro X da cidade Y pelo Orkut. Diagnosticou-se, em um primeiro momento, que esta região tem uma elevada participação nesta rede. São mais de 5 comunidades com mais de 3 mil membros em

cada uma e com incríveis participações nos fóruns: os típicos jogos de “você conhece?” além das reclamações sobre buracos, ruas, iluminação fazem parte deste universo. Dados básicos que você já tem sobre um grupo para ser avaliado. A partir disso você poderá classificar idades, sexo, e se for se aprofundar mais, descobrirá gostos e características em comum, pelas comunidades, por exemplo. O que há em comum entre o off e o online é a necessidade da transparência. André Telles (2010; p. 175) indica o mesmo: “A palavra-chave do projeto é interagir e ser transparente, ter honestidade na rede e saber ouvir os usuários, saber as opiniões deles sobre suas ideias.” Com um momento delicado com todos os holofotes e atenção para os políticos como é durante as eleições, omitir e mentir fatos pode gerar uma dor de cabeça desnecessária. Para não cair em armadilhas é muito importante pensar bem antes de postar qualquer coisa e nunca fingir que nada está acontecendo. Um plano de gerenciamento de crises, neste caso, é muito válido.

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O exagero em termos também é um agravante, querer se sobressair e esperar que isto gere uma boa repercussão é uma ilusão imatura. O apresentador e jornalista Marcelo Tas questionou em seu Twitter “qual a maior besteira que os seguidores haviam ouvido dos políticos pelas redes sociais”. E nesta interessante experiência ele conseguiu trazer uma série de respostas instigantes e valiosas, seguem algumas de destaque: “Vamos mudar o país” Vindo de uns candidatos malas, isso é uma afronta à sociedade. Será que estamos indo na direção errada?

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A pior besteira que vejo no twitter dos candidatos é: - Vejam minha agenda de hoje! to nem aí pra onde eles vão estar... acho que a maior besteira é estarem aqui sem ter preparo pra isso. Nem sigo políticos no twitter, já basta ver na TV e cê quer que eu cometa um ato de masoquismo no twitter?! Atualmente, é tantas bobagens que fica difícil escolher. Siga o Serra e vc vai saber o q ele sonhou, o que ele comeu no café da manhã, a música preferida da vizinha do tio dele.. dureza

o José Serra repassa todas as noites o mapa quatro rodas A @_mariadorosario rasgou elogios a uma candidata, mas errou nick no twitter e acabou colocando uma menina na campanha! até agora isso que o sr @viceindio disse:todo mundo sabe que o PT é ligado às Farc, ao narcotráfico,ligado ao que há de pior. Deles ou de quem usa as ferramentas em nome deles? Poucos são os que “pilotam” por si só. Os presidenciáveis nunca respondem meus questionamentos, logo nãos os lêem (escrevi certo?), pq haveria de ler os posts deles?

As lições que se pode tirar destes depoimentos, e que demonstram a veracidade do que foi dito anteriormente sobre planejar, são: • Informar os locais em que estará fazendo a campanha é uma opção interessante, mas nunca utilize estes canais como diário ao relatar o tempo todo todos os passos;

• As pessoas percebem quando não há uma preparação para conversar nestes canais, não se iluda de que é apenas criar a conta e falar qualquer coisa; • Mídias sociais são diferentes de outras campanhas; • Confirme informações antes de falar, se for citar alguém abra a página dele primeiro para ter certeza do nome de usuário; • Muitos exploram estes meios como forma de exclusividade, o que é bom, a idéia de falar primeiro para este público causa impacto, mas opiniões pessoais no momento em que seu nome está super exposto é atirar contra si mesmo; tudo o que for dito sairá em todas as outras mídias de massa; • Deixe muito claro quando é o candidato ou quando é a assessoria que está postando. Mais uma vez, as pessoas não gostam de ser enganadas; • E por último e não menos importante, responda sempre. O número de mentions é super elevado? Peça ajuda, mas não deixe de responder. A intenção é se aproximar das pessoas, então você precisa saber ouvi-las e falar com elas.


