PLANADOURO 04

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Nº04

CENTRO INTERNACIONAL DE VOO À VELA DE MOGADOURO

E SE O VOO À VELA FOSSE IMPORTANTE PARA A LINHA AÉREA?

BOAS PRÁTICAS PARA EVITAR COLISÕES COM AVES COMO FAZER AS MELHORES LEITURAS DO ALTÍMETRO

ASW 15 ALEMÃO, MODERNO E CLÁSSICO



EDITORIAL

ICAO - Anexo 14 Números e letras de identificação de pista

Caros leitores, 2012 foi para a aviação desportiva portuguesa um ano particularmente difícil. Um pouco por todo o país as comunidades dedicadas às diversas especialidades foram abaladas por um conjunto de acidentes com o custo severo de perdas humanas. Ficaram marcas profundas e vazios impossíveis de reparar. Da parte do CIVVM é devida uma sentida palavra de solidariedade e encorajamento aos mais diretamente afetados por estas perdas. Foi difícil também porque a conjuntura económica em que o país vive reflete-se numa redução acentuada dos níveis de atividade e da procura dos cursos de pilotagem. Contudo os entusiastas da aviação não desistem e temos notícias de desenvolvimentos muito positivos. É o caso da notícia do arranque das obras do aeródromo da Amendoeira em Montemor-o-Novo, infraestrutura que está a ser pensada para integrar de raiz um centro de voo à vela. Este é um projeto impulsionado pelo Centro de Voo Livre (CVL) apontando na direção daquilo de que o país tem comprovadamente falta – centros de voo que tenham o ADN do voo à vela em evidência. Há uma cultura de operação que é própria de cada especialidade. No voo à vela há uma necessidade crítica de espaço e de tempo para se poder afirmar e vivenciar a atmosfera única e salutar que a atividade proporciona. Consideramos que este é um exemplo a seguir por todos os entusiastas dispersos pelo território nacional e que vão orbitando por diversos pontos. Os projetos que integram uma base, uma escola de pilotagem e um compromisso operacional próprio são os nós de uma rede agarrada ao território onde se poderá de forma permanente oferecer a genuína experiência do voo silencioso e amigo da natureza. Um piloto de planador é muito mais do que alguém que se remete para a postura de quem usufrui egoisticamente as condições existentes. Sendo o voo à vela uma atividade iminentemente cooperativa, cada piloto tem que

dar algo mais, tem que deixar de ser um mero “utente” e abraçar um projeto sustentável com o qual se identifique, assumindo as responsabilidades inerentes ao facto de ser um elo sólido numa cadeia de cultura de voo. A revista Gliding International publica anualmente um resumo dos dados estatísticos gerais, organizados por países, de grande interesse para o estudo da evolução da atividade. Os números divulgados recentemente indicam que em Portugal existem 177 pilotos ativos, 25 planadores operacionais e 7 clubes. Perante esta informação os comentários a fazer são óbvios: Em termos relativos Portugal tem poucos praticantes pelo que há um enorme potencial de crescimento do número de pilotos, para cuja formação as escolas têm que se mobilizar; Há um número muito reduzido de centros dedicados ao voo à vela face o número de clubes/associações existentes. A geração atual de pilotos portugueses tem estes desafios pela frente. Cremos que estará à altura para os enfrentar. No CIVVM o ano de 2012 foi precisamente um ano de reestruturação. O modelo de responsabilidades centralizadas foi abandonado em favor de um processo de repartição de áreas de trabalho que ainda decorre e que envolveu a nomeação de um novo Diretor de Aeródromo, um novo Diretor da Escola e a formação e certificação de quatro novos Instrutores de Planadores. Há agora que avançar no sentido da criação de grupos de missão dedicados a setores como o de intervenção externa, de forma a ser reforçada a relação com a comunidade envolvente, e o da consolidação do diálogo e estabelecimento de novas parcerias com entidades com afinidade ao voo à vela nas vertentes desportiva, social e formativa. Há portanto muito caminho a percorrer em prol da atividade e da região que nos acolhe. Caros, o melhor de todos os voos é o voo em segurança!


Sumário

Nelson Reis

CAPA

J. Corredeira / ASW 15 no Red Burros

CONTRACAPA P. Castanheira / TWIN, fim de voo e dia Coordenação editorial Artur Moreira Gonçalves Colaboraram neste número António Machado, Emanuel Alves, Gonzalves; João Corredeira, João Custódio, Joaquim Sá Correia, José Carlos Fernandes, José Loureiro, Jyrki Leppanen, Mathieu Neuforge, Nelson Reis, Nicolas Jourdain, Paulo Cabral, Pedro Castanheira, Pedro Cavadas Dias, Pedro João Ferreira, Pedro Mesquita, Sérgio Mota Ferreira, Agradecimentos Camilo Miranda, Dulce Gonçalves PLANADOURO O4 - Ano de 2012

CIVVM 5 Aeródromo Municipal de Mogadouro OPINIÃO 6 CVL - Novo aeródromo da Amendoeira 8 E se o voo à vela fosse importante para a L.A.? HUMOR 9 Bouo zem metore NOTÍCIAS 10 RED BURROS 2012 - Festa em Mogadouro 19 TÉRMICAS 2012 - Encontro convivial no CIVVM DOSSIER ASW 15 22 ASW 15 - 1º standard de Schleicher e Wailbel 28 Uma viagem “across countries”

DOSSIER ASW 15 A primeira vez, outra vez... 32 36 PB - ASW TÉCNICA 37 O altímetro 40 A centragem de planadores ESCOLA CIVVM 46 Curso de instrutores de planadores do CIVVM 47 2013 - Cursos e projetos NÃO TENHO MAIS NADA SENÃO AS ASAS... 50 Colisões de aeronaves com aves VER DO CÉU, VIVER EM TERRA 56 Brunhosinho, intento e serenidade


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CIVVM

AERÓDROMO MUNICIPAL DE MOGADOURO Um pouco de história sobre uma das obras mais emblemáticas do concelho de Mogadouro nos 3 últimos mandatos. António Machado Presidente da Câmara Municipal de Mogadouro

Sessão de assinatura do Protocolo de Cooperação entre o Regimento de Engenharia nº 3 e o Município de Mogadouro

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inda na qualidade de candidato à presidência da Câmara Municipal de Mogadouro, em agosto de 2001, sou abordado por três cidadãos ligados à aeronáutica, aficionados e entusiastas de voos planados, arquiteto Artur Gonçalves, engenheiro José Carlos Fernandes, e Adriano Osório, que me chamaram a atenção para as ótimas condições climatéricas para a prática de voos planados – voo à vela. Eleito em dezembro de 2001 presidente do Município e entusiasmado com a oportunidade de implementar em Mogadouro uma infraestrutura que permitisse a prática de um desporto radical de inovação, raro no país, porquanto só existiam então dois centros ligados à formação de pilotos de voos planados, resolveu a Câmara Municipal, após ponderação de interesses e custos, avançar com a construção de um aeródromo que servisse de base à pratica desse desporto. Escolheu-se o local, alto de Azinhoso, e elaborou-se um projeto de raiz da autoria do arquiteto Artur Gonçalves que amavelmente o ofereceu. Encarregado o vereador da Obras Públicas, António Joaquim Pimentel, de executar este projeto, vimos nascer com a determinação deste homem para vencer obstáculos que se interpuseram, aquisição e negociação dos terrenos, desafetação da reserva ecológica nacional e apresentação do projeto a apoios comunitários, já não um campo de voo à vela mas o Aeródromo Municipal de Mogadouro. Criou-se a Associação Internacional de Voo à Vela para sustentar oficialmente o projeto e deitamos mãos à obra. Para obviar os custos solicitamos os serviços da engenharia militar que rapidamente se disponibilizou para realizar o trabalho de terraplanagem em toda a pista. Surge assim o Protocolo de Cooperação entre o regimento de Engenharia nº 3 e a Câmara Municipal de Mogadouro, assina-

do em cerimónia realizada em fevereiro de 2002 no Salão Nobre, pelo Presidente da Câmara, pelo Coronel Jorge Santos, RE3 e a Engenheira Joaquina Miranda, CCDRN. Com o 1º Sargento Afonso Resende a chefiar a frente de trabalho e a aprovação do projeto e apoio financeiro pelo PICTUR, foi possível inaugurar o aeródromo com uma pista asfaltada de 1270 m, em 31 de julho de 2005. Entregue a gerência do aeródromo ao Vice-presidente, Dr. João Manuel dos Santos Henriques, e contratado o pessoal de apoio foi possível por à disposição do concelho e do país uma infraestrutura multidisciplinar aprovada pelo INAC e hoje chefiada com recursos humanos próprios, alguns já formados em Mogadouro. Está em pleno funcionamento o Centro Internacional de Voo à Vela de Mogadouro (CIVVM) com funções de formação de pilotos de planador, que tem vindo a obter alguns sucessos no número de diplomas atribuídos pela escola e homologados pelas instâncias superiores, em quantidade que excede a das restantes escolas do país juntas. Para além das funções habituais de estar à disposição da defesa civil do território, de turistas e aficionados da aviação, desenvolve ação meritória na realização de um dos eventos mais populares do Concelho de Mogadouro, o Red Burros Fly In que, nos finais dos mês de julho, faz acorrer à nossa terra milhares de pessoas. O CIVVM publica uma revista única no país, o magazine Planadouro, de alto nível técnico nas valências do voo à vela. Parabéns pelo dinamismo e pela promoção que imprime ao Concelho de Mogadouro.


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OPINIÃO

Abordava eu na última edição a falta de projetos que ajudassem a fomentar o voo à vela em Portugal. Pois foi com muita alegria que as boas novas não tardaram a chegar. Acaba de se dar um passo de gigante na sedimentação de um desses projetos de que tanto carece a comunidade ligada a esta atividade. Iniciaram-se as obras de construção do aeródromo da Amendoeira em Montemor-o-Novo e respetivas infraestruturas. Projeto do Centro de Voo Livre (CVL) levado a cabo com apoio do Município local. Pela importância do projeto, pela admiração pessoal, e por estar bem ciente da titânica tarefa que ainda os aguarda, partilho aqui a mensagem que enviei aos Cmdts. Sá Correia e João Marques, mal o início das obras foi notícia.

Por Pedro Mesquita

Em cima à direita e na pág. seguinte: Visita ao local das obras do grupo de participantes no seminário de refrescamento de instrutores, realizada na tarde do dia 23 de fevereiro de 2013. Imagens de João Corredeira

Aeródromo da Amendoeira:

Novo projeto com destino traçado ao sucesso


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Caríssimos Acabo de ler no site da CVL a notícia do inicio das obras de construção do Aeródromo e respetivas infraestruturas (Hangar, escola, instalações sociais, equipamentos…). Os meus mais sinceros parabéns! Parabéns pelo projeto, por ver que estão a conseguir concretiza-lo, e pela luta titânica que sei que tiveram até aqui. É apenas o início de muitas outras lutas. Eu estou no projeto Mogadouro desde a primeira hora e sei bem o que isso é. Mas o V/ é de uma importância vital para o desenvolvi-

mento nacional da atividade. Escrevi um artigo na edição nº 3 do magazine PLANADOURO precisamente sobre isso. A atividade só se desenvolverá em Portugal com o aparecimento de mais projetos, autónomos e sem estar constantemente sujeita outras guerras e tricas menos dignas. Como sempre, há quem vá à frente. Há quem faça. Quem empreenda. Quem luta. Quem tem visão. Quem não se conforma com as “não existências”. Quem não se limita a ficar sentado à espera que as coisas lhes caiam do céu. E depois há os “sabichões” que fariam sempre melhor, mas como nunca fizeram nada limitam-se a fomentar

essas guerras e tricas e apenas se apresentam para criticar e desfrutar dos projetos desenvolvidos por outros. A pluralidade de projetos leva a que se agucem competências. Partilhar, competir (de forma saudável claro), organizar eventos conjuntos, combinar permutas, etc. Tudo isto só é possível se tivermos um leque de projetos, que sendo “alternativos e concorrenciais” não deixarão NUNCA de ser COMPLEMENTARES… Um grande BEM HAJAM para vocês!! Parabéns e força! Abraço amigo,

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OPINIÃO

E se o voo à vela fosse importante para a Por Mathieu Neuforge

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o passado ano de 2012 o CIVVM teve o privilegio de ver alguns dos seus pilotos qualificados como instrutores de voo. Abraçando a nova função, estes instrutores irão percorrer com rigor um "syllabus" cuidadosamente elaborado levando a cabo a formação personalizada de alunos candidatos a piloto de planador. Estes serão munidos com conhecimentos teóricos e técnicos adequados para que tenham sucesso não só na obtenção das suas licenças como também na realização de voos com a segurança pretendida. Aprenderão que a natureza do voo sem motor exige eficiência e logo proficiência na gestão da energia do planador aliada a uma pilotagem precisa. Rapidamente perceberão que o voo a vela é o exercício de aviação no seu estado mais puro. Paralelamente os alunos irão assimilar que a segurança do voo depende não tanto das mãos do aviador mas sim da sua cabeça e de uma forma quase imperceptível começarão a interiorizar algo de muito mais evasivo do que polares, voltas coordenadas e anéis de MacCready;

LINHA AÉREA? algo a que podemos chamar de "cultura aeronáutica". Difícil de definir, trata-se de uma filosofia de segurança baseada em disciplina e conhecimento, no uso sistemático de bom senso, no pensamento "fora-da-caixa" e na busca constante de excelência associada a um modelo comportamental de humildade, rigor e assertividade. A "cultura aeronáutica" tem como combustível a paixão pelo voo e tudo o que o viabiliza; este é um sentimento que os pilotos de planador conhecem bem. Penso que um instrutor de pilotos de planador não deve declarar "missão cumprida" ao ver os seus alunos licenciados; deverá sim aprender a incentivar e orientar aqueles que demonstraram vontade e potencial para continuar a sua formação aeronáutica. Este instrutor poderá ter a singular oportunidade de ter impacto no principio de carreira de um futuro piloto profissional, cultivando nele a paixão que o atraiu para a aviação, incutindo nele a referida "cultura aeronáutica" e orientando-o na sua metamorfose de "ser terrestre" para "ser aéreo". Todas as qualidades acima mencionadas são desejáveis

num piloto de linha aérea e felizmente estão presentes na maioria deles, no entanto é a minha opinião que na aviação de linha moderna caminha-se para uma crise da referida "cultura aeronáutica" porque existe uma crise de paixão pelo voo. Frequentemente nos cockpits aparecem indivíduos para quem voar profissionalmente não é um objectivo em si mas meramente um meio para atingir objectivos alternativos. Os critérios qualitativos de contratação de pilotos profissionais variam em função das necessidades quantitativas das companhias. Para estas, os pilotos são ferramentas (caras mas ainda indispensáveis) para o alcance dos seus objectivos económicos. A formação destes, baseada em exigências legais que salvaguardam a segurança, é ajustada às necessidades das companhias e tendencialmente a valorização de indivíduos pela sua "cultura aeronáutica" está a desaparecer. A médio e longo prazo isso poderá ter um impacto na segurança dado que a segurança de uma operação aérea é directamente proporcional à qualidade dos seus profissionais e acredito que um profissional apaixonado pelo seu trabalho fornece um "produto" de maior qualidade. Actualmente um indivíduo que ambicione seguir uma carreira na aviação não está sensibilizado para a escolha do voo a vela para iniciar a sua formação e poderíamos enumerar varias razões que justifiquem isso. Irei, no entanto, destacar que a indústria de formação de pilotos profissionais não valoriza ou simplesmente desconhece a mais valia qualitativa que o voo a vela pode proporcionar aos futuros pilotos de linha aérea. Associada a isso está uma comunidade de voo à vela tendencialmente fechada nela própria e alheia ao resto do mundo aeronáutico. Com esta realidade em mente, termino deixando uma questão para reflectir: Não caberá à comunidade do voo a vela fazer ver à indústria de formação de pilotos profissionais e aos legisladores da EASA que existe um papel para o voo à vela na formação inicial de pilotos de linha aérea?


