Jornal Mercosur dezembro 2015

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Venezuela: Estados Unidos e Alemanha financiam o imaginário da fraude 500 mil dólares: este é o financiamento estrangeiro à oposição, cujo único fim é criar um imaginário de fraude eleitoral através do terrorismo midiático. rante a campanha, tarefa para a qual estarão comprometidos os demais 30 mil dólares, para garantir que não faltarão as ferramentas necessárias, como telefones, tablets, laptops, baterias e outros equipamentos.

Álvaro Verzi Rangel* - Carta Maior A Unasul já começou os trabalhos de acompanhamento das eleições parlamentares da Venezuela, no dia 6 de dezembro, feito por especialistas de onze países, encabeçados pelo ex-presidente dominicano Leonel Fernández. Apesar desses esforços, a oposição continua clamando pela ingerência de políticos e observadores da Organização dos Estados Americanos (OEA), da União Europeia e de ex-presidentes conservadores não só da América Latina. Mas o interesse não é só dos membros da coalizão direitista Mesa de Unidade Democrática (MUD), que aglutina os setores da oposição. A necessidade de criar um imaginário de fraude eleitoral – como vem se repetindo em cada fracasso nas urnas – vem do Norte, e tem um amplo financiamento germano-estadunidense. No dia 29 de setembro, a sede do Comitê de Relações Internacionais da MUD foi palco de uma reunião sigilosa, com o objetivo de coordenar com diferentes ONGs internacionais a presença de “observadores” especiais vindos de outros países. Outro ponto abordado nessa reunião foi a necessidade da oposição venezuelana de receber maior apoio financeiro, que permita desenvolver maiores e melhores ações, além do dinheiro necessário para alimentar as campanhas dos candidatos, para maior publicidade e mobilização de eventos, que visam não só promover a oposição como trabalhar na deterioração da imagem do governo nacional e internacionalmente – e para isso os fundos sempre estão disponíveis. Embora os principais líderes da MUD se encontrassem no recinto, o encontro foi dirigido por Eduardo Semtei e Lilian Tintori, a esposa de Leopoldo López. Também estavam presentes os “patrocinadores convidados”, os financiadores estrangeiros da desestabilização: Henning Suhr, representante da Fundação alemã Konrand Adenauer na Venezuela, Lee Mclenny, encarregado de negócios da Embaixada dos Estados Unidos em Caracas, e Samuel David Sipes, funcionário do escritório político da mesma sede diplomática, e sucessor de Phililp Laidlaw na direção da sede da CIA na capital venezuelana. Os opositores venezuelanos e os financiadores alemães e estadunidenses concordaram em promover a presença de mais de 200 observadores membros das fundações alemãs Adenauer e Frederick Ebert, da Internacional Socialista (socialdemocrata), da União Europeia e da Fe-

deração Interamericana de Advogados (FIA) – tais organismos não são reconhecidos pelas autoridades eleitorais da Venezuela. Além desses grupos, também seriam trazidos ao país grupos de parlamentares e ex-presidentes da região, talvez alguns intelectuais – todos ultradireitistas. O essencial neste encontro foi desenhar a estratégia para que os observadores dessas ONGs selecionadas pudessem ter acesso ao processo eleitoral, segundo o mecanismo pelo qual os partidos políticos podem convidar alguns dos observadores, os quais o Conselho Nacional Eleitoral (CNE) chama de “acompanhadores do processo”. A missão principal dessa manobra, segundo explicou Semtei, é conseguir que a campanha midiática internacional pressione o governo para aceitar a observação eleitoral de diferentes atores internacionais, capazes de semear uma matriz de opinião que reflita a possibilidade de uma fraude. Os financiadores pedem ordem As conclusões da reunião não ficaram nas mãos dos dirigentes da MUD. Se tornaram missões encarregadas a Suhr, Mclenny e Sipes, que deram prioridade e à necessidade imediata de que a oposição alcance uma maior organização sobre os diversos projetos e ações previstas para os dias prévios, para o dia das eleições e também para as jornadas posteriores. Conscientes de que para pedir ordem deveriam mostrar seu poder de persuasão, os patrocinadores convidados falaram na distribuição de meio milhão de dólares como apoio solidário, para serem distribuídos através de transferências bancárias, provenientes principalmente desde a Alemanha, passando por contras já existentes na República Dominicana, em Curaçau e nos Estados Unidos.

A divisão, dólar por dólar A tabela de distribuição dos fundos foi apresentada no final da reunião: de um total de 500 mil dólares, cerca de 91 mil seriam destinados ao apoio aos candidatos opositores nas eleições parlamentares, fundamentalmente naqueles circuitos onde existem maiores possibilidades de abstenção e muitos eleitores indecisos. Timoteo Zambrano, coordenador de assuntos internacionais da MUD, foi quem assumiu o compromisso de administrar sua distribuição. Outros 98 mil dólares foram investidos no lobby internacional através de viagens, conferências, pronunciamentos e encontros com representantes dos governos. Obviamente, essa verba será controlada pela esposa pop star de López, Lilian Tintori, para turnês na Europa (Espanha, Bélgica e Suíça) e na América Latina (Uruguai, Brasil, Argentina, México, Colômbia e Chile). Os patrocinadores convidados também investiram 32 mil dólares para a promoção a grande escala de projetos, conferências, entrevistas (televisão, publicidade digital, rádio, redes sociais), assim como encontros com figuras de realce internacional, para o qual se destinaram mais 35 mil dólares. Para o apoio logístico e a preparação da imagem para as eleições parlamentares serão usados 30 mil dólares, cifra que alguns dirigentes da MUD consideraram baixa. Um montante de 50 mil dólares será para a campanha em favor da liberação dos que eles qualificam como presos políticos venezuelanos e contra as supostas violações de direitos humanos contra eles – dos quais, cerca de 20 mil irão para os meios jornalísticos audiovisuais, gráficos e portais cibernéticos, e quem os administrará é o diretor do diário El Nacional, Miguel Enrique Otero. O acordo também prevê uma maior ênfase na figura de Leopoldo López du-

Financiar a subversão Mas a maior cifra, cerca de 250 mil dólares, serão para o desenvolvimento de projetos, programas, cursos de capacitação que abordem temas de liderança juvenil, governabilidade social, sociedade civil e diretos humanos. Para isso, se selecionou um grupo de ONGs na Venezuela, encarregadas de estruturar as redes necessárias para inserir neste plano subversivo os setores juvenis, estudantis e demais, capazes de mobilizar a “sociedade civil” para enfrentar o governo. Dessa verba, cerca de 24 mil dólares foram entregues à Rede Venezuelana de Organizações para o Desenvolvimento Social (Redsoc), 26 mil para as atividades da ONG Anistia Internacional Venezuela e 20 mil para e a Corporação Venezuelana de Televisão (Venevisión), especializada em campanhas de degradação do governo. Mas há outros beneficiários: 18 mil foram para o Centro de Divulgação do Conhecimento Econômico para a Liberdade (Cedice) e 38 mil para fortalecer o acionar dos jovens do Centro de Diritos Humanos da Universidade Católica Andrés Bello. Na lista divulgada no dia 29 de setembro, 22 mil dólares foram destinados para a promoção do trabalho da Fundação Reflexos da Venezuela, 17 mil para incrementar o trabalho realizado pela ONG Transparência Venezuela, além de 16 mil para os jesuítas da Fundação Centro Gumilla. Ainda assim, 34 mil dólares serão para o trabalho da ONG Venezuela Diversa, e outros 22 mil para continuar com a capacitação de jovens através do Programa Venezuelano de Educação (Provea). Finalmente, 22 mil a mais para assegurar o apoio da associação civil Controle Cidadão, “para a segurança, a defesa e a força armada nacional”. Essas são as cifras do financiamento estrangeiro à oposição, cujo único fim é a desestabilização do país, e criar um imaginário de fraude eleitoral através do terrorismo midiático cartelizado. *Sociólogo, investigador do Observatório da Comunicação e da Democracia. Tradução: Victor Farinelli