Mídias Sociais e Eleições 2010 Impressões deixadas por eleitores que utilizam o Twitter e classificaram, assim, suas percepções por esta mídia, o que não significa que as ações se restringem a tal. Por fim, é válido salientar, novamente, as palavras de Telles (2010, p. 28): “Criar um ótimo canal personalizado requer planejamento cuidadoso e atenção constante”. O que significa que toda e qualquer atitude que for cogitada deve ser minuciosamente pensada e diagnosticada. Evite transtornos desnecessários e, muito mais do que isso, jamais omita fatos.

Referências Bibliográficas COMM, Joel; BURGE, Ken. O poder do Twitter: Estratégias para dominar seu mercado e atingir seus objetivos com um tweet por vez. São Paulo: Gente, 2009. FERNANDES, Manoel (Org.). Do Broadcast ao Socialcast. São Paulo: W3 Editora, 2009. TELLES, André. A revolução das Mídias Sociais: Estratégias de marketing digital para você e sua empresa terem sucesso nas mídias sociais. Cases, conceitos, dicas e ferramentas. São Paulo: M.Books, 2010 TERRA, Carolina Frazon; BUENO, Laís Cardozo. Os microblogs como ferramenta de comunicação organizacional. Disponível em <http://www.abciber.com.br/simposio2009/trabalhos/anais/pdf/ artigos/1_redes/eixo1_art7.pdf>. Acesso em 04 set. 2010. http://twitoaster.com/country-br/marcelotas/ candidatos-ainda-nao-entenderam-que-internete-comunicacao-de-massa-qual-a-maior-besteiraque-voce-ja-ouviu-deles-aqui/

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Política? "E eu com isso?" Por Samantha Shiraishi

Jornalista diplomada, com passagens redações em Curitiba e Tóquio, blogueira desde 2005. Mescla a experiência offline com a da coordenação de projetos de mídia social, meio em que atua desde 2007. É editora de blogs corporativos na área de sustentabilidade. É voluntária da SaferNet e embaixadora 2.0 do movimento Todos Para Educação. Palavras-chaves: educação, família, mídias sociais, sustentabilidade, jornalismo www.twitter.com/avidaquer www.samshiraishi.com/ www.linkedin.com/in/samanthashiraishi twitter.com/samegui otagaissama.tumblr.com/

As eleições 2010 foram o primeiro teste dos políticos para o jornalismo-cidadão que nós, “consumidores 2.0”, fazemos nas redes sociais desde a popularização das ferramentas de compartilhamento de notícias e de autopublicação. Se antes precisávamos ir ao ombudsman para ler uma visão mais crítica da notícia repercutida, agora temos muitos blogs e perfis de Twitter para seguir, ora concordando, ora discordando, mas acima de tudo - e felizmente - vivenciando um debate inovador na nossa sociedade. No auge das eleições sugeri que meus leitores - boa parte deles eleitores também - interessados em votar bem escolhessem um foco (eu escolhi educação) e acompanhassem os candidatos na temática selecionada, sendo também um propagador dos erros e acertos de suas propostas e campanhas neste assunto. Isso é ser proativo no desnudar do candidato e na tarefa de escolher quem vai representar seus interesses no próximo governo.

E

acredito que seja assim de agora em diante. O eleitor descobriu que pode ter um papel, uma voz ativa, uma função no conjunto eleitoral, notando que tem capacidade de mobilizar multidões mesmo que seja de seu sofá e de seu smartphone.


Mídias Sociais e Eleições 2010 Redes sociais como amplificador Uma coisa eu aprendi nestas eleições: como na Copa do Mundo, assistir a TV e tuitar ao mesmo tempo amplifica muito a nossa voz. Dá para “conversar” com muita gente, trocar ideias em tempo real e confirmar se, pelo menos no universo dos conectados, os institutos de pesquisa estão ou não retratando a verdade que vimos nas urnas, mas certamente mostrando o que cada um de nós quer. E quanto ao velho trabalho dos marqueteiros, ele está com os dias contados. No meio das eleições, a denúncia do uso não autorizado de uma foto (retirada do Twitpic de @lidifaria) para a produção de um vídeo de internet usada na campanha do candidato petista ao governo de São Paulo foi exemplo da reação 2.0. Foi uma mostra em tempo real do que Edney Souza, editor do blog Interney, chamou de Candidatos Analógicos em sua contribuição à matéria: “Há um abismo entre o que a campanha digital poderia ser e o que está sendo. Os candidatos estão mais preocupados em influenciar (ou manipular) a opinião alheia do que efetivamente compartilhar

