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UENF

Revista da Universidade Estadual do Norte Fluminense Darcy Ribeiro - Ano 1 - Nº 2 - Maio de 2008

Superando desafios Alunos garantem que, com esforço e determinação, não é preciso ser gênio para estudar na Uenf

Vida de cientista A imagem idealizada dos cientistas esconde profissionais que, no diaa-dia, têm que lidar com problemas e situações comuns a todas as pessoas Renato DaMatta, pesquisador

Em defesa das aves Aluno da Uenf ganha primeiro lugar em concurso de fotografia


Nesta Edição Flagrante inédito na ciência

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Vida de cientista

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Pesquisadora da Uenf filma momento exato em que verme penetra em carrapato; processo pode ajudar no controle biológico do animal A imagem idealizada dos cientistas esconde profissionais que, no dia-a-dia, têm que lidar com problemas e situações comuns a todas as pessoas

Ciência para o futuro do planeta Medir a ‘sede’ da planta pode gerar novos conhecimentos sobre seqüestro de carbono e efeito estufa; pesquisas envolvem cooperação entre Uenf e EUA

Cupim: um problema urbano

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Superando desafios

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Pesquisadores da Uenf detectam, em Campos, espécies de cupins até então restritas às áreas florestais

Alunos desmistificam a idéia de que é preciso ser gênio para estudar na Uenf

Em vez de antigüidades, insetos

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Museu Entomológico da Uenf possui cerca de 50 mil espécimes

Por que não aqui? Como em São Carlos (SP) e Santa Rita do Sapucaí (MG), a Incubadora TEC Campos quer transformar conhecimento acadêmico em desenvolvimento

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Em busca de um norte

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Em defesa das aves

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Entrevista com José Luis Vianna da Cruz sobre perspectivas para o Noroeste Fluminense

Expediente

Aluno da Uenf ganha primeiro lugar em concurso de fotografias Governador do Estado Sérgio Cabral Vice-Governador do Estado Luiz Fernando Pezão Secretário de Ciência e Tecnologia Alexandre Cardoso Reitor da Uenf Almy Junior Cordeiro de Carvalho Vice-reitor Antonio Abel Gonzalez Carrasquilla Pró-reitora de Graduação Lílian Maria Garcia Bahia de Oliveira

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Diretor do CBB Arnoldo Rocha Façanha Diretor do CCT Alexandre de Moura Stumbo Diretora do CCH Teresa de Jesus Peixoto Faria Diretor do CCTA Hernán Maldonado Vásquez Diretor de Projetos Ronaldo Paranhos

Pró-reitor de Pesquisa e Pós-Graduação Edson Corrêa da Silva

Diretor Geral Administrativo Marco Antônio Martins

Pró-reitor de Extensão e Assuntos Comunitários Silvério de Paiva Freitas

Prefeito do Campus Paulo César de Almeida Maia

Jornalistas Responsáveis Fúlvia D’Alessandri e Gustavo Smiderle

Projeto Gráfico Felipe Moussallem

Estagiários: Felipe Oliveira, Nériton Toledo, Thaís Bereta, Whytney Magalhães

Dá para acreditar? Prezado leitor, estimada leitora, se a elaboração desta segunda edição trouxe algum aprendizado à equipe da NOSSA UENF, ele foi o seguinte: não se faz um texto convincente sem acreditar no que se escreve. Veja só que interessante: pautamos uma matéria com o claro objetivo de mostrar que a Uenf é uma universidade de qualidade, mas não inacessível. Paira entre parte da população estudantil da região o mito de que estudar na Uenf é coisa para poucos — talvez para os superdotados ou para aqueles que só vivem para estudar. Pois bem: para preparar esta matéria e desmantelar esse mito, o primeiro obstáculo que tivemos que superar foi a desconfiança de nossas próprias estagiárias. Também elas, recém-chegadas ao ambiente da Assessoria de Comunicação da Uenf, traziam cristalizada essa representação da Uenf como universidade inalcançável para o comum dos mortais. Mas isto é um mito, e temos certeza de que você vai se convencer disto depois de ler nossa matéria de capa. Outro exemplo: você já deve saber que Campos inaugurou em maio sua Incubadora de Base Tecnológica, a TEC Campos. Quem está metido nessa empreitada garante: a incubação (uma espécie de berçário de futuras empresas) é o melhor caminho para se começar a transformar conhecimento acadêmico em desenvolvimento tecnológico local ou regional. Só que profissional de comunicação é um bicho desconfiado. Ele já ouviu falar de muitas coisas que foram apresentadas como a “salvação da lavoura” ou a “redenção da região”, mas também sabe que o desenvolvimento verdadeiro não é coisa simples de se fazer. Então, fomos em busca de outras experiências nessa área pelo Brasil afora. Se você acha que as universidades poderiam ser ainda mais úteis do que têm sido para o desenvolvimento regional, dê uma olhada nessa matéria e tire suas próprias conclusões. No mais, passeie pela NOSSA UENF como quem se sente em casa, pois a universidade pública também lhe pertence. Tem muito mais matéria interessante. Boa leitura!


Flagrante inédito na ciência Pesquisadora da Uenf filma momento exato em que verme penetra em carrapato; processo pode ajudar no controle biológico do animal

Flagrante: Inês capturou o nematóide na hora em que penetrava no carrapato fêmea

Pela primeira vez, cientistas conseguiram flagrar o momento exato em que um nematóide entomopatogênico (verme que atua no controle biológico) penetra em um carrapato através de seu espiráculo (orifício usado para a respiração). O flagrante, obtido pela mestranda Inês Ribeiro Machado, do Programa de Pós-Graduação em Produção Vegetal da Uenf, ocorreu durante pesquisa onde foram testadas, com sucesso, duas espécies diferentes de nematóides no controle biológico do carrapato bovino. — Já se sabia que o nematóide penetra por um dos orifícios naturais do carrapato: boca,

A coloração das fêmeas muda de acordo com o número de nematóides infiltrados em cada uma delas