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Terroristas do Estado Islâmico fazem novas ameaças contra a França Grupo extremista Estado Islâmico postou novo vídeo com ameaças da realização de novos atentados terroristas na França; em uma das cenas está a imagem caída da Torre Eiffel, um dos maiores símbolos franceses; gravação mostra, ainda, dois extremistas do Estado Islâmico, aparentemente de origem francesa, na província síria de Alepo – um dos redutos do grupo – elogiando os ataques a Paris e incitando outros

muçulmanos da França e do mundo inteiro a praticarem atos semelhantes Em um vídeo divulgado na internet, o grupo extremista Estado Islâmico voltou hoje a ameaçar a Europa, especialmente a França, com a realização de novos atentados, como os que ocorreram em 13 de novembro, em Paris, e custaram a morte de 130 pessoas, além de mais de 350 feridos. O vídeo mostra uma cena em que a

Torre Eiffel, um dos maiores símbolos franceses, e principalmente da capital, Paris, aparece caída, segundo um grupo de monitoramento de ameaças terrorista intitulado Site. Na gravação, aparecem ainda dois extremista do Estado Islâmico, aparentemente de origem francesa, na província síria de Alepo – um dos redutos do grupo – elogiando os ataques a Paris e incitando os muçulmanos da França e

do mundo inteiro a praticar atos semelhantes. Nos ataques de 13 de novembro, em pontos diferentes de Paris, os extremistas abriram com fuzis num restaurante onde centenas de pessoas estavam, detonaram três bombas perto do estádio onde a seleção francesa de futebol jogava com a Alemanha e fizeram reféns numa sala de concertos. Agências Lusa e Sputnik

Fotos dos atentados promovidos por membros do Estado Islâmico em Paris no dia 13 de novembro passado.

Política internacional independente

www.marchaverde.com.br Abaixo o imperialismo e o sionismo!


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A França responde ao terror doméstico com o “terrorismo de Estado” A cidade de Raqqa na Síria, impiedosamente bombardeada pela aviação francesa nos últimos dias em retaliação aos atentados em Paris na última sexta-feira tinha 338.773 habitantes na área metropolitana em 2004. Com a guerra criada pelos EUA e Otan através do Estado Islâmico, a população está reduzida a pouco mais de 100.000 habitantes, mas ainda assim é uma cidade populosa. Considerada a “capital do Estado Islâmico”, Raqqa foi capturada pelos terroristas financiados por potências ocidentais e monarquias árabes, mas ainda assim resiste, e seus habitantes sofrem muito mais com os bombardeios da França que com a presença de terroristas e mercenários vindos de diversos países financiados por EUA, Israel, Turquia, França, Inglaterra, Catar e Arábia Saudita. O presidente Hollande, chamado de “o idiota” pelos opositores, repete a utilização do terrorismo de Estado em Raqqa, como a França fez em suas excolônias ao longo dos séculos. As feridas do terrorismo de Estado francês na Argélia, Líbia (onde os aviões franceses foram os primeiros a despejarem bombas na população civil), Iraque e Síria, não cicatrizaram. Os aviões de guerra franceses voltaram a bombardear Raqqa, no leste da Síria, nesta terça-feira, anunciou o Ministério da Defesa Francês. As informações foram publicadas nesta terça-feira, no jornal Le Monde. Domingo à noite 10 caças franceses lançaram 20 bombas sobre a fortaleza do EI, destruindo um posto de comando e um campo de treinamento, mas também atingindo zonas comerciais e residenciais da cidade, fazendo centenas de vítimas entre homens, mulheres, idosos e crianças. O último ataque foi realizado esta madrugada (1 h 30 horário da França), e conduzido em coordenação com as

forças dos EUA "composto por dez caças Rafale e Mirage, que levantaram voo dos Emirados Árabes Unidos e Jordânia "e jogaram 16 bombas, um ataque de tamanho comparável ao de domingo à noite. O presidente François Hollande anunciou que a resposta da França seria "implacável" após os ataques de sexta-feira, considerado o mais sangrento já cometido no seu território. Os governantes da França não aprenderam a lição. Enquanto seguirem praticando o terrorismo de Estado como política de governo, colherão as consequências. Os familiares dos civis assassinados dos bombardeios da aviação francesa um dia vão se vingar, e o povo francês pagará pelos erros de seus governantes. A Rússia bombardeia alvos militares do Estado Islâmico, com precisão e inteligência, mesmo disparando mísseis há milhares de quilômetros de distância, enquanto a França bombardeia alvos civis e militares, indiscriminadamente, por vingança cega, praticando o pior dos terrorismos: o terrorismo de Estado. A França está deslocando um porta-aviões nuclear para a Síria para intensificar os bombardeios aos terroristas e às cidades sírias. Quanto maior a força a ser usada pelo Estado francês na Síria e Iraque, maior será a reação do terrorismo em solo francês. Isto é o que a história registra nos últimos tempos. Mas para um país em grave situação econômica, com sérios problemas de refugiados, enfrentando o terrorismo doméstico, a França parece não ter outra saída que fazer mais uma guerra para desviar a atenção da sua população aos reais problemas que afetam o país, e principalmente à incompetência de seus governantes.

O TERRORISMO DA FRANÇA QUE A IMPRENSA NÃO MOSTRA

Abel Kaheler - Marcha Verde, Brasil

O governo da França se iguala aos terroristas do Estado Islâmico ao adotar o terrorismo contra civis inocentes como estratégia de guerra. Os terroristas do Estado Islâmico atacaram civis indefesos com bombas e tiros de metralhadoras. O presidente da França, Hollande, está atacando a população civil da Síria com bombardeios aéreos. Ambos são terroristas!


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“A França está colhendo o que semeou” Entrevista do Excelentíssimo Senhor Presidente Bashar Al Assad à Tv italiana RAI O presidente Bashar Al-Assad ressaltou que os terroristas não têm tutela na Síria e que podem ser fortes, já que têm o apoio de vários países, tanto no Médio Oriente quanto no Ocidente, e são treinados com o apoio da Turquia, do Qatar e da Arábia Saudita. O Presidente Bashar Al-Assad salientou numa entrevista, concedida à televisão italiana RAI, que o Ocidente tem a responsabilidade primária pelo apoio dado aos terroristas que fundaram o "Daesh" e a "Frente Al-Nusra" na Síria, dando-lhes a cobertura necessária para proteger estas organizações terroristas. O Presidente Bashar Al-Assad destacou que os terroristas são o principal obstáculo frente a qualquer progresso político na Síria e que não é viável definir qualquer calendário para uma solução política antes de infringir a derrota ao terrorismo. A seguir, a transcrição da entrevista: Jornalista: Sr. Presidente, gostaria de agradecê-lo pela oportunidade de entrevistá-lo. Vamos começar por Paris. Como foi a sua reação à notícia sobre acontecimentos em Paris? Presidente Bashar Al-Assad: Posso começar dizendo que este é um crime terrível . Ao mesmo tempo, é muito triste termos que ouvir sobre a morte de pessoas inocentes sem razão ou justificativa. Nós, na Síria, compreendemos bem o significado da perda de familiares, de entes queridos, de amigos ou de pessoas que você conhece, num crime tão terrível quanto este. Nós, na Síria, estamos sofrendo com estes eventos há cinco anos e compartilhamos dos sentimentos dos franceses. Assim como compartilhamos dos sentimentos dos libaneses, há alguns dias atrás, e dos russos que perderam seus familiares e entes queridos no acidente que derrubou o avião no Sinai. Vale o mesmo para iemenitas. Mas será que o mundo e, especialmente, o Ocidente compartilha do sentimento destas pessoas? Ou será que sentem apenas pelos franceses? Será que sentem pela dor dos sírios, que estão sofrendo deste tipo de terrorismo por cinco anos? Não devemos politizar os sentimentos porque os sentimentos não estão relacionados com o nacionalismo, mas sim a humanidade de forma geral. Jornalista: O "Daesh" está por trás deste crime. Baseado na perspectiva de

