Notícias do Mar n.º 331

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vadas e participadas por alguns reis os fidalgos da sua corte, que para além de serem aficionados também toureavam. Quando séculos mais tarde passaram a realizar-se em Alhandra as toiradas reais, que herdou de Salvaterra, a rainha D. Maria II que era uma grande aficionada dos toiros, vinha de Lisboa pelo Tejo num bergantim e desembarcava no cais da vila para assistir às toiradas, e ficava hospedada no palácio do Duque da Terceira no Sobralinho. Essas toiradas e festejos deram brado, ao ponto de Almeida Garrett ao subir o Tejo, nas suas Viagens na minha terra, quando ia a passar por ali chamou-lhe “Alhandra a Toireira”. Das éguas do Ribatejo dizia-se que o vento as fecundava. Podemos, por nossa vez Imaginar que os touros nascem do ventre da terra. Os homens montam os cavalos, levam os bois ao pasto e inventam estas coisas José Saramago (in Viagem a Portugal) Quem, como nós, conhece a mística da Lezíria do Tejo, entende esta forma metafórica de se expressar do nosso Nobel, nascido no coração do Ribatejo, na Azinhaga. A partir daqui entro na essência do tema que me levou a escrever esta crónica que intitulei: O Tejo na vida do Toiro. A criação do toiro de lide é feita por um processo metódico e rigoroso que passa por várias etapas. Após nascer e passado o período de amamentação seguese a “desmama” que consiste em arrancar os filhos às mães, o que não é tarefa fácil porque a vaca que é bastante ciosa, quando se sente sem o filho entra num estado de grande inquietação tornando-se perigosa. Mas com o tempo ela acaba por esquecer-se. O novilho fica no campo até à fase seguinte que é a “ferra”. Trata-se de um acontecimento bastante festivo para o qual o ganadeiro convida amigos e mui-

O Toiro foi adorado como um deus mitológico por várias civilizações da Antiguidade tos aficionados e amadores, e aparecem também alguns curiosos que se prestam a levar pancada dos novilhos bravos, e quando mete uns copos de vinho a valentia vai ao rubro e surgem as grandes tareias, mas o novilho acaba por ser agarrado e derribado, ficando à mercê do ferro em brasa com a marca da ganadaria e um número. O novilho depois é retirado e segue-se o seguinte. Fica no campo a aguardar que chegue a altura da “tenta”, que é um processo igualmente rigoroso que se destina a avaliar a bravura das fêmeas. Trata-se de um episódio idêntico ao da “ferra”, mas mais sério, e neste caso a assistência é seleccionada e processa-se da seguinte forma: Num terreiro vedado há um picador montado a cavalo que empunhando uma vara com um ferro na ponta, cita a novilha que arranca para o cavalo sendo picada no cachaço com a choupa. Se suporta a dor e arremete novamente, mais de uma vez, isso

Estrada de toiros conduzida pelos campinos

demonstra a sua bravura e passa a ser considerada apta para ser futura mãe para a reprodução e aguarda no campo em manada, separada dos novilhos, até atingir a idade de ir ao semental para ser fecundada. Mas se foge ao castigo é-lhe passado o atestado de mansidão. Mas a “tenta” do novilho é feita em campo aberto porque se fosse feita em terreiro vedado como acontece às novilhas, adquiria vícios ou manhas prejudiciais à sua bravura futura. Neste caso o novilho é apartado da manada à vara por dois cavaleiros munidos

de um pampilho que o perseguem até conseguirem derribá-lo. No caso dele se levantar e arrancar para o cavalo é recebido pela vara e a sua bravura é avaliada pelo número de investidas que fizer. A partir daí o novilho cresce e faz-se toiro vivendo no campo em liberdade, recebendo um tratamento cuidado. Na estação das chuvas e das cheias no campo é feita a deslocação das manadas para a charneca. Assim vive o toiro até à idade em que é considerado pronto para fazer parte de um curro para ser lidado numa praça de toiros.

Lidar os toiros nos Terreiros dos Castelos 2014 Julho 331

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