ânus, espiráculos ou cutícula. Mas até hoje ninguém nunca tinha conseguido presenciar este momento — conta Inês, que confirmou a eficácia dos nematóides Heterorhabditis baujardi LPP7 e Heterorhabditis indica LPP4, nativos da Floresta Amazônica (Monte Negro-RO), contra o carrapato Rhipicephalus (Boophilus) microplus. A pesquisa mostrou que, em condições de laboratório, tais espécies de nematóides são capazes de provocar a morte do carrapato. Isso acontece porque eles carregam em seu intestino uma bactéria, chamada Photorhabdus, que é liberada assim que o nematóide consegue pene-

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Carrapato infectado

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trar no animal. Uma vez dentro do organismo do carrapato, a bactéria se multiplica rapidamente, matando o hospedeiro por infecção generalizada num período de 48 horas. — O carrapato bovino é hoje um sério problema para os pecuaristas. O controle é difícil, porque os carrapatos adquiriram resistência aos carrapaticidas existentes. E aqueles que não morrem com o carrapaticida, ou seja, que são selecionados, acabam dando origem a outros carrapatos também resistentes — afirma Inês, que teve a orientação da professora Cláudia Dolinski, do Laboratório de Entomologia e Fitopatologia da

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Uenf (LEF). A idéia é fazer com que os nematóides entrem em contato com as fêmeas ingurgitadas (fêmeas cheia de ovos) dos carrapatos quando estas caem no solo. É no solo que as fêmeas do carrapato depositam os ovos que depois darão origem a larvas que subirão na vegetação até alcançar seus hospedeiros — no caso, os bovinos. Segundo Inês, 95% da população de carrapatos se encontra no solo, o que facilita o controle biológico. Segundo a pesquisadora, as perdas anuais provocadas pelo carrapato bovino, no Brasil, chegam a 2 bilhões de dólares. O animal provoca perdas tanto na produção de leite, quanto na de carne e couro. Um sério problema, que vem sendo combatido pela defesa sanitária, é a presença de possíveis resíduos de carrapaticidas no leite consumido pela população.

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Vida de cientista A imagem idealizada dos cientistas esconde profissionais que, no dia-a-dia, têm que lidar com problemas e situações comuns a todas as pessoas Na TV, no cinema e até nas histórias em quadrinho, eles são retratados ora como gênios obcecados por alguma descoberta revolucionária, ora como loucos querendo dominar o mundo. Mas, por detrás dos estereótipos que circundam a profissão de cientista, encontram-se cidadãos comuns, que, apesar das peculiaridades do ofício, não deixam de lidar com problemas e situações comuns a tantos outros profissionais. A parte não tão atraente da profissão nem sempre aparece na mídia — mais preocupada com os “avanços da ciência” do que em mostrar como é que se chega até eles —, mas consome grande parte do trabalho dos cientistas. Ela envolve, por exemplo, a acirrada competição para conseguir financiamentos, indispensáveis para a execução de qualquer pesquisa. Para conquistar um espaço no competitivo cenário científico brasileiro, por exemplo, é preciso

enfrentar uma espécie de maratona onde a inspiração é fundamental, mas precisa ser acompanhada de muita “transpiração”, conforme relata o biólogo Renato Augusto DaMatta, do Centro de Biociências e Biotecnologia (CBB) da Uenf: — Primeiro, é preciso ter uma boa idéia, capaz de gerar um projeto de pesquisa competitivo. Segundo: conseguir aprovar o projeto em agências financiadoras, em meio a grande competição. Isto depende da idéia, mas também do currículo do pesquisador, do número e do impacto de seus artigos anteriores. Terceiro: é preciso manter produção científica constante e impactante — afirma. Mas nem sempre isso é suficiente para a obtenção dos recursos necessários para as pesquisas. Idéias brilhantes podem permanecer engavetadas durante anos simplesmente porque não se inserem nas preocupações estraté-

Maria da Glória

gicas dos governantes. Na prática, algumas áreas acabam sendo mais estimuladas que outras. — Hoje, infelizmente, os investimentos estão atrelados à decisão política. Ultimamente, por exemplo, a área de produção de alimentos, onde atuo, vem sendo deixada de lado. Os editais abrem

mais espaço para pesquisas ligadas à área biotecnológica. Tratase de uma área importante, mas o governo se esquece que a população precisa se alimentar — diz o professor José Fernando Coelho da Silva, do Centro de Ciências e Tecnologias Agropecuárias (CCTA) da Uenf.

Renato DaMatta

Conciliar o trabalho com a vida pessoal é a principal dificuldade da professora Simonne Teixeira, pesquisadora do Centro de Ciências do Homem (CCH) da Uenf. Ela diz que, embora goste muito do seu trabalho, o maior problema é o tempo, pequeno para o volume de atividades às quais precisa se dedicar — aulas, pesquisa, coordenação (do Programa de Pós-Graduação em Políticas Sociais), reuniões,

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artigos, congressos, entre outras atividades diárias. — Em muitas ocasiões, trabalhamos intensamente nos fins de semana para conseguir concluir todas as atividades. O difícil é convencer os filhos, o marido e demais familiares que trabalhar no fim de semana é necessário — afirma. Depois de um problema de saúde, no ano


Boa produção requer formação de equipe

Simonne Teixeira mostra como interpretar as marcas na cerâmica

O professor Renato DaMatta lembra que, para manter uma boa produção científica, o pesquisador precisa formar uma equipe — o que não acontece de um dia para o outro. Na Universidade, isso normalmente se faz com alunos de pós-graduação, principalmente de doutorado. — Aí, sim, você forma uma equipe, mas isto gera outro estresse: nós não fomos preparados com técnicas gerenciais, mas precisamos gerenciar pessoas e recursos — analisa o professor, para quem é indispensável ter a “cuca fresca” para que o coração agüente o ritmo. Tudo isso sem falar nas aulas da graduação e nas atividades de extensão universitária. Recentemente Renato coordenou a disciplina Biologia Celular I e II, reunindo aproximadamente 200 alunos. Mas ele não tem encontrado tempo para se dedicar à extensão, embora reconheça sua importância estratégica. A professora Maria da Glória Alves, do Laboratório de Engenharia Civil (Leciv) da Uenf, conta que, ultimamente, não tem hora para sair da universidade. Tudo para poder conciliar as atividades de professora e pesquisadora do Laboratório de Engenharia Civil do Centro de Ciência e Tecnologia (CCT). — Muitas vezes não tenho tempo, durante o dia, de falar com os alunos que oriento, pois fico totalmente envolvida com as aulas de graduação e pós-graduação, reuniões e visitas ao Parque de Energias Alternativas. Além disso, atendo à comunidade, que está sempre me procurando para saber se encontrou algum mineral precioso na suas terras, entre outras coisas — diz.