Presidente Bashar Al-Assad para a televisão Rai italiana: "Daesh" não tem tutela na Síria”. Damasco, o quão forte é o "Daesh"? Qual seria, em sua opinião, a maneira de lutar contra os terroristas no terreno? Presidente Bashar Al-Assad: Se você quer falar sobre o poder da "Daesh", a primeira coisa que você deve perguntar é se ele possui uma tutela real ou natural numa determinada comunidade. Até o presente momento, posso afirmar que o "Daesh" não possui uma tutela natural ou social dentro da Síria. Isso é bom e reconfortante. Mas, ao mesmo tempo, se este se tornar um problema crônico, tal ideologia pode até mudar uma sociedade. Jornalista: Mas alguns dos terroristas foram treinados na Síria, a poucos quilômetros daqui. O que isso significa? Presidente Bashar Al-Assad: Isso acontece com o apoio dos turcos, dos

sauditas, dos qataris e, claro, das políticas ocidentais, que apoiaram terroristas de várias maneiras, desde o início da crise. Mas não é este o caso. Primeiramente, se não houver uma tutela, não devemos nos preocupar. Por outro lado, eles podem se tornar fortes, já que têm o apoio de diferentes países, tanto no Médio Oriente quanto no Ocidente. Jornalista: Sr. Presidente, há especulações no Ocidente de que o senhor estava entre aqueles que apoiaram o "Daesh", no início da crise, a fim de dividir a oposição e os rebeldes. Qual é a sua resposta para isso? Presidente Bashar Al-Assad: Na verdade, de acordo com algumas autoridades norte-americanas, incluindo Hillary Clinton, a Al Qaeda foi criada pelos americanos, com o apoio financeiro e ideológico wahabista da Arábia Saudita. A mesma coisa foi dita por

muitas outras autoridades dos Estados Unidos. O "Daesh" e a "Al Nusra" são duas ramificações da Al Qaeda. Quanto ao "Daesh", este foi criado no Iraque, em 2006, e seu líder era Al-Zarqawi, morto pelas forças americanas na época. Portanto, o “Daesh” foi criado no Iraque, sob a supervisão dos americanos. O líder atual do "Daesh" é o chamado Abu Bakr al-Baghdadi, que estava detido nas prisões americanas, em Nova York, e depois posto em liberdade. Portanto, não há relação da Síria nisso. O Daesh não foi criado na Síria e sim no Iraque e, de acordo com o que eles disseram, já atuava no Afeganistão. Tony Blair disse, recentemente, que a guerra no Iraque contribuiu para o surgimento do "Daesh". Então, a confissão deles é a prova mais importante no que se refere à sua pergunta. Jornalista: Sr. Presidente, quando olhamos para o mapa da Síria, parece que as fronteiras entre a Síria e o Iraque já não existem mais. Qual é a parte que vocês controlam, de fato, atualmente na Síria? Presidente Bashar Al-Assad: Se você está se referindo ao aspecto geográfico, isso muda a cada dia. Mas, o mais importante é o número de habitantes que vivem nas áreas controladas pelo governo. Na realidade, a maior parte da área controlada pelos terroristas foi esvaziada de seus moradores, tanto pelos terroristas quanto pela própria população, que fugiu para as áreas controladas pelo governo. Em termos militares, você pode ganhar algumas áreas ou pode perder uma determinada área. De qualquer forma, o exército não pode estar presente em todos os cantos da Síria. Mas olhando para o mapa descrito por você ou assistindo, de vez em quando, a mídia ocidental, quando dizem que o governo controla 50% ou menos dos territórios, a realidade é que 50% ou 60% dos territórios sírios são terras vazias, sem habitantes, e por isso as colocam sob o controle dos terroristas, já que estão completamente vazias. Jornalista: Sim. Gostaria de perguntar sobre a fronteira entre a Síria e o Iraque. Presidente Bashar Al-Assad: Tudo bem. A região localizada depois de Damasco, indo em direção ao Iraque, está vazia e, por isso, não se pode falar em controle. No que diz respeito às fronteiras, isso está relacionado aos terroristas e aos governos que os apoiaram,


06 como o governo turco, de forma essencial, bem como o governo da Jordânia. Ambos os governos apoiam os terroristas. Por esta razão, as fronteiras estão soltas, porque quando você quer o controle das fronteiras, este controle deve ser feito pelos dois lados e não de forma unilateral. Jornalista: Foram realizadas, na semana passada, duas importantes conferências que abordaram a situação na Síria, uma em Viena e a outra em Antalia. A maioria dos países fala sobre um processo de transição na Síria. Existem diferentes posições. Mas, basicamente, a maioria dos países concorda com a ideia de realizar eleições depois de dezoito meses. Entretanto, dizem que, neste ínterim, deve ocorrer a sua destituição do poder. Qual é a sua posição em relação a isso? Presidente Bashar Al-Assad: A declaração não contém nada sobre o presidente. A principal parte (da declaração) da Conferência de Viena diz que tudo o que se refere ao processo político depende do que for acordado entre os sírios. Desta forma, a frase mais importante que resultou da conferência está relacionada à Constituição e ao presidente. Qualquer que seja o presidente, ele deve ocupar ou deixar o cargo em conformidade com os procedimentos constitucionais e não de acordo com os critérios de alguma força ou de algum país ocidental. Então, desde que a conversa seja sobre o acordo entre sírios, devemos esquecer todo o resto do que foi dito em Viena, exceto este ponto. No que diz respeito ao calendário, isso depende do acordo que podemos, como sírios, alcançar. Se não alcançarmos um acordo no prazo de dezoito meses, que importância tem isso? Eu acho que existem muitas coisas que não são importantes ou essenciais. A coisa mais importante é que sentemos juntos, como sírios, e possamos definir a agenda e o plano que nos convém. Jornalista: Eu entendo. Mas a probabilidade de sua destituição do cargo não seria algo que o senhor deveria levar em consideração? Quero dizer, o senhor imagina um processo eleitoral sem a sua participação? Presidente Bashar Al-Assad: Isso depende do que você quer dizer com o processo eleitoral. Você se refere às eleições presidenciais ou parlamentares. Jornalista: Me refiro às eleições parlamentares. Presidente Bashar Al-Assad: Claro. Ocorrerão eleições parlamentares, porque essas eleições mostrarão quais forças políticas têm peso real na Síria, do

ponto de vista do povo sírio. E qual dessas forças tem bases populares. Neste momento, qualquer um pode dizer: "Eu represento a oposição". O que isso significa? Como podemos traduzi-lo? A tradução será feita através das eleições e do número de assentos que eles ocuparão no parlamento. E isso determinará a sua participação no governo que será formado. Isto é um exemplo. É claro que isso vai acontecer depois da homologação da nova Constituição. Eu estou apresentando apenas um exemplo de proposta e não definindo o que deve ser acordado. Jornalista: E sobre as eleições presidenciais? Presidente Bashar Al-Assad: Se durante os diálogos os sírios decidirem pela realização de eleições presidenciais, não haverá nenhuma linha vermelha no que diz respeito a este assunto. Esta decisão deve estar sujeita ao acordo entre os sírios. Jornalista: Mas poderia haver outra pessoa em quem o senhor confia para participar das eleições, no seu lugar? Presidente Bashar Al-Assad: Uma pessoa em quem eu confie? O que você quer dizer com isso? Jornalista: Eu quero dizer alguém que o senhor confie para ocupar o cargo de presidente. Presidente Bashar Al-Assad: Parece-me que estamos falando das minhas posses, de forma que eu possa escolher quem me substituirá. O assunto sobre o qual estamos falando não se refere a uma propriedade privada. Estamos falando de um processo nacional. Somente os sírios têm o direito de escolher a pessoa em quem confiar. Não importa se eu confio ou não em alguém. A pessoa que tiver a confiança dos sírios é quem deve ocupar o cargo.