volta do regime democrático, Renato nos convidou a pensar em como algumas das artimanhas e manejo de palavras e gestos de Odorico Paraguaçu que ressurgem no processo de construção da persona pública de vários candidatos país afora podem ser revisadas e bloqueadas com o advento das redes sociais. E deste novo universo saem novas figuras, como a da candidata Marina Silva e da Presidenta eleita Dilma Rousseff. Mas, como a historiadora Mary del Priore relembra, as figuras públicas femininas importantes não Usando o mote do lançamento para o ci- são total novidade no Brasil. nema de O Bem-Amado, baseado na obra “Uma das pioneiras foi Nísia Floresta. do teatrólogo Dias Gomes, com o revival da Nascida na pequena localidade de Papari, figura de Odorico Paraguaçu, “arquétipo no Rio Grande do Norte, casada contra do político matreiro, envolvente, “enrolaa vontade aos 13 anos, logo abandonou dor”, corrupto até a medula e obsessivo”, o marido e, em 1832, já sustentava mãe e filhos com o salário de professora. Em o repórter Renato Guimarães escreveu um 1832, publicou Direitos das mulheres excelente artigo para a revista online Págie injustiças dos homens, artigo em que na 22 (da FVG) na qual listou os elemenenfrentava os preconceitos da sociedade patriarcal, exigindo igualdade e educação tos que no imaginário nacional permeiam para todas. Segundo Nísia, a situação de o jogo político: “amores, luxúria, dinheiro, ignorância em que eram mantidas era poder, inveja e violência” e, ao abrir seu responsável pelas dificuldades que as mutexto com a mais bem-acabada represenlheres enfrentavam. Submetidas a um círculo vicioso, não tinham instrução e não tação de um modo de fazer política que podiam participar da vida pública. Não aparentemente está enterrado no passado participando da vida pública, continuarecente do Brasil, especialmente depois da vam sem instrução. Alguns anos depois, suas opiniões, conversar, mostrar quem são. Não temos candidatos na internet, são seus assessores que cuidam dos seus espaços, cometendo gafes, pinçando as perguntas que querem responder e editando tudo para que o candidato apareça plástico e sem vida, defendendo os argumentos que a campanha decidiu serem o pilar de sua candidatura. Não temos espaços abertos para conversar com os candidatos no âmbito digital, porque a candidatura off-line toma todo esse tempo: as redes sociais contemplam relacionamento e os candidatos estão usando a internet como mídia de massa. ”

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já instalada no Rio de Janeiro, Nísia passou a realizar conferências defendendo a emancipação dos escravos, a liberdade de culto e a federação das províncias sob um sistema de governo republicano.”

A descrição da situação de ignorância lembrou a você, leitor, algumas das figuras do seu convívio? Gente que não sabe exatamente por quê e para quê escolhemos, nas urnas, os nossos representantes está por aí, em pleno século XXI, fazendo militantes como Nísia se remoerem no túmulo. Mas creio que, aos poucos e com educação, podemos mudar isso.

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Se as mulheres são comunicativas e mais capazes de empatia com as dificuldades do próximo, quero crer que através das redes sociais elas farão muito pelo País. Onde elas estavam antes de Dilma chegar ao poder? Infiltradas nos gabinetes, elegendo-se para o legislativo, aquele espaço mesmo que poucos sabem para que serve (né, Tiririca?). Se o Congresso Nacional é responsável pelas leis do Brasil, meu voto faz diferença e devo saber em quem e por que votar...

