Terras de Antuã - Histórias e Memórias do Concelho de Estarreja

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Nยบ 13 | ANO 13 | 2019






[ FICHA TÉCNICA ]

TERRAS DE ANTUÃ REVISTA DE PUBLICAÇÃO ANUAL Nº13 | ANO 13 | NOVEMBRO DE 2019

DIRETORA Rosa Maria Rodrigues EDITOR Câmara Municipal de Estarreja IMPRESSÃO E ACABAMENTO Procer TIRAGEM 750 Exemplares IMAGEM DE CAPA Foral do Antuã - 1519 PT/TT/MSMAR/L107 PROJETO GRÁFICO Câmara Municipal de Estarreja | GCRPT ISBN 1646-8562 DEPÓSITO LEGAL 267394/07 Os artigos publicados neste número são da responsabilidade científica e ética dos seus autores bem com o respeito pelo acordo ortográfico em vigor.


[ SUMÁRIO ]

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500 anos do Foral de Antuã Diamantino Sabina

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EDITORIAL Rosa Maria Rodrigues

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SOCIEDADE DE REPRESENTAÇÕES DA BEIRA LITORAL LDA Andreia Tavares

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FREI GONÇALO MARIA TAVARES - Do clero secular para o regular António Augusto Silva

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O CASTRO DE SALREU, UM DOS POVOADOS PROTO-HISTÓRICOS ATLÃNTICOS DO ENTRE DOURO E VOUGA António Manuel Silva, Edite Martins de Sá, Jorge Fernando Salvador, Paulo A.P. Lemos e Sara Almeida e Silva

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AS CASAS DO MATO (SALREU) E DE FONTE CHÃ (BEMPOSTA) NOS OFÍCIOS CONCELHIOS ANTUANOS SUBSÍDIOS PARA A HISTÓRIA DOS REGISTOS DE NOTARIADO NO CONCELHO DE ESTARREJA 2ª PARTE DE D. FILIPE II A D. JOÃO V António Pedro de Sottomayor

108 A FAMÍLIA QUADROS EM SALREU DESDE O FINAL DO SÉCULO XVIII (PARTE II) Delfim Bismarck Ferreira 125 OLHARES POR DENTRO DO MUNICÍPIO DE ESTARREJA - ITINERÁRIOS POR ÁGUA Etelvina Resende Almeida 146 A ODIOSÍSSIMA MORTE DO LÁZARO José Gurgo e Cirne 165 CARLOS MARQUES RODRIGUES: O IMPULSIONADOR DA EDIFICAÇÃO DA CENTRAL DE ENERGIA ELÉTRICA A TURBINA DE ESTARREJA Juliana Cunha 182 ESTARREJENSES ILUSTRES: O 1º MARQUÊS DE TERENA – SEBASTIÃO CORREA DE SÁ (1766-1849) Luís Cardoso Menezes 188 MILITARES DOS CONCELHOS DE ESTARREJA E MURTOSA MORTOS EM ÁFRICA (1961-1974) Marco Pereira 193 ESTARREJA NA GRANDE GUERRA MILITARES FALECIDOS NA FRENTE OCIDENTAL (1917-1918) Maria Clara de Paiva Vide Marques, António Cruz Leandro;Teresa Cruz Tubby


233 A SOMBRA DO MOSTEIRO DE AROUCA RAIZES LONGAS DE ANTUÃ Norvinda Leite e Carlos Pinho 253 COISAS DE CANTADORES Sérgio Paulo Silva 279 EMIGRAÇÃO ESTARREJENSE NO ANO DE 1908 Teresa Cruz Tubby e Valter Santos 303 SAUDADES 70 ANOS DO PRÉMIO NOBEL EGAS MONIZ Rosa Maria Rodrigues


500 ANOS DO FORAL DE ANTUÃ Diamantino Sabina*

Este “Terras de Antuã” celebra o dia 15 de novembro de 1519! A data onde em Évora, Dom Manuel I concedeu Carta de Foral ao lugar e concelho de Antuã do Mosteiro de Arouca. Um marco na história do Município de Estarreja. Com este Foral, D. Manuel I, concedeu privilégios, tanto aos seus moradores, como aos seus senhorios, livrando-os de feudos e vassalagens senhoriais, cimentando normas comunitárias baseadas no equilíbrio, na justiça e na paridade a que todos tinham direito. O propósito seria fazer valer e cumprir o que nele estava estabelecido, funcionando com eficácia de lei. Não é comum comemorar-se 500 anos de aniversário, seja do que for! E tendo-nos cabido esse privilégio, não pudemos descurar tão distinta data. Comemoraremos com brio e pompa a atribuição do nosso Foral de Antuã. Recuando até 1519, um Banquete Real é uma das atividades que fará parte das festividades. Trajaremos a rigor e haverão danças e teatro. Até o regabofe revestirá contornos quinhentistas. A comunidade é convidada a participar e marcará presença numa noite que se prevê animada e de rigor histórico. Os restaurantes locais também ostentarão menus medievais juntando-se à festa do concelho. Engalanámos a capa desta edição da “Terras de Antuã” com a bonita imagem do Foral. O lançamento dá-lhe relevante destaque, integrando também as merecidas comemorações. Teremos uma palestra que versará sobre as históricas singularidades do Foral de Antuã e sobre os idos anos de 1500. Também não faltará uma exposição, um concerto e Teatro! Um dos momentos altos destas comemorações caberá à justa Homenagem aos ex-combatentes da Guerra do Ultramar, na Estação dos Comboios, onde será inaugurado um bonito memorial. Neste “Terras de Antuã” contámos mais uma vez com um notável conjunto de autores aos quais agradecemos penhoradamente. A emigração, os nobres, a Guerra Colonial, os “cantadores” e Egas Moniz, fazem parte de mais este volume da história estarrejense. Continuaremos a promover esta revista, com a qualidade a que nos vem habituando. Com a prestimosa ajuda dos autores deste “Terras…”, continuaremos a dar conta de pedacinhos da nossa história. Esta edição tem também a especial missão de nos transportar para o dia 15 de novembro do ano da graça de 1519, uma data de importância fundamental! Data que hoje comemoramos! Foi há 500 anos que D. Manuel I, El Rei de Portugal, nos atribuiu o Foral de Antuã! * Presidente da Câmara Municipal de Estarreja



EDITORIAL

Rosa Maria Rodrigues

Assinalando-se no corrente ano (15 de novembro), os 500 anos da outorga do foral por D. Manuel I às Terras de Antuã, apresentamos a décima terceira edição da revista “Terras de Antuã – Histórias e Memórias do Concelho de Estarreja”. Os factos históricos coincidem, para que não se apague na nossa memória coletiva, um passado que apreendemos e que temos consciência de ser nosso dever, transmitir às gerações futuras, para que estas sintam partes integrantes desta sua história. Os temas apresentados nesta edição de Terras de Antuã permitem-nos na sua globalidade um melhor conhecimento da historiografia local, desencadeiam a discussão, permitem a divulgação de estudos sobre realidades, factos e momentos que permaneceriam desconhecidos, se não fossem organizados e compendiados numa publicação com estas características e que passam por abordagens sobre arqueologia, património industrial na senda de memórias de imaterialidade, emigração, genealogia, guerra colonial, cultura popular, relatos de viagens no coração da Ria, história medieval, religiosa, local e política, onde se destaca a evocação do Centenário do Tratado de Versalhes, com o memorar dos militares que aí pereceram e que eram oriundos do Concelho de Estarreja. Este número de Terras de Antuã apresenta na capa o Foral do Antuã, onde nos é possível evocar o documento que concedeu privilégios, tanto aos seus moradores, como aos seus senhorios, neste caso ao Mosteiro de Arouca, livrando-os de tributos e dependências senhoriais, fortalecendo as regras comunitárias baseadas no equilíbrio, na justiça e na igualdade a que todos tinham direito. Evocar esta efeméride é perpetuar no tempo a riqueza de um povo a singularidade das suas gentes e do seu território. O tema Saudades desta revista Terras de Antuã, evoca os 70 anos da atribuição do prémio Nobel a Egas Moniz (1949|2019). Podemos e devemos considerar Egas Moniz, uma individualidade singular do século XX português, pois a sua obra pluridisciplinar e inovadora passou para além do seu tempo, e inscreve-o inequivocamente na Galeria daqueles que modificaram o rumo da história, por isso com justiça se lê no monumento erigido em sua homenagem em 1950 em Avanca: AQUI VIU NOVA LUZ A HUMANIDADE. A todos os que contribuíram abnegadamente, para a concretização desta edição de Terras de Antuã, o nosso agradecimento.



TERRAS DE ANTUÃ | HISTÓRIAS E MEMÓRIAS DO CONCELHO DE ESTARREJA

SOCIEDADE DE REPRESENTAÇÕES DA BEIRA LITORAL LDA.

Andreia Tavares * Introdução Falar da Sociedade de Representações da Beira Litoral Lda. é, antes de mais, lançar pontes para as memórias de outras empresas que fizeram e marcaram a história dos concelhos de Estarreja e Murtosa. Reviver a memória de gentes empreendedoras que permitiram o desenvolvimento de ambos os concelhos, que agora irmãos, até 1926 unos. A inexistência de documentação física foi um dos problemas com que nos debatemos, sendo possível recorrer ainda à memória de alguns dos familiares directos dos fundadores, embora nos possamos apenas alicerçar na tradição oral que vai passando de geração em geração – e já vamos na quarta. Perdoe-nos o leitor, o historiador, os familiares ou os que de alguma forma estiveram ligados a esta sociedade, se não conseguimos retractar fidedignamente a história da empresa, mas fica o desafio para que tragam a lume informações que possam aperfeiçoar a presente resenha e enriquecer a história do concelho. 1. Fundação A Sociedade de Representações da Beira Litoral, Lda., comummente conhecida como SOREBEL, foi fundada em 1941 e tinha como sócios António Augusto Souto Alves1, os irmãos João Augusto da Costa e António Costa2, e Alexandre Miranda3, estando actualmente a sociedade na posse dos herdeiros de João Augusto da Costa.

* Solicitadora Agradecimentos: Ao Dr. Marco Pereira e ao Sr. António Augusto Silva Rodrigues pela constante disponibilidade para pesquisa e esclarecimento de dúvidas; aos netos do Sr. José Augusto da Costa (Ana Maria e João Figueira Rebelo) pela partilha das memórias. 1 - Filho do conceituado médico Sr. Souto Alves e irmão do antigo presidente da Câmara Municipal de Estarreja, Dr. Guilherme Souto, foi contador da Comarca de Albergaria-a-Velha, nasceu em 1888 e faleceu em 1946. 2 - Naturais de Veiros, os irmãos estiveram juntos na fundação de outras sociedades, tais como a Comur, Agência de Viagens Costa & Irmão e Cerâmica Beira Ria Lda. 3 - Filho de comerciantes locais, foi jogador do Futebol Clube do Porto e mais tarde veio a ser atleta em Estarreja. Foi um dos fundadores do Sporting Clube de Estarreja que esteve na génese do Clube Desportivo de Estarreja. Foi fundador do Café e Residencial Almir, que ainda hoje existe, embora à data da fundação com outras designações. Esteve ligado ao Centro Recreativo de Estarreja, à Associação de Solidariedade Estarrejense e ao Rotary Clube. Nasceu em 1910 e faleceu em 1993.

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ANDREIA TAVARES

Figura 1 - João Augusto Costa Figura 2 - Alexandre Miranda

O Jornal Concelho de Estarreja (quando publicado sob a chancela de “O Povo de Pardilhó”), dá notícia do início da sociedade, a 22 de Novembro de 1941.

Do pacto social da empresa ainda hoje faz parte a seguinte cláusula: “O seu objecto social é o exercício de comércio por comissões, consignações, representações e conta própria, podendo dedicar-se a qualquer outro ramo, com excepção do comércio bancário”. A SOREBEL tal como a conhecemos hoje não era dedicada ao comércio de viagens, mas à representação de marcas nacionais e internacionais, sendo revendedores de produtos que até então estavam afastados das gentes de Estarreja. [ 12 ]


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2. Na origem das Conservas da Murtosa A Sociedade de Representações da Beira Litoral está na origem da empresa Conservas da Murtosa – COMUR. Reza a memória das gentes que foi a SOREBEL que recebeu a encomenda de conservas para fornecer às forças beligerantes, decorria a II Guerra Mundial4. Em 1946, o jornalista João Paulo Freire (Mário), edita um caderno inteiramente dedicado ao concelho de Estarreja, sob o nome “Cadernos dum Jornalista: factos – memórias – acontecimentos”5, tratando-se, como refere o próprio autor, de “alguns apontamentos para o estudo geral deste concelho”, em que refere a SOREBEL como a origem das conservas de peixe. “E já se encontra em experiências uma outra iniciativa da mencionada firma SOREBEL, concessionária do fabrico de conservas de peixe, a qual muito pode concorrer para a valorização da fauna das águas interiores. A expansão de conserva das apetitosas enguias de esta firma é a prova de um género alimentício que caiu bem no mercado”, pode-se ler no estudo. Fundada em 1942, a produção enraizou e mais de 70 anos depois ainda existe a fábrica em funcionamento, embora não apenas dedicada à conserva de enguias. Na Murtosa existe também museu municipal aberto de terça e domingo, nas antigas instalações da empresa, de forma a perpetuar a memória desta importante actividade para o concelho. As enguias da Murtosa eram, e ainda continuam a ser, um ex-libris da Feira de São Mateus, em Viseu, onde continuam a ser vendidas fritas ou em escabeche, e fazem parte da memória gastronómica das gentes beirãs.

Figura 3 - Trabalhadoras da Comur juntamente com o sócio fundador Alexandre Miranda (e outro sócio que não conseguimos identificar) 4 - Só a memória da família de João Augusto da Costa permite alicerçar esta possibilidade, não havendo nenhum documento escrito até agora conhecido que consubstancie esta afirmação, embora, sem dúvida que a empresa esteve na base da formação da COMUR. 5 - O Caderno especial sobre o concelho de Estarreja vem no seguimento do livro “8 dias de “liberdade” condicionada”, da autoria do jornalista João Paulo Freire (Mário), publicado pela Sociedade Cooperativa “O Lar Familiar”, do Porto, em 1945. De passagem por Estarreja o referido autor tem como companhia de tertúlia o Sr. Dr. António Tavares Afonso e Cunha, que lhe apresenta o concelho, o Dr. Manuel de Figueiredo, Dr. António Pires Machado, o Sr. Francisco de Moura Almeida Eça, Sr. António Tavares Afonso e Cunha e o Dr. Alberto Vidal (antigo presidente da Câmara dos Deputados).

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ANDREIA TAVARES

3. Representantes comerciais Tratando-se de uma sociedade de representações, a SOREBEL representava produtos locais a nível nacional e vice-versa. No referido “Cadernos dum Jornalista” João Paulo Freire (Mário) atribui à empresa a comercialização e promoção comercial do queijo Hoornh, à data produzido pela imponente industria leiteira do concelho. “… cuja distribuição se encontra a cargo da nova firma comercial – Sorebel, na sua polpa bem equilibrada com 40% de gordura, e de igual paladar suave, conseguiu tomar a posição do estrangeiro Croa, delicada e decentemente destronado de todas as mesas do país. Estamos convencidos trata-se de um produto alimentar que dignifica a industria nacional, e exalta o bom nome do concelho onde se fabrica!”. Pela descrição do autor podemos facilmente depreender que não só o queijo seria de excelente qualidade, como o trabalho desenvolvido pela SOREBEL na sua promoção e comercialização dava frutos. Na memória da família está a comercialização de produtos tão distintos como sapatos, óleos e volfrâmio, sendo que não possuem documentação que permita aprofundar esta relação comercial. 4. João Augusto da Costa, de carpinteiro a empresário de sucesso Natural de Veiros, João Augusto da Costa, viveu na propriedade ainda existente em frente ao Clube Cultural e Desportivo de Veiros. Carpinteiro de profissão, rapidamente a sua veia de empresário e empreender veio ao de cima. Os netos João Figueira Rebelo e Ana Maria Rendeiro recordam um avô de ideias fervilhantes, muito à frente da sua época e com uma capacidade de iniciativa fora do comum. É memória familiar que no início dos anos 30 ter-se-á deslocado aos Estados Unidos da América, não como emigrante, mas em prospeção de mercado. Eram frequentes as suas deslocações ao Porto e a Lisboa em negócios, com a análise de representações comerciais na zona norte e centro do país. João Augusto da Costa foi também um dos sócios fundadores da Fábrica de Cerâmica Beira Ria Lda., que produzia telhas, algumas das quais ainda chegaram à actualidade. Mas na origem da família está uma história de amor digna de um conto de fadas: aos 18 anos o avô João perdeu-se de amores por uma jovem rapariga de Sarrazola e sem ter autorização dos pais para a cortejar, decidiu raptá-la (com o devido consentimento da própria) numa carroça e refugiar-se em Águeda. Viriam a casar-se já depois do nascimento da primeira filha e mais tarde regressaram ao concelho de Estarreja. [ 14 ]


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Figura 4 - Documento consulado de Portugal em New Bedford

5. Transformação em Agência de Viagens Não há um momento exacto para se definir que a SOREBEL passou também a comercializar viagens de barco e de avião. Certo é que a 17 de Setembro de 1949 o jornal Concelho de Estarreja já trazia anúncios a referir esse novo serviço prestado pela sociedade, na senda da emigração que se começou a sentir para destinos como o Brasil, Venezuela e Estados Unidos da América. De realçar que o alvará da agência de viagens é o n.º 44/58, ou seja, um dos mais antigos do país ainda em actividade. [ 15 ]


ANDREIA TAVARES

Certo é que o nome de João Augusto da Costa já se encontrava ligado ao ramo das viagens e representante oficial no concelho de Estarreja em 19316, sendo que continua a ser representante oficial em 1939, através da Agência Costa. Os jornais da época publicitam essa oferta de mercado:

Mais tarde, a Agência Costa dá origem à empresa Costa & Irmão Lda., sendo actualmente a agência de viagens em funcionamento mais antiga da cidade de Aveiro, com o alvará emitido em 1958. A SOREBEL continua a operar no ramo das viagens, e por curiosidade mantém o mesmo apartado de CTT desde a sua fundação: o número seis.

6 - Boletim da Emigração: 1919 - 1933 e Anuário Comercial de Portugal, pesquisa realizada e disponibilizada pelo Dr. Marco Pereira

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FREI GONÇALO MARIA TAVARES DO CLERO SECULAR PARA O REGULAR António Augusto Silva*

FIRMINO MARQUES TAVARES, nasceu a 15 de Maio de 1890, 4.º filho de uma família de lavradores da Póvoa de Cima, em Beduído. A sua infância passou-a já na Areosa do Norte, para onde os pais se haviam mudado, não muito longe da Igreja de S. Tiago.

Como outras crianças da Freguesia terá frequentado a Escola Primária do Conde de Ferreira e, provavelmente, terá continuado os seus estudos no Colégio de S. Fiel, em Louriçal do Campo, orientado por Jesuítas, e que tinha grande fama no ensino. Por lá já passara, por exemplo, o futuro Dr. Egas Moniz e, em Outubro de 1900, para lá foi um grupo de jovens da região - um do Bunheiro e três de Pardilhó, entre os quais o futuro Padre Donaciano de Abreu Freire. Este Colégio era o local procurado para a formação de jovens que pretendiam seguir a vida religiosa, embora nem todos depois o tivessem feito. Não sabemos se Firmino estudou em S. Fiel, mas sim que depois frequentou durante quatro anos o Seminário Menor dos Carvalhos e aí concluiu os “Preparatórios”, onde reforçou a sua vocação e o chamamento de Deus, seguindo então para o Seminário Maior do Porto, onde acabaria os seus estudos. Estes eram os passos clássicos dos jovens – principalmente da nossa região - via ao sacerdócio. * Investigador - Autodidacta - sobre a História de Estarreja e Murtosa

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ANTÓNIO AUGUSTO SILVA

Da passagem pelo Porto vamos encontrá-lo entre 1909 e 1911, com Donaciano e outros Seminaristas, a participar num “Círculo de Estudos” que promovia o debate de temas importantes para a formação de um Padre. A Firmino coube ser o Relator da 8.ª reunião, que abordou “Conferências sobre S.Vicente de Paulo”. Nestas reuniões falou-se, entre outras coisas, de catequese, divórcio, escravatura, celibato, alcoolismo, cooperativismo, acção social do padre, instrução religiosa do povo, beneficência, crédito agrícola, catolicismo e protestantismo. Nesse tempo, a Igreja Católica em Portugal passava por um momento extraordinariamente difícil dada a implantação da República e a perseguição que o novo regime fazia à Igreja, que levou à destituição e desterro do Bispo do Porto, D. António Barroso. Firmino vem a ser ordenado sacerdote a 3 de Novembro de 1912, na casa daquele Bispo, em Remelhe, Barcelos. Nesta mesma casa fora ordenado Donaciano de Abreu Freire a 4 de Agosto do mesmo ano; a vida destes dois estava bem ligada, pois na Missa Nova de Donaciano a 11 de Agosto, Firmino fez o sermão, e depois a situação inverteu-se quando, a 10 de Novembro, é a vez de Donaciano proferir o sermão na Missa Nova de Firmino.Tinha 22 anos, então a idade mínima para a ordenação. O seu primeiro serviço foi de Prefeito no Colégio dos Carvalhos, por onde passara como estudante e aí estará 1 ano. O primeiro registo de Firmino como sacerdote dá-se, curiosamente, em Beduído, no 1 de Janeiro de 1913, na festa ao nome de Jesus – ou da Circuncisão de Jesus -, em que preside à missa solene. Ficará nos Carvalhos até ser indicado Pároco da Freguesia de S. Martinho de Melhundos, Penafiel, de que tomará posse a 15 de Setembro de 1913. Milhundos (como na altura se identificava) teria cerca de 700 habitantes e, como todas estas Paróquias de Além Douro, tinha grandes manifestações de fé e religiosidade de gente simples e crédula. Aqui chegado, logo ganhou o apreço da população e ali ficou pouco mais de 5 anos; neste período acompanhou – e certamente aconselhou – um menino da terra que em 1916 entrou para o Seminário, vindo mais tarde a ser uma das maiores figuras da Igreja Portuguesa do Século XX, o futuro Bispo D. António Ferreira Gomes. Contudo a vida Paroquial também tinha as suas condicionantes e a 9 Fevereiro de 1919, o Padre Firmino despede-se desta terra; quando subiu ao púlpito – e graças a testemunho presencial e registado em livro -, ficamos a saber daqueles momentos de arrasar os nervos, da consternação do povo, de choro, gritos e até desmaios… Ele seria ali, certamente, muito querido. Daqui passa para a Paróquia de Penha Longa (Marco de Canaveses), um pouco maior em área e população que a anterior, mas de que infelizmente nada se sabe.Terá estado aqui 2 anos. Sabemos que, nos seguintes 5 anos, surge como Pregador Missionário Diocesano na região entre Douro e Minho. Do mesmo testemunho presencial ficamos a saber que “o estilo de pregação era grave e sem grande beleza literária e que, num tom monocórdico, pesado, repetitivo, pregava aos novíssimos com grandes ameaças de condenação eterna”. E ainda uma frase que ele repetia continuamente e que impressionava os ouvintes: “Salva a tua alma e não olhes para trás”. [ 18 ]


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O Padre Firmino era muito rigorista; por exemplo, quando se hospedava em casa de Párocos, deitava água na comida, fosse qual fosse o prato que lhe ofereciam; isto por espírito de mortificação, mas que certamente irritava o anfitrião e a cozinheira, que até achariam que isso era desprezar as coisas boas que Deus criou. Não conhecemos o que o levou em Outubro de 1926 a tomar o Hábito da Ordem dos Dominicanos no Convento de St. Maximin, França, onde professou a 11 de Outubro de 1927, e aqui estudou pelo menos mais quatro anos; Aqui passa a ser o Frei Gonçalo Maria Tavares e, deste tempo, tivemos acesso ao seu testamento que ele escreveu a 9/10/1930, em que lega praticamente tudo à Ordem de S. Domingos. Curioso é ver que ele utilizou partes dos envelopes de correspondência que recebia para registar a sua última vontade.

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ANTÓNIO AUGUSTO SILVA

Seria o mesmo “rigorista” quando pregador diocesano? Talvez. Entretanto o que acontecia em Portugal, em Estarreja e na sua família? O irmão Francisco, nascido em 1892, seguira a vida religiosa e cantara Missa Nova a 22 de Outubro de 1916. Os seus irmãos mais novos, António e David, tinham constituído em 1924 uma sociedade comercial – Tavares & Irmão – que viria a ser uma grande referência nesse sector em Estarreja e na região. João, mais velho, também era destacado comerciante. Outras duas irmãs também optaram pela vida religiosa vindo a falecer em Convento de França, lá ficando sepultadas. Frei Gonçalo regressa a Portugal em 1931, por pouco tempo, dado que aqui a Ordem dos Dominicanos passava por processo de reorganização; por isso, e após indicação dos Superiores de Roma, é enviado para o Convento de Padron, na Galiza, onde se dedicará à Pregação e a dar aulas aos Padres daquela comunidade; leccionou Moral, Dogma, Liturgia e Direito Canónico. Estará aqui mais de 10 anos, depois dos quais volta para o Porto, e para a Igreja de Cristo Rei. Deste período Espanhol pouco mais se sabe, para além de muito trabalho e problemas de saúde. Assim entre 1940 ou 1941- ainda vivendo em Padron - vamos encontrar este Estarrejense muito empenhado na sua Terra, intervindo com artigos no “Jornal de Estarreja” e com um tema para o tempo controverso: dividir a Freguesia de Beduído em duas - uma para nascente duma linha próxima do Paço, Quinta Velha, Arrotinha, e outra – a nova – dessa linha para poente. A justificação era de que a população das Póvoas, do Agro e do Outeiro da Marinha poderiam ter a possibilidade de exercer a sua Fé numa nova Igreja, mais próxima da sua residência, transformando a Capela de Santo António da Praça em Igreja e epicentro da nova Paróquia. Esta ideia não era original, pois em Outubro de 1933 já tinha sido aventada por Francisco Marques Rodrigues, de Salreu, mas sem êxito. Os artigos (no seu total 6) foram publicados no “Jornal de Estarreja” entre 18/10/1940 e 19/5/1941 sob o pseudónimo de “Um Estarrejense”. Mas a sua proposta não teve eco na população e ainda menos na Cúria Diocesana, não tendo por isso não teve seguimento. Apesar disso e de estar longe, não desiste da ideia, tendo em Agosto de 1942 escrito a seu irmão António, lembrando-lhe de que é preciso pôr mãos à obra e pedindo-lhe toda a ajuda quanto possa. Frei Gonçalo, a seu pedido, terá regressado a Portugal em 1943 vindo viver na Igreja de Cristo Rei, da Ordem dos Dominicanos O.P., no Porto. Durante algum tempo dedicou-se à pregação, destacando sempre o seu amor à Virgem Santíssima. Mas será nesta fase da sua vida que terá muito mais tempo para o estudo da história da sua Terra Natal, utilizando outro pseudónimo - “Um Amigo de Estarreja” -, passa a enviar artigos para o mesmo Jornal de Estarreja; começa a 25/5/1952 com o tema “Uma Igreja na Vila de Estarreja” que se prolongará até 25/2/1953 (18 artigos). Aqui faz um pouco a história da antiguidade dos lugares da Freguesia, do Rio Antuã e, principalmente, da Capela de Santo António, que considera já obsoleta e não corresponder ao desenvolvimento da Vila e dada a religiosidade do povo ser necessária a construção de novo Templo a construir num local mais central; [ 20 ]


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nestes 9 meses de publicações foi constituída uma Comissão Fundadora da nova Igreja, a que logo aderiram figuras de destaque da sociedade Estarrejense, sendo promovida uma subscrição pública que o próprio Frei Gonçalo iniciou com 100 escudos.

Esta iniciativa terá encontrado alguns obstáculos e críticas. Passam alguns meses sem notícias suas até que, em Março de 1954, nova série de artigos a que chamou “Reparos a um livro” (8 artigos), comenta e critica algumas passagens do livro “Paróquias Rurais Portuguesas” do Padre Miguel de Oliveira que, entretanto, mostrara desacordo com a proposta do nosso Frei; nesta série aproveita ainda para desenvolver a sua interpretação dos topónimos e lugares “Insula” e “Antunane”, que termina em Junho desse ano. Esta discussão histórica não iria ficar por aqui. O Padre Miguel de Oliveira, figura de destaque da Igreja Portuguesa e profundo conhecedor da nossa História Religiosa, não deixou de responder no mesmo Jornal, o que levou Frei Gonçalo a nova série de escritos iniciados em Novembro de 1954 e concluídos em Março de 1957 que intitulou “Análises de uns reparos” e teve 25 artigos. Nas páginas do “Jornal”, então quinzenário, “um amigo de Estarreja” continua a sua grande argumentação sobre S. Tiago, invocando profusa documentação histórico/religiosa e ainda extraordinária informação sobre a História da Igreja em Portugal e Espanha. São textos de enorme interesse, que revelam bem o profundo conhecimento de Frei Gonçalo sobre a matéria. Mas, claro, a sua luta por uma nova Igreja em Estarreja não parou, assim como o confronto com o Padre Miguel de Oliveira. Nesse ano de 1957, entre Abril e Agosto, nova série de 8 artigos, intitulados “Observações a um artigo” e “Resposta ao 3º artigo”. [ 21 ]


ANTÓNIO AUGUSTO SILVA

Deu-se então um interregno de um ano sem mais notícias desta iniciativa, até que, em Novembro de 1958, surge nova série de 20 textos agora com o subtítulo de “A nossa Vila”. Ao longo dos próximos meses, Frei Gonçalo vai apresentar-nos a sua versão da história do nome e lugar Antuã e das origens do lugar e nome de Estarreja. Tudo isto muito bem documentado a partir do ano 569 d.C.. Inclui ainda uma relação sobre o culto na Vila, com a descrição de Oratórios domésticos, Capelas particulares e públicas e, em especial, da Capela de Santo António e da Igreja Matriz. Textos de grande valor histórico e que serviam para justificar a edificação de uma nova Igreja em Estarreja. De referir que num desses artigos ele faz referência a uma reunião do grupo ou comissão promotora de tal iniciativa de 18/11/1958, em que o Sr. António Marques Tavares informou que os empregados da firma “A Mercantil de Estarreja” já tinham angariado através de cotas semanais ou mensais a quantia de 8.332$50 para ajudar. Quem era este António? O Irmão de Frei Gonçalo, antes referido, e proprietário da maior firma comercial de Estarreja, que acompanhava a iniciativa desde o primeiro dia. Nessa reunião, o Reitor de Beduído, Padre António Belém, esteve presente mas não usou da palavra. Percebe-se porquê… Em quase todos os trabalhos enviados para o “Jornal de Estarreja”, terminava com uma quadra, ou frase, para estimular a adesão dos leitores à sua luta.

Claro que o projecto não avançava como o seu promotor queria, mas certamente obstinado, não largava a luta, ainda por cima tendo por contendor, além da indiferença da população, a controvérsia com o Padre Miguel de Oliveira. Frei Gonçalo não desarma e, em Fevereiro de 1961, apresenta novo conjunto de documentos, agora denominados “Antoã ou Antuã”, também eles merecedores de leitura, e que terminaram em 10 de Novembro de 1962; ao todo seriam quinze artigos, mas por qualquer problema de edição do periódico não identificado não foram publicados quatro, os numerados entre 9 e 12. Assim, e graças à sua dedicação a uma causa que acabou por perder, ao longo de dez anos e quase 100 artigos, Frei Gonçalo deixou-nos um outro testamento nada comparável ao que escrevera em St. Maximin, mas que muito enriqueceu a nossa Terra. [ 22 ]


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Legou a todos os que se interessam pela História de Estarreja um extraordinário conjunto de textos que podem servir de ajuda bibliográfica para outros estudos. Podendo estar ou não de acordo com muitas das teses que ele defendia, devemos aproveitar os poucos documentos deste género que temos à disposição para reflectir e depois formar melhor opinião. Perante a quantidade e qualidade de escritos e informação neles apresentados, seria lógico pensar que na Ordem dos Dominicanos existiria o espólio do Frei Gonçalo porque, claro, para escrever o que escreveu sempre com base em documentos por ele analisados, deveria ter acesso a vasta biblioteca e, porventura, a algum arquivo próprio. Após contactos feitos há anos, confirma-se que infelizmente nada lá existe; resta assim o que foi publicado no “Jornal de Estarreja”. O seu falecimento ocorreu no Porto, na Igreja do Cristo Rei onde vivia, a 7 de Maio de 1963; por vontade expressa foi enterrado no jazigo da família em Beduído. A Câmara Municipal de Estarreja, por deliberação de 13 Julho de 1992, atribui-lhe o nome de Rua, na zona da Quinta Velha, local não muito distante da Igreja Matriz e do lugar da Areosa do Norte onde cresceu.

Fontes bibliográficas: - Acervo da família - Registos Paroquiais de Beduído, A.D.A. - Cónego Filipe de Figueiredo – in: Vida e obra do Padre Donaciano de Abreu Freire - Paróquia de Melhundos - Paróquia de Penha Longa - Cónego António dos Santos – in: A memória dos tempos - Ordem do Dominicanos, O.P. - O Concelho de Estarreja - O Jornal de Estarreja

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O CASTRO DE SALREU, UM DOS POVOADOS PROTO-HISTÓRICOS ATLÂNTICOS DO ENTRE DOURO E VOUGA António Manuel S. P. Silva * Edite Martins de Sá ** Jorge Fernando Salvador *** Paulo A. P. Lemos **** Sara Almeida e Silva *****

Objeto de sondagens arqueológicas pela primeira vez em 2011, o castro de Salreu recebeu em 2019 a quinta campanha de escavações, agora no quadro de um novo projeto de investigação aprovado pela Direção Geral do Património Cultural, o projeto ARQEDOV, intitulado Arqueologia da Idade do Ferro no Entre Douro e Vouga Atlântico e desenhado para o período entre 2019 e 2022 (Silva et al., 2019). Não sendo possível ter disponíveis, à data da preparação dos textos para esta publicação, a informação gráfica, o estudo de materiais ou a cabal interpretação dos resultados da escavação, que se concluiu há poucas semanas, optámos por sintetizar as bases do novo projeto de investigação ARQ-EDOV, que potencia o castro de Salreu à luz de um novo enquadramento geocultural, o da sua feição litorânea. Não deixaremos porém, em breve nota, de apresentar sumariamente os trabalhos efetuados neste povoado em 2019, deixando para momento posterior a sua divulgação mais completa. Um sítio entre muitos no 1º milénio antes de Cristo Entre as perto de quatro dezenas de povoados proto-históricos identificados na faixa mais litoral do Entre Douro e Vouga (Silva, 1994; 2005; Silva, 1986; Silva; Pereira, 2010)1 é ainda escasso o número daqueles que tiveram escavações arqueológicas cientificamente conduzidas e cujos resultados se encontrem publicados de forma monográfica ou relativamente substancial. Dos sítios ocupados nos finais da Idade do Bronze avultam em especial os resultados das escavações em São Julião da Branca, Albergaria-a-Velha (Silva; Pereira da Silva, 1995; 2014; Silva et al., 2015; 2016; 2017c; 2019) e, numa área mais interior, os dados da Cividade, * Arqueólogo. Centro de Arqueologia de Arouca. Investigador do CITCEM (UP). Coordenador do Projeto ARQ-EDOV. amspsilva@hotmail.com. ** Arqueóloga. Centro de Arqueologia de Arouca. Projeto ARQ-EDOV. editesa@gmail.com. *** Arqueólogo. Câmara Municipal de Espinho. Projeto ARQ-EDOV. jfmdsal@gmail.com. **** Arqueólogo. Centro de Arqueologia de Arouca. Projeto ARQ-EDOV. paplemos@gmail.com. ***** Arqueóloga. Centro de Arqueologia de Arouca. Projeto ARQ-EDOV. saralmeidasilva@gmail.com. 1 - Para aligeirar o texto, optámos por não incluir as páginas nas referências bibliográficas.

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Arouca (Silva; Leite, 2010) e do Senhor dos Aflitos, igualmente em Arouca mas já na bacia do Paiva (Silva; Lemos, 2018), sendo aliás dos primeiros dois sítios as únicas datações absolutas disponíveis: 490-388 BC2 para a Cividade (marcando uma fase intermédia da ocupação do sítio) e 976-826 BC e 1002-842 BC para São Julião. Também o castro de Monte Calvo/ Cesar, em Oliveira de Azeméis foi objeto de sondagens que confirmaram uma ocupação desta época, mas os dados publicados são ainda limitados (Tavares; De Man, 2018). A presença de cerâmicas desta cronologia noutros sítios de altura é por enquanto pouco expressiva e não tem relação com quaisquer estruturas, como sucede nos castros de Valinhas, Arouca (Silva, 1995; Silva; Ribeiro, 1999; Silva, 2004; 2005), Ul, Oliveira de Azeméis (Marques, 1989; Almeida e Silva, 2013), Outeiro do Murado, Santa Maria da Feira (Silva, 1994; Pereira, 2010), Castelo da Feira (Teixeira, 2017), Castelo de Gaia (Silva, 1984; Carvalho; Fortuna, 2000; Carvalho, 2003; Silva, 2017; 2018) e outros, sendo também ainda imprecisa a relação destes sítios com ocupações de planícies aluviais ligadas a contextos de fossos e valados, como sucede na Agra do Crasto,Aveiro (Pereira, 2005; Pereira da Silva, 2005; 2007)3 ou a ocupações costeiras em espaços aparentemente abertos (Silva; Pereira, 2010) ou, noutra linha, com as sepulturas em tumuli de tradição megalítica (Pereira da Silva, 1994; 1997; Sá, 2014), com as deposições metálicas como os achados do Perrinho, Vale de Cambra (Brandão 1963; Queiroga, 2001; Coffyn, 1983; 1985, Silva, 1986;Vilaça 2007), os de Urrô e Covelo de Paivô, Arouca (Brandão, 1962; Silva, 1986), o do torques de Vale da Malhada, Sever do Vouga (Fortes 1907; Monteagudo 1977; Silva, 1986: 236) ou o tesouro de braceletes em ouro das Baralhas, Oliveira de Azeméis (Vasconcelos 1896; Silva, 1986) e ainda com as expressões de arte rupestre presentes nas áreas mais interiores da região, designadamente os importantes núcleos de Arouca,Vale de Cambra e Sever do Vouga, de acordo com recente revisão de conjunto (Silva et al., 2018). O período de transição para a Idade do Ferro, genericamente compreendido entre os séculos VII e V a.C. (Bettencourt, 2001; 2005) encontra-se nesta região, aliás como na generalidade da área da «cultura castreja» do Noroeste, mal documentado, quer do ponto de vista de espólios e estruturas arqueológicas, quer de datações absolutas, podendo talvez ser o sítio da Cividade, em Arouca, um dos que maior potencial terá para essa averiguação, se bem que prejudicada pelo desconhecimento de quaisquer estruturas para além das de delimitação do povoado (Silva; Leite, 2010). Por fim, parece ser numa fase já de plena Idade do Ferro, pelos finais do século V ou já no séc. IV a.C. que a maior parte dos castros poderá ter tido o seu início, neste quadro se inserindo os de Salreu e de Ovil, como também os de Romariz, Santa Maria da Feira (Silva, 1986; Centeno, 2011), Baiza (Sá; Paiva, 1994), Sandim (Silva, 1994) ou Crestuma (Silva; Guimarães, 2013; Silva; Sousa; Pinto, 2018), em Vila Nova de Gaia e muitos outros (Silva, 2 - BC = Before Christ, abreviatura convencional utilizada para as datações radiocarbónicas calibradas. 3 - Neste sítio arqueológico realizaram-se mais recentemente trabalhos arqueológicos extensivos, sob direção de Lídia Baptista (Arqueologia & Património/Empatia Arqueologia), que confirmaram a ocupação do local na Idade do Bronze, não se encontrando ainda disponível o respetivo relatório final.

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1994; 2005). Na verdade, a maior parte das estruturas habitacionais ou defensivas postas a descoberto pelas escavações em muitos castros, nomeadamente os de maiores dimensões ou aparentemente maior expressão regional, como o Castelo de Gaia, o Monte Murado (Silva, 1984; 1986), em Gaia, o castro de Ul (Oliveira de Azeméis), Cabeço do Vouga, Águeda (Silva, 1994; Pereira da Silva, 2008; s.d.) ou Valinhas datam certamente desde o século II a.C. em diante e traduzem uma fase avançada, arquetípica, da designada «cultura castreja». Nesta linha, este novo projeto de investigação pretende potenciar, de forma articulada, os resultados dos trabalhos arqueológicos desenvolvidos no castro de Ovil (Salvador; Silva, 2005b; 2010) – a par de Romariz o povoado proto-histórico com maior área escavada no Entre Douro eVouga – e no castro de Salreu (Silva et al., 2012; 2016a; 2016b; 2017a; 2017b; Almeida e Silva et al., 2018), dois sítios com fortes analogias estruturais e cronológicas e que representam na região o modelo de povoados indígenas que foram abandonados nos começos da romanização, situação que se pretende precisamente confrontar com os dados que venham a obter-se para os pequenos castros de Santiais, Estarreja (Silva; Pereira, 2011) e Madalena, em Vila Nova de Gaia (Silva, 1994; Silva; Pereira, 2010).

Fig. 1 – Localização dos quatro castros incluídos no projeto ARQ-EDOV, entre os povoados proto-históricos do Entre Douro e Vouga. 1 – Castro da Madalena (V. N. Gaia); 2 – Castro de Ovil (Espinho); 3 – Castro de Santiais (Estarreja); 4 – Castro de Salreu (Estarreja). (Cartograma: G. R. Pereira)

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O contexto atlântico A região litoral do Entre Douro e Vouga constitui uma área de orografia de baixa e média altitude na qual se sucedem, a partir da linha costeira, a orla mesocenozóica composta essencialmente por formações sedimentares plio-plistocénicas (que se alarga particularmente a sul de Espinho), logo seguida, já às cotas de 120-140 metros, por terrenos de litologia granítica alternante e por vezes metamorfizada com a grande mancha do tradicionalmente designado como complexo xisto-grauváquico. Esta acentuada orografia regional, traduzida por uma acentuada gradação de patamares altimétricos que vão desde a planície aluvial do litoral atlântico até aos níveis montanos de 1100 metros s. n. m., numa curta distância que em pouco ultrapassa os 40 km mediados entre o Maciço da Gralheira (serras do Arestal, Freita e Arada) e a linha costeira, reflete-se igualmente nas formas de apropriação histórica do território, produzindo duas distintas formas de paisagem: a da faixa litoral, que se alarga extraordinariamente para sul da latitude de Espinho pelos terrenos aluviais das bacias do Antuã e do Vouga, refletindo a geomorfologia e a evolução da linha da costa (aspeto essencial no projeto, como iremos sublinhar); e em contraste, a da região mais a norte (concelhos de Oliveira de Azeméis, Santa Maria da Feira e Vila Nova de Gaia), caracterizada por uma paisagem «minhota» de terrenos graníticos e xistentos rasgada pelos vales dos afluentes do Douro (Uíma, Arda, etc.) ou do Vouga (o Ul, o Antuã, etc.) e pontuada por colinas de altitude até aos 300-400 metros. Mais a sul, na bacia aluvionar do Vouga, a faixa litoral ascende com uma orografia menos expressiva até aos contrafortes do Caramulo, sendo o maciço da Gralheira o relevo que delimita pelo oriente a região4. Neste âmbito geográfico, o contexto mais estritamente atlântico é aquele marcado no projeto pela localização dos castros da Madalena e de Ovil, a um par de quilómetros da atual linha de costa e enquadrados por pequenas linhas de água que escapando às duas grandes bacias da zona, correm diretos ao mar, as ribeiras da Madalena e de Rio Maior5. Mais a sul, onde as variações da linha costeira foram mais assinaláveis, sublinhámos já (Silva; Pereira, 2010; Silva et al., 2012) o quanto o castro de Salreu (e similarmente, talvez em menor medida, também o de Santiais) eram verdadeiros povoados costeiros há dois mil e quinhentos anos, altura em que o estuário do Antuã era bem mais amplo e recuado que o presentemente sugerido por qualquer mapa genérico (Fig. 1).

4 - V. Silva, 1994 e Silva; Pereira, 2010 para referências bibliográficas. 5 - O único exemplo português de um povoado castrejo verdadeiramente marítimo e batido mesmo pelas ondas é o do castro de São Paio, em Vila do Conde (Dinis, 1993; Barciela; Rey; Silva, 2005); todavia povoados com esta localização são comuns nas mais recortadas costas galegas.

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Objetivos e metodologia do projeto ARQ-EDOV Todavia, a eleição dos povoados sobre os quais incide o projeto não obedeceu apenas à sua similar localização. Nesta sub-região do «Ferro Atlântico», Salreu, Ovil e Madalena estão também aparentados por um idêntico enquadramento locacional (colinas de baixa altitude localizadas em meandros de linhas de água), estruturas de delimitação análogas (a presença de fossos, que só em Ovil não estão articulados com estruturas murárias ou em talude) e, pelo menos no que se refere a Salreu e Ovil, um intervalo de ocupação mais ou menos paralelo, mediando entre os séculos IV-III a.C. e o período augustano. Terão estas similitudes qualquer tradução cultural assinalável no quadro da proto-história regional? Terá a implantação relativamente costeira destas aldeias favorecido uma maior abertura a contactos comerciais que utilizassem o mar como via privilegiada? Estas, entre muitas questões, estarão na agenda e serão regularmente relançadas no âmbito deste programa de pesquisa.

Fig. 2 – Castro de Salreu. Sector K. Vista da muralha em secção, durante os trabalhos de 2019. Foto: CAA.

Desta forma, além de uma melhor compreensão da organização interna e modelos arquitetónicos da mancha construída dos povoados (para o que importarão essencialmente os trabalhos em Ovil), e dos sistemas defensivos e de delimitação física desses castros – situados numa franja meridional muitas vezes considerada periférica e porventura menos «típica» da designada «cultura castreja» - o projeto ARQ-EDOV visará três objetivos particulares, essenciais na estruturação do projeto e da equipa envolvida: (1) fixar de modo mais preciso o intervalo de ocupação destes castros, nomeadamente com recursos a datações absolutas pelo método do carbono 14; (2) analisar e comparar as cerâmicas de uso doméstico, quer do ponto de vista do elenco formal e decorativo, quer sobretudo procurando analogias técnicas e os

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locais de proveniência das argilas (recorrendo à análise da composição química das pastas, por microscopia eletrónica de varrimento ou fluorescência de raios X, ou análise petrográfica); e ainda (3) recolher informação sobre a cobertura vegetal e as espécies cultivadas na área dos povoados, designadamente através de estudos de carpologia e antracologia. Para atingir estes objetivos o projeto disporá dos materiais arqueológicos e amostras de sedimentos dos sítios a intervencionar através de ações de escavação arqueológica, dos resultados de prospeção nos mesmos sítios e áreas envolventes (por exemplo, para a localização de depósitos de argilas porventura utilizadas para a manufatura cerâmica), da pesquisa bibliográfica e cartográfica e dos trabalhos de análise arqueométrica e paleoambiental. Paralelamente, como aspeto metodológico que deverá potenciar a consecução dos objetivos, o ARQ-EDOV tentará rentabilizar o mais possível a colaboração dos consultores científicos6 e assume-se como um projeto em rede, sempre aberto ao diálogo e à troca de experiências e conhecimento com outros projetos e investigadores7. Numa outra dimensão, tida também como fundamental e estruturante, o ARQ-EDOV entende-se como um projeto de arqueologia social, comprometido no envolvimento das comunidades locais e numa efetiva «social accountability». Esta preocupação, matricial tanto quanto o financiamento do ARQ-EDOV será essencialmente público8, potencia também as redes de informação e de aquisição de memórias e conhecimento sobre os territórios envolvidos na sua dimensão geohistórica, o que se reflete no envolvimento de três municípios, quatro juntas de freguesia9 e uma associação local10, a publicação dos resultados em revistas municipais, uma significativa animação através das redes sociais e, naturalmente, por uma importante presença de voluntários locais nos trabalhos de campo. Quatro sítios «em diálogo» Certamente mais, mas quatro povoados proto-históricos constituem a «matériaprima» principal deste programa de pesquisa: os castros de Salreu e Santiais (Estarreja), Ovil (Espinho) e Madalena (Vila Nova de Gaia), naturalmente com diferentes ritmos e intensidade, considerando o estado dos sítios arqueológicos e os meios reunidos.

6 - Os doutores Teresa Soeiro e Rui Morais (Universidade do Porto), o doutor João Tereso (CIBIO-UP), o geólogo Manuel Abrunhosa (UP) e Cláudia Manuel, mestre em SIG, a que se junta a colaboração, nesta e outras áreas, dos mestres António Coelho da Rocha e Gabriel da Rocha Pereira. 7 - Como é o caso do projeto POVOAZ_2, em curso no concelho de Oliveira de Azeméis sob coordenação de Adriaan de Man e João Tiago Tavares (C. M. Oliveira de Azeméis). 8 - Ainda que não se exclua a possibilidade de captação de outros apoios, o financiamento dos trabalhos assenta nos Municípios envolvidos: Espinho, Estarreja e Vila Nova de Gaia, estimando-se o seu valor em cerca de 79.000€ para os quatro anos do projeto. 9 - As respeitantes aos povoados envolvidos: Madalena (V. N. Gaia), Paramos (Espinho), Salreu e União de Freguesias de Beduído e Veiros (Estarreja). 10 - A Confraria Queirosiana – Associação de Amigos do Solar Condes de Resende (V. N. Gaia), através do seu Gabinete de História, Arqueologia e Património; e, naturalmente, o Centro de Arqueologia de Arouca, associação de defesa do património cultural sediada em Arouca mas de âmbito regional e que é a entidade promotora do projeto.

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O Castro de Salreu Localizado num pequeno esporão aplanado em raqueta sobre um meandro do rio Antuã, com escarpas declivosas por todos os sectores à exceção do voltado a nascente, este povoado tem uma implantação bastante canónica entre os pequenos castros de vale do Norte de Portugal. Distribui-se topograficamente em três plataformas delimitadas por outros tantos taludes, correspondendo a uma área de ocupação de cerca de dois hectares. Dos trabalhos arqueológicos realizados até 2019, resultou a escavação de uma superfície que ronda os 236 m2, com produção de significativa bibliografia já citada. Na plataforma superior, as sondagens evidenciaram profunda destruição dos depósitos, decorrente da florestação e da erosão ligada à escassa possança estratigráfica. Não obstante a ausência de estruturas preservadas, o espólio cerâmico recolhido comprovou plenamente a ocupação desta “acrópole” na Idade do Ferro.

Fig. 3 – Castro de Salreu. Sector K. Os trabalhos de 2019 permitiram definir o paramento exterior da muralha. Foto: CAA.

Na segunda plataforma, sobre o talude (sector A) as escavações permitiram a identificação de estruturas antigas, constituídas por restos de alinhamentos pétreos correspondentes a pelo menos duas fases distintas de construção, que deverão ter servido como muretes de delimitação e contenção da própria plataforma. No interior destas estruturas detetou[ 30 ]


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se uma estrutura de caráter doméstico, representada pelo alinhamento de construção de planta subcircular, com entrada visível a poente assinalada pelos encaixes de dois umbrais de porta em madeira; possuía internamente restos de dois pisos em argila, dos quais o superior se encontrava decorado com pequenos círculos impressos. Entre outros resultados merece nota a escavação em curso no designado sector K, na parte Oeste do povoado, onde foi localizado um tramo da muralha ou estrutura de delimitação do povoado, composta por um muro feito em xisto com cerca de quatro metros de espessura (Fig. 2). Em escavação desde 2017, esta construção apresenta-se bastante desmantelada superiormente, em resultado da florestação, sendo difícil, nomeadamente, determinar a sua delimitação externa e pelo interior. A campanha de escavações do ano de 201911 dirigiu-se exclusivamente a esta estrutura, tendo como meta iluminar melhor o seu processo construtivo e, simultaneamente, alargar as sondagens para a plataforma imediatamente a nordeste, aparentemente com potencial para a identificação de outras estruturas, em particular relacionadas com alguns vestígios de prática da metalurgia que haviam sido identificados em campanhas prévias. Como resultado de muito interesse deve destacar-se, finalmente, a observação do processo de delimitação da estrutura de xisto e terra na sua face exterior, constituído por um conjunto de lajes, de dimensões sensivelmente maiores, implantadas verticalmente no solo (Fig. 3). Em contrapartida, na parte interna da construção não foi possível ainda confirmar a presença de outras estruturas ou vestígios delas, se bem que a escavação não tenha sido concluída neste ponto.

Fig. 4 – Castro de Salreu. Placa em xisto com motivos gravados. Foto: CAA.

11 - Realizada no mês de julho, durante três semanas, contou com cerca de duas dezenas de participantes, incluindo jovens voluntários, na sua maioria estudantes de arqueologia, de Portugal, Espanha e Brasil. Como habitualmente, a campanha teve o apoio financeiro e logístico da Câmara Municipal de Estarreja e da Junta de Freguesia de Salreu, autarquias a quem naturalmente cumpre registar uma nota de gratidão e reconhecimento por este investimento em prol do conhecimento das origens da ocupação humana na região.

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Mais uma vez a campanha proporcionou a recolha de abundante e interessante espólio, representado essencialmente por cerâmica, objetos em pedra, alguns restos metálicos e mais algumas contas de colar em pasta vítrea, maioritariamente de cor azul, que começam a ser um dos elementos quantitativamente em destaque neste povoado. Estando estes materiais ainda em processo de tratamento, não é possível adiantar informações mais detalhadas, podendo todavia assinalar-se a presença de uma significativa proporção de cerâmica decorada, revelando padrões ornamentais inéditos neste sítio (Almeida e Silva; Silva, no prelo). Outro achado que merece nota mesmo que de passagem, pela sua raridade em contextos desta época e região, é o de uma pequena laje em xisto, fragmentada, muito fina e com c. de 30 por 17 cm de dimensões, que exibe algumas gravuras numa das faces, identificando-se entre outros motivos de gravação mais fina e ténue, a representação de um signo ramiforme, aparentemente enquadrado numa figura subtriangular (Fig. 4). Não sendo oportuno avançar por agora outras considerações – tanto mais que a peça está ainda em processo de conservação e levantamento cuidadoso dos motivos incisos – deve todavia assinalar-se a singularidade desta ocorrência, com paralelos óbvios mais evidentes no conjunto de mais de um milhar de peças gravadas, igualmente em xisto, procedentes do povoado da Idade do Ferro do Castelinho, em Cilhades, Torre de Moncorvo, sítio escavado no âmbito do plano de minimização de impactes da construção da barragem do Sabor (Santos et. al., 2012; 2016; Neves; Figueiredo, 2015). Dispomos já de três datações radiométricas para o castro de Salreu. No sector A, onde foi localizada a estrutura habitacional, as amostras proporcionaram, após calibração os intervalos de 196 – 39 BC e 358 – 278 BC; no sector K, algumas sementes de cevada permitiram o cálculo dos anos 236 – 111 BC, datações que requerem ainda estudo e confronto com novos ensaios, não podendo ser discutidas em profundidade neste texto. Os trabalhos previstos pelo ARQ-EDOV para o castro de Salreu até ao ano de 2022 incluem, numa primeira fase, a conclusão e alargamento deste tramo da estrutura de delimitação do povoado e a escavação da plataforma superior que lhe é imediatamente adjacente, reservandose para fase posterior, em função dos resultados entretanto obtidos, a eventual realização de outras sondagens para melhorar o conhecimento sobre a área habitacional do povoado. O Castro de Ovil Situado a 2.400 metros do mar, o castro assenta numa pequena colina de 53 metros de cota máxima que integra o primeiro cordão orográfico que se sucede à planície litoral, encaixado sobre o meandro da ribeira de Rio Maior.Trata-se de um pequeno povoado, com uma área de ocupação a rondar os 1,2 ha. (Fig. 5). A ribeira de Rio Maior, que contorna as vertentes sul e oeste do castro de Ovil, é um elemento preponderante na estruturação defensiva do povoado, uma vez que através do [ 32 ]


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leito cavado pela ribeira (de nível hidrostático mais elevado atualmente pela construção de um açude) e dos afloramentos rochosos, representa o limite do recinto naqueles pontos cardiais. A norte e a este do povoado, o menor declive do terreno obrigou à construção de um sistema defensivo constituído por um profundo fosso, com cerca de quinze metros de desnível e uma largura que ronda os oito metros, e que ocorre duplicado em parte da sua extensão (Fig. 6). Este sistema defensivo não parece ter sido complementado por qualquer estrutura de delimitação em pedra ou terra, sendo a este propósito um caso aparentemente singular na região do Entre Douro e Vouga litoral, já que a generalidade dos povoados coevos associa os fossos a linhas de muralha, como sucede nos castros de Sandim e Monte Murado (V. N. Gaia), Ossela (Oliveira de Azeméis) e tantos outros (Silva, 1994; 2005; Silva; Pereira, 2010; no prelo). Os trabalhos arqueológicos, desenvolvidos de forma intermitente entre 1981 e 2005 (Ferreira; Silva, 1984; 1985; Salvador; Silva, 2000, 2004, 2005a; 2005b; 2010; Silva; Salvador, 2008), incidiram em diversos sectores do povoado, revelando numerosas estruturas de planta circular, muitas dotadas do característico vestíbulo em forma de caranguejo, e vieram a revelar que as origens do povoamento do Castro de Ovil remontam ao final do século IV ou ao início do século III a.C., considerando os materiais recolhidos e uma datação por radiocarbono (Salvador; Silva, 2010).

Fig. 5 – Castro de Ovil. Vista geral do povoado (em primeiro plano, as ruínas da fábrica de papel oitocentista). Foto: CME

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Desta forma, a escavação do castro de Ovil – presentemente, aliás, objeto de um processo de requalificação e preparação para visitas por parte do Município, prevendose até a construção de um centro interpretativo no local – será relativamente pontual, buscando essencialmente a identificação de depósitos bem controlados para efetuar mais datações por carbono 14 e estudos de caráter paleoambiental, se bem que se pretenda igualmente melhorar a compreensão de alguns núcleos habitacionais.