Jornalista: Deixe-me ver se eu entendi o que o senhor disse. Qual seria o calendário realista para isso? Qual seria o calendário, do seu ponto de vista, para sair desta crise? Presidente Bashar Al-Assad: Se você quer falar sobre um calendário, então ele começa a valer após a derrota do terrorismo. Antes disso, não valeria a pena definir qualquer calendário, porque não seria possível conseguir qualquer conquista política no momento em que os terroristas controlam muitas das áreas na Síria. Os terroristas são, como eram originalmente, o principal obstáculo frente a qualquer progresso político. E se você quer falar sobre o que vai acontecer depois disso, creio que um ano e meio ou dois anos seriam suficientes para qualquer período de transição. O que eu quero dizer é: Se você quiser homologar uma nova Constituição e, em seguida, realizar um referendo, logo depois as eleições parlamentares e quaisquer outros procedimentos, sejam eles presidenciais ou não, não importa. Tudo isso não levaria mais do que dois anos. Jornalista: No que diz respeito à oposição, o senhor insistiu em dizer, ao longo dos últimos anos, que as partes que pegam em armas e lutam não fazem parte da oposição. O senhor mudou de opinião? Presidente Bashar Al-Assad: Você pode aplicar isso no seu próprio país. Vocês não aceitam qualquer oposição que pegue em armas em seu país. Isso se aplica a qualquer outro país. Qualquer um que pega em armas, aterroriza as pessoas, destrói propriedade privada ou pública e mata pessoas inocentes não pode ser um oposicionista. A oposição é uma expressão política. Você não pode definir o que é uma oposição

baseando-se numa opinião pessoal, mas sim através das eleições e das urnas. Jornalista: Então quais são as partes que o senhor considera parte da oposição política no momento? Presidente Bashar Al-Assad: Você pode perguntar aos sírios sobre quais as partes que eles consideram oposição. Se eles a elegerem, esta será a verdadeira oposição. Por isso eu disse que só poderemos defini-la após as eleições. Mas se estamos falando sobre a minha opinião, então a oposição é formada pelas partes que detêm bases populares e pertencem à este país. Você nunca será oposição se você for formado, tanto como pessoa quanto como entidade, num ministério estrangeiro ou nas sedes dos serviços de inteligência dos outros países. Você não pode ser um fantoche ou um agente ou um mercenário. Você deve ser, unicamente, um sírio. Jornalista: Vemos, agora, na Europa, na Itália, muitos refugiados sírios. O que o senhor gostaria de dizer a estas pessoas que fugiram do seu país? Presidente Bashar Al-Assad: Certamente direi que qualquer pessoa que deixa este país é uma perda para a Síria. Isso é fato. Estamos tristes e sentimos pelo sofrimento deles, porque cada refugiado tem uma história de sofrimento dentro da Síria. É disso que devemos tratar e nos perguntar sobre o motivo deles saírem. Eles estão saindo por várias razões. A primeira razão é a ameaça à qual estão expostos por parte dos terroristas. A segunda razão é o impacto que os terroristas causam quando destroem grande parte da infraestrutura e o efeito disso na vida destas pessoas. A terceira razão, ligada à importância deste impacto terrorista, é o embargo ocidental à Síria. Se você perguntar a muitos desses refugiados se eles que-


07 rem voltar para a Síria, você verá que eles querem voltar imediatamente. Mas como voltar para a Síria num momento em que foram afetados, de forma drástica, todos os alicerces de sua vida e de seus meios de subsistência. Por esta razão, eles não conseguem ficar na Síria. Os impactos do embargo ocidental e dos terroristas colocaram estas pessoas numa posição difícil, entre a cruz e a espada.

tãos, esta região rumaria em direção a um extremismo maior e assim por diante. O futuro deles é importante e não pode ser separado do futuro dos sírios. Quero dizer que, se houver um bom futuro para os sírios, então o futuro de cada um dos componentes da nossa sociedade será bom e vice-versa. Jornalista: Bem, então o senhor acha que eles têm um futuro aqui. Mas parece que os cristãos estão sendo alvos. Presidente Bashar Al-Assad: Não, isso não é verdade. Na verdade, o número de muçulmanos que foram mortos na Síria é muito maior do que o número de cristãos. Portanto, não se pode dizer que eles estão sendo alvos em particular. Novamente, os extremistas estão usando isso para promover a guerra. Eles dizem que é uma guerra contra os ateus e pela causa de Deus e tal, mas a realidade é outra.

Jornalista: Mas o senhor não se sente responsável, de alguma forma, pelo que aconteceu com o seu povo? Presidente Bashar Al-Assad: Você se refere a mim, como pessoa? Jornalista: Sim. Presidente Bashar Al-Assad: A única coisa que temos feito, desde o início da crise, é lutar contra o terrorismo e apoiar o diálogo. O que mais podemos fazer, além disso? Existe alguém que se oponha ao diálogo? Existe alguém que se oponha à luta contra o terrorismo? Se você quer falar sobre detalhes e sobre a propaganda ocidental, então não vamos desperdiçar o nosso tempo. É mera propaganda. Porque o problema, desde o início, em relação ao Ocidente é que eles não querem tal presidente. Eles querem que este governo falhe e entre em colapso, de modo que eles possam muda-lo. Todos sabem disso. Todo esse jogo ocidental é para mudar os regimes. Independentemente do que se entende por regime. Nós não temos um regime. Temos um Estado. Mas eu estou falando sobre os seus conceitos e princípios. Desta forma, você pode culpar a quem você quiser. Mas a responsabilidade principal é do Ocidente, que apoiou estes terroristas e criou o “Daesh” e a “Frente Al Nusra” na Síria, dando-lhes a cobertura necessária para proteger tais organizações terroristas. Jornalista: Então o senhor não assume qualquer responsabilidade? Presidente Bashar Al-Assad: Eu, como um sírio, não digo que nós não cometemos erros. Existem erros cometidos, em nível tático, em todos os dias de atuação. Mas existem estratégias e as estratégias que temos adotado estão configuradas nestas duas abordagens. Em termos táticos, temos cometido erros todos os dias. Cada sírio é responsável pelo que vem acontecendo. Nós, como sírios, somos responsáveis quando permitimos que esses terroristas venham para a Síria, porque alguns sírios têm a mesma mentalidade deles. E alguns sírios aceitaram servir de fantoches nas mãos dos países do Golfo e dos países ocidentais. É claro que assumimos a responsabilidade. Mas

se você quiser falar sobre a minha responsabilidade pessoal, então ela está relacionada aos detalhes e isso é difícil de julgar neste momento. Jornalista: Gostaria de perguntar sobre como foi sua visita a Moscou? Presidente Bashar Al-Assad: A visita foi para discutir a situação militar, porque ela ocorreu duas semanas antes das tropas russas iniciarem os ataques aéreos. Bem como para discutir o processo político, porque a visita também ocorreu poucos dias antes da Conferência de Viena. Foi uma visita muito proveitosa porque os russos compreendem bem esta região, em virtude de laços históricos que nos unem. Eles têm suas embaixadas e todas as relações e os meios necessários que lhes permitem desempenhar o seu papel. Desta forma, posso descrever a visita como frutífera. Jornalista: Em Roma, o Papa disse que matar em nome de Deus é uma forma de infidelidade. Esta é, na realidade, uma guerra religiosa? Presidente Bashar Al-Assad: Na verdade, não. Não é uma guerra religiosa. É uma guerra entre aqueles que se desviaram da verdadeira religião, principalmente do islamismo, e se viraram para o extremismo, e nós não os consideramos como parte de nossa religião. É uma guerra entre os verdadeiros muçulmanos, de um lado, e os extremistas de outro lado. Esta é a essência da guerra hoje. É claro que eles dão outros nomes a esta guerra, tais como a guerra contra os cristãos ou a guerra contra outras seitas. Isso

não é nada, senão nomes usados pelos extremistas para promover a sua guerra. Enquanto que a verdadeira questão é a guerra entre eles e todos os outros muçulmanos, compostos, em sua maioria, pelos moderados. Jornalista: Mesmo se eles estejam lutando em nome de Deus e matando ao dizer Deus é grande? Presidente Bashar Al-Assad: Exatamente. É desta maneira que eles promovem a sua guerra. Para isso, eles usam estas expressões ou frases sagradas. Para convencer as pessoas comuns, nesta região, de que estão lutando pela causa de Deus. Isto não é verdade, em absoluto. Alguns deles usam estas expressões, mesmo sabendo que não é verdade. E alguns as usam por ignorância e por acreditar que esta guerra é pela causa de Deus. É por isso que eu a descrevi como um desvio. Estas pessoas se desviaram do verdadeiro Islã, de forma consciente ou inconsciente. Jornalista: E quanto ao futuro dos cristãos na Síria e na sua região? Presidente Bashar Al-Assad: Na verdade, esta região, creio que os italianos e muitos no Ocidente sabem disso, é uma região moderada. Uma comunidade moderada. Especialmente na Síria. Tanto em termos políticos, sociais ou culturais. E a verdadeira razão para esta moderação é a existência da diversidade sectária e étnica. Mas um dos fatores mais importantes na história da Síria é o fator cristão, especialmente após o advento do Islã a esta região há quatorze séculos. Sem cris-