não teve o destaque que deveria, nada de viral “Cala Boca Galvão”para ajudar), foi a campanha Seu voto faz o Congresso. Partindo do futebol, paixão nacional, como metáfora da importância de escolha dos deputados e senadores - “escalar a melhor seleção para fazer as regras da sua vida” -, a campanha foi bem sucedida por usar termos que estão próximos da vida do eleitor - podia ter usado com sucesso metáforas ligadas à família (as decisões que uma mãe atual faz com relação ao orçamento doméstico, por exemplo) ou a uma pequena empresa (a escolha de colaboradores/funcionários e de clientes/fornecedores faz diferença no sucesso do empreendimento). Merece elogio a tentativa de falar com as pessoas de forma que elas entendam, o que o Senado não fazia até pouco tempo atrás. Sim, até o Senado Federal tenta se aproximar das redes sociais, do eleitor, do cidadão, embora nem sempre as pessoas “comuns” fiquem sabendo. Creio que cabe a nós, stakeholders, chamar mais pessoas para o debate online.

E se, como Alexandre Inagaki, editor do Uma das ideias muito boas nas mídias sociais blog Pensar Enlouquece, você acha que o nas eleições de 2010 (mas que infelizmente canal ainda é mal explorado,

“As mídias sociais ainda estão sendo utilizadas de modo muito tímido no Brasil. Não poderia ser diferente: apesar do crescimento substancial de visitas a sites como Twitter e Facebook no País nos últimos doze meses, o fato é que a TV aberta ainda é o grande formador de opiniões no Brasil. Outro problema que diagnostico é o fato de, em blogs e mídias sociais, as discussões políticas andarem extremamente exacerbadas. O maniqueísmo desses debates empobrece demais as discussões, afastando interessados em comentar política. E a internet, que poderia representar um meio onde fosse possível encontrar informações diferenciadas, infelizmente acaba por fomentar rivalidades em vez de construir pontes de entendimento entre partidos. ”


A relação entre redes sociais na internet e o certame eleitoral no Brasil Por Luiz Marcos Ferreira Júnior

Mestre em Comunicação Midiática pela Universidade Estadual Paulista/ UNESP - Campus Bauru, advogado e com graduação incompleta em jornalismo. É ativista de direitos humanos em diversos núcleos, dentre os quais, atua na área de democratização da comunicação social e na área de apoio a imigrantes estrangeiros. Fora membro da Comissão organizadora da Conferência Estadual de Comunicação do Estado de São Paulo e um dos representantes do estado na Conferência Nacional de Comunicação (CONFECOM). Atualmente, integra a Frente Paulista pelo Direito à Comunicação e Liberdade de Expressão. Membro do grupo do LECOTEC (Laboratório de Estudos em Comunicação, Tecnologia e Educação Cidadã). No campo das Ciências da Comunicação pesquisa a relação entre o Estado e a sociedade, comunicação política, cultura política e mídias, comportamento eleitoral. Palavras-chave: Internet, comportamento eleitoral, 2010, recepção, campanha eleitoral. lcacoman@gmail.com lcacoman.blogspot.com/ www2.psdb.org.br/ www.dilma.com.br

A

relação entre redes sociais na internet e o certame eleitoral no Brasil permite explorar inúmeros problemas de análise relacionados à aplicação do instrumental tecnológico e sua relação com o usuário de internet. No entanto para se estabelecer um critério abstrato do cenário contemporâneo no Brasil, que constitua uma base para a formulação específica de um modelo estratégico de política nas redes, não há como se perder de vista alguns fatores como: a relação entre o mundo da vida (extra-midiático) e o mundo da tela (midiático), tomando-se em consideração que fatores extra-midiáticos assumem um peso maior na decisão eleitoral quando foram dimensionados por elementos da realidade antes do discurso midiático. Ou quando os meios de comunicação digital acabam, por estratificação social do acesso, limitados a uma esfera de classe social. Ou ainda, quando o discurso midiático encontra-se descolado dos fatores determinantes da decisão eleitoral. O presente artigo apresentará as categorias explicativas destas relações e suas co-determinações, tomando em conta referenciais da ciência política combinados aos de estudos de comunicação. Tomará