BOUO ZEM METORE

BD de Gonzalves


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NOTÍCIAS

Festa no céu e na terra de Mogadouro No passado dia 28 de Julho DE 2012 o Aeródromo Municipal de Mogadouro, localizado na freguesia de Azinhoso, foi palco da 3ª edição do Red Burros Fly In. Comemorando o aniversário do aeródromo, que entra nesta data no oitavo ano de atividade, o evento tem crescido em termos de notoriedade nacional e internacional mantendo o caráter festivo e despretensioso que tem sabido cultivar desde a primeira edição. A mobilização de entusiastas da aviação e do público em geral foi a maior até agora alcançada o que deixa os seus organizadores satisfeitos pela concretização dos objetivos de convívio entre o público e os pilotos, pela qualidade do espetáculo aéreo que proporcionou e pelos efeitos que o evento tem na promoção da região de Mogadouro e do Centro Internacional de Voo à Vela do Município de Mogadouro (CIVVMM) cuja atividade em prol da formação e da dinamização do voo em planador é reconhecida. Claro que numa festa com este espírito e neste local os burros, mais uma vez, marcaram bem a sua presença e proporcionaram emocionantes “voos rasteiros” a valentes de todas as idades.


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ssistiram ao festival aéreo deste ano perto de 4000 pessoas, número que atesta o crescimento da notoriedade do evento. Para além do público local que continua a aderir, são cada vez mais os que viajam de todo o país e da vizinha Espanha para vivenciar a atmosfera e o espetáculo que aqui se realiza no último sábado do mês de julho. A organização recebeu 104 inscrições de aeronaves para participarem no Fly-In que decorre ao logo do dia, tendo 41 delas sido enviadas dos quatro cantos do país vizinho, o que dá a perceber o grau de espalhamento da mensagem de acolhimento e de convívio que é a marca de toque deste evento. As condições de nevoeiro que se verificaram na manhã deste dia na orla costeira de Portugal impediram que muitos pilotos inscritos realizassem o voo para Mogadouro. Felizmente na região de Mogadouro as condições do tempo foram as melhores, contribuindo muito para o lustro deste encontro de entusiastas da aviação. Participaram efetivamente no encontro 70 aeronaves ultrapassando largamente os números atingidos nas edições anteriores, distribuídas pelas classes de aviões ligeiros, de

aviões ultraligeiros e de autogiros. Viajaram nestas aeronaves mais de 140 pessoas. Tanto a imprensa generalista como a especializada na aviação, em toda a diversidade de suportes anunciou a realização deste evento em Mogadouro. Realizado o festival outro tanto aconteceu, agora dando conta do que se passou. Através das redes sociais a troca de mensagens e de imagens atingiu proporções muito significativas. Especialmente no YouTube a partilha de vídeos esteve muito animada, deixando um registo visual bastante forte do que se viu e sentiu nesta festa. No que respeita às questões fundamentais de organização e segurança do Fly-In e do festival, para além do trabalho de gestão do espaço e de encaminhamento no solo realizado pelo corpo de voluntários, foi inestimável a colaboração graciosa dos controladores aéreos profissionais que se juntaram à organização partilhando as suas competências e envolvendo-se na magia da festa. Rende-se assim uma homenagem bem merecida a José Rocha (controlador militar) e a Pedro Batista (controlador na torre do Porto) que se aplicaram em desembaraçar o tráfego aéreo nos momentos críticos de chegada e de partida.

Nesta página: Vista aérea do aeródromo durante o fly-in. Imagem de José Rocha Concentração na mesa dos “controladores” Imagem de João Corredeira Na página da esquerda: Cartaz de divulgação do evento. Design de Nelson Reis


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NOTÍCIAS

CALEIDOSCÓPIO AERONÁUTICO O público, composto por pessoas de todas as idades e proveniências, respondeu à chamada desfrutando a tarde de verão, preenchendo e animando o espaço disponível, produzindo um ambiente rico de luz, cor e festa. O festival aéreo teve início às 14:00H com a intervenção de boas-vindas realizada pelo Sr. Presidente da Câmara Municipal de Mogadouro, Dr. António de Moraes Machado, que deu o sinal de partida para o espetáculo aéreo. Passagem de autogiro Imagem de José Loureiro - ULM em exposição - Alinhamento das aeronaves das atrações - Parque de ULM de visitantes Imagens de João Corredeira


UM ALINHAMENTO DE ATRAÇÕES SENSACIONAL Planador ASW 15B – Pedro Mesquita A abertura das exibições aéreas coube ao CIVVMM com o voo de demonstração de performance e manobrabilidade realizada pelo piloto Pedro Mesquita aos comandos do ASW 15B. Para além da descolagem e de uma passagem baixa sobre o eixo da pista 03 na configuração de reboque, foi também realizada uma passagem a alta velocidade seguida de uma aterragem de precisão. Aos comandos do MS 893A RALLYE, avião rebocador do CIVVMM, esteve o piloto Camilo Miranda.

Emanuel Alves

Salto de precisão de paraquedistas Dando continuidade ao sucesso obtido no ano anterior, assistiu-se ao salto de precisão realizado por 4 paraquedistas do Pára-Clube da Maia, que voltou a proporcionar imagens vibrantes, cheias de cor, que combinam controlo e graciosidade. A pilotar o avião Cessna 172 na missão de transporte e largada dos paraquedistas esteve Mathieu Neuforge que, abraçando de forma entusiástica o espírito do evento, colaborou como voluntário nas tarefas de coordenação no solo.

Husky AA-1 – Marinho Pereira Foi uma surpreendente novidade a exibição do piloto Marinho Pereira aos comandos de um modelo de avião raro entre nós. As capacidades de descolagem e aterragem curta do Husky A-1 foram plenamente exploradas e testemunhadas pela multidão que vibrou com a exploração dos limites de manobrabilidade desta aeronave, superiormente pilotada por um aviador que já marcou os seus créditos nas edições anteriores do Red Burros aos comandos de outros aviões. Um avião belo, obediente e potente, que faz sonhar na liberdade de descolar, aterrar e voar em praticamente qualquer local! José Loureiro

João Corredeira


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NOTÍCIAS

Bellanca 7ECA Citabria – Pedro C. Pereira

J. Loureiro

Pedro Cunha Pereira regressou ao Red Burros para nos fazer desfrutar de uma demonstração da sua capacidade de gestão da energia do Citabria 7ECA. Um brilhante e elegante espetáculo de pilotagem num avião clássico que está cada vez melhor em forma estética e funcional! O piloto realizou também voos de batismo para o publico.

Patrulha Fantasma Asso VXVX-Ray - Carlos Costa Rutan VariEze - José Figueiredo

J. Corredeira

Rever o “canard” VariEze de José Figueiredo em voo e no solo continua a fascinar. Carlos Costa, o líder da Patrulha Fantasma, apresenta-se agora com o Asso VX-Ray. Duas aeronaves modernas em que motores mais eficientes de baixa cilindrada proporcionam elevadas performances, valorizadas pela sincronização das passagens e manobras. A estes dois pilotos se deve um trabalho admirável de promoção da aviação experimental no nosso país, representando a Experimental Aircraft Association dos EUA, organizadora dos eventos Airventure em Oshkosh, meca da aviação experimental mundial.

YakYak-52 Smokewings – Marco Rodrigues Foi com uma exibição consistente e profissional que Marco Rodrigues a solo, aos comandos do Yak 52 negro Smokewings, presenteou a multidão que vibrou com as manobras, passagens e cruzamentos de precisão, num espetáculo visual cuja banda sonora provem do característico rumor emanado pelo motor radial, e que constituiu a exibição aérea que empolgou os presentes pela força das manobras mas também pela interação com o público.

J. Loureiro


J. Loureiro

J. Loureiro

Aerobática Extra S 300 - Filipe Conceição e Silva Pitts S2B - Luís Garção A evolução coordenada do Pitts S2B azul de Luís Garção e do Extra 300 vermelho de Filipe Conceição e Silva espantou-nos pela aparente facilidade e naturalidade das manobras de voo invertido e movimentos de espelho em perfeita simetria. Voo em formação cerrada e exibição a solo combinaram-se numa sequência e ritmo que prenderam a atenção do público, deixando no céu os traços de fumo que materializaram as estonteantes trajetórias dos aviões e as prolongaram na retina.

Voo em formação dos 8 aviões participantes, momento final de rara beleza que fica como um símbolo do espírito do Red Burros FlyFly-In! Nelson Reis


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NOTÍCIAS

J. Rocha (Arquivo do Município de Mogadouro)

Os burros da festa Claro que no Red Burros não podem faltar os burros! Esta é uma nota tónica da experiência proporcionada pelo evento. Eles marcaram a sua presença proporcionando circuitos sob um espaço sombreado criado no interior do recinto do aeródromo, passeando os mais pequenos, e não só, que assim puderam “voar”… a baixa altitude. Este é um contributo da população de Azinhoso, coordenado pela Junta de Freguesia, que assim promove junto do vasto público a defesa da raça asinina e os valores e tradições da região.

J. Corredeira

J. Corredeira

como uma correia de transmissão e um elo seguro da rede de decisão que um evento deste tipo envolve. Depois da programação e da planificação realizada pelos responsáveis há a árdua tarefa de aplicar o plano à realidade e de resolver as incontáveis novas situações que sempre aparecem. Neste capítulo deve ficar bem sublinhado o empenho e dedicação dos voluntários que se prestaram a participar nesta edição de 2012,. Sem a sua ajuda a festa não seria possível!

Espírito dos voluntários Uma celebração da aviação e do convívio entre a comunidade aeronáutica e o público só funciona se tiver o contributo de uma equipa dedicada de voluntários que agem J. Corredeira


O público acompanhou com entusiasmo o espetáculo. Imagem de J. Rocha (Arquivo de Município de Mogadouro

Um projeto em crescimento Em conclusão, e como ficou claro pelo atrás exposto, tivemos uma jornada de celebração da aviação onde animação e descontração, as marcas do Red Burros Fly-In, se confirmaram e se projetaram para o futuro onde este evento continua a afirmar-se como um ponto especial do ano aeronáutico. O êxito alcançado nas três edições já Husky e Cessna 182 Imagem ar-ar de João Corredeira Aterragem do Rutan VariEze de José Figueiredo Imagem de José Loureiro

realizadas permite à Câmara Municipal de Mogadouro, que o promove, e aos voluntários que com ela colaboram na organização do festival, traçar o objetivo de dar a este evento um carácter regular, calendarizado, em cada ano, para o último sábado do mês de Julho. Assim...

Encontro marcado no

Red Burros FlyFly-In 2013!


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RED BURROS FLY-IN

Compromisso de voluntário Já se passaram três anos desde a primeira edição do Festival Aéreo RED BURROS FLY-IN que, a cada ano que passa, se converte num festival mais admirável, com mais aviões e mais espetadores, algo notável para uma vila do interior como Mogadouro. Tal facto implica um maior compromisso organizacional.

Para montar e gerir um evento desta importância é necessário uma grande coordenação e cooperação. O espírito de equipa com altos índices de motivação fazem com que tudo funcione, salientando o facto da esmagadora maioria dos intervenientes serem voluntários. Com um protocolo bastante rigoroso e perfeitamente definido, cada elemento da organização tem uma tarefa precisa a cumprir. No meu caso, juntamente com o meu amigo Mesquita, fomos destacados para realizar várias funções, nomeadamente transmitir aos pilotos o local de parqueamento das aeronaves, auxiliar e coordenar o seu reabastecimento e distribuir pequenas lembranças. Durante toda a manhã, o trabalho foi bastante intenso, era necessário que tudo estivesse operacional para o início do evento. Após o fecho previsto da pista, regressei a Mogadouro onde já me esperava, e vindos de Coimbra, o meu amigo Francisco Batista e a sua esposa. Eles estavam de visita e pela primeira vez vinham assistir ao festival aéreo do RED BURROS FLY-IN 2012. Sendo eu um bom Mogadourense, a hospitalidade teria de ser exemplar e ao mais alto nível. A gastronomia é um dos valores que distingue uma região, por isso foi preparada a verdadeira e saborosa posta assada na brasa do Talho Custódio, sem dúvida a “cereja no topo do bolo”. Às 14 horas o espetáculo começou, e uma grande multidão de pessoas afluiu à localidade do Azinhoso, para acompanhar as manobras dos incríveis pilotos, que de forma muito profissional exibiram fantásticas acrobacias. Além das acrobacias, existia também uma grande variedade de atividades, que proporcionaram aos visitantes horas de diversão e de convívio. Algumas dessas atividades foram: os passeios de burro, a atuação dos gaiteiros,

a venda de produtos regionais... Todos estes fatores contribuíram para que existisse muito dinamismo e animação nessa extraordinária tarde. No final do evento, as aeronaves ordeiramente descolaram do aeródromo e seguiram viagem. Os responsáveis pela organização ficaram satisfeitos, procederam ao parqueamento dos planadores no hangar, e por fim encerraram este maravilhoso festival aéreo. Acredito que estamos numa fase de amadurecimento, e mais novidades poderão ser implementadas nos próximos anos, para que este evento continue a oferecer um magnífico espetáculo de forma a proporcionar um convívio único e memorável.

