Kalango 11

Page 1

Kalango11

Circo: ensaio de Laura Aidar Homofobia: nossa resposta ao preconceito Loucura: delírios reais nas ruas do centro velho de SP Poesia, literatura, astronomia

BUNDA Preferência nacional ano III • setembro 2012


Amanhecer Por Rubens Paschoal

O vapor do novo dia roรงa a pele. O canto de um pรกssaro cheira novidade; desperta pensamento leve. O olho saboreia o amanhecer. A calma toma conta do corpo entorpecido. Deixo tudo que pesa no farpado do arame. Vou feliz pra vida.


Ciência & Tecnologia

Por Hemerson Brandão

“Curiosity fotografa o Sol visto de Marte. Com o tamanho de um carro e pesando 1 tonelada, a NASA conseguiu pousar com sucesso o robô explorador Curiosity, na superfície do planeta Marte, a quase 250 milhões de km da Terra. A missão do robô será procurar, pelos próximos 10 anos, vestígios de vida no passado ou até mesmo no presente do planeta vermelho.” Crédito da imagem: NASA/JPL-Caltech


E D ITORIA L

Prezados estão A edição 11 da Kalango traz alguns assuntos que ional”. na ordem do dia. Um deles é a “preferência nac o Atento, nosso articulista Mário Sérgio fala sobre s parcas assunto, bem como extraterreno Delta9 traça sua ulo. Já linhas para abordar o mesmo tema, sob outro âng aproveita que, assim, está tudo dominado, Orivaldo Biagi (e das para falar rapidamente sobre o poder do corpo nda ver mentes) através dos tempos e Robson Helton ma al nos no traço da dita cuja. Feliz da vida, Rubens Pascho o livro traz um novo amanhecer e Thiago Cervan lança liano Tosin Sumo Bagaço, que serve de inspiração para Giu nos escrever sobre a obra, ao mesmo tempo em que tiago oferece um belo poema, “Umbigo”. Weberson San MIS, em nos empresta um de seus trabalhos, exposto no Numa São Paulo, para encher nossos olhos de emoção. loucos Missão Quase Impossível, Jean Takada entrevista Casali no centro velho de São Paulo, enquanto Rodrigo nas de mostra que logo teremos nas telas o filme “Esqui azans Monalisa”, já retratado aqui na Kalango. Diego Cal tazes responde a onda de intolerância existente nos car Aidar homofóbicos em várias partes do mundo e Laura re brinda os nossos leitores com um lindo ensaio sob “O o circo, enquanto celebramos a escolha do filme 3. Palhaço” para nos representar no Oscar, em 201 do Boff – Finalizando, não deixe de ler o artigo de Leonar a com o para ele, nosso tempo exige responsabilidade par erson planeta. E que tudo mais vá para Marte, com Hem o. Brandão. Tudo isso você só tem aqui. Na Kalang Boa leitura, se gostar, compartilhe! Agradecido!

Osni Dias

11

go Kalan

ni Dias 2 s O : t de 201 /Layou Edição 1 - Setembro 1.51

rativa. colabo a m r istas, a de fo rabalh rteres, colun adores t o g n A Kala ipe de repó , ilustr u poetas balhos por q , s e a a t s u S rti ra seus t sionalismo. afos, a fotógr istas cedem fis o r te p ul n c a ti t r s a a b e ulos e com sos e m vínc paixão ação não te nem religio a s r lic A pub , econômico ocê pode le e, V s . o d s c a e políti buiçõ zer downlo tador. contri a mpu aceita online ou f seu co m o e g r n e . Kala nte, l ontato iorme Faça c . s a poster d m vin

MTb2

rações Colabo

be serão


WEBERSON SANTIAGO

thiago cervan

dó maior é ver o sol menor lá no fundo de si

http://arteverbal.tumblr.com/ .projeto. de. thiago. cervan. Snow White - weberson83 in http://instagram.com/p/PkDz7JPpBM/


Thiago Cervan lança o livro de poesias “Sumo Bagaço”