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por corpos os sites de Dilma e Serra e sua toral, o clima de campanha já havia se ins- tura de Dilma, seja pela suposição da inviadinâmica interativa. taurado no Brasil, desde o início do ano2. bilidade da transferência dos votos de Lula, em um patamar passível de fazê-la vitorioA campanha eleitoral em 2010 Um dos fenômenos mais claros de anteci- sa, seja no apontamento de sua incapacidaO fenômeno eleitoral manifestado no de- pação eleitoral ocorreu em favor da candi- de comunicativa (o que era destacado como correr de todo o ano de 2010 e que teve datura de Dilma Rousseff3, este se caracte- uma diferença em relação a Lula)5; b) por um acirramento no segundo semestre, mar- rizou por um processo de polarização entre uma abordagem retórica opinativa nos escará a história política brasileira para além blogueiros, twitteiros de um lado (que bus- paços de noticia; c) por uma abordagem do enfrentamento polarizado de dois eixos caram reagir aos grandes veículos de im- adjetivada, sobretudo na imprensa escrita, políticos na disputa à Presidência da Repú- prensa convencional), e do outro lado os contra a pessoa de Dilma e seu histórico; d) blica, as candidaturas de Dilma e Serra. A grandes veículos de imprensa escrita e de por abordagens contra o Partido dos Tracultura política brasileira materializou for- televisão do país, que desde o ano de 2009 balhadores6. mas de contra-agendamento midiáticos na propunham um agendamento desfavorável internet e da consolidação de uma tendên- a candidatura de Dilma4. Semelhanças com o caso cia de fatores extra-midiáticos no cálculo de Lula da escolha eleitoral. As evidências deste processo podem ser Esse cenário de pré-agendamento de campercebidas em episódios da agenda da panha já havia sido provado desfavoravelEm razão da vigente legislação no Brasil, a grande mídia que se caracterizaram: a) pela mente por Lula em 2005, quando do incimanifestação oficial de candidaturas fica res- abordagem de desqualificação da candida- dente do mensalão, escândalo explorado trita a um período muito próximo ao de promidiaticamente, que levou a muitos acredi2 No dia 06/07/2010 começou a propaganda eleitoral. A partir paganda eleitoral. No entanto, sobretudo, desta data foi permitida a propaganda na internet. O horário com a atuação do agendamento midiático eleitoral gratuito, no primeiro turno, veiculado em rádio e 5 Algo muito explorado pela grande mídia foi a debilidade de televisão, iniciou-se em 17 de agosto e foi ao ar até o dia 30 de em relação aos pré-candidatos e da ostensi- setembro. saúde de Dilma que se viu acometida por diagnóstico de câncer linfático. O anúncio da cura da doença, detectada em abril de 3 O blog coletivo denominado Blog da Dilma <http:// va defesa antecipada por uma militância na blogdadilma.blog.br/> foi um exemplo claro deste fenômeno. 2009, foi feito no dia 03/09/2009 (fonte: http://g1.globo.com/ internet1, fenômeno que se evidenciou com 4 A radicalização da mídia, no segundo turno, acentuou ainda Noticias/Politica/0,,MUL1291182-5601,00.html). mais esta polarização entre parte dos internautas engajados e 6 Uma das tomadas de posição contra-ofensivas por parte clareza, pela primeira vez, neste certame elei- a “parcial” grande mídia, o que levou, aos primeiros, a uma tal do Planalto visando proteger seu projeto de governo em 1 A primeira campanha de internet no Brasil, em que um candidato conseguiu expandir seu eleitorado a partir da estimulação deste veículo, ocorreu com a candidatura de Gabeira à prefeitura do Rio de Janeiro em 2008.

coesão nas ações militantes de contra-informação, que chegou-se a produzir um encontro não virtual de muitos destes, o 1º Encontro Nacional de Blogueiros Progressistas do Brasil, nos dias 20 a 22 de agosto em São Paulo (fonte: http://www.blogueirosprogressistas. org/encontro/).

“descompasso” com a cobertura midiática, foi a criação do Blog do Planalto < blog.planalto.gov.br>, em 31/08/2009, que publica na íntegra manifestações oficiais ou entrevistas concedidas aos veículos de imprensa revelando uma clara diferença entre o informado e o publicado.