A

o longo do dia, foram várias as peripécias que acorreram, das quais gostaria de partilhar um pequeno episódio, intitulado “pernas para que te quero”. Encontrava-me no meu posto a realizar as minhas funções, quando começo a ouvir o som de uma aeronave cada vez mais próxima, olhei nessa direção e apercebime que a mesma se dirigia para o local onde me encontrava. A minha reação instintiva foi correr em direção à vedação do aeródromo e num impulso comecei a gritar “FUJAM, FUJAM”. Olhei assustado para o piloto e apercebi -me que a aeronave se encontrava a descolar bem junto a mim. Foi um momento muito intenso, e de preocupação, dado que a aeronave esteve realmente muito próxima. Mais tarde, informaram-me que um dos pneus da aeronave rebentou ao aterrar, o que fez com que o piloto perdesse algum controle da mesma, optando por abortar a aterragem, e voltar a descolar. Evitando assim o risco de ocorrer algum acidente.


NOTÍCIAS

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TÉRMICAS Encontro convivial e único no CIVVM

Imagem de Nelson Reis


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NOTÍCIAS

Momentos do Red Brurros Fly - In

TÉRMICAS 2012

A 2ª edição do Red Burros Fly-In TÉRMICAS 2012, encontro de voo à vela organizado pelo Centro Internacional de Voo à Vela de Mogadouro (CIVVM) decorreu de 21 a 29 de Julho, tendo atraído pilotos de diversas regiões de Portugal e de Espanha. As excelentes condições meteorológicas verificadas durante a semana permitiram realizar voos de viagem um pouco por todo o distrito de Bragança. A atmosfera descontraída é uma das marcas deste evento. Em vez de um caráter competitivo, o encontro é sobretudo cooperativo. Pilotos mais experientes e menos experientes trocam informações sobre as condições atmosféricas e os padrões de desenvolvimento dessas condições, sobre técnicas de centragem das “térmicas”, sobre a localização das famosas “térmicas de serviço, sobre as áreas do território mais amigáveis em caso de aterragem fora, sobre os procedimentos de segurança a implementar, realizam-se voos em duplo comando e a solo, enfim, partilham-se os saberes e os meios disponíveis. No final de cada jornada de voo o convívio continua, agora centrado na deliciosa e substancial gastronomia regional, e é complementado pelas inesgotáveis histórias épicas e humorísticas e pelas picardias entre sempre inspirados “oradores” de serviço.


Na página da esquerda: Descolagem do ASW 24 - Imagem de N. Jourdain. P. Mesquita pilotando o Twin - Imagem de N. Reis SZD Jantar Standard 3, Piper Super Cub e MS 893A Rallye em alinhamento na placa Imagem de J. Corredeira

Paulo Cabral pilotando Twin Astir CS-PBH. Sá Correia aterra no ASW 15B. Piloto e ajudantes conduzem o SH Discus B de regresso à placa do aeródromo. Churrasco e “minis” no final da jornada de voo à vela. Imagens de J. Corredeira


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DOSSIER ASW 15

ASW 15 Primeiro standard de Schleicher e Waibel Por Jo達o Corredeira

Imagem de Jo達o Corredeira


A

Alexander Schleicher GmbH&Co é uma das maiores e mais antigas empresas de concepção e produção de planadores que até aos dias de hoje continua de boa saúde, mantendo em constante produção novos e melhores modelos para todas as classes de planadores preconizadas pela FAI (Federation Aériene Internacionale). Alexander Schleicher, nasceu em Huhnrain em 22 de Maio de 1901. Filho de carpinteiro, aos 14 anos começou a trabalhar com o seu pai numa fábrica de mobilias. E m 1923 foi trabalhar na fábrica de aviões Weltensegler en Baden-Baden, tendo-se mudado para Wasserkuppe 2 anos mais tarde a desempenhar funções na RhönRossitten Gesellschaft na construção de planadores. Acabou por aprender a voar e em 1926 ganhou o campeonato de planadores que decorria todos os anos em Wasserkuppe. Aplicou o dinheiro do prémio para fundar a sua própria empresa, começando no espaço do salão de danças Huhnrain tendo mais tarde alugado uma oficina em Remmerz. Schleicher continuou a projectar planadores até ao inicio da Segunda Guerra Mundial, tendo a sua empresa durante este período ministrado instrução de voo, prestado serviços de manutenção e reparação aos planadores da juventude hitleriana. Após 1945, Alexander Schleicher regressou às suas raízes e durante 6 anos dedicou-se à produção de mobiliário usando as instalações da sua empresa. Em 1951, após serem levantadas as restrições pelos Aliados, retomaria a construção de planadores. Engenheiros aeronáuticos como Rudolf Kaiser, Gerhard Waibel, Martin Heide e Michael Greiner são reconhecidos internacionalmente e respeitados, uma vez que os seus nomes estão associados à fiabilidade das suas aeronaves desde a fase de projecto à fase do voo. A Alexander Schleicher ganhou mais notoriedade através de planadores projectados por Rudolf Keiser, como o ASK4, ASK 6, ASK 7 (bilugar), ASK 8, ASK 13 (bliugar), ASK 14

Imagem de Pedro Mesquita (motoplanador), ASK 16, ASK 21 (bilugar) e ASK23. O engenheiro aeronáutico Gerhard Weibel projetou planadores marcantes como o ASW 12, ASW 15, ASW 17, ASW 19, ASW 20, ASW 22, ASW 24, ASW 27, ASW 28. Num período mais recente, a Alexander Schleicher destacou-se também com os planadores de Martin Heide o ASH 25 (bi-lugar), ASH 26, ASH 30Mi, ASH 31 e de Michael Greiner com o ASG 29. Por esta altura o leitor já deve ter reparado que as duas primeiras letras representam a abreviatura de Alexander Schleicher e a terceira letra representa o apelido do responsável pelo projeto. A empresa mantém o negócio na família, sendo actualmente propriedade dos netos, Peter e Ulrich Kremer. Edgar Kremer, também um dos proprietários, continua a servir a empresa, assumindo apenas o papel de consultor. É constituída por 115 funcionários, produzindo cerca de 100 planadores anualmente, dos quais 65% são para exportação. Todos os componentes são construídos na fábrica de Poppenhausen (Alemanha), permitindo grande flexibilidade e grandes níveis de controlo de qualidade.


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DOSSIER ASW 15

ASW 15 Concepção e evolução técnica

Imagem de Pedro Castanheira

O ASW 15 foi desenhado Gerhard Waibel tendo sido produzido em série pela Alexander Schleicher GmbH&Co. O seu voo inaugural foi realizado a 20 de Abril de 1968 em Wasserkuppe. É um planador de “plástico” contendo no entanto alguns componentes em madeira balsa (estrutura interna), trem-de-aterragem fixo, asa média, leme de profundidade monobloco, gancho de reboque deslocado do eixo do planador, freios aerodinâmicos do tipo Schempp-Hirth e desprovido de tanques para lastro. O desenvolvimento da versão “B” veio introduzir alguns melhoramentos ao projeto inicial, uma vez que as regras FAI para a classe standard tinham sido alteradas, passando a permitir trem-de-aterragem retrátil e lastro. O gancho de reboque foi reposicionado para o plano de simetria do planador, aumentado o espaço em comprimento do cockpit, leme de direcção 11cm mais alto que o original, trem de aterragem principal retrátil com uma roda de maior diâmetro, painel de instrumentos redesenhado para permitir maior visibilidade para a frente e sistema de lastro com capacidade para 90 litros. O perfil na raíz das asas é o Wortmann FX 60-163, transitando a partir do inicio do aileron até à ponta da asa para o perfil Wortmann FX 61-126. A dada altura, num dos exemplares iniciais, foi detectado um fungo que atacava a estrutura interna de madeira, o que veio a originar a TN (Tecnical Note) 23 de carácter obrigatório, referindo a necessidade uma inspecção a todos os ASW 15 e ASW 15B. Nestas inspecções foi detectada infecção fúngica nas longarinas e nervuras em quatro ASW 15, tendo nos restantes sido aplicado anti-fúngico como medida preventiva. Assim sendo, em 1973, a partir do número de série 15357, a estrutura em madeira balsa foi posta de lado e passou a ser utilizado o Conticell C 60, levando a um ligeiro aumento

Diagrama 3 vistas de João Corredeira


Evolução do desenho da fuselagem, deriva e leme no peso das asas – (balsa=62-68kg | Conticell C 60 = 7075kg) - não tendo no entanto penalizado a performance do planador. O Conticell C 60 é uma espuma pvc com densidade de 60kg/cm³ amplamente utilizada em aeronáutica, especialmente na concepção de planadores, devido à sua elevada resistência e durabilidade. A empresa encarregue de produzir este material, Continental, deixou de o fazer, tendo no entanto surgido um material substituto, o Divinycel, produzido pela empresa Sueca DIAB. Inicialmente o peso máximo à descolagem estava estipulado nos 318Kg para os modelos ASW 15, sendo que os ASW 15B tinham um peso máximo à descolagem de 408Kg, incluindo o lastro de água localizado nas asas. O ASW 15 conta com um total de 452 exemplares, tendo a Alexander Schleicher encerrado a produção em 1977. Os números de série do ASW 15, iniciam com o 15001 até ao

Imagem de Sérgio Mota Ferreira


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DOSSIER ASW 15

Imagem de Paulo Cabral Imagem de João Corredeira

15183, sendo que a partir do 15184 até 15453 são da “clássica” versão “B”. Os ASW 15 com os números de série 15001 ao 15356 mantiveram a estrutura interna em madeira balsa, o que totaliza 172 ASW 15B construídos com este material e 97 planadores com o Conticell. Considerando todos os modelos construídos com madeira balsa (ASW 15 e ASW 15 B) obtemos um total de 355 unidades. A partir de 1991 foi possível instalar uma roda de cauda certificada no ASW 15 e ASW 15B (TN nº24), uma vez que até aqui a cauda estava equipada com um patim de borracha. Em 1997 foi emitida uma TN que permite a instalação de winglets produzidos pela empresa FBW-Flugzeugbau GmbH em ambos os modelos, o que vem adicionar maior estabilidade ao ASW 15. No que respeita ao limite operacional, em 2007 saí a TN nº27 que permite aumentar o tempo de vida do planador até as 12.000 horas de voo.

Palmarés admirável No campo das competições, estreou-se no Campeonato do Mundo de 1968 realizado em Lezne (Polónia), pilotado pelo alemão Hans-Werner Grosse, tendo terminado em 10º lugar da classe standard. Dois anos mais tarde, no Campeonato do Mundo em Marfa (Texas), Gerhard Weibel alcançou o 6º lugar da classe standard. Em 1972, o piloto Eugene Rudesnky (U.S.S.R), conseguiu obter o 2º lugar no Campeonato do Mundo realizado em Vrsac (Jugoslávia). Em 1972 o piloto Karl Striedieck (antigo piloto da USAF – Força Aérea dos E.U.A) estabeleceu o record do mundo de distância em planador (ir e voltar), 3 três vezes aos comandos de um ASW 15. O primeiro foi em 7 de Novembro de 1971, em Eagle Field – Pensilvânia, tendo voado 916.30Km. No ano seguinte mas em 7 de Outubro, estabelece o record de 1025.02 Km (mesmo local), e 8 dias depois, a 15

ASW 15 BM pronto para a descolagem

ASW 15 BM Versão de descolagem autónoma A Alexander Schleicher chegou a modificar um ASW 15B número de série 15440 (alterado para 15001M) para acomodar um motor Wankel KM27, retrátil de 300cc equipado com um depósito de combustível de 20 litros. Para além da instalação do motor, foi necessário efectuar um corte das asas em cerca de 30 centímetros, isto para manter os esforços estruturais dentro dos limites. O ASW15 BM, matrícula D-KIWB, acabou por ser abatido ao registo oficial em 1983 pelo que se desconhece a sua localização e estado. Existe ainda outro registo de um ASW-15 BR, com número de série 15207, matrícula DKGHE, do qual apenas de sabe que terá tido um acidente em 21 de Maio 1989. As únicas fotografias e a pouca informação disponível que foi possível encontrar sobre esta versão, foram retiradas do site www.asw15.org, não tendo sido possível apurar o autor das fotos.


Velocidade de afundamento

Velocidade ar indicada

Imagem de Paulo Cabral

Polar de velocidades do ASW 15B

Especificações técnicas Características Comprimento

ASW 15

ASW 15B

6.45m

6.48m

Envergadura

15m

Área alar

11m²

Massa em vazio

205Kg

Peso máximo à descolagem

318Kg

230Kg 408Kg

Velocidade máxima (Vne)

220Km/h

Velocidade de perda

63Km/h

Diedro Perfil aerodinâmico Lastro Carga alar

2º FX61 163 e FX61 126 Não equipado

90 litros

26.5 a 28.9Kg/m²

28 a 37Kg/m²

Coeficiente de planeio máx. Razão de afundamento mín.

1:38 0.58m/s a 70km/h

0.59m/s a 73Km/h

Imagem de João Corredeira


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DOSSIER ASW 15

Uma viagem

across countries Por José Carlos Fernandes

Como diz o provérbio, “a necessidade aguça o engenho” e foi o que aconteceu em agosto de 1996 quando um grupo de pilotos decidiu juntar algum dinheiro e ir pela Europa fora à procura de um planador que permitisse melhores voos.