Por Giuliano Tosin*

D

epois de seus trabalhos com poesia visual, poemaobjeto e videopoesia, Thiago Cervan leva sua poesia ao formato convencional de publicação, sempre com o mesmo comprometimento: a difícil tarefa de fazer o simples bem feito. Nos conhecemos nas minhas aulas de Comunicação Social em Atibaia, cidade que ele adotou como lar, e chamaramme imediatamente a atenção sua generosidade e o repertório vasto de informações vinculadas ao universo underground das artes e cultura, sobretudo brasileira. Anos depois vim a conhecer sua poesia, e descobri o uso

criativo que fazia de todas essas referências. Neste trabalho Thiago apresenta traços nítidos da cultura contemporânea, tanto pelas temáticas quanto pelo estilo de sua poesia. Fala de amor com a simplicidade natural desse sentimento, de causas sociais pela perspectiva empírica de um desfavorecido, e subverte com criatividade os clichês da cultura de massa. Faz isso com textos curtos e de efeito rápido, como um nocaute no primeiro round ou um gol nos primeiros segundos de jogo. Espalha fragmentos que trazem ao leitor o gosto prazeroso do encontro com a boa poesia. *Giuliano Tosin é músico, poeta e professor universitário.

Sumo Bagaço, de autoria de Thiago Cervan e lançado pelo selo Poesia Maloqueirista, tem capa e ilustrações de Matias Picón, apresentação de Wilson Freire, projeto gráfico de Victor Meira, revisão de Heyk Pimenta e coordenação editorial de Berimba de Jesus. O livro está sendo vendido pelo e-mail under.ago@gmail.com, direto com o autor ou “em alguma rua do Brasil,” avisa Thiago Cervan.

Umbigo Giuliano Tosin

O umbigo é o centro do corpo da gravidade do corpo centro de tudo Olho do mundo eixo da via láctea ponto de fuga no óleo do artista Os índios tapam o umbigo e mostram o pênis o bico do pênis no meio da mata Matavam-se e se comiam mas não os umbigos Umbigo é a boca do feto que descansa incesto atrás do umbigo da mãe


´ para a nova era Etica Por Leonardo Boff*

N

enhuma sociedade no passado ou no presente vive sem uma ética. Como seres sociais, precisamos elaborar certos consensos, coibir certas ações e criar projetos coletivos que dão sentido e rumo à história. Hoje, devido ao fato da globalização, constata-se o encontro de muitos projetos éticos nem todos compatíveis entre si. Face à nova era da humanidade, agora mundializada, sente-se a urgência de um patamar ético mínimo que possa ganhar o consentimento de todos e assim viabilizar a convivência dos povos. Vejamos, suscitamente, como na história se formularam as éticas. Uma permanente fonte de ética são as religiões. Estas animam valores, ditam comportamentos e dão significado à vida de grande parte da humanidade que, a despeito do processo de secularização, se rege pela cosmovisão religiosa. Como as

religiões são muitas e diferentes, variam também as normas éticas. Dificilmente se pode fundar um consenso ético, baseado somente no fator religioso. Qual religião tomar como referência? A ética fundada na religião possui, entretanto, um valor inestimável por referi-la a um último fundamento que é o Absoluto. A segunda fonte é a razão. Foi mérito dos filósofos gregos terem construído uma arquitetônica ética fundada em algo universal, exatamente na razão, presente em todos os seres humanos. As normas que regem a vida pessoal chamaram de ética e as que presidem a vida social chamaram de politica. Por isso, para eles, política é sempre ética. Não existe, como entre nós, política sem ética. Esta ética racional é irrenunciável mas não recobre toda a vida humana, pois existem outras dimensões que estão aquém da

razão como a vida afetiva ou além como a estética e a experiência espiritual. A terceira fonte é o desejo. Somos seres, por essência, desejantes. O desejo possui uma estrutura infinita. Não conhece limites e é indefinido por ser naturalmente difuso. Cabe ao ser humano darlhe forma. Na maneira de realizar, limitar e direcionar o desejo, surgem normas e valores. A ética do desejo se casa perfeitamente com a cultura moderna que surgiu do desejo de conquistar o mundo. Ela ganhou uma forma particular no capitalismo no seu afã de realizar todos os desejos. E o faz excitando de forma exacerbada todos os desejos. Pertence à felicidade, a realização de desejos mas, atualmente, sem freios e controles, pode pôr em risco a espécie e devastar o planeta. Precisamos incorporá-la em algo mais fundamental. A quarta fonte é o cuidado, fundado na razão sensível e na sua expressão racional, a responsabilidade. O cuidado está ligado essencialmente à vida, pois esta, sem o cuidado, não persiste. Daí haver uma tradição filosófica que nos vem da antiguidade (a fábula-mito 220 de Higino) que define o ser humano como essencialmente um ser de cuidado. A ética do cuidado protege,