Mídias Sociais e Eleições 2010 tar na possibilidade da não reeleição de Lula desta retórica midiática deve-se a fatores ou no aumento significativo de abstenções extra-midiáticos e a reação de internautas e votos nulos. contra o comportamento da grande mídia e/ou a favor da candidatura de Dilma, Muitas semelhanças podem ser percebidas proporcionando uma maior pluralidade entre o incidente eleitoral de 2006 e o de opinativa de abordagens e de seleção de 2010. O primeiro foi a unidade política dos temas e fatos noticiosos. grandes veículos de comunicação contra o projeto de continuidade do PT. O segundo, Uma retórica persuasiva, natural em uma um fenômeno (comprovado pelas pesqui- eleição, em um universo social muito amsas eleitorais) de antecipação da tomada de plo, não pode dispensar os processos de decisão eleitoral. Este efeito de antecipa- mediação social midiáticos, uma vez que ção deu-se em razão do agendamento da a presença dos discursos em meios de cogrande mídia. Mas, tanto em 2005/2006, municação social pode gerar consensos quanto em 2009/2010, não foi o discurso compartilháveis fora da tela. midiático suficientemente persuasivo, posto que em ambos os casos, a maior parte do Bolaño (2004) trata do conceito habereleitorado colocou-se contra a posição sus- masiano de Lebenswelt (reprodução simtentada pela angulação, posições editoriais bólica no espaço da vida) e afirma que e agendamento da grande mídia. a indústria cultural só é capaz de “colonizar” o mundo da vida para o capital e Indagar acerca dos fatores de influência estado (economia e política) quando coneleitoral extra-midiáticos e midiáticos, bem segue substituir os mecanismos internos como, estes podem ser combinados e fun- de reprodução simbólica do mundo da cionar inseridos nos processos comunica- vida. Algo nem sempre possível, sobrecionais, permite entender ganhos e perdas tudo, quando existe uma franca oposição na estratégia de marketing das duas prin- entre meios de comunicação ou entre os cipais candidaturas no ano de 2010. As discursos destes primeiros e a percepção razões da limitação do alcance persuasivo dos indivíduos.

Por isso, Bolaño (2004), ao discutir processos persuasivos da indústria cultural, afirma que a melhor forma de garantir fidelização da audiência seria forjando um mecanismo de barreiras superior ao estrutural (das relações sociais autônomas), ou seja, fixando a referência de um modelo tecno-estético que pode se efetivar tanto mais a transmissora concentra para si uma produção própria, sob o seu controle estratégico e detém alto alcance de difusão. Este modelo foi ameaçado quando a plataforma comunicacional monopolizadora da mediação social até então dominante (televisão e rádio), passou a concorrer com a internet. Dentro e fora da tela A grande contribuição, para a investigação do comportamento eleitoral, percebida na ciência política, e ausente nos estudos de comunicação, é a noção de que diferentes fatores da ordem social, constituídos em longo, médio e curto prazo atuam isolados ou combinados na mediação de decisões e na elaboração de opiniões. Um dos modelos lógicos mais sofisticados e completos de análise do comportamento eleitoral é o desenvolvido por Miller e

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Shanks (1996). Estes propuseram a obser- • avaliação da imagem dos candidatos vância de oito fatores que mais influenciaestágio 5, categoria de médio e curto vam o eleitorado: prazo, em que se verifica um padrão do que se pensa acerca da pessoa do can• características econômicas e sociais dos didato em questão; eleitores - estágio 1, categoria a ser con- • avaliação prospectiva dos partidos solidada como referência para a decisão e candidatos - estágio 6, situação de do eleitor à longo prazo; curto prazo em que se percebe em al• predisposições partidárias e predisposiguns momentos políticos de decisão ções ideológicas - estágio 2, categorias eleitoral, um sentimento coletivo de de longo prazo, em que se percebe no necessidade de mudança, que pode se eleitorado uma predisposição em votar caracterizar por um rompimento com em determinado partido sempre, ou a o quadro político, ou por uma mudanconsiderar determinados fatores de orça que considere positivo os resultadem ideológica para a decisão eleitoral; dos presentes (MILLER e SHANKS, • posições quanto a problemas de polí1996). ticas públicas - estágio 3, categoria de longo e médio prazo em que os indiví- De qualquer forma, o que tais autores não duos, dispostos a um determinado pro- explicam é como os meios de comunicablema de repercussão social atinente ao ção podem ser integrados ao jogo eleitocargo político em disputa; ral. Diante disso, Baudrillard (1972) surge • avaliação de governo - estágio 4, cate- como um ponto de partida conciliador, goria em que o indivíduo tem, como para ele pode-se caracterizar as relações elemento preliminar para a decisão do humanas por formas que estão circunscrivoto, os resultados de um governo pas- tas a um dos seguintes modelos: 1. lógica sado que tenta reeleição ou que apóia funcional do valor de uso ; 2. lógica ecocandidato de seu grupo político para nômica do valor de troca; 3. lógica de trouma continuidade governamental; ca simbólica;4. lógica do valor-signo.