Fig. 6 – Castro de Ovil. Uma imagem recente do fosso defensivo, no sector norte. Foto: JS/CME.

O Castro de Santiais Apenas a cerca de 1,2 quilómetros para NNE. do castro de Salreu e um pouco mais afastado das margens do Antuã existiu um outro pequeno povoado proto-histórico, que vem sendo designado como «Castro de Santiais», na linha das referências de Lopes Pereira (1946) e A. Nogueira Gonçalves (1981), se bem que o pequeno outeiro do Crasto, lugarejo de poucas dezenas de casas que conserva a memória toponímica do sítio arqueológico, não se encontre já localmente associado ao lugar de Santiais mas mais ao de Santo Amaro, de que dista poucas centenas de metros. Efetivamente, foi na capela de Santo Amaro, um templo setecentista com origens anteriores, que escavações arqueológicas realizadas em 2004 identificaram entre a terra que preenchia as sepulturas modernas do interior do templo, fragmentos de cerâmicas romanas e proto-históricas, tendo os responsáveis pelas escavações proposto que tais materiais não proviriam de qualquer ocupação antiga do local (se bem que a elevação onde se acha a capela apresenta também condições topográficas para um pequeno «castro agrícola»), mas teriam vindo das proximidades com a terra usada para o preenchimento das sepulturas, sugerindo [ 34 ]


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mesmo o próximo lugar do Crasto – onde entretanto reconheceram também a existência de tegula romana12 – para a sua origem (Almeida; Almeida, 2007; Almeida; Silva, 2010). Nesta linha, como entretanto algumas ações de prospeção se revelaram pouco conclusivas, um primeiro objetivo do presente projeto será precisamente o de determinar com precisão a localização do povoado, devendo depois procurar-se realizar um pequeno corte estratigráfico para verificação de estratigrafias preservadas, materiais arqueológicos e recolha de sedimentos para obtenção de amostras orgânicas para datação. O Castro da Madalena O castro da Madalena, por vezes erroneamente designado como de Valadares, freguesia com que confina, situa-se num pequeno cabeço de baixa altitude (59 m), o «Coteiro do Crasto», mas bastante destacado na paisagem (Fig. 7), encravado num meandro da ribeira da Madalena e a apenas 1,9 quilómetros do Oceano (Correia, 1924;Veloso, 1963; Guimarães, 1993; Silva, 1994; Queiroz, 1997; Silva; Pereira, 2010). Três taludes que circuitam o monte devem corresponder a outras tantas ordens de muralhas, eventualmente complementadas por um fosso, de que parecem ver-se indícios a sul (Silva, 1994). A extração de pedra destruiu amplas áreas no topo superior e nas encostas voltadas a Poente, o que não obsta a que possam ainda recolher-se materiais arqueológicos à superfície, nomeadamente cerâmica indígena da Idade do Ferro e fragmentos de tegula.

Fig. 7 – Castro da Madalena. Foto aérea do Google Earth, destacando-se o relevo da colina onde se situa o povoado. 12 - Informação pessoal de Carlos A. Brochado de Almeida, que agradecemos.

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Em 2000 foram feitas sondagens arqueológicas no sopé, em terrenos a sudeste destinados a construção, não tendo sido detetadas quaisquer estruturas, mas apenas materiais cerâmicos esparsos (Pereira, 2000).Também nas proximidades (Rua do Formigueiro, lugar de Penouço) foram mais recentemente feitos trabalhos arqueológicos de salvaguarda para a implementação de um projeto imobiliário que revelaram um sítio com estruturas negativas (fossas, buracos de poste e valados) com uma cronologia aparentemente compreendida entre a Pré-história recente e o Bronze Final (Gomes, 2007; Baptista; Oliveira, 2008; Pinheiro, 2016). O objetivo do projeto para este castro atlântico passa essencialmente por realizar alguns cortes estratigráficos que permitam aferir a conservação dos depósitos arqueológicos e recolher quer materiais, quer sedimentos que permitam também a execução de datações e eventuais estudos paleoambientais. Conclusão Quando não é de emergência ou preventiva em resultado de operações urbanísticas, rodoviárias ou por outras formas invasivas do subsolo ou meio líquido em grande escala; quando não visa a conservação e valorização de sítios já escavados e estudados, a atividade arqueológica tem, de acordo com o seu enquadramento legal, que organizar-se em projetos de investigação, planos de intervenção normalmente plurianuais, programados e com a necessária previsão de metas, metodologias, meios e sistema de comunicação. O castro de Salreu vinha já sendo estudado, desde 2011, ao abrigo de outros projetos, de similar enquadramento legal, e que produziram um importante e inédito manancial de informação sobre a ocupação de Estarreja e dos municípios envolventes nos séculos que precederam a ocupação romana na região. Não se trata de um registo meramente erudito ou académico. A missão da história e da arqueologia é «fabricar» passado, ou seja, iluminar e enriquecer a nossa visão sobre as gerações que desde há muitos milénios pisaram sensivelmente o mesmo chão que pisamos; mas essa construção (sempre interpretação) dos tempos antigos só se converte em conhecimento e cultura se, após a necessária discussão e validação científica, as comunidades verdadeiramente a incorporarem na sua própria história e leitura do mundo. Como? Através dos museus e da exposição de uma parte desses restos que nos chegaram de antanho; através da apropriação sensorial de uma visita e contacto físico com ruínas ou objetos; através da palestra ou da atividade escolar; por publicações de divulgação destinadas a públicos alargados, do que a Terras de Antuã é excelente exemplo e modelo certamente a seguir por outras autarquias, por vezes mais interessadas na festa do efémero ou no direto televisivo do que em fazer memória e transformá-la num arquivo dinâmico, interpelante, agente de melhor cidadania e qualidade de vida.

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TERRAS DE ANTUÃ | HISTÓRIAS E MEMÓRIAS DO CONCELHO DE ESTARREJA

AS CASAS DO MATO (SALREU) E DE FONTE CHÃ (BEMPOSTA) NOS OFÍCIOS CONCELHIOS ANTUANOS SUBSÍDIOS PARA A HISTÓRIA DOS REGISTOS E NOTARIADO NO CONCELHO DE ESTARREJA • 2ª PARTE - DE D. FILIPE II A D. JOÃO   António Pedro de Sottomayor*

Virado o século, o segundo dos Habsburgo a cingir a coroa portuguesa, ratificou e fez publicar, em 1603, a nova cartilha legislativa do reino, actualização da anterior, manuelina. A compilação fizera-se ainda em vida e por ordem do pai que a sancionou em 1595, sem, contudo, lhe dar a visibilidade necessária para se aplicar. Opinam os entendidos que por se basear e estruturar no de 1512-13, ao novo código faltava originalidade e clareza, nele abundando, por outro lado, contradições e preceitos entretanto caídos em desuso. Um bom exemplo do que se afirma, transcreve-se no encerrar do registo de um alvará do próprio Filipe II, treze anos adiante, autorizando JERÓNIMO DA CUNHA, não só a renunciar aos ofícios que detinha em Antuã, como também a dividi-los por dois dos filhos. Ao pé de letra, dessa forma pretendia o rei estender a sua vontade além do tempo legislado. Chamado à sua redacção, o escrivão da chancelaria, Álvaro Correia, não iludiu o óbice, posto que o efeito do mesmo tivesse “de durar mais de um ano sem embargo da ordenação em contrário”. Inalterado na origem, o padrão repetiu-se à saciedade, reinado após reinado, bastas vezes concretizando a norma desrespeitada: “livro segundo título 40” das chamadas “Ordenações Filipinas”. No âmbito deste ensaio, ainda assim acontecia em 1737, no tempo de D. João V1! Ordenava-se ali “Que as coisas, cujo efeito há-de durar mais de um ano, passem por Cartas, e não por Alvarás”! Como se disse, foi efectivamente por meio de um alvará régio, com data de 3 de Novembro de 16162, que pela primeira vez no concelho de Antuã se criou uma escrivania dos órfãos independente da alçada do tabelião do público, judicial e notas, escrivão da câmara e almotaçaria que, como se sabe, era então Jerónimo da Cunha. A vastidão do concelho e o muito trabalho exigido, levara já a que, três anos antes, o oficial pedisse ao soberano, licença para empregar um escrevente. Segundo ele, era mesmo essencial para “a melhor expedição dos negócios e servir melhor os ditos ofícios e para melhor aviamento das partes”. A tal anuira o rei por carta de 29 de Maio de 16133, não deixando de

* Licenciado em Design. Desenvolve a sua actividade profissional na área da arquitectura. Autor de vários ensaios no âmbito da genealogia e história da Família 1 - Ordenações Filipinas, Livro II, Título XL. 2 - Vd. (DOC. 15). 3 - ANTT/CHR/Chancelaria de D. Filipe II, Livro 3, fl. 250 vrs: Jerónimo da Cunha – Carta de ajudante no ofício.

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ressalvar “que não poderá nenhum escrivão ter mais de dois escreventes”, consoante o parágrafo 22 da lei que fizera publicar no 29 de Janeiro anterior4. Obrigados a viver nas cercanias do oficial a que serviam, não é de estranhar que familiares próximos daquele ocupassem o lugar, nomeadamente os irmãos ou filhos letrados, desse modo treinados para a sucessão. Entrevê-se nessa posição, no primeiro caso o já mencionado bacharel Afonso da Cunha, e no segundo os jovens António e Diogo da Cunha (de Azevedo) a quem se voltará. Nascido na segunda metade da década de cinquenta do século XVI, no verão de 1615 – quase ou já sexagenário – Jerónimo da Cunha descrevia-se como “velho e doente”, incapaz de continuar a servir os seus múltiplos cargos. Levava doze anos de leais serviços, o que pressupõe a sua estreia nas funções ainda em vida do pai António da Cunha, e cerca de ano e meio antes de ser encartado. Preparava, obviamente, a continuidade da posse dos ofícios no seio familiar. Real ou empolada, a anquilosada senectude evocada foi verificada pelo corregedor da comarca de Coimbra. Surpreende que, pertencendo Antuã à comarca de Esgueira, fosse chamado ao assunto o corregedor de Coimbra! A razão deduz-se do próprio historial daquela comarca marinha, traçado com mestria pelo jurisconsulto e escritor José Pinto Loureiro5: criadas ambas as correições em 1533, já se confundiam volvidos poucos anos. “A princípio, talvez de forma encoberta, para evitar descontentamentos e reclamações, ter-se-ia recorrido ao expediente de confiar a um só corregedor a gerência das duas comarcas, criando a ilusão de que continuava existindo a comarca de Esgueira, quando fora já incorporada na de Coimbra”. Adiante, as referidas correições partilhavam os mesmos oficiais, obrigados a um total de meio ano de serviço numa e noutra. Em sequência, o autor concretizava um exemplo jurídico do conflito institucional – misto de hegemonia, identidade e autonomia – que nas primeiras décadas do século XVII opunha ainda ambas as comarcas, com clara vantagem para a do Mondego. Pergaminhos à parte, o rei autorizou a renúncia de Jerónimo da Cunha em dois filhos, desde logo num primeiro alvará com data de 16 de Julho do próprio ano de 1615 (DOC. 14). Assumida a extensão do concelho e o muito povo a servir, sugeriu Filipe II a repartição dos ofícios, separando o de tabelião do público, judicial e notas, e mantendo agrupados os de escrivão dos órfãos, câmara e almotaçaria, numa visão claramente semântica e menos prática. De facto, já ficou vista a maior conveniência do tabelião estar igualmente por dentro das matérias respeitantes à gestão concelhia. Desse modo se justifica o segundo alvará de Novembro de 1616, acima mencionado, corrigindo a repartição anterior, fazendo regressar à alçada do tabelião as responsabilidades 4 - Collecção chronologica de leis extravagantes, posteriores à nova compilação das Ordenações do Reino publicadas em 1603, desde esse anno até o de 1761 (Vol. I). (1819). Coimbra, Portugal: Real Imprensa da Universidade, p. 198. Assim rezava a forma da lei: “Não poderá nenhum Escrivão ter mais de dois Escreventes; e estes terão Carta de Escreventes passada pela Chancelaria; e se devassará deles como dos mais Oficiais de Justiça; e serão castigados pelos erros, que fizerem, como os próprios Escrivães; e viverão no Bairro dos Escrivães, a que escreverem; os quais os não poderão despedir sem expressa licença do Regedor ou do Chanceler; nem dar-lhes menos da quarta parte do que escreverem”. 5 - LOUREIRO, J. P. (setembro de 1936). A comarca de Egueira. Arquivo do Distrito de Aveiro, II(7), pp. 200-203.

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da escrivania da câmara e almotaçaria, e separando de vez a escrivaninha dos órfãos. Esta decisão régia indicia também um claro aumento da demografia em Antuã, assim como reflecte uma crescente incidência de óbitos precoces, numa região gradualmente mais afectada na sua salubridade pela laguna aveirense, ecossistema com tendência à estagnação graças ao evidente assoreamento da barra. A alternância atrás referida fez calhar as averiguações, desta feita, ao provedor da comarca da vila de Esgueira.

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Assegurada a propriedade dos ofícios na sua progénie, Jerónimo da Cunha resolveu-se a deixar orientado o futuro da filha maior, Filipa, nela renunciando a posse de um deles – o dos órfãos – a ser exercido pelo futuro marido. Entendida como dote matrimonial, a respectiva certidão foi feita no dia de Todos-os-Santos de 1618, e tinha o sinal público de Ambrósio Dias de Oliveira, identificado como tabelião do público, judicial e notas do concelho de Antuã! Na escolha do nubente, pouca ou nenhuma opinião terão tido os quinze ou dezasseis anos da noiva, face aos trinta e muitos do eleito FRANCISCO BOTO, licenciado em Cânones pela universidade de Coimbra (1599-1605)6. Natural de Lisboa, era filho de António Rodrigues Boto, corregedor do cível na capital segundo o manuscrito de frei Bernardo do Amaral, informação que não foi possível confirmar. O casamento ocorreu durante o verão de 1619, no próprio dia ou pouco antes de 17 de Julho, data da certidão que o atestou, assinada pelo padre Antão, oficiante da cerimónia sob a protecção de São Martinho, orago de Salreu. Reconheceu o documento Francisco Rabelo, outro tabelião de Antuã! Provado o consórcio com todas as regras ditadas pelo sagrado concílio tridentino, logo Francisco Boto se prestou a ser examinado na mesa do despacho dos desembargadores do paço. Considerado apto ao desempenho do cargo, fez o juramento da praxe na chancelaria e pagou mil reais dos direitos da ordem. Foi encartado como escrivão dos órfãos do concelho de Antuã no 18 de Outubro seguinte (DOC. 15). Por ignotas razões, quis, porém, o destino que Francisco morresse em três anos, deixando um filho pequeno e uma viúva “moça de menos de vinte anos”7. Certamente a conselho e por mediação dos irmãos, Filipa da Cunha fez chegar à chancelaria régia uma petição expondo a sua delicada situação e solicitando ao rei a propriedade do ofício que lhe servira de dote, agora para vigorar, em moldes semelhantes, no âmbito de um possível segundo casamento. Reforçava o pedido, a notícia – previamente confirmada também pelo provedor da Esgueira – que Filipa herdara do pai dois mil cruzados, o equivalente a oitocentos mil reais.

6 - AUC, Índice de Alunos da Universidade de Coimbra, letra F, nº 004402, Francisco Boto (1599-1604). 7 - Vd. (DOC. 16).

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Essa informação não era, de todo, acessória. Ordenavam as já aludidas leis filipinas que o escrivão dos órfãos, antes de começar a exercer, desse como fiança uma quantia entre os cinquenta e os duzentos mil reais, consoante “a povoação e grandeza do lugar” onde servisse, valor determinado pelos oficiais da câmara8. A medida visava garantir a segurança das fazendas dos órfãos, perante eventuais erros ou desonestidades que pudessem ser cometidas pelo oficial no exercício da função em que fora investido. Para a cumprir, propunham-se “fiadores abonados”; caso estes não se apresentassem, afiançavam os próprios encartados, razão que justifica a menção feita à herança de Filipa da Cunha. Seguidamente, tornava-se o garante “a todos notório” por meio do seu registo em tabelião e respectivo treslado nos livros camarários9. Face ao exposto, o soberano aquiesceu, concedendo a mercê por meio de um alvará datado de 21 de Outubro de 162210, impondo contudo um prazo de dois anos para que um novo matrimónio acontecesse, o que se não respeitou, mas foi relevado.

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Efectivamente e mesmo excedendo o prazo estipulado, Filipa voltou a casar, desta feita com o barcelense JOÃO DA SILVA11. Certificou-o Jerónimo de Crasto – padre encomendado na matriz de Salreu – a 9 de Junho de 1625, reconhecendo-se o instrumento legal no tabelião da vila da Bemposta, António de Andrade. O conhecimento de que, nesses tempos, a região de Salreu se dividia entre os concelhos de Antuã e da Bemposta, permite extrapolar a hipótese de que João da Silva fosse morador na parte abrangida por este último. De resto nada mais foi possível apurar acerca daquele que seria, a partir de 1 de Julho de 1625 (DOC. 16), o escrivão dos órfãos do concelho de Estarreja. Não se considere, todavia, estar eivado de lapso o que se acaba de escrever, trocando Antuã por Estarreja. Efectivamente e no que a este estudo concerne, o citado alvará de Outubro de 1622 pontua a estreia dessa nova designação do concelho antuano ao nível da chancelaria régia, ainda na aurora do mandato de Filipe III.Antecipa, desse modo, num par de décadas, a vulgarização daquela identificação, geralmente aceite como balizada na vigência do Portugal restaurado12. Voltando a João da Silva, enquanto escrivão dos órfãos as suas competências ficaram já sumariamente elencadas a propósito de Pero Anes, o primeiro conhecido neste ofício em Antuã. Mas que proventos auferiria à face da legislação filipina? Antes do mais, saber que não tinha remuneração fixa, recebendo por cada acto praticado, salário na sua maior parte indexado à lei que determinava “o que hão de levar os Tabeliães e Escrivães de seus Ofícios”13. 8 - Ordenações Filipinas, Livro I, Título LXXXIX. 9 - Ibid., Título LXXXVIII. 10 - Vd. (DOC. 16) 11 - A naturalidade de João da Silva (Barcelos) é indicada no manuscrito de frei Bernardo do Amaral. Não foi possível a sua confirmação. 12 - (PEREIRA, 2017: 12, 13) 13 - Ordenações Filipinas, Livro I, Título LXXXIV.

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Especificamente, por cada cinco linhas escritas nos inventários ou em quaisquer outros autos, cobrava-se de dois réis14. De cada deslocação, fosse na vila ou arrabalde, sete réis. Se a matéria fosse complexa e morosa – caso de partilhas ou acertos de contas em tutorias – rendia-lhe, só pelo tempo investido e independentemente da escrita, catorze réis diários, sete pela manhã e outros tantos pela tarde – as “assentadas” – assegurando-lhe (se tal fosse necessário e não se multiplicassem as galinhas na sua propriedade!) a compra de duas dúzias de ovos15. E outros sete réis por assentar uma tutoria ou o arrendamento de gado; e doze – correspondente a 0,75l de vinho – pelo registo da entrega de um órfão para trabalhar a soldo!16 Os livros de inventários eram autênticos mananciais de rendimento, muitos deles escritos ao longo de um par de décadas. À linha ou a quatro réis o assento, ficava ao critério do escrivão as custas de cada entrada de despesas dos órfãos. João da Silva e os outros seus pares também se cobravam pelas pesquisas – as “buscas” – que neles faziam além de seis meses; no entanto, determinava o regimento, para evitar abusos, que aos órfãos e seus tutores não levariam mais de trinta e seis réis por cada ano esmiuçado, estabelecendo um tecto máximo de cento e oito réis, correspondente a três anos, independentemente da antiguidade necessária ao objectivo procurado17. Caso fosse provado em falta por excesso nos valores cobrados, desrespeitando a letra das ordenações, a pena remetia à lei geral que abrangia os oficiais do reino18; e não era meiga! “Morte civil” ou degredo para África por dois anos, se a fraude não atingisse os quinhentos réis; por três anos, se ultrapassasse aquele valor ficando abaixo dos dois mil réis; e pelo tempo que o rei entendesse, além daquela quantia. Superados os seis mil réis de dolo, esperava-o um degredo perpétuo no Brasil! Tudo isto acrescido de nove vezes o valor apurado na causa, cabendo ao lesado duas partes, e ao acusador e câmara régia as restantes sete, equitativamente divididas. Na coincidência de lesado e acusador, dividiria este a metade do anovedado com a câmara real. Para cúmulo, perderiam o ofício para sempre. Desconhece-se por quantos anos exerceu João da Silva. Na chancelaria régia não consta mais nenhuma carta de nomeação para escrivão dos órfãos de Antuã ou Estarreja até 1709. Deduz-se, contudo, que já o não exerceria – quiçá por óbito – em 1657, ano em que a propósito da nomeação de um novo tabelião para o concelho19, se encontra referência a um Roque Ribeiro como titular daquela escrivaninha. 14 - Para consulta, foi usada a versão on-line das Ordenações Filipinas baseada na edição impressa em 1870 no Rio de Janeiro, por Cândido Mendes de Almeida. Desse modo, os valores encontram-se em “réis”, designação que a moeda portuguesa tomou, definitivamente, no reinado de D. João IV. Antes, porém, pelo menos desde 1616, já a moeda era, pontualmente, assim denominada, e uma das provas reside na carta de escrivão dos orfãos de João da Silva. Efectivamente, e ao contrário do que era uso, o valor dos direitos pagos pela propriedade do ofício não é sucedido da abreviatura “r’s”, mas sim “reis”. Não pode assim considerar-se que o escrivão Pero Lopes, neste caso particular datado de 1625, se referisse a “reais”. 15 - (VASCONCELOS, 1999: 42-44) 16 - Ordenações Filipinas, Livro I, Título LXXXIX. 17 - Ibid. 18 - Ibid., Livro 5, Título LXXII. 19 - Vd. (DOC. 21).

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No entretanto e como já se percebeu pela vultosa quantia herdada por Filipa, finou-se Jerónimo da Cunha, algures durante o ano de 1621. Na abertura do seu testamento, ficou conhecido o filho em quem escolhera renunciar os restantes ofícios, de acordo com a autorização régia de 1616. Recaíu a indicação em DIOGO DA CUNHA DE AZEVEDO20, filho segundo, cuja idade – quiçá abaixo dos vinte cinco anos – obrigaria ainda a um compasso de espera para o assumir das funções. Era, no entanto, a forma de lhe assegurar o futuro, dado que o grosso patrimonial da Casa do Mato haveria de caber ao primogénito António da Cunha de Azevedo, a quem o pai indicou para a administração do hospital de Albergaria-a-Velha21 – ofício na família há seis décadas, desde 1560 – e de que tomou posse no ano seguinte. Provavelmente ainda menor de idade, garantido como sucessor no tabelionato e escrivanias pelas derradeiras vontades paternas, Diogo da Cunha não pediu, desde logo, o assentimento real à posse daqueles ofícios. Quando por fim o fez, sete anos depois da morte do pai, justificou-se afirmando que o alvará de renúncia de 1616 “se rompera ou desaparecera ao tempo em que se passou carta do ofício de escrivão dos órfãos” ao cunhado Francisco Boto. A débil escusa será, porventura, um indício de que só em finais de 1628, Diogo lograra atingir a idade legal para o desempenho das funções.

Pedra de Armas da Casa do Mato em Salreu (séc. XVII); escudo pleno de Cunhas Crédito fotográfico: Delfim Bismarck

20 - Embora nas cartas e alvarás da chancelaria régia nunca seja referido o apelido de Azevedo que vinha da avó paterna, tanto Diogo como seus irmãos António e Clara o usaram. Essa práctica está documentada nalguns assentos paroquiais: em Santa Maria de Sardoura (num baptismo em 16/2/1655 é madrinha Clara da Cunha de Azevedo, do Barral); em Ançã (no casamento de Inês Maria Pereira de Melo em 16/6/1693, é identificado o pai como António da Cunha de Azevedo, de São Martinho de Salreu); e em Esgueira (casamento de Diogo da Cunha de Azevedo em 5/2/1634). Infelizmente para este intervalo cronológico, não existem os livros paroquiais de São Martinho de Salreu, quiçá os mais representativos para a matéria em questão. É igualmente de notar que no nobiliário manuscrito de frei Bernardo do Amaral, todos os filhos de Jerónimo da Cunha são identificados com os apelidos “Cunha e Azevedo”. 21 - SOTTOMAYOR, A. P. (Novembro de 2018). Nove décadas e três vidas que resgataram para a coroa a Albergaria da Rainha. Os Cunha da Casa do Mato (Salreu, Estarreja), na administração do hospital de Albergaria-a-Velha. Albergue. História e Património do Concelho de Albergaria-a-Velha(5), pp. 59, 62, 63, 68 e 71.

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Data de 23 de Outubro de 1628 o alvará de Filipe III (DOC. 17), autorizando a mise en marche do processo de encartação. No texto do diploma, ficou explícito que no tempo que mediara desde a morte de Jerónimo da Cunha, a mais ninguém fora passada carta de propriedade dos ofícios de tabelião do público, judicial e notas, escrivão da câmara e almotaçaria do concelho de Antuã22. O que não significa, forçosamente, que os mesmos não fossem exercidos, entretanto, por oficiais nomeados de forma avulsa e a prazo, como se procurará demonstrar adiante. Em cerca de um ano, Diogo da Cunha era examinado na mesa do despacho dos desembargadores do paço, e considerado apto a servir os cargos a que se propunha. Jurou sobre os santos Evangelhos que bem e verdadeiramente os serviria, guardando em tudo o serviço a el-rei e os direitos das partes, e cumprindo o regimento. Pagou cinco mil reais de direitos ordenados, ao tesouro da chancelaria. E, claro está, fez registo do sinal público que, enquanto tabelião, haveria de usar. Só então se passou a respectiva carta de ofício, com data de 21 de Novembro de 1629 (DOC. 18).

Autógrafo e sinal público de Diogo da Cunha de Azevedo (1629)

Porém, ainda assim é de crer que somente em Julho de 163323 lhe tenham sido definitivamente reconhecidos os cargos, passando enfim a usufruir de pleno direito dos “prós e percalços” a eles inerentes. A razão parece relacionada com o seu casamento, pois, como já ficou dito, os tabeliães e no geral todos os candidatos a ofícios “de julgar ou de escrever”, queriam-se casados, e se o não fossem, sê-lo-iam, obrigatoriamente, no prazo de um ano, sob pena de os perderem24. Diogo da Cunha casou-se, de facto, apenas a 4 de Junho desse ano de 1633. Na práctica, contudo, há notícias de que já em Fevereiro do ano transacto os exerceria, auxiliado na escrita pelo irmão mais velho, António da Cunha25. 22 - De notar que, três anos após o encartamento de João da Silva como escrivão dos órfãos do concelho de Estarreja, se continua ainda a identificar, de forma oficial, o mesmo concelho como Antuã. No âmbito deste estudo, ainda assim acontecia em 1657. 23 - Á margem esquerda do alvará de 1628 (DOC. 17), lê-se um averbamento informando que no seguimento do mesmo se passou carta dos ofícios. Está assinado por Miguel Maldonado, escrivão da chancelaria-mor do reino, e datado de 12 de Julho de 1633. 24 - Ordenações Filipinas, Livro I, Título XCIV. 25 - CARDOSO DE MENEZES, L. P. (2016). O vínculo da capela de S. Simão do Bunheiro no concelho de Estarreja, distrito de Aveiro. (C. M. Estarreja, Ed.) Terras de Antuã. Histórias e Memórias do Concelho de Estarreja(10), p. 121. A transcrição do testamento de 15 de Fevereiro de 1632 do Padre Simão Fernandes Ruela, instituidor do vínculo, encerra com o rol das testemunhas presentes, antecedido pelos executantes do instrumento: “Eu, escrivão, em fé de verdade, assinei do meu público sinal, que tal é. Eu, António da Cunha, que o escrevi”. Contrariamente à interpretação do autor que dá como tabelião o próprio António da Cunha, prova-se deste modo que a sua intervenção se resumiu à escrita. O “escrivão” – leia-se “tabelião” – seria Diogo da Cunha, que não se identifica pelo nome, mas sim pelo sinal público, marca pessoal dos tabeliães.

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A noiva, Filipa Pacheca Cardosa, era natural de Esgueira, vila onde também decorreu a cerimónia, na matriz de Santo André26. Foram seus pais Francisco Cardoso Pacheco e Ana Maria Cardoso, cuja sepultura ainda subsiste actualmente naquela igreja, exibindo com orgulho as armas de Cardoso – dos de São Martinho de Mouros – e Pacheco – de André Pacheco, cavaleiro-fidalgo de Aveiro27. Viveram no Couto de Salreu – lugar vizinho do Mato – onde fundaram casa, imóvel erradamente confundido com outro que no lugar do mesmo nome se conhece por “Casa do Couto”, e que era então solar da família Almeida e Amaral28. Nessa morada cuja localização o tempo consumiu, terão nascido as três filhas do casal, antes do mais que provável óbito da mãe Filipa, no decurso da década de quarenta, facto impossível de verificar, em virtude da inexistência dos livros de assentos paroquiais de Salreu anteriores a 1755. Chega-se a esta conclusão – contrariando embora a autoridade linhagista de frei Bernardo do Amaral29 – através da conjugação de dois factores: o conhecimento de um segundo casamento de Diogo da Cunha; e a obrigatoriedade de novo matrimónio a que os tabeliães eram obrigados por lei e sob pena de perderem o ofício, caso enviuvassem. A confiar-se no monge genealogista, Diogo da Cunha de Azevedo teve “o filhamento, por alvará passado, por Belchior de Andrade, a 18 de Fevereiro de 1639 com 750 réis de moradia por mês”. Na sua qualidade de tabelião das notas de Antuã, foi ainda quem – a instância do irmão António – tratou da escritura de instituição do morgado da quinta do Mato, aprovada a 12 de Dezembro de 164930. É possível que António da Cunha de Azevedo assim procedesse, sentindo aproximar-se o fim da sua existência que deverá ter acontecido nos alvores do ano seguinte, deixando viúva Cecília de Melo, com quem estava casado desde finais dos anos trinta. Tiveram ambos os irmãos, cada um, três filhas31, e nenhum rapaz que pudesse ficar à frente dos destinos de suas casas, nomeadamente do recém instituído vínculo do Mato. Por 26 - ADAVR, Paróquia de Esgueira, Registos de casamento, liv. 3, fl. 102. 27 - COUTINHO, F. M. (Junho de 1944). Pachecos e Cardosos da região de Aveiro. Arquivo do Distrito de Aveiro, X(38), pp. 106-108. 28 - MONTENEGRO, J. B. (2011). Origem da Casa do Couto, Salreu, Estarreja. Terras de Antuã. Histórias e Memórias do Concelho de Estarreja, 5, pp. 89, 95. 29 - O manuscrito genealógico de frei Bernardo do Amaral não refere um segundo casamento de Diogo da Cunha de Azevedo, e dá como seu sobrinho (filho do irmão António) o morgado do Mato e de Sampaio Jerónimo Pereira de Melo. É desmentido pelo assento de casamento deste último, no ano de 1668 em Vilar de Maçada, onde é identificado como filho de Diogo e de sua mulher (e cunhada) Cecília de Melo. Arquivo Distrital de Vila Real (ADVRL), Paróquia de Vilar de Maçada, Registos de casamento, liv. 1, p. 24. 30 - “Genealogia dos Valentes e Silvas e de outros muitos que deles descenderam e se aparentaram com os mesmos como se verá no decurso desta obra”. O original manuscrito com data de 1777, da autoria de frei Bernardo do Amaral, pertenceu à biblioteca do 2º Conde de Azevedo, e integra actualmente o acervo da Biblioteca Pública Municipal do Porto (BPMP). Num das páginas pode ler-se a seguinte nota: “António da Cunha de Azevedo, o Novo. Fez em 1649, nas notas do Tabelião Diogo da Cunha do Concelho de Antuã, escritura de instituição do Morgado da Quinta do Mato em Salreu, aprovado a 12 de Dezembro do mesmo ano. A instituição acha-se lançada no Livro das Capelas da provedoria de Esgueira e de Aveiro, a fls. 170”. O tabelião Diogo da Cunha era irmão do instituidor e, acreditando na opinião de Francisco Ferreira Neves, os tombos da Provedoria de Esgueira desapareceram no incêndio do edifício do Governo Civil de Aveiro, em 20 de Julho de 1864. NEVES, F. F. (1948). Vida e testamento do humanista Aires Barbosa. (F. F. Neves, Ed.) Arquivo do Distrito de Aveiro, 14, p. 45. 31 - Do casamento de António da Cunha com Cecília de Melo, nasceram Inês Maria, Vicência da Glória e Maria, a qual morreu jovem. De Diogo da Cunha e Filipa Pacheca Cardosa, nasceram Maria e duas irmãs que se conheceram no clero pelos nomes de Luísa dos Serafins e Ana da Assunção.

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seu turno, uma vez viúvo, Diogo estava forçado por lei a novo casamento de forma a poder manter-se na posse dos ofícios de Antuã. Resulta assim quase intuitivo que se juntassem os cunhados numa nova aliança matrimonial32, a qual acabou mesmo por render fruto, em pouco tempo, na pessoa do futuro morgado do Mato e de Sampaio, Jerónimo Pereira de Melo33. Todavia, a vida de Diogo da Cunha pouco mais se estenderia, depois de uma carreira que ultrapassou as duas décadas, “com muita verdade, sem interpolação de tempo e nunca surpreendido em erros”34. É mesmo expectável que já tivesse falecido em Abril de 1656, uma vez que é o seu cunhado Francisco Cardoso Pacheco – tabelião do público, judicial e notas da vila de Esgueira – quem actua enquanto escrivão da câmara de Antuã, numa acta reguladora dos vendeiros de vinho do concelho35. E se de mais factos necessitasse o argumento, suficiente será afirmar que no ano seguinte, coube ao escrivão dos órfãos do concelho a certificação do casamento de Maria da Cunha, a filha mais velha do tabelião, certamente já defunto36. Ao fim de um século nas mãos de três gerações consecutivas dos Cunha da quinta do Mato, estavam agora vagos os ofícios de tabelião do público, judicial e notas, escrivão da câmara e almotaçaria de Antuã.

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Será talvez o momento ideal para analisar o que, durante a primeira metade do século XVII se passou na dinâmica do segundo tabelionato do concelho, sob a égide dos Andrade Cardoso da quinta de Fonte Chã, na Bemposta.

Aspecto actual da quinta de Fonte Chã, lugar da freguesia de Pinheiro da Bemposta Crédito fotográfico: Google Earth

32 - Este tipo de matrimónio, de eminente cariz socioeconómico e pouco vulgar entre os cristãos, tem raízes ancestrais remontantes à lei moisaica do “levirato”, a qual tinha como principal objectivo garantir a descendência e assegurar o legado patrimonial da família. 33 - Vd. nota 28. 34 - Vd. (DOC. 21). 35 - COSTA, E. A. (Dezembro de 1969). Estarreja no Passado. Apontamentos para a sua História. Aveiro e o seu Distrito, 8, pp. 21-25. 36 - Vd. nota 33.

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Ficou visto ao encerrar da primeira parte deste estudo que, desde 29 de Agosto de 1611, estava encartado como segundo tabelião do público e judicial de Antuã, DIOGO DE ANDRADE CARDOSO. Igualmente ficou referido o facto de, pelo menos nos seis anos consequentes, não ter chegado a servir o ofício, fosse por falta de idade – razão de que se discordou – ou por necessidade de amparo à família – o que o posicionaria, eventualmente, em comissões financeiramente mais vantajosas, as quais, porém, se deconhecem. Chegara-lhe o tabelionato através de renúncia que nele fizera o avô Fernão Tavares, certamente por questões de idade mas, com maior probabilidade, devido à morte prematura do pai – outro Diogo de Andrade, nascido em Fonte Chã e residente em Sever do Vouga enquanto casado com Maria Froes. A fatalidade deixara a seu cargo duas irmãs “pobres e muito nobres”37, cujo sustento e futuro lhe cabia providenciar e acautelar. Segundo se conhece das genealogias locais, Maria Froes Cardosa, a mais nova, veio a casar com Manuel Coutinho de Lacerda, filho do capitão-mor de Sever do Vouga e ele próprio sucessor do pai naquele posto; assegurado lhe ficou o porvir. No que respeita à irmã mais velha, Isabel Cardosa, sabe-se que estava concertada para casar com Miguel da Cunha em 20 de Outubro de 1617, data do alvará de Filipe II autorizando Diogo de Andrade Cardoso a renunciar o ofício de tabelião no futuro cunhado38. Do processo para Familiar do Santo Ofício do primogénito deste casal, foi possível esclarecer que o noivo era filho de “Manuel da Cunha e de Isabel Dias de Pinho, naturais e moradores que foram em a freguesia de São Martinho de Salreu, perto da Bemposta deste Bispado de Coimbra”39. Esta brevíssima nota permite equacionar um estreito parentesco de António da Cunha – o tabelião de Antuã na segunda metade do século XVI, dono e senhor da quinta do Mato em Salreu – com este Manuel da Cunha; porventura enquanto tio e sobrinho. Verificando-se correcta esta proposição – já enunciada na primeira parte, tratando daquele oficial40 – estar-se-ia perante uma possível estratégia matrimonial por parte da família, visando o pleno controlo da escrita notarial na globalidade do concelho antuano. Desse modo segundos primos, Diogo e Miguel da Cunha teriam usufruído do conhecimento minucioso de toda a vida concelhia ao longo de três décadas. Era um domínio que aparentemente se escapava por impossibilidade práctica aos Andrade, desde finais do verão de 1611, e aos Cunha, por manifesto desgaste físico do seu

37 - SOTTOMAYOR, A. P. (Novembro de 2018). As Casas do Mato (Salreu) e de Fonte Chã (Bemposta) nos ofícios concelhios antuanos. Subsídios para a história dos registos e notariado no concelho de Estarreja. 1ª parte – de D. João II a D. Filipe II. Terras de Antuã. Histórias e Memórias do Concelho de Estarreja(12), p. 68. Por lapso, a transcrição em itálico aparece como “pobres em nobreza”, lendo-se, de facto, no documento original, “pobres e muito nobres”. 38 - Vd. (DOC. 19). 39 - ANTT, Habilitações do Santo Ofício, António Cardoso da Cunha, letra A, maço 28, nº 751. 40 - O enunciado original, de 2018, propunha Manuel da Cunha como filho e não como sobrinho de António da Cunha. A sua revisão tornou-se, entretanto, necessária face às Ordenações Filipinas, Livro 1, Título LXXIX, parágrafo 45, proibindo os parentescos ao nível de primo co-irmão entre dois ou mais tabeliães do judicial na mesma cidade, vila ou concelho.

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titular, autorizado a renunciar no Inverno de 1616.Vislumbra-se nestes imponderáveis, um déficit notarial experimentado pelo concelho de Antuã durante alguns anos, justificando o aparecimento de oficiais providos pelo procurador da comarca de forma avulsa e a prazo anual. É o caso dos atrás citados AMBRÓSIO DIAS DE OLIVEIRA e FRANCISCO RABELO, identificados como tabeliães no concelho de Antuã, respectivamente em 1618 e 1619. Um instrumento posterior revela indícios de que, em 1620, já era Miguel da Cunha quem servia o lugar41.

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Todavia, apenas em Junho de 1622, MIGUEL DA CUNHA E FARIA foi encartado tabelião do público, judicial e notas no concelho de Antuã (DOC.19), após comprovar o casamento, “conforme ao sagrado concílio tridentino”, com Isabel Cardosa. Um engano em que incorreram os seus responsáveis – doutores Luís da Gama Pereira e Dinis de Melo, e o escrivão Pero Lopes – dá a encartação como pedida na sequência do óbito de Diogo de Andrade Cardoso. No entanto, o erro não escapou ao crivo verificador de Miguel Maldonado que o corrigiu ao finalizar da carta, mediante a seguinte ressalva: “posto que acima digo que os ditos ofícios vagaram por falecimento do dito Diogo de Andrade não vagaram senão por renunciação que deles fez no dito Miguel da Cunha seu cunhado”. Quanto ao comprovado matrimónio, não se encontrou o assento paroquial, nem em Pinheiro da Bemposta, nem em Sever do Vouga onde os pais da noiva residiram. Sobra a hipótese de ter-se realizado em São Martinho de Salreu, freguesia de onde o noivo era natural e cujos registos paroquiais – como se disse – são inexistentes até meados do século XVIII. Contudo, pode estimar-se a sua realização, entre o final do ano de 1617 e a primeira metade de 1619, uma vez que Maria, a primeira filha do casal, recebeu o baptismo por intermédio do cura da matriz de São Paio da Bemposta, a 12 de Abril de 162042. Este facto, aliado ao levantamento dos restantes baptismos dos oito filhos que tiveram, assegura ainda a residência permanente de Miguel da Cunha e Isabel Cardosa na quinta de Fonte Chã, garantidamente até Outubro de 1640. Um outro processo para Familiar do Santo Ofício que não o atrás citado, vai um pouco mais longe, atestando-os por “moradores que foram sempre na dita quinta”43. Miguel pagou de direitos ordenados, a rebuscada quantia de três mil duzentos e dez reais, supondo-se, portanto – com base nos cinco mil reais pagos por Diogo da Cunha poucos anos adiante – que o valor então atribuído às escrivanias conjuntas da câmara e almotaçaria, corresponderia aos restantes mil setecentos e noventa reais.

41 - Vd. (DOC. 20). 42 - ADAVR, Paróquia de Pinheiro da Bemposta, Registos de baptismo, liv. M-1, fl. 27vrs. 43 - ANTT, Habilitações do Santo Ofício, Habilitações Incompletas, António Cardoso da Cunha, doc. 256.

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ANTÓNIO PEDRO DE SOTTOMAYOR

Autógrafo e sinal público de Miguel da Cunha (1622)

Jurou depois que serviria bem e verdadeiramente, e guardaria e cumpriria os regimentos de cada ofício em que ficava investido (Notas, Judicial e comuns a ambos), os quais lhe foram entregues na chancelaria para que os levasse e mostrasse aos juízes territoriais ou a quem futuramente lho exigisse44. A alguém que isso não cumprisse, aguardavam-no, além da natural destituição dos ofícios, a cadeia e uma pesada multa de vinte cruzados (8000 reais), “metade para os Cativos, e a outra para quem o acusar”45. Foi-lhe passada carta de tabelião a 22 de Junho, e a 25, conforme o texto do mesmo regimento, fez “um termo de sua letra, e um sinal público” de que usaria, em livro próprio para tal, existente na Casa da Suplicação. No avesso da carta, constava uma declaração do escrivão da chancelaria-mor do reino em como prestara juramento, e uma certidão do regedor das justiças da Casa da Suplicação testemunhando o registo autógrafo e o sinal público. Sem estes pró-formas, e uma fiança entre os dez e os trinta mil réis registada em notário e tresladada no livro da câmara, não poderia Miguel da Cunha – ou qualquer um de seus pares – ter-se estreado no desempenho das suas funções. 44 - O regimento que o Desembargo do Paço dava aos Tabeliães, consistia na cópia integral das Ordenações Filipinas, Livro 1, Títulos LXXVIII (Dos Tabeliães das Notas), LXXIX (Dos Tabeliães do Judicial), LXXX (Das coisas, que são comuns aos Tabeliães das notas e aos do Judicial), e LXXXIV (Do que hão-de levar os Tabeliães e Escrivães de seus Ofícios). 45 - Ordenações Filipinas, Livro I, Título LXXX.

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O elenco descritivo de direitos e deveres dos mencionados regimentos é extenso, nos seus cento e vinte seis parágrafos divididos por quatro títulos, e ultrapassa os objectivos do presente ensaio. No entanto, pelo seu interesse, e à semelhança do que atrás se fez relativamente a João da Silva e escrivães dos órfãos em geral, aponta-se o foco, nas próximas linhas, à especificidade do modo como Miguel da Cunha e colegas de profissão compunham o seu salário enquanto oficiais das notas e do judicial. Porquanto inalteradas na sua essência, o resumo das competências que lhes eram atribuíveis em ambas as vias, remete-se à primeira parte deste artigo e ao tempo do escudeiro Lopo Preto. Vinte cinco linhas por página – chamadas “regras” – cada uma “de trinta letras, pouco mais, ou menos”; assim se uniformizava a escrita tabeleónica daqueles dias. Dois réis pagavam cinco destas linhas caso o registo da nota não preenchesse a página por inteiro. Se o fizesse, cada lado do fólio valia dezanove réis, e o seu lavrado, em escritura, vinte e dois46 – o preço de quase litro e meio de vinho, releve-se o burlesco da analogia! O preço cobrado constaria de forma obrigatória em cada escritura pela mão do próprio oficial, de maneira a poder averiguar-se, a qualquer momento, a sua legalidade. Qualquer excesso apontado, provando-se a acusação, valia uma “morte civil”, coima anovedada, e o “desemprego”, penas transversais a todos os oficiais do reino, como se viu a propósito dos escrivães dos órfãos. Por seu turno, a “morte natural” – vulgo pena capital – acrescida da perda dos bens em favor da Coroa, estava garantida a todo e qualquer tabelião ou escrivão apanhado em falta forjando escrituras ou delas fazendo uso. “Vistas” e “buscas” também valiam o seu quinhão. Das últimas já anteriormente se dissecou a finalidade; rendiam cento e oito réis pelo primeiro ano (9 réis por mês), cinquenta e quatro no segundo, e não mais de dezoito remontando a três ou mais anos, num total de cento e oitenta réis. Já as primeiras tinham por objecto a consulta processual, resultando na produção de cópias parciais que poderiam render, no máximo, a sexta parte do valor da escritura original, contada de acordo com o número de linhas abrangidas pelo pedido. Finalmente, as deslocações de igual modo contribuíam para os emolumentos. Fonte Chã ficava no limiar das duas léguas autorizadas para residência de um tabelião em relação ao lugar onde se faziam as audiências47– no caso concreto a “Praça” de Estarreja. Idealmente, Miguel da Cunha vencia essa distância à sua custa, todos os dias, para cumprir as seis horas – três de manhã e outras tantas à tarde – a que o regimento o obrigava a assistir na casa dos tabeliães. Mas a cada ida fora, já o caso mudava de figura, cobrando-se sete réis por cada metade do dia em serviço. Se levasse “besta sua e moço” acrescia o pagamento dois tostões diários – o equivalente a duzentos réis, ou pouco mais do que um grama de ouro – para mantimento de ambos. Esse valor descia para metade, caso lhe fosse fornecido, da parte dos interessados, o animal para a jornada. E se fosse a pé, só cobraria um tostão, acrescentando 46 - Ibid., Título LXXVIII. O custo limite era de cinquenta e oito réis por fólio escrito de ambos os lados, no caso de sentença ou instrumento retirado de um processo ou instrumento de agravo; Ibid, Título LXXXIV. 47 - Ibid., Título LXXX.

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ainda o regimento que não fizesse as refeições com a parte requerente do serviço “para se não dar azo de se afeiçoar a ela”. Caía por terra esta recomendação na eventualidade de, no lugar onde se dirigisse, “não existir a vender outro mantimento, senão o que lhe a parte der”. Assim sendo, e nomeadamente se comesse “à custa da parte” – o que de modo semelhante valia para o criado e o animal – reduziam-se-lhe a metade os cobros anteriores48. Durante, pelo menos, vinte e quatro anos, serviu Miguel da Cunha e Faria o seu ofícialato com bom procedimento e sem erros. A afirmação é patente no alvará de renúncia que o rei “Restaurador” lhe mandou passar em 11 de Janeiro de 1645 (DOC.20). Por intermédio desse instrumento, e como recompensa desses anos de bons serviços, ficava o fidalgo de Fonte Chã – pela primeira vez identificado com o apelido “Faria”49 – autorizado a renunciar aquele tabelionato num filho, ou num eventual genro que viesse a ter, desde aquele dia até “à hora da morte”. Estaria então no patamar dos cinquenta anos de idade, e seguramente que se manteve ao serviço mais algum tempo, quiçá década e meia. Advém a extrapolação, do histórico que foi possível levantar acerca do período seiscentista da escrivania das sisas de Antuã.

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Dessa maneira, é já facto conhecido que DIOGO CARDOSO DA CUNHA não serviu enquanto tabelião, preferindo renunciar o ofício no cunhado Miguel, por bem do futuro da irmã. Recorde-se, porém, que igualmente estava investido na propriedade do registo das sisas, cargo que nunca alienou e, segundo as evidências, sempre terá desempenhado, provavelmente desde a sua investidura em finais de 161150. É de considerar o seu falecimento durante os anos de alvorada do reinado de D. João IV, talvez até em consequência da guerra da restauração, a qual deixou marca idelevel nos registos de óbitos da Bemposta. Isto, porque em 1683 já se dava o ofício por vago há mais de quarenta anos. Nesses tempos de grande conturbação, facilmente se compreende que, mesmo sem a respectiva carta de propriedade, acabasse por ser MIGUEL DA CUNHA E FARIA a pegar nas rédeas do ofício, anualmente investido por meio de alvarás régios e provimentos do procurador de Esgueira. Afinal, a escrivania das sisas de Antuã – agora definitivamente reconhecida por Estarreja – estava na Casa de Fonte Chã há mais de cento e trinta anos! Outrossim sem a devida cédula da chancelaria-mor do reino e através de investiduras a prazo, a Miguel da Cunha sucedeu nas sisas o filho JOÃO CARDOSO DA CUNHA, baptizado em 20 de Agosto de 1633 na matriz da Bemposta tendo por padrinho o escrivão dos órfãos João da Silva51, seu parente. Como era de lei, João só pôde iniciar-se no ofício 48 - Ibid., Título LXXXIV. 49 - Sendo bem conhecidos os apelidos paternos (Cunha) e maternos (Dias de Pinho), escapa-se a origem da conjugação “Cunha e Faria”. A hipótese colocada do pai, Manuel da Cunha, ser sobrinho do tabelião António da Cunha, do Mato, permite a sugestão daquele ser filho de uma irmã deste, eventualmente casada com alguém apelidado “Faria”. 50 - Vd. (DOC.13), na primeira parte. (SOTTOMAYOR, 2018: 79) 51 - ADAVR, Paróquia de Pinheiro da Bemposta, Registos de baptismo, liv. M-1, fl. 64.

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aos vinte e cinco anos, razão porque, no mínimo, terá começado a servir em 1658. Desse modo se conclui a mais que provável década e meia que Miguel da Cunha ainda terá estado no activo, após a autorização de renúncia de 1645. Na mesma fonte que permitiu deduzir as informações anteriores, também se afirma que João Cardoso da Cunha já não vivia em Outubro de 1683 e quem assumia o seu lugar desde alguns anos, era o irmão benjamim. Indo um pouco mais além, admita-se inclusive a sua defunção anteriormente a Maio de 1680, por não ter sido opção enquanto cumpridor das obrigadas missas e esmolas decorrentes do óbito da mãe52. Aclamado rei há apenas mês e meio, o até então príncipe regente D. Pedro II foi quem, nessa carta de 30 de Outubro de 1683 (DOC. 21), renovou de forma perene e após uma vacância de mais de quatro décadas, a propriedade do ofício de escrivão das sisas à linhagem de Fonte Chã. Fê-lo na pessoa de ANTÓNIO CARDOSO DA CUNHA, o irmão mais novo do anterior. E segundo alí se pode ler, o principal motivo que fundamentou o agraciamento prendeu-se com os bons serviços prestados por aquele durante “alguns anos no tempo da guerra com cavalo à sua custa”. Naturalmente que se referia ao conflito com Espanha no pós-restauração, oficialmente terminado mediante o “Tratado de Lisboa” assinado a 13 de Fevereiro de 1668, teria António Cardoso vinte sete anos de idade. Nesse meio-tempo, elevara-se a capitão de ordenanças. Igualmente pedira para ser admitido a Familiar do Santo Ofício, entendendo que tinha “as partes e requisitos necessários para isso”, e também porque no lugar em que vivia “e mais três concelhos circunvizinhos a ele, que todos constam de mais de oito mil fogos”, apenas uma pessoa, de momento, cumpria esse papel, deixando subentendida a manifesta insuficiência do facto. Apesar do patrocínio do Conde de Figueiró e de Plácido Cabral de Azevedo, juiz do crime da Mouraria, o processo emperraria por conta “de uma fama vaga e duvidosa (…) nascida mais de inveja que da verdade”, que ensombrava o avô Manuel da Cunha, de Salreu.53 Decorreu a amputada demanda no próprio ano de 1683 em que António se viu encartado escrivão das sisas de Estarreja. Antes, porém, casou-se a 8 de Fevereiro, em Valongo do Vouga, com Cristina Teixeira Rebela, autóctone do lugar do Beco54. À imagem dos seus antecessores, viveram em Fonte Chã, “com abundância de bens, com cavalos na estrebaria e criados, cães de caça e galgos e criados caçadores”55.

52 - Ibid., Registos de óbito, liv. 3, fl. 2. Isabel Cardosa faleceu a 24 de Maio de 1680, sendo sepultada dentro da igreja de S. Paio da Bemposta. Foi cumpridor o filho mais novo António Cardoso da Cunha. Sendo João o irmão mais velho, seria ele certamente o escolhido, caso ainda estivesse vivo. 53 - Vd. nota 43. 54 - Ibid., Paróquia de Valongo do Vouga, Registos de casamento, liv. M-2, fl. 124. Cristina era filha de Domingos Teixeira Rebelo e de sua mulher Maria da Conceição “do Beco desta freguesia”. 55 - Annaes do Município de Oliveira de Azeméis (Fac-Símile da 1ª edição de 1909 – Livraria Chardron, de Lello & Irmão, Porto ed.). (2011). Oliveira de Azeméis, Portugal: Município de Oliveira de Azeméis, p. 212.

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Durante mais de trinta anos e “com boa satisfação”, exerceu António Cardoso da Cunha o ofício, até que, “por se achar com muita idade e achaques”, se resolveu a renunciar ao mesmo em mãos do rei “Magnânimo”56. A cronologia admissível para a renúncia – entre os anos de 1714 e 1717 – aponta-lhe uma idade próxima dos setenta e cinco anos, claramente de acordo com os motivos argumentados. De facto, a morte ceifá-lo-ia a 13 de Julho desse último ano57, e de acordo com informações de D. Fernando de Tavares e Távora constantes nos “Annaes do Município de Oliveira de Azeméis”, foi sepultado na matriz de Pinheiro da Bemposta “perto do altar de Nossa Senhora, em campa de família, hoje coberta pelo soalho, e brazonada com as armas dos Cunhas e Cardosos – Cardosos da quinta de S. Martinho de Mouros, que é solar deles, e Cunhas dos verdadeiros de Portugal da quinta do Mato, de S. Martinho de Salreu”.58

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A citação anterior corrobora a sugestão de parentesco, aqui já traçada, unindo as casas de Fonte Chã e do Mato. Nesta última e em virtude da extrema menoridade do único varão sucessor, os ofícios haveriam de continuar por via feminina, na segunda metade do século XVII, através do casamento de Maria da Cunha de Azevedo com ROQUE VARELA PACHECO, seu primo terceiro pela parte materna59. Um alvará de D. João IV com data de 8 de Junho de 165260, validara esta transmissão em forma dotal, ao autorizar Diogo da Cunha de Azevedo que se encontrava “achacado”, a renunciar numa das filhas os ofícios que tinha “para os servir a pessoa que com ela casar”. Necessitado de homens de armas para a guerra que mantinha com Espanha, o rei fez depender a mercê da presença do futuro agraciado numa praça fronteiriça, durante seis meses e a expensas próprias. Excusou-se este, pessoalmente, ao requisito, como seria praxe entre os mais abonados, entregando ao tesoureiro-mor da Junta dos Três Estados – organismo criado para administração dos tributos lançados para custear as despesas militares decorrentes da guerra da Restauração – doze mil réis, o custo calculado para o mantimento de um soldado durante o tempo requerido. Antes de ser investido na propriedade do ofício que fora do sogro, pagou ainda mil novecentos e dezasseis réis de direitos ordenados, e teve de fazer prova documental de que se encontrava casado, pelas leis da Igreja, com Maria da Cunha. Encartado a 30 de Outubro de 1657 (DOC. 22) como “escrivão da câmara, almotaçaria, público, judicial e notas do concelho de Antuã”, Roque Pacheco Varela registou quatro dias mais tarde no Desembargo do Paço o seu sinal público ao rematar do termo autógrafo em que, corrigindo o anterior, se deu por “tabelião do público, judicial e notas, câmara e almotaçaria do concelho de Estarreja”! 56 - Vd. (DOC. 25). 57 - ADAVR, Paróquia de Pinheiro da Bemposta, Registos de óbito (1679-1747), fl. 97. 58 - (Annaes do Município de Oliveira de Azeméis, 2011: 212). 59 - (COUTINHO, 1944: 110,111) Roque Varela Pacheco era filho de Sebastião Pacheco Varela Duraço e de Isabel Cardosa Henriques, neto paterno de André Pacheco Duraço e Filipa Varela, bisneto de André Pacheco e Isabel Afonso. Estes últimos eram trisavós de Maria da Cunha de Azevedo através da filha Filipa Pacheca, casada com Francisco Cardoso “o velho”. 60 - Vd. (DOC. 22).

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Autógrafo e sinal público de Roque Varela Pacheco (1657)

Viveu com sua mulher em São Martinho de Salreu, na quinta do Couto que o sogro fundara, já desaparecida na actualidade. Ali terão nascido os nove filhos que lhes dão os genealogistas, dos quais quatro raparigas tomaram hábito nos conventos aveirenses de Jesus e de Sá, um rapaz foi frei em São Domingos, e as meninas mais novas viveram solteiras na casa do Couto onde morreram em idade avançada, sendo – na opinião de frei Bernardo do Amaral que bem as conheceu – “senhoras exemplaríssimas, pela sua gravidade, modéstia e virtudes, tratando-se com grande honra, decência e estimação”.