Jornalista: Sr. Presidente, antes de terminarmos esta entrevista, deixe-me fazer outra pergunta. Como o senhor vê o seu futuro? O que o senhor considera mais importante, o futuro da Síria ou permanecer no poder? Presidente Bashar Al-Assad: Primordialmente, o futuro da Síria é tudo para nós. Quero dizer que até mesmo o meu futuro, como um cidadão, não pode ser separado do futuro dela. Como um cidadão, se meu país não estiver seguro, eu não estarei seguro. Se o meu país não estiver bem, não terei um bom futuro. Isto é basilar. Mas, novamente, se você quer colocar as coisas na balança, você dirá: Se o presidente ficar, o futuro da Síria será ruim. E se o presidente se for, o futuro da Síria será bom. Isto faz parte da propaganda ocidental. E este não é o caso na Síria. Não dentro da Síria. Há quem apoia o presidente e há quem não o apoia. E assim será se o meu futuro for bom para a Síria. Se o povo sírio me quiser como seu presidente, o futuro será bom. Mas se os sírios não quiserem a minha presença e eu me agarrar ao poder, então o fato de eu ser o presidente será ruim para a Síria. É uma questão muito simples. Então não devemos seguir a propaganda ocidental e agir de acordo com ela, porque ela está longe da realidade. Nós temos que agir de acordo com a nossa realidade. Jornalista: Obrigado, Sr. Presidente, por esta oportunidade de conhecêlo. Presidente Bashar Al-Assad: Obrigado por terem vindo para a Síria.

Fonte: Embaixada da República Árabe da Síria Tradução: Jihan Arar


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Atentado em Paris: as lágrimas de crocodilo dos dirigentes europeus e dos EUA por Edmilson Costa [*] O terrorismo é um método de ação pequeno-burguês, eivado de niilismo e revolta cega, cujos autores imaginam que podem mudar alguma coisa mediante ações individuais, desligadas das massas. Além disso, quando o terrorismo é realizado indiscriminadamente, atingindo a população civil, esse tipo de ação se torna ainda mais condenável, pois mata pessoas inocentes e não serve à causa que os próprios terroristas defendem. Trata-se apenas do terror pelo terror, da barbárie pura e simples. Em algumas situações, em que se torna necessário ações específicas contra certos objetivos militares ou governamentais, no bojo de grandes lutas de massas ou dualidade de poder, essas ações podem até ser realizadas, desde que não atinjam civis ou inocentes. Esse atentado em Paris se enquadra nas ações de terrorismo puro e simples. Cerca de 130 pessoas foram assassinadas, nenhuma delas possuía relação com o governo ou tinha realizado qualquer ação contra o islamismo. Foram mortos simplesmente por estar no lugar errado, na hora errada. Tratou-se, evidentemente, de um ato bárbaro que ceifou a vida de inocentes, executado por fanáticos, sem nenhum critério político, ideológico ou militar. Na verdade, os executores desse massacre eram apenas peões guiados desde longe por interesses geopolíticos e econômicos do imperialismo, tanto europeu quanto norte-americano. O atentado deve ser duramente condenado e seus autores punidos severamente, mas é importante refletirmos: por que ocorrem tragédias tão bárbaras como esta em pleno século XXI? Os atentados realizados na França, como o das torres gêmeas nos Estados Unidos e em vários países se assemelham à lenda do feiticeiro que, ao desenvolver de maneira descontrolada o feitiço, terminou não controlando mais a alquimia e esta voltou-se contra o próprio feiticeiro. Os atentados contra as torres gêmeas foram realizados pela Al Qaeda, um grupo terrorista treinado e financiado pela CIA para lutar contra os soviéticos no Afeganistão. Enquanto lutou contra os soviéticos, Bin Laden era festejado como herói, saia em fotos ao lado de dirigentes dos Estados Unidos e era reverenciado no Ocidente. Quando a guerra acabou e os EUA tentaram descartá-lo porque este não ser-

via mais aos seus interesses, recebeu o troco, com os atentados que resultaram em milhares de mortes no centro do império. Agora a França está sentindo na carne pela segunda vez a mesma dupla moral do imperialismo. O Estado Islâmico e outros grupos terroristas que atuam na Síria foram treinados e armados pelo Ocidente para derrubar o presidente Bashar Assad, porque a Síria representa no Oriente Médio um espinho na garganta do imperialismo, uma vez que não se dobra aos interesses do Ocidente na região. Os Estados Unidos e a Europa, especialmente a França, além da Arábia Saudita, Qatar e Turquia, organizaram milhares de mercenários, oriundos de dezenas de países, construíram rede logística, doaram equipamentos bélicos altamente sofisticados para invadir a Síria e depor seu presidente. Provocaram uma guerra civil e um banho de sangue no País, cujo resultado é a morte de 280 mil sírios, entre os quais milhares de crianças, o deslocamento de 11 milhões de habitantes e o êxodo de 800 mil refugiados que hoje perambulam famintos pela Europa. Poucos também ainda lembram de que há quatro anos, o Departamento

Militar dos Estados Unidos na Europa, a OTAN, com o apoio decisivo da França e sem nenhum motivo plausível,

a não ser o desejo de derrubar o presidente da Líbia, Muamar Kadafi, colocou toda a sua máquina de guerra para bombardear a Líbia e organizou milhares de mercenários para invadir o País e matar o presidente, num espetáculo dantesco divulgado pelas TVs do mundo inteiro. Essa guerra particular do imperialismo contra uma nação soberana custou milhares de vidas, desarticulou o Estado líbio e espalhou a anarquia institucional, onde cada região do País é governada por gangues mercenárias que espalham diariamente o terror entre a população. É educativo recordar ainda que a guerra dos mercenários contra a Síria tem o apoio também decisivo da Fran-

RETRATO DA VINGANÇA DA FRANÇA NA SÍRIA - Esta é a vingança francesa na Síria: massacres de inocentes. Isto é terrorismo de Estado, embora a imprensa ocidental canalha e mercenária não admita.

ça, que forneceu armamento aos mercenários, chamados eufemisticamente de “grupos moderados”. Ao admitir que estava entregando armas para esses grupos, o presidente “socialista” francês, François Hollande, disse que os equipamentos bélicos estavam dentro do compromisso europeu com o esforço para derrubar Assad. Esse mesmo argumento foi também expresso pelo presidente dos Estados Unidos, Barak Obama, quando solicitou ao Congresso verbas para o financiamento dos “rebeldes sírios”. Qualquer observador sabe que esses mercenários são treinados em campos da Jordânia e da Turquia pela CIA e depois são enviados para a Síria. Ao chegar na Síria, as armas terminam caindo nas mãos do Estado Islâmico porque os mercenários não têm moral: lutam ao lado de quem paga mais. E o Estado Islâmico, que controla regiões petrolíferas do Iraque, tem dinheiro suficiente para absorver os novos combatentes. Tudo isso é feito com o conhecimento da CIA, resultando no fato de que o Estado Islâmico se tornou o grupo mais forte entre os mercenários no interior do País. Estado Islâmico ganha vida própria Nessa conjuntura, o Estado Islâmico ganhou vida própria. Instalou um Califado na região, instituiu leis medievais nas cidades sob seu controle, destruiu monumentos históricos, realizou um conjunto de atrocidades contra os povos das áreas ocupadas e ainda tinha a prática de degolar os habitantes que não se convertiam ao islã. Enquanto acontecia com os povos da região, essa prática era tolerada pelo Ocidente e desconhecida do grande público. Só se tornou um fato internacional quando jornalistas ocidentais e estrangeiros em geral, europeus e norte-americanos, foram degolados publicamente, com grande estardalhaço e publicidade. A partir daí o mundo inteiro tomou conhecimento dos métodos do Estado Islâmico e sua imagem se deteriorou internacionalmente. Mesmo assim a CIA e os outros serviços de inteligência ocidental continuaram fornecendo, por baixo do pano, armas e material logístico para esses terroristas continuarem matando civis na Síria. Um dos elementos da conjuntura que mostra a hipocrisia do imperialismo norte-americano e europeu na guer-