potencia, preserva, cura e previne. Por sua natureza não é agressiva e quando intervem na realidade o faz tomando em consideração as consequências benéficas ou maléficas da intervenção. Vale dizer, se responsabiliza por todas as ações humanas. Cuidado e responsabilidade andam sempre juntos. Essa ética é hoje imperativa. O planeta, a natureza, a humanidade, os povos, o mundo da vida (Lebenswelt) estão demandando cuidado e responsabilidade. Se não transformarmos estas atitudes em valores normativos dificilmente evitaremos catástrofes em todos os níveis. Os problemas do aquecimento global e o complexo das varias crises, só serão equacionados no espírito de uma ética do cuidado e da responsabilidade coletiva. É a ética da nova era. A ética do cuidado não invalida as demais éticas, mas as obriga a servir à causa maior que é a salvaguarda da vida e a preservação da Casa Comum para que continue habitável. * Leonardo Boff é teólogo, escritor e autor de Saber cuidar. Ética do humano, compaixão pela Terrra, Editora Vozes. www.leonardoboff.wordpress.com


Formemos um clube

´ e Corpo Historia Por Orivaldo Biagi*

U

Por Marcelino Lima*

Q

uando era criança uma de minhas diversões prediletas era jogar futebol de botão! Era craque na mesa, com times das marcas Estrela, Canindé, Brianezzi, tanto na regra livre, quanto na de três toques, com bola de disco, aquelas achatadas, de plástico, ou de feltro, arredondadas. Eu e meus companheiros botonistas organizavámos vários campeonatos e eu, claro, ganhei alguns, perdi outros. Cheguei a ter mais de 100 times montados, entre seleções e clubes de vários países. Os times eram montados tanto com escudos (ou distintivos/ brasões), quanto com rostos de jogadores, uma das características dos jogos da Estrela. Bom, eu era craque, sim, mas a última vez em que peguei na palheta apanhei, feio, de um italiano que nunca havia jogado, chamado Lorenzo.

Foi em 25 de janeiro de 1994, na casa do Claudio Piteri, lá no Parque Continental, com o Paulo Netho presente. Bom, estou com muita saudade desta época e desta diversão, que é uma excelente forma de relaxar e cultivar os amigos, então, vim aqui propor aos interassados que formemos um clube de futebol de botão, que poderá ter uma página nesta mídia social.

ma das mais interessantes e produtivas correntes historiográficas modernas procura relacionar a História com o corpo, ou seja, analisar criticamente a construção das representações imaginárias de determinados momentos sobre o corpo e o seu papel social nesse mesmo período. Michel Foucault tem um importante papel neste campo, pois foi um dos primeiros

Aos interessados basta entrar em contato comigo dizendo se topa e ai a gente junta a galera e organiza. No aguardo e aquele abraço, lançando já alguns convites para meus futuros patos: Érison Martins; Fabiano Gudjenian; João Barboza; André Bittencourt, o popular André Pega ele, Totó; Osni Dias. Pro gol!”

* Marcelino Lima é jornalista formado pela PUC-SP

pensadores a mostrar que as relações de poder eram muito maiores do que apenas a atuação do Estado na sociedade ou a luta de classes no universo político-econômico: as visãoes sociais do corpo (como um todo ou em partes; com traços delicados ou rústicos; com nudez ou roupas; com sua tensão entre o erótico e a pornografia; com as marcas criadas pela sociedade, como tatuagens, marcas de chicote, emblemas públicos, etc.; entre tantas possibilidades) também faz parte das relações de poder. O corpo comunica aspectos culturais de uma sociedade, sendo muito maior do que apenas uma expressão biológica. * Orivaldo Leme Biagi é PósDoutor em História pela USP e Professor da FAAT Faculdades

