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Quando você começou sua trajetória no grafite? Qual era o contexto urbano em

Nova York e suas motivações?

O momento em que percebi que existia algo chamado grafite foi no final da década de 1960. Você via por todo lugar. Eu era uma criança e percebia, enquanto crescia, que o grafite estava por todos os lados, como tag. Mas só comecei a entrar no grafite, fazendo tags, quando fugi da casa da minha mãe para ir morar com o meu pai, no começo da década de 1970.

Nessa época, o Bronx tinha muitas gangues e muitas drogas, era um bairro perigoso. Comecei a fazer tags quando entrei em uma, os Bronx Enchanters [Encantadores do Bronx]. Escrevia “King13”, e também o nome da gangue, nas paredes e caixas de correio. Foi só quando eu saí dela e fui para outra, os Renegades of Harlem [Renegados do Harlem], que comecei a escrever nos trens. Danko, Smoky, Diamond Dave e eu fazíamos motion tagging [pintar e grafitar com o trem em movimento]. Nesse período, eu usava a tag “Sen102”, que continuei fazendo até 1977, quando fui baleado e decidi sair do mundo das gangues. Foi nesse momento que eu me tornei T-Kid 170.

Como você criou o nome T-Kid?

T-KID

Quando eu estava no hospital depois de ter sido baleado, meu irmão comprou um caderno de rascunho e algumas canetas El Marko e Buffalo para mim. Eu escrevia e rascunhava no papel. Escrevia um grande “T”, escrevia “Kid”. Então olhei para os desenhos e vi que os dois juntos eram muito legais, e era original: T-Kid. O interessante é que pode significar muitas coisas: The Kid, Terrible Kid, Tenacious Kid, Terrorizing Kid. Foi assim que criei o nome, no hospital, em 1977, me recuperando. Foi muito louco, mas o nome pegou.

Quando escrevia em paredes, caixas de correio e tudo o mais que encontrava, era vandalismo. Não tinha permissão para fazer isso, e essa era a maneira como as pessoas viam. A gente não buscava permissão, a gente só fazia. É bem interessante como o grafite se transformou no que é hoje em dia, apesar de as pessoas o odiarem tanto.

Na passagem dos anos 1970 para os 1980, com a revolução cultural que se iniciou no Bronx, com o hip-hop, as pessoas passaram a ver o grafite de uma maneira diferente. A percepção começou a mudar porque as galerias no centro da cidade, em Manhattan, começaram a aceitar o grafite como um meio de ganhar dinheiro. A Autoridade de Trânsito [que administra os trens] e muitas pessoas odiavam o grafite porque achavam que a arte precisava ser limpa, ter uma estética, que é o que a mentalidade conservadora sempre pensou. Apesar disso, muitas pessoas tiveram a mente aberta e viram a verdadeira arte. O grafite é a única expressão artística que sempre se comunicou rompendo barreiras como raça, religião, idade. Não importa de onde você é, qual sua idade e no que você acredita ou não, o grafite te toca.

Por causa desse movimento cultural do Bronx, pessoas como [o fotógrafo] Henry Chalfant e [a fotojornalista] Martha Cooper documentaram o que acontecia em um livro. Assim que a publicação se internacionalizou, o movimento virou um fenômeno mundial. Tenho certeza de que muitos artistas hoje em dia, inclusive no Brasil, foram influenciados. Por exemplo, a história de OSGEMEOS. Eles conseguiram uma cópia xerocada do livro e isso os inspirou. Nosso movimento criou a fundação. Criamos, colocamos nos trens, e isso motivou e inspirou muita gente, a ponto de virar um fenômeno global. No meio disso tudo, para escapar do estigma da palavra grafite, começaram a chamar de arte de rua – afinal, é arte na rua.

Quando começou a ficar mais difícil de pintar os trens, o grafite passou a ir para as paredes, que eram mais aceitas pelo público, porque você podia pedir permissão. Não estávamos mais diante de um grande departamento federal, estávamos lidando com indivíduos, que gostavam ou não. Alguns reconheciam seus muros e paredes como um bom espaço para exibir arte, e isso foi uma transformação incrível.

Tudo se resume à maneira como você percebe o mundo: o quão conservador ou liberal você é, qual é a sua visão. A minha motivação sempre foi estabelecer o grafite como arte, porque ele é. É um meio de expressão, como a arte também é, seja ela visual, física ou performática. Arte é sobre expressão.