A primeira é uma lógica de operações práticas (da utilidade, da noção que evoca ao utensílio, ao util)7, a segunda é uma lógica de equivalências (da mercadoria, do bem como equivalente econômico). Já a terceira corresponde a uma lógica de ambivalência (vinculada à noção de dom, de símbolo)8, tem-se como exemplo o objeto do presente. Nesse terceiro caso, o que predomina é a relação de ambivalência, não o preço, nem mesmo a marca ou distinção. A quarta é uma lógica da diferença (do estatuto, do signo: que é percebida pela diferença com outros signos, que só permite a constituição da significação em função dessa relação de distinção) (BAUDRILLARD, 1972). Esta última forma de relação é a que se encontra difundida na ideologia do consumo. Tanto mais sólida é à medida que absorve todas as demais formas anteriores, traduzindo toda relação objetiva, na comparação 7 Exemplo: situação em que o eleitor imagina que valha a pena investir num candidato, por que ele, prospectivamente, irá corresponder as suas expectativas. 8 Exemplo disso é o da imagem do candidato baseada em configuração de ações a longo prazo (não meramente publicitárias). Outras situações que se podem dimensionar por essa forma é a da identificação partidária, identificação ideológica.


Mídias Sociais e Eleições 2010 de um objeto pelo outro, sem dar transparência (a outras possíveis relações) visando que o indivíduo - por exemplo, no caso de uma publicidade - seja levado a desconsiderar, o caráter de utilidade/instrumentalidade de um bem, ou de um produto, de um candidato ou de um interesse a ser reivindicado. Esse sistema que não é puramente racional, mas resultado também de atividades do psiquismo e é consubstanciado em práticas e reconhecido por seus sintomas e na sua experimentação. Permite caracterizar diferentes manifestações sócio-culturais, tais como a cultura política e o comportamento eleitoral. E permite perceber que não é só a dimensão difundida pelas mídias e a lógica do valor-signo (marketing) que é determinante para um dado juízo ou escolha. Dentro deste contexto, quais fatores estariam influenciando o eleitorado no período de 2010? Desde a reeleição de 2006, o enfoque para as realizações de governo de Lula (avaliação de governo e políticas públicas) havia tomado conta das referências do eleitorado.

Não é acertado tomar a vitória de Lula em 2006 somente em função de sua imagem como candidato e sua força simbólica. Lula venceu, sobretudo e também, pela avaliação positiva de seu governo, baseada na percepção de ganho que esta traduzia para uma parte da população brasileira (relação de uso = fruição de políticas públicas e relação de troca = melhor rentabilidade dos ganhos). Ocorre que este processo, depois de 2006, se alargou, alcançando, por meio de políticas de crédito (sobretudo habitacional), parte da classe média.

Serra estava diante de um dilema. Não poderia criticar diretamente ao governo Lula. Ao mesmo tempo, tinha o desafio de se apresentar como uma continuidade, sendo adversário direto do governo. Ademais, deveria evitar uma demasiada racionalização do eleitorado em seu discurso, vez que esta levaria a duas conseqüências: a um comparativo mais cuidadoso de políticas de governo (PT x PSDB, Lula x FHC – avaliação de governo comparativa) e denotaria a característica sisuda e séria do candidato tucano. A análise do comportamento de campaÉ por isso, que Dilma Rousseff detinha nha dos dois candidatos traduz este panoenormes chances de vencer, ainda que fos- rama. Vejamos o comparativo abaixo: se, de início, desconhecida pela maior parte do eleitorado. A relação simbólica da figura • Quanto as Políticas Públicas (categoria de Lula estava intrinsecamente relacionada à de longo e médio prazo): dimensão de uso e troca que favoreciam um juízo racional, prospectivo e economicista A campanha de Serra, em televisão e na ao eleitorado. A tarefa de Serra neste con- internet, buscou enfocar: continuidade texto era muito difícil, ainda que iniciasse em prospectiva, traduzida no discurso genéprimeiro lugar nas intenções de voto, já que rico do avanço, de que se pode fazer mais era uma figura conhecida de outros pleitos, com um candidato experiente (discurso já que tanto mais Dilma ficasse conhecida e subjetivo); e uma abordagem objetiva que fosse apresentada como figura chave desse apontava determinadas políticas similaprocesso de ganhos, o cenário se inverteria. res do governo FHC ou do governo do