Imagem © Gunther von Hagens, Instituto de Plastinação, Heidelberg, Alemanha


Por Paulo Netho*

E

´ Emanuel e as vitimas

stava convicto: o riso deixa vítimas. As pessoas perdem a chance de terem conversas espirituosas. Ainda mais quando esta se passa entre dois espertos. Nessas ocasiões sempre tem alguém que se chateia e alguém que se arrebenta de alegria. Alguns se incomodam com o riso alheio, ainda mais, quando se reconhece causador do mesmo. Na vida, em hipótese alguma, ninguém deseja ser ridículo. Na roda das pessoas graves e hipócritas deve ser de bom alvitre parecer-se sério. Isto deve impor certo respeito. O cara tava de saco cheio: “A civilização é uma bosta que quanto mais você se limpa dela, mais sujo fica”. Especialmente naquela noite, Emanuel parecia disposto a enfrentar qualquer mala que cruzasse o seu caminho com conversa sem futuro. Quando se sentou à mesa, o Celsinho – um que se acha engraçado e que diz pra todo mundo que não tem papas na língua – já foi tirando uma. “E aí, Emanuel, quando nasce o bebê”? A resposta veio de bate - pronto: “Vai demorar um pouquinho”. Nisto o Celsinho insistiu num tom galhofeiro: “ah, mas pelo tamanho da

barriga já deve estar bem próximo”! “Não se preocupe não, a puta da sua mãe disse que só faltam três meses”. A gargalhada ecoou pelo boteco. As pessoas rolavam de rir. O Celsinho ficou vermelho de raiva e quis voar no pescoço do Emanuel, mas a turma do deixa-disso conseguiu acalmar os ânimos. O Emanuel não disse mais nada e continuou a sorver o seu Domecq com limão quando alguém se condoeu: “O senhor só diz isso porque está bêbado!” Emanuel, então olhou para o seu interlocutor fixando-o bem nos olhos e disparou sem meias palavras: “E você, nem bêbado, tem coragem para sair desse estado deplorável de miséria humana!” Sim, o Emanuel era o bêbado da praça; era a escória da raça; era a prova cabal de tudo o que não deve ser um ser humano. Além disso, tinha outro gravíssimo defeito, ria e com o seu riso deixava vítimas por onde passava. A mídia o descobriu, nas ruas as pessoas só falavam dele, mas ele nem ligava pra esses comentários. “Não valho uma bosta. Homem que ri não tem valor por essas bandas. Vou andar”. Nisso, alguém gritou para um Emanuel que já ia trôpego e bem longe: “Vai ser alegre lá na puta que o pariu, hiena!” * Paulo Netho é poeta, escritor e “um encantador de pessoas”.

Dabundabundabundabun Por Delta9*

A

nsioso esgueirava-se por entre as pernas, procurando abrir passagem, encontrar o seu caminho. E isto posto, encontrar seu lugar por entre as beiradas, o piso duro, o barulho ensurdecedor de seu silêncio incólume, de seu grito incontido, do estupor no olhar. A enormidade de passos, o descompasso cansado, o descaminho do tempo. O furor das bandeiras, das cornetas, dos uniformes em desalinho. O olhar certeiro para o horizonte perdido. Heróicamente incontido, perfila-se no meio-fio, na sarjeta, na calçada. Na direção errada do cão pastor alemão. O alvoroço de vozes, o bater palmas voraz, o falso discurso veraz. O giro, o pulo, o endireitar de passos à esquerda e à direita, volver. Sem poder ver bem a tuba. Por detrás da linha, a turba. Nada a ver. E segue o séquito de pretensos iludidos, aturdidos beneméritos, ressurgidos beneplácidos, cingidos num colar de páreas. Trepitosamente chega o clímax, em seus Ápis de aço, recheados

de fortuita força, pés pesados, baionetas escoradas sobre o ombro esquerdo a lembrar da lição de morrer em ação. Incontinências hereditárias; mementos sem coca-cola; crucifixos na gandola e chocalhos nas canelas de Angola. A parada sempre foi outra. Hoje a festa é julina; a cuca é ‘raloina’; o banho cheira a urina. E se as crianças são feitas em fevereiro, elas são inventadas em outubro. E a independência?! À merda... * Delta9 é extraterrestre, publicitário e atua no Judiciário. www.undiverso.blogspot.com/