José Fernando Coelho

A difícil arte de conciliar trabalho e vida pessoal de 2006, a professora Maria da Glória aboliu o trabalho nos fins de semana. Agora, os sábados e domingos são passados no Rio de Janeiro, ao lado da família e dos amigos. — Trabalho muito aqui durante a semana, mas na sexta-feira, quando vou para o Rio, me desligo completamente. Afinal, precisamos de um tempo para o descanso e o lazer — diz.

A maratona de trabalho muitas vezes pode gerar estresse e até levar à depressão. Foi o que aconteceu com o professor Renato DaMatta, que, em 2003, embora estivesse diante de dados científicos bastante expressivos, teve muita dificuldade para conseguir escrever um bom artigo mostrando os resultados obtidos em uma pesquisa de doutorado que teve sua orientação. A publicação era

imprescindível para a renovação da bolsa do CNPq. — Os dados eram muito bons, mas eu simplesmente não conseguia escrever um bom artigo. Sim, porque a gente é cientista, mas também é autor, tem que publicar. Só consegui publicar na terceira versão do artigo. Foi o maior estresse da minha vida de pesquisador, o que me levou à depressão — conta.

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Ciência para o futuro do planeta Medir a ‘sede’ da planta pode gerar novos conhecimentos sobre seqüestro de carbono e efeito estufa; pesquisas envolvem cooperação entre Uenf e Departamento de Agricultura dos EUA Num estudo mundialmente pioneiro de medição da fotossíntese de plantas inteiras de mamoeiro, pesquisadores brasileiros e norte-americanos desenvolveram metodologia inédita para estimar a transpiração (perda de água) e a assimilação de carbono atmosférico em plantios comerciais de mamão. Esta técnica de medição da planta inteira, em associação com a instalação de sensores (sap flow), permite calcular a “sede” da planta estimando a quantidade de água que passa pelo tronco e com isso evitar o desperdício de água na irrigação. Num futuro próximo, acreditam os pesquisadores, será possível saber se num plantio comercial de mamão ou outras culturas, como cana-de-açúcar, ocorre algum nível de “seqüestro de carbono”, contribuindo para a diminuição do efeito estufa. Também será possível estimar a quantidade de água perdida para a atmosfera. O trabalho é resultado da parceria entre o grupo de Ecofisiologia Vegetal da Uenf, coordenado pelo professor Eliemar Campostrini, e o pesquisador David Michael Glenn, do Departamento de Agricultura dos Estados Unidos (USDA), com participação da empresa Caliman Agrícola S.A. e recursos da Capes e da Finep. Pela Uenf, o projeto também tem a colaboração do professor Elias Fernandes de Sousa, do Laboratório de Engenharia Agrícola. Em fevereiro deste ano, o biólogo Tiago Massi Ferraz defendeu dissertação de mestrado sobre o tema, orientada por Eliemar Campostrini. Como resultado do trabalho, concluiu-se que uma planta de ma-

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mão papaya de seis meses de idade, com cerca de 3,5 m2 de área foliar, fertirrigada por gotejamento, num dia de céu claro no mês de julho, transpirou cerca de 8,6 litros de água e assimilou 67 gramas de CO2 — equivalentes a 18,7 gramas de carbono. — A partir destes dados mais trabalhados, mostramos que estas mesmas plantas transpiram cerca de 142 gramas de água para cada grama de CO2 assimilado — informa o professor Campostrini. A estimação da passagem de água pelo tronco do mamoeiro se dá pela aplicação de modelos matemáticos, já que os sensores não

medem diretamente a água, e sim a temperatura. Os estudos permitiram ainda relacionar a quantidade real de água que a planta transpira no campo com variáveis climatológicas, tais como temperatura do ar, luz, velocidade do vento e umidade relativa do ar (esta, estimada por meio da chamada evapotranspiração de referência ou ET0). — Com estas informações, os produtores poderão considerar estas variáveis do clima (que são de obtenção fácil e barata) e, indiretamente, poderão saber quanto de água uma planta de mamoeiro está transpirando em condição de campo. Sabendo quanto transpira, ele

sabe exatamente quanto de água ele pode colocar na raiz da planta, evitando o desperdício desse bem cada vez mais escasso que é a água — avalia Eliemar. Eliemar Campostrini está nos Estados Unidos fazendo pós-doutorado na estação experimental do Departamento de Agricultura dos Estados Unidos (USDA). Lá estão sendo ajustados os modelos para estimar o balanço de carbono em pomares comerciais de macieira (solo e planta). A macieira será utilizada como modelo, para depois promover as adaptações em Campos para o mamoeiro e a cana-deaçúcar.

Experimento para medir perda de água e absorção de carbono em plantio de mamão


Cupim: um problema urbano Pesquisadores da Uenf detectam, em Campos, espécies de cupins até então restritas às áreas florestais Muitas espécies de cupins são consideradas pragas urbanas em países de clima temperado ou tropical, como é o caso do Brasil. Mas pouca gente se dá conta de que a infestação de cupins dentro das casas muitas vezes é o resultado da degradação do habitat desses insetos. Uma prova disto pode ser encontrada na cidade de Campos (RJ), onde pesquisadores da Uenf detectaram, além dos cupins comumente encontrados em áreas urbanas, espécies nativas restritas, principalmente, às áreas de vegetação natural. — Foi uma surpresa verificar que espécies nativas de cupins, que ocorrem essencialmente em áreas de vegetação natural, infestaram árvores e residências na cidade com tal intensidade. O aparecimento dessas espécies como praga em áreas urbanas reflete as conseqüências do desmatamento ocasionado pelo avanço das construções urbanas sobre as áreas de vegetação natural — diz o professor Omar Bailez, do Laboratório de Entomologia e Fitopatologia da Uenf, que orientou pesquisa sobre cupins feita pelo doutorando Vinícius Gazal. Vinícius percorreu 17 bairros de Campos dos Goytacazes, entrevistando moradores e recolhendo cupins de árvores e casas para serem analisados no laboratório. As espécies nativas mais encontradas foram Nasutitermes corniger e Microcerotermes sp.. Estas espécies estiveram também entre as que mais danos ocasionaram dentro das residências, ao lado de Cryptotermes brevis e Coptotermes gestroi, consideradas as principais es-