Alto-relevo do século XVII representando o brasão de armas de Roque Varela Pacheco, apeado do tecto da casa que lhe pertenceu aquando da sua venda a João do Amaral Correia de Almeida e Calvos, sr. da “Casa do Couto” (Salreu) Crédito fotográfico: Jorge Barbosa de Montenegro

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ANTÓNIO PEDRO DE SOTTOMAYOR

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SEBASTIÃO PACHECO VARELA DA CUNHA foi o varão primogénito, como o próprio afirma no requerimento que fez ao rei “Pacífico” em inícios do ano de 1699, pedindo-lhe a propriedade dos ofícios na sequência do óbito paterno. Nascido em 1662, aos dezassete anos foi admitido na Universidade de Coimbra para a aula de Instituta, espécie de ano zero de preparação geral, obrigatório para todos os caloiros. De 1680 a 1685 cursou a faculdade de Cânones, fazendo exame ao grau de bacharel em 1 de Junho desse ano, e prestando provas para formatura a 14 de Junho de 168661. Em data incerta de 1688, foi admitido à leitura no Desembargo do Paço, verdadeiro momento percutor na ascensão de qualquer aspirante a magistrado. Esta noção é afirmada no texto de Ana Isabel Ribeiro, tratando dos bacharéis oriundos da provedoria de Aveiro na carreira das Letras ao longo de grande parte do século XVIII.62 Segundo a docente coimbrã, os sete anos de formatura jurídica universitária não garantiam, por si só, acesso directo ao serviço do reino nos lugares de letras: “O escrutínio final era feito pelo Desembargo do Paço e pelas exigências por ele ditadas – a prática forense em auditório, a aprovação na inquirição de genere e a aprovação no exame que constituía a leitura propriamente dita e que tomava a forma de uma lição de ponto que era classificada por um júri com «que leu» (aprovação), «bem» ou «muito bem», por todos ou pela maioria dos seus membros.” Da sua habilitação para “Leitura de Bacharéis”63 cujas inquirições tiveram início em Fevereiro de 1687, consta que era morador na quinta do Couto, e confirma-se a identidade e vida “à lei da nobreza” dos seus pais e avós aqui elencados. Apenas a origem lisboeta da avó paterna, Isabel Cardosa, suscitou algumas dúvidas, merecendo deligências extras na capital, de que se desconhecem os resultados por estar incompleto o processo. Pelo mesmo motivo não há notícia da sua aprovação, nem em que data aconteceu, deduzindo-se a avaliação positiva e subsequente exame perante os desembargadores do paço pelo facto de, à posteriori, ter exercido dois triénios como juiz de fora, primeiro no Vimieiro (1689)64 e mais tarde em Lamego (1695)65. Orfão de pai e concluída que estava a segunda das supracitadas comissões, foi o tempo escolhido pelo magistrado para pedir a D. Pedro II a sucessão enquanto proprietário dos ofícios de tabelião do público, judicial e notas, e de escrivão da câmara e almotaçaria

61 - AUC, Índice de Alunos da Universidade de Coimbra, letra V, nº 000820, Sebastião Pacheco Varela (1679-1686). 62 - RIBEIRO, A. I. (2005). Ministros de Sua Majestade. Bacharéis oriundos da provedoria de Aveiro na carreira das Letras (1700-1770). Em F. T. Fonseca (Ed.), O Poder Local em Tempo de Globalização. Uma História e um Futuro, Comunicações (pp. 5585). Viseu: Palimage / Centro de História da Sociedade e da Cultura 63 - ANTT, Desembargo do Paço, Leitura de Bacharéis, Sebastião Pacheco Varela da Cunha, letra S, maço 2, nº 4. 64 - Frei Bernardo do Amaral troca, erradamente, Vimieiro por Aveiro. ANTT/CHR/Chancelaria de D. Pedro II, Doações, Liv. 48, fl. 286 vrs: Sebastião Pacheco Varela – Carta de juiz de fora de Vimieiro (3/8/1689). 65 - Ibid., Liv. 39, fl. 268: Sebastião Pacheco Varela – Carta de juiz de fora de Lamego (6/2/1695).

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do concelho de Estarreja. O rei concedeu-lhe a mercê, desde logo mediante um alvará datado de 25 de Maio de 1699. Não satisfeito, Sebastião Pacheco requereu de imediato a maior efectividade de uma carta que, por ordem do soberano, se mandou passar a 24 de Julho seguinte (DOC. 23). De novos direitos pagou um total de quarenta e cinco mil réis, metade desta quantia a título de obrigada fiança. Entenda-se por isso que o valor intrínseco do conjunto daqueles ofícios ascendera já, no final do século XVII, a vinte e dois mil e quinhentos réis, equivalente a sessenta gramas de ouro. Um custo sem dúvida elevado, mas muito relativo se for levada em consideração certa notícia de época atribuindo às cabeleiras importadas – tão em voga, nomeadamente entre os estratos sociais mais elevados – preços na ordem dos cinquenta a sessenta mil réis!66 Relembre-se ainda que, à distância de um século, o bisavô Jerónimo da Cunha despendera, pelo direito àquela propriedade, pouco mais de quarenta gramas do mesmo metal de referência67, significando uma valorização real daqueles ofícios em cerca de cinquenta por cento. Contrariamente ao costumado, o registo da carta nos livros da chancelaria-mor do reino não inclui a necessária declaração autógrafa, nem o desenho do sinal público que Sebastião Pacheco Varela da Cunha haveria de usar. Seguramente porque o não chegou a fazer, em virtude da nomeação para superintendente dos Tabacos na província de Trás-os-Montes, ocorrida em 9 de Outubro de 170068, e que o obrigou a assistir com carácter permanente em Vila Real. Da capital transmontana sairia no Outono de 1707 para assumir o lugar de corregedor na comarca de Pinhel69, passando a residir em Trancoso, onde morreria em Setembro do ano seguinte, solteiro e sem geração. Conservando embora a posse dos ofícios, é evidente que durante estes anos os não exerceu e os teve arrendados, acredita-se, com licença régia.

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No Arquivo Distrital de Aveiro, o livro notarial mais antigo de Estarreja data de 1700. É da responsabilidade do tabelião JOÃO DE FIGUEIREDO, o qual não consta na chancelaria-mor, pelo que terá servido ao abrigo de alvarás anuais. O seu sinal público remata um dos instrumentos da citada “Leitura de Bacharéis” de Sebastião Pacheco, com data de 26 de Maio de 1688, onde se identifica como “escrevente e tabelião do público, judicial e notas neste concelho da vila de Estarreja”70.

66 - SARAIVA, J. H., & GUERRA, M. L. (1994). Diário da História de Portugal. Da Restauração à Constituição (Vol. II). Lisboa, Portugal: Difusão Cultural, p. 59. 67 - (SOTTOMAYOR, 2018: 65) 68 - ANTT/CHR/Chancelaria de D. João V, Doações, Liv. 44, fl. 2 vrs: Sebastião Pacheco Varela – Carta de superintendente dos caminhos do tabaco da reposição da província de Trás-os-Montes (9/10/1700) 69 - Ibid., Liv. 29, fl. 157: Sebastião Pacheco Varela – Carta de corregedor da comarca de Pinhel (6/10/1707). O seu substituto, Manuel Homem de Carvalho, foi nomeado a 24/8/1709. 70 - Vd. nota 63.

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ANTÓNIO PEDRO DE SOTTOMAYOR

Assinatura e sinal público de João de Figueiredo (1688)

Segue-se-lhe o livro do tabelião JOÃO DA SILVA RANGEL (1701-02), meramente referido como escrivão nesse processo de 1688 e que também não se vê encartado na chancelaria. Ambos terão sido, sem dúvida, arrendatários dos respectivos tabelionatos, regime que as ordenações censuravam a todo custo, mas o crepúsculo seiscentista começava a facilitar. À falta de melhor notícia, Rangel terá exercido os ofícios que pertenciam à Casa do Mato/Couto há quase duzentos anos. Estando correcta esta asserção, logo após o falecimento de Roque Pacheco Varela e a consequente investidura de Sebastião que lhos arrendou. Quanto a Figueiredo, é provável que estivesse à frente do tabelionado enraizado também secularmente na Casa de Fonte Chã, e então pertença do capitão António Cardoso da Cunha, o qual, à semelhança do seu parente e congénere de Salreu, nunca registou o sinal público no Desembargo do Paço. Razão que motiva a suspeita de não ter chegado a exercer, de facto, o ofício de tabelião, que obtivera de maneira sui generis. Senão vejamos:

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Como atrás ficou escrito, nos alvores de 1645 MIGUEL DA CUNHA E FARIA fora autorizado por D. João IV a renunciar num dos filhos ou filhas, a propriedade do segundo tabelionato do público, judicial e notas de Antuã. E fê-lo, realmente, por disposição testamentária, tornando-o em dote de casamento da filha mais velha MARIA DA CUNHA CARDOSA. Estima-se o seu óbito em finais da década de sessenta – período em que são inexistentes os assentos paroquiais de Pinheiro da Bemposta – uma vez que, não só o alvará onde a coroa reconhece a nomeação de Maria é da vontade do príncipe D. Pedro“como regente e governador dos Reinos de Portugal e dos Algarves”71, como também ao tempo da sua emissão a beneficiada ainda não cumprira o meio século de idade o que só aconteceria em 167072. Todavia, por motivos não apurados, Maria nunca chegou a contrair votos matrimoniais, e como tal, a propriedade do ofício que se haveria de atribuir “à pessoa com quem casasse” ficou 71 - Vd. (DOC. 24). 72 - Vd. nota 42.

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em suspenso, aguardando resolução. O que não equivale forçosamente a considerar o lugar como vago e não preenchido. Sabe-se, a título de exemplo, que nesse período foi o irmão JOÃO CARDOSO DA CUNHA quem continuou o trabalho do pai como escrivão das sisas, mesmo sem ter sido encartado. Supôe-se, por isso, que de forma análoga terá sucedido enquanto tabelião do público, judicial e notas, exercendo o ofício durante a década de setenta, embora não se tenha encontrado documentação que o confirme. Também atrás ficou visto que no início da década de oitenta já teria falecido, o que justifica a entrada em campo do irmão mais novo, António, procurando reunir em torno de si a posse de ambos os ofícios.

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Para tal compareceu Maria da Cunha Cardosa – solteira e recém sexagenária – perante o tabelião de notas da Bemposta, Domingos Figueira, mandando lavrar nesse mesmo dia 12 de Fevereiro de 1681 um instrumento público, no qual nomeava em ANTÓNIO DA CUNHA CARDOSO o direito que tinha ao tabelionado paterno. Considerava-se naturalmente “incapaz de tomar estado pela sua idade de mais de cinquenta anos”, e afirmava que era aquele irmão quem a sustentava e lhe acudia às necessidades. A 9 de Setembro seguinte, D. Pedro, príncipe regente, mandava passar o alvará que – uma vez mais contrariando as ordenações – haveria de durar, não apenas um, mas doze anos. Efectivamente, António só foi encartado como tabelião das notas e judicial do concelho de Estarreja a 2 de Março de 1693 (DOC. 24), sendo D. Pedro II já rei de pleno direito há quase uma década. A cópia da carta no assento da chancelaria contém um pormenor contraditório, passível de tipificar alguma confusão entre os conceitos de “tabelião” e “escrivão” que semelha ter perpassado a segunda metade do século XVII. Com efeito, no treslado do alvará de 1681 o cabeça de ofício surge designado por “escrivão”, sendo mais abaixo encartado como “tabelião”! Longe de ser erro, o exemplo não é singular, consoante se pode verificar nas transcrições de alguns dos documentos anexados neste estudo. No assento detecta-se, igualmente, uma alteração na nomenclatura do ofício, desaparecendo a arcaizante expressão “do público”, substituída pelo mais concreto designativo “das notas” reposicionado para anteceder, tanto no espaço como na relevância, a forma “judicial”. Engano do escrivão Jerónimo da Nóbrega de Azevedo, ou a manifestação subliminar de uma lógica que haveria de mover a definitiva conversão dos “tabeliães” em “notários” ao romper do século XX? A vontade dessa mudança não era novidade entre a classe. A título de exemplo, o historiador Henrique da Gama Barros, na sua “História da Administração Pública em Portugal”73, transcreveu uma curiosa petição dos tabeliães de Lisboa a D. João I. Nela desenrolam a sua vontade de se identificarem por “notários” – como aliás acontecia na 73 - BARROS, H. G. (1914). História da Administração Pública em Portugal nos séculos XII a XV (Vol. III). Lisboa, Portugal: Typographia Castro Irmão, p. 726.

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maioria dos reinos e senhorios, com excepção de Portugal – argumentando ser “nome «fremoso» e apropriado a seus ofícios que são de notas”, e o nome “tabelião”, nesses senhorios, ser bastas vezes motivo de comentários jocosos! Não conseguiram então o aval do “Mestre de Avis”, e somente quatro séculos mais tarde, com o decreto de 14 de Setembro de 1900, se cumpriu aquela reivindicação. No seu preâmbulo, justifica-se a lei do seguinte modo: “Nenhum inconveniente havia na adopção do nome de notário que precedeu historicamente entre nós o de tabelião e é geralmente adoptado nos outros países.Tem talvez esse nome mais razão de ser em Portugal do que em qualquer outra nação; entre nós, o termo nota perdeu o seu sentido primitivo de apontamento para se organizarem os instrumentos e passou a representar o acto notarial na íntegra, generalizando-se o seu emprego nas expressões tabeliães de notas, cartórios de notas, livros de notas”.74 Finalmente, uma terceira anomalia do assento negou o conhecimento à posteridade, não só da caligrafia de António Cardoso da Cunha, como também do seu eventual sinal público. O que pode significar que o mesmo não chegou a pretender desempenhar o cargo, estando já consideravelmente ocupado com a escrita das sisas do concelho. Este facto pode justificar o enquadramento do citado João de Figueiredo enquanto tabelião em Estarreja nas duas últimas décadas do século XVII, provavelmente como arrendatário deste ofício. A emissão da carta foi precedida de nova tentativa junto da Santa Inquisição – claramente um modus operandi do capitão de Fonte Chã, visando colher mútuos dividendos capazes de reforçar, ou até mesmo alavancar, se necessário, qualquer um dos dois processos em curso. Enfim aceitaram-no por Familiar, “não sem graves lutas”, desconhecendo-se em que data, mas certamente depois de Novembro de 169575.

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Decorridos vinte anos, como se escreveu, ao renunciar na chancelaria por se sentir velho e doente, António pediu a D. João V a graça de ver suceder-lhe o filho BERNARDO CARDOSO DA CUNHA – então ainda sem a idade requerida para tal76 – na propriedade do registo das sisas de que abdicava. Era um promissor homem de leis, bacharel em Cânones por Coimbra e que se preparava – ou eventualmente já o fizera – para o exame ao grau de Formatura, que realizou a 19 de Junho de 171677. Não chegaria o pai a sabê-lo a ler no Desembargo do Paço, no verão do ano seguinte78. Cumpridos, entretanto, os vinte cinco anos de idade, Bernardo requereu ao rei o ofício das 74 - Decreto de 14 de Setembro de 1900. Diário do Governo. 210 (18 Set. 1900), p. 2675. 75 - Vd. nota 39. 76 - ADAVR, Paróquia de Pinheiro da Bemposta, Registos de baptismo (1671-1711), p. 97. Bernardo Cardoso da Cunha foi baptizado na Bemposta a 24/4/1692. 77 - AUC, Índice de Alunos da Universidade de Coimbra, letra C, nº 002207, Bernardo Cardoso (1708-1716). 78 - O dia referenciado da leitura é 12/8/1717. Vd. nota 62, p. 84.

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sisas que fora do pai, não deixando de justificar que o fazia como filho segundo, em virtude do “irmão mais velho se achar com ordens menores para sacerdote”. Tratar-se-ia, provavelmente, do licenciado José Cardoso da Cunha79, perdido que foi o rasto de Teotónio80 e João81. A autorização foi dada, enfim, por despacho de 11 de Maio de 1719 assinado pelo Marquês de Alegrete, conselheiro de Estado e Guerra, gentil-homem da Câmara do rei e vedor da sua Fazenda. Emitiu-se a respectiva carta no 31 seguinte (DOC.25). E se o pai, três décadas antes, pagara três mil e quinhentos réis de novos direitos para se ver investido na propriedade desse ofício, o filho investia agora, pela mesma causa, seis mil réis, quase o valor de uma “peça” – a moeda padrão de ouro da época82. Suportaram ambos, igualmente, as custas de “assinar” (200 réis) e da “avaliação” (1200 réis), além do que tiveram que pagar aos oficiais intervenientes no processo que, no caso mais antigo onerou novecentos e noventa réis e no mais recente não excedeu os quinhentos e cinquenta. Garantida a posse daquele “mantimento” com seus “proes e percalços”, perserverou Bernardo na senda de um lugar na magistratura. Conforme a opinião de Ana Isabel Ribeiro, numa sociedade onde o conceito da “limpeza de sangue” predominava e era factor de selecção, ser aceite no núcleo restrito do Santo Ofício – enquanto Familiar – pesava “no acesso a cargos e no estabelecimento de alianças matrimoniais”83. E esse foi também o caminho trilhado pelo novel escrivão das sisas do concelho de Estarreja, na sequência dos passos anteriores, dando início ao processo nesse mesmo ano de 1719. É precisamente através dos testemunhos nele constantes que é possível saber-se que dois anos mais tarde, em finais de 1721, já Bernardo Cardoso da Cunha residia na vila alentejana de Arronches, cumprindo ali um triénio de juiz de fora84.Vivia “à lei da nobreza”, sustentando-se das rendas de três quintas “muito boas” que tinha – uma delas, certamente, a de Fonte Chã, na Bemposta – e do foro de várias terras em Angeja e São Martinho de Salreu. Obrigado a residir fora, trazia então arrendado, na freguesia de Veiros, o ofício de escrivão das sisas.85 A situação manteve-se inalterada pelo menos até finais da década de trinta, em virtude de um segundo triénio cumprido por Bernardo nas mesmas funções, desta feita na cidade algarvia de Tavira86.

79 - ADAVR, Paróquia de Pinheiro da Bemposta, Registos de baptismo (1671-1711), fl. 79. Baptizado na Bemposta a 7/6/1688. AUC, Índice de Alunos da Universidade de Coimbra, letra C, nº 015672, José Cardoso da Cunha (1704-1711). Solteiro, em 1747 legitimou a filha Mariana de Almeida, então já casada com Manuel Tavares da Fonseca “o novo”. 80 - ADAVR, Paróquia de Pinheiro da Bemposta, Registos de baptismo (1671-1711), fl. 73. Baptizado na Bemposta a 19/2/1687. 81 - Ibid., fl. 87. Baptizado na Bemposta a 15/4/1690. 82 - Valia 6400 réis. 83 - (RIBEIRO, 2005: 4) 84 - Na chancelaria de D. João V não se encontrou a respectiva carta de nomeação. 85 - ANTT, Habilitações do Santo Ofício, Bernardo Cardoso da Cunha, letra B, maço 5, nº 81. 86 - Ibid./CHR/Chancelaria de D. João V, Doações, Liv. 127, fl. 281: Bernardo Cardoso da Cunha – Carta de juiz de fora da cidade de Tavira (15/10/1725).

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O facto de permanecer solteiro detendo cargos “de julgar ou de escrever”, indicia claramente que o absolutismo joanino deixara já cair a norma do casamento obrigatório dos oficiais do reino. Por isso Bernardo não teve geração legítima; e com a sua morte, aos sessenta e sete anos de idade87, cessa o histórico possível, aqui reconstituído no que ao ofício do registo das sisas de Antuã / Estarreja concerne no intervalo de tempo proposto.

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Ocorreu caso semelhante com MANUEL CARDOSO DA CUNHA, o irmão mais novo, em quem se esgotaria no ano de 1758 a varonia da Fonte Chã, e a correspondente posse do segundo tabelionato do judicial e notas no concelho estarrejense. Após a morte do pai no verão de 1717, pretendeu suceder-lhe na propriedade daquele ofício – que se supõe o pai traria arrendado – no que foi confirmado mediante provisão do rei “Magnânimo” de 4 de Fevereiro de 171988. Estava em vésperas de cumprir vinte cinco anos de idade. Contrariamente ao irmão que em simultâneo corria para escrivão das sisas – cargo pertença da Coroa – e a todos os antecessores no tabelionado da família, Manuel não careceu de renúncia prévia ou mercê régia. Ao soberano coube apenas confirmar a sua indicação para proprietário do ofício, após escolha prévia da abadessa de Arouca.

Autógrafo e sinal público de Manuel Cardoso da Cunha (1725)

87 - ADAVR, Paróquia de Pinheiro da Bemposta, Registos de óbito (1747-1860), fl. 28 vrs. Faleceu na quinta de Fonte Chã a 7/4/1760. 88 - ANTT/CHR/Chancelaria de D. João V, Doações, Liv. 125, fl. 205 vrs: Manuel Cardoso da Cunha – Provisão de confirmação de nomeação que a Abadessa do Mosteiro de Arouca lhe fez da propriedade do ofício de Tabelião do público, judicial e notas da vila de Estarreja.

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Assim se passava desde a viragem do século com todos os cargos de carácter concelhio em Estarreja. Apenas se estranha porque não foi sempre deste modo, levando em consideração o estatuto de donatárias do Couto de Antuã e Avanca – cujos limites coincidiam, grosso modo, com os do próprio concelho – de que se revestiam as religiosas do cenóbio arouquense há mais de quatrocentos anos89! Porém já em finais do século XV assim não acontecia, como o presente ensaio bem demonstra, submetendo-se a vontade das donatárias ao maior peso político, primeiro da Casa de Angeja, e depois da Casa Real. O que mudou, nesse caso, na transição para o século XVIII? A origem da alteração do paradigma reside na Restauração de 1640 e subsequente guerra com Espanha. Nesse conflito, entre muitos outros participantes lusos, deu o corpo ao manifesto o fidalgo Lourenço de Sousa da Silva e Meneses, aposentador-mor do reino. Segundo Salazar y Castro na “Historia de la Casa de Silva”90, foi capitão de cavalos, mestre de campo do Terço de Moura – vila que chegou a governar –, e seria preso durante o cerco a Juromenha de 1662. Depois de libertado, chegaria ainda à patente de sargento-mor de batalha no Exército do Alentejo, posto que ocupava em 1669, depois de assinado, no ano anterior, o Tratado de Lisboa que finalmente estabeleceu a paz com o reino vizinho. Iniciada a “Pedatura Lusitana” em 1667 quando era juiz de fora dos órfãos do Porto, Cristóvão Alão de Morais nela regista que por esses serviços na fronteira alentejana, e com base na comenda de São Tiago de Beduído de que Lourenço era titular, lhe deu o rei D. Afonso VI a vila de Estarreja, elevando-a a condado por carta de 12 de Novembro desse mesmo ano91. O douto genealogista, proprietário de uma quinta no concelho92, testemunha ainda que o novo conde não ficou, de imediato, na posse efectiva de Estarreja. E de facto, conforme Hugo Cálão, mestre em história e património especialmente dedicado à região de Aveiro, a documentação relativa ao padroado da igreja de Beduído deixa entrever um conflito jurídico arrastado até finais do século XVII, entre as freiras de Arouca – senhoras presumidas da vila – e a coroa – que dela fizera doação ao conde de São Tiago93. Concertadas as partes, saíram reforçadas as religiosas em matéria de controlo dos ofícios concelhios – o qual não detinham, de modo concreto, pelo menos há dois séculos; provavelmente mais. Recuperaram assim o direito à escolha e apresentação dos oficiais que 89 - Respeitando as últimas vontades da irmã – a Rainha viúva D. Mafalda Sanches – a 25/10/1257 o rei D. Afonso III coutou as vilas de Antuã e Avanca e dooas ao mosteiro de Arouca e sua abadessa, D. Mor Martins. 90 - SALAZAR Y CASTRO, L. (1685). Historia de la Casa de Silva (Vol. II). Madrid, Espanha, pp. 772-774. 91 - MORAIS, C. A. (1943-1948). Pedatura Lusitana (Nobiliário de Famílias de Portugal). (A. A. MirandaVasconcellos, A. A. Ferreira da Cruz, & E. E. Cunha e Freitas, Edits.) Porto, Portugal: Livraria Fernando Machado,Tomo II,Volume 2, pp. 238-239. 92 - Nos anos oitenta e noventa do século XVII, há referências nos livros paroquiais de Beduído a uma “Quinta do Doutor Cristóvão Alão”, situada no lugar de Santo Amaro. Presume-se que pertencesse ao reputado genealogista Cristóvão Alão de Morais, desembargador da Relação do Porto e corregedor do Cível na mesma cidade, falecido em 1693 com sessenta e um anos. 93 - CÁLÃO, H. (14 de Setembro de 2011). Padroados das Igrejas da Diocese de Aveiro. (H. Cálão, Ed.) Obtido em 8 de Fevereiro de 2019, de Arquivos Paroquiais da Diocese de Aveiro. Repositório virtual dos fundos de arquivo e livro antigo das 101 Paróquias da Diocese de Aveiro: http://arquivosparoquiaisaveiro.blogspot.com/2011/09/padroados-das-igrejasda-diocese-de.html

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serviriam num território cuja jurisdição lhes pertencia enquanto donatárias. Nada mais justo. Ao soberano passava a caber, meramente, a sua confirmação (por alvará ou provisão) e posterior encartamento. Confirmado por provisão régia em 1719, Manuel Cardoso da Cunha foi encartado tabelião do público, judicial e notas da vila de Estarreja a 5 de Dezembro de 1725 (DOC. 26). Tinha trinta e um anos, e supostamente terá servido outros tantos até 7 de Março de 1758, dia em que faleceu, solteiro e sem geração, na sua quinta da Fonte Chã94.

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A suposição anterior não é gratuita, e pode estender-se igualmente à órbita da quinta do Couto. Na realidade não foi possível apurar se, de facto, Manuel serviu pessoalmente o lugar, ou se o manteve arrendado, como é suspeita que o teria o pai António Cardoso da Cunha. Retomando os poucos livros de notas do século XVIII ainda sobreviventes em arquivo95 – certamente oriundos de algum dos ofícios tanto da Casa do Mato/Couto, como da Casa de Fonte Chã – aos dois já referidos de João de Figueiredo e João da Silva Rangel seguem-se, até 1758, uma meia dúzia lavrada por MANUEL FERNANDES DE ALMEIDA (1706-1715), uma dezena do punho de RAFAEL VALENTE (1715-1728), três de JOÃO FERREIRA DE CARVALHO 1727-1729), quinze da pena de GUALTER DA SILVA CARDOSO (1728-1744), dois de GONÇALO PINTO BANDEIRA (173034), outros tantos de VENTURA PEREIRA DA FONSECA (1738-39, 1744), três de JOÃO FERNANDES JORGE (1741-1746), nove de DOMINGOS MARQUES DA SILVA (1746-1758), dois de MANUEL DA SILVA VALENTE (1748-49, 1756-57), e três de JOÃO TAVEIRA (1750-53). Nenhum destes nomes consta na chancelaria joanina, pelo que não foram encartados como proprietários de qualquer um dos dois tabelionados de Estarreja. Não implica, todavia, que deles não fossem arrendatários. E expectável seria, caso contrário, a presença neste elenco, dos “Varela” e “Cardoso da Cunha”. Desconhecendo outra documentação que permita, eventualmente, clarear esta nebulosa, sobra a noção – quiçá ilusória – de que no reinado de D. João V, uma ou ambas as tradicionais linhagens de tabeliães do concelho usufruíssem dos rendimentos dos ofícios de sua propriedade, já libertas, contudo, do “fardo” inerente ao seu serviço.

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Em Salreu, por outro lado, uma vez conhecida a morte, na Beira Alta, do primogénito Sebastião, logo o irmão JOÃO DE AZEVEDO VARELA E CUNHA se posicionou junto das monjas de Arouca para lhe suceder nos ofícios da Casa. A abadessa não tergiversou; 94 - ADAVR, Paróquia de Pinheiro da Bemposta, Registos de óbito (1747-1860), fl. 24 vrs. 95 - Aveiro, A. D. (Ed.). (21 de Dezembro de 2018). Notariais – Cartório Notarial de Estarreja – 1º Ofício – Inventário. Obtido em 3 de Março de 2019, de Arquivo Distrital de Aveiro: http://adavr.dglab.gov.pt/wp-content/uploads/sites/5/2018/12/ Invent%C3%A1rio-PT-ADAVR-NOT-CNETR1.pdf

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como tal João foi apresentado para o lugar e o rei “Magnânimo” não pôs entraves à sua escolha, mandando passar um primeiro alvará de confirmação a 19 de Janeiro de 1709. Seguindo os passos do irmão, pediu que o soberano o encartasse em definitivo, o que aconteceu a 23 de Setembro do mesmo ano (DOC. 27). No prazo de quatro dias, o novo escrivão da câmara, almotaçaria, público, judicial e notas da vila de Estarreja fazia o requerido juramento e registava o sinal público que haveria de usar “em ofício das notas”.

Autógrafo e sinal público de João de Azevedo Varela e Cunha (1709)

Dez anos volvidos sobre a investidura do anterior proprietário, os novos direitos e fiança oneravam agora mais três mil réis, valendo um total de quarenta e nove mil réis. Acrescia à despesa mil e duzentos por ser ofício “de apresentação”, quinhentos “de feitio”, e o trabalho dos oficiais subira para mil cento e quarenta réis. Ao todo, entre alvará e carta, João de Azevedo Varela e Cunha desembolsou a quantia de cinquenta e dois mil quatrocentos e cinquenta réis. Caída em desuso a obrigatoriedade do casamento dos tabeliães, João só contraiu matrimónio doze anos mais tarde, já cinquentão. A noiva, Micaela Maria Barbosa da Fonseca e Sá, tinha menos de metade da sua idade, e era natural da quinta da Taipa em São Martinho de Sardoura, freguesia onde aconteceu a cerimónia96. Como era uso, foi consórcio arranjado, casando-se os noivos a 8 de Setembro de 172197, representados por procuradores “que expressaram os consentimentos dos contraentes livres na forma das suas procurações”. Quem

96 - ADAVR, Paróquia de São Martinho de Sardoura, Registos de baptismo, liv. M-2, fl. 20. Micaela era filha de Santos Barbosa de Sá e de sua mulher Escolástica Bernardes da Fonseca, senhores da quinta da Taipa, neta paterna de António Correia de Sá e Maria Barbosa Reimão, da quinta da Taipa, e materna do capitão Gonçalo da Fonseca Coutinho e de Maria Bernardes da Fonseca, senhores da quinta do Outeiro em S. Miguel de Paredes (Penafiel). 97 - Ibid., Registos de casamento, liv. M-2, fl. 60.

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falou e assinou pelo tabelião de Salreu, foi o “sobrinho”98 Francisco Barbosa da Cunha e Melo, jovem de dezasseis anos que na quinta do Barral da vizinha freguesia de Santa Maria de Sardoura acompanhava a velhice solitária do tio-avô João Barbosa da Cunha, uma das testemunhas do evento; pela nubente respondeu o irmão Santos Barbosa de Sá, outro jovem, com dezassete anos de idade, parente do primeiro e afilhado dos pais daquele99. Os factos anteriores sugerem, como adiante se verá, a mediação do acordo nupcial por parte do pai de Francisco – outro Francisco Barbosa da Cunha – revelando igualmente a continuada teia de interesses e parentesco que continuava a unir os descendentes da Casa do Mato em torno dos principais ofícios de escrita do vetusto concelho de Antuã / Estarreja. Vem a propósito, neste ponto, retomar a senda da escrivania dos órfãos, deixada em suspenso no final da vigência de João da Silva.

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Já ficou dito que em 1657 era ROQUE RIBEIRO quem se arrogava como escrivão dos órfãos de Estarreja. Supôe-se, por isso, o falecimento em data anterior de João da Silva, o qual, sabe-se pelos nobiliários locais, só teve filhas do seu casamento com Filipa da Cunha de Azevedo100. Excepção feita à primogénita, as restantes quatro viveram solteiras, sendo conhecidas pelas “Donas do Mato” por ali habitarem a casa familiar. Quanto à mais velha, de nome Margarida da Silva e Cunha, casou por duas vezes: primeiro com Diogo de Pinho Valente101, seu conterrâneo, com quem viveu em quinta própria no lugar de Adou de Cima, em São Martinho de Salreu; enviuvando precocemente, voltou a contrair votos de matrimónio, com João de Matos Leitão de quem nada mais se conhece. Teve filhos de ambas as uniões, destacando-se o doutor João da Silva da Cunha, primonato em meados dos anos cinquenta do século XVII, bacharel com formatura em Cânones por Coimbra (1670-1676)102.

98 - As aspas, da responsabilidade do autor, significam que não era, tecnicamente, sobrinho – consoante o designa o cura de S. Martinho de Sardoura. Seria certamente um tratamento familiar, uma vez que João de Azevedo Varela e Cunha era primo direito de Maria Clara da Cunha de Azevedo, mãe de Francisco. Quase como irmãos, cresceram juntos em Salreu nas duas últimas décadas do século XVII, entre as vizinhas quintas do Couto e do Mato onde residiam. 99 - ADAVR, Paróquia de São Martinho de Sardoura, Registos de baptismo, liv. M-2, fl. 35 vrs. 100 - Na realidade, os genealogistas dão-lhe um único filho, chamado Tomé da Cunha, não referindo qualquer geração do primeiro casamento de Filipa da Cunha, com Francisco Boto. O presente estudo demonstra que houve um filho nascido deste matrimónio. Deverá ser o aludido Tomé, de quem – seguindo a frei Bernardo do Amaral ou Felgueiras Gaio – se perdeu o rasto na Índia. 101 - Diogo era filho de Miguel Dias, natural de Salreu, o qual, de acordo com frei Bernardo do Amaral, foi familiar do Santo Ofício e cavaleiro professo da Ordem de Santiago, atributos que não foi possível confirmar documentalmente. Dos testemunhos relativos a uma inquirição para o Santo Ofício de um parente, confirmou-se apenas que Miguel Dias foi opulento e rico, sustentando-se de sua fazenda e chegando a servir como juiz no concelho de Antuã. ANTT, Habilitações do Santo Ofício, João Luís de Almeida, letra J, maço 9, nº 285. Por sua mãe, Domingas Valente, Diogo era neto do influente capitão de Avanca, Diogo Valente. 102 - AUC, Índice de Alunos da Universidade de Coimbra, letra C, nº 015614, João da Silva da Cunha (1670-1676).

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Roque Ribeiro é omisso na chancelaria-mor do reino pelo que nunca foi encartado no ofício que servia.Também não se alcançou quanto tempo desempenhou o cargo, concerteza mandatado por alvarás anuais e provimentos do procurador da comarca. E depois dele espraia-se um vazio de meio século, em que nada permite aclarar a trajectória da escrita dos órfãos e a identidade dos seus oficiais. Conjectura-se, por tal, uma evolução similar ao ocorrido na escrivania das sisas sensivelmente no mesmo período: a sua propriedade há quatro décadas que vagara por morte do anterior possuidor, “sem se saber no discurso dos ditos anos quem ouvesse sido proprietário do dito ofício”103, servindo consecutivamente todo esse tempo, o cunhado e dois sobrinhos do defunto. Estampando o exemplo no respeitante aos escrivães dos órfãos de Estarreja, quem sabe se o não foram, da mesma forma, algum dos genros de João da Silva e, já na década de oitenta, aquele seu neto licenciado? E o mais explícito sintoma dessa possibilidade prendese com o óbito deste – solteiro e sem geração – a 6 de Setembro de 1707, ao que parece ocorrido na sua quinta de Adou de Cima, herdada dos pais, onde vivia104. De facto, ano e meio depois do trágico evento, um alvará de D. João V confirmava a apresentação feita pela “Madre Abadessa e Deputadas do convento de Arouca” do novo proprietário do ofício, cessando dessa forma, nos livros da chancelaria, o hiato não documentado acerca do mesmo.

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Ora o nomeado foi, precisamente, aquele FRANCISCO BARBOSA DA CUNHA atrás mencionado, que assim se tornou escrivão dos órfãos da vila de Estarreja, emitindo-se a respectiva carta cerca de seis meses depois do alvará de confirmação, a 26 de Agosto de 1709 (DOC. 28). Neste instante cumpre recordar que, embora de ramos diferentes, João de Azevedo Varela, João da Silva e Francisco Barbosa partilhavam o apelido Cunha, sendo mutuamente primos segundos, e todos bisnetos de Jerónimo da Cunha, o senhor da quinta do Mato e tabelião de Antuã nos alvores do século XVII. Um facto capaz de reforçar a asserção do parágrafo anterior e que tornava Francisco um “natural” sucessor do seu finado primo João.

103 - Vd. (DOC. 21). 104 - Residência e data do óbito de João da Silva da Cunha, são retiradas do manuscrito genealógico de frei Bernardo do Amaral.

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Outra circunstância terá sido a estreita ligação dos três a São Martinho de Salreu, onde o primeiro vivia no lugar do Couto, o segundo no de Adou de Cima, e o terceiro tinha a cargo a quinta do Mato – por ausência dos sogros em Vila Real105 – residindo periodicamente tanto ali como em Ovar, onde era capitão de ordenanças da vila. Bem informado acerca dos sucessos da freguesia, Francisco não tardou, decerto, a acorrer a Arouca na sequência da morte do primo.

Assinatura (1694) e pedra de armas de Francisco Barbosa da Cunha; escudo partido de Barbosa e Cunha (de Tábua) Crédito fotográfico da Pedra de Armas: António Fernando de Sequeira Barbosa Sottomayor

A bem da verdade, terminara naquele a geração do último escrivão dos órfãos encartado que se conhecia. E em virtude do parentesco, nele assentaria como uma luva a eventual sucessão no ofício, excluído que estava o primo Varela, recentemente apresentado para tabelião, como se viu. Invocado o facto, anuiram as religiosas, talvez com um empurrão da madre Clara Maria, irmã do suplicante e professa no cenóbio arouquense.

105 - No senhorio da quinta do Mato, aos irmãos António e Diogo da Cunha de Azevedo e à viúva de ambos, dona Cecília de Melo, sucedera Jerónimo Pereira de Melo, respectivamente sobrinho e filho dos anteriores. Casado em Vilar de Maçada em 1668, residia em Vila Real onde foi morgado de São Paio (Ponte-Mouçós), passando a Salreu na década de 1680 após a morte da mãe. Regressaria em definitivo à capital transmontana com a mulher e dois filhos, já entrado o novo século, ficando a viver no Mato a filha Maria Clara de Cunha de Azevedo, casada com o capitão de Ovar Francisco Barbosa da Cunha.

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Três anos após o aludido casamento de São Martinho de Sardoura e a poucos dias do Natal de 1724, Francisco Barbosa da Cunha herdou do tio João a quinta do Barral106. Decorrida meia dúzia de anos, já sexagenário, decidiu-se a trocar os ares menos saudáveis da laguna aveirense, pelas verdejantes encostas do Paiva, mudando-se definitivamente para o seu novo senhorio de Sardoura.

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Antes, porém, garantiu para o filho FRANCISCO BARBOSA DA CUNHA E MELO o comando das ordenanças de Ovar e, com licença régia, desistiu da propriedade da escrivaninha dos órfãos, assegurado de que aquele a receberia das mãos das freiras, facto que se verificou na sequência do seu falecimento em finais do Outono de 1736107. Acto contíguo, casou-o também em Salreu, com uma das irmãs de frei Bernardo do Amaral, dona Arcângela Micaela Josefa, da família Almeida e Amaral cujo solar ainda hoje prevalece na freguesia conhecido como “Casa do Couto”108. Unidos por procuração na igreja de São Martinho, os noivos receberam as bênçãos dias mais tarde, a 21 de Novembro de 1733109, na capela ovarense de Nossa Senhora da Graça, numa cerimónia oficiada pelo irmão mais velho da noiva, D. Agostinho Manuel da Silva e Amaral, reitor de Fermelã. Entretanto, Francisco fora agraciado com o hábito de cavaleiro da Ordem de Cristo, associado a uma tença anual de quarenta mil réis, por pedido expresso feito a D. João V pelo tio materno João Teixeira de Melo e Castro. A mercê – datada de 4 de Junho de 1731, mas apenas concretizada postumamente em 1734110 – pretendeu recompensar, na pessoa do sobrinho, os valorosos serviços prestados por aquele capitão da cavalaria deTrás-os-Montes, no conflito internacional pela sucessão ao trono espanhol que opôs Habsburgos e Bourbons na transição do século. Por fim, aos trinta e dois anos de idade, já finado o pai, foi encartado a 15 de Maio de 1737 como proprietário do ofício de escrivão dos órfãos de Estarreja (DOC. 29). Percebese a maior valia da escrita dos órfãos face aos tabelionados – quer o dos Varela quer o dos Cardoso da Cunha – sabendo que desembolsou de novos direitos setenta mil réis, enquanto aqueles pagaram, respectivamente, as quantias de quarenta e nove, e quarenta mil da mesma moeda. Ainda nesse ano, e por se terem formado seis companhias de ordenanças em Ovar, foi o eleito daquele concelho para estrear o cargo de capitão-mor111.

106 - ADAVR, Paróquia de Santa Maria de Sardoura, Registos de óbito, liv. 12, fl. 42 vrs. 107 - Ibid., liv. 13, fl. 11. 108 - Arcângela era filha de João Rebelo de Almeida, familiar do Santo Ofício e capitão de infantaria na “Guerra da Sucessão de Espanha”, e de sua mulher e prima Mariana Nogueira de Pinho, senhores da “Casa do Couto” em S. Martinho de Salreu. 109 - ADAVR, Paróquia de Ovar, Registos de casamento 1718/1735, fl. 241 vrs. 110 - ANTT/CHR/Chancelaria de D. João V, Doações, Liv. 88, fl. 152 vrs: Francisco Barbosa da Cunha e Melo – Carta de padrão de 28000 réis; Chancelaria da Ordem de Cristo, Liv. 101, fl. 133: Francisco Barbosa da Cunha e Melo – Carta de padrão de 12000 réis. 111 - TEIXEIRA DE PINHO, J. F. (1959). Memórias e Datas para a História daVila de Ovar. Ovar, Portugal: Câmara Municipal de Ovar, pp. 57-60.

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Não lhe poupou elogios o cunhado Bernardo. Através da sua pena fradesca, legou à posteridade a imagem de um “cavaleiro bem estimável pelo agrado e docilidade do génio com que trata a todos, servindo a pobreza, e compondo as suas discórdias, já em causas crimes, já nas cíveis, per si e pelos seus amigos, que de todos é atendido e respeitado, porque em tudo tem Espíritos nobres, e se faz digno de Eterna memória”. Viveu oitenta anos112 e foi o penúltimo proprietário de ofícios concelhios em Antuã / Estarreja, com raízes na Casa do Mato. Seu filho José Manuel seguiu-lhe as pisadas enquanto capitão-mor e escrivão dos órfãos, já reinava D. Maria I. Escreve Teixeira de Pinho na sua “História de Ovar” que foi demitido duas décadas mais tarde, por abuso de autoridade113!

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Resta conhecer-se o ocaso da linhagem no que concerne ao ofício que juntava o tabelionato do público, judicial e notas, bem como a escrivania da câmara e almotaçaria da vila de Estarreja. Relembre-se que desde 1709 era seu proprietário João de Azevedo Varela e Cunha, o qual casou e teve filhos tardiamente. Por essa razão, ao falecer na primeira metade de 1728114 depois de quase vinte anos à cabeça do ofício, não tinha o seu varão primogénito mais de sete anos, inviabilizando-se, desse modo, qualquer hipótese de conservação daquela escrita no seio da família. Ciente da oportunidade, não hesitou D. Maria de Berredo, abadessa de Arouca115, em quebrar inapelavelmente uma sucessão dinástica que remontava ao escudeiro Afonso Pires e ao distante ano de 1511. Vaga que estava a propriedade do ofício, nela apresentou o irmão, DIOGO LEITE CABRAL, fidalgo de meia idade da casa arouquense de Eiriz116. Uma provisão régia de 3 de Agosto de 1728 confirmou a nomeação, e na Primavera do ano seguinte, a 23 de Maio, foi passada carta em forma do ofício (DOC. 30), que assim escapou, de forma perene, ao domínio dos Cunha do Mato.

112 - ADAVR, Paróquia de Ovar, Registos de óbito 1780/1786, fl. 63. Faleceu a 11/2/1786. 113 - (TEIXEIRA DE PINHO, 1959: 56) 114 - Vd. (DOC. 30). 115 - D. Maria de Berredo está documentada como abadessa do mosteiro de Arouca nos anos de 1727 a 1729. Vd. nota seguinte, p. 30. 116 - BRITO, F. (s.d.). Casa de Eiriz. O livro da Casa de Eiriz. Obtido em 28 de Março de 2019, de Academia: https://www. academia.edu/23609472/CASA_DE_EIRIZ._O_Livro_da_Casa_de_Eiriz

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Pedra de armas de Diogo Leite Cabral, baseada na carta de brasão de 17 de Abril de 1732; escudo esquartelado de Tavares, Teixeira, Cabral e Castelo-Branco Crédito fotográfico: Património & História / Facebook

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Resumindo à guiza de conclusão, ficou traçada uma panorâmica da evolução dos principais ofícios do concelho de Antuã / Estarreja, entre finais do século XV e meados do século XVIII. Esse recorrido permitiu a noção paralela de um concelho em forte crescimento demográfico, nomeadamente durante o século XVI, no qual se operaram sucessivas modificações administrativas que o indiciam. Nesse contexto, existia à partida um único tabelião reunindo a escrita dos foros do “público” e “judicial”, nos concelhos de Antuã e Figueiredo, e nas terras do arcediagado do Vouga. Num segundo oficial, andavam reunidas as correspondentes escritas dos “órfãos” e das “sisas”, das quais, entrado o século XVI, a primeira passou à alçada do tabelião, e a segunda – por ser receita do reino – permaneceu àparte em oficiais de afectação régia. O foral de 1519 e, principalmente, a criação, em 1521, dos juizados dos órfãos e das sisas para o serviço de ambos os concelhos, são sinónimos de que a população ultrapassara já, no final do reinado de D. Manuel I, o número de quatrocentos vizinhos, correspondente a mais de mil e quinhentos indivíduos residentes. No prazo de duas décadas, o avolumar de trabalho faria separar da tutela do tabelião de Antuã e Figueiredo, a escrita relativa ao arcediagado do Vouga. [ 79 ]


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O binómio restante apartou-se em 1553, talvez por igual motivo, mas certamente por maior conveniência e interesse de D. João III, o qual fez tabelião de Antuã um fidalgo da sua Casa, nele reunindo a escrita concelhia de maior relevância: “público “, “judicial”, “notas”, “órfãos”, câmara” e “almotaçaria”. Face ao volumoso afã daquele, oito anos volvidos o rei criou um segundo tabelião no concelho, o qual – muito convenientemente – sempre andaria associado à escrita das “sisas”, imposto do foro régio. A população de Antuã mantinha-se em crescendo já no novo século, embora afectada regularmente pelos períodos de maior ou menor salubridade na laguna de Aveiro. Juntamente com a grande extensão territorial a cobrir, são as razões que justificam a decisão de D. Filipe II, em 1616, de retirar a escrita dos órfãos ao tabelião e escrivão da câmara e almotaçaria, criando assim uma escrivania independente, a qual, obstando a conflitos de interesse, manteve na mesma família do tabelião lesado. Coexistiram desse modo no concelho, ao longo do século XVII, dois ofícios de tabelião do “público”, “judicial” e “notas”, afectos a duas famílias nucleares que se tocavam por parentesco próximo. Numa andava igualmente a escrita da “câmara e almotaçaria” e, embora em ramo secundário, a dos “órfãos”. Noutra subsistiam ainda as “sisas”. A única mudança introduzida pela centúria de setecentos, decorreu do renovado ascendente das monjas de Arouca sobre o concelho de que eram donatárias. Efectivamente, pelo menos desde o tempo de D. João II, os principais ofícios do concelho de Antuã não foram tutelados pela instituição monacal a que legitimamente pertenciam: o convento de Arouca. Estiveram, pelo contrário e face ao maior poderio no terreno, sob a alçada política da nobreza local. Primeiro dos influentes Albuquerque e Moniz – senhores de Angeja. Depois, na segunda metade do século XVI e com patrocínio régio, sob a tutela dos Cunha e Andrade Cardoso – de fidalguia menos relevante, implantada, respectivamente, em Salreu e na Bemposta; linhagens que na segunda década de seiscentos se uniram no troco comum dos primeiros – com origem no Mato – permanecendo dominantes na escrita concelhia até ao advento do século seguinte. Só então, e como resultado de prolongado pleito – cujo mote foi a usurpação que lhe fazia o recém-nascido condado de São Tiago de Beduído – conseguiu o mosteiro de Arouca retomar parte do controlo político perdido, neste particular mediante a recuperação da prerrogativa de selecção dos seus oficiais. Assim mesmo, as freiras não alteraram o status quo prevalecente, enquanto a tradicional conjuntura que regia as sucessões dinásticas o não proporcionou. Quando tal aconteceu, a idade juvenil do putativo herdeiro ditou o términus da carreira de tabelião e escrivão da câmara e almotaçaria na Casa do Mato / Couto, em 1728; e a quebra de varonia aliada à falta de geração legítima, retirou à Casa de Fonte Chã a posse do segundo ofício de tabelião, trinta anos adiante. Embora excedendo os limites cronológicos deste ensaio, cabe afirmar que unicamente o ramo dos capitães de Ovar se alongou à cabeça da escrivaninha dos órfãos até 1826, ano em que morreu José Manuel Barbosa da Cunha e Melo, o derradeiro titular oriundo da Casa do Mato. Andava então o seu presumível herdeiro fugido em Espanha no âmbito das lutas liberais. [ 80 ]


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Também se pôde atestar durante o período analisado, a inexistência de venalidade no processo de transmissão dos ofícios em questão. Contrariamente, foi o factor hereditário que maioritariamente prevaleceu na escolha dos novos oficiais, acrescido de uma baixa percentagem atribuída a imposições régias ou dotes matrimoniais. Registaram-se igualmente algumas datas-chave na evolução onomástica oficial do concelho, entre o arcaico “Antuã” e o moderno “Estarreja”, sendo o dia 21 de Outubro de 1622 o mais antigo encontrado em que primeiro surge – embora pontualmente – a designação que persiste na actualidade. Finalmente, demonstra-se o equívoco genealógico das fontes de Frei Bernardo do Amaral, reproduzido pelo notável Felgueiras Gaio. A linhagem dos Cunha, da quinta do Mato de São Martinho de Salreu, não tem origem no casal Bento da Cunha Perestrelo e Antónia de Pina Mascarenhas. Consequentemente não é oriunda da Casa conimbricense de Sub-Ripas. Eventualmente poderá compartilhar com aquela a sua génese, remontando à linha arcaica e nobilitada do senhorio de Tábua. Contudo, as informações disponíveis de momento, não o desmentindo, também o não permitem confirmar. Fica igualmente contestado o motivo invocado pelo monge genealogista, através do qual a Casa do Mato se tornara proprietária dos ofícios concelhios de Antuã, e da administração do hospital de Albergaria-a-Velha: um suposto acto de generosidade e altruísmo de Maria Jerónima de Azevedo para com a coroa. Foram afinal mais prosaicas as motivações da mercê régia, e no sentido de um maior controlo de um território que, de facto, lhe não pertencia. O eleito foi, pelo contrário, o marido daquela, António da Cunha, quiçá – dando razão à velha máxima – por “estar no sítio certo à hora certa”. Simplesmente… era moço da câmara do rei, e irmão do anterior proprietário! [ 82 ]


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APÊNDICE DOC. 14 ANTT, Chancelaria Régia, Chancelaria de D. Filipe II, Livro 34, fl. 93, doc. 1 1615/07/16 Jerónimo da Cunha – Alvará de renúncia de ofício [fl. 93] Dezembargadores do paco amigos Avemdo respeyto a que Jeronimo da Cunha porpiatayro dos oficios de tabalião do publico Judicial E notas E escrivão dos orfãos camara E almotaceria do comcelho de Amtoán aver doze anos que os serve com satisfação E ser velho E doente E não poder servir os ditos ofícios como constou por ymformação do coregedor da comarca da cidade de coymbra Ey por bem e me praz de lhe fazer merce de Licemça para poder renumciar os ditos ofícios: os de tabalião do publico judicial e notas em hum seu filho E o de escrivão dos orfãos camara E almotaceria do dito comcelho de Antoam em outro filho ou filha pera a pesoa que com ella cazar pello que vos mando que eyxamineis ao dito seu filho em que renumciar os ditos ofícios de tabalião E semdo apto E não tendo ympidimento algum pera os aver de servir lhe facais passar carta em forma deles mostrando a que tinha o dito Jeronimo da Cunha seu pay E sua renunciação pagando primeyro os direytos ordenados com declaração que havendo Eu por bem de lhos tirar minha fazenda não ficara por yso obrigada a satisfação alguma ¶ E outrosi Eyximinareis ao filho do dito Jeronimo da Cunha en quem renumciar os ofícios de escrivão dos orfãos camara E almotacaria acima nomeados E semdo outrosi apto E não tendo ympidimento algum pera os servir lhe faseis pasar carta em forma deles mostrando a que tinha o dito seu pay E sua renumciação pa [fl. 93v] gando primeyro os direytos ordenados E renumciando os en sua filha Eyxaminareis a pesoa que com ella ouver de casar E sendo apta E não tendo ympidimento algum como dito he lhe dareis niso despacho pera com elle E este alvara depois que fizer testo estar cazado com a filha do dito jeronimo da cunha comforme ao sagrado comsilio tredemtino lhe ser pasado carta em forma deles mostrando a que tinha o dito seu sogro E sua renumciação pagando primeyro os direytos ordenados na chamcelaria com declaração que avemdo Eu por bem de lhe tirar os ditos ofícios ou ao filho do dito Jeronimo da Cunha que nele o renumciar o poderey fazer sem pro yso minha fazemda lhe ficar obrigada a satisfação alguma Francisco Pereira a fez em lixboa a dezaseis de julho de mil e seis cemtos E quimze João Travacos da Costa o fez escrever. DOC. 15 ANTT, Chancelaria Régia, Chancelaria de D. Filipe III, Livro 1, fl. 67 vrs., doc. 2 1619/10/18 Francisco Boto – Carta de escrivão dos orfãos do concelho de Antuã [fl. 67v] Dom fillipe etc. Aos que esta mjnha carta virem faço saber que por parte de francisco boto me foi apresentado hum meu alvará por mjm asinado e pasado por mjnha chancelaria do coal o treslado he o seguimte ¶ Eu Ell Rej fasso saber Aos que este alvará virem que avendo respeito A ter fejto mersse A Jeronjmo da Cunha escrjvam do pubrico judiçial notas Almotassarja camara e orfaos do comselho de Antoam De lljssensa para renumcjar os ditos offiçios em hum filho e filha repartjmdo o dos orfaos camara Almotaçarja perssj e os do pubrico judicial tambem perssj e o dito concelho sser muito gramde e ficarem os ditos offiçios mjlhor repartidos e os moradores delle mjlhor Aviados repartindosse o ofiçio [ 83 ]


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descrivam dos orfaos perssj e os mais da mesma manejra por desta ficarem com mais ygualdade no remdimento mjlhor servidos como constou por jnformaçam do provedor da comarca da vila desguejra ej por bem de fazer mersse Ao dito Jeronjmo da Cunha de lissensa para que possa repartir os ditos offiçios etc. pella dita manejra pelo que mando Aos meus desembargadores do passo enxamjnem o filho em quem o dito jeronjmo da cunha nomear ou renumcjar a parte dos ditos offiçios na manejra assjma declarada e ssemdo apto lhe fareis passar carta em forma delles e assj enxamjnem A pessoa que ouver de casar com a dita sua filha com quem outrossj em quem o dito Jeronjmo da Cunha renumcjar a outra parte dos ofiçios e ssemdo apto como dito he e nam temdo ympedimento Algum para aver de sservir os ditos offiçios lhe dareis despacho para depois de fazer sserto ser casado e recebjdo por pallavras de prezemte comforme Ao sagrado comsilljo tirdimtino com a filha do dito Jeronjmo da Cunha lhe sser passada carta em forma dos ditos offiçios mostramdo por isso a que o dito Jeronjmo da Cunha delles tinha pagamdo por isso os dereitos e ordenados com [fl. 68] declarasam que Avemdo eu por meu serviço de lhos tirar em algum tempo mjnha fazemda lhe nam ficara por isso obrigada A ssatisfassam alguma e este me apraz que valha e tenha força e vigor posto que o efejto delle Aja de durar mais de hum anno sem embargo da ordenassam em contrario Alvaro corea o fes em lixboa a tres de novembro de mil sseissentos e dezasseis eu joam travasos da costa o fes escrever Pedindome o dito francisco boto por mersse que por coanto o dito Jeronjmo da Cunha por vertude do Alvara assima yncorporado renumçiar nele o ofiçio descrivam dos orfaos do dito comselho de antuam como constava de hum pubrico isstrumento de dote cazamento que Aprezemtou e que dezia sser fejto e assinado do sjnal pubrico de Ambrosio dias dolivejra taballiam do pubrico judiçial e notas do dito comselho Ao premeiro dia do mes de novembro do ano passado de mil sseissentos e dezojto e isto por cazar com fillipa da Cunha filha do dito Jeronjmo da Cunha com a coal estava cazado e ressbjdo comforme ao ssagrado consilio tirdimtino como constava de huma sertidam que outrossj apresentava do padre Antão que foi cura da jgrejja de ssam martinho de Salreu bispado de cojmbra por elle fejta e assinada Aos dezassete dias do mes de julho passado deste anno prezemte de mil sseissemtos e dezanove e reconhecida por francisco rabello taballiam no dito comselho de Antuam ouvese por bem de lhe mamdar passar carta em forma do dito ofissio descrivam dos orfaos e visto sseu requerimento Alvara Asima yncorporado jsstromento de renumçiassam sertidam de como esta casado e recebido com a dita fillipa da Cunha e por confjar dele francisco boto que no de que o emcaregar me servira bem e fiellmente como a meu sservisso e ao bem das partes cumpre e por lhe fazer merse hej por bem e o dou ora daquj em djante por escrivam dos orfaos do dito comselho de Antuam asj e da manejra que o elle deve sser e como o foj o dito Jeronjmo da Cunha seu ssogro que o dito Jeronjmo da Cunha o ofissio tinha por carta que me foj aprezemtada e o coal ofissio elle terá e sservira emcoanto o eu ouver por bem e nam mandar o contrajro com declarassam que Avemdo eu por meu servisso de lho tjrar ou isstingir em Algum tempo mjnha fazenda lhe nam ficara por isso obrigada a satisfassam alguma e portanto mando aos juízes do dito comselho de Antoam e a todas as outras justisas offiçiais e pesoas a quem esta mjnha carta for mostrada e o conteudo della com dereto pertencer que metam em posse do dito ofissio descrivam dos orfaos do dito comselho Ao dito francisco boto que lhe o deixem servir e delle usar e aver todos os prois percalços que lhe deretamente pertenserem sem lhe a jsso sser posta duveda nem duveda alguma por que eu o ej por bem porcoanto foj examjnado na mesa do despacho dos meus desembargadores do passo e avido por Apto para sservir o dito offiçio e pagou de ordenado Ao thezoureiro de mjnha chancelaria mil reaes que lhe foram carregados em reseta como se vio por hum isstromento em forma na coal chancelaria jurara Aos ssantos Avamgelhos que bem e verdadejramente os sirva goardamdo a mjm meu sservisso e as partes seu dereto e de conprir e goardar o regimento [ 84 ]