Viva a Bunda! Por Mario Sérgio de Moraes*

V

ALLAN TEGER

http://robsonartes.blogspot.com.br/

ocê está assistindo a novela “Gabriela? Não? Pois bem, não sabe o que está perdendo. Não pela produção, nem pela qualidade de alguns artistas, nem pelo roteiro bem feito. Mas sim por um aspecto central da obra de Jorge Amado: é uma ode, homenagem, celebração do gosto masculino (ou também é do feminino?) pela bunda. Aliás, caro leitor, pergunto: existe na língua portuguesa palavra tão sonora como a bunda? Pronuncie e sinta a sua sonoridade: buunnndaa! Em determinado capitulo uma das senhoras diz uma verdade acachapante ao personagem Nassib: “Homem gosta mesmo é de uma bunda”. Ele, diante da afirmativa, faz uma cara algo envergonhada diante da estampada afirmação, mas dá um sorrisinho malicioso e disfarça a evidente assertiva. Ou melhor, não é assertiva, é a ativa clarividência: bunda rima com funda verdade. Podemos chamá-la por outros nomes tão criativos: nádegas para os envergonhados; bumbum para as crianças, assento para as senhoras, rabo para as desejadas, traseiro para as recém casadas.

Outro privilégio: são duas luas estufadas. Aliás, por tudo isto a bunda desperta inveja. Por quê? As mulheres perdoam tudo, menos uma bunda maravilhosa em outra mulher. Vejam só: ela é a grande preferência nacional. Suplanta o futebol, a cachaça e ganha longe da feijoada. E no caso especifico: a bunda da Juliana Paes. Meu Deus! Que bunda... Sua abundancia é amazônica. E não é somente rotunda como outras --- da Tiazinha, Mulher Melancia --- que siliconizadas plastificam nossa imaginação. E qual diferença? Ora, a bunda desta atriz é uma bunda nacional. Ou melhor, é o retrato do nosso país, tão abundante... Você está duvidando da minha exaltação? Ora, naquela dimensão cabem as curvas obliquas do

®Allan Teger - Bodyscapes

Oscar Niemeyer. As ondulações dos morros. A fartura da nossa miscigenação. Sintam o óbvio: a própria palavra é tão bonita que soa como um tambor indígena! Bamboleia --- sobe e desce --como o traseiro de uma sambista negra. Repica (não pense bobagem com esta palavra!) na maciez de uma pele européia. Enfim, é uma “sustância” bem nutrida pelo arroz com feijão. E, finalmente, aos ululantes traseiros correspondem fartos peitos (bunda com mulher chapada na frente não combina) explicando a causa de nossa boca brasileira ser tão tagarela. Concluindo: bunda sinaliza, pontifica e personifica. E na bunda a bondade não existe. É o estandarte, sem paz, do nosso Brassillll. * Mario Sérgio é Doutor em História pela USP.


ELES SÃO LOUCOS e não são poucos

Praça da Sé: palco onde Edvânia aguarda por um sinal das Agências de Informação para sua próxima missão secreta


Por Jean Takada*

Delírios reais nas ruas do centro velho de São Paulo

Mendigos já fazem parte do cenário gótico e neoclássico do centro velho de São Paulo. Pessoas desligadas da família, sem moradia e sem convívio comunitário. Pessoas claudicantes de corpo e alma que sobrevivem misturados à multidão que circula diariamente pelas ruas mais antigas da cidade. Pessoas desempregadas, maltrapidas, desiludidas, viciadas em álcool, crack e miséria. Pessoas que já foram de tudo e outras que nunca foram nada e nem serão ninguém . . .

Edvânia: atriz, bailarina e jornalista das mídias mundiais

* Jean Takada é editor de arte e aprendeu que é sempre bom ter um chocolate na mochila em tempos de TPMs.


B

em diferentes da pernambucana de Pau D’alho, Edvânia. Ela é atriz, bailarina e jornalista das mídias mundiais. Trabalha para todos os veículos de comunicação, fala diversas línguas e ainda por cima é uma espécie de espiã secreta de várias agências de informações secretas. Vive na Praça da Sé há uns dez anos esperando por uma missão derradeira. Cícero ou Zoreba também é espião, mas não trabalha para nenhuma agência secreta. Só segue ordens dos chefões e guarda um segredo que revela para poucos: é um robocop. Seu domínio é a Rua Barão de Itapetinga e seu Q.G. fica na Praça da República. Reginaldo dos Santos traz no sangue a destreza dos índios paulistas. Do colo da mãe foi direto para um orfanato dirigido por freiras. Quando a idade chegou foi para as ruas do centro e descobriu, por conta própria, como é sobreviver sozinho em uma selva de pedras. Quando não está fitando o movimento, está no largo São Bento dando um rolê com sua moto roxa de 1.600 cilindradas. Uma bala!