A

comunidade nortenha estava a crescer e a ganhar alguma experiência voando noutras geografias e começou a tornar-se intolerável não possuirmos uma máquina própria com alguma performance. Não íamos aceitar as velhas desculpas de que não havia dinheiro ou não era fácil adquirir ou manter uma aeronave em Portugal, etc. Certo dia, após os habituais voos locais de manutenção de proficiência, na cativante contemplação do entardecer no aeródromo habitual, em Chaves, um grupo de amigos decide: É agora ou nunca! Fizeram-se contas às participações financeiras reais e prometidas, reviram-se mais uma vez os modelos adequados à experiência e ambição dos pilotos interessados, conferiram-se os contactos de potenciais vendedores e marcou-se hora de partida para

o dia seguinte às seis da manhã com farnel para a viagem. Poderia durar até uma semana, mas a missão era trazer um pássaro na mão. Fomos três, estrada fora, com destino ao primeiro objetivo, um aeroclube em St Denis L’Hotel, ainda a uns bons quilómetros a sul de Paris. O primeiro dia de viagem passou a planar: ainda antes do pôr-do-sol já estávamos no destino a examinar um Cirrus, que se encontrava no meio de um enorme hangar apinhado de planadores que até fazia inveja! Mas, na verdade, o planador não entusiasmou pois tinha uma boa rachadela na canopy, um gelcoat pouco radioso e umas boas folgas que gemiam devido ao trato dos recém alunos piloto que, com toda a certeza, faziam os seus batismos em monolugar naquele mesmo planador.

Em cima: O ASW 15B D-3976 na soleira da pista do aeródromo de Chaves, com cabo esticado, asas niveladas, pronto para a primeira descolagem de um dos sócios-piloto. Imagem de Jyrki Leppanen, 1996 À direita: Adaptações ao cockpit e briefing de dois sóciospiloto acompanhados por vários pilotos e curiosos, em Chaves. Imagens de Jyrki Leppanen, 1996



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DOSSIER ASW 15

Assim ainda o dia não tinha acabado e já viajávamos em direção à fronteira alemã. No dia seguinte íamos examinar outro planador no aeroclube de Hockenheim mesmo junto ao circuito automóvel. Foi amor à primeira vista, mal a porta do hangar se abriu e os primeiros reflexos do ASW15, as suas linhas imaculadas, enfim o seu estado geral fez-nos até desconfiar da intenção dos donos em vendê-lo. Rapidamente percebemos a razão. Um dos donos, o Frank, era um dos técnicos do fabricante de planadores Salto e pretendia adquirir um outro planador com mais performance para participar em competições. Talvez devido à paixão comum entre todos nós, criámos entre todos uma grande empatia. Mais tarde percebi que havia uma forte componente emocional da parte do

Frank quando no dia seguinte ficou a chorar como uma criança ao ver-nos partir com o planador no atrelado em direção a Portugal.

O regresso Viajar mais de dois mil quilómetros com um reboque com quase sete metros de comprimento e com o aspeto de míssil balístico comprado na ex-URSS prometia ser uma aventura. E assim foi. Logo nos primeiros quilómetros percebemos que a mais de oitenta quilómetros por hora o reboque começava a baloiçar ameaçando a direção da trajetória rodoviária. Logo reconhecemos que a opção devia ter sido viajar pelo ar, mas enfim, não poderíamos andar de noite e pela estrada podíamos... O rumo de regresso estava claro e o tempo era precioso, por isso mantivemos sempre o andamento de dia e de

noite. O problema foi que um de nós não conseguia dormir tal era o desconforto e a excitação, tendo chegado ao ponto de, aí por volta de Santander, começar a ter alucinações e jurar a pés juntos que o planador tinha saído do atrelado e tinha ficado atrás no meio da estrada. Após tanta lamúria lá parámos o carro e fomos fisicamente mostrar que o planador ainda lá se encontrava intacto. Era já manhã cedo quando cruzámos a fronteira perto de Chaves, local de destino e base de voo durante aquele e anos seguintes. Finalmente podemos festejar, voltar a montar o planador, apreciá-lo demoradamente, entreolharmo-nos e dizer cada um para si e depois em conjunto - “aqui nasce uma nova etapa dos nossos sonhos”.


Na página anterior Corrida para a primeira descolagem de um sócio aos comandos do D-3976, em Chaves; Um sócio familiarizando-se com o cockpit na companhia de dois pilotos que posam para a posteridade. Imagem de Jyrki Leppanen, 1996 Em cima: Aterragem na pista 16 do aeródromo de Chaves Imagem de Jyrki Leppanen, 1996. Ao lado: Atrelado do D-3976 em viagem no IP4 Imagem de José Carlos Fernandes


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DOSSIER ASW 15

Por Pedro Mesquita

A primeira vez outra vez...

Costumo dizer em tom de brincadeira, mas convicto do que digo, que se perguntarem a um piloto aviador como foi a sua “primeira vez”, este acaba por dececionar grande parte da plateia mas vai relatar o seu voo de largada. O seu primeiro voo solo. Será difícil ao comum dos mortais entender o misto de sensações que atravessam um aluno quando pela primeira vez vai para o ar sozinho. Medo, prazer, emoção, concentração, realização… É chorar e tremer e cantar e sorrir e tentar não estragar tudo. É tentar que termine tudo da melhor forma e ao mesmo tempo tentar que o momento não acabe! “Também cantaste na tua largada?”


A

largada é sem dúvida dos momentos mais marcantes de qualquer aviador. Atinge dimensões inenarráveis. O tema merecia por si só um artigo, e mesmo assim seria uma árdua tarefa. Há coisas que… só mesmo sentindo! Não se descrevem, sob o risco de as “estragarmos”. Depois desse momento, claro que há outras primeiras vezes. E também outras primeiras vezes aeronáuticas. O primeiro looping, o primeiro batismo, o primeiro voo de planador fora do cone, a primeira aterragem fora (não obrigado, essa para já passo. Pastos com vacas ou campos de batatas não são grandes locais para aterrar um planador. Continuo a preferi-las no debriefing ao jantar à mesa no Ti Abílio.) Há contudo um outro momento [aeronáutico] que se aproxima do voo de largada: O primeiro voo num monolugar. Uma máquina que desconhecemos, que nunca voamos com outro piloto já experiente que nos corrija se metermos água, cujo comportamento apenas conseguimos imaginar e cujas reações aos comandos são mais imprevisíveis do que as de uma namorada zangada.

Se num voo de largada a questão passa por gerir a ansiedade , manter a concentração, e tentar cumprir à risca aquilo que já se treinou com instrutor inúmeras vezes, um primeiro voo num monolugar é marcado essencialmente pelo desconhecido. O mistério. As questões. Tantas questões sem resposta!! Como reage aos pedais? E efetividade de ailerons? E leme de profundidade, é muito brusco? E freios, são eficientes? Mas afunda muito ou só perde velocidade? E nos reboques, mantem-se estável ou temos de corrigir muito? E…? E foi assim que um dia chegou a minha vez e descolei no ASW 15. Neste caso um exemplar do modelo ASW 15 B de matricula D-9638, de uma elegância ainda hoje invejada por máquinas moderníssimas. LPMU, a meio de uma tarde de verão, ainda com bastante atividade térmica e ligeiramente atrasado após ter feito 3 batismos inesperados no bilugar do CIVVM. Manual decorado. Todas as velocidades e procedimentos sabidos de cor, salteado e de trás para a frente. Sem esquecer nenhuma das dicas dadas por quem já tinha experimentado a máquina, mas acima de tudo carregado de fé e vontade.

Na página da esquerda: A colocar o para-quedas momentos antes do voo. Imagem de Paulo Cabral Nesta página: - Eu bem que queria fugir, mas eles amarraram-me. - Vais ver que é fácil. Isso aí serve para subir e descer. Se puxas sobes, se empurras desces. Não há que enganar! Imagens de Paulo Cabral


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DOSSIER ASW 15

Na verdade foi com muita vontade que acreditei que tudo iria correr bem quando carreguei no PTT e pedi ao sempre amigo e companheiro Camilo Miranda para iniciarmos a corrida de descolagem. Porque há momentos que são mesmo assim: contaramme que aquilo funcionava e eu acreditei que também seria capaz. Tão diferente! Mas tudo tão diferente! Primeira constatação foi a de que o peso faz mesmo diferença. Reboque levava meia dúzia de metros e já estava capaz de descolar. Menos de metade da pista que o bilugar costuma gastar, ou mais do dobro da velocidade deste naquela mesma distância… Tão leves os comandos. Uma leve pressão na manche e foi suficiente para me fazer sair do solo e subir um par de metros, mantendo o alinhamento com o eixo da pista. Tudo batia certo com o manual e os avisos que levava comigo. Muito franco de comandos, sem reações bruscas, mas bem mais efetivo que qualquer máquina já voada até à altura. Foi um reboque trabalhoso. Muitas térmicas, fortes, e foi fácil perceber que tinha nas mãos um planador com mui-

ta vontade de voar. Precisamos de muito pouco tempo para atingir os 600 metros e me despedir do avião de Reboque. Trem dentro. O Silêncio. A leveza. O mundo parou, e a magia aconteceu. Qual miúdo fascinado a olhar para borboleta, eu estava colado na máquina que voava. E foi óbvio naqueles primeiros segundos, que nascia ali uma relação intensa. Havia harmonia no que fazíamos. De térmica em térmica, nas velocidades, no modo como tudo o que eu queria era tão bem interpretado pelo planador. Foram quase 3 horas de voo. E sempre muito alto. Deu para explorar alguns limites. Voltas apertadas, aproximação à perda, arco amarelo. Não vou esconder que foi um voo de descoberta. Muitas surpresas. Era uma máquina completamente nova. Mas acima de tudo, aquilo que rapidamente aprendi é que é uma máquina franca. As reações repetem-se vezes sem conta. Depois de ver como faz na primeira vez, podemos contar que vai ser sempre assim. Pressenti-o na altura e confirmo-o hoje, uns anos e umas dezenas de horas de voo depois. Da pista vinham notícias de um certo vento cruzado, tão típico das tardes transmontanas, e que estaria a aumen-

tar de intensidade. Horas de aterrar, não sem antes acompanhar um Discus numa estrada de térmicas bem marcada entre Mogadouro e Alfandega da Fé. Em poucos minutos deu para ir, voltar, e à mesma altitude do Discus tal como quando saí. Isto sempre a voar em frente, a velocidade de passeio, claro, a desfrutar o aproximar do pôrdo-sol. Porque voar em Mogadouro ao por do sol… um dia, quem sabe, partilho esse feitiço. Foi uma aterragem difícil. Bastante difícil até. Muitos avisos e muitas leituras sobre reações do planador aos comandos, mas muito pouca informação sobre reações da máquina ao ambiente que a rodeia. Vento estava mesmo forte, planador a acusar efeito de cata-vento muito acima do que eu esperava, falta de habituação minha a comandos tão sensíveis, tornaram a aterragem num quase numero de circo. Mas não passou disso. Rápido, estava em cima da situação e dentro de um planador quase ancorado, não no eixo mas ainda muito dentro da pista. Foi um primeiro voo memorável. E tal como previ, nasceu uma relação que se sedimenta voo sobre voo. Depois desse já foram muitos os voos com surpresas, já foram muitos os desafios, os ventos inesperados, as tér-


Na página da esquerda: - “Índia Victor, D 38 pronto para descolar.” - Final da aterragem, já “ancorado”. Imagens de José Carlos Fernandes Nesta página: Estrada de térmicas, captada em pleno voo . Imagem de Pedro Mesquita

micas estreitas fora do cone, a turbulência quase severa de um dia onde lindos cúmulos de base plana se transformaram em congestus, e em cada um desses voos o verdadeiro desafio fui eu e nunca a máquina…

“Essa esteve sempre onde eu a esperava. Onde eu contava com ela. Relação nobre, de confiança, como se de outro ser se tratasse.


PB - ASW

Desenho a tinta de Pedro Castanheira Observando a graciosa silhueta do ASW 15 quando este, na fase final do circuito de aterragem, se prepara para arredondar a trajet贸ria.


TÉCNICA

D

“O” Altímetro Por Pedro Cavadas Dias

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e quando em vez, por brincadeira, pergunto à minha filha de 3 anos de quem gosta mais, do pai ou da mãe. Ela responde: dos dois! A resposta deixa-me embevecido, mesmo sabendo que não é verdade. Quando está doente ou mal disposta, é a mãe que procura… Enquanto professor de instrumentos de voo, os alunos fazem muitas vezes uma pergunta semelhante: qual o instrumento de voo mais importante. A minha resposta politicamente correta é: Todos! No entanto, sei que, tal como a minha filha, estou a cometer uma mesma imprecisão bem-intencionada. O convite, que tanto me honra, a escrever um artigo sobre um instrumento de voo, levou-me a deixar de lado o “politicamente correto” e eleger um instrumento como o mais importante. Confesso que a escolha não foi difícil: O altímetro. Se, na minha opinião, o altímetro é o instrumento de voo mais importante na aviação geral, ele reveste-se de uma importância acrescida no voo à vela. Capaz de provocar as maiores alegrias quando o vemos subir e as maiores deceções (e por vezes sustos) quando o vemos a descer, os olhos do piloto de planador estão sempre cravados no altímetro, porque ele sabe que este instrumento é o “indicador de combustível” do planador. Ao me propor a falar sobre o altímetro (altímetro de pressão se quisermos ser mais corretos), penso ser oportuno relembrar o seu funcionamento.


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TÉCNICA

Componentes e mecanismo interno do altímetro

Princípio de funcionamento Nas camadas mais baixas da atmosfera (até cerca de 3000 metros de altitude), a pressão atmosférica diminui a uma razão aproximada de 1hPa por cada 30 pés. Assim, houve uma mente brilhante (o físico francês Louis Paul Cailletet) que se lembrou de construir um barómetro que medisse pressão atmosférica e cuja indicação se movesse numa escala de altitudes. Assim nasceu o Altímetro de pressão! O Altímetro é então constituído por uma caixa hermética, tendo como única entrada uma tubagem que está ligada à tomada de pressão estática da aeronave. Assim, podemos dizer que todo o interior do instrumento está alimentado com pressão estática (pressão da atmosfera envolvente). Dentro do altímetro existe uma cápsula expansível aneroide

Pressão de Referência

O Altímetro indica:

QFE (pressão atmosférica no aeródromo)

Avião no chão: ZERO Avião em voo: Altura do avião à pista

QNH (pressão atmosférica reduzida ao nível médio das águas do mar)

Altitude (relativamente ao nível médio das águas do mar)

1013,25 hPa = 29,92 Hg Inch

Avião no chão: QNE Avião em voo: Nível de Voo (Altitude Pressão)

(cápsula hermética contendo vácuo ou uma quantidade muito pequena de ar). Esta cápsula é o sensor de pressão. À medida que a aeronave sobe, a pressão estática diminui, provocando uma expansão da cápsula. Este movimento é transmitido por engrenagens aos ponteiros do instrumento, indicando um aumento de altitude. Tudo estaria resolvido se a pressão atmosférica no nível médio das águas do mar fosse sempre a conhecida 1013,25 hPa da atmosfera ISA. Porque tal não acontece, tornou-se necessário introduzir um dispositivo que permita introduzir diferentes pressões de referência: janela de Kollsman.

