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A visão de representantes das marcas

A revista abolsamia pediu a quatro representantes de marcas uma leitura ao mercado nesta fase do ano.

1 - O ano de 2023 arrancou em forte quebra e piorou em fevereiro mas já melhorou no fim do primeiro trimestre, embora continue negativo (-28,78%). A quebra era expectável? Como prevê a evolução do mercado nos próximos três meses?

2 - Depois da preponderância do escalão 51-120cv no ano passado, os representantes das marcas contactados no fim do ano indicavam que este escalão voltaria a perder peso este ano em detrimento do <50cv, que é o que está a acontecer. Tem a ver só com a ausência de novo programa de abates ou há mais razões a justificar esta alteração?

3 - Que medidas considera que poderiam ser tomadas por parte do Governo em relação aos apoios previstos para renovação do parque de máquinas?

4 - E as empresas, que tipo de estratégias podem desenvolver de forma a contribuir para a revitalização do setor?

Bruno Pignatelli

Bruno Pignatelli

Gerente da Tractores Ibéricos

“Não prevejo grandes alterações nos próximos meses”

1 – Sim, a quebra era expectável, face não só ao que vinha já a ocorrer desde meados do ano passado, bem como ao agravar da situação económica em que a inflação não só fez disparar preços como, ao mesmo tempo, os juros dispararam e fizeram com que os financiamentos também ficassem mais caros. A juntar a isto tudo, acrescentar que não existem projetos com ajuda do Estado em curso e não se vislumbram a curto prazo… infelizmente e em face do que disse, não vejo grandes alterações nos próximos meses.

2 – Não diria que está a perder peso mas sim que o escalão dos <50cv está a crescer bastante. Do meu ponto de vista, terá a ver com alguns fatores tais como a diminuição das importações de tratores sem matrícula durante a pandemia, a limitação de não poderem circular na via pública e ainda o aparecimento de várias marcas provenientes de mercados mais baratos. O que faz com que os preços desses tratores sejam atrativos não só para esse tipo de mercado mas também para os clientes de motocultivadores e de uso menos profissional. No caso da nossa marca, os modelos nessa gama (linhas B1 e B2) continuam a ser vendidos a bom ritmo e, como é sabido, a Kubota com a sua participação maioritária na fábrica Escort na Índia, coloca também no nosso mercado esse tipo de produto mais barato, com a marca E-Kubota.

3 – Creio que retomar e lançar o quanto antes esses apoios seria não só fantástico para o nosso mercado mas também uma maneira de modernizar o parque com todos os benefícios, não só de segurança e ambientais, bem como de otimização de custos de operação dos agricultores. Terá que ser é bastante mais abrangente do que foi o último, onde apenas foram contemplados alguns agricultores e sobretudo das regiões mais desfavorecidas. Nada contra essas ajudas, sempre a apoiar regiões mais distantes dos centros de decisão e com maiores dificuldades mas deve-se também apoiar agricultores com perfil mais profissional e com dimensão para concorrer em diversos mercados, muitos deles no exterior.

4 – Da nossa parte, continuar a apresentar-nos no maior número de eventos a nível nacional (nomeadamente na FNA e na Agroglobal), onde apresentaremos as nossas soluções de produto. Também continuamos, em conjunto com o BNPLeasing, a procurar as melhores soluções financeiras para ajudar na aquisição de equipamentos. Continuar em conjunto com a nossa rede de concessionários e com os clientes finais a colaborar para que, junto da nossa representada, encontremos as melhores soluções para as suas necessidades.

João Bizarro

João Bizarro

Diretor Comercial Tratores New Holland

“Governo devia clarificar se voltará a conceder os apoios”

1 – A quebra era esperada. Em igual período de 2022 entregavam-se muitas unidades vendidas ao abrigo da campanha de abate. A verdade é que o mercado não está em quebra no primeiro trimestre deste ano mas sim desde Maio do ano transato.

2 – Por se tratar de um escalão de potência (51-120 cv) mais profissional, os apoios comunitários ou a ausência deles condiciona muito as matriculações. Existe também alguma incerteza em alguns setores como por exemplo a produção de leite, olival, amendoal ou vinha.

3 – No mínimo, clarificar se voltará a abrir este tipo de apoios. A incerteza leva os potenciais compradores a retraírem-se e, mesmo necessitando, acabam por ir adiando essa decisão. A última unidade entregue ao abrigo da campanha anterior tinha uma pontuação demasiado elevada. Grande parte do território acabou por não beneficiar e, em minha opinião, muitos agricultores (até mesmo de zonas mais profissionais) não foram abrangidos. Se o Governo reforçasse agora com verbas semelhantes à campanha anterior, utilizando os projetos já inseridos/não contemplados, chegaria a todo o país e a todo o tipo de agricultor.

4 – Só para recordar, nos últimos 5 anos, houve escassez de matéria-prima, falta de chips e conectores, dificuldade em obtermos contentores disponíveis, preço dos transportes marítimos internacionais (em alguns casos aumentou para o triplo), grandes condicionamentos nas fábricas durante o período crítico na pandemia, ocupação da Ucrânia, aumento do custo geral da energia… As empresas que comercializam máquinas agrícolas vivem em constante adaptação.