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que delle levar e o alvara assima imcorporado e carta de Jeronjmo da Cunha sse nam romperam por ficarem e (?) em vigor pera os mais offiçios em sseus registos deles do livro das mersses se poram verbas do conteudo nesta carta de que aprezemtava ssertidois nas costas della de miguel Maldonado marçal da costa fidalgos de mjnha caza Dada na çidade de lixboa Aos dezojto dias do mes doutubro // Ellrej noso senhor o mandou pelos doutores (?) pinto Antonjo cabral pero lopes o fes Anno de sseis ssemtos e dezanove eu miguel Maldonado o fis [assinatura] Miguel Maldonado DOC. 16 ANTT, Chancelaria Régia, Chancelaria de D. Filipe III, Livro 15, fl. 45 vrs., doc. 2 1625/07/01 João da Silva – Carta de escrivão dos órfãos do concelho de Estarreja [fl. 45v] Dom felipe etc. Aos que esta minha carta virem faco saber que por parte de joão da silva morador em são martinho de salreu comarca de esgueira me foi apresentado de hum alvara tirado dos livros dos registos de minha chanselaria.mor en huma sertidão asinada per miguel maldonado fidalgo de minha casa escrivão da dita chanselaria do qual o treslado he o seguinte eu el Rej faco saber Aos que este alvara virem que avendo respeito a francisco boto já falicido que foi escrivão dos orfãos do conselho de estareja servir o dito oficio três anos (?) e proseder nelle com verdade e inteiresa sen cometer erro e o dito oficio lhe ser dado en dote com filipa da cunha sua molher a qual me pidio a propriedade delle para a pesoa que com ella casar por ficar mosa de menos de vinte anos e hum filho que lhe ficou do dito seu marido de idade de dois anos e erdar do dito seu pai dous mil crusados segundo constou [fl. 46] por informasão do provedor da comarca da villa desgueira hei per bem de faser merce da propriedade do dito oficio a dita felipa da cunha para a pesoa que com ella casar e mando aos meus desembargadores do paço que ixaminem a pesoa que ouver de casar com a dita felipa da cunha Antes deo reseberem e achando que he apto e que não ten enpidimento algun pera aver de servir o dito oficio lhe darão disso despacho e constando lhes despois que esta recebido com a dita felipa da cunha como manda o santo consilio tridentino lhe passarão carta en forma do dito oficio apresentando a que o dito francisco boto delle tinha pagando primerio os dereitos ordenados en minha chanselaria e com declarasão que avendo eu por meu serviso de lho tirar ou estinguir en algun tenpo o poderei faser livremente sem por iso minha fasenda lhe ficar obrigada a satisfasão algua e isto com declarasão que a dita felipa da cunha se casara dentro en dous anos e isto me pras que valha posto que o efeito delle aja de durar mais de hum ano sem embargo da ordenasão do segundo livro titolo 40 en contrairo joão francisco o fes en lixboa vinte hum de outubro de mil e seis sentos e vinte dous duarte corea o fes escrever E pidindo me o dito joão da silva por merce que por quanto elle estava casado [fl. 46v] E resebido conforme o sagrado consilio tridentino com a dita felipa da cunha como constava de uma sertidão que apresentava de jeronimo de crasto emcomendado na igreija de san martinho de salreu por elle feita e asinada aos nove dias do mes de junho deste ano presente de mill e seis sentos e vinte cinco e reconhesido por antonio de andrade tabalião do publico judicial e notas no conselho da villa da benposta ouvese por bem de lhe mandar passar carta en forma do dito oficio avendo por relevado não casar a dita felipa da cunha no termo dos dous anos E visto seu requerimento alvara asima encorporado e sertidão de como esta casado e recebido com a dita felipa da cunha e por confiar delle joão da silva que no de que o encaregar me servirá bem e fielmente como a meu serviso e bem das [ 85 ]


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partes cumpre e por lhe faser merce hei por bem e o dou ora daqui en diante por escrivão dos orfãos do conselho de estarreja asi he da maneira que o elle deve ser E como o foi francisco boto primeiro marido da dita felipa da cunha por cujo falecimento o dito oficio vagou o qual oficio elle tera e servira enquanto eu ouver por bem e não mandar o contrario com declarasão q avendo eu por meu serviso de lhe tirar ou estinguir en algum tenpo minha fazenda lhe não ficara por isso obrigada a satisfasão alguma e por tanto mando ao provedor da co [fl. 47] marca da villa de esgueira e a todas as outras justisas oficiaes e pesoas a que esta minha carta for mostrada e o conteudo della con dereito pertenser que metão en pose do dito oficio ao dito joão da silva e lho deixen servir e delle usar E aver todos os proes e per calcos que lhe dereitamente pertenser sem lhe aija ser posto duvida nem enbargo algum por que asi o ei por bem por quanto foi examinado na mesa do despacho dos meus desembargadores do paco e avido por apto para servir o dito oficio e pagou de ordenado delle ao tesoureiro de minha chanselaria mill reis que lhe forão caregados en reseita como se vio por seu conhecimento en forma na qual chanselaria jurara aos santos Evãojelhos que bem e verdadeiramente servira guardando a mi meu serviço e as partes seu dereito e de cumprir e guardar o regimento que della levar dada na cidade de lisboa ao primeiro dia do mes de julho el Rei nosso señor o mandou pelos doutores alvaro lopes monis e inacio fereira Anbos do seu conselho e seus desembargadores do paso pero lopes a fes ano do nacimento de nosso señor jesu cristo de mil e seis sentos e vinte cinco miguel maldonado a fes escrever Consertado [assinatura] Miguel oliveira lobo DOC. 17 ANTT, Chancelaria Régia, Chancelaria de D. Filipe III, Livro 31, fl. 235, doc. 2 1628/10/23 Diogo da Cunha – Alvará de tabelião do público, judicial, notas, câmara e almotaçaria do concelho de Antuã [fl. 235] Eu el Rej faco saber aos que este aluara virem que auendo respeito a el Rej meu senhor e paj que santa gloria aja ter feito merçe a jeronimo da çunha escrivão do publico judicial notas almotacaria çamera e orfãos do consselho de antoão de licença para renuciar os ditos offiçios em hum filho e filha repartido o dos orfãos çamera e almotaçaria por ssi e os do publico e judicial tambem por ssi e por o dito consselho ser muito grande e fiçarem os ditos officios milhor repartidos e os moradores delle milhor avidos repartindose o offiçio de escrivão dos orfãos por ssi e os mais da mesma maneira por desta ficarem com mais jgualdade no rendimento e milhor seruidos como constou por informacão do provedor da çomarca da villa de esgueira ouue por bem de fazer merçe ao dito jeronimo da çunha de licença para que pudefse repartir os ditos officios pela dita maneira por aluara feito a uinte e tres de novembro do ano de mil seis çentos e dezaseis e por o dito jeronimo da çunha renunciar ao officio de escriuão dos orfãos en francisco boto seu genro por çasar com felipa da çunha sua filha lhe foi delle pasado çarta em dezoito dias do mes de outubro de mil e seis çentos e dezanove e no asento que esta no Livro do registo das merçes en titulo do dito jeronimo da cunha se não achão posto uerba nem deçlaração alguma que deçlare ser pasada çarta a nenhuma pecoa dos ditos officios de tabalião do publico judicial notas almotaçaria e camera do dito consselho de antoam conteudos no aluara acima dito segundo se continha em huma çertidão de marcal da Costa que me foj aprezentada por diogo da Çunha filho do dito jeronimo da Cunha o qual me inviou hora dizer por sua peticão que o dito seu [ 86 ]


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paj en seu testamento nomeara nelle os ditos offiçios conforme ao aluara da merçe que pera isso tinha como constaua do treslado da uerba de seu testamento que prezentaua que fora feito pello escriuão da villa de aveiro diogo pita e por elle aprouado o qual aluara se rompera ou desapareçera ao tempo [fl. 235v] que se pasou çarta do officio de escrivão dos orfãos ao dito francisco boto e que por esse respeito não auia elle tirado çarta dos ditos officios: pedindome lhe fizese merçe mandar lhe passar aluara delles em seu nome para com elle tirar sua çarta. E tendo eu respeito ao que alega lhe mandej pasar este pello qual mando aos meus desembargadores do paço que examinem ao dito diogo da Cunha e sendo apto e não tendo impedimento algum pera auer de seruir os ditos officios de tabaliam do publico judicial notas çamera e almotacaria do dito consselho de antoam lhe facão pasar çarta en forma delles mostrando a que tinha o dito seu paj pagando primejro os direjtos ordenados na chancelaria com deçlaração que auendo eu por bem de lhe tirar os ditos officios em algum tempo o poderej fazer sem por isso minha fazenda lhe fiçar obrigada a satisfacão alguma francisco ferreira o fez en lixboa a uinte tres de outubro de mil e seis çentos e uinte oito joão pereira de castell branco o fez escrever. [margem esquerda ao topo] A Diogo da Cunha conteudo no Registo deste Aluara se pasou Carta dos officios de taballião do publico judicial e notas Almotacaria e Camara do concelho de Antoam por vertude deste Aluara, e do sobre dito se pos aquj esta verba por vertude da dita Carta en lixboa a doze de julho de 633 [assinatura] Miguel Maldonado DOC. 18 ANTT, Chancelaria Régia, Chancelaria de D. Filipe III, Livro 31, fl. 320 vrs., doc. 2 1629/11/21 Diogo da Cunha – Carta de tabelião do público, judicial, notas, câmara e almotaçaria do concelho de Antuã [fl. 320v] Dom phelipe etc. Aos que esta minha carta virem faço saber que por parte de diogo da çunha filho de jeronimo da çunha tabaliam no consselho de antoão me foi apresentado hum meu aluara por mim asinado e pasado por minha chamcelaria do qual o treslado he o seguinte ¶ Eu el Rey etc. outro tal aluara nem mais nem menos com as palavras que esta dita carta vai neste Livro tresladado E encorporado a fls. 235 ate onde dis joão pereira de castel branco o fez escreuer (?) o seguinte ¶ o dito aluara o tinha seu paj jeronimo da çunha ora pedindome o dito diogo da çunha por merçe que na conformidade desse aluara acima ençorporado lhe mandace passar carta en forma dos ditos officios de tabaliam do publico judicial notas almotaçaria E çamara (?) e por confiar delle que no de que o emçaregar me seruira bem e fielmente como a meu seruico e bem das partes cumpre E por lhe fazer merce ej por bem e o dou ora daqui en diante por tabalião do publico judicial notas almotacaria e camara do dito consselho de antoão afsi e da maneira que delle deue ser como o foi jeronimo da çunha seu paj que os ditos officios tinha por carta que me foi aprezentada e por seu falecimento vagarão os quais officios elle tera e seruira emquanto o eu ouver per bem e não mandar o contrario com deçlaração que auendo Eu [fl. 321] por meu seruico de lhos tirar em algum tempo minha fazenda lhe não ficara por ifso obrigada a satisfacão alguma E portanto mando aos juizes do dito consselho de Antoam e a todas as outras justicas officiaes e pecoas a que esta minha carta for mostrada e o conteudo della com direito pertencer que metão em posse dos ditos officios de tabalião do publico judicial notas almotacaria e camara do dito consselho ao dito diogo da çunha lhos deixe seruir e delles uzar e auer [ 87 ]


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todos os proens e percalcos que lhe direitamente pertencerem como os teue e seruiu o dito seu paj sem lhe afsi ser posta duuida nem enbargo algum por que afsi o ej por bem por quanto foi examinado na mesa do despacho dos meus desenbargadores do paco e auido por apto para seruir os ditos officios e pagou de ordenado delles ao tesouro de minha chamcelaria sinco mil reaes que lhe forão caregados en receita como seruio por hum conhecimento en forma na qual chamcelaria jurara aos santos euangelhos que bem e uerdadeiramente os seruira guardando em tudo a mim meu seruico e as partes seu direito e de comprir e guardar os regimentos que della levar e o aluara acima encorporado se compra ao açinar desta e nos registos delle dos livros de minha chamcelaria e das merces se porão verbas do conteudo nesta carta que aprezentara certidões nas costas della de miguel maldonado e marcal da costa fidalgos de minha casa dada na cidade de lixboa aos uinte e hum dias do mes de novembro el Rej noso senhor o mandou pellos doutores (?) daraujo de barros E jeronimo pimenta dabreu E francisco lopes a fez ano do nascimento de nosso senhor jesus xpo de mil e seis çentos e uinte e noue anos. Eu miguel maldonado a fis escreuer [com letra autógrafa] Eu Diogo da Cunha contheudo no registo atras E afimna escrito fis aqui o meu sinal publiquo de que Ei de usar [sinal público] DOC. 19 ANTT, Chancelaria Régia, Chancelaria de D. Filipe III, Livro 9, fl. 128 vrs., doc. 2 1622/06/22 Miguel da Cunha – Carta de tabelião de notas e judicial do concelho de Antuã [fl. 128v] Dom filipe etc. Aos que esta minha carta virem faco saber que por parte de miguel da cunha me foi aprezemtado hum alvara d’el Rey meu senhor e pay que santa gloria aja por elle asinado e pasado pela chancelaria do qual o treslado he o seguinte; Eu El Rey faco saber aos que este alvara virem que auemdo respeito a ter feito merce a diogo damdrade da propriedade dos ditos officios de tabalião de notas e judicial do comselho de amtoam que ate gora não tem servido asim per falta de idade como por ajudar ao emparo de duas irmas orfas que tem que sam pobres e muito nobres E pelas ditas rezões estar comsertado pera auer de casar [fl. 129] A mais velha por nome izabel cardosa ey por bem de fazer merse ao dito diogo damdrade de lisenca pera renumciar os ditos officios no dito miguel da cunha casado com a dita sua irma izabel cardosa e sendo apto pello que mando aos meus desembargadores do paco examinem ao dito miguel da cunha e sendo apto como dito he e não tendo empedimento algum por auer de servir os ditos officios lhe darão disso despacho pera depois de fazer testo estar casado e resebido per palavras de prezente comforme ao sagrado comsilio tredemtino com a dita izabel cardosa lhe ser passado carta em forma dos ditos officios mostrando primeiro a que o dito diogo de amdrade deles tinha e sus renunsiasão e pagando prymeiro os direitos ordenados com declarasão que auendo Eu por bem de lhos tirar em algum tempo minha fazenda lhe nao ficara por isso obrigada a satisfacão alguma e este me praz que valha tenha força e vigor posto que o efeito delle aja de durar mais de hu anno sem embargo da ordenasão em contrario francisco nunes o fez em lixboa a vinte doutubro de mil e seis centos e dezasete E eu pero sanches farinha o fis escrever ¶ E pedindo me o dito miguel da cunha por mersse que porquanto elle estaua casado e resebido comforme ao sagrado comcilio tredemtino com a dita izabel cardosa como cons como consta de hum publico estromento de testemunhas que aprezentaua que desia ser soscrito e afsinado do synal publico de francisco da cunha tabalião do publico judicial da uila de bemposta ao primeiro dia do mes de junho deste prezente ano [ 88 ]


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de mil e quinhemtos e seis centos e vinte e dous ouuesse por bem de lhe mandar pasar carta em forma dos ditos officios e visto seu requerimento alvara acima emcorporado e estromentos de renumciação e de como esta casado e resebido com a dita izabel cardosa e por confiar delle miguel da cunha que no de que o emcarregar me servira bem e fielmente como a meu serviso e bem das partes cumpre e por lhe fazer merce ey por bem e o dou ora daqui em diante por ta [fl. 129 v] balião das notas e judicial do comselho de amtam asim e da maneira que o elle deve ser e como o foi diogo de amdrade seu cunhado que os ditos officios tinha per carta que me foi aprezemtada e por seu falesimento vagarão os quais officios elle tera e servira emquanto eu ouuer por bem e não mandar o comtrario com declarasão que auendo eu por meu serviso de lhos tirar ou estinguir em algum tempo minha fasenda lhe não ficara per isso obrigada a satisfacão ¶ E por tanto mando ao corregedor da comarca da cidade de Coimbra e a todas as outras justiças officiaes e pessoas a quem esta minha carta for for mostrada e o conteudo dela com direito pertemser que metão em pose dos ditos officios ao dito miguel da cunha e lhos dejxem servir e delle uzar e auer todos os pros e percalsos que lhe direitamente pertemserem sem lhe a jsso ser posto duuida nem embargo algum porque asim o ej por bem porquanto foi examinado na meza do despacho dos meus dezembargadores do paco e auido por apto pera seruir os ditos officios e pagou dordenado delle ao thesoureiro da minha chancelaria tres mil e duzentos e dez reaes que lhe forão carregados em resejta como se vio por conhecimento em forma na qual chancelaria jurara aos santos euãogelhos que bem e verdadeiramente etc. e de cumprir e guardar os regimentos que dela leuar dada na cydade de lixboa aos uinte e dous dias do mez de junho el rey noso senhor o mandou pelos doutores luis da gama pereira e denis de mello pero lopez o fez ano de mil e seis cemtos e vimte e dous e posto que asima digo que os ditos officios vagarão por falesimento do dito diogo dandrade não vagarão senão por renuciasão que delles fez no dito miguel da cunha seu cunhado per vertude do alvara acima incorporado por inda servir ao fazer desta e com esta declarasão se cumprira esta carta como nella se comtem miguel maldonado a fez escrever e dis o riscado e quinhentos / Consertadas 2 [assinatura] Manuel Castanho. [margem esquerda em baixo com letra autógrafa] Miguel da Cunha conteudo no treslado da carta atrás e asima treslada fis aqui meu sinall publico de que ei de usar aos vinte simquo dias do mes de junho do anno de mil e seis sentos e vinte dous anos [sinal público] DOC. 20 ANTT, Chancelaria Régia, Chancelaria de D. João IV, Livro17, fl. 120 vrs., doc. 2 1645/01/11 Miguel da Cunha – Alvará de renúncia de tabelião do público, judicial e notas do concelho de Antuã [fl. 120v] Eu elRey faco saber aos que este alvara virem que avendo respeito a miguel da çunha e faria proprietario do officio de tabalião do publico e judicial e notas do consselho de anteano aver vinte e quatro anos servir o dito officio e sempre proceder bem com a obrigação d’elle e nunça se livrou de erros e ter filhos e filhas como tudo constou por informação do provedor da comarca da villa de esgueira ej por bem de fazer merçe ao dito miguel da cunha de licença para que em sua vida ou a ora da morte pofsa renunciar o dito officio em hum seu filho ou filha pera servir a pesoa que com ella casar sendo apta ../ pelo que mando aos meus desembargadores do paco examinem o filho em quem [ 89 ]


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o dito miguel da cunha nomear o dito officio e sendo apto lhe farão pasar carta em forma delle e nomeando em filha a pesoa que com ella ouver de casar sera obrigada a vir se apresentar ante os ditos meus desembargadores do paco pera o examinarem e sendo apto como dito he e não tendo impedimento algum pera aver de servir o dito officio lhe darão disso despaçho pera depois de fazer certo estar casado e resebido per palavras de prezente comforme ao sagrado comsilio tredentino com a filha do dito miguel da cunha lhe ser pasado carta em forma do dito officio mostrando o filho ou a pesoa que casar com a dita sua filha a que o dito miguel da cunha delle tinha e sua nomeacão e pagando primeiro os direitos ordenados com deçlaracão que avendo eu por bem de lho tirar em algum tempo minha fazenda lhe não ficara por isso obrigada a satisfacão alguma e este me praz que valha e tenha força e vigor posto que seu effeito aja de durar mais de um ano sem embargo da ordenação do livro 2º título 40 em contrario constando primeiro por certidão dos officiaes dos novos direitos de como os pagou se os dever na forma de minhas ordens francisco Teixeira sobrinho a fez em lisboa a onze de janeiro de mil e seis centos quarenta e sinco Bartolomeu Roiz d’Abreu o fez escrever. DOC. 21 ANTT, Chancelaria Régia, Chancelaria de D. Afonso VI, Livro 52, fl. 272, doc. 2 1683/10/30 António Cardoso da Cunha – Carta de escrivão das sisas do concelho de Estarreja [fl. 272] Dom Pedro etc. faco saber aos que esta minha carta virem que tendo respeito ao que se me apresentou por parte de Antonio cardozo da cunha filho que ficou de Miguel da cunha em razão de hauer mais de quarenta anos esta uaga a propriedade do officio de escriuão das sizas do conselho de estareja sem se saber no discurso dos ditos annos quem ouuefse sido proprietario do dito officio seruindo no espaco dos ditos annos o dito seu Paj Miguel da cunha e seu irmão João cardozo da cunha por meus Aluaras anuaes e pro provimentos dos procuradores da comarca da villa de guimarães (sic) com grande satisfação sem nunca ser compreendidos em erros alguns que no dito officio fofsem e falecendo ambos da vida prezente seruia o dito officio com a mesma satisfação o dito Antonio cardozo da cunha (?) asim seruir alguns anos no tempo da guerra com cauallo a sua custa como tudo constou por informação que aserca difso [fl. 272v] deu o provedor da comarca da dita villa de esgueira e por comcorrer no dito Antonio cardozo da cunha os requizitos nesefsarios para bem exercitar o dito officio e comfiar delle que no que o emcarregar me seruira bem e fielmente como a meu seruico cumpre e por lhe fazer merce e me praz digo merce Hey por bem e me praz de fazer merce ao dito Antonio cardozo da cunha do dito officio de escriuão das sizas do conselho de estareja para que o sirua asim e da maneira que o seruirão as mais pefsoas que delle forão proprietarios e isto emquanto eu ouuer por bem e não mandar o contrario e com declaração que tirandolho ou extinguindo por qualquer cauza que seja lhe não ficara por ifso obrigada a satisfação alguma e hauera com o dito officio o mantimento proes e precalcos que lhe direitamente pretencerem como tinha e hauia as mais pefsoas que dantes o seruirão e delle forão proprietarias Pello que mando a vos Procurador da comarca da villa de esgueira lhe deis a pofse do dito officio de escreuão das sizas do conselho de estareja e lho deixeis seruir e delle uzar e hauer o mantimento proes e precalcos como dito he dandolhe (?) o juramento dos santos euangelhos que bem e uerdadeiramente o sirua guardando em tudo o meu seruico e as partes seu direito de que se fara asento nas costas desta que se cumprira inteiramente como nesta se conthem porquanto pagou [ 90 ]


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de nouos direitos tres mil e quinhentos réis que forão carregados ao thezoureiro deles Manoel ferreira Botelho no livro de sua receita a fls. 92 verso como constou por certidão do escreuão do seu conselho e asinado por ambos o qual com a informação dada asima se faz menção e mais papeis foj tudo roto ao asinar desta que por frimeza de tudo mando dar ao dito Antonio cardozo da cunha por mjm asinada e sellada com o meu cello pendente // ElRey nofso senhor o mandou pelo conde Manoel tellez da silua do seu conselho do estado e guerra e gentil homem de sua camara francisco Manoel (?) a fes em lixboa aos trinta de outubro de seiscentos outenta e tres luis teixeira de carualho a fez escrever // O conde Manoel tellez da silua João de Roxas de Azeuedo Pagou duzentos E de aualiação mil e duzentos réis E aos officiaes 990 réis dezanove de fevereiro de 684 Dom sebastiam Maldonado [fl. 272 margem esquerda em baixo] Em 31 de majo deste anno se passou carta da propriedade deste officio a Bernardo Cardozo da Cunha filho segundo de Antonio Cardozo da Cunha passou pella chancelaria em 20 de junho deste anno em virtude da mesma carta que esta verba e risquei este asento por digo que esta verba (sic) Lixboa oriental 13 de julho de 1719 DOC. 22 ANTT, Chancelaria Régia, Chancelaria de D. Afonso VI, Livro 23, fl. 51 vrs., doc. 2 1657/10/30 Roque Varela Pacheco – Carta de tabelião do público, judicial, notas, câmara e almotaçaria do concelho de Antuã [fl. 51v] Dom Affonço etc. faço saber aos que esta minha carta virem que por parte de roque varella pacheco me foi apresentado o alvara del rej meu senhor e pai que santa gloria aja o qual he o seguinte ¶ Eu el rej faço saber aos que este alvara virem que havendo respeito a diogo da cunha proprietario dos ofiçios de escrivão da camara e almotaçaria publico judiçial e notas do conselho de antoão os haver servido a uinte annos com muita verdade sem interpolação de tempo e nunca ser comprehendido em eros delles e ter servido muito bem nas decimas e ser achacado e ter filhos como tudo constou por informação do provedor da comarca da villa de esgueira hei por bem fazerlhe merçe de licença para que posa nomear estes ofiçios em huma de suas filhas para os seruir a pessoa que com ella cazar sendo apto com declaração que primeiro que se encarte nelle sirua seis meses na fronteira e o servico que fizer por conta desta obriguação hade ser a sua custa e não pedira por elle outra satisfação e se não justificara nem leuara en conta senão por ter drofiçios (sic) da praça darmas donde o fizer pelo que mando aos meus desembargadores [fl. 52] do paço exzaminem a pessoa que ouver de cazar con a dita sua filha e sendo apto como dito he lhe darão diso despacho para dispois de fazer serto estar cazado e recebido con ella por palavras de presente na forma do sagrado concilio tridentino lhe darão diso despacho pagando primeiro os direitos ordenados con declaração que havendo eu por bem de lhos tirar en algum tenpo minha fazenda lhe não ficara obriguada a satisfação alguma e este se cumprira constando que tem pago os novos direitos na forma de minhas ordens e valera posto que seu efeito aja de durar mais de hum anno sen enbargo da ordenação en contrario do 1º livro titulo 4º Antonio de moraes o fez en lixboa a oito de junho de seiscentos cincoenta e dous pedro sanches farinha o fez escrever rej pedindome o dito roque varella por merce que porquanto o dito diogo da cunha nomeara os ditos ofiçios en sua filha mais velha maria da cunha como constaua de huma certidão de roque ribeiro escrivão dos orfãos do dito conselho que aprezentaua con a qual maria da cunha estaua cazado e recebido na forma do [ 91 ]


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sagrado concilio tridentino e aprezentaua a certidão de jeronimo gaspar cura na igreja de s. martinho ouvese por bem mandarlhe pasar carta en forma dos ditos ofiçios (?) seu requerimento alvara certidões asima referidas e hum conhecimento de antonio de moura thezoureiro mor dos tres estados que constaua auer o suplicante pago doze mil réis o custo de um soldado en seis meses que he a obriguação con que estaua feita esta merce e no alvara em que fora careguado ao thezouro a p. 144 verso do livro do seu recebimento e confiando delle roque varela que no de que o encaregar me seruira bem e fielmente como a meu seruico e bem das partes cunpre e por lhe fazer merce hei por bem e o dou daqui en diante por escriuão da camara almotaçaria publico judicial e notas do dito conselho de antoão asi e da maneira que o elle deve ser e como o foi o dito seu sogro os quais elle tera e servira enquanto eu ouver por bem e não mandar o contrario con declaração que tirandolhos en algum tenpo o poderei fazer sen minha fazenda ficar obriguada e portanto mando aos juízes do dito conselho en a quen seus cargos servirem que metão en pose dos ditos offiçios ao dito roque varela e lhos deixem seruir e delles uzar e haver todos os proes e percalços que lhe direitamente pertencerem porque asi o hei por bem porquanto foi exzaminado na meza do despacho dos meus desembargadores do paço e havido por apto para seruir os ditos offiçios e pagou de ordenado delles ao thezouro da chamcelaria mil novecentos e dezasseis réis que lhe ficão careguados en receita na qual chamcelaria jurara na forma costumada e nella se pora uerba no regimento do dito alvara para constar que ouve efeito contratal no livro das merces e por firmeza de tudo mandei dar esta carta pasada pella chamcelaria e con o selo pendente della a qual não havera efeito sen constar que pagou o nouo direito na forma de minhas ordens dada en lixboa a 30 de outubro elrej noso senhor o mandou pellos doutores diogo marchão timudo pedro fernandes monteiro manuel antunes de sampaio que ora sirvo de escrivão da dita chamcelaria a fez anno de mil seiscentos cincoenta e sete = [com letra autógrafa] Eu RoqueVarella Pacheco taballião do publico judicial e nottas e camara e almottaceria do Comcelho destareia fis aqui meu sinal publico Paço em Lisboa aos 3 de novembro de 1657 = [sinal público] DOC. 23 ANTT, Chancelaria Régia, Chancelaria de D. Pedro II, Livro 25, fl. 249 vrs., doc. 2 1699/07/24 Sebastião Pacheco Varela da Cunha – Carta de escrivão da câmara, público, judicial, notas e almotaçaria do concelho de Estarreja [fl. 249v] Dom Pedro por grasa de Deos Rey de Portugal E dos Algarues etc. faço saber aos que esta minha carta virem que por parte de sebastião Pacheço varella me foi aprezentado hum meu Alvara pafsado pella minha Chamcelaria cujo theor seguinte ¶ Eu el Rey faco saber aos que este Alvara virem que havendo respeito a sebastião Pacheço varella da Cunha me reprezentar que elle hera filho legitimo E mais velho de Roque varella Pacheço proprietario que fora dos offíçios descrivão da Camara publiço judiçial e notas E Almotacaria do conselho de estareja os quais servira por espaço de muitos annos com boa satisfação E por que elle supplicante hera o filho mais velho [fl. 250] velho que do dito roque varella fiçara E capaz de servir os ditos ofíçios me pedio lhe fizefse merçe da propriedade deles E vistto seu requerimento E o que constou por informação do Provedor da Comarca de esgueira Hey por bem fazer merçe ao supplicante da propriedade dos ditos ofíçios sendo apto e mando aos meus Dezembargadores do Paço o examinem e sendo apto como dito he lhe facão pafsar carta em forma [ 92 ]


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dos ditos mostrando a que delles tinha o dito seu pay pagando primeiro os direitos ordenados com declaração que havendo Eu por bem de lhos tirar ou extinguir em Algum tempo minha fazenda lhe não fiçara por ifso obrigada a satisfacão alguma e este se lhe cumprira inteiramente como nelle se conthem de que pagou de novos direitos trinta réis que forão carregados ao thesoureiro delle e no Livro 1.o de sua Reçeita a folhas 28 como se vio de hum conhecimento em forma registado no livro primeiro do Regimento geral dos novos direitos a folhas 28 verso E valera posto que seu efeito haja de durar mais de hum anno sem embargo da ordenação do Livro 2.o titulo 40 em contrario Antonio vahia o fez em Lixboa a vinte e sinco de Majo de seiscentos noventa e nove francisco galuão o fez escrever // Rey // ¶ Pedindome o dito sebastião Pacheço varella que na forma do dito Alvara ouvefse por bem de lhe mandar pafsar carta da propriedade dos ditos offícios E visto seu requerimento e o Alvara nesta incorporado E por confiar delle que no de que o emcarregar me seruira bem e fielmente como ao meu seruico cumpre E ao bem das partes e por lhe fazer merce Hey por bem e o dou daqui em diante por escrivão da Camara publico judiçial e notas e Almotacaria do conselho de estareja afsim E da maneira que o elle deve ser e como o foy o dito seu Pay por quem vagarão portanto mando aos Juizes do dito Conselho ou a quem esta carta toçar metão de pofse destes ofícios ao dito sebastião Pacheço varella e lhos deixem seruir e deles uzar e haver os proes e precalcos que lhe pertençerem sem lhe ser posto duuida nem embargo algum por que afsim o Hey por bem com declaracão que hauendo Eu por bem de lhos tirar ou extinguir em algum tempo minha fazenda lhe não ficara por ifso obrigada a satisfação alguma porquanto foy examinado na meza do Dezembargo do Paço e hauido por apto para seruir os ditos ofiçios e pagou de novos direitos vinte e dous mil e quinhentos réis que forão carregados ao tesoureiro joão soares E a outra tanta quantia deu fiança no Livro primeiro della como se vio de hum conhecimento de sua receita a folhas 88 do Livro 1.o della e Regimento no livro 1.o do Regimento geral a folhas 83 verso e por firmeza de tudo lhe mandey dar esta minha carta passada pela minha Chancelaria e com o çello pendente della e na dita Chancelaria jurara aos santos Euangelhos que bem e verdadeiramente servira estes ofiçios [fl. 250v] ofiçios guardando em tudo meu seruiço e o bem e justiça das partes e na dita Chancelaria se porão verbas no registo do Alvara Dada na cidade de lixboa aos vinte e quatro Dias do mes de julho El Rey nofso senhor o mandou pellos Doutores Miguel da Silva Pereira e Manoel da Costa de Almeyda ambos do seu conselho e seus Dezembargadores do Paço Jerónimo da Nóbrega de Azeuedo a fez Anno do nascimento de nofso senhor Jezus christo de mil e seiscentos nouenta e noue pagou de ofícios duzentos réis em lugar do Doutor Miguel da Silva Pereira asinou o Doutor Manuel lopes de oliveira Dom francisco Maldonado a fez escrever Manoel da Costa de Almeyda Manoel Lopes de oliveira João de roxas E Azeuedo (?) E de avaliação sinco mil e duzentos e sincoenta réis e ofiçiaes novecentos e quarenta réis lixboa 23 de Agosto de 699 na Chancelaria Dom francisco Maldonado. DOC. 24 ANTT, Chancelaria Régia, Chancelaria de D. Pedro II, Livro21, fl. 271 vrs., doc. 2 1693/03/02 António Cardoso da Cunha – Carta de tabelião de notas e judicial do concelho de Estarreja [fl. 271v] Dom Pedro por graça de Deos Rey de Portugal e dos Algarues etc. faco saber aos que esta minha carta virem que por parte do cappitão Antonio cardozo da cunha me foy apresentado hum meu Aluara pafsado pella minha chancelaria do qual o tresllado he o seguinte ¶ Eu o Principe como [ 93 ]


ANTÓNIO PEDRO DE SOTTOMAYOR

regente e gouernador dos Reinos de Portugal e dos Algarues faco saber aos que este Aluara virem que hauendo respeito a ter feitto merce a Miguel da cunha e faria já faleçido de licença para poder nomear em hum seu filho ou filha os offiçios de escriuão do publiço judicial e nottas do concelho de estareija pelos hauer seruido por espaco de muitos anos com muita satisfacão E uzando da dita faculdade fazer nomeacão deles a Maria da cunha cardoza sua filha para os seruir a pefsoa com quem cazafse e por se achar incapaz de tomar estado pella sua ida [fl. 272] idade de mais de sincoenta anos doutro acha querer dezistir do direito que tinha aos mesmos offiçios por hum estromento publico em fauor de seu irmão o cappitão Antonio cardozo da cunha que a sustenta e acode as suas necefsidades e he filho do mesmo proprietário seu Pay em quem comcorrem todas as partes necefsarias para o seruir e ser pefsoa de bom proçedimento como constou por informacão do Procurador da comarca da villa de esgueira Hey por bem fazer-lhe merce de que a que lhe tenha efeito da propriedade destes officios tenha efeito no dito cappitam Antonio cardozo da cunha seu irmão sendo apto e mando aos Dezembargadores do Paço o examinem e sendo apto como dito he lhe facão pafsar carta em forma dos ditos offiçios mostando a que deles tinha o dito seu Pay pagando primeiro os direitos ordenados com declaração que hauendo Eu por bem de lhos tirar ou extinguir em algum tempo minha fazenda lhe não fiçara por ifso obrigada a satisfação alguma E este se lhe comprira inteiramente como se nelle comthem de que pagou de nouos direitos trinta réis que foram carregados ao thezoureiro deles e no seu livro de reçeita a fl. 17 E valera posto que seu efeito haja de durar mais de hum anno sem embargo da ordenação do livro 2º título 40 em contrario Manoel da Silua Colaço o fes em lixboa a noue de setembro de seiscentos e outenta e hum pagou de assinar duzentos réis francisco galuão o fes escrever // Rey ¶ Pedindo me o ditto Antonio cardozo da cunha por merçe que na forma do dito Aluara neste tresladado a dita sua irmaã momear nelle como se uio por hum estromento publiço que dezia ser feito nas nottas do tabaliam Domingos figueira do conselho da villa da bemposta aos doze Dias do mes de fevereiro de mil e seis centos outenta e hum deuefse por bem de lhe mandar pafsar carta em forma dos ditos offiçios E uisto seu requerimento E Aluara asima emcorporado E enstromento de renunciacão e por comfiar delle que no de que o emcarregar me seruira bem e fielmente como a meu seruico e bem das partes cumpre e por lhe fazer merçe Hey por bem e o dou daqui em diante por tabaliam das notas e judicial do conselho de estareija assim e da maneira que elle o deue ser e como o foy o dito Miguel da cunha seu pay que os ditos officios tinha por carta que foy apresentada e por seu faleçimentto vagarão os quaes officios elle tera e seruira emquanto Eu achar por bem e não mandar o contrario com [fl. 272v] com declaração que hauendo Eu por meu seruico de lhos tirar ou extinguir em algum tempo minha fazenda lhe não fiçara por ifso obrigada a satisfacão alguma e portanto mando ao corregedor da comarca da cidade de coimbra E a todas as mais justiças e offiçiaes a quem esta minha carta for mostrada E o conheçimento com direito pretençer que metão em pofse dos ditos officios ao ditto Antonio cardozo da cunha e lhos deixem seruir e deles usar sem embargo de que o seu anteçefsor dizer (sic) a sua carta serem os ditos officios do conselho de Antoão E hauera todos os proes e precalcos que lhe direitamente pretencerem sem lhe ser posto duuida nem embargo algum por que assim o hey por bem porquanto foy examinado na meza do despacho dos meus Dezembargadores Do Paco E hauido por apto para seruir os ditos officios e pagou de direitos velhos de minha chancelaria três mil e duzentos e des réis que se carregarão ao thezoureiro Cosme da Costa de Albuquerque e pagou de nouos direitos quarenta mil réis que se carregarão ao thezoureiro deles João Ribeiro cabral no livro 2º de sua receita a fls. 283 verso Registado no livro segundo do Registo geral a fls. 460 como tudo consta por hum conhecimento em forma e na chancelaria jurara aos santos Euangelhos que bem e verdadeiramente os seruira guardando em tudo [ 94 ]


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meu serviço E as partes seu direito e na dita chancelaria se porão verbas no Registto do Aluara em certeza do qual se pafsou esta carta Dada na cidade de lixboa aos dous Dias do mes de março El Rey nofso senhor o mandou pelos Doutores Diogo Marchão Themudo e Bras Ribeiro de Afoncequa ambos do seu conselho e seus Dezembargadores do Paço Jeronimo da Nobriga de Azevedo a fes anno do nasimento de nofso senhor jezus christo de mil e seis centos e nouenta e três pagou de assinar cem réis o uedor Dom francisco Maldonado a fes escrever Bras Ribeiro de Afonsequa Diogo marchão themudo João de Roxas E Azeuedo Pagou quatro centos réis e aos officiaes nouecentos sefsenta réis lixboa 3 de março de 693 E jurou na chancelaria Dom francisco Maldonado [assinatura] licenciado Inosencio correa de moura DOC. 25 ANTT, Chancelaria Régia, Chancelaria de D. João V, Livro 125, fl. 377, doc. 2 1719/05/31 Bernardo Cardoso da Cunha – Carta de escrivão das sisas do concelho de Estarreja [fl. 377] Dom João por graça de Deos Rey de Portugal etc. faco saber aos que esta minha carta virem que tendo respeito ao que se me reprezentou por parte de Bernardo Cardozo da Cunha filho de Antonio Cardozo da Cunha proprietario do officio de escrivão das sizas do conselho de Estarreja comarca de Esgueira o qual seruio o dito officio por mais de trinta annos com boa satisfação e a haver renunciado o dito seu Pay nas reaes maos a propriedade do dito officio por se achar com muita idade e achaques para poder seruir o dito officio e me pedir ouvefse por bem fazer merce da dita propriedade para o dito seu filho Ber [fl. 377v] Bernardo Cardozo da Cunha por ter os requezitos necefsarios para bem poder seruir, e a me pedir o dito Bernardo Cardozo que por ser filho segundo a quem pertence o requererme a propriedade do officio de escrivão das sizas do conselho de Estarreja de que seu Pay Antonio Cardozo foi ultimo proprietario por seu irmão mais velho se achar com ordens menores para sacerdote e ter os requezitos necefsarios para bem poder servir o dito officio, e me pedir lhe fizefse merce da propriedade do dito officio e visto por mim seu requerimento e informação que deu o Provedor da comarca daVilla de Esgueira e por comcorrerem no dito Bernardo Cardozo da Cunha os requezitos necefsarios para bem exercitar o dito officio e confiar delle, que no em que o emcarregar me servirá bem e fielmente como a meu seruiço cumpre. Hey por bem e me pras fazer merce ao dito Bernardo Cardozo da Cunha da propriedade do dito officio de escrivão das sizas do Conselho de Estarreja para que o sirua asim e da maneira que o servirão as mais pefsoas que delle forão proprietários e isso em quanto Eu o ouver por bem e não mandar o contrario com declaração que tirando lho ou extinguindo o por qualquer cauza que seja lhe não ficara por ifso minha fazenda obrigada a satisfação alguma, e hauerá com o dito officio o mantimento a elle ordenado e os proes e percalsos que direitamente lhe pertencerem, como o tiuerão as mais pefsoas que dantes o servirão e delle forão propriétarios. Pello que mando a vos Provedor da Comarca da Villa de Esgueira lhe deys pofse do dito officio de escrivão das sizas do conselho de Estarreja e lho deixeis seruir e delle uzar e hauer o mantimento proes e percalsos como dito he dando lhe primeiro o juramento dos santos evangelhos para que bem e verdadeiramente o sirua guardando em tudo o meu serviço e as partes seu direito de que se fará asento nas costas desta que se cumprirá inteiramente como nesta se conthem por quanto pagou de nouos direitos seis mil réis que forão carregados ao thezoureiro delles Joseph Correa de Moura no liuro primeiro de sua receita a folhas 68 verso como constou por conhecimento feito pello escrivão do seu cargo e asignado por ambos que [ 95 ]


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foi registado no liuro 1º do Registo geral dos mesmos direitos a folhas 69 e rotto com a carta do seu antecefsor ao asignar desta minha carta El Rey nofso senhor o mandou pelo Marques de Alegrete dos seos conselhos de Estado e guerra gentil homem de sua camera e vedor de sua fazenda Manoel Pinto de oliueira a fes em Lisboa occidental em trinta e hum de Mayo de mil e setecentos e dezanove annos Jorge Luis Teixeira de Carualho a fes escrever // e no Registo da carta se ponhão as verbas necessárias // Marques de Alegrete // Pafsada por despacho do Marques de Alegrete dos conselhos de estado e guerra de El Rej nofso senhor e vedor de sua fazenda a quem toca a data deste officio de onze de Mayo de mil e setecentos e dezanove // Joseph Galuão de Lacerda pagou Duzentos réis e de aualiação mil e duzentos réis [fl. 378] E aos officiaes quinhentos e cincoenta réis Lisboa occidental dezafsete de Junho de 1719 Dom Miguel Maldonado [assinatura] licenciado Joseph Correa de Moura DOC. 26 ANTT, Chancelaria Régia, Chancelaria de D. João V, Livro 68, fl. 44 vrs., doc. 2 1725/12/05 Manuel Cardoso da Cunha – Carta de tabelião do público, judicial e notas do concelho de Estarreja [fl. 44v] Dom João por graça de Deos Rey de Portugal etc. Faço saber aos que esta minha carta virem que por parte de Manuel Cardozo da Cunha me foy apresentada huma minha Poruizão asignada pelos Doutores Antonio dos Santos de Oliueira e Antonio de Beja de Noronha meus Dezembargadores do Paço e pafsada pella minha chancelaria da qual o theor he o seguinte ¶ Dom João por graça de Deos Rey de Portugal e dos Algarues daquem e dalem Mar em Africa Senhor de Guine etc. faço saber que hauendo respeito a me reprezentar Manuel Cardozo da Cunha que a Abbadeça do Mosteiro de Arouca nomeara nelle a propriedade do officio de Tabalião do Publico judicial e notas da villa de Estarreja como Donataria da dita villa; Pedindome lhe fizefse merce confirmar a dita nomeação visto pertencerlhe a dada do dito officio como mostraua por doação que offerecia e visto o seu requerimento a que não teue duvida o meu Procurador da Coroa sendo ouvido. Hey por bem fazerlhe merce de confirmar como por esta confirmo e hey por confirmada a nomeação que nelle se fes da Propriedade do dito officio para o seruir sendo apto pello que mando aos meos Dezembargadores do Paço o examinem e sendo apto como dito he lhe façam pafsar carta em forma do dito officio pagando primeiro os direitos ordenados com declaração que hauendo eu por bem de lhos tirar ou extinguir em algum tempo minha Fazenda lhe não ficará por ifso obrigada a satisfação alguma, e esta se lhe cumprirá inteiramente como nella [fl. 45] se conthem que valerá posto que seu effeito haja de durar mais de hum anno sem embargo da ordenação livro 2º título 40 em contrario de que pagou de nouos direitos quatrocentos réis que foram carregados ao Thezoureiro delles no livro 2º de sua receita a fl 176 verso como se vio do seu conhecimento em forma registado no livro 2º do Regimento geral a fl. 92. El Rey nosso senhor o mandou pellos Doutores Antonio dos Santos de Oliveira e Antonio de Beja de Noronha ambos do seu Conselho e seus Dezembargadores do Paço Bras de Oliveira a fes em Lisboa occidental a 4 de Feuereiro de 1719 pagou duzentos réis Antonio Galuão de Castellobranco a fes escrever // Antonio dos Santos de Oliveira = Antonio de Beja de Noronha = E Pedindome o dito Manuel Cardozo da Cunha que na conformidade da dita minha Prouizão ouvesse por bem de lhe mandar pafsar carta em forma da Propriedade do dito officio e visto seu requerimento e Prouizão refferidas e por confiar delle que em [ 96 ]


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tudo de que o emcarregar me seruirá bem e fielmente como a meu seruico e bem das partes cumpre, e por lhe fazer merce. Hey por bem e o dou daqui em diamte por Proprietário do officio de Taballião do publico judicial e notas da villa de Estarreja asim e da maneira que elle o deue ser e como o forão os mais proprietarios seus antecessores que o dito officio seruirão E esta merce lhe faço daprezentação da Abbadeça do Mosteiro de Arouca Donataria da dita villa o qual terá e seruirá emquanto eu o houver por bem e não mandar o contrario; com declaração que hauendo por meu seruiço de lho tirar ou extinguir em algum tempo por qualquer cauza que seja minha Fazenda lhe não ficará por ifso obrigada a satisfação alguma Portanto Mando ao Prouedor da Comarca de Esgueira ou a quem o dito cargo seruir que meta de posse deste officio ao dito Manuel Cardozo da Cunha e lho deixe seruir e delle uzar e hauer os proes e precalcos que direitamente lhe pertencerem sem lhe ser posto duvida nem embargo algum porque asim o hey por bem porquanto foy examinado na Meza do Despacho dos meos Dezembargadores do Paço e hauido por apto para seruir o dito officio de que pagou de nouos direitos vinte mil réis que forão carregados ao Thezoureiro delles Joseph Correa de Moura no livro 9º de seu receita a fl. 250 verso e deu fiança a outra tanta quantia no livro 2º dellas a fl. 240 como tudo constou de hum conhecimento em forma feito pello escrivão de seu cargo, e asignado por ambos que foy registado no livro 9º do Regimento geral dos mesmos direitos a fl. 252 verso e elle dito Manuel Cardozo da Cunha jurara em minha chancelaria aos Santos [fl. 45v] Evangelhos de que bem e verdadeiramente sirua o dito officio guardando em tudo meu seruiço, e as partes seu direito, e nos registos da Prouizão asima incorporada dos livros da dita chancelaria e merces se porão verbas do contheudo nesta carta que por firmeza de tudo mandey dar ao dito Manuel Cardozo da Cunha pafsada pella minha chancelaria e com o sello pendente della Dada na cidade de Lixboa occidental aos 5 dias do mes de Dezembro. El Rey nosso senhor o mandou pellos Doutores Gregorio Pereira Fidalgo da Sylueira e Antonio Baracho Leal ambos do seu conselho e seos Dezembargadores do Paço Rodrigo Xavier Martins de Moura a fes anno de Nascimento de nosso senhor Jezus christo de 1725 pagou quinhentos réis e de asignar duzentos réis Dom Miguel Maldonado a fez escrever = Gregorio Pereira Fidalgo da Sylueira = Antonio Baracho Leal = E por Despacho da Meza do Dezembargo do Paço de 7 de Novembro de 1725 = João Roiz Pereira = Pagou seiscentos réis por ser de Aprezentação E aos officiaes novecentos e sessenta réis. Lixboa occidental 11 de dezembro de 1725 e jurou na chancelaria mor do reino. Dom Miguel Maldonado – Licenciado [assinatura] Ambrosio Soares da Sylva [com letra autógrafa] E eu Manuel Cardoso da Cunha aqui faço os meos sinais publico e razo de que ei de uzar no officio de que sou proprietario pella carta asima registada Lixboa occidental 12 de Dezembro de 1725 [assinatura] em testemunho de verdade Manuel Cardoso da Cunha DOC. 27 ANTT, Chancelaria Régia, Chancelaria de D. João V, Livro 34, fl. 51, doc. 1 1709/09/23 João de Azevedo Varela e Cunha – Carta de escrivão da câmara, público, judicial, notas e almotaçaria da vila de Estarreja [fl. 51] Dom João por graça de Deos Rey de Portugal etc. Faço saber aos que esta minha carta virem que por parte de João de Azevedo Varella e Cunha me foy apresentado hum meu Alvara pafsado pella minha chançellaria do qual o theor he o seguinte // Dezembargadores do Paço Amigos havendo [ 97 ]


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respeito a me reprezentar João de Azevedo Varella e Cunha que Abbadesa e Relligiozas do Convento de Arouca aprezentara nelle a propriedade dos offiçios de escrivão da camara publico judicial e notas e almotaçaria da villa de estarreya que vagarão por falleçimento de Sebastião Pacheco Varella por pertençer ao dito convento âpprezentação, e visto seu requerimento a que não teve duvida o meu Procurador da Coroa sendo ouvido Hey por bem fazerlhe merçe de confirmar como por este confirmo e hey por confirmada âpprezentação que nelle fizerão a dita Abbadeça e mais Relligiozas destes offiçios para os servir sendo apto Pello que vos mando o examineis e sendo apto como dito he lhe fareis pafsar carta em forma dos ditos offiçios pagando primeiro os direitos ordenados com declaração que havendo eu por bem de lhos tirar ou extinguir em algum tempo minha fazenda lhe não ficará por isso obrigada a satisfação alguma e este se lhe cumprirá inteiramente como nelle se conthem de que pagou de novos direitos trinta réis que forão carregados ao thezoureiro delles Aleixo Bottelho de Ferreira no Livro 1º de sua Reçeita a fl 64 verso e registado no Livro 1º do Registo geral a fl (?) e valerá posto que seu efeito haja de durar mais de hum anno sem embargo da ordenação Livro 2º título 40 em contrario. Brás de Oliveira o fes em Lixboa a dezanove de Janeiro de mil e setecentos e nove pagou de feitio duzentos réis francisco galvão o fes escrever // Rey // E Pedindome o dito João de Azevedo Varella e Cunha que em vertude do dito alvará ouvesse por bem de lhe mandar pafsar carta em forma destes offiçios confirmando-lhe âpprezentação que nelle fizerão a Abbadeça e mais Relligiozas do Convento de Arouca e visto seu requerimento e Alvara nesta incorporado e por confiar delle que no de que o emcarregar me servirá bem e fielmente como a meu serviço e bem das partes cumpre e por lhe fazer merce Hey por bem e o dou daquy em diante por porprietario dos offiçios de escrivão da camara publico judiçial e notas e Almotaçaria da villa de Estarreja confirmando-lhe como por esta confirmo e hey por confirmada âpprezentação que nelle fizerão Abbadeça e mais Relligiozas do Convento de Arouca asim e da maneira que elle o deve [fl. 51v] o deve ser e como o forão os mais proprietários que estes offiçios servirão os quais terá e servirá emquanto o eu houver por bem e não mandar o contrario com declaração que havendo eu por meo serviço de lhos tirar ou extinguir em algum tempo minha fazenda lhe não ficará por isso obrigada a satisfação alguma Portanto mando ao Corregedor da Comarca ou a quem seu cargo servir e as mais Justicas a que tocar meta de pofse destes offiçios ao dito João de Azevedo Varella e Cunha e lhos deixe servir e deles uzar e haver todos os proes e percalsos que direitamente lhe pertençerem sem a isso lhe ser posto duvida ou embargo algum porque asim o hey por bem porquanto foy examinado na meza do Dezembargo do Paço e havido por apto para servir os ditos offiçios e pagou de novos direitos quarenta e nove mil réis que se carregarão ao thezoureiro delles Aleixo Bottelho de Ferreira no Livro 1º de sua reçeita a fl 327 como se viu de seu conhecimento em forma registado no Livro 1º do registo geral a fl 298 verso que elle dito João de Azevedo Varella e Cunha jurara na chançellaria na forma costumada e nella e no Registo do Alvará se porão as verbas necessárias e por firmeza de tudo lhe mandey dar esta carta pafsada pella minha chançellaria e com o sello pendente della Dada na cidade de Lixboa aos vinte e tres dias do mes de Setembro El Rey nosso senhor o mandou pellos Doutores Sebastião da Costa e Miguel Fernandes de Andrade ambos do seu Conselho e seus Dezembargadores do Paço Francisco da Nobriga de Azevedo a fes Anno do Naçimento de nosso senhor Jezus christo de mil e setecentos e nove e pagou quinhentos réis e de asinar duzentos réis // Innocencio Correa de Moura que sirvo deVedor da chansellaria mor do Reino a fis escrever // Sebastião da Costa // Miguel Fernandes de Andrade // Por Alvará de Sua Magestade e despacho do Dezembargo do Paço de 20 de Setembro de 1709 // João de Andrade Leitão // Pagou mil e duzentos réis por ser de apprezentação aos offiçiaes mil cento e quarenta e do Regimento cento e outenta réis [ 98 ]


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Lixboa 26 de Setembro de 1709 e jurou na chançellaria // Innocencio Correa de Moura - [em letra autógrafa] Eu Joam de AzevedoVarella e Cunha conteúdo em o rezisto da carta atrás e asima rezistada da propriedade dos officios nella contheudos faço aqui meu signal publiquo e razo de que hey de uzar em oficio das notas. Lisboa 27 de Setembro do anno de mil e setecentos e nove [assinatura] Em testemunho de verdade João de AzevedoVarella da Cunha e comigo Thomas Ferreira Barreto DOC. 28 ANTT, Chancelaria Régia, Chancelaria de D. João V, Livro 31, fl. 242, doc. 2 1709/08/26 Francisco Barbosa e Cunha – Carta de escrivão dos órfãos da vila de Estarreja [fl. 242] Dom João faço saber aos que esta minha Carta virem que por parte de francisco Barboza e Cunha me foi apresentado hum meu Alvara pafsado pela minha chanselaria do qual o theor he o seguinte ¶ Dezembragadores do Paço amigos havendo respeito a me reprezentar francisco Barboza e Cunha que a Madre Abbadeça e Deputadas do convento de Arouca aprezentarão nelle a propriedade do offiçio de escrivão dos orffãos da villa de estareia como donatarias que herão da dita villa e pre que não podia servir sem comfirmação minha me pedia lhe fizefse merce comfirmar a dita aprezentação e visto o seu requerimento a que não tem duvida o meu Procurador da Coroa sendo ouvido Hei por bem fazerlhe merce de comfirmar como por este comfirmo e hei por confirmada a aprezentação que nelle fes a dita Abbadeça da propriedade do offiçio de escrivão dos orffãos da dita villa de Estarreja para o servir sendo apto. Pello que vos mando o ezamineis e sendo apto como dito he lhe fareis pafsar carta em forma do dito offiçio pagando Primeiro os direitos ordenados com declaração que havendo eu por bem de lhe tirar ou extinguir em algum tempo minha fazenda lhe não ficará por ifso obrigada a satisfação alguma; E este se lhe cumprirá inteira mente como nelle se comtem de que pagou de novos direitos trinta réis que forão carregados ao thezoureiro deles Aleixo Botelho ferreira no livro 1º de sua reçeita a fls. 122 registado no livro 1º do registo Geral a fls. 110 e vallera posto que se efeito haia de durar mais de hum anno sem embargo da ordenação do livro 2º titulo 40 em [fl. 242v] contrario Brás de oliveira o fes em Lixboa a nove de Março de mil sete sentos e nove pagou de feitio duzentos réis francisco Galvão o fes escrever // Rey e pedindome o dito francisco Barboza e Cunha que em vertude do dito Alvara houvese por bem de lhe mandar pafsar carta em forma deste offiçio e visto seu requerimento e Alvara nesta incorporado e por comfiar delle que no de que o emcarregar me servirá bem e fielmente como a meu serviço e bem das partes cumpre e por lhe fazer merce hei por bem e o dou daqui em diante por proprietário do offiçio de escrivão dos orffãos da villa de estarreia confirmamdolhe a aprezentação que nelle fes Abbadeça do convento de Arouca o qual offiçio terá e servirá emquanto o eu ouver por bem e não mandar o contrario com declaração que havendo eu por meu serviço de lho tirar ou extinguir em algum tempo minha fazenda lhe não ficará por ifso obrigada a satisfação alguma. Portanto mando ao Provedor da Comarca ou a quem seu cargo servir e as mais justifsas a que tocar meta de pofse deste offiçio ao dito francisco Barboza e Cunha e lho deixe servir e delle uzar e haver todos os proes e percalços a que direitamente lhe pertenfserem e como levavão os mais proprietários que este offiçio servirão sem que aija de ser posto duvida ou embargo algum porque afsim o hei por bem porquanto foi exzaminado na meza do Dezembargo do Paço e avido por apto para servir o dito offiçio e pagou de novos direitos setenta mil réis que se carregarão ao thezoureiro delles Aleixo Botelho de ferreira no [ 99 ]