Pressões de referência As diferentes pressões de referência inseridas na janela de acerto altimétrico vão resultar em diferentes indicações no instrumento:

QFE É bem verdade que o piloto de planador voa a esmagadora maioria das vezes em QFE. Voar em QNH, obrigaria o piloto a fazer um constante cálculo mental da subtração

da sua altitude em relação à elevação do aeródromo. O uso do QFE é, de facto, mais confortável e menos permeável a erros quando voamos no cone de um mesmo aeródromo. Convém no entanto lembrar que a pressão no aeródromo (QFE) poderá variar significativamente ao longo do dia. Principalmente na aproximação de sistemas frontais, a pressão pode variar significativamente no tempo. Como diz a nossa velha conhecida mnemónica em relação às pressões: “From low to high look out the sky. From high to low look out bellow”. Com efeito, se a pressão diminuir 4 hPa e nós mantivermos um mesmo acerto altimétrico, estaremos a voar cerca de 40 metros abaixo do indicado no altímetro. Esta poderá ser uma diferença significativa no planeamento de um circuito para aterragem. Em voos de curta duração, estes erros serão mínimos. Já nos voos de permanência, uma forma de contornar este risco é pedir à equipa de chão o acerto altimétrico de QFE na aproximação ao circuito. Prevenindo a eventual necessidade de diferentes acertos altimétricos durante o voo (QNH ou 1013hPa para níveis de voo), ou até de um desacerto inadvertido do altímetro pelo piloto, seria uma boa prática o aviador registar o valor de QFE no início de cada voo.


QNH Já para aqueles que se queiram aventurar a sair do cone e fazer umas viagens de “cross-country”, apenas o aeródromo de descolagem é garantido. Já o de aterragem… Por esta razão, e porque dificilmente conseguiríamos o QFE de um outro aeródromo, é aconselhável utilizar o QNH. Passando agora a ler Altitudes no altímetro, poderemos determinar a nossa altura ao aeródromo se ao valor indicado descontarmos a elevação da pista. Para estes voos, será prudente levar uma pequena “cábula” com as informações essenciais dos vários aeródromos da área: pistas, frequência rádio e elevação. O QNH poderá ser determinado com base nas isóbaras de uma carta de superfície. Há, no entanto, uma outra forma talvez mais pragmática de conseguir este acerto altimétrico. Com a aeronave no chão, se introduzirmos no altímetro a elevação do aeródromo, podemos descobrir o QNH na janela de Kollsman. À semelhança do QFE, seria uma boa prática registar o QNH antes de cada voo, prevenindo a eventual necessidade de aterrar num aeródromo no qual desconhecemos o QFE.

Sistema de Estática Sendo a pressão estática a fonte do funcionamento do altímetro, qualquer condicionante que afete o sistema de estática afetará também o altímetro. Um fenómeno clássico (embora felizmente pouco frequente) é o bloqueamento do sistema de estática. Isto pode dever-se a uma série de fatores, tais como: tubagens dobradas, sujidades, insetos, esquecimento de retirar a cobertura de estática… Em todas estas situações, o aviador apercebe-se rapidamente que algo não está bem, logo no início do voo. Noutros casos, este bloqueamento poderá acontecer durante o voo, o que se poderá dever, por exemplo, à for-

mação de gelo na tomada de pressão estática ou ao congelamento de humidades nas tubagens de estática. Quando isto acontece, o altímetro mantém a indicação de altitude a que se deu o bloqueamento e o variómetro passa a ler zero. Assim, quando o piloto observar uma altitude constante e o variómetro a zeros durante algum tempo, será de suspeitar de um bloqueamento de estática. Perante isto, o aviador deverá fazer uma descida e planear o circuito de aterragem fazendo-se valer do seu olho treinado (e não há quem ganhe aos pilotos de planadores na determinação visual de uma altura). Mesmo que o altímetro comece a dar algumas indicações devido a descongelamentos durante Esquema de tubagens do sistema de pressão estática a descida, os valores indicados poderão não ser os corretos. de indicada poderá não estar correta. Após o voo, deverÉ ainda importante lembrar que, quando a estática está se-á fazer uma inspeção cuidadosa a todo o sistema de bloqueada, também o velocímetro fica afetado, indicando estática. velocidades superiores às reais abaixo da altitude de bloPara finalizar, gostaria de falar de um outro erro comum queio. Este erro será tanto maior quanto mais afastados nos altímetros: a fricção nos mecanismos internos. estivermos da altitude de bloqueio, pelo que deveremos Quem nunca deu uns toquezinhos no vidro do altímetro? utilizar velocidades de aproximação significativamente Quantas não foram as surpresas? mais altas e, acima de tudo, voar por atitude e ouvido! Com efeito, a fricção pode provocar alguns erros de indiUma forma eficaz (mas dispendiosa) de resolver o problecação. Aquele toquezinho milagroso pode fazer a difema seria partir o vidro do variómetro. Ao fazê-lo, estaríarença e será um bom procedimento a adotar na preparamos a alimentar pressão de cabine a todo o sistema de ção da aterragem. estática. Uma vez que a pressão de cabine não será muito E agora, já sabem a resposta à pergunta: Qual é o instrudiferente da pressão exterior, voltaríamos a ter indicações mento de voo mais importante? razoavelmente fiáveis de altitude e velocidade. Todos, pois está claro! Um outro fenómeno (este já mais comum) é a acumulação de humidade nas tubagens de estática. Este fenómeno Bons voos! E que o altímetro vos traga resulta em flutuações visíveis de altitude e de variómetro. mais alegrias que desilusões! Nestas circunstâncias, será prudente assumir que a altitu-


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TÉCNICA

A centragem dos planadores Por Nicolas Jourdain Tradução de P. Castanheira

Acima, verificação do carregamento do planador. Imagem de Nelson Reis

O piloto de uma aeronave deve ter consciência do efeito da posição do Centro de Gravidade nas características e na segurança do voo. No voo de planador tal consciência integra-se no âmago de um conjunto de variáveis que têm que ser geridas para garantir, por um lado, a performance ideal e a harmonia da pilotagem, e por outro, a manutenção de bons níveis de estabilidade e de reação positiva do planador nas situações críticas de voo. Vamos focar a atenção nesta matéria procurando as ligações entre os princípios básicos de voo e as operações práticas cuja realização cabe ao piloto.


PONTOS A CONSIDERAR Um planador está sujeito a uma série de esforços: Peso (P): força vertical resultante de todas as massas constituintes e transportadas na aeronave: - Massa dos componentes geradores de sustentação: asas; - Massa dos componentes não geradores de sustentação: fuselagem equipada (estrutura/ instrumentos/rádio/ assento/pesos de lastro) estabilizador horizontal/winglets; - Massa da carga: piloto/para-quedas/bagagem/ lastro/ … - Centro de Gravidade (CG): É o ponto, real ou imaginário, no qual se aplica a resultante do peso. Sustentação (S): Força gerada pelas asas. O perfil aerodinâmico das asas determina a capacidade destas para gerar sustentação. - Força aplicada numa direção aproximadamente perpendicular à trajetória;

- Força proporcional ao quadrado da velocidade de circulação do ar; - O centro de aplicação da sustentação é um ponto (real ou imaginário) denominado Centro Aerodinâmico (CA). Resistência (R): É a resultante de todas as forças geradas na área em contacto com o ar (área molhada) da aeronave (asas/empenagens/fuselagem/trem de aterragem) que se opõem ao movimento: - Força paralela à trajetória - Força proporcional ao quadrado da velocidade de circulação do ar - O ponto de aplicação da força da Resistência (R) é um ponto (real ou imaginário) que coincide com o Centro Aerodinâmico (CA). Em regime estacionário (velocidade constante), a soma vetorial dessas forças é zero (Fig. 1). A Resistência (R) é equilibrada pela componente horizontal de peso. Logo, quanto maior for a atitude de nariz em

baixo do planador (picada), maior é a velocidade e maior é a resistência uma vez que esta aumenta de acordo com o quadrado da velocidade. Consequências para o voo: - Quanto mais forte for a atitude de picada mais alta será a velocidade estabilizada do planador; - Quanto mais velocidade, mais resistência; A Finesse é uma característica importante do planador: Quanto maior ela for, maior a autonomia de um planador para uma dada altitude. É a razão entre a Sustentação (S) a Resistência (R), ou, de forma equivalente, a razão entre a velocidade de deslocamento e a velocidade de afundamento, ou ainda, a razão entre a distância percorrida e a altura perdida. A finesse de um dado planador está intimamente ligada à velocidade de circulação no ar. A "polar" de velocidades é uma representação gráfica que exprime esta interelação.


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TÉCNICA Equilibrio estático : S1 = P + S2 (1) S1*d1 = S2*d2 (2) (1)(2) => S2 = d1/(d2-d1)*P S1 = d2/(d2-d1)*P AN1 : Centragem à frente P = 350kg d1 = 400mm d2 = 4000mm S2 = 39kg S1 = 389kg AN2 : Centragem a meio P = 350kg d1 = 200mm d2 = 3800mm S2 = 19kg S1 = 369kg

CÁLCULO DA SUSTENTAÇÃO NEGATIVA PRODUZIDA PELO ESTABILIZADOR HORIZONTAL Propomo-nos agora determinar de forma aproximada a força gerada pelo estabilizador horizontal para compensar o momento de picada (fig. 3) A força de sustentação negativa a ser gerada pelo estabilizador de um planador centrado à frente (CG próximo do limite anterior) é o dobro da necessária a esse mesmo planador centrado atrás (CG próximo do limite posterior). Esta sustentação negativa prejudica a sustentação gerada pelas asas, e induz resistência e deflexão permanente de superfícies de comando: Tal situação afeta diretamente a finesse do planador. A perda de finesse nestas circunstâncias é tipicamente da ordem de 2 pontos para um planador de classe standard, o que é bastante significativo.

POR QUE É QUE A CENTRAGEM É TÃO IMPORTANTE? A posição do CG relativamente ao centro aerodinâmico (CA) é crucial para garantir a estabilidade e a controlabilidade da aeronave (fig. 2):

- A centragem atrás (CG perto do CA) provoca um comportamento instável e nervoso da aeronave assim como: - Controlo de pranchamento difícil; - Recuperação da vrille difícil ou impossível; - Em teoria, a finesse melhora - A centragem no limite à frente (CG mais distante do centro aerodinâmico (CA)) provoca um comportamento da aeronave menos ágil e elevado esforço de ação sobre os comandos assim como: - Voo estável; - Início das voltas difícil, se não impossível; - Em princípio, degradação da finesse. O fabricante estabelece limites do passeio do CG, geralmente medidos a partir de um ponto de referência, um ponto notável da aeronave (bordo de ataque da asa / firewall, o DATUM, dentro dos quais se deve localizar o Centro de Gravidade em voo. A não conformidade com estes limites compromete severamente segurança de voo (fig. 3). A configuração mais perigosa corresponde à posição junto ao limite posterior (centragem atrás). Nessa

configuração uma ligeira variação em voo da massa embarcada (efeito da transpiração / urinar /...), pode deslocar o Centro de Gravidade para fora do intervalo aprovado. Por isso é muito importante assegurar que o Centro de Gravidade da aeronave em configuração de voo permanece dentro de limites aceitáveis em todos os momentos.

QUANDO DEVER SER REALIZADA A DETERMINAÇÃO DO CENTRO DE GRAVIDADE? A posição do Centro de Gravidade tem de ser determinada novamente sempre que: - O planador sofra alterações que podem afetar a posição do CG (reparações / reparação de pintura / instalação de novos instrumentos) - Atinge o termo da validade da pesagem anterior (normalmente a cada quatro anos).

COMO DETERMINAR A POSIÇÃO DO CENTRO DE GRAVIDADE? Na primeira fase devem ser pesados os seguintes elementos: - Asa esquerda - Asa direita - Fuselagem equipada - Estabilizador horizontal O planador deve ser colocado numa configuração de referência: - Trem de aterragem fora - Canopy fechada - Os equipamentos fixos no lugar (instrumentos/ baterias, etc.) - Cadeira e/ou encosto e/ou almofadas no lugar - Wingtips instalados - Asas horizontais - Fuselagem posicionada no ângulo de referência do estabilizador horizontal (ASW 24 - 100:4.9 DISCUS b 100:4.4)


O planador é então montado sobre duas balanças: - Uma balança sob o trem de aterragem com capacidade para um peso próximo ao peso em vazio do planador (num monolugar duas balanças com capacidade de 150kg podem ser uma opção prática) - Precisão necessária: 500g - Uma balança na roda de cauda com capacidade mais baixa, normalmente menos de 70 kg. - Precisão necessária: 100g - Controle da altura para o ângulo de referência da cauda horizontal A fórmula (Fig. 5) dá como resultado a posição do Centro de Gravidade XL em relação ao bordo de ataque da asa (BA - DATUM).

QUEM PODE CALCULAR E REGISTAR O CENTRO DE GRAVIDADE? O procedimento está ao alcance de qualquer pessoa. No entanto, o registo dos resultados na ficha de pesagem e o lançamento de dados no manual de voo deve ser realizado por um inspetor autorizado.