09 ra da Síria é fato de que, quando a imagem do Estado Islâmico se deteriorou definitivamente, o Estados Unidos e os países da Europa resolveram “combater” o Estado Islâmico. Era uma forma de dar alguma satisfação à opinião pública diante das atrocidades cometidas por esses terroristas. Após mais de um ano de bombardeios, o Estado Islâmico continuou mais ativo do que nunca, sofisticando suas ações, ampliando seu exército e conquistando novos territórios. Quando a Rússia decidiu, por solicitação da Síria, bombardear efetivamente os terroristas do Estado Islâmico, em coordenação em terra com o Exército Sírio, logo a opinião pública mundial tomou conhecimento do engodo que era a luta dos Estados Unidos e da Europa contra esses terroristas. Em menos de três semanas, os russos destruíram campos de treinamento, sua logística, depósitos de armas, bunkers, mudando assim o curso da guerra. A partir daí, com os terroristas em debandada, o Exército Sírio foi retomando as cidades ocupadas e demonstrando ao mundo a farsa dos bombardeios dos Estados Unidos. Ou seja, em um mês a Rússia fez mais do que os Estados Unidos e o Ocidente em mais de um ano. Diante desse fato insofismável, qual foi a reação do governo norte-americano e de seus aliados? Um cinismo risível. Quando os primeiros resultados dos certeiros bombardeios se tornaram públicos, em vez dos Estados Unidos elogiarem os russos pelos êxitos no combate aos terroristas que eles teoricamente estavam também combatendo, colocaram toda a máquina de propaganda para divulgar que os russos não estavam bombardeando o Estado Islâmico mas os “rebeldes” treinados pela CIA, que os russos erraram alvos e acertaram civis ou que bombardearam por engano território do Irã. Como essas informações eram fantasiosas e convenciam poucas pessoas, mudaram de tática e agora procuram se desvincular do jogo sujo, criando algum fato para salvar sua imagem. Recentemente, diante da inevitável derrota do Estado Islâmico pelos bombardeios russos, os Estados Unidos novamente buscam manipular a opinião pública através dos meios de comunicação a serviço de seus interesses. Ago-

ra, divulga-se que os EUA estão bombardeando efetivamente o Estado Islâmico e num desses bombardeios chegaram a matar o chefe dos terroristas que degolava os estrangeiros. Querem desesperadamente mudar a imagem, associando sua ação à morte de um terrorista “degolador de ocidentais”. Pura propaganda. Para quem estava há mais de um ano lutando contra esse grupo terrorista, matar um degolador é um feito não muito digno do exército mais bem equipado e sofisticado do mundo. Não se pode esquecer também que a França é um dos principais parceiros da Arábia Saudita, uma monarquia feudal e reacionária, principal baluarte do imperialismo no Oriente Médio. Fica muito difícil para a França dizer que todos devem se unir para combater o terrorismo, ao mesmo tempo em que é um dos principais países vendedores de armas para a Arábia Saudita, a principal financiadora dos grupos mais radicais do terrorismo internacional. Essas armas francesas terminam caindo nas mãos dos terroristas. Além disso, como país colonialista, a França não respeita a soberania dos países africanos, suas antigas colônias. Nos últimos anos, mesmo com um governo que se diz socialista, invadiu vários países para defender seus interesses. É contraditório e ridículo querer combater o terrorismo alimentando os terroristas ou os

EXPEDIENTE Editor: José Gil Correspondentes: Dilma de Cássia e Adilson Moreira (Curitiba); Armando Bragança (Rio de Janeiro) Richard Luna (Venezuela), Dmitry Muntean (Rússia), Juan Gonzalez (Equador) O jornal Mercosur é uma publicação do Movimento Marcha Verde do Paraná www.marchaverde.com.br

midiaverde@sapo.pt

países que os financiam. Em outras palavras, a política francesa para o Oriente Médio contribuiu para o fortalecimento do terrorismo no mundo. Criaram um monstro e foram atacados por ele. Os mortos de segunda classe Neste momento, todos os dirigentes dos países ocidentais estão consternados com as mortes de Paris, mas nenhum deles se sensibiliza com as mortes que ocorrem diariamente nos países da periferia, fruto da política imperialista dos Estados Unidos e da Europa. No mesmo momento em que ocorreram os atentados em Paris também os terroristas do Estado Islâmico realizavam um atentado em Beirute no qual morreram 43 pessoas e mais de 280 ficaram feridas. Há algum tempo atrás os terroristas invadiram uma universidade no Quênia e mataram 147 estudantes, da mesma forma que mataram outras centenas na Nigéria. Todos os dias palestinos são mortos pelas tropas de ocupação de Israel, num espetáculo de brutalidade que já se tornou rotina na região. Milhares de pessoal morreram na invasão da Líbia pelos bombardeios da OTAN e pelas tropas mercenárias a serviço do imperialismo. Outros milhares também morreram ou estão ainda morrendo no Iraque e no Afeganistão. Na Síria, o número de mortes causadas pela guerra imperialista já pode ser considerado um genocídio. Todas estas mortes são da responsabilidade direta da política imperialista para o Oriente Médio e a África na sua insaciável busca por fontes de petróleo, gás e matérias-primas. Para atingir seus objetivos, o imperialismo não limites.

Nenhum dirigente das potencias ocidentais veio a público condenar de forma tão indignada essas atrocidades como estão fazendo com os atentados de Paris. É a indignação seletiva do Ocidente. Parece que a vida dos árabes e africanos tem pouco valor, são mortes de segunda classe. Afinal, nenhum deles era branco de olhos azuis ou residente nas metrópoles imperialistas. Além da brutalidade como o imperialismo trata esses povos, existe também algo vinculado ao racismo, fenômeno típico das sociedades ocidentais, que cresceram e se desenvolveram explorando e humilhando esses povos. Isso pode ser visto claramente na cobertura realizada pelos meios de comunicações, também controlados pelas nações ocidentais. Nas mortes de segunda classe, eles praticamente silenciam. Tratam a carnificina no Oriente Médio e na África como uma coisa de pouco destaque. Mas quando os atentados são realizados nas vitrines do capital, nos Estados Unidos ou na Europa, os jornais realizam uma cobertura com grande estardalhaço. Passam dias e dias desdobrando o assunto. Transformam essas mortes de primeira classe numa calamidade mundial, incitam a população à solidariedade induzida e todos os dirigentes tratam esses episódios como uma guerra contra os valores ocidentais. Quem são os verdadeiros responsáveis? Na verdade, os principais responsáveis pelo terrorismo no mundo são o imperialismo norte-americano e europeu, além de Israel. São os seus governos que armam, treinam e constroem a logística e fornecem as coordenadas de


10 inteligência para esses grupos atacarem países que não seguem o receituário imperialista. Armam terroristas contra Cuba, “contras” para desestabilizar a Nicarágua, Bin Laden e a Al Qaeda para atacar os soviéticos, mercenários para invadir a Líbia e outros grupos que estão direta ou indiretamente servindo aos seus interesses. Na Síria, todos os grupos terroristas, especialmente o Estado Islâmico, foram armados e treinados pelos serviços de inteligência ocidental. O Estado Islâmico e os outros grupos mercenários que atuam na Síria são criaturas do imperialismo, filhos legítimos ou bastardos da política externa do Ocidente imperial. Sem as armas, o treinamento, a logística e a inteligência e o financiamento do imperialismo estes grupos não teriam condições de operar da mesma forma que estão operando na Síria. Como se explica que um grupo como o Estado Islâmico, inexpressivo há cinco anos, construa num passe de mágica um exército com mais de 50 mil pessoas, com armamento pesado, artilharia, tanques, mísseis e toda a parafernália militar sofisticada que utilizam atualmente? Como explica os desfiles triunfais desse grupo terrorista, com centenas de pick-up novinhas, dezenas de tanques, armamento pesado e moderno, quando conquistam uma cidade ou território? Todo esse armamento é fornecido pelos países imperialistas e por seus satélites para desestabilizar governos legítimos. Por isso, as lágrimas de crocodilo derramadas pelos dirigentes franceses e ocidentais em geral é uma tremenda hipocrisia contra a opinião pública mundial e os franceses em particular. As balas que mataram os franceses inocentes nesses atentados provavelmente foram fabricadas nos Estados Unidos, na Inglaterra ou na França e os terroristas que executaram os atentados possivelmente foram treinados pelos serviços de inteligência ocidentais. Denunciar essa hipocrisia dos líderes ocidentais neste momento, esclarecer a população sobre os verdadeiros responsáveis por esses atentados é um dever de todos aqueles querem transformar o mundo e se livrar do imperialismo. A funcionalidade do terrorismo Vale ressaltar finalmente que o terrorismo é funcional para o capital e o imperialismo, especialmente neste período de crise sistêmica global. Alimentando e financiando o terrorismo contra governos legitimamente eleitos, mas contrários à política do império, desestabiliza-se essas nações, depõe-