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livro 1º de sua reçeita a fls. 293 verso como se vio de seu conheçimento em forma registado no livro 1º do registo geral a fls. 222 verso e elle dito francisco Barboza e Cunha jurara na chansellaria na forma costumada nella em registo do Alvara se porão as verbas necefsarias e por firmeza de tudo lhe mandei dar esta carta pafsada pela minha chansellaria e com o sello pendente della Dada na cidade de lixboa aos vinte e seis dias do mes de Agosto El Rey nofso senhor o mandou pelos Doutores Joseph Galvão de Laçerda e Manoel Carneiro de Sáa ambos do seu conselho e seus Dezembargadores do Paço francisco da Nobrega de Azevedo a fes anno do Nafsimento de Nofso senhor Jesus christo de mil setesentos e nove pagou quinhentos réis e de assignar duzentos réis Ignoçençio Correia de Moura que servio de vedor da chansellaria mor do Reino a fis escrever Joseph Galvão de Laçerda e Manoel Carneiro de Sáa e Por Alvara de Sua Magestade e despacho do Dezembargo do Paço de vinte e dous de Agosto de mil setesentos e nove e Manoel Lopes de oliveira chanseller mor e Pagou trezentos réis por ser de aprezentação e aos offiçiaes seissentos e des réis Lixboa trinta de Agosto de 1709 Ignoçençio Correa de Moura // E comigo [assinatura] Joseph Correa de Moura Licenciado Patriçio Nunes DOC. 29 ANTT, Chancelaria Régia, Chancelaria de D. João V, Livro 90, fl. 342, doc. 2 1737/05/15 Francisco Barbosa da Cunha e Melo – Carta de escrivão dos órfãos da vila de Estarreja [fl. 342] Dom João por graça de Deos Rey de Portugal etc. Faço saber aos que esta minha Carta virem que por parte de Francisco Barboza da Cunha e Mello cavaleyro profeço na ordem de christo me foi apresentada huma minha Provizão asignada pelos Doutores Gregorio Pereyra fidalgo da Silveyra e Antonio Teyxeira Alvares meus Dezembargadores do Paço e passada pela minha chancelaria da qual o theor he o seguinte ¶ Dom João por graça de Deos Rey de Portugal e dos Algarves daquém e dalem mar em Africa senhor de Guiné etc. Faço saber que havendo respeito ao que por sua petição me imviou dizer Francisco Barboza da Cunha e Mello para effeito de lhe comfirmar a nomeação que nelle fes a Abbadeça do Real Mosteyro de Arouca do offiçio de escrivão dos orphaos da villa de estareja de cujo offiçio de cujo offiçio (sic) tinha feito desistência seu Pay Francisco Barboza da Cunha com Licenca minha e visto seu requerimento em que foi ouvido o meu Procurador da Coroa Hey por bem fazer lhe merce de comfirmar como por esta comfirmo e hey por comfirmada a nomeação que nelle fes do do dito offiçio a Abbadessa do Mosteiro de Arouca sendo apto pello que mando aos meus Dezembargadores do Paço o examinem e sendo apto como dito he lhe fação passar carta em forma do dito offiçio pagando primeiro os direitos hordenados, com declaração que havendo eu por bem de lho tirar ou extinguir em algum tempo minha Fazenda lhe não ficará por isso obrigada a satisfação alguma e esta Provizão se lhe cumprirá inteiramente como nella se conthem que valerá posto que seu efeito haja de durar mais de hum anno, sem embargo da ordenação livro segundo titulo quarenta em contrario de que pagou de novos direitos quatrocentos réis que forão carregados ao Thezoureiro deles no livro terçeiro de sua reçeita a folhas duzentas e honze verço como se vio de seu conheçimento em forma registado no livro treçeiro do registo geral a folhas setenta e duas El Rey Nosso Senhor o mandou pellos Doutores Gregorio Pereira Fidalgo da Silveira e Antonio Teyxeira Alvares ambos do seu conçelho e seus Dezembargadores do Paço Joze Ferreira a fes em Lisboa occidental em vinte e hum de Janeiro de mil setecentos trinta e sette pagou duzentos réis Gaspar Galvão de Castellobranco a fes escrever // Gregorio Pereira Fidalgo [ 100 ]


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da Silveira // Antonio Teyxeira Alves // ¶ Pedindome o dito Francisco Barboza da Cunha e Mello que na comformidade da dita minha Provizão houvesse por bem de lhe mandar passar carta em forma da Propriedade do dito offiçio e visto seu requerimento e Provizão referida e comfiando delle dito Francisco Barboza da Cunha e Mello que em tudo de que o emcarregar me servirá [fl. 342v] bem e fielmente como a meu servisso e bem das partes cumpre e por fazer merçe Hey por bem e dou daqui em diante por proprietário do offiçio de Escrivão dos Orphaos da villa de Estarreja asim e da maneira que elle o deve ser e como o forão os mais proprietários seus anteçeçores que o dito offiçio servirão o qual terá e servirá emquanto eu o houver por bem e não mandar o contrario, com declaraçãoque havendo por meu servisso de lho tirar ou extinguir em algum tempo minha Fazenda lhe não ficará por isso obrigada a satisfação alguma, pelo que mando ao Provedor da Comarca de esgueira ou a quem o dito cargo servir que meta de posse deste offiçio ao dito Francisco Barboza da Cunha e Mello e lho deiche servir e delle uzar e haver os proes e precalços que direitamente pertençerem e a todas as mais justissas e offiçiaes e pessoas a que esta minha Carta for apresentada e o conhecimento della pertença lhe cumprão e guardem e a fação inteiramente cumprir e guardar asim e da maneira que nella se conthem sem lhe ser posto duvida ou embargo algum porque asim o hey por bem porquanto foi examinado na meza do meu Dezembargo do Paço e havido por apto para servir o dito offiçio de que pagou de novos direitos setenta mil réis que forão carregados ao thezoureiro delles Manoel Antonio Bottelho de Ferreira no livro 3º de sua reçeita a folhas trezentas e quarenta e seis verco como se vio de hum conheçimento feito pelo escrivão, de seu cargo e asignado por ambos que foi registado no Livro 3º do registo geral dos mesmos direitos a folhas cento outenta e sinco E elle o dito Francisco Barboza da Cunha e Mello jurará em minha chancelaria aos Santos Evangelhos de que bem e verdadeiramente sirva o dito offiçio guardando em tudo meu servisso e as partes seu direito e nos registos da Provizão asima emcorporada dos livros da dita chancellaria e nelles se porão verbas do contheudo nesta que por firmeza de tudo mandei dar ao dito Francisco Barboza da Cunha e Mello passada pela minha chancellaria e com o cello pendente della dada na cidade de Lisboa occidental aos quinze dias do mes de Maio El Rey Nosso Senhor o mandou pellos doutores Antonio Teyxeira Alvares e Belchior do Rego e Andrada ambos do seu concelho e seus Dezembargadores do Paço Rodrigo chavier Alvares de Moura a fes anno do Nassimento de Nosso Senhor Jezus christo de mil sette centos e trinta e sette pagou quinhentos réis e de asignar duzentos réis // Dom Miguel Maldonado a fes escrever // Antonio Teyxeira Alves // Belchior do Rego e Andrade // E por despacho da Meza do Dezembargo do Paço de quatro de Abril de 1737 JosephVas de Carvalho // Pagou trezentos por ser de aprezentação e aos offiçiaes seis centos e des réis Lisboa occidental o primeiro de Junho de 1737 // e jurou na chancellaria mor da corte e reino // Dom Miguel Maldonado [assinatura] licenciado Francisco Joseph de Sáa DOC. 30 ANTT, Chancelaria Régia, Chancelaria de D. João V, Livro 79, fl. 34, doc. 2 1729/05/23 Diogo Leite Cabral – Carta de propriedade dos ofícios de escrivão da câmara e almotaçaria, tabelião do público, judicial, notas da vila de Estarreja [fl. 34] Dom João por graça de Deos Rey de Portugal etc. Faço saber aos que esta minha carta virem que por parte de Diogo Leyte Cabral me fou apresentada uma minha Provizão asinada pelos Doutores [ 101 ]


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Antonio Teixeira Alvares e Manoel da Costa Bonicho meus Dezembargadores do Paço e passada pella minha chansellaria da qual o theor he o seguinte = Dom João por graça de Deos Rey de Portugal e dos Algarues daquém e dalem mar em Africa Senhor de Guine etc. Faço saber que hauendo respeito ao que me reprezentou Diogo Leite Cabral para efeito de lhe confirmar a aprezentação que nelle fes a Abbedeça do Mosteiro da villa de Arouca da propriedade dos officios de Escrivão da [fl. 34v] da Camara e Almotacaria Taballião de publico Judiçial e notas da villa de Estarreja por serem da sua aprezentação e se acharem vagos por falecimento de João de AzeuedoVarella e ter para o exercício deles a capacidade necessária e visto o seu requerimento em que foi ouuido o meu Procurador da Coroa. Hey por bem fazer lhe merce confirmar como por esta confirmo e hey por confirmada a aprezentação que nelle fez a dita Abbadeça dos officios refferidos para os seruirem sendo apto pello que mando aos meus Dezembargadores do Paço o examinem e sendo apto como dito he lhe fação passar carta em forma dos ditos officios pagando primeiro os direitos ordenados com declaração que hauendo eu por bem de lhos tirar ou extinguir em algum tempo minha fazenda lhe não ficará por isso obrigada a satisfação alguma e esta se lhe cumprirá inteiramente como nella se conthem que valera posto que seu effeito haja de durar mais de hum anno sem embargo da ordenação Livro 2º título 40 em contrario de que pagou de novos direitos quatro centos réis que forão carregados ao thezoureiro delles no Livro 13 de sua receita a folhas 68 verso como se vio de hum conhecimento em forma regimentado no Livro 12 do regimento geral a folhas 138. El Rey nosso senhor o mandou pellos doutores Antonio Teixeira Alvares e Manoel da Costa Bonicho ambos do seu conselho e seus Dezembargadores do Paço. Bras de Oliueira a fes em Lisboa occidental a tres de Agosto de mil setecentos vinte e outo pagou duzentos réis Gaspar Galvão de Castellobranco a fes escrever = Antonio Teixeira Alvares = Manoel da Costa Bonicho = Pedindome o dito Diogo Leyte Cabral que na comformidade da dita minha Prouizão ouuese por bem de lhe mandar passar carta em forma da propriedade dos ditos officios e visto seu requerimento e Prouizão refferida e comfiando delle dito Diogo Leyte Cabral que em tudo de que o emcarregar me seruira bem e fielmente como a meu seruiço e bem das partes cumpre e por lhe fazer merce Hey por bem e o dou daqui em diante por proprietario dos officios de Escriuão da Camara e Almotacaria Tabalião do publico judicial e notas da villa de Estarreja assim e da maneira que elle o deue ser, e como o forão os mais proprietarios seus antesessores que os ditos officios seruirão / e esta merce lhe faço a aprezentação da Abbadeça do Mosteiro da villa de Arouca Donataria da dita villa / os quaes terá e seruira em quanto eu o houuer por bem e não mandar o contrario, com declaração que hauendo por meu seruico de lho tirar ou extinguir em algum tempo por qualquer cauza que seja minha fazenda lhe não ficará por ifso obrigada a satisfação alguma portanto mando ao Corregedor da Comarca da Cidade de Coimbra ou a quem o dito cargo seruir que meta de posse destes officios ao dito Diogo Leyte Cabral, e lhos deixe seruir, e delles uzar e hauer o ordenado proes e precalsos que direitamente lhe pertencerem sem lhe ser posto duuida nem embargo algum porque asim o hey por bem por quanto foi examinado na Meza do despacho dos meus Dezembargadores do Paço, e hauido por apto para seruir [fl. 35] os ditos officios de que pagou de nouos direitos quarenta e noue mil réis que forão carregados ao thezoureiro deles Joseph Correa de Moura no Livro 14º de sua receita a folhas 41 verso como se vio de hum conhecimento em forma feito pello Escriuão de seu cargo e asinado por ambos que foi registado no Livro 13º do regimento geral dos mesmos direitos a folhas 32 e elle dito Diogo Leyte Cabral jurara em minha chansellaria aos santos evangelhos de que bem e verdadeiramente sirua guardando em tudo digo sirua os ditos officios guardando em tudo meu serviço e as partes seu direito e nos registos da Prouizão asima incorporada dos liuros da dita chansellaria em que se porão verbas do contheudo nesta carta que por firmeza de [ 102 ]


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tudo mandey dar ao dito Diogo Leyte Cabral passada pella minha chansellaria e com o sello pendente della. Dada na cidade de Lisboa occidental aos vinte e tres dias do mes de Mayo. El Rey Nosso Senhor o mandou pellos Doutores Gregorio Pereira Fidalgo da Silveira e Manoel da Costa Bonicho ambos de seu conselho e seus Dezembargadores do Paço. Rodrigo Xauier Aluares de Moura a fes anno do Nacimento de Nosso Senhor Jezus christo de mil setecentos vinte e noue pagou 500 réis e de asinar 200 réis Dom Miguel Maldonado a fes escrever = Gregorio Pereira Fidalgo da Silueira // Manoel da Costa Bonicho //. E por despacho da Meza do Dezembargo do Paço de 18 de Mayo de 1729. JosephVas de Carvalho Pagou outo centos réis e de avaliação noue mil e outo centos réis, e aos officiaes mil e duzentos réis Lisboa occidental 28 de Mayo de 1729 e jurou na chansellaria aos santos evangelhos digo e jurou na chansellaria mor da Corte e Reino Dom Miguel Maldonado [assinatura] licenciado Luis Figueira de Sáa

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FONTES E BIBLIOGRAFIA FONTES MANUSCRITAS ANTT – Arquivo Nacional Torre do Tombo Chancelaria de D. Afonso V, Liv. 32 Chancelaria de D. João II, Liv. 15, 22 e 27 Chancelaria de D. Manuel I, Liv. 8, 10, 18, 29, 33, 38, 39, 42, 46 e 56 Chancelaria de D. João III, Liv. 1, 17, 18, 20, 40, 45, 46 e 47 Chancelaria de D. Sebastião e D. Henrique, Liv. 6, 8 e 10; Privilégios, Liv. 2 Chancelaria D. Filipe II, Liv. 3, 17, 21 e 34 Chancelaria D. Filipe III, Liv. 1, 9, 15 e 31 Chancelaria D. João IV, Liv. 17 Chancelaria D. Afonso VI, Liv. 23 e 52 Chancelaria D. Pedro II, Liv. 21, 25, 39 e 48 Chancelaria D. João V, Liv. 29, 31, 34, 44, 68, 79, 88, 90, 125 e 127 Chancelaria Ordem de Cristo, Liv. 101 Corpo Cronológico, Parte II, maço 149, nº 59 Habilitações do Santo Ofício, letra A, maço 28, nº 751; letra B, maço 5, nº 81; letra F, maço 2, nº 92; letra J, maço 9, nº 285; incompletas, nº 256 Leitura de Bacharéis, letra S, maço 2, nº 4 Moradias da Casa Real, maço 6, Liv. 2 ADAVR – Arquivo Distrital de Aveiro Livros Paroquiais das freguesias de Esgueira, Ovar, Pinheiro da Bemposta, Santa Maria de Sardoura, São Martinho de Sardoura e Valongo do Vouga ADVRL – Arquivo Distrital de Vila Real Livros Paroquiais da freguesia de Vilar de Maçada AUC – Arquivo da Universidade de Coimbra Convento de S. Domingos de Aveiro, Livro de Lembranças de Missas III Índice de Alunos da Universidade de Coimbra, letra C, nºs 002207, 014599, 014995, 015614 e 015672; letra V, nº 000820 Árvore de genealogia dos Pinhos, Almeidas e Amarais…, de D. Frei Bernardo do Amaral (cópia de António Fernando de Sequeira Sottomayor) Genealogia dos Valentes e Silvas…, de D. Frei Bernardo do Amaral (cópia de António Fernando de Sequeira Sottomayor) FONTES IMPRESSAS Annaes do Município de Oliveira de Azeméis (Fac-Símile da 1ª edição de 1909 – Livraria Chardron, de Lello & Irmão, Porto ed.). (2011). Oliveira de Azeméis, Portugal: Município de Oliveira de Azeméis [ 104 ]


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INTERNET Aveiro, A. D. (Ed.). (21 de Dezembro de 2018). Notariais – Cartório Notarial de Estarreja – 1º Ofício – Inventário. Obtido em 3 de Março de 2019, de Arquivo Distrital de Aveiro: http://adavr.dglab.gov.pt/wp-content/uploads/sites/5/2018/12/Invent%C3%A1rioPT-ADAVR-NOT-CNETR1.pdf Avelãs de Caminho, J. F. (Ed.). (s.d.). Foral Manuelino. (Niceoffice) Obtido em 3 de Julho de 2017, de Avelãs de Caminho. Sua terra suas gentes!: http://avelasdecaminho.pt/ niceoffice/mod1/?&tp=temp001&fid=1.0&lg=PT BRITO, F. (s.d.). Casa de Eiriz. O livro da Casa de Eiriz. Obtido em 28 de Março de 2019, de Academia: https://www.academia.edu/23609472/CASA_DE_EIRIZ._O_Livro_da_ Casa_de_Eiriz CÁLÃO, H. (14 de Setembro de 2011). Padroados das Igrejas da Diocese de Aveiro. (H. Cálão, Ed.) Obtido em 8 de Fevereiro de 2019, de Arquivos Paroquiais da Diocese de Aveiro. Repositório virtual dos fundos de arquivo e livro antigo das 101 Paróquias da Diocese de Aveiro: http://arquivosparoquiaisaveiro.blogspot.com/2011/09/padroados-das-igrejasda-diocese-de.html Ordenações Afonsinas: http://www1.ci.uc.pt/ihti/proj/afonsinas/ Ordenações Manuelinas: http://www.ci.uc.pt/ihti/proj/manuelinas/ Ordenações Filipinas: http://www1.ci.uc.pt/ihti/proj/filipinas/ordenacoes.htm

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DELFIM BISMARCK FERREIRA

A FAMÍLIA QUADROS EM SALREU DESDE O FINAL DO SÉCULO XVIII (PARTE II) Delfim Bismarck Ferreira*

Depois de na primeira parte deste artigo termos apresentado os descendentes de José Bernardo de Quadros Teixeira Côrte-Real, nascidos até 1900, no presente número falaremos de seus irmãos D. Margarida Engrácia e Bernardo Jacinto que igualmente se fixaram na freguesia de Salreu. 2(X) - D. MARGARIDA ENGRÁCIA DE QUADROS CÔRTE-REAL, proprietária e doméstica, nasceu na “Quinta da Póvoa”, em Recardães, onde foi baptizada em 2 de Janeiro de 1737.1 Casou em 20 de Abril de 1754 em Eixo2, com SEVERIANO JOSÉ DA SILVA BRANDÃO, natural de Salreu, filho do Cap. Bernardino Brandão da Silva, capitão de ordenanças de Salreu, e de sua mulher D. Teresa Maria Figueira e Pinho (2.º casamento); neto paterno do Cap. Manuel Brandão e de sua mulher Maria da Silva; neto materno do Dr. Cipriano Martins e de sua mulher Mariana de Pinho Figueira. Severiano José viveu muitos anos viúvo na sua quinta junto à Fonte dosValles, em Salreu. deixou por herdeiros seus sobrinhos, filhos de Bernardo Jacinto3. Faleceu em 4 de Novembro de 1796 no Couto, em Salreu.4 D. Margarida Engrácia faleceu em 21 de Novembro de 1817 no Couto, em Salreu5, sem geração. 6(X) - BERNARDO JACINTO DE QUADROS PACHECO CÔRTE-REAL, proprietário, nasceu em Eixo, onde foi baptizado em 24 de Novembro de 17486, e foi Senhor da “Casa de Queirós”, em Antuã, Salreu.7 Casou em 1 de Junho de 1793 em Salreu8, com D. RAQUEL MARIA PINTO CORREIA DE ALMEIDA E CALVOS, proprietária e doméstica, nascida em 31 de Março de 1774 na “Casa do Couto”, em Salreu.9 Era filha de João do Amaral Correia de Almeida e Calvos, Senhor da “Casa do Couto”, em Salreu, de onde era natural, juíz dos órfãos de Estarreja por provisões de 9 de Agosto de 178710 e de 9 de Dezembro de 179411, Cavaleiro professo na Ordem de Cristo, fidalgo de * Historiador 1 - ADA, Livro Paroquial de Recardães, n.º 3, Baptismos, fl. 20v. 2 - ADA, Livro Paroquial de Eixo, n.º 9, Casamentos, fls. 30-30v. 3 - ADB, Manuscrito 997, fl. 199. 4 - ADA, Livro Paroquial de Salreu, n.º 8, Óbitos, fl. 38v. 5 - ADA, Livro Paroquial de Salreu, n.º 8, Óbitos, fl.s. 196-196v. 6 - ADA, Livro Paroquial de Eixo, n.º 3, Baptismos, fls. 265v.-266. 7 - GONÇALVES, M. P., 2005, p. 147. 8 - ADA, Livro Paroquial de Salreu, n.º 7, Casamentos, fl. 61v. 9 - ADA, Livro Paroquial de Salreu, n.º 2, Baptismos, fls. 226-226v. 10 - IAN/TT, Chancelaria de D. Maria I, liv. 30, fl. 269. 11 - IAN/TT, Registo Geral de Mercês, Registo de Certidões, Liv. I, fl. 173 v.

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Cota de Armas por carta de 24 de Julho de 1788 (Calvos, Correia, Silva e Amaral)12, e de sua mulher D. Mariana Inácia de Almeida e Macedo, natural de Coimbra, moradores na “Casa do Couto”, em Salreu; neta paterna de José Caetano de Almeida e Amaral, natural de Salreu, onde foi Senhor da “Casa do Couto” e da Capela de São Mateus, Ouvidor de Estarreja e familiar do Santo Ofício por carta de 3 de Março de 173913, e de sua mulher D. Raquel Maria Pinto Correia da Silva Calvos14, natural Aregos, Senhora da “Quinta da Granja” em Aregos, São Miguel de Anreade, Resende; neta materna de Roque Francisco Guimarães e de sua mulher D. Ana Josefa de Almeida Macedo, de Coimbra. Bernardo Jacinto faleceu em 28 de Dezembro de 1821 na “Casa do Couto”, em Salreu.15 D. Raquel Maria foi Senhora da “Quinta da Teixeira”, em Carvalhal, Macinhata do Vouga, que vendeu em 8 de Fevereiro de 182916, e faleceu em 4 de Outubro de 1830 em Antuã, Salreu.17 Residiram inicialmente na “Casa do Couto”, depois na Rua de São Martinho, mais tarde em Antuã, e na “Casa de Queirós”18, em Salreu, onde tiveram treze filhos: Maria José, Raquel Maria, Antónia Augusta, Bernardo José, Caetano José, Margarida Engrácia, José Joaquim, João, Filipe José, António Joaquim, Maria Engrácia, Inocência Margarida e Ana Peregrina.

“Casa do Couto”, em Salreu - século XVIII19

12 - BORREGO, N., vol. II, 2004, p. 190. 13 - IAN/TT, Habilitações do Santo Oficio, José, m. 44, n.º 711 (LIMA, J. H. P., 1969, p. 149). 14 - Assim surge nos registos de seus netos, embora no Processo de habilitação para o Santo Ofício de seu marido, seja identificada como Raquel Maria Pinto da Fonseca e Silva. 15 - ADA, Livro Paroquial de Salreu, n.º 8, Óbitos, fl. 236v. 16 - GONÇALVES, M. P., 2005, p. 148. 17 - ADA, Livro Paroquial de Salreu, n.º 8, Óbitos, fl. 328v. 18 - Segundo apontamentos de Francisco Marques Rodrigues. 19 - Fotografia da década de 70 do século XX. Fundo Francisco Marques Rodrigues.

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DELFIM BISMARCK FERREIRA

Pedra de armas existente na fachada principal da “Casa do Couto”, em Salreu, com o brasão de armas atribuído em 24 de Julho de 1788, pela Rainha D. Maria I, a João do Amaral Correia de Almeida e Calvos20

Escudo francês (mal representado), esquartelado: 1.º - Calvos, esquartelado: o primeiro e o quarto de vermelho, com cinco fivelas redondas (aqui mal representadas) de prata postas em sautor; o segundo e o terceiro de azul, com cinco vieiras de prata, também em sautor (mal representadas); escudete sobreposto de ouro, com um leopardo de sua cor; 2.º - Correia, de ouro, fretado de vermelho, de seis peças; 3.º - Silva, de prata, com um leão de púrpura, armado e lampassado de vermelho ou de azul; 4.º - Amaral, de ouro, seis crescentes invertidos de azul (aqui mal representados). Elmo, paquife e timbre: deteriorados21. Escudo assente numa cartela decorativa de inspiração barroca

Pedra de armas existente na fachada principal do jazigo da família da “Casa do Couto”, no cemitério de Salreu22, com o brasão de armas atribuído em 24 de Julho de 1788, pela Rainha D. Maria I, a João do Amaral Correia de Almeida e Calvos. Escudo francês (mal representado), esquartelado: 1.º - Calvos, esquartelado: o primeiro e o quarto de vermelho, com cinco fivelas redondas (aqui mal representadas) de prata postas em sautor; o segundo e o terceiro de azul, com cinco vieiras de prata, também em sautor (mal representadas); escudete sobreposto de ouro, com um leopardo de sua cor; 2.º - Correia, de ouro, fretado de vermelho, de seis peças; 3.º - Silva, de prata, com um leão de púrpura, armado e lampassado de vermelho ou de azul; 4.º - Amaral, de ouro, seis crescentes invertidos de azul (aqui mal representados). Elmo, paquife e timbre: deteriorados. Escudo assente numa cartela decorativa

20 - BORREGO, N., vol. II, 2004, p. 190. O original da Carta de Brasão de Armas referente a este brasão, esteve exposto na Esposição Districtal de Aveiro de 1882, pelo seu então detentor Francisco António do Amaral Cirne, de Salreu (GOMES, M., 1883, p. 86). Fotografia da década de 70 do século XX. Fundo Francisco Marques Rodrigues. 21 - O timbre era o dos Calvos, que é o leopardo do escudo. 22 - Fotografia gentilmente cedida pelo Prof. Doutor Martim de Albuquerque.

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“Casa dos Côrte-Reais”, em Salreu23

1(XI) - D. MARIA JOSÉ DE QUADROS CÔRTE-REAL, proprietária e doméstica, nasceu em 6 de Julho de 1793 na Rua de São Martinho, em Salreu24, onde faleceu solteira em 15 de Novembro de 1857.25 2 (XI) - D. RAQUEL MARIA PINTO DE QUADROS CÔRTE-REAL. (Ver: § 1.º BARBOSA DE QUADROS, de Ossela) 3(XI) - D.ANTÓNIA AUGUSTA DE QUADROS CÔRTE-REAL, proprietária e doméstica, nasceu em 29 de Setembro de 1796 na Rua de São Martinho, em Salreu26, onde residiu e faleceu solteira e sem geração em 26 de Dezembro de 1861 na “Casa do Couto”.27 4(XI) - BERNARDO JOSÉ PINTO DE QUADROS CÔRTE-REAL, nasceu em 24 de Março de 1798 na “Casa do Couto”, em Salreu28, onde residiu e faleceu em 4 de Janeiro de 1851.29 23 - Fotografia do autor. 24 - ADA, Livro Paroquial de Salreu, n.º 3, Baptismos, fl. 258. 25 - ADA, Livro Paroquial de Salreu, n.º 21, Óbitos, fl. 19. 26 - ADA, Livro Paroquial de Salreu, n.º 3, Baptismos, fl. 287. 27 - ADA, Livro Paroquial de Salreu, n.º 21, Óbitos, fl. 71, reg. n.º 71. 28 - ADA, Livro Paroquial de Salreu, n.º 4, Baptismos, fl. 17v. 29 - ADA, Livro Paroquial de Salreu, n.º 20, fl. 147.

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DELFIM BISMARCK FERREIRA

5(XI) - Cap. CAETANO JOSÉ TAVARES DE QUADROS CÔRTE-REAL, Senhor da “Casa de Fontechãs”30 em Pinheiro da Bemposta e da “Quinta das Lapas”, em Antuã, Salreu, nasceu em 7 de Abril de 1800 na “Casa do Couto”, em Salreu.31 Foi capitão do Regimento de Milícias de Aveiro32 e graduado em Major do Batalhão de Milicias de Aveiro, tendo falecido em 9 de Agosto de 1833 em Leiria, onde se achava por occazião que o Batalhão havia marchado sobre a Provincia do Alentejo.33 6(XI) - D. MARGARIDA ENGRÁCIA DE QUADROS CÔRTE-REAL, proprietária e doméstica, nasceu em 16 de Abril de 1803 na “Casa do Couto”, em Salreu34. Casou em 27 de Fevereiro de 1835 em Salreu35, com JOÃO AGOSTINHO AFONSO DA SILVEIRA, proprietário, nascido em 7 de Setembro de 1810 no lugar da Póvoa, Beduído, Estarreja.36 Era filho de João Gualberto Afonso, natural de Beduído, Estarreja, e de sua mulher D. Angélica Maria Rodrigues da Silveira, natural de Cacia, moradores na Póvoa, Beduído, Estarreja; neto paterno do Dr. José Afonso Alberto e de sua mulher D. Ana Teresa Florência dos Santos, da Póvoa, Beduído; neto materno do Dr. Pedro Dias e de sua mulher D. Joana Rodrigues, da Quintã do Loureiro, Cacia. João Agostinho faleceu em 22 de Setembro de 1844 nas Laceiras, Salreu37. D. Margarida Engrácia faleceu em 7 de Agosto de 1877 no Couto, em Salreu38. Residiram nas Laceiras e na Rua de São Martinho, em Salreu, onde tiveram, pelo menos, dois filhos: Maria Isménia e José Fortunato. 1(XII) - D. MARIA ISMÉNIA DE QUADROS CÔRTE-REAL, proprietária e doméstica, nasceu em 11 de Dezembro de 1835 em Antuã, Salreu39, morou nas Laceiras e depois no Couto, onde faleceu solteira e sem geração em 19 de Abril de 1873.40

Assinatura de D. Maria Isménia de Quadros Côrte-Real (1862)

30 - Por sucessão de seu tio Dr. Caetano José de Quadros Côrte-Real (AAVV, 2006, p. 1144). 31 - ADA, Livro Paroquial de Salreu, n.º 4, Baptismos, fl. 48. 32 - BORREGO, N. G. P., vol. I, 2006, p. 708. 33 - Testamento de 12 de Dezembro de 1832 em Vila Nova de Gaia. Doc. de Francisco Marques Rodrigues. 34 - ADA, Livro Paroquial de Salreu, n.º 4, Baptismos, fl. 79v. 35 - ADA, Livro Paroquial de Salreu, n.º 15, Casamentos, fl. 6v. 36 - ADA, Livro Paroquial de Beduído, n.º 13, Baptismos, fl. 45. 37 - ADA, Livro Paroquial de Salreu, n.º 20, Óbitos, fl. 108. 38 - ADA, Livro Paroquial de Salreu, n.º 24, Óbitos, fl. 9, reg. n.º 39. 39 - ADA, Livro Paroquial de Salreu, n.º 6, Baptismos, fl. 297v. 40 - ADA, Livro Paroquial de Salreu, n.º 23, Óbitos, fls. 4v.-5, reg. n.º 14.

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2(XII) - JOSÉ FORTUNATO AFONSO DA SILVEIRA DE QUADROS CÔRTEREAL, proprietário, nasceu em 19 de Abril de 1839 em Antuã, Salreu.41 Casou em 25 de Janeiro de 1858 em Salreu42, com D. MARIA CÂNDIDA DE VILHEGAS PAIVA PEREIRA DE MELLO, proprietária e doméstica, natural de Beduído, Estarreja. Era filha do Dr. António Bernardino Vilhegas e Paiva e de sua mulher D. Maria Custódia Vaz Freire de Mello, de Beduído, Estarreja. José Fortunato faleceu em 22 de Setembro de 1877 no Couto, em Salreu.43 Resiram nas Laceiras e depois no Couto, em Salreu, e mais tarde em Beduído. Tiveram, pelo menos, doze filhos: António Fortunato, Maria Emília, Maria Isménia, José Fortunato, Maria Augusta, Gracinda Augusta, Maria Amália, João Fortunato, Guilherme, Bernardo Augusto, Ernesto e Álvaro Augusto.

Assinatura de José Fortunato Afonso da Silveira de Quadros Côrte-Real (1862)

1(XIII) - ANTÓNIO FORTUNATO VILHEGAS DE QUADROS CÔRTEREAL, escriturário da fazenda pública, nasceu em 18 de Abril de 1858 em Beduído, Estarreja44. Casou em 14 de Junho de 1884 em Salreu45, com D. CLEMÊNCIA ANTÓNIA NETO CONDE, proprietária e doméstica, natural da Murtosa. Era filha de João José Conde e de sua mulher Rita de Cacia Neto, da Murtosa. S.m.n. 2(XIII) - D. MARIA EMÍLIA, nasceu em 1860 nas Laceiras, Salreu, onde faleceu ainda criança, em 17 de Outubro de 1860.46 3(XIII) - D. MARIA ISMÉNIA DE MELO VILHEGAS DE QUADROS CÔRTEREAL, proprietária e doméstica, nasceu em Salreu. Casou em 17 de Abril de 1883 em Salreu47, com seu primo em 3.º grau,ANTÓNIO FERREIRA VIDAL, proprietário que havia estado no Brasil, natural de Salreu.

41 - ADA, Livro Paroquial de Salreu, n.º 9, Baptismos, fls. 68v.-69. 42 - ADA, Livro Paroquial de Salreu, n.º 15, Casamentos, fl. 115-115v. 43 - ADA, Livro Paroquial de Salreu, n.º 24, Óbitos, fls. 10v.-11, reg. n.º 48. 44 - ADA, Livro Paroquial de Beduído, n.º 21, Baptismos, fls. 73-73v. 45 - ADA, Livro Paroquial de Salreu, n.º 29, Casamentos, fls. 11v.-12, reg. n.º 21. 46 - ADA, Livro Paroquial de Salreu, n.º 21, Óbitos, fl. 45, reg. n.º 37. 47 - ADA, Livro Paroquial de Salreu, n.º 29, Casamentos, fls. 4v.-5, reg. n.º 8.

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DELFIM BISMARCK FERREIRA

Era filho de João Luís Ferreira Vidal, proprietário, e de sua mulher D. Maria José Afonso da Silveira, das Laceiras, Salreu; neto paterno de José Luís Ferreira Vidal e de Josefa Maria de Almeida, de Salreu; neto materno do Dr. João José Lopes da Silva48 e de D. Maria Emília Afonso da Silveira, das Laceiras. Residiram primeiro em Avanca, e depois nas Laceiras, em Salreu, e tiveram, pelo menos, um filho: Américo.

Assinatura de D. Maria Isménia de Melo Vilhegas de Quadros Côrte-Real (1889)

1(XIV) - AMÉRICO (DE QUADROS CÔRTE-REAL) VIDAL, caixeiro, nasceu em Avanca e emigrou em 1900, solteiro, para Lourenço Marques, Moçambique.49 S.m.n. 4(XIII) - JOSÉ FORTUNATO DE QUADROS CÔRTE-REAL, proprietário e escriturário na Escola Práctica Central de Agricultura e Coudelaria Nacional do Norte, nasceu em 16 de Setembro de 1863 nas Laceiras, em Salreu.50 Casou em 14 de Julho de 1890 em Cucujães, Oliveira de Azeméis, com D. EMÍLIA DE BASTOS VALENÇA, nascida em 1865 em Valença. Era filha de Domingos Fernandes Valença, natural de Valença, e de sua mulher Emília Margarida de Bastos. José Fortunato emigrou para o Brasil51. S.m.n. 5(XIII) - D. MARIA AUGUSTA VILHEGAS DE QUADROS CÔRTE-REAL, proprietária e doméstica, nasceu em 30 de Março de 1865 nas Laceiras, Salreu.52 Casou em 29 de Novembro de 1887 em Salreu53, com seu primo em 3.º grau, CAETANO FERREIRA VIDAL, proprietário, nascido em 10 de Agosto de 1866 na Rua de São Martinho, em Salreu.54 Era filho de João Luís Ferreira Vidal, proprietário, e de sua mulher D. Maria José Afonso da Silveira, das Laceiras, Salreu; neto paterno de José Luís Ferreira Vidal e de Josefa Maria de Almeida, de Salreu; neto materno do Dr. João José Lopes da Silva e de D. Maria Emília Afonso da Silveira, das Laceiras.

48 - Formado em Direito pela Universidade de Coimbra (1823) (PT/AUC/ELU/UC-AUC/B/001-001/S/007009). 49 - SANTOS, V., 2008, p. 150. 50 - ADA, Livro Paroquial de Salreu, n.º 10, Baptismos, fls. 232-232v., reg. n.º 79. 51 - ADA, Inventários Orfanológicos, m. 68, n.º 17. 52 - ADA, Livro Paroquial de Salreu, n.º 11, Baptismos, fl. 46v., reg. n.º 40. 53 - ADA, Livro Paroquial de Salreu, n.º 29, Casamentos, fls. 14-14v., reg. n.º 28. 54 - ADA, Livro Paroquial de Salreu, n.º 11, Baptismos, fl. 86v., reg. n.º 58.

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Caetano emigrou no final de 1899 para a África Oriental.55 Residiram nas Laceiras, em Salreu, onde tiveram, pelo menos, seis filhos: Etelvina, Adolfo, José Fortunato, Maria do Céu, Caetano e Urbano. 1(XIV) - D. ETELVINA QUADROS CÔRTE-REAL, doméstica, nasceu em 15 de Setembro de 1887 nas Laceiras, em Salreu56, e faleceu solteira em 20 de Janeiro de 1939 na Rua do Alcaide, em Frossos, Albergaria-a-Velha.57 2(XIV) - ADOLFO, nasceu em 17 de Abril de 1889 nas Laceiras, Salreu.58 S.m.n. 3(XIV) - JOSÉ FORTUNATO FERREIRA VIDAL, funcionário público, nasceu em 24 de Abril de 1891 nas Laceiras, Salreu.59 Casou em 21 de Março de 1919 em Aveiro60, com MARIA INÊS DE OLIVEIRA FREITAS, costureira e doméstica, natural da Glória, Aveiro. Era filha de António de Freitas, carteiro, natural da Vera Cruz, Aveiro, e de sua mulher Leopoldina da Glória, doméstica, , natural de Oliveira de Azeméis. Maria Inês faleceu em 27 de Maio de 1955 na Glória, Aveiro. José Fortunato faleceu em 14 de Dezembro de 1967 em Ovar. Residiram na Rua de Sá, em Aveiro. S.m.n. 4(XIV) - MARIA DO CÉU, nasceu em 20 de Maio de 1894 nas Laceiras, em Salreu61. S.m.n. 5(XIV) - CAETANO, nasceu em 30 de Novembro de 1895 nas Laceiras, em Salreu62. S.m.n. 6(XIV) - URBANO, nasceu em 31 de Agosto de 1899 na Rua de São Martinho, em Salreu63. S.m.n. 6(XIII) - D. GRACINDA AUGUSTA DE MELO VILHEGAS DE QUADROS CÔRTE-REAL, proprietária, costureira e doméstica, nasceu nas Laceiras, em Salreu, onde foi baptizada em 10 de Janeiro de 1868.64

55 - TUBBY, T. C.; SANTOS, V., 2016, p. 209. 56 - ADA, Livro Paroquial de Salreu, n.º 25, Baptismos, fl. 30, reg. n.º 88. 57 - CRCAAV, Livro de Registo Civil do Concelho de Albergaria-a-Velha, Óbitos de 1939, reg. n.º 24. 58 - ADA, Livro Paroquial de Salreu, n.º 25, Baptismos, fls. 18v.-19, reg. n.º 55. 59 - ADA, Livro Paroquial de Salreu, n.º 26, Baptismos, fls. 17-17v., reg. n.º 50. 60 - CRCCA, Livro de Registo Civil do Concelho de Aveiro, Casamentos de 1919, fls. 26-26v., reg. n.º 26. 61 - ADA, Livro Paroquial de Salreu, n.º 26, Baptismos, fls. 16v.-17, reg. n.º 53. 62 - ADA, Livro Paroquial de Salreu, n.º 26, Baptismos, fls. 51-51v., reg. n.º 137. 63 - ADA, Livro Paroquial de Salreu, n.º 28, Baptismos, fl. 28v., reg. n.º 84. 64 - ADA, Livro Paroquial de Salreu, n.º 11, Baptismos, fls. 162v.-163, reg. n.º 29.

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DELFIM BISMARCK FERREIRA

Casou em 13 de Junho de 1889 em Salreu, com seu primo em 3.º grau65, FRANCISCO FERREIRA VIDAL, escriturário da Fazenda Pública e depois funcionário público no Ultramar, nascido em 10 de Dezembro de 1862 nas Laceiras, em Salreu.66 Era filho de João Luís Ferreira Vidal, proprietário, e de sua mulher D. Maria José Afonso da Silveira, das Laceiras, Salreu; neto paterno de José Luís Ferreira Vidal e de Josefa Maria de Almeida, de Salreu; neto materno do Dr. João José Lopes da Silva e de D. Maria Emília Afonso da Silveira, das Laceiras. Residiram na Rua de São Martinho, em Salreu, onde tiveram, pelo menos, quatro filhos: Maria Cândida, Carmina, Aurelino e Hermosa. 1(XIV) - D. MARIA CÂNDIDA DE QUADROS VIDAL, doméstica, nasceu em 22 de Outubro de 1889 no Couto, Salreu.67 Casou em 3 de Janeiro de 1914 em Salreu68, com o Dr. EDUARDO DE ALMEIDA E SILVA DE LIMA, médico e autarca, nascido a 2 de Setembro de 1895 no Outeiro da Marinha, em Beduído, Estarreja.69 Era filho de Manuel de Almeida e Silva Lima, negociante e proprietário, natural de São Miguel do Mato, e de Margarida da Conceição Lima, natural de Figueiredo das Donas, Vouzela. O Dr. Eduardo doi presidente da Câmara Municipal de Estarreja (19281930) e faleceu em 30 de Junho de 1931 em Figueiredo das Donas, Vouzela. D. Maria Cândida faleceu sem geração em 1 de Fevereiro de 1975 na freguesia de Campo Grande, Lisboa. 2(XIV) - D. CARMINA DE QUADROS VIDAL CÔRTE-REAL, também identificada como Carmen, doméstica, nasceu em 3 de Abril de 1891 nas Laceiras, em Salreu70. Casou em 17 de Abril de 1910 em Salreu71, com ANTERO DA SILVA PEREIRA, ferroviário, natural da Glória, Aveiro. Era filho de José Maria Pereira, natural da Vera-Cruz, Aveiro, e de sua mulher Mariana da Silva Pereira, natural de Ílhavo, moradores em Aveiro. Antero faleceu em 21 de Fevereiro de 1928. Carmina faleceu em 2 de Agosto de 1987 na Glória, Aveiro. Residiram em Paços de Brandão, na Branca e depois em Aveiro, e tiveram pelo menos dois filhos: Maria Gracinda e Francisco Augusto.

65 - ADA, Livro Paroquial de Salreu, n.º 29, Casamentos, fls. 3v.-4, reg. n.º 6. 66 - ADA, Livro Paroquial de Salreu, n.º 10, Baptismos, fls. 204-204v., reg. n.º 115. 67 - ADA, Livro Paroquial de Salreu, n.º 25, Baptismos, fls. 35v.-36, reg. n.º 103. 68 - CRCE, Livro de Registo Civil do Concelho de Estarreja, Casamentos de 1914, fls. 91-91v., reg. n.º 17. 69 - ADA, Livro Paroquial de Beduído, n.º 64, Baptismos, fl. 25, reg. n.º 70. 70 - ADA, Livro Paroquial de Salreu, n.º 26, Baptismos, fls. 13v.-14, reg. n.º 39. 71 - ADA, Livro Paroquial de Salreu, n.º 45, Casamentos, fls. 5v.-6, reg. n.º 10.

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3(XIV) - AURELINO, nasceu em 16 de Março de 1894 na Rua de São Martinho, em Salreu, onde faleceu recém-nascido em 22 de Abril de 1894.72 4(XIV) - HERMOSA, nasceu em 31 de Março de 1899 na Rua de São Martinho, em Salreu73, onde faleceu recém-nascida em 28 de Novembro de 1899.74 7(XIII) - JOÃO FORTUNATO DE QUADROS CÔRTE-REAL, proprietário, nasceu em 9 de Janeiro de 1867 nas Laceiras, em Salreu.75 Casou em 27 de Setembro de 1890 em Salreu76, com MARIA AUGUSTA RODRIGUES DE ALMEIDA, costureira e depois doméstica e proprietária, nascida em 24 de Janeiro de 1868 na Rua de São Martinho, em Salreu. Era filha natural de Rosa Rodrigues de Almeida, tecedeira, solteira, natural de Salreu, neta materna de Lourenço de Almeida e de Maria Rodrigues, lavradores, naturais de Salreu.77 João Fortunato emigrou para Lourenço Marques, Moçambique, em 189778 e faleceu em 1907. Residiram na Rua de São Martinho e depois na Senhora do Monte, em Salreu, onde tiveram, pelo menos, dois filhos: Albertino e António. Maria Augusta teve ainda, pelo menos, um filho ilegítimo, de nome Américo. 1(XIV) - ALBERTINO, nasceu em 30 de Maio de 1891 na Rua de São Martinho, em Salreu79, onde faleceu em 21 de Setembro de 1892. 2(XIV) - ANTÓNIO DE QUADROS CÔRTE-REAL, proprietário, nasceu em 18 de Junho de 1893 na Rua de São Martinho, em Salreu80. Casou em 13 de Fevereiro de 1931 em Estarreja81, com ALBERTINA DE JESUS DE PINHO, doméstica, nascida em 1909 na Murtosa. Era filha de Joaquim Marques, negociante, natural de Beduído, Estarreja, e de sua mulher Maria Rosália de Pinho, doméstica, natural da Murtosa, moradores no Outeiro da Marinha, Estarreja. António faleceu em 15 de Setembro de 1986 em Salreu. Residiram na Senhora do Monte, em Salreu. S.m.n.

72 - ADA, Livro Paroquial de Salreu, n.º 26, Baptismos, fl. 11, reg. n.º 34. 73 - ADA, Livro Paroquial de Salreu, n.º 28, Baptismos, fl. 16v., reg. n.º 48. 74 - ADA, Livro Paroquial de Salreu, n.º 41, Óbitos, fl. 16, reg. n.º 77. 75- ADA, Livro Paroquial de Salreu, n.º 11, Baptismos, fls. 106-106v., reg. n.º 10. 76 - ADA, Livro Paroquial de Salreu, n.º 29, Casamentos, fls. 8-8v., reg. n.º 15. 77 - ADA, Livro Paroquial de Salreu, n.º 11, Baptismos, fls. 154-154v., reg. n.º 15. 78 - CRUZ, T.; SANTOS, V., 2014, p. 291. 79 - ADA, Livro Paroquial de Salreu, n.º 26, Baptismos, fls. 23-23v., reg. n.º 69. 80 - ADA, Livro Paroquial de Salreu, n.º 26, Baptismos, fl. 25v., reg. n.º 78. 81 - CRCE, Livro de Registo Civil do Concelho de Estarreja, Casamentos de 1931, fls. 20-20v., reg. n.º 20.

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DELFIM BISMARCK FERREIRA

8(XIII) - D. MARIA AMÁLIA VILHEGAS DE QUADROS CÔRTE-REAL, proprietária e doméstica, nasceu 3 de Agosto de 1869 nas Laceiras, em Salreu82. Residiu solteira, primeiro em Coimbra, e depois nas Laceiras, Salreu, onde faleceu ma década de 20 e teve, pelo menos, uma filha natural: Georgina. 1(XIV) - D. GEORGINA DE CASTRO CÔRTE-REAL, doméstica, nasceu em 8 de Dezembro de 1898 nas Laceiras, em Salreu83. Casou em 23 de Abril de 1927 no Entroncamento, Vila Nova da Barquinha84, com o Cap. JOSÉ DA CÂMARA SAMPAIO, Capitão da Administração Militar, nascido em 1891 em São Sebastião, Ponta Delgada, Açores. Era filho de Francisco da Câmara Sampaio, militar, natural de São Pedro, Ponta Delgada, e de sua mulher D. Carolina Amélia de Sampaio, natural de Rabo de Peixe, Ribeira Grande. O Cap. José faleceu em 18 de Outubro de 1964 na Fajã de Baixo, Ponta Delgada. Residiram em Ramalho e depois na Rua do Calco da Ferme, em Ponta Delgada, e no Entroncamento, Vila Nova da Barquinha, e tiveram, pelo menos três filhos: Luís, Raúl e Olga. 9(XIII) - GUILHERME DE QUADROS CÔRTE-REAL, inicialmente caixeiro e depois proprietário, nasceu em 1 de Março de 1871 nas Laceiras, em Salreu.85 Emigrou em 1898 para Lourenço Marques, Moçambique, sendo então solteiro e proprietário.86 S.m.n. 10(XIII) - BERNARDO AUGUSTO JACINTO DE QUADROS CÔRTE-REAL, proprietário, nasceu em 3 de Novembro de 1873 no Couto, em Salreu.87 Emigrou em 1892 para o Rio de Janeiro, Brasil, sendo então solteiro e estudante.88 Regressou a Estarreja, onde foi padrinho da sobrinha Georgina, sendo então solteiro. S.m.n.

82 - ADA, Livro Paroquial de Salreu, n.º 12, Baptismos, fls. 3-3v., reg. n.º 65. 83 - ADA, Livro Paroquial de Salreu, n.º 28, Baptismos, fl. 41, reg. n.º 132. 84 - CRCVNB, Livro de Registo Civil do Concelho de Vila Nova da Barquinha, Casamentos de 1927, reg. n.º 12. 85 - ADA, Livro Paroquial de Salreu, n.º 12, Baptismos, fls. 94v.-95, reg. n.º 13. 86 - CRUZ, Teresa; SANTOS,Valter, “Emigração estarrejense no ano de 1898”, Terras de Antuã, Estarreja, Câmara Municipal de Estarreja, n.º 9, Ano 9, 2015, p. 298. 87 - ADA, Livro Paroquial de Salreu, n.º 13, Baptismos, fls. 40-40v., reg. n.º 83. 88 - SANTOS, V., 2010, p. 240.

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11(XIII) - ERNESTO, nasceu em 16 de Março de 1875 no Couto, em Salreu89, onde faleceu em 27 de Novembro de 1877.90 12(XIII) - ÁLVARO AUGUSTO DE QUADROS CÔRTE-REAL, nasceu em 30 de Dezembro de 1876 no Couto, em Salreu.91 Emigrou em 1892 para o Rio de Janeiro, Brasil, sendo então estudante e solteiro.92 S.m.n. 5(XI) - JOSÉ JOAQUIM DE QUADROS CÔRTE-REAL, proprietário, Senhor da “Casa de Queirós”, em Salreu93, nasceu em 31 de Março de 1805 em Antuã, Salreu94, onde faleceu solteiro e sem geração em 4 de Maio de 1867.95 8(XI) - JOÃO PINTO DE QUADROS CÔRTE-REAL, nasceu em 29 de Setembro de 1807 em Antuã, Salreu96, onde faleceu em 7 de Janeiro de 1834, solteiro e sem geração.97 9(XI) - FILIPE JOSÉ DE QUADROS CÔRTE-REAL, escrivão da Fazenda Pública, nasceu em 12 de Abril de 1810 em Antuã, Salreu.98 Casou em 17 de Setembro de 1835 em Canelas99, Estarreja, com D. DOROTEIA EDUARDA ADELAIDE DE ALMEIDA CABRAL DE FIGUEIREDO E CARVALHO, ou de Figueiredo Pereira de Almeida Cabral, como também é identificada, proprietária e doméstica, Senhora da “Casa dos Morgados de Nossa Senhora das Dores” (também conhecida por “Casa da Fonte”), em Canelas, nascida em 19 de Outubro de 1811 na Vila da Feira.100 Era irmã do Frei José de São Jerónimo, filhos de Francisco Xavier de Almeida Cabral, guarda-mor de Saúde da Vila da Feira, natural da Vila da Feira, e de sua mulher D. Maria Bernarda Pereira da Silva Vilela, da Vila da Feira, moradores em Canelas; neta paterna do Dr. Francisco Xavier de Almeida Cabral e de sua mulher D. Ana Josefa de Figueiredo e Carvalho101, da Rua Direita, em Canelas; neta materna de Bernardo Pereira e de sua mulher Maria Vilela, de Monforte, bispado de Lamego.

89 - ADA, Livro Paroquial de Salreu, n.º 13, Baptismos, fls. 14v.-15, reg. n.º 42. 90 - ADA, Livro Paroquial de Salreu, n.º 24, Óbitos, fl. 14v., reg. n.º 66. 91 - ADA, Livro Paroquial de Salreu, n.º 14, Baptismos, fls. 2v.-3, reg. n.º 6. 92 - SANTOS, V., 2010, p. 240. 93 - GONÇALVES, M. P., 2005, p. 150. 94 - ADA, Livro Paroquial de Salreu, n.º 4, Baptismos, fl. 102. 95 - ADA, Livro Paroquial de Salreu, n.º 21, Óbitos, fl. 171, reg. n.º 16. 96 - ADA, Livro Paroquial de Salreu, n.º 4, Baptismos, fl. 143v. 97 - ADA, Livro Paroquial de Salreu, n.º 20, Óbitos, fl. 26. 98 - ADA, Livro Paroquial de Salreu, n.º 4, Baptismos, fls. 188v.-189. 99 - ADA, Livro Paroquial de Canelas, n.º 22, Casamentos, fl. 1v. 100 - ADA, Livro Paroquial da Vila da Feira, n.º 10, Baptismos, fls. 37v.-38. 101 - Irmã do Cap. António José de Figueiredo e Carvalho, que teve carta de brasão de armas em 27 de Janeiro de 1807 Figueiredo e Carvalho.

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DELFIM BISMARCK FERREIRA

D. Doroteia Eduarda faleceu em 27 de Março de 1885 na Rua Direita, em Canelas.102 A 7 de Outubro de 1856, tomou posse do cargo de Escrivão da Repartição de Fazenda de Albergaria-a-Velha, onde se manteve, pelo menos, até 1862, residiendo naquela vila.103 Foi escrivão do Juizo de Paz de Canelas (1889), ondee faleceu em 3 de Janeiro de 1889 na Rua Direita.104 Residiram em Albergaria-a-Velha e depois na “Casa da Fonte”, em Canelas, onde tiveram, pelo menos, sete filhos: Mariana Augusta, Francisco Joaquim, António Joaquim, Maria, Vicente, Maria e Sebastião Maria

“Casa da Fonte”, em Canelas - século XVIII105. É hoje propriedade dos herdeiros do juiz-Desembargador Dr. Luís Manuel de Vilhegas Lucena e Vale

102 - ADAVR, Livro Paroquial de Canelas, n.º 65, Óbitos, fls. 2v.-3, reg. n.º 9. 103 - ACA, Apontamentos do Prof. Patrício Theodoro Álvares Ferreira. Col. Delfim Bismarck Ferreira. 104 - ADAVR, Livro Paroquial de Canelas, n.º 91, Óbitos, fl. 1, reg. n.º 1. 105 - Fotografia gentilmente cedida pelo Prof. Doutor Martim de Albuquerque.

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Pedra de armas existente na fachada da “Casa da Fonte”, em Canelas106, com o brasão atribuído em 27 de Janeiro de 1807 ao Cap. António José de Figueiredo e Carvalho107. Escudo de fantasia esquartelado: 1.º e 4.º - Figueiredo, de vermelho, com cinco folhas de figueira de verde, nervadas e perfiladas de ouro, postas em sautot; 2.º e 3.º - Carvalho, de azul, com uma estrela de ouro de oito raios, encerrada numa caderna de crescentes de prata; Timbre: Figueiredo: dois braços de leão de vermelho, passados em aspa, e cada um com uma folha de figueira de verde nas garras. E por Diferença: um tifólio. Coronel de Nobreza.

1(XII) - D. MARIANA AUGUSTA DE QUADROS CÔRTE-REAL, nasceu em 9 de Maio de 1837 na Rua Direita, em Canelas, Estarreja.108 S.m.n. 2(XII) - FRANCISCO JOAQUIM DE QUADROS CÔRTE-REAL, escrivão da Fazenda Pública, nasceu em 26 de Fevereiro de 1839 na Rua da Fonte, em Canelas, Estarreja.109 De JOAQUINA DO CARMO (NEVES FREITAS), inicialmente criada de servir e depois doméstica, nascida em 9 de Maio de 1850 em Alviães, Palmaz, Oliveira de Azeméis110, teve um filho único: Alfredo Augusto. Era filha de Manuel Neves da Silva Freitas e de sua mulher Maria Custódia, de Alviães, Palmaz; neta paterna de Francisco Neves da Silva e de Francisca Rosa, de Alviães; neta materna de Caetano José Lopes e de Luísa Maria, de Tagilde, Pinheiro da Bemposta. Casou com NARCISA AUGUSTA DA GLÓRIA, inicialmente vendeira e depois doméstica, exposta na Roda daVila da Feira, onde foi baptizada em 30 de Junho de 1860.111 Narcisa faleceu em 19 de Julho de 1943 em Canelas. Tiveram, pelo menos, dois filhos: Filipe e Rosalina. 106 - Fotografia col. Martim de Albuquerque. 107 - METELLO, M. A., 2002, p. 41. Monteiro-mor da vila de Angeja, morgado de Canelas, falecido sem sucessão (VALE, A. L. 1934, p. 261). 108 - ADA, Livro Paroquial de Canelas, n.º 7, Baptismos, fl. 43v. 109 - ADA, Livro Paroquial de Canelas, n.º 7, Baptismos, fl. 50. 110 - ADA, Livro Paroquial de Palmaz, n.º 7, Baptismos, fl. 7. 111 - ADA, Livro Paroquial de Vila da Feira, n.º 17, Baptismos, fl. 68, reg. n.º 35.