QUE REGULAÇÃO DEVE SER ADOPTADA EM CADA PLANADOR? É vital respeitar o intervalo do passeio do CG especificado pelo fabricante, sendo conveniente conservar uma certa margem para garantir que as mudanças nas massas embarcadas (piloto/lastro/...) não resultem numa posição do CG fora do intervalo aprovado para a aeronave (especialmente atrás). O ideal é pesar a aeronave em configuração de voo com o piloto na cabine de cintos ajustados/lastro completo/ etc, e determinar a posição do CG, mesmo quando esta pode ser obtida por cálculo. Para reflexão, é interessante colocar dois exemplos típicos para se ter a noção do impacto das alterações da

Dolly - não esquecer de a remover antes do voo! distribuição dos pesos no planador: a montagem de um novo painel de instrumentos ① e o esquecimento da dolly na fuselagem do planador ②, tomando como base de cálculo o caso do planador ASW 24. No exemplo ①, a adição de 3 kg no painel de instrumentos será de pouca consequência: o Centro de Gravidade mantem-se dentro do intervalo permitido e o deslocamento do CG não é significativa (apenas 8 mm). No entanto, o esquecimento da dolly, exemplo ② é muito mais crítico pois adicionar 6 kg na cauda tem como resultado a deslocação do CG para fora 30 milímetros do intervalo aprovado que é entre 240 milímetros e 370 milímetros relativamente ao DATUM. O voo na configuração do exemplo ② é muito perigoso! Todo o piloto deve ter consciência que esta é uma receita comprovada para o acidente…


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PRÁTICA VV

Linha da vida

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Entre o planador e o avião de reboque há um equipamento cuja inspeção diária é fundamental para a segurança de todo o processo de lançamento. Qual é? Texto e imagens de Sérgio Mota Ferreira

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cabo de reboque é o elemento que faz a ligação entre o avião rebocador e o planador. Com uma das extremidades presa no avião e outra no planador, é efetuado o reboque até à altitude previamente estipulada. Este elemento fundamental na atividade do voo à vela é composto por vários elementos. Genericamente podemos considerar os seguintes elementos fundamentais: 1. Argola de ligação ao avião rebocador 2. Cabo 3. Elemento fusível 4. Argola de ligação ao planador Durante a fase do voo denominada por “reboque”, ocorrem várias perturbações, quer no planador, quer no avião rebocador, provocados pelos elementos envolventes. Estas perturbações originam esforços e forças adicionais sobre o elemento “cabo de reboque”. Para garantir que esta fase do voo é concluída com sucesso, é necessária uma boa inspeção ao cabo de reboque para garantir que todos os seus elementos estão em perfeitas condições de operação, reduzindo assim a probabilidade de ocorrerem separações intempestivas.

Verifique as argolas de reboque quanto ao seu desgaste, certificando-se que estas não têm riscos profundos. Para o conjunto de engate de reboque, existem dois tipos de argolas de reboque, um Tost (tipo europeu) ou Schweizer (tipo americano). Não use argolas ou outro tipo de hardware não certificado, pois a solda pode ser fraca e falhar durante o reboque. É também fundamental que se proceda a uma inspeção pormenorizada do cabo (corda) pelo menos uma vez por dia, antes do início da atividade, de forma a detetar possíveis rompimentos, abrasões ou pontos fracos que poderão diminuir a resistência à tração do cabo. Deve verificarse igualmente a segurança das junções em ambas as extremidades.

1 Certifique-se que a resistência cabo de reboque é apro-

2 Elemento fusível – Esta peça metálica romper-se-á quando

priada para o planador a ser rebocado. A resistência do cabo de reboque deverá estar compreendida no seguinte intervalo: Mínimo: 80% do peso máximo certificado do planador a rebocar Máximo: Dobro do peso máximo certificado do planador a rebocar

atingida a sua força de rutura, evitando danos nos restantes elementos do cabo, planador e avião de reboque. Os elementos fusíveis deverão também ser escolhidos de acordo com peso máximo do planador a que se destinam. Alguns fabricantes distinguem estes elementos por cores, segundo a sua força de rotura. Segurança em primeiro lugar! Bons voos


Códigos de cor dos fusíveis TOST® Preto Castanho Vermelho Azul Branco Amarelo Verde

1000 +/-100 daN 850 +/- 85 daN 750 +/- 75 daN 600 +/- 60 daN 500 +/- 50 daN 400 +/- 40 daN 300 +/- 30 daN

À esquerda, de cima para baixo: - Conjunto terminal de cabo, composto por porta -fusíveis, argola oval e argola de engate. - Cabo com marcas de grande desgaste. Em cima: - Á esquerda fusíveis com furação circular e, à direita, fusíveis de reserva com furação alongada.


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ESCOLA CIVVM

Curso de instrutores de planadores do CIVVM

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Não é fácil medir a maturidade de um projeto. Certamente que a mesma se mede por vários parâmetros. Um desses parâmetros é sem dúvida a sua capacidade de crescer, de se ir tornando independente e de se renovar. O CIVVM deu o que pode ser considerado um passo de gigante nessa direção. Realizou o seu primeiro curso interno para instrutores de planadores.

o aeródromo do Mogadouro, e apoiados pelas instalações da escola de voo à vela na aldeia do Azinhoso, a 23/06/2012, Artur Gonçalves, João Corredeira, José Carlos Fernandes e Pedro Mesquita, iniciaram a sua formação de instrutor de planadores. A lecionar o curso, o CIVVM contou com a distinta direção e colaboração dos Cmdts. Joaquim Sá Correia e João Marques, instrutores experientes do Centro de Voo Livre (CVL). O curso iniciou com uma parte teórica com a duração de 30 horas. Foram diversos os temas. Enquadramentos legais; Funções, qualidades, direitos e obrigações enquanto instrutor; Teorias de aprendizagem; Características e reações dos alunos; Processos de decisão assim como perigos de atitudes individuais; Briefings típicos e um especial enfase à parte de Fatores Humanos. Também fez parte do curso um conjunto de várias missões práticas de objetivos diferentes. Simulação de emergências, recuperação de um planador voluntariamente posto em atitudes anormais, aperfeiçoamento de algumas técnicas de pilotagem, etc. Acima de tudo deu-se a provar aos novos instrutores, o quanto imprevisíveis e perigosos podem ser certos alunos. Foram bem vistosas algumas dessas manobras e fizeram também a delícia de quem as assistia em terra. Cada um dos candidatos teve ainda de preparar um tema e leciona-lo à restante comunidade de pilotos local. Tudo terminou nos dias 15 e 16 de Setembro com as provas de exame. Todos os alunos passaram com distinção. Aos novos instrutores, boa sorte e votos de muito sucesso, em prol do voo à vela. Ao CIVVM, parabéns por ter dado este passo. É agora um projeto mais completo, rico e maduro.


ESCOLA CIVVM

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2013 - Cursos e projetos Por Pedro João Ferreira Diretor de Escola Ilustração de Pedro Castanheira

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início de um novo ano num centro de voo à vela como o que existe em Mogadouro é sempre um período em que se realiza o balanço do ano que termina, se faz o levantamento de necessidades e se definem as novas metas. No final do ano de 2012 demos mais um passo importante para a operacionalidade da escola do nosso centro de Voo á Vela. Podemo-nos orgulhar de termos formado quatro novos instrutores de pilotos de planador, os primeiros a serem formados em Mogadouro, que têm agora uma responsabilidade acrescida em todo o processo de fortalecimento da atividade da escola de pilotagem do centro de Voo à Vela. Assim sendo, estão criadas condições de maior flexibilidade para podermos formar futuros pilotos de planador, os quais são a matéria-prima para a “máquina” poder funcionar em toda a sua plenitude. E esse é um trabalho contínuo e sempre em evolução. Neste ano de 2013 iniciar-se-á mais um curso ab-initio de pilotos de planador, e já temos interessados em dar o “salto” de mero mortal para praticante de voo à vela. Paralelemente a este curso, abrimos portas também aos interessados (e são bastantes) que já são pilotos de outro tipo de aeronaves, alguns deles profissionais da aviação, que desejam ter a qualificação de piloto de planador. Todo este interesse surgiu em grande parte, devido à divulgação por nós realizada no meio aeronáutico em Portugal e no estrangeiro, promoção essa realizada através da internet, publicações da especialidade e claro também pelo evento anual Red Burros, que atrai as atenções da comunidade aeronáutica e população em geral. Um dos desígnios da escola do CIVVMM para este ano de 2013 é a realização de um curso de qualificação para piloto rebocador de planadores, o que vai valorizar a globalidade da atividade e garantir a existência de pilotos devidamente preparados no capítulo teórico e prático para realizar esse serviço fundamental do qual depende toda a atividade. Há no CIVVMM um acervo invejável de saber e experiência neste campo que merece ser partilhado e perpetuado. Com toda esta evolução e acréscimo de alunos, surge a necessidade promover uma maior uniformização de procedimentos em todo o contexto académico e operacional de uma

escola. Todos os manuais de formação, publicações operacionais, aulas teóricas, testes escritos e voos de instrução têm de estar aprovados pelo órgão regulador da aviação em Portugal, INAC (Instituto Nacional de Aviação Civil) de quem temos sempre a preciosa ajuda no campo documental e logístico. Uma escola, para além de formar alunos, tem também a responsabilidade acrescida de proporcionar os meios para que seja mantida toda a proficiência dos seus ex-alunos depois de eles terem ganho o privilégio de serem pilotos comandantes de um planador. A formação e aprendizagem não terminam quando o piloto recebe a autorização legal (do INAC) para exercer a função de piloto comandante de um planador, devendo por esse motivo manter toda a proficiência e conhecimentos atualizados, pois caso contrário, a performance do piloto não evoluirá. Esta continuará a ser uma das áreas de intervenção da escola nomeadamente através da divulgação de informação atualizada e pertinente e da realização de verificações de proficiência. É a eleição da segurança como alicerce da cultura aeronáutica dos pilotos que permitirá manter o estado de alerta necessário a uma atividade de voo focada no bem-estar dos praticantes e da população residente.


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HISTÓRIA VV

Planadores de escola em Portugal Por Pedro Castanheira

J. Corredeira

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stas breves notas sobre as história dos planadores de escola operados em Portugal continuam nesta parte II com uma abordagem das opções que as escolas realizaram para se equiparem nos anos 70 e 80. Avançamos então para uma época marcada por dois modelos totalmente diferentes mas ambos com uma forte “personalidade” que permanece como referência para muitos pilotos que neles fizeram a sua instrução – o Blanik L-13 e o Twin Astir II Acro. O magazine PLANADOURO publicou já na edição 01 e na edição 03 dossiers circunstanciados sobre estes planadores que estão disponíveis para os interessados em aprofundar o conhecimento sobre os mesmos.

Anos 70 – A era de ouro dos Blanik Ao longo da década de 60 do séc. XX a atividade do voo á vela e, em especial a ação das escolas dos aeroclubes com secções de voo sem motor, desenvolveu-se balizada pela nova estratégia do Estado para o setor da aviação, e que apostava numa política de abandono dos projetos de dinamização centralizados e, em alternativa, de apoio às associações e clubes que, descentralizadamente, já haviam dado provas de competência nesta área. A Direção Geral de Aeronáutica Civil passou a ter então o papel de administradora do pequeno orçamento destinado ao fomento da atividade aeronáutica em Portugal. É assim que, com a ajuda da DGAC, os aeroclubes se pre-

pararam para adquirir os planadores Blanik L-13 fabricados na Checoslováquia, junto à cidade de Kunovice, para substituir e(ou) complementar a frota de Rhönlerches existente e que constituía, até ao início dos anos 70, a coluna dorsal da atividade de formação de pilotos. Esta nova “máquina” de instrução, mantendo as características de robustez e de estabilidade de voo tão apreciadas dos Rhönlerches, proporcionava uma performance muito mais alta e dispunha de comandos de trem de aterragem e de flaps que permitiam dar uma instrução mais completa, integrando procedimentos duma mais variada gama de situações de manobra. Ao observador a comparação entre as duas aeronaves colocava em relevo a rusticidade do Ka 4 de Schleicher e a modernidade e a seriedade do produto de alumínio da LET. A exploração de térmicas mais fracas e, consequentemente, uma maior duração dos voos tornou-se uma realidade. Os aeroclubes de Coimbra, de Torres Vedras, do Porto e o Ae. C. de Portugal operaram Blaniks L-13 a partir de 1971, e alguns deles, como o de Torres Vedras e o de Portugal, reintegraram, em etapas posteriores, novos exemplares na frota após acidentes com os iniciais. Também em Angola, onde um pequeno grupo de entusiastas do voo à vela trabalhava para o florescimento da atividade num território com condições de sonho, os aeroclubes adquiriram neste início de década Blaniks para as suas escolas. Com algumas interrupções os Blanik foram uma ferramenta de formação nas escolas portuguesas até que os dois últimos exemplares que ainda voavam em Portugal foram impedidos de o fazer em Setembro de 2010 na sequência da decisão da Agência Europeia para a Segurança Aérea por falta de garantias de integridade estrutural.

Twin Astir II - o “plástico” chega à escola A evolução tecnológica no campo da construção de planadores apontou para a consolidação da técnica dos compósitos como a via a seguir na permanente procura


de solidez, performance e qualidades de voo. A melhoria da qualidade das estruturas dos planadores em compósitos foi, desde 1965, ano em que de deram os primeiros passos práticos nesta tecnologia, simplesmente espantosa, e a ela se renderam de imediato as principais marcas. Naturalmente os fabricantes de planadores integraram nos seus catálogos máquinas bilugares de duplo comando, aptas para a fundamental missão de formação de pilotos. A Grob Flugzeugbau foi uma das pioneiras nesta via, tendo, em 1976 lançado o Twin Astir I e, no ano

seguinte, o Twin Astir II, com alterações relativamente ao modelo anterior que o elevaram ao estatuto de planador de instrução praticamente ideal. Uma das opções inéditas da Grob foi a de criar um laço de continuidade entre os seus planadores bilugares de duplo comando e os monolugares que produzia, facilitando assim a transição. Tal característica foi muito apelativa para os aeroclubes com escola que assim ofereciam aos alunos em voo solo e aos pilotos recém-formados um planador de aspeto e de comportamento similar.

Foi o Aero Clube de Portugal que, em 1989, ao adquirir o Twin Astir II Acro, o CS-PBH inaugurou a era do “plástico” na instrução de pilotos. Mais tarde, juntou à sua frota um novo Twin do mesmo modelo, o CS-PBP para dispor simultaneamente de material para a instrução básica na base de Sintra e de um planador de aperfeiçoamento para expedições a Évora e à Covilhã. Atestando as qualidades da criação da Grob Flugzeugebau, estes dois Twins continuam a desempenhar o seu papel na atualidade.


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NÁO TENHO NADA MAIS SENÃO AS ASAS...

Colisões de aeronaves com aves Por Paulo Cabral

É sensacional poder compartilhar os céus com as aves quando voamos em planador. Voar lado a lado na companhia destes seres alados dá-nos a sensação efémera de fazermos parte do seu Reino. Contudo, temos de estar conscientes que existem alguns perigos potenciais, que podemos minimizar pela adoção de alguns cuidados na nossa conduta enquanto pilotos.