Nuno Santos

Nuno Santos

Diretor comercial do Entreposto Máquinas

“Esperamos que no próximo trimestre a queda seja menos acentuada”

1 – A queda que se registou no início deste ano era previsível e em linha com a tendência dos últimos meses de registos do ano anterior, talvez não tão acentuada, mas ainda assim não se pode falar em surpresa, considerando o enquadramento atual. Pensamos que, nos próximos três meses, a tendência de quebra relativamente ao período homólogo do ano transato se mantenha, mas esperamos que seja um pouco menos acentuada do que foi nos dois primeiros meses do ano.

2 – Sim, a ausência de incentivos ao abate/troca de equipamentos neste segmento tem uma consequência direta nos números. Por outro lado, o nosso tecido empresarial agrícola tem registado a tendência de profissionalização crescente, o que normalmente implica maior crescimento relativo neste segmento e nos segmentos de maior potência por oposição ao dos compactos mais ligados ao “Hobby Farming” e explorações de menor dimensão.

3 - O programa de incentivo ao abate e renovação de equipamentos mais antigos, mais poluentes, menos eficientes e menos seguros foi um sucesso que poderá muito bem ser continuado, mas devemos apostar mais nas novas tendências disponíveis que permitem melhorar significativamente a competitividade dos nossos clientes empresários, associando o equipamento a características diferenciadoras, como o sistema de conetividade e análise em tempo real, automatização e semi-automatização, e mesmo software de análise de frota e agronómicos, entre muitas outras e novas soluções já disponíveis.

4 – A aposta em divulgação, formação e consultoria junto dos profissionais é essencial para dinamizar o desenvolvimento de soluções e produtos. A simplificação e flexibilização de processos e modelos de negócios disponíveis para os nossos clientes deve ser desenvolvida criando novas formas de fazer negócio para além das “clássicas” de compra/venda. Por último, ter uma voz de conselho/opinião, quer junto das associações de agricultores, quer das entidades reguladoras e governantes seria um contributo positivo para o desenvolvimento do nosso setor.

Arnaldo Caeiro

Arnaldo Caeiro

Diretor Geral da SDF Portugal

“Critérios de aprovação das candidaturas à renovação do parque de tratores frustraram os agricultores”

1 – Esta quebra era expectável sobretudo depois do forte crescimento que o mercado teve no primeiro trimestre de 2022 em grande parte devido à medida de renovação do parque de tratores. Nos próximos três meses devido às baixas expectativas dos agricultores, agravadas pela situação da seca, esperamos uma queda do mercado.

2 – O segmento de potência 51-120cv aumentou em 2022 muito por influência da medida de renovação do parque de tratores. É um facto. No entanto, dentro do segmento de potência 51-120cv, temos que fazer a separação entre os tratores de 51-100cv, destinados maioritariamente a clientes não profissionais, e consequentemente muito dependentes dos apoios ao investimento, e os tratores acima de 101cv que, podemos dizer, são na sua maioria destinados a clientes profissionais onde a compra é, em grande parte, determinada por fatores dependentes da rentabilidade da atividade agrícola. A confirmar isso verificamos que entre Janeiro e Março de 2023 o segmento 101-120cv tem uma queda menor do que o segmento 51-100cv. Relativamente ao segmento <50cv, aumentou o peso relativo no mercado total sobretudo devido às vendas de tratores abaixo dos 26cv.

3 – A medida de renovação do parque de tratores recebeu 7.120 candidaturas das quais só 1362 foram aprovadas, o que significa uma taxa de aprovação de 19%. Este resultado ficou muito aquém do esperado e, em certa medida, causou frustração nos agricultores, sobretudo porque os critérios de pontuação das candidaturas foram, na minha opinião, pouco ou nada adequados à realidade agrícola do País. O Ministério da Agricultura decidiu avançar com essa medida em 2021 sem consultar a entidade que representa as empresas que atuam no mercado do tratores agrícolas, a Comissão Especializada de Grossistas de Máquinas Agrícolas da ACAP e, como tal, o resultado está à vista de todos: das 1.362 candidaturas aprovadas, 68% foram na Zona Norte, 27% na Zona Centro, 3% no Alentejo e 2% no Algarve. É nossa convicção que a medida deveria continuar, embora com critérios de pontuação diferentes de modo a beneficiar todas as regiões de forma equitativa. É publico também que em março foram disponibilizados 126 milhões de euros no PDR2020 que irão beneficiar cerca de 2100 candidaturas pendentes por falta de dotação orçamental. Esperamos que esta decisão possa beneficiar o mercado dos tratores agrícolas.

4 – Ao nível das empresas, creio que todos enfrentamos uma situação semelhante, com quedas acentuadas das vendas, devido à quebra do mercado total. Quando o mercado está em queda acentuada, a estratégia passa sobretudo por melhorar a competitividade dos nossos produtos. Naturalmente que cada marca tem a sua maneira própria de atuar no mercado.