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DELFIM BISMARCK FERREIRA

1(XIII) - ALFREDO AUGUSTO DE QUADROS CÔRTE-REAL, nasceu em 4 de Março de 1873 na Corredoura, em Sever do Vouga.112 Casou em 31 de Março de 1906 em Lisboa, com D. MARIAADELAIDE RODRIGUES GONDIM, nascida em 17 de Julho de 1882 em Covas do Douro, Sabrosa. Era filha de Manuel Rodrigues Gondim e de sua mulher D. Ana Emília Pereira. Alfredo faleceu em 15 de Maio de 1932 em São Sebastião da Pedreira, Lisboa, deixando quatro filhos: Artemísia Hortense, Adriano Manuel, Idália Adelaide e Alice Eugénia.113 2(XIII) - FILIPE DE QUADROS, que emigrou para o Brasil. S.m.n. 3(XIII) - ROSALINA AUGUSTA DA GLÓRIA, costureira e doméstica, nasceu em 19 de Março de 1883 em Alviães, Palmaz, Oliveira de Azeméis.114 Casou em 22 de Janeiro de 1903 em Canelas115, Estarreja, com JOSÉ DE OLIVEIRA CRESPO, carpinteiro, nascido em 16 de Janeiro de 1879 na Rua do Campo da Cruz, em Canelas.116 Era filho de Francisco de Oliveira Crespo, carpinteiro, natural de Canelas, e de sua mulher Custódia de Azevedo, doméstica, natural de Salreu, moradores em Canelas; neto paterno de António de Oliveira Crespo e de sua mulher Bernarda Joaquina da Silva; neto materno de José Tavares da Cunha e de sua mulher Margarida de Azevedo. José esteve emigrado em França e faleceu em 30 de Junho de 1961 em Canelas. Rosalina faleceu em 19 de Janeiro de 1970 na Rua da Estrada, em Canelas. Residiram na Rua da Estrada, em Canelas, onde tiveram, pelo menos, três filhos: Maria da Glória, Custódia e José. 3(XII) - ANTÓNIO JOAQUIM DE QUADROS CÔRTE-REAL, escriturário da Fazenda Pública em Macieira de Cambra, nasceu em 5 de Outubro de 1843 na Rua da Fonte, em Canelas, Estarreja.117 S.m.n. 4 (XII) - D. MARIA, nasceu em 21 de Agosto de 1845 na Rua da Fonte, em Canelas, Estarreja118, onde faleceu criança. 5 (XII) - VICENTE CARLOS DE QUADROS CÔRTE-REAL (Ver: § 2.º QUADROS CÔRTE-REAL, de Paradela, Sever do Vouga) 6(XII) - D. MARIA DE QUADROS CÔRTE-REAL, gémea do seguinte, nasceu em 20 de Janeiro de 1853 no Cabeço de Baixo, em Canelas, Estarreja.119 S.m.n. 112 - ADA, Livro Paroquial de Sever do Vouga, n.º 123, Baptismos, fls. 20-20v., reg. n.º 12. 113 - AAVV, vol. III, tomo IV, 2006, pp. 1150-1151. 114 - ADA, Livro Paroquial de Palmaz, n.º 52, Baptismos, fls. 17v.-18, reg. n.º 17. 115 - ADA, Livro Paroquial de Canelas, n.º 112, Casamentos, fls. 1v.-2, reg. n.º 2. 116 - ADA, Livro Paroquial de Canelas, n.º 18, Baptismos, fls. 2-2v., reg. n.º 4. 117 - ADA, Livro Paroquial de Canelas, n.º 7, Baptismos, fl. 69v. 118 - ADA, Livro Paroquial de Canelas, n.º 7, Baptismos, fl. 78. 119 - ADA, Livro Paroquial de Canelas, n.º 12, Baptismos, fl. 18v.

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7(XII) - SEBASTIÃO MARIA DE QUADROS CÔRTE-REAL (Ver: § 3.º QUADROS CÔRTE-REAL, da Bemposta, Oliveira de Azeméis) 10(XI) - ANTÓNIO JOAQUIM DE QUADROS CÔRTE-REAL, proprietário, nasceu em 8 de Outubro de 1812 no Couto, em Salreu.120 Casou em 23 de Novembro de 1844 em Salreu121, com D. MARGARIDA ROSA NOGUEIRA DA SILVA BRANDÃO, proprietária e doméstica, nascida em 9 de Abril de 1814 no Outeiro, Salreu. Era filha do Dr. José Valente da Silva122 e de sua mulher D. Rosa Margarida Nogueira da Silva Brandão, do Outeiro, Salreu; neta paterna do Dr. Manuel Valente da Silva123 e de sua mulher D. Maria da Silva, do Corgo; neta materna de Monteiro-mor João Nogueira da Silva Brandão e de sua mulher D. Maria Valente, do Outeiro, todos de Salreu.124 António Joaquim faleceu em 9 de Dezembro de 1865 no Seixal, em Salreu.125 D. Margarida Rosa faleceu em 17 de Setembro de 1881 no Feiro, em Salreu.126 Residiram no Feiro e depois no Seixal, em Salreu, onde tiveram, pelo menos, sete filhos: Maria da Ascensão, Joaquim Maria, José Maria, António Maria, Maria Isménia, Ana e Emília.

Assinatura de António Joaquim de Quadros Côrte-Real (1862)

1(XII) - D. MARIA DA ASCENSÃO DE QUADROS CÔRTE-REAL, proprietária e doméstica, nasceu em 4 de Maio de 1846 no Feiro, em Salreu127, onde faleceu solteira em 24 de Dezembro de 1907.128 2(XII) - JOAQUIM MARIA DE QUADROS CÔRTE-REAL, proprietário, nasceu em 6 de Janeiro de 1848 no Feiro, em Salreu.129 Foi vereador da Câmara Municipal de Estarreja (1890-1892) e vice-presidente da mesma autarquia (1891), pedindo suspenção de mandato por questões de saúde.130 S.m.n.

120 - ADA, Livro Paroquial de Salreu, n.º 4, Baptismos, fl. 232. 121 - ADA, Livro Paroquial de Salreu, n.º 15, Casamentos, fl. 44. 122 - Formado em Direito pela Universidade de Coimbra (1800) (PT/AUC/ELU/UC-AUC/B/001-001/S/007696). 123 - Formado em Direito pela Universidade de Coimbra (1754) (PT/AUC/ELU/UC-AUC/B/001-001/S/008396). 124 - ADA, Livro Paroquial de Salreu, n.º 5, Baptismos, fl. 20. 125 - ADA, Livro Paroquial de Salreu, n.º 21, Óbitos, fl. 149v., reg. n.º 87. 126 - ADA, Livro Paroquial de Salreu, n.º 24, Óbitos, fl. 8v., reg. n.º 40. 127 - ADA, Livro Paroquial de Salreu, n.º 9, Baptismos, fl. 192. 128 - ADA, Livro Paroquial de Salreu, n.º 41, Óbitos, fls. 15v.-16, reg. n.º 62. 129 - ADA, Livro Paroquial de Salreu, n.º 9, Baptismos, fl. 226. 130 - LEITE, N., 2013, fl. 117.

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DELFIM BISMARCK FERREIRA

3(XII) - JOSÉ MARIA, nasceu em 28 de Dezembro de 1849 no Seixal, em Salreu.131 S.m.n. 4(XII) - ANTÓNIO MARIA DE QUADROS CÔRTE-REAL, lavrador e proprietário, nasceu em 12 de Maio de 1851 no Seixal, em Salreu.132 Casou em 4 de Junho de 1900 em Salreu, com sua prima em 3.º e 4.º grau133, ROSA MARQUES DE QUADROS, lavradora e proprietária, nascida em 4 de Janeiro de 1872 na Ladeira, em Salreu.134 Era filha de José Afonso da Silva e de sua mulher Maria Marques de Quadros, lavradores, naturais e moradores em Salreu; neta paterna de Domingos Afonso da Silva e de Maria Valente; neta materna de Francisco Marques Pereira Santiago e de D. Margarida de Quadros, todos de Salreu. António Joaquim faleceu em 16 de Março de 1915 em Salreu. Rosa faleceu em 5 de Novembro de 1966 em Salreu. Moraram em São Martinho e depois no Feiro, em Salreu, onde tiveram, pelo menos, dois filhos: Ana Augusta e José Eduardo. 5(XII) - D. MARIA ISMÉNIA DE QUADROS CÔRTE-REAL, proprietária e doméstica, nasceu em 29 de Agosto de 1852 no Seixal, em Salreu.135 S.m.n. 6(XII) - D. ANA DE QUADROS CÔRTE-REAL, doméstica, nasceu em 7 de Dezembro de 1853 no Feiro, em Salreu136, onde faleceu solteira e sem geração em 20 de Dezembro de 1944.137 7(XII) - D. EMÍLIA, nasceu em 11 de Dezembro de 1854 no Feiro, em Salreu138, onde faleceu em 19 de Outubro de 1856, no Seixal.139 11(XI) - D. MARIA ENGRÁCIA, nasceu em Salreu. S.m.n. 12(XI) - D. INOCÊNCIA MARGARIDA DE QUADROS CÔRTE-REAL, (Ver: § 4.º - AMARAL CIRNE, da “Casa do Couto”, Salreu, Estarreja) 13(XI) - D. ANA PEREGRINA DE QUADROS, proprietária e doméstica, nasceu em 14 de Maio de 1815 em Antuã, Salreu140. Residiu em Ossela, Oliveira de Azeméis. S.m.n.

131 - ADA, Livro Paroquial de Salreu, n.º 9, Baptismos, fl. 273v. 132 - ADA, Livro Paroquial de Salreu, n.º 9, Baptismos, fl. 314v. 133 - ADA, Livro Paroquial de Salreu, n.º 29, Casamentos, fls. 7v.-8, reg. n.º 14. 134 - ADA, Livro Paroquial de Salreu, n.º 13, Baptismos, fls. 4-4v., reg. n.º 7. 135 - ADA, Livro Paroquial de Salreu, n.º 9, Baptismos, fl. 345. 136 - ADA, Livro Paroquial de Salreu, n.º 9, Baptismos, fl. 370v. 137 - CRCE, Livro de Registo Civil do Concelho de Estarreja, Óbitos de 1944, fl. 180, reg. n.º 359. 138 - ADA, Livro Paroquial de Salreu, n.º 9, Baptismos, fl. 392v. 139 - ADA, Livro Paroquial de Salreu, n.º 21, Óbitos, fl. 7v. 140 - ADA, Livro Paroquial de Salreu, n.º 5, Baptismos, fl. 43.

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TERRAS DE ANTUÃ | HISTÓRIAS E MEMÓRIAS DO CONCELHO DE ESTARREJA

OLHARES POR DENTRO DO MUNICÍPIO DE ESTARREJA ITINERÁRIOS POR ÁGUA Etelvina Resende Almeida *

Olhares por Dentro são registos traduzidos em palavra & imagem realizados durante incursões, por água, à extensa frente ribeirinha do Município de Estarreja, a bordo de uma bateira tradicional, tipo caçadeira, baptizada de “A Menina da Ria”. Os itinerários realizados levaram-me ao encontro de vários espaços ribeirinhos do Município.1 Optou-se por apresentar, neste artigo, somente os principais esteiros e ribeiras reabilitados e qualificados recentemente, no âmbito da Operação Polis Litoral da Ria de Aveiro. Foram escolhidos os portos mais importantes abrangendo todas as freguesias do Município2. Neles se realizaram trocas comerciais, embarque e desembarque de bens e produtos, ervagens e pessoas, e até eventos festivos e desportivos: foram pontos de atracagem, de chegadas e partidas de todo o tipo de embarcações tradicionais da Ria de Aveiro. Mapeados os percursos, estabelecidas as rotas, antevendo, ventos, sol, chuva e marés, partiu-se à aventura e descoberta das frentes de água marinhoas.A cada jornada, atravessando o coração da ria e saindo das “águas largas”, entrava-se um mundo desconhecido de cruzamentos * Etelvina Resende Almeida, nasceu em 1969 e é natural de Aveiro | Licenciou-se em Design pela Universidade de Aveiro, tendo terminado o Mestrado, em Dezembro de 2012, com o tema: Embarcações Tradicionais da Ria de Aveiro. Uma análise pelo Design. | É Designer da Comunicação, em regime de freelancer. | Integrou o projecto Postais solidários, no concelho da Murtosa, na vertente fotográfica e de design e participou em 6 exposições colectivas de fotografia, na Murtosa, Torreira e Aveiro, durante os anos 2013, 2017, 2018 e 2019. | Participou, em co-autoria com Ana Maria Lopes, na apresentação de uma palestra intitulada Uma viagem p’la Ria, em 2014, no Clube de Vela da Costa Nova. | Expôs individualmente, com permanência de Janeiro a Maio de 2014, no Museu Marítimo de Ílhavo, fotografias do Processo construtivo da bateira ílhava. Publicou, em co-autoria com Ana Maria Lopes, com fotografia de Paulo Godinho, Uma Janela Para o Sal, em Abril de 2015, editado pela Alêtheia Editores | Tem alguns artigos publicados sobre o tema do património lagunar: as embarcações tradicionais da Ria de Aveiro, no “Diário de Aveiro”, “Notícias de Aveiro”e jornal “O Ilhavense” e “AveiroMag” | Conduziu a Conversa à Volta da Construção Naval, com Mestre Esteves e Etelvina Almeida no Estaleiro do Mestre, em Pardilhó, a 5 de Maio de 2018, uma iniciativa da Câmara Municipal de Estarreja. | Faz parte da Direcção dos Amigos do Museu de Ílhavo. Foi coordenadora e designer editorial da obra monográfica, que homenageou ao artista plástico Murtoseiro, José de Oliveira, intitulada: Memórias. 30 anos a pintar a Ria. José de Oliveira, editada pela Câmara Municipal da Murtosa, em Julho de 2019. A autora não segue o acordo ortográfico. 1 - Alguns conteúdos aqui desenvolvidos foram adaptados das crónicas de viagem que a autora tem redigido para o jornal centenário “Concelho de Estarreja”, desde Dezembro de 2018, colaborando na rubrica da sua autoria, com o título, Palavra & Imagem | In “A Menina da Ria”. Olhares por dentro - percursos lagunares. 2 - União das Freguesias de Canelas e Fermelã, de Beduído e Veiros, de Salreu, de Avanca e de Pardilhó. Errata: Artigo, “CONSTRUÇÃO NAVAL TRADICIONAL NO MUNÍCIPIO DE ESTARREJA. QUE FUTURO?”, de Etelvina Resende Almeida, publicado na Revista nº 12, de Novembro de 2018. Pag. 125, Título, “Mestre Felisberto Oliveira Amador (escola Lavoura) (1959) – Pardilhó. Na linha 9, “(…) iniciou por conta própria, com apenas 28 anos de idade (…)” onde se lê “28”, deverá ler-se “22”.

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de águas doces e salgadas, de lamas, juncais, caniçais, arbustos, bosques e até silvados. Navegouse pelos meandros mais desconhecidos e inacessíveis. Percorreram-se canais, canaletes, ribeiras, esteiros, valas e regueiras. Esgueirando-se por estreitos e labirínticos veios de água rumou-se sempre ao encontro de um porto seguro, cumprindo o objectivo. Na descoberta do presente e imaginando o passado, ao longo dos percursos procurou-se compreender o processo evolutivo do grande meio húmido lagunar; o natural e o humanizado. Seguindo-se o critério de localização, criaram-se rotas, espaçadas no tempo, partindose de sul para norte da laguna, num total de seis. Em tom de crónica de viagem, ao sabor da maré, relataram-se sensações, pormenores paisagísticos, experiências de navegação, recordações de vivências contadas por quem já atravessou estes caminhos de água, assentes em anotações históricas contextualizantes. A aventura por águas marinhoas iniciou-se a sul, no Ribeiro de Canelas. Seguiu-se a do Esteiro de Salreu. Numa investida seguinte percorreu-se aquele que foi referido como o segundo maior porto da região lagunar, o Cais do Esteiro de Estarreja ou Beduído. Passando para lá do Rio Antuã, navegou-se até à principal Ribeira de Veiros, ao encontro da Capela do Senhor da Ribeira. Mudando de rumo entrou-se na freguesia de Pardilhó, em terras de “Vila de Rei”, aportando no seu maior cais, a Ribeira da Aldeia.Terminou-se o itinerário em Avanca, na Ribeira do Mourão, outrora um cais com intensa actividade lagunar, onde aportavam as grandes embarcações lagunares, os mercantéis, mas sobretudo os barcos moliceiros. Todos estes itinerários realizados por água têm os seus percursos mapeados por terra, com acessos pedonais e cicláveis, integrados no programa da BioRia, e sobre os quais se poderá obter um interessante e fascinante “olhar por fora”. Depois de me ter enamorado destas vistas quis obter um outro “olhar”, por dentro”. O objectivo passou a ser o de navegar pelos meandros da laguna, obtendo assim uma outra visão e perspectiva sobre o meio envolvente da extensa zona marinhoa. RIBEIRO DE CANELAS Percurso: Béstida (Murtosa) - Canelas (Estarreja) | 14,5 milhas | duas marés | 5h30m | 9-02-2019

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A sul do Município, na União de Freguesias de Canelas e Fermelã, a localidade de Canelas apresenta uma forte ligação à agricultura, sendo uma região naturalmente irrigada por água doce e salgada. Encontra-se em contacto com a laguna o que facilitava o escoamento dos produtos agrícolas. Nela se formou uma grande zona de bocage3, arrozais, sapais, juncais, canízia, e pântanos, gerando uma paisagem riquíssima e diversificada, aportando biodiversidade de fauna e flora à região da BioRia. Esta região é visitada por milhares de pessoas que procuram a beleza em plena Natureza, utilizando os percursos pedonais e cicláveis criados nesse âmbito. Partiu-se pela fresca, quase em preia-mar, do Cais da Béstida, na Murtosa. O céu estava limpo e as temperaturas suportáveis para a época de Inverno. A Ria apresentava-se calma e o vento fraco. No entanto aparelhou-se a vela. Saiu-se perturbando as águas da laguna que ainda dormiam. Serenamente, e num despertar demorado, observei as tonalidades do grande lençol de água - parecia pintada de azul forte, tal como o céu. Cruzei-me com outras embarcações tradicionais da Ria que saiam para a apanha do berbigão, e com gente apeada nas coroas de lama, meio enterradas, escavando para apanhar o casulo. Já se verificava intensa actividade na Ria a essa hora. Ao longo do percurso passei por alguns dos principais cais do Concelho da Murtosa: Mamaparda, Ameirinhos, Bico, Chegado, Cais do Chegado e Cambeia. Deste último, já se avistavam as ribeiras de Veiros, aconchegadas pelos extensos juncais. Ao avançar para sul, vislumbra-se o Esteiro de Estarreja, a leste, e bem perto entrava-se na foz do Rio Antuã. Em plena foz, na zona de águas largas, observam-se extensas praias de junco. Na proximidade de uma bifurcação: surgem dois caminhos de água, um para leste, para o Esteiro de Salreu, outro para Sul, para o de Canelas. As águas agitavam-se e o vento já se fazia sentir. Desfraldou-se a vela, encheu-se o pano. A bateira navegou impulsionada pelo vento, em silêncio, ao longo do esteiro de Canelas, que se ia estreitando. Encontrei-me perante uma paisagem distinta, que se deve à aproximação dos Rios Jardim e Antuã. Carregados com água doce, também provinda dos arrozais, despejamna no leito da Ria. Comportas e pequenos diques regulam a entrada e saída da água para irrigação dos campos. A canízia e o junco acompanham a navegação, pelas margens, assim como os arbustos e outras tipologias de vegetação, que se curvam sobre a água. Postes eléctricos apontam-se, e adivinham-se caminhos por detrás da vegetação, dando sinal da passagem do homem. Eis os trilhos de Canelas! 3 - No Baixo Vouga encontra-se um tipo particular de paisagem agrícola, retalhada em forma de mosaico, denominado de “Bocage”. “Trata-se de um ecossistema em estrutura de campo fechado com vegetação arbórea e arbustiva, limitando campos de cultivo, pastagens, pousios e linhas de água. Todo este reticulado possui um elevado potencial biológico. No Baixo Vouga, podemos encontrar o mais extenso e genuíno “Bocage” do território português.” In http://www.biorede.pt/page.asp?id=708

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Já perto do fim do percurso observavam-se grandes zonas arborizadas, fazendo antever caminhos de sombra. Era a aproximação à zona de bocage, de campos de cultivo compartimentados, retalhados, irrigados por veios de água doce e delimitados por sebes vivas, onde a vaca marinhoa tem presença. Num olhar atento descobrem-se as valas que serpenteiam labirinticamente por entre a canízia. Muros de pedra, lama e madeira seguram as margens criando padrões lindíssimos. Os arbustos e as acácias em flor caem sobre o leito estreito, em vénia, recebendo o visitante. Reflectidos na água oferecem uma tela sui generis. Ao cais seria impossível chegar.Abicou-se ao muro que circunda essa pequena lagoa.Aí termina o esteiro navegável. Deparrei-me com a comporta que jorrava água fortemente. Fim de viagem! A navegação neste esteiro já foi intensa. As pequenas embarcações de rio, chatas ou patachas de uma só tábua de costado, e de tamanho reduzido, permitiam uma fácil navegação à vara através das valas. As bateiras de Canelas eram negras, embreadas com breu e movidas à vara, e à vela. Das médias às de maiores dimensões, serviam para o transporte das ervagens, do junco, do moliço, dos produtos agrícolas, das pessoas e do gado, e ainda para a pesca ao longo do rio e nos canaletes da laguna. Apresentavam formas variadas, sendo construídas pelos mestres carpinteiros navais de Canelas e de Salreu. O Regresso fez-se de forma idílica. Saiu-se do esteiro ao sabor da maré e da suave aragem, sob um sol espevitado que ainda aquecia o corpo. Saltitavam odores que espevitam os sentidos. Cheirava a maré baixa, a juncos apodrecidos nas lamas quentes. Já se adivinhavam os fundos lodosos. Mas a Menina cala pouca água e havia tempo para acompanhar a vazante e chegar a bom porto, quase em preia-mar. A vela branca sobressaia por entre aquele esteiro rodeado de vegetação e a bateira seguia, quase sozinha, até às águas largas da laguna. ESTEIRO DE SALREU Percurso: Béstida (Murtosa) - Esteiro Salreu (Estarreja) | 19,10 milhas | duas marés | 5h30m 9-03-2019

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Salreu situa-se na Região do Baixo Vouga Lagunar, entre o Rio Antuã e o Rio Vouga. Este território é palco de uma grande biodiversidade de fauna e de flora. Coexistem habitats únicos devido à presença de água salgada e de água doce, controladas e direccionadas através de taludes, comportas, açudes e azenhas, mantendo a irrigação dos campos agrícolas, o bocage, e das pastagens, mas sobretudo dos arrozais - uma actividade muito importante para a vila de Salreu. No entanto, a água salgada da laguna acaba por se infiltrar nos campos o que tem gerado grande preocupação para os produtores. Aguarda-se a construção de um dique que proteja os dois ecossistemas, o do salgado e o do bocage. O projecto BioRia surgiu em 2003, como forma de preservar esta riqueza cultural e ambiental, e potenciar este património regional. O Centro de Interpretação Ambiental surge como um espaço explicativo e orientador do projecto. Ali tem lugar a investigação, a observação da flora e da fauna, o lazer, o desporto, ou a simples contemplação da Natureza. Para o efeito foram criados vários percursos pedonais e cicláveis e disponibilizado material e meios de transporte de apoio. Foram construídas infra-estruturas de apoio ao projecto, em 2014, e requalificado o espaço envolvente ao cais, de forma a melhorar o acesso e a navegabilidade. Saiu-se pelo cedo, em pleno Inverno, ainda com a paisagem a descongelar da geada nocturna. Ao sabor da maré, em vazante, rumou-se para sul, ao encontro da foz do Rio Antuã. Esse Rio, que antes de se encontrar com a laguna, se infiltra por entre os milheirais e arrozais de Salreu, levando-lhes a água doce. No seu percurso é interrompido por açudes e azenhas, o que dificulta a navegabilidade. Seguiu-se pelo canal de navegação lagunar ladeados por praias de junco. Uma pequena e peculiar casinha colorida pintada por gente, e com gente que brinca, avista-se por bombordo, rodeada de canízia. Neste ponto do percurso, e numa encruzilhada de caminhos de água, ao entrar no esteiro de Salreu, deparámo-nos com uma pequena casa de campo, já quase coberta por heras, com uma convidativa área para piquenique. Videiras e árvores de fruto, e um refrescante poço, parecem convidar o caminhante para o repouso, para uma sombra em dias de intenso calor. Iniciou-se o percurso pelo labiríntico esteiro ladeado por muros de lama, junco e canízia seca de tons ocre e verde. Intercalados pela margem surgiam alguns arbustos, pinheiros e eucaliptos que projectavam a sua sombra sobre o leito. Essa vegetação e arvoredo reflectido na água, juntamente com uma pincelada de azul céu, iludiram-me os sentidos: tive a sensação de estar a navegar sobre um quadro vivo, pintado na água em tons naturais. O estreitamento do esteiro e a inclinação da canízia, nas curvas mais apertadas, criava um efeito ondulante, ilusório, estonteante. Deslizando, embalada pelo som das aves, envolta nesta beleza natural, sem contacto com a civilização, quase me senti viajar no tempo. Noutros tempos, por este esteiro navegaram imensas embarcações tradicionais, de pequeno e médio porte, e pelas valas e regueiras apanharam-se, fisgaram-se muitas enguias – existiu muita actividade ao longo desse esteiro. [ 129 ]


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De cima da proa avistei, por entre a canízia, uma parte da vila de Salreu. Para baixo da linha do caminho-de-ferro encontram-se terrenos agrícolas e algum casario, mas é no cimo do monte que assenta o grande aglomerado habitacional, destacando-se a torre da Igreja de S. Martinho de Salreu. No entanto, era na capela da Nossa Senhora do Monte que se realizava uma grande festa, a meados de Agosto, tida como uma das maiores da região. Os romeiros vinham das terras vizinhas, de barco, pelo esteiro, assistir aos festejos. No último trajecto do esteiro, ali consideravelmente largo, deparei-me com um quadro lindíssimo: os campos; o rio Jardim; a vila, ao cimo; o largo do esteiro e algumas habitações a ladeá-lo, e as infra-estruturas do projecto BioRia, onde se insere o cais. Este aparece muralhado e dividido por uma faixa de terra, ao centro, entrando pelo esteiro, ficando a rampa de acesso situada a sul. O Cais e o largo do esteiro chegaram a ser palco de grande movimento de embarcações, em trabalho e em lazer, e ainda de eventos culturais, desportivos e festivos. Era ali que se descarregava o sal e o junco transportados pelos barcos mercantéis, sendo o sal posteriormente guardado no antigo armazém, actual edifício do CIA4, situado a norte do esteiro. Os barcos moliceiros saíam de madrugada para fazer a maré de moliço, que era depois ali descarregado e colocado a escorrer para vender aos agricultores como fertilizante das terras de cultivo. De ali partiam as bateiras erveiras para a apanha e transporte de ervagens, do gado e dos produtos agrícolas, assim como as bateiras de pesca, as bateiras caçadeiras e as patachas. Era porto de chegada e partida dos romeiros para a Festa do S. Paio da Torreira, em inícios de Setembro. Fretados os barcos mercantéis, os barqueiros ali embarcavam os grupos de pessoas e os seus haveres, para passarem alguns dias na Torreira. A festa iniciava-se no largo do esteiro e prosseguia a bordo. Cantava-se, dançava-se, comia-se e bebia-se, espalhando alegria pelo cais. No regresso prolongava-se a festa do S. Paio. Os familiares e amigos, que não tendo conseguido ir, aguardavam os romeiros no cais e ali faziam uma grande festa, a que chamavam a Festa do S. Paio dos Ougados. Para tal, existia no cimo da casa dos Garridos, situada no início da rua, de frente para o cais, um pequeno nicho onde era colocada a imagem do S. Paio Pequenino. Chegaram a recriar essa tradição, mas não se voltou a repetir. Frente a essa casa, no largo do esteiro, reparavam-se e reconstruíam-se pequenas embarcações erveiras, pelas mãos dos mestres Garridos de Salreu, e do mestre Arnaldo de Canelas. No largo chegaram a realizar-se corridas de cavalos. Além do passadiço de madeira, que se prolonga até ao esteiro, servindo de miradouro e até de ancoradouro, também existe um parque de merendas coberto, a norte. Ali se encontram, ainda, mais algumas estruturas de madeira, um ponto de observação e o Centro 4 - Centro de Interpretação Ambiental (CIA), um espaço de explicação interactiva do Projecto BioRia.

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de Interpretação Ambiental, onde está exposto o espólio do mestre carpinteiro naval, Henrique Lavoura, de Pardilhó. Ainda se realizam eventos neste cais. De referir, O Cruzeiro Náutico a Salreu realizado pela ANGE, da Gafanha da Encarnação, e o OBSERVARIA, feira dedicada ao Turismo da Natureza, ao qual alguns visitantes chegam, a bordo de barcos moliceiros, bateiras e lancha. Saindo do histórico esteiro inebriada com tanta beleza, entra-se nas águas largas da laguna sentindo, de imediato, o cheiro característico da maré baixa, onde lamas e muros de junco se expõem. No regresso, saindo do percurso, rumou-se para Sul seguindo pelo “Gramatal”. Contornaram-se as marinhas de junco, evitando a grande coroa de seco, para não atrasar a viagem. Maré a encher. Senti uma fresca aragem, e já a vela se enfunava. Regressou-se velejando, rumo ao norte, ao sabor da maré. ESTEIRO DE ESTARREJA OU BEDUÍDO Percurso: Béstida (Murtosa) - Esteiro de Estarreja | 22 milhas | duas marés | 7h | 19-03-2019

Estarreja é cidade e sede de município com raízes remotas, sendo recortada por imensas linhas de água, tendo como a mais importante a do Rio Antuã. Apresenta uma extensa frente ribeirinha com acessos por água às cinco freguesias do município: Fermelã e Canelas, Salreu, Beduído e Veiros, Pardilhó e freguesia de Avanca. Diz-se que “Estarreja é a terra dos esteiros”. Estes entram por terra dentro e banham este extenso território gerando zonas de pântano; de marinhas de junco; de caniçais, onde nidificam as aves; de sapal; arrozais; de pequenas parcelas agrícolas, o bocage e canais arborizados onde predomina a lontra. Contém um complexo emaranhado de canais, ribeiras e esteiros que outrora serviram como importantes vias de comunicação e comercialização entre as regiões vizinhas. Estarreja esteve desde sempre ligada ao campo, ao cultivo do arroz, outrora com produção do sal, e às actividades lagunares da apanha do moliço, do junco e da pesca. [ 131 ]


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Localiza-se na sub-região do Baixo-Vouga Lagunar, onde o cruzamento de água salgada com água doce alimentam distintos ecossistemas, que coabitam e comunicam entre si, ligados por uma rede de valas, ao longo das suas frentes de água, daí resultando uma grande biodiversidade de fauna e de flora, oferecendo uma beleza paisagística ímpar. Com um eco parque empresarial e industrial, Estarreja não deixa de valorizar, de preservar e de dar a conhecer a sua região bucólica - um património paisagístico estudado, admirado e muito visitado - através do projecto BioRia. O “Observaria 2019” é um evento que atrai muitos visitantes e divulga esse mesmo património. É uma Feira Internacional que se dedica ao Turismo da Natureza e à Observação de Aves. Este ano, 2019, realizou-se de 11 a 14 de Abril. Estarreja foi um lugar que deu nome à Vila. Foi posteriormente elevada a Cidade, em 2004, tendo por base a freguesia de Beduído. A partir de 2013 passou a integrar a União de Freguesias de Beduído e Veiros. O histórico esteiro de Estarreja, ou de Beduído, foi considerado o segundo maior porto de sal da Ria de Aveiro. Os comerciantes e agricultores do concelho dependiam da actividade gerada neste Esteiro. Por ele se transportavam e aportavam ao cais produtos e mercadorias que abasteciam a região: como o sal, para conservação da carne e do peixe; os produtos cerâmicos; os materiais de construção civil, o adobe e a areia; o moliço retirado dos canais para adubar as terras; o junco colhido nas praias da ria para a produção artesanal de esteiras, para atar as videiras, para as camas do gado, posteriormente como fertilizante para as terras e, ainda, para utilizar como soalho nos palheiros dos pescadores; o peixe da Ria, sobretudo as enguias, entre outros bens produzidos na região. O esteiro foi aberto artificialmente no século XIX, tendo servido até ao século XX. Entrou em declínio quando a importância das vias de comunicação lagunar se perderam a favor das novas vias rodoviárias e dos caminhos-de-ferro, situados em frente ao cais. Pela sua proximidade da cidade, não é visível grande biodiversidade de fauna e flora junto ao cais, mas facilitava a entrada e escoamento dos produtos ali transaccionados e comercializados. Recuperado em 2013: desassoreado o cais; levantadas e fixas as margens, com muralhas laterais, construídos os passadiços entre margens; aplicado o mobiliário urbano e plantadas as árvores, fizeram dele um lugar visitável e aprazível. Não existem embarcações atracadas neste cais, no entanto apresenta-se navegável e com acesso à laguna. Nos anos 50 foi um entreposto comercial gerador de grande actividade para a região e potenciador da economia local. Um porto onde chegavam barcos moliceiros, mercantéis e bateiras carregadas com os mais variados produtos, provindos de variadíssimas rotas comerciais, tendo sido o sal, oriundo de Aveiro, o produto mais movimentado. Nessa manhã de sol, pré-primaveril, partiu-se ao encontro do Esteiro pela hora da vazante. [ 132 ]


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De vela içada, aproveitando o vento de noroeste, teve-se a companhia de jovens robalinhos que, saltando efusivamente, roçavam o costado da embarcação, salpicando o rosto de água. Foi um início de viagem maravilhoso. Fugindo aos cabeços de areia contornou-se uma grande língua de lama, gingando por ali e por acolá, tentando passar por regueiras de água mais profunda, rumando para o lado da serra, ora à vela, ora a motor e por fim à vara. Aguardando a enchente seguiu-se velejando suavemente ao sabor do vento, passando o Cais do Bico e entrando finalmente no Largo do Laranjo. A entrada para o Esteiro encontrava-se no centro de uma encruzilhada de valas. De largura considerável, o esteiro é ladeado por junco e canízia. Nessa parte do percurso já se fazia sentir a enchente, permitindo iniciar a navegação pelo esteiro. Observou-se um colorido diferente da vegetação: rebentos novos, verdejantes, contrastando com as velhas canas, pardas. Observar a mutação da roupagem das margens é impressionante. Pequenos bosques despontavam entre a canízia alta. Folhagem espessa e baloiçante caía sobre o leito, prendendo o olhar nesse súbito emaranhado. Já o sol ia alto. Em silêncio prosseguiu-se saboreando o fresco dessa meia sombra arbórea. A vela roçando na folhagem reflectia-se nas águas do esteiro. Tudo aquilo se assemelhava a uma tela viva, ondulante. Apetecia parar o tempo, tal era a beleza do momento. Por instantes folgou-se um pouco o pano, deixando a brisa transportar suavemente esse ente navegável. Flutou-se esteiro adentro, penetrando na profundeza dessa selva de água e de vegetação. Se há momentos de paz, de contemplação, este foi um deles! Por esse veio de água salobra, que corria entre arbustos, pinheiros e eucaliptos, de galhos intrincados, formando um túnel de vegetação perfumada e sombreado, refresquei e embeveci o espírito. Segui embalada pelo chilrear das aves e o marulhar da água. Ao chegar à zona de extensos e altíssimos caniçais, senti o roçar das finas canas na vela e o seu entrelaçar nos cabos, quebrando-se, espalhando-se sobre os paneiros da bateira. O esteiro ia-se estreitando cada vez mais devido à invasão da canízia, que na água plantada, quase cobria a embarcação. Desbravou-se “mato” por essa regueira de água selvagem.Tudo o que via era canízia, nada mais. A dado momento, por entre as canas, vislumbrei um apontamento de civilização - o casario ao longe, com telhados vermelhos e fachadas díspares recortadas num pano azul céu, formando um belo quadro emoldurado por canízia. Depois de tanto serpentear pelo túnel chegou-se à boca do esteiro. Era chegado o [ 133 ]


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momento de “abrir o pano”, afastar a vegetação e assistir ao espectáculo, que teria lugar nesse palco natural. Como é lindo o Esteiro de Estarreja! A vela reflectida prolongando-se pelo canal de água, agora alargado, deu notícia desta nova presença. O cais encheu-se com a alvura da vela e o colorido da embarcação - ganhou vida, por instantes. Não fosse o passadiço, que une as margens, e a bateira atracaria na muralha frontal do esteiro. Esse porto, outrora movimentado, encontra-se agora inactivo, tal como a maré se apresentava nesse momento. A pouca movimentação existente que se podia observar, era a dos funcionários dos armazéns das empresas de transporte instaladas na margem sul. Porque a margem oposta adormeceu no tempo: campos que se alongam, ruínas de casario, uma habitação e armazéns encerrados, outrora afectos à grande actividade portuária desse esteiro histórico. A requalificação efectuada, a limpeza, os arranjos, as estruturas e o ajardinado existente transformaram esta frente de água. É agora um espaço que se exibe pelo seu primor e beleza, mas que desperta o sentimento de nostalgia a quem conheceu a sua vida anterior. Contrastando com um enorme tráfego lagunar e fluvial, existente no século passado, onde até então existiam barcos atracados existem agora camiões estacionados, e impera a calmaria. Eram barcos que vogavam por esse esteiro adentro rumo às águas abertas da laguna; que chegavam e que partiam, num vai e vem entre marés; cumprindo rotas; embarcando e desembarcando encomendas; realizando fretes; gerando riqueza. Atracou-se na muralha e, em silêncio, pisou-se a terra batida dos caminhos impregnada de passagens e vivências de almas marinhoas. Por momentos voguei pelo tempo. Ao cimo encontra-se a estação de caminhos-de-ferro, agora gradeada, e no largo do esteiro existem duas fileiras de árvores, que dão sombra ao estacionamento. Apetecia ficar, mas a viragem da maré mandou mais que essa vontade de querer estar. Regressou-se, deixando para trás esse lugar mítico e histórico.Voltou-se a entrar no caniçal. Fechou-se o pano mas deitando um último olhar, pela popa, ao belo porto. Penetrou-se no labiríntico túnel, navegando ao sabor da corrente, por entre aquela sementeira de canas, perdendo totalmente a imagem da civilização para me enredar nesse mundo misterioso e encantado da Natureza. Velejando saiu-se do esteiro e entrou-se nas águas largas, onde os raios de sol e o fortíssimo vento acolheu de volta tão rara visita. Segurando bem a escota e sob forte nortada, navegouse até porto seguro. Contra vento e maré, rumou-se ao norte, regressando ao cais. Levei na alma a quietude e o encanto de um esteiro selvagem, quase in natura. “Provada” a aventura fiquei com vontade de lá voltar. [ 134 ]


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RIBEIRA DE VEIROS Percurso: Béstida (Murtosa) - Ribeira deVeiros | 14 milhas | uma maré | 3,5h | 4-05-2019

Veiros é um lugar do concelho de Estarreja. Tendo sido sede da freguesia, com o mesmo nome, foi agregado a Beduído em 2013, formando a actual União de Freguesias de Beduído e Veiros. Veiros faz parte da mais antiga terra marinhoa deixada pelo mar ao homem, que ali se instalou e produziu para sua subsistência e comercialização. Muito próxima da confluência do Rio Antuã com a laguna, é caracterizada como uma zona húmida com fácil acesso aos esteiros, tendo permitido ao homem desenvolver várias actividades: da agricultura à pesca e comércio, com fácil escoamento dos produtos. Ali aproveitava a vegetação que brotava das águas salobras - o moliço para fertilizar os terrenos agrícolas, o junco e caniço para a cama dos animais, e para o artesanato, o bunho. Nesta região sempre se comercializaram os produtos agrícolas e o pescado da laguna e do mar, peixe e enguias. Em tempos realizava-se uma grande e afamada praça de venda de peixe. Do património religioso que detém, a Igreja de S. Bartolomeu, a Capela do Senhor da Ribeira, a Capela de Stª. Lúzia, a Capela de S. Geraldo, Veiros tem também um Clube Cultural e Desportivo. Mas o mais importante património de que Veiros dispõe é o ambiental e paisagístico, gerador de uma de grande variedade de fauna e flora que se distribuí pela terra cultivável, pelos pequenos bosques, pelas ribeiras, marinhas de junco, sapais e caniçais, valas, canais e canaletes. Este património foi recentemente requalificado: com reabilitação das estruturas de drenagem e manutenção das motas para percursos pedonais e cicláveis. Nestas ribeiras realizam-se alguns desportos náuticos e eventos de grande escala, como o passeio anual de kayak pelas Ribeiras de Veiros. O artesanato sempre teve uma forte presença nesta localidade. A arte da produção das esteiras de bunho exige tempo e mestria. Estas esteiras foram um artefacto com muita utilidade nesta região, tendo sido utilizadas para envolver os produtos para exportação, para cobrir o chão das casas, como base para os colchões, para cobrir os cereais e, ainda, como “colchão” nos barcos moliceiros. A construção de miniaturas de barcos moliceiros também aqui ainda tem expressão, realizadas pelas mãos de um único artesão. Os cesteiros ainda produzem cestos de vime para transporte de produtos agrícolas e o vassoureio, vassouras [ 135 ]


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de junco e de piteira, que agora só servem para adorno. Actualmente estas peças artesanais apenas se comercializam no mercado tradicional, como artefactos artísticos e decorativos. O cultivo das cebolas e, principalmente, o trabalho de as enrestiar, são ainda uma arte local. Eram tão famosas estas réstias de cebolas que Veiros passou a ser conhecido como a “terra das cebolas”. Iniciei o percurso em direcção a Veiros saindo do Cais da Béstida após a hora do almoço, aproveitando a enchente das águas. Segui rumo ao sul, contornando o Bico da Sobeira, para leste. Aproei a bateira ao Cais da Cambeia, já para norte, deixando para trás o Largo do Laranjo, onde as águas já se expandiam e envolviam margens e juncais. A imagem que guardo é de uma imensa mancha de água de onde despontavam hastes de junco e canízia, e de umas valas não muito definidas, dada a enchente da maré. Deixei o Cais da Cambeia e entrei no labirinto deVeiros, quase medieval dado o seu aspecto selvagem, mas cativando pelo inesperado e pela beleza natural. Rodeada por vegetação, mas procurando não perder o rumo, segui com propulsão a motor e com a vela içada, saboreando a beleza do seu reflexo nas águas, sentindo o seu roçar, muito ao de leve, pelo junco e pela canízia. Ali nada é expectável, tudo se metamorfoseia à medida que se serpenteia pelas valas – a vegetação muda, as águas correm, cobrem e descobrem lamas e muros. A área interior navegável é surpreendentemente contorcida. Por entre juncais, embriagada de beleza e entontecida pelo ziguezaguear, quase perco a razão. A laguna enfeitiça-nos e atrai-nos para o seu coração. Ao longo do percurso cruzei-me com um colorido grupo de gente aventureira que praticava padle por aquelas ribeiras - inesperado mas entusiasmante encontro. Percorri o canal principal procurando o passadiço que liga a Cambeia à Ribeira Nova, iniciando-se a partir daí o percurso das Ribeiras de Veiros, por terra. Tomei novo rumo, desta feita para o interior dessa imensa lagoa de água semeada de junco, ao encontro do canal que me levaria à Ribeira de Veiros. Ao longe o Bosque da Carvalhosa já despontava. É um lugar cativante onde as aves de rapina proliferam. Por lá, outrora, corria a ribeira da Carvalhosa com mais intensidade, e também se apanhavam por lá enguias. Ao me aproximar do Cais da Ribeira de Veiros avistei a sinalética vertical avisando da existência de um açude, o que me impediu de chegar ao seu término. Este permite manter um nível de água no cais, proporcionando um belo espelho de água. A bombordo avisto o Bosque da Carvalhosa e, um pouco mais ao fundo, o cemitério de Veiros e a Capela do Senhor da Ribeira, rodeada de árvores. A paz ali reinava, naquele largo. [ 136 ]


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Onde outrora existiu agitação impera agora o silêncio, a religião e o descanso último, que nos transporta para a meditação. Àquele cais chegaram e partiram barcos com produtos, mas eram, sobretudo, as ervagens e as algas da laguna: moliço, junco, canízia e bunho, que ali se descarregavam nas margens. A capela do Senhor da Ribeira foi outrora um local de peregrinação. Do achado de uma imagem do Nº. Senhor Jesus Cristo, naquele local, e acreditando-se que teriam ocorrido milagres pela sua intervenção, construiu-se ali o edificado religioso para venerar a imagem. De Capela da Stª. Cruz, a Senhor da Ribeira, até de Stº. António, como é hoje designada, foi mudando o nome mas manteve-se a essência. Abandonando aquela paz e regressando pelo mesmo labirinto, saboreei a fresca aragem da tarde, acompanhando a mutação da paisagem. Mais profundas se tornaram as valas pela vazante. Rodeada de vegetação mais alta e mais exposta senti-me aconchegada por aquele ambiente lagunar. Desliguei o motor e segui uns minutos impulsionada pela aragem, que enchia um pouco o pequeno pano da vela. Senti-me deslizar por um labirinto paradisíaco ao som da Natureza. Ai, se eu tivesse podido parar o tempo!!! RIBEIRA DA ALDEIA – PARDILHÓ Percurso: Béstida (Murtosa) - Ribeira da Aldeia (Pardilhó)| 16 milhas | uma maré | 3h 23-08-2019

Continuando por “Terras Marinhoas”, mas desta feita navegando pelas ribeiras da “Vila da Ria”, na freguesia de Pardilhó, descobrindo a região mais ligada à laguna, através dos seus esteiros - onde o homem mais se embrenha na água. É uma região de terras baixas formadas por aluvião e depósitos de areias deixadas pelo mar e pelos rios. Noutros tempos o homem enveredava pelas inúmeras ribeiras na procura do seu sustento, comercializando e comunicando com as restantes regiões ribeirinhas. De entre todas as ribeiras de Pardilhó, a da Aldeia, é a maior e foi a mais importante para a região - um ponto de comunicação e um elo de ligação com as restantes povoações ribeirinhas. Por ela entravam e saiam pessoas e bens, dependendo dela a economia local. [ 137 ]


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Nesta Ribeira desagua a Regueira da Tranqueira, que atravessa a freguesia de Pardilhó. Nasce no sítio do Canedo de Além, que por ser uma zona de baixio, acaba por servir de escoante às águas das chuvas durante o Inverno, criando ali uma “bolsa” de água. Essa regueira não é navegável, mas consta-se que aí se apanhavam enguias. A “Vila da Ria”, para além de ter sofrido uma forte emigração até meados do século XX, como todas as restantes da região, fixou a sua economia na agricultura, com predominância para a cultura do milho, assim como na pesca, nas fainas ligadas à ria, como da apanha do moliço e do junco, na lida dos barqueiros que transportavam o sal entre regiões e na actividade da construção naval. Mas entre tantas outras profissões, a mais emblemática foi, e ainda é, a do mestre construtor naval. Tendo os últimos três mestres construtores navais, pardilhoenses, António Esteves, Felisberto Amador e Arménio Almeida recebido a Medalha de Mérito Municipal, em Junho do corrente ano. Segundo o edil, este mestres “representam todos os construtores navais que, outrora, com o seu trabalho e dedicação, engrandeceram a arte da construção naval no concelho.” Em Pardilhó, e um pouco por toda a “Terra Marinhoa” chegaram a construir-se todo o tipo de embarcações: desde varinos, fragatas, barcos de mar, barcos moliceiros e mercantéis até às bateiras de caça e de pesca. Na Ribeira da Aldeia, em inícios do século XX, registavase uma intensa actividade mercantil, assim como na área da construção naval. Os “botaabaixo”, o lançar de novas embarcações à água, aconteciam sucessivamente, desde o dos barcos tradicionais da Ria, aos varinos que eram construídos para navegar no Tejo. Os “construtores de machado”, ou os “Pardilhós”, assim denominados, eram mestres construtores navais naturais de Pardilhó e portadores de excelente formação na área, adquirida e passada ao longo de gerações. Eram, e ainda são, muito afamados pelo seu conhecimento e habilidade. Nessa época eram contratados para trabalhar nos mais prestigiados estaleiros, ao longo de todo o país, e até no estrangeiro, ocupando os mais elevados cargos. Estes, os calafates, e demais mestres na arte, dignificaram e honraram a então aldeia de Pardilhó, vila a partir de 2005. Eram portadores de um conhecimento e talento inigualável, justificando-se ter aí sido instalada a sede da Delegação Distrital do Sindicato Nacional dos Operários de Construção Naval, entre 1937 e 1977. Em termos culturais e associativos é de salientar, entre outros, a existência da sede do jornal centenário, “O Concelho de Estarreja”, em terras de Pardilhó. Jornal fundado por Egas Moniz, em 1901, e que ainda hoje se mantém em actividade.A Banda Musical Saavedra Guedes surgiu em 1874, nesse tempo com outro nome, e a Associação Cultural e Recreativa Saavedra Guedes foi formada em 1934. Para além de outras valências e modalidades desportivas, esta Associação destaca-se pela intensa actividade na canoagem. Os treinos realizam-se na Ribeira da Aldeia, onde foi construído um armazém de apoio à modalidade. A envolvência da Ribeira sofreu algumas alterações ao longo do tempo. Recordam que, a partir de meados do século XX, anexo à Ribeira existia um espaço amplo, sem grandes infra[ 138 ]


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estruturas, que alagava na época das marés-vivas. Nesse tempo existiam muitas embarcações, mas apenas os barcos mercantéis e moliceiros eram atracados aos moirões, ocupando todo o cais. As bateiras, embarcações de menores dimensões, atracavam-se fora do cais. Ainda há pouco tempo ali se podia encontrar um estaleiro naval, construído em 1956, por Manuel Dias Bastos, no qual trabalharam, Diniz Tavares de Matos e, até há poucos anos, o mestre José Duarte da Silva, conhecido por José Pitarma. Nele se efectuavam construções e reparações de barcos de recreio em madeira. No seu final de existência já se apresentava bastante degradado e, após a morte do mestre construtor, o estaleiro foi doado ao Município, estando já a ser criada uma nova infra-estrutura, no sentido de preservar o património da construção naval da região. Mas, outras construções tiveram lugar neste palco ribeirinho, tão peculiar, o das embarcações tradicionais da laguna, tanto em estaleiros espalhados por Pardilhó, como à beira-ria, nesta mesma ribeira. No final do século XX, o espaço acolheu novas estruturas, tendo sido construído um café, em madeira, um parque de merendas, um parque infantil e um parque para caravanas, assim como o armazém de apoio à modalidade da Canoagem. A Ribeira da Aldeia foi um dos espaços requalificados recentemente, contendo o cais um ancoradouro e uma rampa de acesso. O largo da Ribeira da Aldeia foi palco para os festejos dos romeiros que chegavam da Festa do S.Paio da Torreira, em inícios de Setembro. Ali se realizava uma pequena festa, a do S. Paio dos Ougados, juntado romeiros, familiares e amigos que não tendo ido às festividades, ali festejavam o seu “S. Paio” à chegada dos felizardos, que lá se tinham deslocado em barcos mercantéis e moliceiros. E era ali que, para eles, se fazia a festa, e para os restantes se dava continuidade: comendo, bebendo e dançando em alegre confraternização. A partir de 1973 a procissão do S. Pedro de Pardilhó incluiu no seu percurso a passagem pela Ribeira da Aldeia. Estes eventos deixaram-se de realizar, tendo-se extinguido essa tradição. A esta Ribeira chegavam todos os dias os barcos moliceiros carregados com uma maré de moliço. Chegavam, ainda, os mercantéis carregados de junco para as camas do gado, que por ali se apanhava nas marinhas e se descarregava no cais, sendo depois transportado pelos agricultores. Além destas ervagens, a esta Ribeira chegava o sal que provinha das salinas de Aveiro, em barcos saleiros (mercanteis), para ser vendido em sacos, a retalho, e guardado no pequeno armazém para posteriormente abastecer o comércio local. Este sal servia para consumo doméstico e para salgar, conservar, a carne e o peixe. A este cais aportavam os barcos mercantéis com as mercadorias que abasteciam a população local, lojas, particulares e construtores civis. Para além de bens e produtos, eram transportados os materiais de construção: as areias, a pedra, o cascalho, o adobe de Esgueira com o qual se construía a casa tradicional de Pardilhó, a denominada “casa de alpendre”. Estes barcos eram manobrados pelos barqueiros pardilhoenses, uma profissão muito comum nesta vila. Os barqueiros deixavam os seus barcos atracados na Ribeira, após [ 139 ]


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cada viagem, tal como os moliceiros ficavam a aguardar outra maré. Existia uma grande frota de barcos neste cais, digna de um grande porto de cargas e descargas, com grande movimentação comercial e de transporte de pessoas, abastecendo e servindo toda a região. Para além destes barcos de grande porte, existiam as bateiras de pesca e de caça, que serviam para a apanha da enguia e do peixe branco. As de médio porte, as mercantelas, serviam para o transporte do gado, das ervagens e dos produtos agrícolas. A outra grande actividade paralela a estas fainas, era a da construção naval que se realizava na Ribeira. Ao longo dos anos foram vários os mestres construtores navais que ali construíram, reconstruíram, repararam e amanharam as grandes e pequenas embarcações de trabalho. Subiam-se as embarcações para a margem durante a enchente e ali se reparavam, ao ar livre, ao longo de todo o ano. No armazém do mestre Lavoura, que se encontra no largo da Ribeira, eram guardadas as ferramentas de apoio para a manutenção e reparação das embarcações feitas à beira da Ribeira. Para além do Mestre Lavoura, e seus aprendizes, mais tarde Mestres - António Esteves, Arménio Almeida, Felisberto Amador, entre outros - também o Mestre Agostinho e o Mestre Firmino ali trabalharam. Relembra o Mestre Felisberto que aí reconstruiu um barco mercantel nos anos 80, e reparou barcos moliceiros e bateiras. Este Mestre participou, junto com outros, ao serviço do Mestre Henrique Lavoura, na construção de um barco de mar - o último a ser construído com 4 remos, entre 1974 e 1975. Relembra, ainda, o último barco mercantel que ainda aí amanhou em 1992, recordando-se ter ainda existido actividade na Ribeira até cerca de 1995. A viagem realizada a esta ribeira iniciou-se pelo início da manhã. Saindo pelo cedo, ainda se fazia sentir o fresco da madrugada, mas o sol já despertava começando a espreguiçar os seus raios pelo manto de água. As aves já em movimento procuravam o seu alimento. Peixes saltitavam ao deslizar da embarcação, e a água enchia a grande baía que se esparramava pelas margens, preenchendo os pequenos juncais. Rumou-se para norte. A Ponte da Varela já se reflectia nas águas. O vento era fraco, mas a vela enfunava suavemente e seguiu-se ao sabor da corrente. Passou-se sob a ponte e entrou-se no Canal de Ovar, seguindo para Este, para “Vila de Ria”, Pardilhó. Já se avistavam as marinhas de junco. Entre os charcos que as preenchiam pousavam as aves: gaivotas, gaivinas, flamingos e outras mais que cantavam e encantavam quem passava de mansinho, turvando as águas por lá ainda adormecidas. Apreciou-se um cenário maravilhoso pelo início da manhã – a Natureza a despertar entre névoas e a Ria e preencher todos os recantos, gerando-se um grandioso manto azul de luz. As névoas da manhã ainda cobriam o casario e os bosques dessa extensa zona ribeirinha. [ 140 ]


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Entre recortes de juncais, adivinhavam-se as ribeiras, assinaladas com estacaria de antigas marinhas. Abicou-se a bateira à Ribeira da Aldeia. Pôde-se observar a sinalética indicativa da distância, entre troços, inscrita sobre placas de madeira, que fazem parte do percurso realizado pelos atletas da canoagem. O casario ia-se mostrando entre os tufos de junco, avistando-se dali o novo estaleiro de madeira que se encontra em construção na Ribeira. Chegou-se ao final da Ribeira, que ali se alarga significativamente, e ao fundo surge o cais. Para estibordo avista-se um antigo armazém, e à entrada do cais, o guincho. Do lado de bombordo encontra-se um pequeno armazém caiado de branco, situado entre as marinhas de junco. Entrou-se no cais, ainda apetrechado com pequenas embarcações tradicionais atracadas: bateiras coloridas, pequenos botes e lanchas. Este cenário transporta o nosso imaginário para épocas passadas. Ainda do lado de bombordo, onde outrora existiu o estaleiro do mestre José Pitarma, encontra-se agora a nova infraestrutura em construção. No final do cais, encontra-se o antigo armazém do mestre Lavoura, o pequeno armazém, contíguo, onde se guardava o sal que ali chegava em barcos saleiros e o pequeno pavilhão de apoio à modalidade da canoagem, situado ao lado do Parque de Merendas. No Cais, um Café construído em madeira, encontra-se agora desactivado. Tudo isto forma um conjunto de infra-estruturas que fazem parte da envolvente dessa zona ribeirinha. Ainda existe movimento no Cais. Algumas viaturas de pescadores madrugadores, já ali se encontravam estacionadas. Já “andavam ao rio”. Mas por ali impera o silêncio a maior parte do dia. O Cais já se encontrava repleto de água, por essa hora já parada. Por momentos imaginei a azáfama deste cais pela manhã com as partidas das grandes embarcações para o moliço, para o junco, e as chegadas das mercadorias para abastecer a região. Fica o que se vê: apontamentos de um património que se perdeu, assim como de tradições e da actividade da construção naval à beira-ria. Armazéns, pequenas embarcações e a esperança nesse novo equipamento que se vai construindo, e que poderá vir a ser um elo de ligação entre o passado e o presente, reavivando parte de um património material e imaterial, o da construção naval em Pardilhó. Regressou-se navegando pelos meandros nas marinhas de junco, tomando outro rumo, ao encontro de outras paisagens. Bandos de flamingos por lá se alimentavam, levantando voo à passagem da embarcação. Velejando suavemente por entre “estradas de água”, contornando juncais, chegou-se até ao grande largo, ao canal principal. Aproveitando o vento, velejou-se à bolina até à Murtosa deixando para trás uma ria já amanhecida e com tons deslumbrantes. Realizou-se uma viagem ao presente de uma Ribeira que já teve um passado áureo, mas que não perdeu o seu encanto.