pécies de cupim que constituem pragas em áreas urbanas de várias partes do mundo. — Todos os bairros analisados apresentaram ocorrência de cupins. Podemos dizer que pelo menos uma rua, em cada bairro, apresentou infestação, seja dentro das casas ou nas árvores — informa Vinícius, que incluiu na pesquisa somente bairros situados na margem direita do Rio Paraíba do Sul, situados entre o Horto, Centro, IPS e Parque São Caetano. Segundo ele, poucas cidades brasileiras já realizaram este tipo de levantamento. A segunda etapa da pesquisa teve por objetivo coletar dados que possam contribuir na elaboração de iscas de captura de cupins. Com esses subsídios, poderão ser elaborados métodos de controle que apresentem menos riscos ao meio ambiente que os oferecidos pelo método tradicional, baseado na preparação de barreiras químicas com inseticidas. Os experimentos mostraram que os cupins são atraídos pelo cheiro da madeira, principalmente quando esta se encontra deteriorada: segundo a pesquisa, madeiras em estado de decomposição são as preferidas por estes insetos. A pesquisa também mostrou que, ao contrário do que muitos acreditam, a densidade da madeira não é um fator relevante para atrair os cupins. —Verificamos, ainda, que há substâncias químicas nas glândulas salivares dos cupins e em suas fezes que podem ser usadas para aumentar a atratividade das iscas — diz o professor Omar.

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Superando desafios Alunos desmistificam a idéia de que os cursos da Uenf não são acessíveis

Wagner da Silva Terra

Muita gente acredita que passar na Uenf é coisa para “nerds” ou gênios. Mas alunos que enfrentaram o vestibular e hoje estão plenamente adaptados à universidade desmistificam esta idéia. Eles asseguram que o vestibular para a Uenf não é o bicho-de-sete-cabeças que muitos supõem, muito menos algo restrito a quem cursou escolas consideradas de alto padrão. O aluno Wagner Terra, que está no 5º período de Química, também tinha esta idéia. Mesmo assim, acreditou em seu potencial e foi aprovado na primeira tentativa de ingresso na Uenf, superando o que muitos acreditam ser um entrave à entrada na universidade: uma trajetória estudantil unicamente em escolas públicas. O ensino médio foi concluído em 2005, na Escola Nilo Peçanha. — Eu pensava que a prova seria muito difícil e me surpreendi com o resultado. Quem vem de escola pública, como eu, precisa se esforçar um pouco mais, principalmente na área de ciências, devido às deficiências do ensino médio. Mas, com esforço, dá certo — diz Wagner, lembrando que outros colegas de escola também conseguiram passar em vestibulares para universidades públicas. A aluna Lucimara Lyrio, que

Lucimara Lyrio

cursa o 7º período do curso de Ciências Biológicas, também veio de escola pública. Ela prestou o vestibular em 2002, ao mesmo tempo em que completava o ensino médio na Escola Técnica Estadual João Barcelos Martins. Neste mesmo ano, era instituída a reserva de vagas para negros e estudantes de escolas públicas nas universidades públicas estaduais de todo o território fluminense. — Eu entrei pelo Sade, programa que reservava 50% das vagas de cada curso para alunos provenientes de escolas públicas. Isso, é claro, me ajudou muito, pois me deixou mais tranqüila na hora das provas — conta Lucimara, que hoje tem 24 anos de idade. Atualmente, o sistema de cotas disponibiliza 20% das vagas para negros auto-declarados, outros 20% para estudantes oriundos de


Marcela Santos Silva

escolas públicas e 5% para povos indígenas, deficientes, filhos de bombeiros e policiais mortos em suas atividades. O aluno Cícero Lobo, do 1º período de Agronomia, acredita que as pessoas exageram quando afirmam que passar no vestibular da Uenf é algo muito difícil. Embora afirme que também levou em conta a relação candidato/ vaga ao optar pelo curso de Agronomia, Cícero garante que, se o candidato leva o vestibular a sério e estuda, a entrada na Uenf é tranqüila. — Uma boa dica, antes das provas, é resolver questões de vestibulares anteriores. Embora as perguntas não sejam as mesmas, a gente já vai se habituando ao estilo da prova — afirma. Quem tem a oportunidade de participar do programa “Jovens Talentos” — que permite a estudantes de ensino médio de escolas públicas participar de projetos de pesquisa dentro das universidades — muitas vezes tem um incentivo a mais para tentar o vestibular. Foi o caso da aluna Marcela Santos, que estudou na Escola Técnica Estadual João Barcelos Martins e hoje está prestes a obter o diploma de Física na Uenf. — A participação em pesquisas científicas, quando ainda era aluna de ensino médio, me motivou a ingressar na universidade. Lá fora as pessoas dizem que é difícil passar no vestibular e continuar estudando na Uenf, mas aos poucos fui percebendo que isso não é verdade quando a gente se leva o curso com a dedicação necessária — afirma.

Cícero Vasconcelos

Inscrições para o Vestibular O ingresso para 12 dos 15 cursos de graduação presenciais da Uenf é feito através do Vestibular Estadual, que reúne ainda a Uerj e as Academias Militares da Polícia Militar e dos Bombeiros. Quem não se inscreveu para o 1º Exame de Qualificação — cuja prova ocorre em 22/06 — ainda pode participar do Vestibular 2009, inscrevendo-se para o 2º Exame de Qualificação.

As inscrições devem ser feitas de 01 a 21/07 no site www. vestibular.uerj.br , onde também podem ser obtidas mais informações sobre o Vestibular Estadual. O último dia para o pagamento da taxa de inscrição, no valor de R$ 38, é 23/07. O cartão de confirmação de inscrição deve ser impresso, no mesmo site, no período de 25 a 28/08. A prova está marcada para 14/09.