se seus dirigentes e implementa-se a política econômica imperialista, ampliando-se assim as fronteiras geopolíticas do capital. Pouco importa se para realizar essas ações sejam assassinados centenas de milhares de pessoas, como aconteceu na invasão do Iraque, da Líbia e na guerra mercenária contra o governo da Síria. Quando o terrorismo ganha vida própria, comete atrocidades nas regiões onde atua e esses fatos chegam à opinião pública internacional, os terroristas deixam de ser funcionais e são descartados por seus patrocinadores. Inverte-se então a equação: para vingar-se da ingratidão, os terroristas punem severamente seus antigos patrocinadores com atrocidades selvagens,

como ocorreu agora em Paris. Mas essas atrocidades são muito menores do que aquelas que praticam nas regiões onde aterrorizam as populações locais. Como são realizadas contra povos de segunda classe não ganharam manchetes nos jornais, rádio ou televisão. Mas quando ocorrem no centro do império, ganham dimensão mundial. No entanto, por incrível que pareça, esses atentados são também funcionais para o capital em época de crise. Sob o pretexto de combater o terrorismo, os governos ocidentais promulgam leis cada vez mais repressivas contra a população e os trabalhadores. Procuram criminalizar os movimentos sociais. Os partidos de extrema-direita, ganham novos argumentos para perseguir os

imigrantes e crescerem eleitoralmente em seus países, tornando-se uma reserva de valor político muito importante que poderá ser utilizada nos momentos de agravamento da crise, como ocorreu no período anterior à Segunda Guerra. Portanto, as lágrimas de crocodilo dos dirigentes ocidentais representam não só a hipocrisia dos representantes de uma classe apodrecida e a dupla moral do imperialismo, mas principalmente a necessidade de superar o sistema imperialista. [*] Doutorado em economia pela Universidade Estadual de Campinas e secretário de Relações Internacionais do Partido Comunista Brasileiro. Resistir.info


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Iraque encontra bombas do Estado Islâmico dentro de bonecas

Colonos israelíes queman a un joven palestino en Kafr Kanna

Policía israelí encuentra el cadáver quemado de Fadi Hoosh en el vertedero de basura de Kafr Kanna, 21 de noviembre de 2015.

Em seu mais recente plano cruel, o Estado Islâmico tenta bombardear peregrinos xiitas no Iraque colocando bombas dentro brinquedos em estrada. As forças de segurança do Iraque encontraram e destruíram 18 bombas disfarçadas de bonecas em alHusseiniya, uma vizinhança xiita de Bagdá, informou a PressTV. Militantes planejavam colocar os explosivos ao longo da estrada que liga a capital à cidade de Karbala. No mês que vem, milhões de xiitas de todo o mundo caminharão por essa estrada durante o Arbain anual. O evento marca o fim de um luto de 40 dias após o Dia de Ashura, que comemora a morte de Imam Hussein, neto do profeta Maomé. A peregrinação, uma das maiores e mais perigosas do mundo, é constantemente alvo de ataques terroristas. No ano passado, 17,5 milhões de peregrinos foram até Karbala, localiza-

da a 65 quilômetros da capital. Cerca de 40 mil oficiais da lei foram posicionados para fortalecer a segurança. Três pessoas morreram em uma explosão em Bagdá. Em 2013, um número recorde de 20 milhões de pessoas viajaram até o santuário de Imam Hussein em 2013, segundo a PressTV. Naquele ano, dezenas de peregrinos xiitas foram assassinados em atos terroristas cometidos pela al-Qaeda e por outros grupos. Sputniknews Nota da redação: A cada dia que passa a ação dos terroristas do Estado Islâmico ficam mais parecidas com as ações terroristas dos israelenses. Na década de 90 os militares de Israel despejaram centenas de brinquedos contendo explosivos nas vilas e cidades palestinas, provocando a amputação de mãos de centenas de crianças palestinas. E as Nações Unidas - criminosamente - silenciaram.

En otro episodio de extremismo y violencia israelíes contra la comunidad palestina, la policía israelí informa del hallazgo del cadáver de un joven. Según un informe del sábado del portal palestino Days of Palestine, la policía israelí encontró la noche del viernes el cadáver calcinado del palestino beduino Fadi Hoosh, de 22 años de edad, en Kafr Kanna, norte de los territorios ocupados palestinos. Citando a testigos locales, medios de comunicación israelíes detallaron que jóvenes israelíes acabaron con la vida del ciudadano palestino y depositaron el cuerpo en su coche en el vertedero de basura de la citada urbe. Los testigos aseguraron haber visto cómo varios colonos israelíes golpeaban el cuerpo sin vida de Fadi, luego lo pusieron en el coche y prendieron fuego: “Después de un par de minutos extinguieron el fuego, lo colocaron en el interior del coche y huyeron rápidamente del lugar”. Por tanto, agregaron, el coche solo fue dañado desde el interior, y no lleva señales de daños o quemadura desde el exterior.

La policía israelí trasladó el cadáver de Fadi para llevar a cabo las tareas de autopsia y conocer las causas de su muerte o encontrar alguna pista relacionada con los autores, mientras que ha asegurado que en el fondo no se trata de un acto criminal. No es la primera vez que colonos israelíes atacan a ciudadanos palestinos. En el caso más reciente, en la noche del pasado 30 de julio, un grupo de colonos israelíes atacó con cócteles molotov una casa palestina en la localidad de Kafr Duma, en la ciudad cisjordana de Nablus. En este ataque murió quemado vivo un bebé de 18 meses, Ali Saad Daubasha. El 8 de agosto de 2015, el padre del niño Saad murió en el hospital de Soroka, donde había sido tratado por quemaduras en el 80 por ciento de su cuerpo. A principios del pasado septiembre, también, la madre del niño palestino murió por la gravedad de sus quemaduras. La Unión Europea (UE) tachó de “intolerable” esa atrocidad y, Husam Badran, portavoz de política exterior del Movimiento de la Resistencia Islámica Palestina (HAMAS), aseguró que la Resistencia no dejará sin respuesta este crimen de los israelíes. El 8 de septiembre, la Organización de las Naciones Unidas (ONU) expresó su profundo dolor por el caso y su preocupación por la ignorancia del régimen de Israel a la hora de castigar a sus responsables. tas/ctl/mrk - HispanTv