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Estado de São Paulo, como origem das do governo Lula, tomando-as como obra de Serra. Já a campanha de Dilma, enfocou: continuidade prospectiva, traduzida no discurso do projeto de governo (discurso objetivo) e em apresentação didática e separada por temas e spots. A própria narrativa discursiva era a de uma continuidade, somatória de temas e apresentação de problemas por região (extremamente racional e didático).

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do pessoal e trajetória política. Esta trajetória, no entanto, deveria estar associada, em uma continuidade narrativa, aos seguintes valores: competência administrativa; força pessoal (luta contra a ditadura); confiança pessoal de Lula; mãe do PAC e de outros programas de Lula; principal assessora de Lula, competência para continuar a plataforma de governo. • Quanto à retórica da imagem (vídeo, imagem, som e texto):

• Quanto à imagem do candidato (categoria de curto prazo): Quanto a Serra, percebia-se um discurso difuso que mesclava, em um mesmo momenA campanha de Serra buscou enfocou com to, elementos da imagem pessoal, cenas de mais ênfase esta categoria. contato com populares e o candidato, propostas pontuais de governo, comparativos Ocorreu um forte apelo retórico de vídeo com Lula e ao fim do primeiro turno e iníe conteúdos visando suavizar sua imagem cio do segundo, ataques a pessoa de Dilpessoal e aproximá-la ao carisma de Lula. ma. Ocorreu, também, uma insistência na característica de político experiente (ex-mi- Na internet, seu sítio se constituía em nistro do planejamento e da saúde, pai dos uma imagem única (não dividida em caigenéricos), comparando com Dilma. xas) contínuo de ícones brasileiros, com apelo emocional, mas com pouca articuPara a candidata petista, no entanto, essa lação informacional. Em verdade Serra categoria serviu para explicar quem era Dil- apostou menos na racionalização e mais ma, a partir de características de seu passa- na mescla entre emoção e razão (estética

e na articulação com as ferramentas de internet). Sua militância de internet reproduziu o cenário midiático e aprofundou os sintomas de ataque a figura de Dilma e do PT. Quanto a Dilma, denotou-se um discurso caracterizado por uma continuidade baseada numa seqüência temporal, identificação de temas, separação de discursos por região do Brasil: a) de realizações do governo Lula; b) da trajetória política da candidata; c) dos projetos que continuariam ou avançariam. Sua militância se caracterizou por uma contraposição ao discurso midiático com um acompanhamento simultâneo das pautas. Ocorreu uma forte articulação colaborativa entre a campanha de Dilma, que fornecia conteúdos específicos para blogueiros e interagia com os mesmos. Para Serra emoção constrangia racionalidade, para Dilma complementava. Uma coisa denotou-se ao fim do certame eleitoral, o segundo turno se viabilizou mais uma vez, em virtude de um incidente midiático escandaloso (efeito de curto prazo), nos últimos dias do primeiro turno: as denúncias de favorecimento ilícito


Mídias Sociais e Eleições 2010 envolvendo Erenice Guerra, sucessora de Dilma como chefe da Casa Civil. Mas, este efeito de curto prazo, não impediu a tendência de vitória de Dilma, mesmo diante de um segundo turno radicalizado pela mídia e Serra, por fatores emocionais e morais (da ordem simbólica). No caso do discurso de Serra denotou-se maior agressividade, o que sedimentou sua derrota eleitoral.

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