Estão incluídos no Vestibular Estadual 2009 os seguintes cursos da Uenf: Ciência da Computação e Informática, Ciências Biológicas, Ciências Sociais, Engenharia Civil, Engenharia Metalúrgica (Habilitação: Materiais), Engenharia de Produção, Engenharia de Exploração e Produção de Petróleo, Medicina Veterinária, Licenciatura em Biologia, Licenciatura em Física, Licenciatura em Matemática e Li-

cenciatura em Química. Os cursos de Agronomia, Pedagogia (licenciatura) e Zootecnia participam, a partir deste ano, de Vestibular Isolado, cujo edital deverá ser publicado em breve no site da Uenf (www.uenf.br). A Uenf oferece ainda os cursos a distância de licenciatura em Ciências Biológicas e Química, cujo ingresso é feito através do Vestibular do Cederj (www.cederj.edu.br).

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Em vez de antigüidades, insetos Museu Entomológico da Uenf possui cerca de 50 mil espécimes Pouca gente sabe, mas a Uenf mantém um museu repleto de insetos das mais variadas espécies, cujos corpos são guardados, catalogados e pesquisados. O Museu Entomológico da Uenf, com 50 mil insetos, funciona no prédio do Centro de Ciências e Tecnologias Agropecuárias (CCTA) no campus Leonel Brizola, e é vinculado ao Laboratório de Entomologia e Fitopatologia (lef). A coleção é utilizada como material didático e de pesquisa para a própria Universidade, mas também serve a pesquisadores de ou-

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tras instituições. Sob a curadoria da professora Magali Hoffmann, o arquivo entomológico é dividido em ordem, família e espécie, facilitando, assim, análises e descobertas. Recentemente, o taxônomo André Nemésio, da Universidade Federal de Minas Gerais, descobriu uma nova espécie de abelha polinizadora de orquídeas, a Eufriesea atlantica, antes denominada Eufriesea ornata. E, em suas pesquisas, Nemésio utilizou material de várias instituições, entre elas do Museu Entomológico da Uenf.

Quem entra no Museu do LEF logo se depara com uma série de gavetas, onde ficam os insetos devidamente identificados por Magali, inclusive a Eufriesea atlantica. A professora, que cuida do arquivo desde 1995, é quem recebe os alunos e professores da Universidade e suas pesquisas. Separadas por caixinhas, estão identificadas 26 ordens, 192 famílias e 425 espécies de insetos, representantes da fauna do Norte e Noroeste Fluminense e de outras regiões do Brasil e do mundo. Especialista em insetos da or-

dem Coleoptera, Magali foi homenageada, este ano, na descrição da nova espécie Oncideres hoffmanni e do novo gênero Magaliella, ambos insetos da família Cerambycidae. Segundo ela, o Museu é uma importante base de pesquisas. — Quando você descreve uma nova espécie, é feita uma separação do material coletado. O principal é chamado olótipo, e o restante, o parátipo, é levado para museus e órgãos de preservação. Por isso é muito importante que sejam feitas pesquisas com o material do nosso museu — explica


Celeiro de cientistas Vem aí um dos eventos mais importantes do calendário da Uenf: o 13.º Encontro de Iniciação Científica, que se realiza de 17 a 19 de junho, paralelamente à 8.ª Mostra de Pós-Graduação da Uenf. Neste ano, o tema geral é a “Vinda da Família Real para o Brasil”. Durante os eventos, centenas de estudantes de graduação, mestrado e doutorado exporão dados sobre suas pesquisas para o público e para membros de comitês avaliadores. Para a Uenf, será ocasião de avaliação de seu Programa de Iniciação Científica pelo Conselho Nacional de Desenvolvimento Científico e Tecnológico (CNPq). Em 2003, a Universidade ganhou do CNPq o Prêmio Destaque do Ano na Iniciação Científica por se destacar entre todas as instituições de ensino superior brasileiras no encaminhamento de seus estudantes para programas de mestrado e doutorado. As palestras de abertura, no dia 17 de junho, a partir das 9h30, serão proferidas por duas personalidades importantes do mundo científico brasileiro. A historiadora Ismênia Martins, da Universidade Federal Fluminense (UFF), vai falar sobre as comemorações pelos 200 anos da vinda da família real e os impactos sobre o ensino e a pesquisa. Já o físico Ildeu de Castro Moreira, diretor do Departamento de Popularização e Difusão da Ciência e Tecnologia do Ministério da Ciência e Tecnologia, vai abordar o tema “Darwin no Brasil e sua excursão ao Norte Fluminense”. Haverá prêmios para os melhores trabalhos tanto na Iniciação Científica quanto na pós-graduação. A programação completa está em www.uenf.br.

Encontro de Iniciação Científica e Mostra de Pós-Graduação movimentam Uenf em junho

Acima, mostra Darcy Ribeiro, um dos eventos que compôs a programação do 12ª Encontro de Inciação Científica em 2007 Abaixo, um dos corredores onde alunos de graduação, pós-graduação e extensionistas explicavam aos avaliadores do Cnpq e ao público em geral suas pesquisas e projetos.


Nossos Cursos Graduação

Pós-Graduação

Agronomia Ciências Biológicas Licenciatura em Pedagogia Ciência da Computação e Informática Ciências Sociais Engenharia Civil Engenharia Metalúrgica Engenharia de Produção Engenharia de Exploração e Produção de Petróleo Medicina Veterinária Zootecnia Licenciatura em Biologia Licenciatura em Física Licenciatura em Matemática Licenciatura em Química Licenciatura em Ciências Biológicas a Distância Licenciatura em Química a Distância

Mestrado e Doutorado Biociências e Biotecnologia Ciências Naturais Ecologia e Recursos Naturais Engenharia de Reservatório e de Exploração Engenharia e Ciência dos Materiais Engenharia Civil Genética e Melhoramento de Plantas Produção Animal Produção Vegetal Sociologia Política Mestrado Cognição e Linguagem Engenharia de Produção Políticas Sociais

Teses e dissertações defendidas no mês de abril Biociências e Biotecnologia 1 - “Interações entre o fungo Paracoccidioides brasiliensis e o sistema complemento: comparação entre cepas de alta e de baixa virulência” Mestrando: Renan Gomes Toledo Orientadora: Thereza Liberman Kipnis (LBR/CBB)

Orientadora: Maria Cristina Gaglianone (LCA/ CBB) 2- “Estrutura, dinâmica e produtividade primária do fitoplancton como base para estimativa do estado trófico de uma lagoa costeira no estado do Espírito Santo (lagoa Mãe-bá. Guarapari)” Mestranda: Bruna D’ Ângela de Souza Orientadora: Valéria de Oliveira Fernandes (LCA/ CBB)