Cícero, sob o manto de Zoreba: espião

Hamilton tem tantas qualidades que se dá ao luxo de dizer que vive na rua por opção. Já foi professor do próprio cursinho pré-vestibular, perdeu muito tempo discutindo política, foi de direita, pendeu para a esquerda, brigou com a família, chutou as amizades falsas e se desencantou com a filosofia présocrática de Diógenes, o cínico. Há dois anos deixou São João Del Rei, em Minas, com a roupa do corpo e veio para Sampa, decifrar o espiritismo no contexto urbano.


Miba é gringa. Nasceu na Tailândia e há cinco anos fugiu das guerras civis daquele país. Sem saber para onde ir, bateu o dedo no mapa mundial e quando se deu conta, estava de pé, sobre o marco zero de São Paulo, na Praça da Sé, falando português fluente. Quer aproveitar a experiência em guerras internas para ajudar o povo brasileiro com seus conflitos. Enquanto as brigas não começam, ela vai treinando o pessoal do 153, 190 e 193 ou qualquer outro número e emergência. Estará sendo injusto quem disser que é trote. Miba garante que tudo não passa de treinamento secreto.


Começam as gravações do documentário “A Esquina de Monalisa” “Mais que nunca precisamos das vozes daqueles cujo discurso não foi turvado pela tentação de dominar o mundo” (Hubert Fitche,1987)

R

odrigo Casali é pesquisador, professor de história e artista plástico. Possui Graduação e Mestrado em História pela Universidade Federal de Mato Grosso do Sul – UFMS. Sua pesquisa está concentrada na Etnopoesia – estudo das linguagens e das identidades e representações - de grupos marginalizados. Fundamentado nessas pesquisas, com chefes de terreiro, publicou o livro “Autofalantes”, 2010, pela editora da Universidade Estadual de Mato Grosso do Sul, com apoio do CAPES – Centro de Apoio à Pesquisa. Casali foi morar em Botucatu e a partir de seu trabalho com os travestis, realizou a exposição “A Esquina de Monalisa” composta por pinturas, desenhos e vídeos, em que esses atores sociais relatam aspectos de seu cotidiano.

A mostra aconteceu no Museu de Arte Contemporânea do município, sendo seu trabalho de artes visuais, participante e vencedor de uma das etapas do Mapa Cultural Paulista, no mesmo ano. Para ampliar sua experiência e pesquisa propõe agora a publicação de um livrodocumentário “A Esquina de Monalisa” que será acompanhado de um vídeo com histórias de travestis da cidade, em um processo de tradução para a escrita de uma nova História - aquela vista de baixo. O documentário será resultado de pesquisas, leituras e trabalhos de campo da equipe envolvida e partirá de etnografias, descrições densas e entrevistas, tratando da identidade e da representação dessas personagens ocultas em nossas periferias urbanas - a travesti.

O filme de Rodrigo Casali e José Renato Arena Scorsatto tem previsão para lançamento em dezembro


Para a elaboração de um trabalho com excelente tratamento audiovisual o projeto conta com a participação do Cineasta José Renato Arena Scorsatto e com a direção de arte do artista plástico Everton Oliveira, experientes profissionais da área. Visando contribuir também para a construção de diálogos que aproximem o Centro à Periferia e difundir o conhecimento e a tolerância pelo interior do Estado, o autor participará de lançamentos de livros, eventos, seminários e congressos sobre a temática LGBT, além de realizar palestras e exibições do documentário como contrapartida pela publicação da obra. Desse modo, o projeto tem como objetivo a publicação de mil (1.000) exemplares do livro “A Esquina de Monalisa”, bem como, a filmagem e edição de um Vídeo Documentário, que acompanhará o livro, com as histórias de vida contadas pelas travestis de Botucatu. Para democratizar ainda mais o acesso à informação, uma parte do livro-documentário “A Esquina de Monalisa” será distribuído gratuitamente para Comitês, Conselhos e Assessorias Municipais de Políticas Públicas para a Igualdade de todo o interior do Estado de São Paulo. Direcionado a pesquisadores,