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RIBEIRA DO MOURÃO - AVANCA Percurso: Béstida (Murtosa) - Ribeira do Mourão (Avanca)| 14 milhas | uma maré | 2,5h | 16-02-2019

Avanca é uma vila e freguesia do Município de Estarreja. É um território com muita história, tendo-se encontrado a primeira referência ao seu nome em inícios do século XI. Entre o século XVI e meados do século XIX, a região sofreu um grande desenvolvimento económico, nomeadamente no sector agrícola, abrangendo a pesca e a apanha do moliço. A economia desta freguesia assenta na agricultura, na criação de gado bovino e na produção de leite, tendo-se desenvolvido a indústria de lacticínios e também a da manufactura do mobiliário em ferro. Mas foi a partir de finais do século XIX que Avanca teve o seu maior apogeu económico e social, com a inauguração do apeadeiro dos caminhosde-ferro, o que mudou o rumo à sua História. A padroeira de Avanca é Santa Marinha.A grande extensão da procissão e a ornamentação da igreja atraem muitos visitantes aos festejos em sua honra. Os seus cursos de água, o seu lado bucólico e o contacto com a laguna através da ribeira do Mourão cativam o visitante. Foi nesta vila que nasceu o Professor Egas Moniz (18741955), tendo iniciado a sua formação escolar em Pardilhó. Foi galardoado com o Prémio Nobel da Medicina em 1949, tendo sido um homem ilustre, reconhecido e acalorado pela gente da sua terra: foi professor, cientista, investigador, médico, escritor, pensador, conferencista, político e coleccionador de arte. Nasceu na “Casa do Marinheiro”, em Avanca. Esta casa passou a chamar-se “Casa Museu Egas Moniz”, poucos anos após a sua morte, em 1968, guardando um valioso espólio. Na quinta da Casa existe um belo lago que é atravessada pelo rio Gonde que o alimenta. Esta propriedade não dista muito da Estação de Caminhos-de-ferro nem da Ribeira, pelo que Egas Moniz terá passado bons momentos de convívio com os amigos em passeios pela Ria. [ 142 ]


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Da rede de percursos pedestres do projecto da BioRia, consta o do Rio Gonde, que se inicia na “Quinta do Marinheiro”, onde se localiza a “Casa Museu Egas Moniz”, passando pelo Moinho de Meias, situado no fundo da quinta e seguindo pelas margens do rio até à Ribeira do Mourão. A Ribeira faz fronteira com duas freguesias, a de Pardilhó e a de Válega. Nesse espaço lagunar cruzam-se vários canais, esteiros e ribeiras, que contactam com o concelho de Ovar. O esteiro do Mourão situa-se a nascente de um outro, o da Ribeira Nova. A Ribeira do Mourão foi requalificada em 2009 - recuperada e integrada na paisagem. Foi construído um parque de merendas, com estacionamento e arruamentos para melhor fruição do espaço. Ficou o antigo armazém de alfaias agrícolas, aí existente, a aguardar novo projecto. Neste cais chegaram a estar atracadas inúmeras e diversas tipologias de embarcações: os mercanteis que ali chegavam com mercadorias; os barcos moliceiros que ali descarregavam o moliço para posteriormente ser transportado em carros de bois, pelos agricultores, para adubar os terrenos agrícolas e as bateiras de pesca artesanal e de recreio. Foi neste cais que se realizou o bota-abaixo de uma embarcação de recreio, a chalupa “Estevan”, construída em 1904 pelo afamado mestre de Pardilhó, Francisco Neves Matos (Fateixas). Este cais teve, em tempos, muito movimento de embarcações, de animais e de pessoas. Numa antiga fonte e lavadouro aí existente encontra-se um painel de azulejo com a imagem do “S.Paio dos Augados”, trazendo à memória os festejos que se faziam em alguns cais, aquando a chegada dos barcos carregados com os romeiros do S. Paio da Torreira. Os que ficavam em terra recebiam-nos em ambiente de festa. E foi em ambiente de “festa”, aventura e descoberta que se realizou a viagem pela Ria até à Ribeira do Mourão. Iniciou-se pela manhã, com a maré a encher, ainda com pouco movimento de águas e muita calmaria. O azulão das águas e o cinza lilás do horizonte, para o lado do mar, geraram uma imagem surreal, com o casario da Torreira reflectido sobre a laguna. Do lado da serra brilhava o sol, tão forte e intenso que encandeava o olhar e fazia perde-se a linha do horizonte, numa explosão de luz. A ponte da Varela ainda se encontrava sob névoas. Entrou-se no canal de Ovar, onde ainda se podiam ver os cabeços de areia, poiso das gaivotas e das garças. Não tardou e serem cobertos pela água. Já se encontravam algumas bateiras à pesca, plasmadas sobre as águas pouco agitadas. Rumando mais para leste, e passando pelas marinhas de junco, foi-se ao encontro das Ribeiras da “Vila da Ria”, em Pardilhó. Nesta zona de juncais repousam as aves. À passagem da embarcação levantaram voo, batendo as asas ruidosamente, deixando um rasto de movimento. [ 143 ]


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Aparelhou-se a bateira e seguiu-se à vela ao surgir de uma leve brisa, já no canal que segue para Válega. Só os ruídos da ria se escutavam, num cenário maravilhoso de água, névoas e vegetação. Ao longe avistou-se a entrada para o canal que levava à ribeira de Avanca. Uma construção habitacional e uma quinta, com uma grande plantação arbórea, assinalam a entrada do canal, do lado de Válega. Do lado oposto, um pequeno bosque, e a Ribeira de Nacinho à vista, onde ainda mora um barco moliceiro e umas bateiras tradicionais, atracadas a velhos moirões. A entrada no canal é larga. A paisagem difere entre margens: do lado de Pardilhó, avistam-se habitações, a estrada, campos, animais, algum arvoredo, juncais e os cais; do lado de Válega, observa-se uma floresta densa, e um estradão que acompanha o canal até ao Mourão, com alguns arbustos, algumas zonas de junco, espaçadas, e canízia pelas margens. Após passar a zona das ribeiras da freguesia vizinha, o canal estreita e subdivide-se em pequenos esteiros e canaletes serpenteando por entre fileiras de junco e canízia. O percurso realiza-se contornando várias línguas de lama e junco que separam zonas navegáveis. Ao seguir por estibordo, entra-se numa zona estreita, num canalete ladeado de canízia alta, perdendo-se a noção da envolvente, sentido-se apenas o roçar da vela nas altas hastes da vegetação. O canalete não apresenta espaço para manobra, e no seu término, junto à ponte (pela estrada de acesso ao cais), a custo se inverteu o sentido. Regressa-se e entra-se de novo na ribeira subdividida em duas, por um troço de terra (lama, junco, canízia e ervas). Para bombordo avista-se uma estreita ribeira ladeada por canízia mais baixa, onde ainda resta alguma estacaria para atracação, mas que termina no início do parque. Do lado de estibordo a ribeira segue até ao cais, sendo acompanhada por um estradão de terra batida, com instalação de várias plataformas em madeira que entram pela água, para fruição da paisagem. Esse curso de água é estreito e ladeado por canízia alta, do lado de Pardilhó. Chega-se à rampa do cais e observa-se, ao fundo, o casario habitacional, alguns animais no campo, a floresta, o grande armazém onde se guardavam as alfaias agrícolas e a antiga fonte e lavadouro. Atracou-se a bateira para conhecer o espaço envolvente. O parque de merendas está equipado com mobiliário apropriado e inserido num espaço verde, contendo placas indicativas do percurso das Ribeiras de Pardilhó, que ali se inicia, e dados sobre a tipologia de fauna e flora existente. Por se tratar de uma zona de sapal, com muita vegetação e águas pouco movimentadas, ali se podem observar vários tipos de habitat, predominando a biodiversidade de plantas, animais e aves aquátiacas. É um espaço onde prolífera o caniçal, que se desenvolve em águas com menos salinidade, mas que coabita com a água salobra e os juncais. [ 144 ]


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Nesta Ribeira ainda se pode observar uma grande fileira de moirões para atracação. Mas só ali se encontra uma bateira tradicional e a pequena bateira, “A Menina da Ria”, que por momentos ali aportou, para reconhecimento do espaço. Com a sua vela branca reflectida naquele curso de água azul, agora parada, ladeada pelo casario branco, pelos campos, pela canízia e vegetação de tons ocre e verde, proporcionou um belíssimo quadro bucólico e lagunar de rara beleza. Ali, na Ribeira do Mourão, onde a faina na ria, ao moliço, na pesca, no transporte e em passeios geraram grande movimento e ezáfama, mora agora a quietude.Todo aquele espaço repousa, guardando memórias e aguardando os visitantes em época de veraneio.

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JOSÉ GURGO E CIRNE

A ODIOSÍSSIMA MORTE DO LÁZARO José Gurgo e Cirne*

No livro de “Registos de Óbitos” da Freguesia do Bunheiro, referente aos anos que medeiam entre 1849-1859, surge o seguinte assento, da mão do Reitor Manuel José Ruela e Silva, relativo ao ano de 1854: À margem: Lázaro, maior. E no texto: No dia sétimo do mês de Julho de mil oitocentos e cinquenta e quatro saiu da casa, onde habitava na cidade de Coimbra, sem jamais voltar a ela, Lázaro, de vinte anos de idade, estudante do primeiro ano jurídico, filho legítimo de Manuel Tavares Amador, e Maria Afonsa Vigária, do lugar do Celeiro, desta Freguesia de São Mateus do Bunheiro, e no dia dezassete do mesmo mês e ano apareceu morto no Salgueiral do encanamento junto à dita cidade de Coimbra, com sinais evidentes de ter sido assassinado, e foi sepultado na Igreja de São João de Almedina1 da mesma cidade, de que fiz este assento e assinei.

*Licenciado em Antropologia e Serviço Social, pós-graduado em Família e Sistemas Sociais, mestre em Antropologia Social e Cultural. Possui o Diploma de Estudos Avançados em Antropologia e frequentou também Estudos Avançados em História das Idades Média, Moderna e Contemporânea. É membro do CRIA – Centro em Rede de Investigação em Antropologia, sob cuja égide se encontra a realizar o doutoramento em Antropologia. 1 - Cf. Castro, 1867:85-86: “No Largo de S. João se encontra esta igreja fundada pelo bispo D. João de Melo, que governou a diocese de Coimbra desde o ano de 1648 até ao de 1704. Foi edificada no local em que existiu outra muito antiga e memorável.” Adjacente ao Museu Machado de Castro, aquando recentes obras neste realizadas, aí foram inumados alguns esqueletos humanos, que jazem encaixotados nas águas furtadas, ditas “Reserva Osteológica”, do antigo Instituto de Antropologia de Coimbra.

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Vinte e quatro anos depois (1878), era publicado em Barcelos, pela Tipografia Aurora do Cávado, da autoria de António Francisco Barata, um livro intitulado “Miscelânea HistóricoRomântica”, cujo Capítulo II (pp:49-60), sob a epígrafe “Miseráveis Conimbricenses”, ostenta o subtítulo “A Lazarada”. Em tom manifestamente langoroso, como ditava ainda a moda desse século, tal capítulo começa assim: Era em Coimbra, em uma brilhante tarde do primeiro dia (sic) de Junho de 1854. São (sic) de uma formosura grande as margens do Mondego naquele tempo, e os arrabaldes de Coimbra de um encanto e poesia inexcedíveis. Debruçam-se sobre o rio indolente os salgueiros verde-claros e os chorões, descanta ainda um ou outro rouxinol as derradeiras canções amorosas nas balsas floridas, e o ar sereno, e o céu formoso, e o inebriante aroma naquele vegetar pomposo conspiram às invejas por nos deliciar a alma, arrastandonos descuidosos e satisfeitos pela «Fonte das Lágrimas», «Lapa dos Esteios», «Fonte do Castanheiro», «Penedos da Saudade e da Meditação», «Vale de Coselhas e Salgueiral». Tem este nome um bastantemente grande tracto de terra povoada de árvores na margem direita do Mondego, no sítio em que o caminho de ferro do norte corta aquele rio sobre a extensão da ponte. Foi nesta deliciosa mata que na tarde do referido dia entravam três académicos do liceu de Coimbra2,trajando capa e batina. Adiante marchava Lázaro Tavares Afonso e Cunha, natural do Bunheiro, no distrito de Aveiro, estudante de Lógica e de Geometria3, seguia-o Diogo Maria Araújo Santa Bárbara, de Coimbra, condiscípulo do primeiro4, e após os dois caminhava Luís Maria da Cunha, da Pedrulha, estudante de Latim5. Embrenharam-se. – Grande caçada de rolas teremos nós esta tarde, ó Lázaro, dissera Diogo. – Talvez não, respondeu o Cunha: a modo que as não vejo. Desviados da estrada, que pela margem do rio e à beira da mata conduz a Montemor-velho por forma que de ninguém fossem vistos, o Diogo redarguira ao Cunha: 2 - Cf. Castro, 1867:102-103: “Neste edifício, que até hoje se tem denominado Colégio das Artes, exerceram os jesuítas o magistério, conseguindo, com o seu poderoso valimento, estarem sempre isentos de submissão à Universidade (…). Extinta, porém, a Companhia foram incorporadas na Universidade as aulas, que com algumas alterações formam hoje o Liceu, regido por abalizados e respeitáveis professores.” Para além de já ter sido também em parte e simultaneamente hospital, nele funciona actualmente o DARQ – Departamento de Arquitectura da Universidade de Coimbra. 3 - Da “Relação e Índice Alfabético dos Estudantes Matriculados Na Universidade de Coimbra e No Liceu no Ano Lectivo de 1853 para 1854…”, consta, com o nº 3, do rol dos “Alunos Voluntários” da Cadeira de “Filosofia Racional e Moral, e Princípios de Direito Natural”; consta também, com o nº 22, do rol dos “Alunos Ordinários” da Cadeira de “Aritmética e Geometria”. Filho de Manuel Tavares Amador, natural do Bunheiro, Distrito de Aveiro, tinha domicílio na Rua do Borralho, nº 13. 4 - Diogo surge com o nº 2, enquanto “Aluno Voluntário” da Cadeira de “Filosofia Racional e Moral, e Princípios de Direito Natural”; e ainda com o nº 4, enquanto “Aluno Ordinário” da Cadeira de “Aritmética e Geometria”. Filho de Herculano Aprígio Alves d’Araújo Santa Bárbara, natural de Coimbra, tinha domicílio na Rua das Rãs, nº 12. 5 - Luís, com o nº 62, é também “Aluno Ordinário” da Cadeira de “Aritmética e Geometria”, filho de pais incógnitos, natural da Pedrulha, Distrito de Coimbra e morador na Rua do Corpo de Deus, nº 58. (Não consta que cursasse a Cadeira de “Latim”.)

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– Enganas-te, repara – e nisto apontava uma carabina que trazia carregada de bala e chumbo grosso ao pescoço de Lázaro, que ia na frente, e desfechava no moço um tiro mortal… Lázaro Tavares Afonso e Cunha levou precípite a mão direita ao gorro, que tirou da cabeça, caindo instantaneamente sem vida aos pés do condiscípulo assassino!... Dois parágrafos à frente, o autor prossegue: Haviam decorrido mais de quinze dias depois dos tristes acontecimentos marcados. Debalde a polícia de Coimbra empregara meios para descobrir o destino do académico Lázaro Tavares Afonso e Cunha: ninguém sabia dele nem morto nem vivo, quando uma tarde correu voz na cidade que era aparecido! E, de facto, um caçador por apelido Tinoco, andando no «Choupal» à caça, notara que alguns dos cães haviam amarrado a uma balsa, e que com seus ladridos o convidavam a aproximar-se. Achegou-se. Que espectáculo! Ali jazia o assassinado estudante, envolto ainda nas vestes pretas de seu uniforme, meio devorado já dos cães famintos e das aves de rapina, separada do tronco a cabeça, cujo rosto já perdera as feições na horrível decomposição em que estava. Pressuroso correra o caçador à cidade para dar parte à autoridade daquele aflitivo e comovedor aparecimento… Trazidos os restos do mancebo infeliz para o teatro anatómico, neles fez autópsia, no dia seguinte, o falecido e distinto médico António Joaquim Barjona6, com dificuldade pelo deletério e nauseabundo do cheiro, oferecendo à justiça a base de um processo crime contra alguém, que se não conhecia, e que havia assassinado aquele moço, com um tiro na parte posterior do pescoço junto à região occipital. E, quase em tom apocalíptico, o autor conclui: Sepultara-se o que restava do mancebo que, 15 dias antes, descuidado cursava os estudos no ledo viver da juventude, primavera de ilusões encantadoras, tão cedo trocada pelos gelos do Outono, pelo frio da morte… E o tempo começava lentamente a sua obra fatalíssima de esquecimento, e o matador a dar tréguas ao fantasma ensanguentado do condiscípulo morto, que por vezes a horas mortas da noite o assaltava em sonhos, medonho como o espectro de Samuel7 e como o de Holofernes8, oferecendo-lhe a própria cabeça horrivelmente desfigurada, em prémio de seu infernal desígnio, de seu feito selvagem e desumaníssimo.

6 - Precursor do ensino da medicina legal no País, nasceu e faleceu em Coimbra (1786-1886). Foi lente da Faculdade de Medicina da Universidade de Coimbra e tio materno de Augusto César Barjona de Freitas, jurista, académico e político, a que mais adiante nos referiremos. 7 - Profeta e último Juiz de Israel (cf. Lello [vol.II], 1992:826). 8 - General de Nabucodonosor, morto por Judite enquanto dormia (cf. Lello [vol.I], 1992:1237).

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No final do também Capítulo II (pp:39-46) do livro “Coimbra Antiga e Moderna”, de A. C. Borges de Figueiredo, editado em Lisboa pela Livraria Ferreira trinta e dois anos após os referidos acontecimentos (1886), ainda estes se mantinham vivos no espírito dos seus contemporâneos. A descrição dos mesmos é-nos dada, em tom circunstancial, pelo referido autor: Estávamos à sobremesa. Um estudante tinha vindo jantar ao hotel, para fazer companhia a um sujeito seu parente, homem de cinquenta anos, rico e jovial, que teve de pagar também o jantar a dois amigos que o primo lhe apresentara, os quais se desfaziam em cumprimentos e atenções para com o seu anfitrião. Além destes quatro personagens (…), estava também à mesa um velhote, cuja idade não podia facilmente ser determinada, mas que tinha a particularidade de se parecer extremamente com o fecundo e finíssimo Mirabeau9, se é exacto o retrato que os escritores e pintores do tempo nos legaram. (…) – Pois declaro-lhes, meus senhores, disse o primo do estudante para os seus convidados, que tive imenso prazer em tornar a ver Coimbra: e, tendo andado lá por longes terras, asseguro-lhes que muitas vezes me lembrei desta cidade onde passei tão bons dias da minha mocidade. –V. Exª esteve aqui em…? Perguntou um dos estudantes. O saudoso veterano confirmou então que frequentara a academia entre 1848 e 1855. Rememorou vários episódios marcantes de que ainda se lembrava (incluindo duas dispensas de acto, uma concedida em 6 de Maio de 1851 pelo duque de Saldanha, recebido em Coimbra nesse dia com “uma extraordinária ovação”, pelo seu triunfo sobre o conde de Tomar; e outra em 23 de Abril de 1852, aquando da visita da rainha D. Maria II à cidade). Quanto a esta, pormenoriza que era perto do meio dia quando o préstito real chegou à “antiga ponte, aquela que sempre foi para a academia doutras eras um ponto de reunião.” Sentados nos seus parapeitos, “em número superior a oitocentos”, escusado será dizer que, dos quintanistas aos caloiros, esse foi um dia de “regabofe”, o que não obstou às formais manifestações de respeito: de imediato, postos de pé, descobriram-se e soltaram vivas à família real! Mas insistiu ainda o estudante seu parente: – Não é também do seu tempo a morte dum Lázaro? Perguntou ao velhote o primo estudante.Tenho ouvido falar nisso.

9 - Honoré Gabriel Riqueti (1749-1791), conde de Mirabeu, filho do marquês do mesmo título, “foi o orador mais eminente da Revolução Francesa” (cf. Lello [Vol.II], 1992:252).

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– Teve lugar esse desgraçado acontecimento em 16 (sic) de Junho de 1854; chamava-se o rapaz Lázaro Tavares Afonso e Cunha. Lembro-me disso como se tivesse sucedido ontem. Foi no Choupal, onde o levaram a pretexto de caça, que covardemente o assassinaram para lhe roubarem algum dinheiro que tinha. O assassino cujo apelido era Santa Bárbara, foi tempo depois preso num botequim, e denunciou os cúmplices. Lembro-me de que na ocasião em que os presos eram conduzidos pela rua da Calçada ao tribunal para comparecerem na audiência em que deviam ser julgados, o pai do assassino estava jogando num bilhar dessa mesma rua… Há também referência ao episódio no Capítulo V, intitulado “Assassinato do Lázaro” (pp:31-46), do livro “Outros Tempos ou Velharias de Coimbra”, de Augusto d’ Oliveira Cardoso Fonseca, apontamentos referentes aos anos que medeiam entre 1850 e 1880, obra publicada pela Livraria Tabuense e impressa em Lisboa pela Parceria António Maria Pereira, em 1911. Dela respigaremos apenas as passagens que não constam das descrições anteriores ou que delas se evidenciam. O referido capítulo, narrado na primeira pessoa do plural, começa assim: Ao fundo da Couraça dos Apóstolos, do lado esquerdo e quase em frente do Arco do Colégio Novo, existia, e ignoramos se ainda existe, uma modesta casa de dois andares, na qual habitava João Gaudêncio Ribeiro do Amaral, professor de latinidade10. (…) No ano lectivo de 1853 para 1854, frequentámos nós a sua aula, na qual tivemos cerca de trinta condiscípulos, contando-se, entre estes, três que felizmente ainda vivem. Após nomear esses três condiscípulos, que nada têm a ver com o enredo do caso, a deslocação diária, acompanhada pelos respectivos criados, a tradicional sabatina (aos sábados, é bom de ver), em que se repetia a matéria dada durante a semana, acrescenta, quanto à história que nos interessa: No dia 16 de Junho (sexta-feira) desse ano, achando-nos todos os condiscípulos na aula, sentiu-se uma enorme vozearia, assim como o rumor de passos de muita gente na rua. Sob um geral impulso de desculpável curiosidade, professor e alunos, todos corremos às janelas e ao muro do quintal que ficava ao lado e nível da sala da aula; e então vimos uma imensidade de estudantes e também futricas, cercando e acompanhando outros estudantes que, em uma maca ligeiramente improvisada, conduziam os restos informes do desditoso Lázaro, o qual, conforme já dissemos, desaparecera na tarde de 7 desse mês.

10 - “Pouco depois dessa época fixou João Gaudêncio a sua residência na cidade de Évora, onde igualmente exerceu o magistério; e aí faleceu passados anos.” (N.A.)

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Pormenorizando, acrescenta o autor: No ano lectivo a que vimos de referir-nos (1853-1854) frequentavam o liceu de Coimbra, Lázaro Afonso Tavares e Cunha (sic), natural do Bunheiro, distrito de Aveiro, Diogo Maria d’ Araújo Santa Bárbara, natural de Coimbra, e Luís Maria da Cunha, natural da Pedrulha, distrito de Coimbra; estando matriculados – os dois primeiros nas aulas de Lógica e Geometria, e o Cunha, apenas, na última dessas disciplinas. Diogo era filho de Herculano Aprígio Araújo Alves Santa Bárbara, empregado na secretaria do Hospital da Universidade11. Tinha sido educado com demasiada liberdade, resultando daí entregar-se desvairadamente a extravagâncias que constantemente o colocavam em circunstâncias precárias. Foi numa destas ocasiões que ele, invocando a sua qualidade de condiscípulo, pediu a Lázaro emprestada uma moeda (4$800 réis), que prometeu pagar-lhe em breve prazo. Nunca lha restituiu, porém; e ainda, tendo conhecimento, em certo dia, de que Lázaro havia recebido a sua mesada, voltou a pedir-lhe mais dinheiro. Bem sabia Lázaro que nunca receberia do Diogo qualquer quantia que lhe emprestasse; e por isso, pretextando ter feito despesas com a compra de livros e roupa, desculpou-se. E desde esse dia adoptou o sistema de guardar o dinheiro num cinto, que usava por forma a não ser visto. De nada lhe valeu, porém, a sua previdência. Quanto pode a fatalidade! Num dia, em que acabava de vestir-se para sair, entrou-lhe o Diogo, inesperadamente, em casa e pôde ainda lobrigar o cinto. Daí, a sua malvada premeditação do roubo e traiçoeiro assassinato do seu condiscípulo!... Fazendo uma breve retrospectiva dos factos ocorridos, esclarece o autor: Na tarde de 7 de Junho não recolheu Lázaro a sua casa, como costumava fazer pontualmente, nem de noite nem no dia seguinte; facto que muito estranhado foi pelo seu companheiro de casa, um estudante de teologia12, que se apressou a comunicá-lo à autoridade administrativa.

11 - “A sua primeira nomeação foi de escriturário do Dispensatório dos Hospitais da Universidade, em 17 de Julho de 1834. (Almanaque de Portugal para 1856, pág. 199)./ Em 1873 ainda era empregado na secretaria do Hospital da Universidade.” (N.A.) 12 - Na mesma morada, não encontrámos registo de nenhum estudante de teologia. Consta, sim, um estudante do 3º ano de Direito, Custódio José Ferreira de Carvalho e Vasconcelos, natural de Travanca, no Distrito do Porto. Era filho de António José Teixeira de Carvalho e Vasconcelos, comendador da antiga Ordem Militar de Nª Srª de Vila Viçosa, por mercê de D. Luís I, e último presidente da Câmara Municipal do extinto concelho de Santa Cruz de Riba Tâmega (1855).

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Formaram-se diversas conjecturas, mas ninguém pensava num assassinato; pois sendo Lázaro um rapaz morigerado, estudioso e inofensivo, não havia lugar a admitir essa hipótese. Alguns se lembraram se seria um suicídio; mas esta ideia foi também posta de parte, porque, sabendo toda a gente que ele vivia sem dificuldades e recebia boa mesada, não podiam admiti-la. Numa persistiram, porém: – um desastre no rio Mondego, onde tivesse ido banhar-se. A autoridade administrativa mandou fazer diversas pesquisas nos portos dos Bentos e dos Lázaros, na margem direita do Mondego, próximo da rua da Alegria, por neles se haverem dado muitos desastres de pessoas que aí iam tomar banho e morriam afogadas. Nada, porém, se descobriu que revelasse ter ali ido o estudante Lázaro. E o autor dá conta também das diligências efectuadas para encontrar o desaparecido: Nessa época havia em Coimbra dois magníficos caçadores, cada um dos quais possuía uma boa matilha. Eram João de Pinho, que durante anos exerceu o lugar de guarda-livros na loja de ferragens do grande capitalista e comerciante, Ferreira Borges, na antiga rua do Coruche, mais tarde rua doVisconde da Luz, e um tal Tinoco, que mais tarde vimos revisor do caminho de ferro, os quais há muitos anos faleceram. Conheciam eles perfeitamente o vasto Choupal, sítio muito frequentado não só para passeio, como por muitos caçadores. E porque algumas vezes ali iam à caça não lhes eram desconhecidos os mais recônditos lugares da grande mata. Ofereceram os seus serviços ao administrador do concelho, que lhos aceitou, mas (diga-se a verdade) sem esperar que qualquer coisa descobrissem, por isso que ninguém poderia supor que Lázaro se fosse embrenhar nos perigosos sítios que abundam no centro do Choupal. Escolheram o dia 16 de Junho para essa batida no Choupal, aonde se dirigiram com os seus cães de caça. Com João de Pinho e Tinoco iam um tenente e dois sargentos. Depois de terem esquadrinhado diversos sítios mais solitários, sentiram os latidos dos cães, parecendo-lhes que alguma coisa estranha houvessem descoberto. Correram ao sítio, donde partiam os latidos, e eis que se lhes depara um cadáver em circunstâncias horrorosas. Era o do infeliz Lázaro, mutilado e em completo estado de decomposição. Escusamo-nos de repetir o que já acima foi dito sobre o macabro cenário do crime e [ 152 ]


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avançamos um ano, altura em que “a Providência não permitiu que os criminosos ficassem impunes” (Fonseca, 1911:38). Tanto que, quando “já pouco se falava em tal assassinato, o seu principal autor veio levantar sobre si justas suspeitas” (idem, ibidem). O caso é explicado assim pelo autor: No ano lectivo de 1854 para 1855, Diogo Santa Bárbara tornou a matricular-se em lógica e geometria, por ter sido reprovado nos respectivos exames, no ano anterior, em que fora condiscípulo de Lázaro. O Cunha abandonara os estudos. Na rua da Calçada, hoje rua Ferreira Borges e fazendo esquina para as escadinhas de Santiago, que daquela rua dão comunicação para a antiga praça de S. Bartolomeu ou Praça Velha, hoje Praça do Comércio, existiu por muitos anos uma ourivesaria pertencente a Abílio Augusto Martins, e por isso conhecida por «Ourivesaria do Abílio». Todas as tardes, em frente deste estabelecimento, se reuniam grupos de académicos, em animada conversa, distracção esta que os pacatos preferiam a ir-se asfixiar com o pestífero ambiente dos cafés, que nesse tempo muito deixavam a desejar. Neste ano cursava o 3º ano da faculdade de Direito D. Francisco de Sousa Holstein13, o qual, com seus dois irmãos, também estudantes, era hóspede do estudante do 5º ano dessa faculdade Jacinto António de Sousa14, morador na rua da Esperança, numas casas que faziam esquina para o Beco do Loureiro. Na tarde do dia 13 (sic) de Julho de 1855 (era uma sexta-feira), estava à porta da referida ourivesaria um grupo de estudantes da Universidade, entre os quais se encontrava aquele D. Francisco, que habitualmente usava uma grossa corrente de ouro, parte da qual brilhava por fora do abotoado da batina. Nessa ocasião passaram perto desse grupo os estudantes Diogo Santa Bárbara, repetente, como já dissemos, de Lógica e Geometria, e Fabrício Augusto Martins Pimentel, também repetente do primeiro ano filosófico. Diogo, tão deslumbrado ficou ao ver aquele precioso objecto, que não pôde resistir que não murmurasse para Fabrício: «Que bela cadeia para uma lazarada!»

13 - “D. Francisco de Sousa Holstein, já no ano lectivo de 1855 para 1856, era Marquês de Sousa Holstein. (…)/ Formou-se naquela faculdade em 1857, e doutorou-se em 1858 ou 1859.” (N.A.) 14 - “Era geralmente conhecido por o «Jacintinho». Em 1855 para 1856 frequentou o 6º ano da faculdade de Filosofia, na qual se doutorou, sendo em 26 de Maio de 1856 nomeado lente substituto extraordinário da mesma. (Almanaque de Portugal para 1856. – Aditamento, pág. 689.)/ Também nos anos lectivos de 1855 para 1856 e 1857 para 1858, regeu no Liceu a cadeira de Princípios de Física e Química e Introdução à História Natural dos Três Reinos, para o qual fora nomeado em 7 de Setembro de 1855. (Citado Almanaque, pág. 174)./ No ano lectivo de 1854 para 1855 foi a mesma cadeira regida interinamente pelo Sr. Dr. Matias de Carvalho e Vasconcelos, posteriormente lente de Filosofia e há muitos anos Ministro plenipotenciário de Portugal na Itália.” (N.A.)

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Se bem que falasse baixo, não passou despercebida ao grupo a expressão «lazarada», não tanto por trazer à lembrança o triste fim de Lázaro, como por ser proferida por Diogo; pois que este, em consequência da sua desregrada e má conduta, não merecia as simpatias da academia. E o certo é que, ponderando aquela frase que se lhes antolhou como tendo referência ao assassinato de Lázaro, esses estudantes que formavam o grupo assim o foram participar ao administrador. E remata o autor: No dia seguinte, 13 (?!) de Julho, foram presos Diogo Santa Bárbara e o seu ex-condiscípulo e quase inseparável companheiro Luís Maria da Cunha. O Fabrício foi preso no dia 3 de Setembro. O Diogo esteve alguns dias preso na antiga cadeia do Aljube, mas, para maior segurança, foi removido para a da Portagem. Essas cadeias foram demolidas há cerca de 50 anos. Contudo, a obra marcante em que é relatado o caso, tem o título de “Os Assassinos da Beira” e o subtítulo “Novos Apontamentos para a História Contemporânea”. É da autoria de Joaquim Martins de Carvalho e teve duas edições: uma em 1890, trinta e seis anos após os acontecimentos descritos, datada de Coimbra, sob a chancela da Imprensa da Universidade; e outra em 1922, sessenta e oito anos depois, também datada de Coimbra, da responsabilidade da Coimbra Editora, Lda. Em ambas, o caso é abordado no Capítulo XXXVII, sob a epígrafe “A Odiosíssima Morte do Lázaro”, mote que escolhemos para título do presente trabalho e por cuja primeira edição (pp:255-265) nos guiamos: Depois da horrorosa morte do Campeão15, em 24 de Janeiro de 1846, o crime mais espantoso praticado em Coimbra foi o da morte de Lázaro Tavares Afonso e Cunha, natural do Bunheiro, concelho de Estarreja, distrito de Aveiro, estudante de lógica e geometria no liceu desta cidade, que se efectuou, na tarde de 7 de Junho de 1854, no interior do Salgueiral, margem direita do Mondego. Havendo desaparecido este estudante, empregaram-se todas as diligências para ver se se descobria o destino que tinha levado. Só, porém, decorridos nove dias, a 16 do mesmo mês de Junho, é que os cães de uns caçadores descobriram o cadáver do Lázaro, já corroído e mutilado.

15 - Cf. Figueiredo, 1886:39-40 – “O Campeão, cujo nome era José António da Silva Rocha, e que tinha loja de câmbio na rua da Sofia, recebera certa porção de dinheiro para pagamento de prémios; e quatro artistas, um sapateiro, um carpinteiro e dois alfaiates, assassinaram-no, para o roubarem. Praticado o crime em 24 de Janeiro de 1846, embrulharam-no em uma esteira e foram pelas mais sombrias ruas do bairro baixo enterrá-lo no Choupal.”

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Procedendo-se no dia 17, imediato, ao auto de declarações e investigações, declararam os peritos que estava o cadáver deitado no chão, de barriga para cima, com a perna direita estendida e a coxa da mesma perna em grande parte devorada pelos animais e a perna esquerda dobrada de forma, que a planta do pé estava voltada para o lado da cabeça, indicando ter sido o cadáver arrastado pelos mesmos animais, na distância de seis palmos pouco mais ou menos, na direcção do norte para o sul do local onde tinha estado, para o que concorriam as circunstâncias de se acharem os braços estendidos na mesma direcção, e estar a batina arregaçada até ao peito, em resultado do dito arrastamento. A cabeça achava-se separada do tronco, e colocada a dois palmos ao sul do cadáver e extremidade da perna direita, estando a dita cabeça toda descarnada, e tendo ainda aderentes a si o atlas e o áxis, e distante palmo e meio uma porção de cabelo empastado. O cadáver achava-se num completo estado de putrefacção, tendo desaparecido as mãos, roídas, ao que parecia, pelos animais. Na sobredita distância de seis palmos, pouco mais ou menos, para o norte do cadáver, se achava a capa do mesmo estudante dobrada, como para servir de travesseiro, ao princípio da elevação de um pequeno montículo, que se seguia para o norte, e em que havia algumas pequenas árvores; e próximo a elas estava o gorro. As dobras da mesma capa, para o lado do sul, achavam-se manchadas, ao que parecia, de sangue sujo; para o lado do poente e junto da extremidade do sítio, onde se achava a capa dobrada, se via o chão mais escuro e exalando um cheiro infecto e com bastantes cabelos aderentes às ervas, indicando ser naquele mesmo ponto onde havia parado e permanecido a cabeça do cadáver. Fazendo os peritos mais algumas indagações e pesquisas nesse lugar, encontraram ainda ali a maxila inferior do cadáver e um pedaço de uma das vértebras do pescoço, com uma pequena fractura, que no auto do exame e da autópsia se havia notado que faltava ao cadáver. Apesar do tempo e das diligências empregues para descobrir quem fosse o autor do crime – interrogaram-se nada menos que setenta testemunhas e aproveitaram-se “todos os indícios que pudessem levar ao descobrimento da verdade” –, nada foi apurado. No entanto, a autoridade administrativa chegou mesmo a convencer-se de que o assassino era um criado dos Srs. Pinto Bastos, residente no Choupal, chamado António Francisco Bispo. Essa era a convicção do próprio administrador do concelho, Manuel Caetano de Almeida Coutinho, que a chegou a manifestar, por escrito, ao delegado do procurador régio, em ofício de 24 de Agosto de 1854. Segundo as suas palavras, constituíam fundamento para tal os precedentes daquele e a confissão de algumas testemunhas que depuseram nos autos, asseverando que o mesmo “queria conhecer o estudante, que no Choupal entendia com as mulheres que ali mandava à erva”16. Não tivesse ele morrido nessa altura e teria sido formalmente acusado do crime. Contudo:

16 - Não é por acaso que a cultura popular atribuía a designação de “filho das ervas” ao filho de pais incógnitos. E os próprios dicionários registam tal locução (cf. Lello [vol.I], 1992:859).

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Decorre muito tempo, e com espanto geral são presos pela autoridade administrativa no dia 13 de Julho de 1855 Diogo Maria de Araújo Santa Bárbara, natural de Coimbra e estudante do liceu; e Luís Maria da Cunha natural da Pedrulha, deste concelho, também estudante do liceu. Interrogado Luís Maria da Cunha pelo administrador do concelho, respondeu: – que em uma tarde de Junho de 1854 fora, na companhia do preso Diogo e do Lázaro, ao Salgueiral do Mondego, convidados pelo Diogo, para atirarem às rolas; – que, entrando no Salgueiral, ia Lázaro na frente, em seguida o Diogo, ele Cunha atrás; e reparara que o Diogo metera algumas vezes a espingarda à cara, a qual por fim desfechara, caindo o Lázaro no chão; – que ele Cunha logo fugira e atrás dele Diogo, separando-se ambos aos Oleiros; – que o Diogo trouxera a clavina, pedindo-lhe que não dissesse cousa alguma; – que lhe parecia que o Diogo matara o outro para o roubar, por lhe ter dito antecedentemente que um seu condiscípulo, chamado Lázaro, tinha muito dinheiro, sendo o jogo um dos meios que ele quisera empregar quinze dias antes; mas que, quando vira apontar a arma, é que se lembrara da intenção do Diogo; – que não sabia quem tirara o cinto do dinheiro, porque fugira apenas vira Lázaro caído, parando só quando o Diogo lhe gritou que lhe faria o mesmo; – que no dia seguinte o Diogo lhe oferecera dinheiro em casa dos Pimentéis, o qual ele não aceitara, e que também o ameaçara de que, se dissesse alguma coisa, o levaria às rolas… Interrogado o Diogo pelo mesmo administrador do concelho, respondeu: – que o Lázaro, à saída da aula o convidara para passear, e que de tarde foram eles e o Cunha para o Salgueiral, levando o Lázaro uma clavina dele Diogo, carregada com bala, que depois lha entregara para se poder embuçar; – que, caminhando o Lázaro na frente, ele Diogo no meio e o Cunha atrás de todos, tropeçara ele Diogo numa silva, disparando-se a arma, e caindo o Lázaro; – que fugira imediatamente e que, dizendo-lhe o Cunha que por estarem perdidos fossem esconder o homem, ele respondera que não queria saber de esconder ninguém; o que ele queria era ver-se em casa; – que, estando essa noite em casa dos Pimentéis, contara tudo ao filho mais velho (Fabrício)17, que lhe disse que o melhor era calar-se para ver se se não sabia nada; – e que não dera parte do acontecimento com medo de ser perseguido. Tornando a ser interrogado o Diogo pelo administrador do concelho em 15 de Julho, disse que quando depusera, no dia 13, não estava em seu perfeito juízo por ter estado a tomar café e licor na rua da Moeda, e que em alguns pontos tinha falado com menos verdade; – que atirara a Lázaro de propósito, não para o roubar, mas porque, tendo sido por ele estendido numa sabatina, e dando-lhe depois um empurrão e dois canelões, lhe ficara com zanga; – que estando os três no Salgueiral, e falando na dita sabatina, o Lázaro o ameaçara, levando a mão ao bolso; e pensando ele Diogo, pouco depois, que seria para lhe disparar alguma pistola, que então sem mais reflexões lhe atirara; – que o Lázaro era de forças superiores às suas; – que dias depois oferecera 1$220 réis ao Cunha para pagar o aluguer de um cavalo, mas que esse dinheiro lhe fora dado por seu pai; – que o cinto de que usava era de seu primo Herculano Brandão. Ainda em outro interrogatório do administrador do concelho disse o Diogo que quem tinha tirado o cinto era o Cunha, que com ele fora de propósito para o assassinar; – que o dito Cunha levara o

17 - Fabrício Augusto Marques Pimentel. Consta como “Aluno Voluntário” da Faculdade de Filosofia, com o nº 35. Filho de Manuel António Pimentel, natural de Coimbra, tinha domicílio na Rua da Moeda, nº 5.

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cinto para casa dos Pimentéis, onde por todos três fora aberto e por todos divididos os 14$000 réis que continha; – que, passados um a dois meses, comprara o cinto ao Fabrício por 160 ou 240 réis, vendendo-o depois ou perdendo-o ao jogo com Luís Pinto Tavares, e sabendo mais tarde que estava de posse dele o Alberto; – que o Fabrício não fora convidado, mas que sabia da tenção de matar o Lázaro. Interrogado de novo o réu Cunha pelo administrador do concelho, disse que não tinha tirado o cinto ao Lázaro, e que ouvira dizer que quem o tinha era o Diogo; – e que este lhe tinha oferecido dinheiro em casa do Pimentel, mas que ele Cunha não aceitara. Segue-se, depois, a respectiva tramitação judicial: Sendo os acusados entregues ao poder judicial, foi o Diogo interrogado pelo juiz de direito no dia 2 de Agosto de 1855. Respondeu ele que matara o Lázaro no Salgueiral sem reflexão por causa da rixa da sabatina, como havia referido ao administrador do concelho, e que fora o Cunha que tirara o cinto, cujo dinheiro se repartira em casa do Pimentel, entre ele Diogo, e Cunha, e o Fabrício, combinando com o dito Cunha que um soberano, que aparecera, fosse para uma vaca ao jogo, onde se perdera; – que o cinto ficara em poder do Fabrício, a quem depois o comprara, vendendo-o a Luís Pinto; – que não praticou a morte com sentido no dinheiro; – que entre os três houve o propósito de maltratar o Lázaro, ou com cacetadas, ou com pedradas, e mesmo de lhe dar um tiro, e que tudo isso não passara de conversa; – que não disparara com a firme certeza de que o matava, mas que em parte fora com essa tenção; – que confessava o delito, por costume que tinha da educação de confessar os pequenos delitos, e por se persuadir que a lei favorecia mais os que confessavam; – que os outros dois, Cunha e Fabrício, tinham sido envolvidos nesta rixa pessoal dele Diogo com o Lázaro, porque, pelo costume de andarem sempre juntos, o que se fazia a um se reputava como feito a todos. Interrogado pelo juiz de direito o acusado Cunha no dia 3 de Agosto, respondeu ele que o Diogo é que matara o Lázaro, e que o Fabrício lhe dissera que aquele Diogo lhe tinha mostrado o cinto, que ele Cunha não vira, ainda que no dia do assassinato estivesse em casa dos Pimentéis, por estar em distância a uma janela; – que na tarde do dia da morte, o Diogo convidara o Lázaro e a ele Cunha para irem às rolas ao Salgueiral; – que ali viu o Diogo fazer pontaria ao Lázaro, com o qual depois desfechou, fugindo ele Cunha, e só demorando o passo, quando o Diogo lhe gritou que, se se viesse embora, lhe fazia o mesmo; – assim com medo do Diogo fora a casa dos Pimentéis, onde o Diogo lhe dava algum dinheiro em prata, que ele não quisera aceitar, ignorando a razão por que lho queria dar; – que o Diogo não lhe comunicara o projecto da morte, e que só lhe dissera que tinha um condiscípulo que possuía muito dinheiro, que não havia meio de ele o largar, e que desejava que jogasse para ver se lho ganhava; – que só no dia do assassinato é que viu o Lázaro em casa do Diogo, ignorando o motivo porque lá fora; – que, se na administração do concelho havia dito que se separara do Diogo aos Oleiros, fora porque havia sido essa a sua tenção, e por ter ficado sobressaltado, e haver decorrido um ano depois do acontecimento; – que não sabia que o Diogo comunicasse a alguém o projecto da morte; – e que nem antes nem depois dela conhecera cinto algum ao Diogo. [ 157 ]


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O juiz de direito, voltando a interrogar o Diogo no dia 3 de Agosto, respondeu este que, quando se queixara dos agravos do Lázaro ao Cunha e ao Fabrício, dissera o Cunha: o melhor é matá-lo; homem morto não fala; – que repartira o dinheiro com o Fabrício, posto não tomasse parte no sucesso: – primo, «por lhe constar logo o acontecimento, assim que de lá veio; secundo, porque era costume entre eles o bem e o mal ser por todos três»; –que o Cunha é que tirara o cinto, dizendo-lhe que o morto «ainda pestanejara ou mexera os olhos»; – que no mesmo dia e tarde seguinte o dito Cunha trazia a mania de que lhe cheiravam as mãos à pólvora, e tanto assim que, junto do muro do quintal do médico Costa Fernandes, ele Diogo subira aos ombros do Fabrício para cortar um pouco de limonete, que lhe dera para esfregar as mãos. O célebre cinto, tirado com o dinheiro ao Lázaro, apareceu em poder de um particular no dia 25 de julho de 1855, em conformidade com a declaração de Diogo. A requisição do ministério público e ordem do governador civil foi preso no dia 3 de Setembro do mesmo ano Fabrício Augusto Marques Pimentel, estudante de filosofia, a quem os acusados se referiam nas suas declarações, e em cuja morada diziam ter sido feita a partilha do dinheiro. Por despachos de 7 e 10 do mesmo mês de Setembro de 1855 foram indiciados sem fiança os três acusados. Diogo Maria Santa Bárbara foi indiciado como «réu de homicídio voluntário e premeditado, acompanhado de roubo». Luís Maria da Cunha foi indiciado «por tomar parte no homicídio e roubo, praticados pelo Diogo». Fabrício Augusto Marques Pimentel foi indiciado como «cúmplice no referido homicídio e roubo». O Diogo não agravou. O Cunha agravou para a relação do Porto, mas não foi atendido. O Fabrício agravou para o mesmo tribunal, e obteve ser despronunciado por acórdão de 30 de Janeiro de 1856. Segue-se o julgamento… No dia 2 de Agosto de 1856 começou a audiência para o julgamento dos acusados. A casa do tribunal era na sala do antigo cartório da Misericórdia, ao princípio da rua da Calçada, hoje de Ferreira Borges, onde posteriormente esteve a Associação Comercial e agora está novamente o cartório da Misericórdia. «Querelante» – O ministério público, representado pelo delegado Augusto de Abreu Castelo Branco. [ 158 ]


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«Querelados» – Diogo Maria d’ Araújo Santa Bárbara e Luís Maria da Cunha, como autores de assassinato na pessoa de Lázaro Tavares Afonso e Cunha. «Juiz» – O bacharel ManuelVilela de Sousa Araújo Barbosa. «Advogados» – Do primeiro querelado o dr. José Adolfo Trony; e do segundo o bacharelVenâncio da Costa Alves Ribeiro. «Jurados» – Presidente, dr. José Joaquim Manso Preto, António Joaquim da Silva Ferreira, Henrique O’ Neill, José da Costa Santos, José Alexandre, Manuel Maria Pereira da Silva, José da Costa, José Joaquim de Sousa Pereira, Manuel Duarte Areosa, Francisco Lopes Sobral, Julião Nogueira Coimbra e João José Nogueira. Começou a audiência às dez horas da manhã, e acabou às quatro horas da madrugada do dia seguinte. Durante todo esse tempo esteve sempre a sala completamente cheia de espectadores, sendo geral e muito grande o interesse por esta causa. Depois do depoimento das testemunhas procedeu o juiz ao interrogatório dos dois acusados, cada um dos quias procurou lançar de si a parte mais odiosa do crime. Seguiu-se a orar o delegado do procurador régio, que ao terminar o seu enérgico discurso, tirando partido da circunstância de o assassinado se chamar «Lázaro», disse: – «Se a minha voz tivesse o poder que tinha o Redentor do Mundo, eu diria agora como aquele: – ‘Surge, Lazare’ e então apresentando-se aqui no meio de nós aquele cadáver decapitado, em corrupção e semidevorado pelos animais, não seríeis vós, senhores jurados, que condenaríeis os réus; haviam de ser seus próprios pais, que como Bruto18 os sentenciariam!» Os dois advogados seguiram na sua defesa o plano adoptado pelos acusados, desviando de cada um dos clientes a parte mais odiosa da acusação. Depois da decisão condenatória do júri passou imediatamente o juiz de direito Vilela a lavrar a sentença, que pelas quatro horas da madrugada foi lida, e é a seguinte: (Segue-se a sentença.) “Vistos estes autos, em que os réus Diogo Maria d’ Araújo Santa Bárbara e Luís Maria da Cunha são arguidos e acusados de terem, em 7 de Junho de 1854, no sítio do Salgueiral, subúrbios desta cidade, morto Lázaro Tavares Afonso e Cunha, isto de propósito, e com o fim principal de lhe subtraírem um cinto com dinheiro: 18 - Marco Júnio Bruto (86 a.C.-42 a.C.), político e militar romano, entrou numa conjura para assassinar César, tido por seu pai e que sempre o havia protegido. “É o protótipo do republicano inflexível, capaz de sacrificar a própria vida em defesa dos seus princípios” (cf. Lello [Vol.I], 1992:395).

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E porque, segundo a decisão do júri, os réus sobreditos se acham convencidos do crime de que são arguidos e acusados, praticando o facto criminoso de propósito, e para o fim da subtracção dum cinto com dinheiro, e é por isso aplicável aos mesmos réus o art. 351 do cód. Pen. – ibi: «Será punido com a pena de morte19 o crime de homicídio voluntário declarado no art. 349, quando concorrer qualquer das circunstâncias seguintes – premeditação – e quando o crime tiver por objecto preparar, ou facilitar, ou executar qualquer outro crime.» Atendendo, porém, a que os réus são menores, e tinham cerca de 17 anos de idade ao tempo do delito: Atendendo a que o réu Diogo Maria, por ser agente directo do crime, ou aquele que se encarregou de disparar o tiro, como disparou, e ser tido e reputado como amigo do homicidado, convidando-o à caça das rolas, é por isso mais criminoso e deve ter maior castigo: Atendendo ao que dispõe o cód. Pen. no art. 71, e ao que dispõe no art. 99: Por isso, e por tudo o mais, havendo por supridos os defeitos supríveis do processo, e suas irregularidades, condeno o réu Diogo Maria d’ Araújo Santa Bárbara em degredo por toda a vida para a Africa Oriental, agravado com prisão por dez anos; e o outro réu Luís Maria da Cunha em degredo, também por toda a vida, para a África Ocidental, e ambos paguem as custas do processo. Coimbra, 3 de Agosto, e quatro horas da manhã de 1856. ManuelVilela de Sousa Araújo Barbosa.” Concluindo, impõe-se aqui uma circunstanciada nota biográfica, ainda que não de todo exaustiva, sobre a família do desafortunado estudante. Lázaro Tavares Afonso e Cunha20 era o 13º filho do casal constituído por Manuel Tavares Amador (que foi Juiz de Paz das freguesias de Veiros e do Bunheiro) e Maria Afonso Vigário. Nasceu em 5 de Novembro de 1835 e faleceu, como se viu, em 7 de Junho de 19 - Na sequência da proposta apresentada em 27 de Fevereiro de 1867 na Câmara dos Deputados, por Barjona de Freitas (1834-1809), Ministro dos Negócios Eclesiásticos e da Justiça, a extinção da pena de morte para crimes civis viria a ser finalmente aprovada por Carta de Lei de 1 de Julho de 1867. (Note-se que, desde 1842, já não se registava nenhuma execução.) 20 - Sobre ele, deixou o seu sobrinho-neto, ao tempo ainda solteiro, lavrador, de 22 anos de idade, “desta casa dos Tavares Afonso e Cunho do lugar do Celeiro e freguesia do Bunheiro”, a seguinte Lembrança comemorativa: “Plantei na terra denominada Celeiro de Baixo no dia vinte e oito de Dezembro uma pinheirinha no sítio onde existiu uma outra deitada abaixo por um ciclone que por aqui passou no dia dezasseis de Janeiro do ano passado (1922)./ Conta-se que esta pinheira destruída fora plantada por um tal Lázaro Tavares Afonso e Cunha, que foi desta casa, quando andava a brincar com um irmãozito (…)./ Mais se conta deste Lázaro que, mais tarde, sendo estudante de Direito em Coimbra, fora ali traiçoeiramente assassinado nas margens do Mondego por um seu condiscípulo, com tiros de revólver./ A pinheirinha de que vinha falando e ontem plantei mede um palmo de altura e foi nascida debaixo duma outra pinheira mãe que está (…) no cômoro de loureiros da estrema do Aido e Terras da Ribeira do Martinho./ Peço portanto a quem esta lembrança vir que a leia e conserve respeitosamente (…)./ Feito isto no escritório desta casa aos vinte e nove dias do mês de Dezembro do ano de 1922./ Eu o escrevi e guardo./ António Tavares Afonso e Cunha Jr.” Lamentavelmente, há meia dúzia de anos, a Câmara Municipal da Murtosa mandou deitar abaixo esta pinheira, sob pretexto de que as suas raízes estavam a empolar o asfalto da estrada próxima… Era uma pinheira molar, exemplar raríssimo, cujo miolo das sementes se alcançava com a simples pressão da polpa dos dedos.

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1854. Era estudante do Liceu de Coimbra e preparava o seu ingresso na Faculdade de Direito. (Não tinha ainda, pois, a idade de 20 anos que o Reitor Manuel Ruela lhe atribui, à data da sua morte, nem a qualidade de estudante do curso jurídico.) A irmã mais velha e 1ª filha do referido casal, chamava-se Maria Ana Tavares Afonso Vigário, nasceu em 26 de Julho de 1817 e faleceu em 10 de Outubro de 1881. Em 23 de Novembro de 1852, casou com António Joaquim Pereira de Sousa, seu tio paterno, do lugar dos Passadouros, na freguesia do Bunheiro, não tendo tido descendência. O 2º filho do casal chamou-se Manuel José Tavares Afonso e Cunha, nasceu em 3 de Outubro de 1818 e faleceu (de “bexigas negras”, segundo nota manuscrita deixada pelo seu sobrinho Dr. António Tavares Afonso e Cunha) em16 de Janeiro de 1842, no estado de solteiro e sem descendência. Cursou direito em Coimbra e é tradição familiar que a sua morte inesperada ocorreu no alpendre da casa paterna, no Celeiro, quando aguardava o ingresso na carreira da magistratura, na comarca de Vila da Feira21. Do seu assento de óbito, o Pároco da freguesia do Bunheiro, na altura, António José Pinto da Cunha, regista o seguinte: À margem: “F. famª”22. E no texto: “Manuel, filho de Manuel Tavares Amador, do Celeiro, desta freguesia do Bunheiro, faleceu da vida presente com todos os sacramentos no dia dezasseis de Janeiro de mil oitocentos e quarenta e dois e no dia dezassete do mesmo foi sepultado no Adro da Igreja, de que fiz este assento que assino. «Era et supra.»” Seguiu-se-lhe, como 3º filho do casal, Domingos Tavares Afonso e Cunha, nascido em 26 de Março de 1820 e falecido, também na casa paterna, em 8 de Junho de 1889. (Por vezes acrescentava “Amador” ao apelido.) Ordenado padre, fixou residência em Aveiro, onde viveu, na Rua do Vento, como hóspede da família Regala. Foi capelão e tesoureiro da Sé de Aveiro até à sua extinção em 1881, professor no Seminário e, de passagem, no então criado Liceu de Aveiro (actualmente Escola Homem Cristo). Por vocação, dedicou-se durante muitos anos também ao ensino livre. Após o assassinato do Pe. José da Anunciação Portugal (por sinal, um murtoseiro), na noite de 30 para 31 de Março de 1866 (respectivamente Sexta-Feira Santa e Sábado de Aleluia) às mãos dos sicários de João Brandão (cf. Pinto, 2004:148-149), passou a administrar a Casa de Almeidinha, como procurador do 2º Visconde do mesmo título, João Carlos do Amaral Osório de Sousa Pizarro.