2- “Caracterização das respostas de defesa local e sistêmica, induzidas por lesão mecânica em plântulas de feijão-de-corda (Vigna unguiculata L. Walp.)”. Doutorando: Márcio dos Santos Teixeira Pinto Orientadora: Kátia Valevski Sales Fernandes (LQFPP/CBB)

Engenharia de Produção

3- “Efeito de estímulos físicos sobre a atividade das bombas de prótons de células vegetais e sua participação nas respostas morfoênicas”. Doutoranda: Tatiana de Felice Elias Orientador: Arnoldo Rocha Façanha (LBCT/CBB)

1- “Educação online no curso de engenharia de produção: caso de uma universidade privada” Mestranda: Denise Simões Dupont Bernini Orientador: Daniel Ignácio de Souza Junior (Leprod/CCT)

Ecologia e Recursos Naturais

2- “Uma metaheurística grasp para o planejamento de movimentação de gás natural em gasodutos” Mestrando: Angelo Cesar Tozi Christo Orientador: José Ramón Arica Chávez (Leprod/ CCT)

1- “Biologia de nidificação e estratégias de manejo de Xylocopa ordinaria e Xylocopa frontalis (hymenoptera: apidae) no norte do Rio de Janeiro” Mestrando: André Sarlo Bernardino

Genética e Melhoramento de Plantas 1-“Diversidade genética por meio de marcadores RAPD e características morfoagronômica em aceroleira (Malpighia emarginata D.C.)” Mestrando: Marcos Góes Oliveira Orientador: Jurandi Gonçalves de Oliveira (LMGV/ CCTA) 2- “Caracterização de variedades de cana-de-açúcar quanto a resistência a tolerância ao raquitismo-dasoqueira” Mestranda: Rozana Moreira Pereira de Lima Orientador: Silvaldo Felipe da Silveira (LEF/CCTA)

Políticas Sociais 1- “Justiça como reconhecimento: a experiência dos Juizados Especiais Cíveis em Campos dos Goytacazes, Rio de Janeiro”. Mestrando: Halisson dos Santos Paes Orientador: Marcos Pedlowski (LEEA/CCH)

Produção Animal 1- “Balanço eletrolítico e redução da proteína bruta em rações para frangos de corte em condições naturais de estresse calórico”. Mestranda: Marize Bastos de Matos Orientador: Rony Antônio Ferreira (LZNA/CCTA)

Produção Vegetal 1- Química do húmus e fertilidade do solo após adição de adubos orgânicos Doutorando: Jader Galba Busato Orientador: Luciano Pasqualoto Canellas (LSOL/ CCTA) 2- “Importância de Nasutitermes corniger (Motschulsky) (Isoptera: Termitidae) em áreas urbanas e características do seu comportamento de Forrageamento” Doutorando: Vinicius Siqueira Gazal e Silva Orientador: Omar Eduardo Bailez (LEF/CCTA)


Por que não aqui? São Carlos (SP), Santa Rita do Sapucaí (MG) e outras cidades brasileiras criam mecanismos para transformar conhecimento em desenvolvimento; Incubadora TEC Campos quer fazer o mesmo

Acima, as instalações da Tec Campos no dia de sua inauguração.

Foto - Paulo Damasceno

Abaixo, circulado em verde, o local onde a incubadora se encontra instalada na área de convivência do Centro de Convenções da UENF

Demorou, mas Campos deu o primeiro passo: em maio foi inaugurada, em área do Centro de Convenções da Uenf, a Incubadora de Base Tecnológica de Campos dos Goytacazes (TEC Campos). Formatada no modelo de consórcio, reunindo várias instituições, a TEC Campos pretende ajudar a estancar a fuga de cérebros e gerar desenvolvimento local mediante aplicação de novas tecnologias. Mas será que o modelo das incubadoras é mesmo um bom caminho para isso? A julgar pela experiência de algumas cidades brasileiras, a resposta é sim. Santa Rita do Sapucaí, no Sul de Minas, é um dos exemplos mais citados. Cidade sede do Instituto Nacional de Telecomunicações (Inatel), Santa Rita implantou em 1985 um pólo industrial nas áreas de telecomunicação, eletrônica e informática. Para incrementar o chamado “Vale da Eletrônica”, o Instituto criou o embrião do seu Programa de Incubação de Empresas e Produtos. Hoje, a cidade é reconhecida como pólo tecnológico e exporta serviços para vários países. Em Santa Rita, os primeiros movimentos em direção à Incubadora tiveram a participação direta da prefeitura local. Conta-se na cidade que a idéia era atingir um desenvolvimento semelhante ao de São Carlos (SP). Este município paulista abriga dois campi da Universidade de São Paulo (USP) e a sede da Universidade Federal de São Carlos (UFSCar), além de dois centros da Embrapa

— dedicados à pecuária e à instrumentação agropecuária. Tendo instituído em 1984 a Fundação ParqTec, São Carlos se notabiliza por vários indicadores: média de um pesquisador doutor (PhD) para cada 180 habitantes; 14,5 patentes registradas anualmente por 100 mil habitantes; e 200 empresas de alta tecnologia em setores como ótica, novos materiais e instrumentação. Em Campos, a Incubadora TEC Campos é fruto de um esforço persistente da Uenf e do Cefet, que agregaram a adesão de outras instituições, incluindo a Prefeitura de Campos. O primeiro edital, de janeiro de 2007, recebeu 21 propostas e selecionou dez delas para pré-incubação. São projetos de empresas em áreas como diamante sintético, biotecnologia animal, design, produção de mudas e sementes, entre outras. Quais delas vão vencer todas as etapas e se firmar no mercado? Isto só o tempo vai dizer. Mas os gestores da TEC Campos estão certos de que aprenderam com os erros e os acertos da caminhada até aqui. — Esse formato de consórcio tem tudo para dar certo, pois conseguimos reunir algumas das principais instituições dedicadas ao desenvolvimento regional — opina o diretor-presidente Ronaldo Paranhos, lembrando a adesão da Associação Comercial e Industrial de Campos (Acic), Fenorte/ Tecnorte, Firjan - Regional Campos, Fundação Cefet, Fundenor, Prefeitura de Campos e Sebrae.