O PAÍS MAIS TERRORISTA DO MUNDO: EUA


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Terror do Estado Islâmico e a Conexão Washington Na noite de sexta-feira, 13/11, três bandos, com oito pessoas no total, atacaram sete alvos em Paris. Mataram cerca de 130 pessoas e feriram centenas mais. A maioria dos mortos assistia a um concerto musical, uma noite de convívio alegre interrompida por um fim abrupto e terrível. O Estado Islâmico do Iraque e Grande Síria (ISIS) assumiu rapidamente a responsabilidade. O presidente François Hollande descreveu o ataque como um “ato de guerra” e declarou estado de emergência, pela primeira vez desde a Segunda Guerra Mundial. A sombra do conflito fratricida que já dura cinco anos na Síria atingiu agora o coração da cultura ocidental. Desde que o ISIS atraiu a atenção mundial, após a dramática tomada de Mosul em junho do ano passado, seguida pela ocupação de outros territórios ao longo da fronteira entre Iraque e Síria e pela declaração do “Califado” naquelas terras da histórica Mesopotâmia, os conflitos na região tiveram desdobramentos novos, e cada vezmais brutais, praticamente todos os dias. Centenas de soldados sírios, yazidi, curdos e outros civis iraquianos – além de alguns reféns ocidentais – foram sumariamente executados por decapitações, com frequência filmadas e divulgados amplamentenas mídias sociais em todo o mundo. Embora atacado pelas forças dos Estados Unidos e pelas monarquias do Golfo Pérsico aliadas a Washingon, o ISIS não sofreu nenhum grande revés militar. Ao contrário: consolidou-se gradualmente, a ponto de converter-se em um proto-Estado, com muitos dos atributos da ordem estatal – exército permanente, recursos financeiros substanciais, um conselho de ministros, governadores provinciais, um sistema judicial em funcionamento, uma força de segurança inflexível e prestação de serviços municipais e de bem-estar.Aparentemente, não tem dificuldades para atrair recrutas que correm para se juntar a suas fileiras e levar a cabo atentados e missões suicidas. O respeitado especialista em assuntos árabes Abdel Bari Atwan estimou recentemente que o ISIS tinha um quadro de cerca de 100 mil combatentes. Estão principalmente do mundo árabe, mas também de outros países da Ásia e até mesmo – alguns milhares – na Europa. Nos últimos meses, o ISIS fez sentir sua presença fora da Mesopotâmia – na Líbia, a oeste, e noAfeganistão, a leste. Também expandiu sua base de apoio, com um número crescente de corpos jihadistas (ou seus grupos dissidentes) que declaram filiação ao Califado, preferindo-o à Al Qaeda. Nos últimos meses, à medida em que que o ISIS levava adiante suas ações devastadoras, a guerra na Síria entrou num impasse. As forças salafistas apoiadas pelas monarquias do Golfo são incapazes de derrotar as forças nacionais ainda leais ao presidente Bashar al-Assad. A situação mudou dramaticamente quando, a partir de 30 de setembro, a Rússia envolveu-se no conflito, ao lado do governo Assad, instalando na Síria aviões, tanques e de vigilância. Moscou realizou bombardeios letais contra todas as forças hostis a Assad, não se importando em distinguir entre o ISIS e as outros grupos terroristas, embora o primeiro tenha sofrido pelo menos um quinto dos ataques. Em 10 de novembro, as forças sírias apoiadas pela Rússia tomaram do ISIS a parte oriental da cidade de Aleppo e a base

aérea de Kweiras, ameaçando as conexões logísticas do grupo com Raqqa e seus territórios no Iraque. A consolidação das forças curdas da Síria, junto à fronteira turca, já bloqueou o fluxo de armas e recrutas que abasteciam o Califado Islâmico a partir da Turquia. O ISIS tem respondido a esses ataques com duras represálias a seus inimigos. Em 10 de outubro, realizou um duplo atentado em Ankara, na Turquia, no qual 128 pessoas, principalmente manifestantes pró-curdos, foram mortas. Em 31 de outubro, reivindicou responsabilidade pela queda do avião de passageiros russo que voava de Sharm el Sheikh para São Petersburgo, no qual mais de 200 pessoas perderam a vida. Em 6 e 12 de novembro, realizou dois bombardeios no Líbano matando mais de 40 pessoas e regozijando-se de ter atacado com sucesso xiitas “apóstatas”. O comentarista libanês Khalil Harb pressagiou, já então: “muito mais derramamento de sangue está a caminho.” No dia em que ocorreram os ataques em Paris, os EUA anunciaram que seus drones haviam matado Mohammed Emwazi, também conhecido com “John Jihadi”, membro do ISIS nascido no Reino Unido que comandou vários assassinatos filmados e assistidos no mundo todo. Comentando essas notícias, o primeiro ministro britânico David Cameron disse que havia sido um ataque “ao coração da organização terrorista”. Por sua parte, os norte-americanos também anunciaram que haviam matado o líder do ISIS na Líbia, Abu Nabil, de nacionalidade iraquiana. Os ataques a Paris são, portanto, parte dos ataques olho-por-olho que vêm ocorrendo nos últimos meses e são diretamente ligados ao conflito na Síria. A reação a esses ataques, pelos protagonistas em conflito na Síria, reflete sua divisão profunda e sectária. Ambos – Hezbollah e 49 grupos de milicianos anti-Assad – condenaram fortemente os ataques. Mas enquanto o Hezbollah vê o ISIS como um produto do apoio a terroristas

dado pelas monarquias do Golfo e pela Turquia, as milícias declararam que Assad encontra-se no coração da atividade terrorista na Síria. Os ataques a Paris marcam a primeira ocasião que o ISIS saiu da Asia Ocidental para organizar atentados no “inimigo distante” no Ocidente, indicando assim que assumiu a agenda de jihad global da Al Qaeda. Novamente, embora ainda não se saiba se os ataques a Paris foram realizados por membros locais do ISIS, criados no país, ou se houve alguma participação de especialistas da liderança central, é claro que o ISIS tem resiliência considerável e construiu, num curto período, redes que o habilitam a penetrar o cordão de segurança nas nações “desenvolvidas” Cumplicidade ampliada As monarquias do Golfo Pérsico lideradas pela Arábia Saudita, a Turquia e os EUA emergem desse imbroglio com pouco crédito. Os sauditas têm continuam focados na mudança de regime na Síria.Isso permitira transformar a guerra civil que se trava lá num grande confronto sectário, no qual Riad apoiara grupos jihadistas, incluindoo Jabhat al-Nusra (um grupo ligado à AlQaeda) em sua guerra por procuração contra o Irã. O presidente turco Recep Tayyip Erdogan,nas etapas iniciais do conflito sírio, estava igualmente obcecado com derrubar Assad, visto como um defensor dos curdos sírios contra a Turquia. Erdogan permitiu o livre fluxo de jihadistas através da fronteira turca com a Síria, o que reforçou as fileiras do ISIS. A atitude dos EUA tem sido a mais débil e sem princípios: enquanto inicialmente rejeitava o envolvimento militar direto na Síria, Washingto deu apoio aos sauditas, em troca do apoio das monarquias do Golfo a o acordo nuclear com EUAIrã. Por isso, os jihadistas dominaram a oposição ao governo sírio. Muitos dos grupos antiAssad negociavam suas armas com o ISIS ou simplesmente juntavam-se a suas fileiras. Mais tarde, os EUA viram a entrada da Rússia na Síria

como uma ameaça à sua hegemonia global, e trabalharam com as monarquias do Golfo para enfraquecer o esforço militar russo, fornecendo aos terroristas mísseis TOW mais eficazes contra tanques russos. Contudo, recentes relatórios dos EUA sugerem uma culpa ainda mais grave por parte dos norte-americanos. O tenente-general Michael Flynn relatou, em agosto deste ano, que, após o fracasso militar dos EUA no Iraque, em 2006, o grupo de falcões norte-americanos conhecido como “neoconservadores” (neocons)persuadiu o vice-presidente Dick Cheney a apoiar iniciativas para derrubar o regime de Assad criando “uma cunha entre a Síria eo Hezbollah”. Isso seria feito apoiando a criação de um “principado salafista” no leste da Síria. Segundo os relatórios, foi o início do apoio da Arábia Saudita e de outras monarquias do Golfo aos jihadistas sunitas no Iraque – que depois metamorfosearam-se em ISIS. O Conflicts Forum, que publicou o relatório, conclui: “A jihadização do conflito sírio foi uma decisão política ‘intencional’ [do governo dos EUA].” Em comentários públicos feitos em outubro de 2014, o vice-pesidente Joe Biden colocou o dedo na ferida. Ele reconheceu: “…na Síria, nosso maior problema foram nossos aliados na região.Estavam tão determinados a derrubar Assad e promover uma guerra entre sunitas e xiitas … [que] ofereceram centenas de milhões de dólares e dezenas, milhares de toneladas de armamentos a qualquer um que lutasse contra Assad. Não importava se estes grupos eram parte da Al-Nusra e Al-Qaeda, oujihadistas vindos de outras partes do mundo.” O caminho que o ISIS fez, da Síria a Paris, tem origem em Washington. Por Talmiz Ahmad, no site Outras Palavras * Tamiz Ahmad é ex-embaixador da Índia na Arábia Saudita, Omane União dos Emirados Árabes. Tradução de Inês Castilho.


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