Imagem de Pedro Castanheira


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ez este ano um século que foi reportada a primeira colisão fatal entre um avião e uma ave. Foi precisamente em 3 de Abril de 1912 que o piloto Norteamericano Calbraith Perry Rodgers, um dos pioneiros da aviação, discípulo dos irmãos Wright, que se celebrizou por ter feito o primeiro voo transcontinental desde a costa Atlântica Estado‑unidense à costa do Pacífico, e que infelizmente viria também a ficar na história da aviação como o primeiro piloto a morrer em consequência de uma colisão com aves ou bird strike 1. Apesar dos bird strikes serem tão antigos como a aviação, os riscos que comportam não têm diminuído, tornando-se um sério problema para a aviação civil e militar com inúmeras perdas materiais e humanas, como a do voo do Lockheed L-188 Electra da Eastern Air Lines no ano de 1960, com origem em Boston, no qual viriam a perecer 62 pessoas. Melhor desenlace viria felizmente a ter em 2009 aquele que se tornou um dos bird strikes mais famosos da história da aviação, o do voo 1549 do Airbus A320-214 da US Airways, com origem no aeroporto de La Guardia em New York, o qual após colisão com aves sofreu a paragem de ambos os motores, tendo o piloto tomado a decisão de planar até ao Rio Hudson e aí aterrar, salvando-se todos os 150 passageiros e os 5 tripulantes. O piloto que conseguiu este feito – o Comandante Chesley Sullenberger, viria a ser condecorado como herói, tendo sido considerada decisiva a sua experiência enquanto piloto de planadores na precisão da manobra de aterragem sem motor que conseguiu efetuar com sucesso (Figura 1). Mas não são somente as grandes aeronaves que estão sujeitas a estes impactos. Também os aviões mais pequenos e os planadores podem sofrer bird strikes. Ainda muito recentemente, em Outubro de 2011 em Espanha nos Pirinéus Aragoneses, dois pilotos finlandeses, voando um Duo Discus, se despenharam contra a montanha vindo ambos a falecer. Da investigação do acidente vir-se-ia a apurar que foi a colisão com um grifo (Figura 2) que lhes provocou

danos no leme e a consequente perda de controle do planador (Figura 3). As colisões de aviões com aves tornaram-se um problema tão sério que a Convenção sobre a Aviação Civil Internacional, assinada em Chicago em 1944, definindo numerosas obrigações internacionais destinadas a garantir a segurança aérea, adoptou um conjunto de normas e recomendações, que constam dos Anexos publicados pela ICAO, entre as quais se destacam as provisões constantes do Anexo 14 – Aeródromos, Vol. 1 (Emenda 10)7, que contém as normas e práticas recomendadas relativas ao risco de Bird strike e ao potencial aumento deste evento devido à presença ou desenvolvimento de condições de atração de aves nos aeroportos ou sua vizinhança. A ICAO viria mesmo a criar um Sistema de Informação para recolher e divulgar informação sobre colisões de aeronaves com animais em cerca de 200 países – o IBIS – ICAO Bird Strike Information System.

Fig. 1 - What’s that? It’s a boat? It’s a plane? Airbus A320 214 flutuando nas águas do Rio Hudson (Fonte: http://voarnews.blogspot.pt/2009/10/tolerancia-zero-de-nova-iorque-com.html)

Fig.2 - Grifo envolvido na colisão com o Duo Discus com marcas visíveis do impacto (Fonte: Colisiones de Aviones Ligeros Contra Pájaros; Autor desconhecido)

Partilhar as térmicas Temos o privilégio de voar no Nordeste Transmontano, uma das zonas do país com maior densidade de avifauna. Aqui existem condições excelentes de formação de térmicas, como bem sabemos, que são aproveitadas não somente pelos pilotos de planadores mas também por todas as aves planadoras, algumas delas de grande dimensão, como águias, abutres e cegonhas, facto que pode agravar os danos de uma eventual colisão. Os bird strikes com aves voando em bandos, com elevado número de indivíduos, são particularmente perigosos devido à possibilidade de múltiplas colisões em simultâneo.

Dados da equação Os danos produzidos por uma colisão estão relacionados com a parte do avião atingida e pela força de impacto criada no momento da colisão. Esta força de impacto está dependente da velocidade a que se dá a colisão, massa da ave envolvida, bem como pelo ângulo do impacto. A

Fig. 3 - Destroços do Duo Discus após colisão com o solo. (Fonte: http://www.diariodelaltoaragon.es/NoticiasGaleria.aspx?Id=709188&Pg=0)


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NÃO TENHO NADA MAIS SENÃO AS ...

Fig. 4 - Danos provocados numa asa devido à colisão com ave. (Fonte: Bird population trends and their impact on Aviation safety 1999-2008)

Fig.5 - Partes das aeronaves atingidas ou danificadas por colisões. (Fonte: IBIS - 2001- 2007 BIRD STRIKE ANALYSES)

energia da colisão (E) é proporcional à massa (m) da ave e ao quadrado da velocidade (v) a que se verifica o impacto: E=1/2 mv2. Além do tamanho da ave e da velocidade a que voamos no planador, outro factor decisivo aquando de uma eventual colisão é o local de impacto, sendo obviamente as zonas mais expostas aquelas que têm uma maior probabilidade de ser atingidas, tais como a canopy, os bordos de ataque das asas (Figura 4) e os estabilizadores horizontal e vertical. Particularmente perigosos são os impactos que danifiquem as superfícies de controle da aeronave. De acordo com o IBIS as partes dos aviões mais afetadas são o pára-brisas, motores, nariz e fuselagem (Figura 5).

Quando e onde? Apesar de se registarem colisões ao longo de todo o ano, a época de maior número de bird strikes em Portugal parece verificar-se nos meses de Maio a Agosto, segundo os dados do GPIAA, para uma média dos anos de 2006 a 2011 (Figura 6). No IBIS, entre os anos de 2001 a 2007, foram registadas 42508 colisões, sendo também nos meses de Julho a Outubro que se verificaram um maior números de bird strikes. Em parte esta situação explica-se por ser neste Fig. 7 - Bird strikes reportados de acordo com a fase de voo (Fonte: IBIS - 2001- 2007 BIRD STRIKE ANALYSES)

período que existe um maior número de voos comerciais, contudo, depois de normalizados os dados, verificou-se que é no Outono e Primavera que parece existir uma maior probabilidade de colisões com aves, pelo que devemos ter um cuidado acrescido nestas épocas. Relativamente à fase do voo, as colisões com aves registadas no IBIS distribuem-se da seguinte forma (Figura 7): aterragem (39%), descolagem (23%), rolagem (17%), subida (16%), em rota (4%) e descida (3%). No caso concreto dos planadores, sendo as térmicas locais potenciais de concentração deste tipo de aviões e de aves planadoras, dever-se-á ter também atenção redobrada durante a termalização. Normalmente a maioria dos impactos verificam-se abaixo dos 600 metros e muito poucos acima dos 1800 metros. A colisão registada a maior altitude aconteceu contudo a 11,300 m (37,100 ft), entre um Boeing 747 e um Abutre de Rüppell's, na Costa do Marfim em África. Como a maioria das colisões se verifica a baixa altitude é especialmente importante estar atento a esta possibilidade durante as fases mais críticas de voo a baixa altitude. Cerca de 90% das aves têm hábitos diurnos e é também durante o dia que existem mais voos de aviões, não sendo por isso de estranhar que a maioria das colisões se regista neste período. Ainda assim, algumas colisões verificam-se durante a noite, quer com espécies noturnas quer com aves em migração, uma vez que, dependendo da espécie e tipo de navegação usada, muitas aves viajam durante a noite.

Espécies de aves envolvidas

Fig. 6 - Distribuição mensal de colisões registadas em Portugal, média de 4 anos. (Fonte: GPIAA)

Segundo o IBIS as espécies de aves mais envolvidos em colisões são as passeriformes (31%), gaivotas (18%), aves de rapina (15%), pombos (10%) e aves aquáticas (6%). Vimos já que a perigosidade dos impactos está muito correlacionada com a dimensão das aves. Devemos assim tomar muitas precauções quando voamos na proximidade de aves de grande porte, tais como os grifos, não só por esta espécie ser uma das maiores aves exis-


tentes no nosso país mas também porque apresenta uma capacidade de manobra muito reduzida devida nomeadamente à pequena dimensão da sua cauda, situação que é agravada pela sua idiossincrasia de não demonstrar medo de aproximação dos planadores quando em térmica, facto que todos nós já bem constatámos. Devemos ainda recordar de edições anteriores desta secção do magazine Planadouro, o facto do Douro Internacional e a província espanhola adjacente de Castela e Leão, serem as zonas onde se regista o maior contingente de grifos de toda a Península Ibérica. Se bem que os grifos nas suas prospeções diárias possam cobrir áreas muito extensas com várias centenas de quilómetros quadrados, as suas zonas de repouso e nidificação localizam-se nos alcantilados rochosos do rio Douro, pelo que se deve evitar voar nas proximidade destas zonas de maior concentração, sendo particularmente perigosa a zona do Douro localizada na Freguesia de Bruçó, a Sul de Mogadouro, por se verificarem aqui as maiores colónias destas aves no Douro Internacional.

Boas práticas Durante o voo as aves estão focadas principalmente na prospeção do território, pelo que não devemos assumir que se apercebem sempre da aproximação e presença de um planador (até porque são aviões silenciosos). Um bom princípio será os pilotos tomarem as medidas necessárias para evitar uma colisão. O comportamento de uma ave quando avista um avião é altamente imprevisível, podendo variar consoante a espécie, maturidade do indivíduo, ciclo biológico, etc. Existem aves que tomam imediatamente medidas evasivas assim que se apercebem de uma aeronave ou, no outro extremo, aves que em certas circunstâncias podem inclusivamente “atacar” o avião, como por exemplo algumas águias mais territoriais. Perante tal facto, a atitude mais prudente de um piloto será a de manter sempre que possível uma distância de segurança entre o seu avião e a ave. Em termalização é

Bando de grifos voando em térmica nos céus de Bruçó, Parque Natural do Douro Internacional Imagem de Pedro Castanheira


54 NÃO TENHO SENÃO AS ASAS... NÃO TENHO NADANADA MAIS MAIS SENÃO AS ASAS...

Em síntese... pode ser dito que o melhor será seguir sempre o princípio da precaução, pois partilhamos o céu com aves e aeronaves. Observar constantemente o espaço que nos rodeia e antever qualquer perigo emergente, atuando com antecipação, diminui com certeza a probabilidade de uma colisão com efeitos imprevisíveis. Será esta a atitude mais racional que devemos adotar, para que possamos continuar a desfrutar do prazer do voo silencioso na companhia de aves.

Cruzamento de planador com ave no céu de Mogadouro Imagem de Nicolas Jourdain

também imprescindível adotar o mesmo sentido de rotação das aves presentes na mesma corrente ascendente, à semelhança aliás do que se deve fazer em relação a outros planadores, diminuindo a probabilidade de colisão. Em térmica, as aves são muito mais eficientes a subir do que qualquer planador, consequentemente, se um piloto observar que uma determinada ave se mantém aproximadamente à mesma altura do planador durante algum tempo, o mais certo é tratar-se de uma ave territorial que está avaliando o “invasor” para decidir qual o melhor momento e forma de atacar, conforme já relatado por pilotos, pelo que o melhor é abandonar a térmica e afastar-se o mais possível. Na circunstância de um piloto se aperceber demasiado tarde que se encontra em rota de colisão eminente com uma qualquer ave, e considerando que um comporta-

mento frequente das aves perante uma provável colisão é o de executar um súbito desvio, normalmente acompanhado de mergulho para ganhar velocidade, uma atitude de último recurso que o piloto poderá tomar será a de puxar o manche fazendo subir o avião. Não só porque assim adota uma atitude contrária à da provável trajetória da ave, mas também porque desta maneira se transforma a energia cinética em potencial, ganhando altura com diminuição da velocidade e, consequentemente, reduzindo os danos potencias em caso de colisão, a qual será também mais tangencial. Cumulativamente com esta atitude cabrada, a parte do avião mais “exposta” será a parte inferior, protegendo zonas mais sensíveis como a empenagem e a canopy. Obviamente que o recurso a esta manobra evasiva apenas deverá ser efetuado quando a altitude de voo o permita fazer com segurança.

Bibliografia consultada e sugestões de leitura para quem quiser saber mais: European Aviation Safety Agency - Safety Analysis and Research Department (2009); Bird population trends and their impact on Aviation safety 1999-2008; Ilias Maragakis. Gabinete de Prevenção e Investigação de Acidentes com Aeronaves (2010); Bird Strikes / Wildlife Strikes – Estatísticas 2009. Gabinete de Prevenção e Investigação de Acidentes com Aeronaves (2011); Breves reflexões sobre bird strikes em Portugal. International Civil Aviation Organization (2009); IBIS - 2001- 2007 Bird strike analyses; Electronic bulletin. Transports Canada (2004); SHARING THE SKIES - An Aviation Industry Guide to the Management of Wildlife Hazards. Video de um bird strike: http://www.youtube.com/watch?v=hTyv8f_8Mw&feature=player_embedded#! Nota 1 - Estas colisões passaram a designardesignar-se como bird strike, segundo a nomenclatura adotada pela ICAO ou, mais recentemente, como wildlife strike, uma vez que esta última abrange também colisões com outro tipo de animais.


GLISSAR NO TEMPO

Em cima, imagens do primeiro planador em fibra no “Império Português”, o Glasflügel H201 Libelle. Aeroporto de Luanda, 1974.

Sá Correia

Em baixo, o avião rebocador Auster após um acidente à descolagem. Em segundo plano, destroços de um Blanik. Huíla, 1973.

pioneiro do voo à vela em Angola Entre os pilotos que protagonizaram a fase de descoberta e exploração das condições de voo à vela existentes em Angola destaca-se o Com. Joaquim Sá Correia. Para além do seu envolvimento contagiante como piloto empenhado em desbravar novos territórios de voo, participou como instrutor do Aero Clube de Angola na formação de novos pilotos indispensáveis ao fortalecimento da pequena, mas dinâmica, comunidade existente. Sá Correia destaca o imenso potencial para o voo de viagem existente em regiões como a de “Sá da Bandeira,

cidade do planalto da Huíla, que classifico como um dos

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santuários do Voo à Vela, onde normalmente a instabilidade da primeira quinzena dos meses de Março e Setembro, supera os 6 m/s (térmica de cúmulo) numa área de centenas de quilómetros”. Os registos fotográficos da sua coleção aqui apresentados referem-se aos anos 70 do séc. XX, Na imagem acima, do ano de 1973, Sá Correia está ao centro, à sua esquerda o aluno José Caroço e à sua direita o “grande entusiasta e amante do voo sem motor, Vice Presidente da Direção do Aero Clube de Angola”, Eng.º Fernandes Pinto, posando à frente de um Blanik.