acadêmicos, alunos do ensino médio de escolas públicas, ativistas, militantes da causa e toda a comunidade interessada pelo assunto, outra parte da publicação será comercializada a preços populares, dez reais (R$ 10,00). Finalmente, buscando o fomento e a implementação de projetos na área e a criação e ampliação de políticas públicas específicas voltadas à saúde, educação e cultura dessas mulheres, o trabalho terá linguagem acessível, a fim contribuir para a construção de uma atitude mais positiva e afirmativa frente às diferenças. O projeto conta com a parceria da Secretaria Municipal de Saúde e já foram realizadas três entrevistas de natureza bastante diferenciada. A primeira delas foi com a técnica em enfermagem Micheli, que contou parte de sua experiência de vida. Depois foi a vez de Vivi, trabalhadora da saúde, que atua diretamente na prevenção de doenças sexualmente transmissíveis com outras travestis no bairro Cecap. Há também uma interessante entrevista com o pai de santo Carlinhos. Mais informações pelo fone (14) 8165-0760 ou pelo endereço na internet www. aesquinademonalisa.blogspot.com


Filme ‘O palhaço’ representará o Brasil na disputa pelo Oscar 2013

O

filme “O palhaço”, de Selton Mello, representará o Brasil na disputa pelo Oscar 2013, em 24 de fevereiro. Selton Mello — que dirigiu, coroteirizou e atuou na produção do filme, divulgou uma nota após o anúncio oficial. “O Palhaço é um filme impregnado de delicadeza e a sua escolha como representante brasileiro me encheu de alegria. A escolha foi algo comovente, pois provou-se que é possível um filme sensível e poético alçar voos grandiosos.” A indicação de “O palhaço” foi feita feita por uma comissão que avaliou 16 filmes inscritos para tentar uma indicação pelo Brasil no Oscar. Para o editor da Kalango, uma excelente escolha. Em homenagem ao grandioso trabalho, publicamos a seguir um ensaio realizado pela fotógrafa Laura Aidar, em visita ao circo na cidade de Nazaré Paulista (SP), com seus alunos.


Circo! Por Laura Aidar*

www.lauraaidar.com.br www.fotolauraaidar.blogspot.com.br






algumas respostas (um tanto cansadas)

a cartazes homofóbicos Por Diego Calazans*

R

espondendo a alguns cartazes dos que não querem que direito algum seja garantido aos casais gays (isso pra não dizer dos que querem que sejam presos, torturados e/ou mortos): * “Anus 4 defication” - “ânus para defecação”, diz o primeiro cartaz. sim, e a boca para comer (nada de beijar nem fazer sexo oral em quem quer que seja). * “Protect the Family” - mas é exatamente ISSO que queremos ao garantir direitos a famílias constituídas a partir de uma união estável entre pessoas do mesmo sexo!!! ou vocês ainda acham que família é sempre papai-mamãefilhinhos? deem uma volta pelo seu bairro e vejam quantas formações diferentes de famílias vocês encontram! * “No gay education in our school” - como eles imaginam que é essa tal de “educação gay”? aulas de maquiagem pros meninos e de direção de caminhonetes pras meninas? aulas de “orgias sodomitas” seguidas de “desmunhecamento avançado”?

sério, queria saber o que querem dizer com “educação gay”. * “It’s not our culture” - a via do absolutismo cultural é curiosa. dá um ensaio inteiro. vou responder apenas com um “e daí?” vão fechar as portas a tudo que não for da cultura de vocês? não vejo esse tipo de protesto quando a Coca abre fábricas nos locais mais remotos

onde certamente beber tal coisa não faz parte da cultura local. * “Gays killed my friend” - como assim? que amigo? por quê? e isso faz de todos os gays assassinos? então se negros ou judeus ou ciganos matarem um amigo meu isso justificaria meu ódio a negros ou judeus ou ciganos? balela! * “Stop AIDS” e variantes os grupos em que há maior crescimento de casos de AIDS atualmente é de mulheres casadas (com homens, diga-se) e idosos héteros. AIDS não escolhe orientação sexual. quem usa esse “argumento” deixou a cabeça em algum lugar nos anos 1980.