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Entrevista / José Luís Vianna da Cruz

Em busca de um norte Apesar da pujança de atividades de comércio e serviços em Itaperuna e Santo Antônio de Pádua, o Noroeste Fluminense ainda busca caminhos para um desenvolvimento mais consistente. A opinião é do sociólogo e professor José Luís Vianna da Cruz, diretor do Instituto de Ciências da Sociedade e Desenvolvimento Regional da UFF, em Campos. Estudioso da problemática regional, Cruz analisa os impactos da economia do petróleo sobre o Noroeste assim como as potencialidades e limites da contribuição do sistema universitário público para o desenvolvimento regional. Confira: NOSSA UENF: Hoje a exploração do petróleo e o pagamento de royalties e participações especiais distinguem bem claramente os municípios do Norte dos municípios do Noroeste Fluminense. Mas na época da separação entre as duas regiões o processo não foi um tanto artificial? Que interesses o presidiram? José Luís: Formalmente o Noroeste Fluminense foi criado em 1987, durante a gestão de Moreira Franco no governo do Estado. Você fala em artificialismo, mas eu contraponho dois argumentos. Primeiro, não existe nada nesse terreno que seja propriamente natural. Tudo é social, tudo é político, tudo é construído. Segundo, falando nestes termos, a unidade do antigo Norte Fluminense é que po-

deria ser considerada “artificial”. Estudei isto em meu doutorado. Regiões geográficas são criadas conforme certas circunstâncias, mas não vingam se não houver reconhecimento, sentimento de pertença, enfim, se não houver referência a uma identidade coletiva e social. NOSSA UENF: Então de alguma forma o Noroeste de fato já existia dentro do Norte Fluminense? José Luís: Segundo o sociólogo Pierre Bourdieu, uma região se constrói quando tem um porta-voz que goza de reconhecimento e legitimidade, de modo que a região se reconhece na fala dele. No antigo Norte Fluminense, os porta-vozes foram as elites ligadas ao açúcar. O mundo da cana era tutelado pelo governo federal, e as elites desse segmento tinham uma relação muito estreita com o Estado. Então, elas reivindicavam em nome da região benefícios que na

verdade diziam respeito a elas próprias. Isto foi construído historicamente, sobretudo a partir da segunda metade do século XX, quando a nossa agroindústria açucareira perdeu definitivamente força para São Paulo. No entanto, essas reivindicações regionalistas não contemplavam em nada a área de Itaperuna e do atual Noroeste. Primeiro porque lá a tradição era cafeeira, e não açucareira. Suas afinidades econômicas eram muito maiores até com a Zona da Mata de Minas e o Sul do Espírito Santo. NOSSA UENF: Havia, portanto, uma tensão... José Luís: Havia uma luta surda, que não deixava vestígios na imprensa — em geral ligada às elites de Campos —, em favor da separação. Lideranças políticas do atual Noroeste foram forjadas em torno desse ideal de criação da nova região. O economista Francisco de Oliveira criou um conceito de “fechamento de região”, que foi o que ocorreu no entorno de Campos. De vez em quando a gente ouve dizer que o campista é muito fechado, que não há espaço para outras vozes, interesses, grupos ou pontos de vista. Isso reflete um pouco esse fenômeno do qual estamos falando. Se as elites locais tivessem tido a perspicácia de contemplar razoavelmente os demais municípios, talvez o Noroeste não tivesse sido criado. NOSSA UENF: Qual é o cenário socioeco-


nômico do Noroeste duas décadas depois de sua criação formal? José Luís: Apesar de vários programas pontuais desenvolvidos por diferentes agências públicas com foco nos municípios dessa região, o Noroeste nunca se recuperou da decadência do café. A forma como a cultura do café foi efetivada sacrificou muito as terras, provocou muito desmatamento. A pecuária também contribuiu para compactar o solo. Então, a região ficou muito degradada, embora tenha chegado a ser a maior bacia leiteira do Estado. De lá para cá a região vem tentando se apoiar em ondas de produtos que podem vir a ser cultivados, como, recentemente, o eucalipto através da empresa Aracruz Celulose. Como você sabe, o eucalipto envolve uma discussão altamente polêmica quanto a seus benefícios ou malefícios. Atualmente, tanto Itaperuna quanto Santo Antônio de Pádua são pólos de comércio e serviços. Não há maior peso em atividades produtivas em sentido estrito. NOSSA UENF: Em que medida a economia do petróleo, que quase monopoliza o Norte Fluminense, tem impactos no Noroeste? José Luís: Em termos de royalties, o petróleo significa uma pequena injeção de recursos em algumas prefeituras. As melhores perspectivas para as gerações mais jovens continuam sendo, notoriamente, aquelas oferecidas pela indústria extrativa do petróleo e o aparato de serviços que a circunda. Os estudos sobre a situação de Macaé, sobretudo realizados pela Uenf, mostram essa pressão migratória. No Noroeste, dependendo do município considerado, tem estagnação, crescimento vegetativo ou mesmo regressão na população. Mas os pólos, como Itaperuna e Pádua, têm algum crescimento por causa mesmo de sua condição de