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VER DO CÉU, VIVER EM TERRA

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Brunhosinho, intento e serenidade Por Pedro Castanheira

ssente num cabeço que pontua o planalto, no recanto oriental do concelho de Mogadouro, eis Brunhosinho, povoação morena de raiz antiga, airosa e simples. Com a estrada de Miranda do Douro a passar a seus pés, a terra revela-se desperta e empreendedora, ancorada num alto e alongada pelos caminhos. A fusão entre o casario que serpenteante e a moldura vegetal que o suporta confere à paisagem um sabor e bucólico que convida à evasão da realidade. Da raiz antiga de Brunhosinho permanecem importantes marcas tais como a graciosa fonte mergulho do largo do Ribeiro, de desenho românico, e a igreja matriz, esta também de traço românico mas mais tardio, erguida no lugar mais alto da povoação e no centro do largo a que dá o nome. Ainda neste largo da Igreja, e à sua ilharga, ergue -se o esbelto cruzeiro que completa o acervo de valores arquitetónicos e urbanísticos aqui presentes Para as redondezas mais altas a norte e nascente abundam os terrenos de mato e a floresta de carrasco, valor inestimável que integra o Parque Natural do Douro Internacional. Soutos e olivais são as opções de renovação das culturas de exploração. Aqui e além, dispersos sobre o solo magro, solitários barrocos de dorso curvado, talhados pelos elementos ao longo de eras e eras, quebram a suavidade da ondulação da terra. Nos baixos, mais para sul e poente, estendem-se hortas, olgas e lameiros, espécie de tecido verde composto por retalhos cozidos uns aos outros, salpicado pelo branco dos pombais redondos. Entre os retalhos de terra erguem -se muros, arbustos e amieiros, cortando o vento, mas também ribeiros, represas e agueiros que, num plano lógico de regadio, se ramificam conduzindo as águas até onde são necessárias. Casas de dois pisos sucedem-se quase iguais, mas de detalhe único. Varanda mais aberta ou mais resguardada, de corpo de pedra à vista ou rebocado e pintado, mas sempre dotadas da imprescindível porta carral.


Na pág. anterior, de cima para baixo: - Núcleo urbano central organizado em redor da igreja e o seu largo; - Vista geral da mancha construída agarrada aos caminhos; - Localização de Brunhosinho no território. Imagens de Paulo Cabral Nesta página, de cima para baixo: - Largo da igreja com cruzeiro e casa com porta carral; - Fonte de mergulho românica ; - Lameiros e pombal redondo. Imagens de Pedro Castanheira.

Mas a vida da gente de Brunhosinho, partindo daí, vai para além da casa de família e do trabalho. Os valores culturais e o sentido comunitário permanecem pujantes. Nas artes tradicionais a produção de rendas, bordados e colchas patenteia bem alto a destreza e sensibilidade estética das bordadeiras aqui nascidas. Da criação do porco, atividade recorrente nesta região como base da dieta e como rendimento, emana o saber fazer dos enchidos e fumados que, aplicado em salpicões, linguiças e no célebre bulho, deixa os gastrónomos rendidos aos aromas singulares de tais especialidades. A matança do animal, é o passo mais marcante deste processo de produção que continua a ser um evento social de importância cimeira. Há nestas atividades e artefactos traços de uma cultura ancestral que, mais do que uma forma atávica e fechada de ler o mundo, é um refazer constante das ligações entre a comunidade e o meio que ela explora e do qual se sustenta. As festas que aqui se fazem são isso mesmo - momentos de reequilíbrio. Que o digam os mancebos e as moças de Brunhosinho que, apesar das censuras antigas de prelados e bispos, acendem as fogueiras de S. Sebastião e dançam à volta delas, em pleno Inverno, pelos dias 18 e 19 de Janeiro.


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DESCOBERTA

Click Texto e imagens de José Loureiro

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té ao dia de hoje tive a oportunidade de voar em planadores por duas vezes. Mantenho viva a recordação de ambas as experiências. Foram, na verdade, voos em distintos modelos de planadores e, bem assim, em condições atmosféricas bem diferentes… Quer numa, quer noutra ocasião, um dos fundamentos que me fez “descolar” do chão foi o de conciliar um voo sobre as belas terras transmontanas com a Fotografia. Quando fotografámos um determinado local a perspetiva é, regra geral, a mesma com que o observámos diariamente. Ou seja, ao nível dos nossos olhos. A fotografia aérea, por outro lado, propicia a oportunidade de observar (e fotografar) a paisagem doutro modo. Vista do céu, essa mesma paisagem parece ter outras dimensões, outras formas, outras cores, outras texturas… Bom, devo dizer que na altura em que me estreei neste tipo de voo não tinha plena consciência da experiência que viria a ter… Por isso mesmo, penso que até o nosso Eça de Queirós teria alguma dificuldade em descrever a fantástica sensação que é! Mas adianto que em nada é parecida com a sentida em voos efetuados em aeronaves de grande porte ou mesmo em pequenos aviões ligeiros como os que já havia feito antes… Desde logo, a ausência de motor (e, naturalmente, do seu ruído); o exíguo espaço interno; a forma de descolar e de


Imagem do CIVVMM registada a bordo do TWIN

José Loureiro com Pedro Ferreira à sua direita

aterrar… Enfim, tudo isto evidência, desde logo, algumas diferenças importantes. Contudo, o que mais me maravilhou foi a natural interação que este tipo de aeronaves tem com o espaço. A simbiose é natural e perfeita! Tudo é mais próximo, imediato e direto! As sensações tocam-nos! Quer seja num dia calmo, num descontraído voo, quer seja num dia de turbulência, sentimo-nos verdadeiramente a voar! Qualquer toque no manche, qualquer “mexida” nos comandos é imediatamente sentido! Regressando atrás no tempo… A primeira vez: Estávamos, então, no ano de 2010 e num calmo dia de Abril, mais concretamente no dia do lançamento deste mesmo Magazine (dia 24), eis-me chegado ao Aeródromo Municipal de Mogadouro há pouco tempo quando alguém, de repente, me aborda e diz: - Prepara-te! A seguir vais tu para cima! E assim foi! Sem mais, sem ter tempo sequer para assimilar a ideia, quando dei por mim lá estava eu na companhia do piloto e amigo João Corredeira a sobrevoar as imediações da pista e a simpática aldeia de Azinhoso a bordo do “BLANIK”! Até então, quando pensava em planadores, um misto de leveza e fragilidade vinham sempre à ideia. Todavia, o “natural receio” que tinha antes de experimentar este tipo de voo desvaneceu-se, de imediato, ainda durante o reboque do mesmo até ganhar a altitude necessária.

Fizeram-se algumas fotografias e em plena segurança lá regressámos para uma serena aterragem. Fiquei a gostar! Segunda vez…: Julho de 2012… Dia bem diferente… chegado ao mesmo local, a meio da manhã, depois de mais de 200Km percorridos, não se vislumbravam hipóteses de efetuar um voo… Como, desta feita, levava em mente repetir a experiência, pairava alguma frustração… Mas a turbulência era tanta que não aconselhava a voos com “turistas acidentais”! Diz-se que a aviação é uma escola de paciência. Bom, da parte da tarde as condições alteraram-se para melhor e, já para o final do dia, lá fui eu, de novo, voar de planador. Na companhia doutro grande amigo, o Pedro Ferreira, com que já fizera outros voos, noutro tipo de aeronaves, lá descolámos no “TWIN”. Não posso dizer que tenha sido propriamente um voo calmo… mas, pela sensação de subir tão rápido (a mais de 5m/s) e de chegar aos cerca de 2000 metros de altitude, valeu! O mesmo género de aeronave - uma experiência nova e totalmente diferente! A adrenalina subia e para baixar (…a aeronave), foi necessário recorrer ao sistema de “travões” aerodinâmicos! Tal como da primeira vez, a câmara fotográfica também voou comigo. Fotos? Nem por isso… Dia bom para voar, mau para fotografar! Mas há sempre uma próxima…

RED BURROS 2011—Passagem do ASW 24 largando lastro


SUGESTÃO DE LEITURA

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Revista de VV Por Pedro Castanheira

Para os apaixonados por revistas e pelo voo à vela mais uma sugestão imperdível, a revista da British Gliding Association (BGA) SAILPLANE & GLIDING. Trata-se da continuação da exploração da oferta internacional existente nesta área, iniciada no nº03 do magazine PLANADOURO, com o confronto de duas publicações - a revista americana SOARING e a revista francesa VOL À VOILE.

ditada continuamente desde 1955, a revista SAILPLANE & GLIDING (S&G) constitui uma referência incontornável no universo das publicações periódicas de voo à vela. Enquanto órgão oficial da BGA goza do suporte institucional que esta entidade associativa e reguladora da atividade no Reino Unido lhe confere. Assim sendo, todos os pilotos de planador licenciados/ membros da BGA, que no ano de 2012 eram mais de 7300, se sentem de alguma forma ligados à revista, por esta lhes pertencer e por ser pensada para os servir. Curiosamente a S&G é herdeira de uma tradição de publicações periódicas de voo em planadores do Reino unido que remonta a 1930. Nesse ano foi lançada a revista SAILPLANE AND GLIDER, nome que parece redundante mas, efetivamente, na época não o era, que tinha uma periodicidade variável, mensal, quinzenal e, às vezes, semanal, e que combinava as características de uma publicação desportiva independente com uma secção da responsabilidade da BGA. Em 1950 a BGA lança uma revista própria, a GLIDING, que entra de certa forma em concorrência com a que até então existia, até que em 1955 se dá a fusão destas duas publicações e nasce, como atrás foi dito, aquela sobre a qual estamos a focar a atenção, e que tem mantido inalterada a sua periodicidade bimensal. Dada esta raiz associativa a S&G tem, na sua base, uma componente que funciona como correia de transmissão da política e da intervenção da BGA na realidade do voo à vela no Reino Unido. O interessante é que tal intervenção é muito mais do que ação organizadora e disciplinadora. É entendida como um contributo para a difusão da informação e da sua discussão e ainda como apoio concreto aos clubes e aos pilotos associados. Através da leitura desta revista fica claro que a atitude da BGA é de liderança mas também de suporte e de serviço aos seus associados, de atenção aos problemas existentes e de colaboração na procura de soluções. A BGA dispõe de um núcleo profissional que trabalha na

produção da revista, complementado por dirigentes afetados a áreas específicas que, enquanto responsáveis e mentores num determinado setor, registam a sua voz em artigos da S&G. Mas esta é apenas uma componente. Na realidade os conteúdos mais significativos da revista são produzidos pelos membros de forma voluntária como contributos para a cultura do voo à vela de toda a comunidade de leitores. Sente-se que esta revista está muito mais centrada nas experiências das pessoas enquanto praticantes do voo à vela do que nas questões da alta competição e da alta tecnologia. Sem descurar estes temas mais especializados, doseia-os com moderação pois a estratégia é a de incluir e espelhar a diversidade de formas de viver a atividade. Há temas dedicados aos juniores e aos seniores, às mulheres, aos colecionadores, aos curiosos e também, claro, aos “viciados na competição”. E, last but not least, dirige-se ao leitor num tom de conversa que estimula a interatividade. Para os que gostam de consultar as edições antigas desde 1955 até 1996 estão disponíveis online em www.lakesgc.co.uk/mainwebpages/oldsandgmagazines.htm . Acreditem, uma verdadeira preciosidade!

Pontos • • • •

+

Seleção e qualidade dos conteúdos Atenção às diversas sensibilidades existentes Regularidade e estabilidade editorial Design gráfico moderno e elegante, mantido com qualidade constante

• Linguagem que privilegia o tom interativo Pontos

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• Focagem direcionada para o caso do Reino Unido


INSPIRAÇÃO

Tomar o elevador Por Andy Bardgett

R

umei em direção a um farrapo de nuvem pairando um pouco mais a sul da pista e desta vez fui recompensado com uma ascendente tão violenta que provocou um súbito pranchamento do planador que ultrapassou a vertical. Embora os picos de leitura do variómetro parecessem promissores a verdade é que a média de subida era medíocre, pelo que subi apenas umas dezenas de metros. No entanto, depois de repetir esta sequência várias vezes, fiquei convencido de que estas térmicas estavam associadas a onda. Depois de algumas deambulações pelo vale do rio Till, acabei por alcançar a base de um cúmulo a 850m e aí, ao progredir em direção a sotavento, a subida constante começou. Finalmente, depois de tanto “trabalhar”, eu estava em onda! O contraste era espantoso: tendo lutado durante uma boa hora para ganhar apenas 300m, estava de repente imerso no silêncio da suave ascendente da uma onda. O meu prévio esforço para me manter em voo, enrolando bolhas e térmicas turbulentas deu lugar a uma aparente experiência de facilidade e de ter entrado no “elevador da onda”. O planador parecia voar por si mesmo e era suficiente a pressão das pontas dos dedos para o comandar, o que permitiu concentrar-me na observação da situação

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exterior e na monitorização do traçado do GPS para me manter na área de melhor ascendente da onda. A subida consolidada situou-se próximo dos 1.5 m/s. À passagem dos 3000m liguei o fornecimento de oxigénio, acertei o altímetro para os 1013mB e solicitei às operações de voo de Wooler diligências junto do ATC para a autorização de abertura da caixa de onda que permite a subida até ao FL240. Já estava em fase de mudança de atitude para picar, interrompendo a subida, quando chegou a autorização. Quando a leitura do altímetro era de 7200m, no apex do voo, a subida continuava, mas era difícil manter a posição – a força do vento tinha aumentado significativamente, situando-se agora acima dos 100km/h – e, sem experiência de voo fora da área, pareceu-me prudente terminar a subida. Estava feliz por ter alcançado os 7200m, mas agora o que eu queria era descer em segurança…

Andy Bardgett tem mais de 2000 horas de voo em planador, e é detentor das insígnias de C de Ouro e 2 Diamantes. É instrutor de planadores e alcançou os melhores registos de ganho de altura no Reino Unido em 2010, 2011 e 2012. Tradução de P.Castanheira; imagem de J.Corredeira


Magazine do Centro Internacional de Voo Ă Vela de Mogadouro


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