* “You don’t have to be gay” - e você não tem de ser cristã, mas a lei garante direitos a você se é isso que você quer ser; direitos devem garantir o respeito à liberade, e a liberdade está calcada na possibilidade de escolha; você realmente “não tem de ser gay”, ou pelo menos não tem de assumir seus desejos, pode viver uma farsa, se é o que deseja; mas, se você quiser “ser gay”, se quiser assumir seus desejos e buscar a felicidade do jeito que você sente que funciona pra você, então a lei deve ampará-lo, porque ao fazê-lo você não está oprimindo ninguém. a lei deve desoprimir; ela deve impedir que o opressor oprima; nesse caso, o opressor é quem quer impedir o oprimido de ser feliz (sem prejudicar ninguém) do jeito que se sente capaz de sê-lo.


http://www.buzzfeed.com/mjs538/faces-of-homophobia-around-the-world

* “Quero um pai e uma mãe” e variantes - não sei por que a obsessão com crianças sendo criadas por um pai e uma mãe. quantas famílias vocês conhecem em que as crianças são criadas por apenas um dos pais ou pelos avós, tios, irmãos, padrinhos, amigos etc. eu particularmente NUNCA fui criado por papai-e-mamãe, fui criado por duas tias e uma avó,

e creio que me saí melhor que muita criança criada pela família propaganda-de-margarina que essa gente tem em mente. * “The more gays the less latvians” - ah, sim, porque todos sabem que a causa da redução da taxa de natalidade na Europa é da existência de gays. não tem a ver com casais hétero e pais

solteiros escolhendo ter menos filhos ou não ter filhos por conta da urbanização, do mercado de trabalho competitivo e da valorização de famílias pequenas. vários outros cartazes fazem essa relação de “casais gays = casais sem filhos”. isso é bobagem. como qualquer criancinha criada em um lar liberal sabe, não é preciso estar num casamento tradicional para se ter filhos; pode-se ter filhos simplesmente indo a uma clínica ou ao banheiro de um bar. e casais gays podem ter filhos; podem adotá-los ou podem optar pela inseminação artificial ou até mesmo pela via convencional, convidando uma pessoa amiga para que a concepção seja possível. de toda forma, não querer ou poder ter filhos não é algo que torna ilegal casamentos héteros (nem deveria ser), então por que inviabilizaria casamentos gays? * “Even animals are not homosexual” - esses aí merecem reprovar em biologia. a homossexualidade já foi registrada em um número considerável de espécies; é até bastante comum. a repulsa à homossexualidade, todavia, só foi encontrada em uma espécie. * “Diversity sucks” - sem o respeito à diversidade, teríamos uma guerra cultural aberta e,

numa situação de guerra, eu seria o primeiro a estourar seus miolos; então, pense na diversidade como uma garantia de que eu te deixarei em paz desde que você me deixe em paz. acredite: você não vai querer me ter como inimigo. * “Civil rights? No!” - se acabarmos com os direitos civis teremos tirania. simples assim. os direitos são garantias de que alguma paz é possível. tire os direitos e haverá convulsão social diante de um quadro aberto de autoritarismo. triste de quem não percebe isso. * “Stop Gay Sex” - sério. como se fosse “parem as caças às baleias”. eu me dignaria a responder se esse não fosse de longe o cartaz mais imbecil porque o idiota realmente pensa que sexo gay é algo que se possa “parar” por meio de um protesto. impedir leis protegendo gays ou exigir leis criminalizando é uma coisa, querer ser o maior empata-foda do planeta no grito é outra. Diego Calazans faz recomendações artísticas, pagãs e anarquistas em geral em seu blog http://diegorscalazans. blogspot.com.br/


Por Amne Faria*

...Ando precisando desesperadamente tirar o pó da minha alma. Depois, ajeitar a cara. Diminuir todo o peso, comprar pão e sorrisos novos. Penso em sair pelo mundo, olhando nos olhos... Enxergando em detalhes. http://amnenoteatrodepalavras.blogspot.com/ * Amne é poeta, escritora e formanda em publicidade e Propaganda pela FAAT.

VOLTE

SEMPRE


EXAME VESTIBULAR - 9 DE DEZEMBRO DE 2012 http://www.faat.com.br/site/prosel.asp


Issuu converts static files into: digital portfolios, online yearbooks, online catalogs, digital photo albums and more. Sign up and create your flipbook.