pólo. Os movimentos migratórios lação de mercadorias. Este, para ocorrem primeiro dentro da prómim, seria o principal uso estrapria região em direção aos municítégico dos royalties de forma a inpios-pólo. Além disso, a migração cluir o Noroeste. Mesmo no Norte, ocorre do conjunto dos municípios a industrialização ainda não acondo Noroeste para Macaé e Rio das teceu de forma sustentável. Os noOstras, que já constituem praticavos e grandes projetos em vias de mente uma área urbana contínua. implantação caracterizam o uso da Em Campos, apesar dos recursos região como território-plataforma, dos royalties, o crescimento popuonde o centro de decisões está lonlacional também é pequeno devido ge. à migração para essa região. Tanto NOSSA UENF: Como você vê é que há mais de dez anos os jora contribuição das universidades nais citam uma população de 500 para o desenvolvimento regional? mil habitantes, mas oficialmente José Luís: Para esta região, a Campos ainda não chegou lá. implantação de um sistema público NOSSA UENF: É praticamende ensino superior é fundamental. te um consenso que os municípios Como a tradição é de uma apartaque recebem grandes volumes de ção muito grande entre as elites e o repasses em royalties restante da sociedae participações espede — portanto uma “Para o Norte/ ciais não estão aplitradição autoritária, cando bem os recursos elitizada, com uma Noroeste mesmo internamente. oligarquia reduzida, Fluminense, Mas seria possível vismonopolizando o lumbrar alguma enpoder, historicamenum sistema genharia política que te — e diante da cenviabilizasse projetos tralidade do Poder público de regionais de desenPúblico na vida da revolvimento, contem- ensino superior gião, uma estrutura plando inclusive o pública de ensino sué estratégico.” Noroeste? perior é fundamental José Luís: Sem para catalisar certos dúvida uma aplicação mais regionaprocessos. Esta estrutura não dá lizada seria positiva, mas aí eu não conta de tudo, talvez até de muito apresento uma fórmula. As fórmupouco, mas seja qual for o volume las são várias: um fundo regional, de sua contribuição, ela será estraum consórcio regional para polítégica. Em que sentido? Primeiro ticas comuns... As possibilidades porque o sistema universitário púestariam no estímulo a atividades blico confere grande ênfase ao segconsorciadas entre os municípios, mento da pesquisa. Ao lado disso, no planejamento da produção, o sistema público de ensino supepara que a região tenha culturas rior é a porta de entrada para uma complementares, possa formar caparcela da população que não teria deias ou adensar cadeias produtiacesso à formação superior de quavas existentes. Ou ainda constituir lidade se ela não fosse gratuita. arranjos produtivos locais, que a NOSSA UENF: Estratégica ou meu ver não existem, pois supõem não, essa contribuição será tanto uma interação que não ocorre enmaior se houver interação, diálotre as unidades econômicas, desde go, troca de experiências entre as o parque de ciência e tecnologia instituições e sobretudo entre elas instalado até a logística da circue a sociedade, o Poder Público, o

mundo empresarial, concorda? José Luís: Há uma cobrança inerente à universidade pública de interagir, se comprometer com a sociedade, com os seus destinos, contribuir para iluminar e equacionar problemas econômicos, sociais, culturais, políticos etc. Primeiro porque essa sociedade regional é historicamente tratada como problemática. Aqui sempre houve baixos indicadores de desenvolvimento e elevados índices de pobreza e exclusão, de desemprego ou subemprego. Então, o sistema público de ensino superior é vital para a região. Agora, em que medida ele se torna imprescindível, isso depende de alguns elementos. Um é a vontade dos seus profissionais de interagir com a região. Outro é a vontade das elites regionais em interagir na busca de solução para problemas coletivos e gerais. NOSSA UENF: O que dizer sobre as posturas de parte a parte? José Luís: Acho que já há uma produção acumulada bastante significativa na Uenf, na UFF e agora também no Cefet. Mas vejo problemas nos dois lados. Temos problemas nas elites dirigentes regionais, talvez porque se sintam ameaçadas, já que a universidade pública tem essa vocação de propor mudanças. No meio acadêmico, há segmentos que têm muito interesse e compromisso em tratar a temática regional, mas eles encontram resistências. E também tem nessas instituições uma parcela que não tem interesse nessa interação. A universidade tem um potencial transformador, mas também é uma instância muito plural, que abriga vários perfis de profissionais. De todo modo, uma nova ordem de interação no seio da sociedade só pode ser produzida pelo concurso de uma seqüência de gerações, na medida em que se constitua uma inteligentzia, que ainda não está consolidada.

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Em defesa das aves Aluno da Uenf ganha primeiro lugar em concurso de fotografias Tão importante quanto preservar a fauna brasileira é cuidar da memória das espécies que a compõem. Esta preocupação acompanha o estudante Luciano Moreira Lima desde os 13 anos de idade, quando teve início a sua paixão pelas aves. Dividindo o tempo entre as aulas do curso de Biologia na Uenf e suas pesquisas Brasil afora, Luciano acaba de ganhar o primeiro lugar no 2º Concurso Avistar Itaú BBA de Fotografia, com a foto “Balé das Garças”. O tema do concurso foi “Aves Brasileiras”, e a foto de Luciano — que retrata a garça-branca-pequena (Egretta thula) — foi selecionada na categoria “Melhor Fotografia”, na qual se inscreveram fotógrafos profissionais do Brasil, Inglaterra, Estados Unidos, Bélgica e Coréia do Sul . Luciano, de 23 anos, recebeu um prêmio de R$ 8 mil. A premiação ocorreu em 22/05, na cidade de São Paulo. — Atualmente, participo de vários projetos na Amazônia e na Mata Atlântica, rodando o país, fotografo as aves, que são meu objeto de estudo. Nem imaginava que fosse ganhar, ainda mais na categoria profissional, porque sou fotógrafo amador. Tinha gente concorrendo com fotos tiradas em máquinas que custam de R$ 30 a 40 mil. — conta Balé das Garças, de Luciano Moreira lima - Foto vencedora

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Luciano, que pretende investir o dinheiro do prêmio em equipamentos fotográficos. No total, foram inscritas no concurso 7383 fotografias, que concorreram às categorias de “Melhor Fotografia”, “Melhor Registro” e “Primeiras Aves” (Iniciantes). As fotos selecionadas serão expostas no Avistar2008, de 22 a 25 de maio de 2008, no Parque Villa-Lobos em São Paulo. Fizeram parte da comissão julgadora o vice-presidente da Sociedade Espanhola de Ornitologia, Josep del Hoyo; o jornalista, fotógrafo e editor do site de jornalismo ambiental Oeco, Marcos Sá Corrêa; o editor-chefe da Revista Brasileira de Ornitologia, Luís Fábio Silveira; e um dos mais conceituados fotógrafos de natureza do Brasil, ganhador do prêmio “Picture of the Year 2002”, da National Geographic, Roberto Linsker. Cursando o 8º período de Biologia, Luciano optou por direcionar suas pesquisas para a área de Ornitologia, que estuda a distribuição das aves no planeta, seus costumes e modos de vida. Luciano também possui um blog (http://www.caapora.blogspot.com), onde escreve sobre Zoologia, Evolução e Conservação da Biodiversidade. À direita, outras fotos de Luciano


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