21 - Da “Relação e Índice Alfabético dos Estudantes Matriculados Na Universidade de Coimbra e No Liceu…”, consta o seguinte: frequentou o 1º Ano de Direito em 1837-38, com domicílio na Rua do Norte, nº 352; o 2º Ano em 1838-39, embora o seu domicílio não esteja identificado; o 3º Ano, com domicílio na Rua do Norte, nº 352; o 4º Ano, com domicílio na Rua do Norte, nº 135; e o 5º Ano, com domicílio na Feira, nº 258. (Ressalve-se uma eventual confusão entre o seu domicílio académico e a comarca da sua colocação.) 22 - Filho-família.

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Registe-se, a título de mera curiosidade, que o 2º Visconde de Almeidinha faleceu em 30 de Maio de 1890, dia em que deveria ser assinado o Decreto que o nomeava Governador Civil de Aveiro. Desconhecemos onde funcionava então o Governo Civil, mas quis a ironia do destino que viesse depois a ser instalado no solar que ele possuía em Aveiro, não obstante o mesmo ter sido entretanto palco de pavoroso incêndio. E aí se manteve, no mesmo edifício, depois recuperado, até à extinção, já em nossos dias, da respectiva circunscrição (Pina et al, 2006:106-107). O 4º filho do casal foi Miguel Tavares Afonso e Cunha, nascido em 29 de Setembro de 1821. Casou em primeiras núpcias, em 8 de Outubro de 1843, em Pardilhó, com Ana Joaquina de Abreu Freire, daí. Deste primeiro casamento não houve descendência. Após o falecimento da esposa, casou em segundas núpcias, em 3 de Fevereiro de 1872, também em Pardilhó, com Ana Joaquina Valente Teixeira. Deste casamento houve quatro filhos: Pe. José Luciano Afonso e Cunha, que paroquiou a freguesia de Stº Aleixo, concelho de Moura, no Alentejo, tendo depois emigrado para a Califórnia, onde continuou o exercício do seu múnus pastoral; Maria Luciana, professora do ensino primário, solteira; Dr. Caetano Tavares Afonso e Cunha, advogado, conservador do Registo Civil em Estarreja, que casou em Angeja, dele sendo filho o médico Dr. Domingos Ferreira Afonso e Cunha, que foi Delegado de Saúde em Aveiro; e Maria Amélia, também professora do ensino primário, que casou com Manuel Maria Cirne, com a mesma profissão, do lugar das Teixugueiras, em Pardilhó. Deste casamento houve outro Miguel, que, após cursar Enologia em Bordéus, se estabeleceu profissionalmente em Trás-os-Montes, no concelho de Montalegre. O 5º filho foi Agostinho Tavares Afonso e Cunha, nascido em 15 de Março de 1823, que casou em 10 de Novembro de 1875 com Joaquina Alves da Silva, dos Passadouros, freguesia do Bunheiro, com descendência. O 6º filho foi José Tavares Afonso e Cunha, nascido em 17 de Junho de 1824 e falecido em 18 de Novembro de 1909, no estado de solteiro e sem descendência. O 7º filho foi apenas registado como João, nascido em 27 de Fevereiro de 1826 e falecido em 4 de Agosto do mesmo ano. O 8º filho, nascido em 15 de Julho de 1827 e falecido em 19 de Maio de 1841, também se chamou João. No respectivo Livro de Óbitos, o Pároco António José Pinto da Cunha anotou: À margem: “F. famª “. E no texto: “João, filho de Manuel Tavares Amador, do lugar do Celeiro, desta Freguesia de S. Mateus do Bunheiro, tendo quase catorze anos de idade, faleceu da vida presente, absolvido «Sub Conditione», com a Extrema Unção, no dia dezanove de Maio de mil oitocentos e quarenta e um, e no dia vinte do dito mês e ano foi sepultado no Adro desta Igreja, e para constar fiz este assento que assinei. «Era et supra»”. [ 162 ]


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O 9º filho chamou-se Evaristo Tavares Afonso e Cunha, nascido em 28 de Novembro de 1829. Casou em 20 de Agosto de 1863 com Maria Rosália Pereira de Sousa, sua vizinha, também do Celeiro, freguesia do Bunheiro, tendo deixado descendência. O 10º filho foi a irmã gémea do anterior, Rosa Delfina, nascida na mesma data e falecida ainda menina, em 5 de Março de 1833. O 11º filho chamou-se António, nasceu em 28 de Abril de 1831 e faleceu em 14 de Outubro do mesmo ano. Ao 12º também foi dado o nome de António, o qual se assinou António Tavares Afonso e Cunha (tal como o sobrinho homónimo, o Dr. António Tavares Afonso e Cunha, último presidente da Câmara Municipal de Estarreja durante o regime monárquico.) Nasceu em 8 de Janeiro de 1833 e faleceu em 11 de Agosto de 1909. Casou em 11 de Maio de 1871 com Clementina Alves Valente, do lugar da Lagoinha, freguesia do Bunheiro, mas não teve descendência, indo, já viúvo, residir para a casa paterna. Faleceu em Estarreja, onde se encontrava hospedado, na pensão da Sra. Ana de Jesus Mortágua. (Se não erramos, chegou a ser vereador da Câmara Municipal de Estarreja, quando a mesma era presidida por Francisco Barbosa.) Ficou sepultado no cemitério de Beduído, à semelhança do que viria a suceder, mais tarde, com o já referido sobrinho. O 13º, como já vimos, foi Lázaro Tavares Afonso e Cunha, de que acima tratámos. Porém, o casal constituído por Manuel Tavares Amador e Maria Afonso Vigário, teve ainda outro filho mais novo; ou, melhor, uma filha: O 14º filho foi Joana Maria Tavares, nascida em 12 de Novembro de 1837. Casou em 13 de Janeiro de 1863 com Manuel José Pereira de Sousa (irmão da atrás mencionada Maria Rosália Pereira de Sousa), também do Celeiro, freguesia do Bunheiro, e viria a ser avó materna do já falecido Dr. José Tavares Afonso e Cunha. Resumindo, o infausto estudante Lázaro Tavares Afonso e Cunha era tio-avô do Dr. José Tavares Afonso e Cunha23, durante muito tempo conservador do Registo Civil da Murtosa, presidente da Câmara Municipal deste concelho, advogado respeitado pela sua rectidão e saber, e autor de “Notas Marinhoas”, obra incontornável da historiografia local.

23 - Sobre ele, o seu irmão mais velho, que, entre vários cargos públicos, durante anos foi vereador da Câmara Municipal da Murtosa, assumindo a presidência interina da mesma após o golpe militar de 25 de Abril de 1974, deixou também a seguinte lembrança manuscrita: “No dia vinte e dois de Outubro foi o meu irmão José Tavares Afonso e Cunha para o Colégio del Pasaje, La Guardia, em Galiza, Espanha, colégio este dos Jesuítas, sendo director ou reitor do mesmo o Revmo. Pe. Manuel Tavares Rebimbas, natural da Murtosa./ Bunheiro, 23 de Outubro de 1923./ António Tavares Afonso e Cunha, Jr.”

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Bibliografia Barata, António Francisco. 1878. Miscelânea histórico-romântica, Barcelos, Tipografia da Aurora do Cávado. Carvalho, Joaquim Martins de. 1890. Os assassinos da Beira: novos apontamentos para a história contemporânea, Coimbra, Imprensa da Universidade (1ª Edição). Carvalho, Joaquim Martins de. 1922. Os assassinos da Beira: novos apontamentos para a história contemporânea, Coimbra, Coimbra Editora, Lda. (2ª Edição). Castro, Augusto Mendes Simões de. 1867. Guia histórico do viajante de Coimbra, Coimbra, Imprensa da Universidade. Figueiredo, A. C. Borges de. 1886. Coimbra antiga e moderna, Lisboa, Livraria Ferreira. Fonseca, Augusto d’Oliveira Cardoso. 1911. Outros tempos ou velharias de Coimbra, s/l, Livraria Tabuense. Lello Universal: dicionário enciclopédico luso-brasileiro, Porto, Lelo & Irmão, 1992 (Vols. I e II). Pina, Miguel Esperança; Borrego, Nuno; Freitas, Lourenço Vilhena de. 2006. Os titulares e os oficiais da Patuleia: ordens gerais da Junta Provisória do Governo Supremo do Reino (1846-1847), Lisboa, Tribuna da História. Pinto, José M. Castro. 2004. João Brandão: «o terror da Beira», Lisboa, Plátano Editora.

Fontes Consultadas ADAVR – “Assentos de Baptismos” da Freguesia do Bunheiro (1824-1840). ADAVR – “Assentos de Baptismos” da Freguesia do Bunheiro (1810-1827). ADAVR – “Registos de Óbitos” da Freguesia do Bunheiro (1810-1827). ADAVR – “Registos de Óbitos” da Freguesia do Bunheiro (1827-1840). ADAVR – “Registos de Óbitos” da Freguesia do Bunheiro (1827-1840). ADAVR – “Registos de Óbitos” da Freguesia do Bunheiro (1840-1848). ADAVR – “Registos de Óbitos” da Freguesia do Bunheiro (1849-1859). “RELAÇÃO e Índice Alfabético dos Estudantes Matriculados Na Universidade de Coimbra e no Liceu no Ano Lectivo de 1839 para 1840, Coimbra, Imprensa da Universidade, 1839. Idem, Ano Lectivo de 1840 para 1841, Coimbra, Imprensa da Universidade, 1840. Idem, Ano Lectivo de 1841 para 1842, Coimbra, Imprensa da Universidade, 1841. Idem, Ano Lectivo de 1842 para 1843, Coimbra, Imprensa da Universidade, 1842. Idem, Ano Lectivo de 1843 para 1844, Coimbra, Imprensa da Universidade, 1843. Idem, Ano Lectivo de 1853 para 1854, Coimbra, Imprensa da Universidade, 1853. [ 164 ]


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CARLOS MARQUES RODRIGUES: O IMPULSIONADOR DA EDIFICAÇÃO DA CENTRAL DE ENERGIA ELÉTRICA - A TURBINA DE ESTARREJA Juliana Cunha *

** “Pretende-se instalar uma linha de transporte de energia eléctrica a 2.000 volts destinada a fornecer força motriz para a fábrica de moagem e descasque de arroz “A Hidro-Eléctrica” na vila de Estarreja. A distância da central à fábrica segundo a linha projectada é de 1870 m.”1 In Memória Descritiva – Projecto da linha de transporte de energia eléctrica para a Fábrica de Moagem do Senhor Carlos Marques Rodrigues na Vila de Estarreja No anterior número da Revista Terras de Antuã, abordamos a temática da antiga Fábrica de Descasque de Arroz, a “Hidro-Eléctrica de Estarreja”, focando igualmente alguns aspetos da vida do seu fundador: Carlos Marques Rodrigues (1882-1976). Além deste património que marcou a história do desenvolvimento e progresso industrial no Concelho, este homem empreendedor e avançado no tempo foi o impulsionador da edificação da central de energia elétrica: a afamada turbina em Estarreja. Situada nos terrenos da Quinta da Costa, que se desenvolvem confinando com o rio Antuã e propriedade da família Marques Rodrigues, foi outrora um símbolo de modernidade e tecnologia. Com uma visão inovadora, Carlos Marques Rodrigues projetou e impulsionou a edificação da central de energia elétrica para “iluminação da propriedade agrícola, constituída pelos terrenos e casas designadas por Quinta da Costa”2 e, para “servir com força motriz a Fábrica de Moagem e Descasque de Arroz em Estarreja.”3 Ambas idealizadas e impulsionadas por Carlos Marques Rodrigues, a central hidroelétrica forneceu à Fábrica de Descasque de Arroz um recurso essencial para o seu desenvolvimento e progresso. Além da fábrica, e junta a esta, as casas e propriedades da família Marques Rodrigues também passaram a usufruir da mesma energia vinda da turbina e gerada pelas águas do rio Antuã.

* Licenciada em Ciência da Informação Arquivística e Biblioteconómica pela Faculdade de Letras da Universidade de Coimbra. ** Voto de agradecimento àqueles que, na construção deste texto, viabilizaram o acesso às fontes primárias de informação, designadamente José Carlos Antão da Costa Maques, entretanto falecido (1954-2018), neto de Carlos Marques Rodrigues e Anabela Amorim, esposa de Carlos Eurico Figueira Marques (1938-2007), neto de Carlos Marques Rodrigues. 1 - Documento gentilmente cedido pelo senhor José Carlos Antão da Costa Marques. 2 - In Memória Descritiva – Plano sobre a instalação na Central Elétrica do lugar da Quinta da Costa. [sem data]. Documento gentilmente cedido pelo senhor José Carlos Antão da Costa Marques. 3 - In Memória Descritiva – Projeto sobre a ampliação da central elétrica no lugar da Quinta da Costa, 1934. Documento gentilmente cedido pelo senhor José Carlos Antão da Costa Marques.

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JULIANA CUNHA

Homem ativo na sociedade, Carlos Marques Rodrigues esteve envolvido na modernização da vila, com a chegada da energia elétrica a Estarreja, apresentando à Câmara Municipal “uma proposta para o fornecimento de energia elétrica à vila, através da sua central hidroeléctrica – turbina”4. A proposta de Carlos Marques Rodrigues materializou-se na realização de “um contrato, pelo prazo de dez anos, onde se comprometia a abastecer a rede de electricidade pública e privada da vila de Estarreja”.5

1 – Turbina no rio Antuã. 6

Projeto ambicioso para a época, a turbina de Estarreja foi construída pela empresa “Les Nouvelles Usines Bellinck”, da Bélgica. O avançado equipamento, que tinha um motor de combustão interna e a potência de 40 cavalos-vapor, foi apetrechado com a parte hidroelétrica e a parte termoelétrica, conforme documento anexo ao Plano sobre a instalação na central elétrica do lugar da Quinta da Costa.7 Parte Hidroeléctrica É constituída por uma turbina hidráulica, marca “Hamma Gieseck & Konegen”, sistema “Francis” de 50 CV, que move pelo sistema de correia de couro, um alternador marca “Boge” de 30 KVA, tensão 2000 4 - CUNHA, Diana; SILVA, Susana Themudo – A chegada da energia elétrica ao concelho de Estarreja: 1925-1930: breves apontamnetos históricos. In: Terras de Antuã – Histórias e Memórias do Concelho de Estarreja, Vol. 3, Ano 3, p. 79-98. 5 - Idem. 6 - Documento gentilmente cedido pela prof. Anabela Amorim, [sem data]. 7 - Central Hidro-Termo Eléctrica de Carlos Marques Rodrigues, [sem data]. Documento gentilmente cedido pelo senhor José Carlos Antão da Costa Marques.

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v, com dínamo de excitação acoplado, da mesma marca, com a tensão de excitação de 110 V contínuo a 50 HZ. Quadro de instrumentos com regulação de excitação e regulação de saída de alta tensão. Parte Termoeléctrica É constituída por um motor diesel, marca “Peter” de 45 CV, com regulação automática de velocidade conforme a carga, movendo por intermédio de correia de nylon, um alternador marca “A E G”, de 32 KVA, com dínamo de excitação acoplado, da mesma marca, com corrente de excitação de 60V contínuo, a 50 Hz. Quadro de instrumentos com regulação da corrente de excitação. Ambos os quadros estão protegidos contra avarias na linha de transporte, e também contra descargas atmosféricas, com pára-raios. Há ainda a possibilidade de se estabelecer ligação em paralelo entre os dois sistemas, com sincronização pelo método de lâmpadas de incandescência. Existem ainda duas saídas de baixa tensão, uma com transformador de 2000 V – 380 V e 12 KVA, e outra com um transformador de 2000-220V de 75 KVA. No referido documento do Plano sobre a instalação na central elétrica, é possível verificar na memória descritiva que o impulsionador da turbina pretende instalar na casa da central elétrica “um transformador de energia e esquema da instalação de ligação e distribuição para força motriz e iluminação da propriedade agrícola do Exmo. Senhor Carlos Marques Rodrigues, constituída pelos terrenos e casas designadas por Quinta da Costa.”8 Quanto às características, o referido transformador a ser instalado terá a “capacidade de 12.5 KVA; relação de transformação de 2.000/382/220 volts e enrolamentoYY”9. No que à montagem diz respeito será “montado na cela do disjuntor automático do alternador de 22 KVA e por sob este conforme desenho, está ligado ao barramento da central por cabo MKBA de 3X10 mm2 e protegido por corta-circuitos fusíveis de 3 amperes.”10 Ainda na memória descritiva é referida a instalação de baixa tensão, a saber: QUADRO DE DISTRIBUIÇÃO N.º 1: Este quadro está provido de seccionador tetrapolar de 200 amperes para recepção da energia do transformador e dele derivam: a) Circuito em cabo PBCR de 3X10mm2 protegido por corta-circuitos fusíveis de 35 amperes para alimentação de um motor de 12 CV com arrancadorY. b) Circuito de BT de 10mm2 protegido por corta-circuitos fusíveis da central, donde parte a linha aérea montada em postes de cimento armado com 7 metros de altura e 45 metros de distância entre si, constituída por cobre nú de 3X10+6 mm2. A linha aérea, segue o traçado dos postes n.º 1-2-3-4 para a casa do proprietário e dependências agrícolas, o traçado dos postes n.º 1-5-6-7 e 8 segue para uma carpintaria. 8 - Plano sobre a instalação na Central Elétrica do lugar da Quinta da Costa. [sem data]. Documento gentilmente cedido pelo senhor José Carlos Antão da Costa Marques. 9 - Idem. 10 - Ibidem.

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JULIANA CUNHA

QUADRO DE DISTRBUIÇÃO N.º 2: Do poste n.º 4 sai uma baixada de em BT de 10mm2 para alimentação do quadro n.º 2, casa do proprietário, protegida por corta-circuitos fusíveis de 25 amperes. Este quadro está provido de seccionador tetrapolar de 100 amperes e dele derivam: a) Circuito em BT de 2,5 mm2 protegido por corta-circuitos fusíveis de 15 amperes e disjuntor automático para motor de 1 CV. b) Circuito de iluminação exterior protegido por corta-circuitos fusíveis, disjuntor automático e interruptor horário, constituído por linha aérea de cobre nú de 10 mm2 montada nos postes do traçado 1-2-3-4 e habitação do pessoal. c) Cinco circuitos para iluminação protegidos por corta-circuitos fusíveis de 6 amperes e disjuntores automáticos. Do poste n.º 4 sai também uma derivação de cobre nú de 3X10+6mm2 que se apoia num postalete do celeiro e noutro da casa do moinho, donde sai uma baixada em PBCR de 4X6mm2 com corta circuitos fusíveis de 25 amperes e interruptor tripolar para um motor de 4 CV, alimentando ainda uma lâmpada de iluminação; deste postalete a linha segue a uma consola na vacaria, donde sai uma baixada em PBCR 3X6 mm2 protegida por corta-circuitos fusíveis de 25 amperes para alimentar um motor de 6 CV com arrancador Y. QUADRO DE DISTRIBUIÇÃO N.º3: Do poste n.º 8 é retirada uma baixada em BT de 10mm2, protegida por corta-circuitos fusíveis de 35 amperes para alimentação do quadro n. º3 na carpintaria. Este quadro está provido de seccionador tripolar e dele derivam: a) Circuito de PBCR 3X2,5mm2 protegido por corta-circuitos fusíveis de 15 amperes e disjuntor automático para motor de 2 cv. b) Circuito de PBCR de 3X6mm2 protegido por corta-circuitos fusíveis de 25 amperes para motor 6 CV. c) Circuito de PBCR 2X1,5mm2 protegido por corta-circuitos fusíveis de 6 amperes para iluminação. Do poste n.º 1, sai uma derivação de 2X10+6 mm2 para um postalete na casa do pessoal, donde sai uma baixada em BT de 2.5mm2 protegida por corta-circuitos fusíveis de 6 amperes para iluminação interior e exterior. O Plano da instalação elétrica foi bem sucedido, e a partir de então, a propriedade agrícola, os terrenos e as casas de Carlos Marques Rodrigues passaram a usufruir de energia elétrica gerada pela turbina. Em fevereiro de 1930, a central de energia elétrica é certificada pelo Ministério do Comércio e Comunicações, Direção Geral das Indústrias e 2ª Circunscrição Industrial, após realização de vistoria e exame de funcionamento, tendo havido outras duas vistorias em 1940 e 1946.

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2 - Certificado de vistoria de instalação e de exame de funcionamento, 1930.11

11 - Certificado de vistoria de instalação e de exame de funcionamento, 1930. Documento gentilmente cedido pelo senhor José Carlos Antão da Costa Marques.

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JULIANA CUNHA

Em 1934, mais de uma década depois do início da laboração da Fábrica de Descasque de Arroz, é autorizado pela Direção e Repartição dos Serviços Elétricos “o projecto sobre a ampliação da central eléctrica no lugar da Quinta da Costa, concelho de Estarreja, distrito de Aveiro, para servir com força motriz a Fábrica de Moagem e Descasque de Arroz de Estarreja do Senhor Carlos Marques Rodrigues.”12 Para este projeto ambicioso de fazer chegar energia da turbina à Fábrica foi necessário instalar na mesma “um motor elétrico para corrente alterna trifásica tipo semi-protegido, dos seguintes dados:”13

Tensão – 41 HP Frequência – 50 períodos Velocidade – 1.400 r.p.m Acessórios: 1 - Reostato de arranque em banho de óleo. 1 - Jogo de carris tensores. 1 - Polia. 1 - Interruptor de alta tensão automático.

“Será ligado o motor por cabo de alta tensão de 3X10mm2 ao interruptor automático e este ao cabo que alimenta o motor trifásico existente.”14 “Quanto ao funcionamento das máquinas: são estas acionadas por energia eléctrica produzida em turbina hidráulica pertencente ao requerente, com a potência de 50 H.P., e motor diesel de 40 H.P., com capacidade de abastecimento para uma produção dupla que tem sido autorizada à fábrica, havendo possibilidades de instalar mais 4 turbinas com a potência total de 200 H.P. Para casos de emergência, e se tal fôr julgado conveniente, está ligada à rede de União Eléctrica Portuguesa.”15. No que à manutenção diz respeito, apenas “meio litro de óleo necessário à lubrificação da turbina, em cada dez horas de trabalho.”16 O passo seguinte, foi projetar a linha de transporte a 2.000 volts da central de energia elétrica até à Fábrica de Descasque de Arroz. Segundo a memória descritiva do referido projeto, “a distância da central à fábrica segundo a linha projectada é de 1870 m.”17 “A energia é gerada num alternador trifásico de 30 K.V.A. acionado por uma turbina hidráulica ou por um motor no caso da água ser insuficiente para alimentar a turbina. A residência

12 - Projeto sobre a ampliação da central elétrica no lugar da Quinta da Costa, 1934. Documento gentilmente cedido pelo senhor José Carlos Antão da Costa Marques. 13 - Idem. 14 - Ibidem. 15 - Exposição que Carlos Marques Rodrigues, proprietário da Fábrica de Descasque de Arroz, a “Hidro-Eléctrica” de Estarreja, tem a honra de apresentar a sua Excelência, o Ministro da Economia. Estarreja, 1949. Documento gentilmente cedido pelo senhor José Carlos Antão da Costa Marques. 16 - Idem. 17 - Projecto da linha de transporte de energia eléctrica para a Fábrica de Moagem do senhor Carlos Marques Rodrigues na Vila de Estarreja, [sem data]. Documento gentilmente cedido pelo senhor José Carlos Antão da Costa Marques.

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do proprietário Senhor Carlos Marques Rodrigues a 250 m da fábrica é iluminada com a mesma energia pelo que se instala um ramal em baixa tensão (250 volts) partindo da fábrica e seguindo a rua indicada na planta.”18 Dois anos após a implementação destes projetos, em 1936, é admitido na Fábrica de Descasque de Arroz um trabalhador com a profissão de turbineiro. Ângelo de Azevedo Saramago, “casado, natural de Beduído e nascido em 25 de novembro de 1923”19 foi o homem que durante décadas trabalhou na central de energia elétrica.

3 - Ampliação da instalação elétrica na Fábrica de Descasque de Arroz, 1934.20

18 - Idem. 19 - Livro de Pessoal da Fábrica de Descasque de Arroz. Fundo documental da Fábrica de Descasque de Arroz. Arquivo Municipal de Estarreja. 20 - Projeto sobre a ampliação da central elétrica no lugar da Quinta da Costa, 1934. Documento gentilmente cedido pelo senhor José Carlos Antão da Costa Marques.

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JULIANA CUNHA

4- PT da Fรกbrica de Descasque de Arroz, 1934.21

21 - Idem.

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5 - Projeto da linha de transporte de energia elétrica. 22

22 - Projeto da linha de transporte de energia elétrica para a Fábrica de moagem do senhor Carlos Marques Rodrigues, na Vila de Estarreja, [sem data]. Documento gentilmente cedido pelo senhor José Carlos Antão da Costa Marques

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JULIANA CUNHA

6 - Projeto da linha de transporte de energia elĂŠtrica. 23

23 - Idem.

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7 - Projeto da linha de transporte de energia elétrica. 24

24 - Ibidem.

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JULIANA CUNHA

8 - Projeto da linha de transporte de energia elĂŠtrica. 25

25 - Ibidem.

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9- Projeto da linha de transporte de energia elétrica. 26

26 - Ibidem.

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JULIANA CUNHA

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10 – Planta do projeto da linha de transporte de energia elétrica.27 27 - Ibidem.

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JULIANA CUNHA

11 - Trecho da barragem e da casa da central de energia elétrica, 1949.28

12 - Central - vista interior, 1949.29 28 - Fotografia gentilmente cedida pelo senhor José Carlos Antão da Costa Marques. 29 - Idem.

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13 – Casa da central de energia elétrica, 1956.30

Fontes de Informação ARQUIVO MUNICIPAL DE ESTARREJA Fundo documental Fábrica de Descasque de Arroz. ARQUIVO PESSOAL DE FAMÍLA Documentos e fotografias cedidos por José Carlos Antão da Costa Marques (1954-2018) e Anabela Amorim. CUNHA, Diana; SILVA, Susana Themudo – A chegada da energia elétrica ao concelho de Estarreja: 1925-1930: breves apontamentos históricos. In: Terras de Antuã – Histórias e Memórias do Concelho de Estarreja, Vol. 3, Ano 3, p. 79-98.

30 - Fotografia gentilmente cedida pela prof. Anabela Amorim.

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LUÍS CARDOSO MENEZES

ESTARREJENSES ILUSTRES: O 1º MARQUÊS DE TERENA, SEBASTIÃO CORREA DE SÁ (1766-1849) Luís Miguel Pulido Cardoso Menezes*

INTRODUÇÃO Foi Sebastião Correia de Sá (1766-1849), 1º Marquês de Terena, uma das mais ilustres personalidades natural do concelho de Estarreja. Nascido em S. Martinho de Salreu, Aveiro em 20-2-1766 de famílias aristocratas, rapidamente inicia a sua carreira política e parlamentar, sendo eleito Deputado pela província do Minho às Cortes Cartistas, entre 18261828, nomeado Par do Reino por carta de 1-9-1834 e tomando posse do mesmo a 9-3-1836 e eleito Senador por Lamego entre 1838 e 1842. Contudo, foi como Governador Civil do Porto de 25-7-1835 a 15-7-1836 e Reitor da Universidade de Coimbra de 10-12-1840 a 1-7-1848, que se projectou quer a nível da administração central, quer a nível universitário nacional. Acumula com estes importantes cargos o de Prefeito de Província do Douro (1835), e de Chanceler da Relação e de Governador das Justiças no Porto (em 1789).

Sebastião Correia de Sá (1766-1849), 1º Marquês de Terena

* Mestre em Ciência Política e Relações Internacionais pela Faculdade de Ciências Sociais e Humanas da Universidade Nova de Lisboa (2005), Licenciatura em História pela Universidade Autónoma de Lisboa “Luís de Camões” (1990), Curso de Especialização em Ciências Documentais, na opção de Documentação e Biblioteca pela Faculdade de Letras da Universidade de Lisboa (1998-2000), bibliotecário e documentalista do sector audiovisual.

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SEBASTIÃO CORREA DE SÁ, 1º Marquês de Terena (decreto de 1-7-1848), 1º Conde de Terena (decreto de 28-9-1835) e 1º Visconde de S. Gil Perre em duas vidas (decreto de 30-101824), Deputado às Cortes cartistas pela província do Minho (1826-1828), com aprovação do diploma e juramento a 20-11-1826, Senador por Lamego (1838 e entre 1840-1842), Par do Reino (a 3-5-1842), Reitor da Universidade de Coimbra (de 10-12-1840 a 1-7-1848), Desembargador dos Agravos da Casa da Suplicação, Membro do Conselho de Sua Majestade, Chanceler doTribunal da Relação e Governador das Justiças da cidade do Porto (1789), Desembargador dos Agravos da Casa da Suplicação, Grã-Cruz da Ordem de Cristo, Senhor do Morgado de Casal Soeiro, do casal de Agrela e do Morgado da Rua Escura no Porto, Senhor de Paredes (em 8-3-1800), etc.1 Nasceu em S. Martinho de Salreu, Aveiro a 20-2-1766, e morreu no Porto a 4-71849, sendo filho de Gonçalo Pereira da Silva Pacheco de Sousa de Menezes Osório de Melo Noronha e Lima, Brigadeiro do Exército, Fidalgo da Casa Real, Senhor da Vila de Bertiandos, e dos morgados de Bertiandos, Pentielos, donatário do Couto de Francemil, Cavaleiro da Ordem de Cristo e de D. Inês Luísa de Lancastre César. Casou a 3-8-1791 com Francisca Jácome do Lago Bezerra, Dama Honorária da Rainha, filha e herdeira de Baltasar Jácome do Lago Bezerra, Senhor do Couto de Paredes e das Casas de S. Gil Perre e da Torre do Paço, ambas na comarca e concelho de Viana do Castelo e de D. Ângela Moscoso Baena Omazur y Angulo. Deste enlace foi herdeira D. Maria Emília Jácome Correa de Sá, 2ª Condessa de Terena e 2ªViscondessa de S. Gil Perre (decretos de 15-10-1839), extensíveis a seu marido, que nasceu em Bertiandos, Ponte de Lima a 28-11-1793 e morreu na Lapa, Lisboa a 6-8-1856, que casou a 2-2-1814 com José Maria Brandão de Mello Cogominho Correia Pereira de Lacerda, 2º Conde de Terena e 2º Visconde de S. Gil Perre (decretos de 15-10-1839), Par do Reino (por carta regia de 3-5-1842 e posse de 2-8-1842), Coronel de Milícias da Maia, Governador Civil do Porto (1835-1836, 1842-1846, 1846-1847), Senador (de 3-7-1840 a 102-1842), que nasceu no Porto a 15-9-1793 e morreu no Socorro, Lisboa a 20-6-1859, filho de Luís Brandão de Mello Pereira de Lacerda, Fidalgo da Casa Real, Familiar do Santo Ofício e de D. Antónia de Portugal e Menezes, com geração em Condes e Marqueses de Terena.2 Em 1789, foi Chanceler doTribunal da Relação e Governador das Justiças da cidade do Porto.3 Inicia a sua carreira política e parlamentar a integrar as Cortes Cartistas (1826-1828), sendo eleito deputado pela província do Minho. Depois do triunfo liberal foi elevado a Par do Reino por carta de 1-9-1834, tomando posse do mesmo a 9-3-1836. Simultaneamente, foi nomeado Governador Civil do Porto,

1 - cf. Afonso Zuquete - Nobreza de Portugal, vol. III, Lisboa: Editorial Enciclopédia, 1960- , pp. 432-433 e Domingos de Araújo Afonso - Livro de Ouro da Nobreza, vol. III, Braga: Pax, 1932-1934, p. 412. 2 - cf. Fernando de Castro da Silva Canedo - Descendência Portuguesa de El Rei D. João II, vol. II, Lisboa: Edições Gama Limitada, 1993, pp. 319-320. 3 - cf. Anselmo Braamcamp Freire - Brasões da Sala de Sintra, 2ª edição, vol. II, Coimbra: Impr. da Universidade, 1921-30, p. 182.

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LUÍS CARDOSO MENEZES

desempenhando esse cargo de 25-7-1835 a 15-7-1836, acumulando em 1835, com o cargo de Prefeito de Província do Douro.

Armas dos Marqueses de Terena

Foi o primeiro Governador Civil do Porto (1835-1836) e pela correspondência expedida, nota-se uma situação social e política instável na cidade, nomeadamente: a realização de reuniões de pessoas suspeitas, com fins sinistros, assassínios, fugas de prisão, prisão de malfeitores, ataques de salteadores, arrombamento de cadeias, detecção de quadrilhas de ladrões, espancamento de guardas, prisão do célebre miguelista abade de Priscos; foi encarregue tal como os restantes governadores civis por portaria de 4-9-1835, de tomar posse por parte da Fazenda, de todos os bens da Coroa, em situação ilegítima, mal alienados, doados por D. Miguel I, possuídos sem título legítimo, para além de todos os bens doados pela Coroa, mas que os donatários se tivessem tornado indignos; foi-lhe confiada a função de arrecadação de todos os foros laudémios, lutuosas e censos pertencentes à Fazenda; pelo decreto de 9-10-1835, foi encarregue de assegurar o cumprimento das providências preliminares dos actos eleitorais; por portaria de 26-10-1935, foi-lhe requerido o preenchimento dos modelos estatísticos de avaliação das existências ao nível da agricultura; a 28-10-1835, foi-lhe solicitado o máximo de informação e o envio dos mapas gerais da Guarda nacional do respectivo distrito, com indicação de exclusão das pessoas dasafectas «ao regime constitucional e à legitimidade de rainha»; por resolução régia de 3-9-1835, informa o seu colega de Coimbra da existência duma pequena propriedade a Casa da Renda em Roriz, S.to Tirso, pertencente à universidade de Coimbra que podia ser arrendada; foi-lhe remetido durante a sua administração, a relação das famílias deste distrito, que foram vitimas das usurpações das comarcas da Figueira da Foz e de Estarreja.4 Durante a vigência da Constituição de 1838, foi eleito Senador por Lamego em 12-81838 e em 22-3-1840, exercendo funções legislativas em 1839 e de 27-6-1840 a 10-2-1842.5 4 - cf. Francisco Barbosa da Costa - História do Governo Civil do Distrito do Porto, Porto: Governo Civil do Distrito do Porto, 2004, pp. 40-41. 5 - cf. Maria Filomena Mónica, dir.; Pedro Tavares de Almeida, colab. [et al.]; Carlos Silva, rev. - Dicionário biográfico parlamentar: 1834-1910, vol. III, Lisboa: Assembleia da República: Imprensa de Ciências Sociais, 2004-2006, pp. 521-522 e Zília Osório de Castro, dir.; coord. Isabel Cluny, Sara Marques Pereira - Dicionário do vintismo e do primeiro cartismo

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Por decreto do governo de Costa Cabral de 10-12-1840, foi nomeado reitor da Universidade de Coimbra, sem poderes reformadores, prestando juramento e posse a 16-1-1841, tendo presidido ao acto Agostinho José Pinto de Almeida, lente de Matemática, recebendo-o por procuração régia de 12 de Janeiro, desse ano. Desempenhou este cargo de 1841 a 1848, sendo o primeiro Cancelário a governar a Academia, não sendo um académico, nem formado da mesma universidade. Encontrou a Universidade de Coimbra muito desorganizada, devido às constantes perturbações que ocorriam no País, dedicando com afinco à reorganização desta instituição.6 Contudo, não conseguiu evitar a suspensão dos trabalhos escolares por carta da Rainha D. Maria II de 7-5-1844 (devido a um motim entre estudantes e populares, que levou à prisão de 26 estudantes em 8-3-1844) e por portaria de 16-10-1846. Neste último ano, o edifício da Universidade esteve na sua maior parte ocupado militarmente.7 Foi no seu reitorado (1840-1848), que se tomou iniciativa de recomeçar a publicar as Efemérides Astronómicas, que tinham sido interrompidas em 1828; em 1841 deram-se novos motins de estudantes, que chegaram a insultar o Administrador-geral do Concelho; em 1842, deu-se a transferência da Misericórdia de Coimbra para o Colégio da Sapiência; no mesmo ano (1842), foi autorizado a adiar os actos universitários, se tal fosse necessário para restaurar a ordem pública, expulsando da universidade os estudantes «conhecidos por turbulentos e díscolos, e os que directa ou indirectamente tomarem parte em tumultos, arruídos e assuadas, ou por qualquer modo atentarem contra o sossego e tranquilidade pública, ou cometerem actos de insubordinação ou desobediência às leis, aos seus prelados, às autoridades ou aos lentes e professores (…)», recorrer às autoridades civis para a repressão de distúrbios para o que seria estacionada em Coimbra «a força militar que for necessária para coadjuvar as diligências da polícia (…)»; visto que os distúrbios de estudantes continuavam na cidade de Coimbra, foi ordenado que os motins fossem rapidamente reprimidos por portaria de 22-3-1843; teve de reportar mensalmente o comportamento moral e literário dos estudantes ultramarinos por portaria de 27-9-1843; por decreto de 29-9-1844, foi estabelecido em Coimbra o Conselho Superior de Instrução Pública, cujo regulamento foi publicado a 10 de Novembro; em 1845, iniciou-se em Coimbra a publicação da Revista Académica, tendo o último número saído em 1848 e reaparecido em 1853; por proposta do Conde de Terena e decreto de 15-4-1845, foi restabelecido o culto na Capela da Universidade, estabelecendo-se o regulamento da Real Capela por portaria de 27-6-1845; a 1-12-1845 era regulada a habilitação dos candidatos ao ministério universitário; por carta régia de 30-4-1846, foi ordenado o alistamento dos funcionários da Universidade de Coimbra, no batalhão dos empregados públicos da cidade de Coimbra; em 9-4-1848, a academia conimbricense, saudou a vitória republicana em França e em 13-5-, publicou-se em Coimbra um protesto, assinado por diversos professores de todas as faculdades, contra as violências infligidas contra a Santa Sé, devido à conquista de parte dos Estados Pontifícios.8

(1821-1823 e 1826-1828), vol. II, Lisboa, Assembleia da República: Edições Afrontamento, 2002, pp. 571-572. 6 - cf. Manuel Augusto Rodrigues - A Universidade de Coimbra e os seus reitores: para uma história da instituição, Coimbra: Arquivo da Universidade, 1990, p. 207. 7 - cf. Francisco Morais - Reitores da Universidade de Coimbra, [s.l.: s.n.], 1951 (Coimbra: -- Impr. de Coimbra), pp. 65-66. 8 - cf. Manuel Augusto Rodrigues, op. cit., pp. 208-212.

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LUÍS CARDOSO MENEZES

Com a Revolução da Maria da Fonte em 1846, pediu a sua demissão do cargo de Reitor da Universidade de Coimbra a 6-7-1846, sendo-lhe concedida exoneração do cargo apenas a 1-7-1848, altura em que foi nomeado vice-presidente do Conselho de Instrução Pública. Por decreto de 22-3-1847, foi nomeado vice-reitor António Ribeiro Luís Teixeira, lente da Faculdade de Direito para substituir Sebastião Correia e Sá, ocupando seguidamente o cargo de reitor José Machado Abreu a partir de 9-4-1849.

Palácio dos Terenas no Porto

Residia na capital nortenha no Palácio dosTerenas, importante casa senhorial setecentista da cidade do Porto, edificado no século XVIII, sendo um dos edifícios mais importantes desta cidade. Em 1919, este imóvel foi adquirido pela Diocese do Porto, que aí instalou o seu Paço Episcopal na sequência das nacionalizações que se seguiram à implantação da República e que causaram o seu desalojamento do morro da Sé. O palácio sofreu várias obras de restauro entre 1999-2000, removendo-se um revestimento em azulejo colocado nos anos 30.

Sebastião Correia de Sá (1766-1849), 1º Marquês de Terena

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Faleceu na cidade do Porto a 4-6-1849, sendo sepultado na igreja de S. Francisco, donde seria trasladado para jazigo particular da sua quinta de Geraz do Lima, junto a Viana do Castelo.

BIBLIOGRAFIA -AFONSO, Domingos de Araújo - Livro de Ouro da Nobreza, vol. III, Braga: Pax, 1932-1934 -CANEDO, Fernando de Castro da Silva - Descendência Portuguesa de El Rei D. João II, vol. II, Lisboa: Edições Gama Limitada, 1993 -CASTRO, Zília Osório de, dir.; Isabel Cluny, Sara Marques Pereira, coord. - Dicionário do vintismo e do primeiro cartismo (1821-1823 e 1826-1828), vol. II, Lisboa, Assembleia da República: Edições Afrontamento, 2002 -COSTA, Francisco Barbosa da - História do Governo Civil do Distrito do Porto, Porto: Governo Civil do Distrito do Porto, 2004 -FREIRE, Anselmo Braamcamp - Brasões da Sala de Sintra, 2ª edição, vol. II, Coimbra: Impr. da Universidade, 1921-30 -MÓNICA, Maria Filomena, dir.; Pedro Tavares de Almeida, colab. [et al.]; Carlos Silva, rev. - Dicionário biográfico parlamentar: 1834-1910, vol. III, Lisboa: Assembleia da República: Imprensa de Ciências Sociais, 2004-2006 -MORAIS, Francisco - Reitores da Universidade de Coimbra, [s.l.: s.n.], 1951 (Coimbra: -- Impr. de Coimbra) -RODRIGUES, Manuel Augusto - A Universidade de Coimbra e os seus reitores: para uma história da instituição, Coimbra: Arquivo da Universidade, 1990 -ZUQUETE, Afonso - Nobreza de Portugal, vol. III, Lisboa: Editorial Enciclopédia, 1960-

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MARCO PEREIRA

MILITARES DOS CONCELHOS DE ESTARREJA E MURTOSA MORTOS EM ÁFRICA (1961-1974) Marco Pereira*

Entre 1961 e 1974/1975 decorreu a chamada Guerra Colonial, Guerra do Ultramar ou Guerra de África, em Angola, Moçambique e Guiné Portuguesa, na qual muitos jovens portugueses vieram a participar. Como a maioria dos militares prestando serviço militar eram rapazes, e passam agora cerca de 45 anos do fim do conflito, estão ainda vivos grande parte dos combatentes. Para quem estava em idade de prestar o serviço militar, se não emigrasse ou seguisse para a pesca do bacalhau, era quase certo ir à Guerra de África. Foi esta a guerra da qual mais ouvi falar, por motivos de proximidade temporal, em diversos contextos e várias vezes na primeira pessoa. Todos conhecem os relatos sobre a grande camaradagem e amizade gerada entre os combatentes, que ficaram para a vida, com emocionados reencontros anuais de grupos que hoje persistem. Há igualmente, pelo lado negativo, episódios que por vezes, mais em privado, se contam, alguns dos quais prefiro não lembrar. Nada disto é novidade e é pouco, muito pouco, o que poderei dizer sobre a Guerra Colonial. São aqueles que nela participaram e os que a estudaram profundamente que melhor habilitados estão para dissertar sobre o assunto1, que não deixa de ser algo incómodo por haver ainda bastantes feridas vivas. Feridas essas que de modo nenhum se pretende aqui avivar. Com profundo respeito por todos os que participaram no conflito e sem quaisquer juízos de valor, aquilo que ora se apresenta é apenas uma lista dos combatentes que perderam a vida na Guerra, sendo naturais dos concelhos de Estarreja e Murtosa. Possui a Liga dos Combatentes informação pormenorizada de todos os mortos na Guerra Colonial. Utilizando os dados por esta facultados, o jornal “Correio da Manhã” publicou em 2007, em sucessivas edições, os nomes dos mortos portugueses na Guerra, sem mais elementos identificativos. Recorrendo à Liga dos Combatentes obtive uma lista circunstanciada de 24 mortos, 13 do concelho de Estarreja e 11 do concelho da Murtosa, que são todos os naturais destes dois concelhos que sei terem morrido no conflito em causa. A informação disponibilizada inclui, para além do nome da cada combatente morto, a Colónia portuguesa onde morreu, o posto, ramo das forças armadas, unidade operacional, unidade mobilizadora, lugar/freguesia/concelho de naturalidade, data de falecimento e

* Advogado, com escritório em Estarreja. 1 - O Jornal de Estarreja, n.º 4406, 9.11.2007, p. 5 – notícia da publicação de um livro de autor estarrejense sobre a Guerra Colonial.

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causa da morte. Como na imprensa local foram sendo publicadas algumas notícias sobre as mortes de militares, incluem-se as respectivas referências bibliográficas. Não se transcreve nem desenvolve informação dessas notícias, não as havendo de todos os mortos, desta forma procurando evitar ferir os sentimentos dos familiares dos militares noticiados e não noticiados. N.º Nome

Colónia

Posto

Ramo

Unidade Operacional

Alferes

EXÉRCITO

ECav 2

1

António Adão Monteiro MOÇAMBIQUE Rodrigues

2

António Afonso da Silva Vigário

ANGOLA

Capitão de Infantaria

EXÉRCITO

Companhia de Caçadores N.º 546 / Batalhão de Caçadores N.º 547

3

António da Costa e Silva

ANGOLA

Soldado

EXÉRCITO

Companhia de Comando e Serviços/Batalhão de Artilharia N.º 2883

4

António da Silva Henriques

ANGOLA

Soldado

EXÉRCITO

Companhia de Caçadores N.º 140/ Batalhão de Caçadores N.º 185

5

António de Sousa Pinto

ANGOLA

Soldado

EXÉRCITO

Companhia de Caçadores n.º 3372

6

António Maria da Silva

GUINÉ

Soldado

EXÉRCITO

Pelotão de Artilharia Aérea N.º 2141

7

Augusto Silva Fernandes

MOÇAMBIQUE

Soldado

EXÉRCITO

CArt 1627

8

Belarmino Oliveira Dias

ANGOLA

Soldado

EXÉRCITO

Batalhão de Intendência de Angola/ RMA - Grafanil

9

Bernardino Figueiredo Marques

GUINÉ

Soldado

EXÉRCITO

Companhia de Caçadores N.º 2367

10

Carlos Alberto Amador MOÇAMBIQUE Santos

Soldado

EXÉRCITO

21.ª. CCmds

11

Carlos Alberto Fragoso e Pinho

ANGOLA

Furriel Miliciano Comando

EXÉRCITO

Companhia de Instrução/Centro de Instrução de Comandos Luanda

12

Eduardo Almeida e Sousa

ANGOLA

Soldado

EXÉRCITO

Companhia de Caçadores N.º 1628 / Batalhão de Caçadores N.º 1898

13

Evangelino Pereira da Cunha

MOÇAMBIQUE

Soldado

EXÉRCITO

CCaç 2794

14

Fernando Simões da Fonseca de Pinho

MOÇAMBIQUE

Tenente

FAP

GUINÉ

Soldado

EXÉRCITO

Companhia de Caçadores N.º 526

ANGOLA

Soldado

EXÉRCITO

Companhia de Artilharia N.º 751 / Batalhão de Artilharia N.º 753

GUINÉ

Soldado

EXÉRCITO

1.ª Companhia de Artilharia do Batalhão de Artilharia N.º 6520

15 Guilherme Nunes 16

Hernani Domingues de Sá

17 João Oliveira da Silva

AB 5

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18 João Vaz dos Santos

MOÇAMBIQUE

1.º Cabo

EXÉRCITO

CCav 2415

19 José de Oliveira Pita

MOÇAMBIQUE

1.º Cabo

EXÉRCITO

CCav2398/BCav2850

20

José Luciano Tavares Diogo

MOÇAMBIQUE

Soldado

EXÉRCITO

CCaç 2449

21

José Maria Pereira Gomes

MOÇAMBIQUE

1.º Cabo

EXÉRCITO

CCaç2304/BCaç2831

22 Lázaro da Costa Tavares

ANGOLA

Soldado

EXÉRCITO

Companhia de Caçadores N.º 501 / Batalhão de Caçadores N.º 503

Manuel Maria Paiva da Silva

ANGOLA

Soldado

EXÉRCITO

Companhia de Artilharia N.º 1658

MOÇAMBIQUE

1.º Cabo

EXÉRCITO

10.ª. CCmds

23

24 Reinaldo Alves Portela Fonte: Liga dos Combatentes

N.º Unidade Mobilizadora

Concelho, Freguesia, Lugar

Data de Falecimento

Causas da Morte

1

RC 8

Estarreja, Salreu, Mato

18/07/1970

Combate

2

Regimento de Infantaria Nº 1 AMADORA

Estarreja, Pardilhó, Curval

21/07/1964

Combate

3

Grupo de Artilharia Contra Aeronaves Nº 2 - TORRES NOVAS

Estarreja, Avanca

07/08/1971

Acidente

4

Regimento de Infantaria Nº 10 AVEIRO

Estarreja, Fermelã

09/12/1961

Combate

5

Regimento de Infantaria nº 16 ÉVORA

Murtosa, Murtosa

01/08/1972

Combate

6

Regimento de Artilharia Anti - Aérea Fixa - QUELUZ

Murtosa, Bunheiro, Outeiro

06/01/1971

Doença

7

RAC

Estarreja, Veiros, Olas

22/01/1968

Combate

8

2º Grupo de Companhias de Administração Miliar - LISBOA

Estarreja, Salreu, Casal

04/01/1970

Doença

9

Batalhão de Caçadores Nº 10 CHAVES

Estarreja, Salreu

20/03/1969

Combate

Estarreja, Avanca, Fontela

23/11/1969

Combate

10 CICmds 11

Centro de Instrução de Operações Especiais - LAMEGO

Estarreja, Pardilhó, Canedo

31/01/1973

Acidente

12

Regimento de Infantaria Nº 1 AMADORA

Murtosa, Torreira

27/09/1968

Acidente

Murtosa, Torreira, Quintas do Norte

09/05/1971

Combate

13 BC 10

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14 BA 3

Murtosa, Monte

15 Regimento de Infantaria Nº 7 - LEIRIA Murtosa, Bunheiro 16

Regimento de Artilharia Pesada Nº 2 VILA NOVA DE GAIA

17

Regimento de Artilharia Ligeira Nº 5 Estarreja, Beduído PENAFIEL

Estarreja, Fermelã, Roxico

16/05/1964

Acidente

27/09/1963

Acidente

25/04/1966

Acidente

15/06/1974

Acidente

18 RC 7

Murtosa, Bunheiro, São Simão

06/11/1969

Combate

19 RC 3

Murtosa, Murtosa

13/09/1968

Combate

20 BC 10

Estarreja, Pardilhó, Teixugueiras

14/12/1968

Combate

21 RI 1

Murtosa, Torreira

05/02/1969

Combate

22

Regimento de Infantaria Nº 2 ABRANTES

Murtosa, Bunheiro, Formiga

31/07/1965

Acidente

23

Regimento de Artilharia Ligeira Nº 1 - LISBOA

Murtosa, Murtosa

06/08/1968

Combate

Estarreja, Avanca

10/11/1969

Combate

24 RAL 1

Notícias relacionadas com o falecimento de militares na imprensa local: 1 – António Adão Monteiro Rodrigues, morto na Operação Nó Górdio, Moçambique? 2 - O Concelho de Estarreja, n.º 3182, 1.8.1964, p. 6 (Capitão António Afonso da Silva Vigário, natural de Pardilhó, morto em Angola); O Concelho de Estarreja, n.º 3228, 10.7.1965, p. 3 (condecorado postumamente o Capitão António Vigário); O Jornal de Estarreja, n.º 3171, 25.8.1964, p. 3 (Capitão António Afonso da Silva Vigário, morto em Angola). 6 - O Concelho da Murtosa, n.º 1688, 30.1.1971, p. 5 (António Maria Valente da Silva, da Murtosa, morto de doença na Guiné); O Concelho da Murtosa, n.º 1691, 15.3.1971, p. 7 (António Maria Valente da Silva, da Murtosa, funeral do militar). 11 - Boletim Paroquial Pardilhó, Ano 5, n.º 77, Fevereiro de 1973, p. 3 (Carlos Alberto Fragoso e Pinho, de Pardilhó, morto em Angola). 15 - O Concelho da Murtosa, n.º 1699, 15.7.1971, p. 5 (Guilherme Nunes, do Bunheiro, morto na Guiné). 18 - O Concelho da Murtosa, n.º 1672, 30.4.1970, p. 2 (João Vaz dos Santos, do Bunheiro, funeral do militar morto em combate em Moçambique). [ 191 ]


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Outras notícias relacionadas com a Guerra Colonial na imprensa local: Murtosa Jornal Paroquial, Julho/1965 (referidos nomes de militares da Murtosa no Ultramar) O Concelho da Murtosa, n.º 1760, 15.11.1974, p. 5 (homenagem aos mortos do concelho da Murtosa na Guerra Colonial) O Concelho da Murtosa, n.º 2110, 28.8.2006, p. 12 (bunheirenses falecidos no ultramar) O Jornal de Estarreja, n.º 3312, 10.7.1970, p. 1 (condecorados no dia 10 de Junho dois militares estarrejenses, Major Artur Baptista Beirão, activo em Moçambique, e Furriel Miliciano José Luís Rodrigues da Silva, activo em Angola). O Concelho de Estarreja, n.º 3459, 13.6.1970, p. 1 (condecorado o Major Artur Baptista Beirão).

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ESTARREJA NA GRANDE GUERRA MILITARES FALECIDOS NA FRENTE OCIDENTAL (1917-1918) António Cruz Leandro1 Maria Clara de PaivaVide Marques2 Teresa Cruz Tubby3

Desceram sucessivamente à terra de França os corpos desses soldados de Portugal. André Brun, A Malta das Trincheiras: Migalhas da Grande Guerra.

PREÂMBULO Comemora-se no presente ano o centenário do Tratado de Versalhes (28 de Junho de 1919), que pôs termo oficial à Primeira Guerra Mundial. Grande Guerra, como ficou conhecida, foi um conflito sangrento, de duração e dimensões devastadoras e apocalípticas, que se transformou no maior drama da História da Humanidade até aí vivenciado. Foi uma guerra total, que provocou a morte de 10 milhões de seres humanos e traumatizou um número ainda maior. Este artigo pretende rememorar os militares que partiram do então concelho de Estarreja4, para combater na Grande Guerra na Frente Ocidental, o mais difícil teatro de operações, aí tendo perecido. A GRANDE GUERRA Apesar de consistir um acto isolado, o assassinato em Sarajevo do Arquiduque Francisco Fernando, herdeiro do Império Austro-Húngaro, em 28 de Junho de 1914, levou à declaração de guerra do Império Austro-Húngaro à Sérvia, em 28 de Julho, desencadeando uma série de reacções, que reacenderam os nacionalismos e os grandes jogos de poderes entre os Estados europeus, mergulhando o “Velho Continente” numa guerra geral, que envolveu todas as grandes potências. O sistema de alianças e tratados que ligavam vários países e dividia a Europa – A Tripla Aliança que agregava a Alemanha, o Império Austro-Húngaro e 1 - Professor e historiador 2 - Museóloga e historiadora 3 - Investigadora e historiadora 4 - Na altura o agora concelho da Murtosa integrava o município de Estarreja, razão pela qual incluímos neste artigo os militares naturais de ambos.

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o Império Otomano e a Tripla Entende, popularmente conhecida por Aliados, liderada pela Grã-Bretanha, França e Rússia – foi activado, dando lugar a uma sucessão de declarações de guerra durante o mês de Agosto. O conflito surpreendeu pela duração, pela dimensão e pela violência, com novos equipamentos bélicos e novas formas de luta, onde o poder do fogo praticamente imobilizou os exércitos5. Quatro anos depois, a 11 de Novembro de 1918, a Grande Guerra terminava com a assinatura do Armistício. Com o fim do conflito armado iniciaram-se, em Janeiro de 1919, as conversações de paz – onde o estarrejense Egas Moniz participou, como primeiro líder da Delegação portuguesa nas reuniões, em Paris – que culminaram com a assinatura do Tratado de Versalhes. PORTUGAL NA GRANDE GUERRA De início neutral, embora combatendo os alemães em África, Portugal entrou oficialmente no conflito em 1916, após a declaração de guerra da Alemanha a Portugal, em 9 de Março, na sequência da apreensão, em 23 de Fevereiro, dos navios alemães que estavam ancorados no Tejo.

O arrear da bandeira alemã e o hastear da bandeira portuguesa Ilustração Portuguesa, n.º 524 de 6 de Março de 1916

A entrada na guerra não foi uma decisão consensual, mas controversa e polémica, que dividiu os políticos e o país, entre os designados intervencionistas ou guerristas e os antiintervencionistas ou antiguerristas. A decisão assentou em três grandes princípios: garantir a manutenção das colónias africanas; garantir o reconhecimento e afirmação da “jovem República” no cenário internacional, ao mesmo tempo que se reforçava a aliança com os Ingleses, afastando o perigo de uma anexação à Espanha, cada vez mais próxima da Inglaterra e a necessidade de defesa, consolidação e legitimação do regime republicano internamente 5 - John Keegan, A Primeira Guerra Mundial, Porto: Porto Editora, 2014, pp. 13 e 14.

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e deve ser interpretada como parte integrante do plano do líder do Partido Democrático, Afonso Costa, para quem a intervenção portuguesa na Europa serviria para consolidar a República internamente e reforçar o peso dos democratas no país6. Tal desiderato levou o governo de Afonso Costa a forçar essa entrada, por todos os meios, incluindo “uma enorme mentira”. O discurso oficial dizia que era a Inglaterra que pretendia essa beligerância, quando na realidade era precisamente o contrário. A pressão portuguesa acabou por conseguir forçar a entrada no conflito, mas com o apoio francês7. NOS CAMPOS DE GUERRA DA FLANDRES Com a entrada na beligerância, começaram os preparativos para o estado de guerra. Superando grandes dificuldades, uma força foi treinada e equipada no polígono de Tancos, em apenas três meses, um esforço preparatório que ficou conhecido como “milagre de Tancos”. Porém, a realidade foi diferente e além da dificuldade pela escassez de transporte, armamento e solípedes, o treino dado às tropas revelou-se desadequado para a guerra de trincheiras que iriam enfrenar. Entre 1917 e 1918, Portugal mobilizou mais de 55.000 homens para a Flandres, que integraram o Corpo Expedicionário Português (CEP), que seria subordinado à BEF (British Expeditionary Force) e o Corpo de Artilharia Pesada (CAPI), sob o comando operacional da França. O primeiro contingente militar do CEP partiu de Lisboa rumo a Brest, na Bretanha, em Janeiro de 1917. Desta cidade portuária, as tropas eram transportadas por via-férrea, até à zona de concentração do CEP, Aire-Sur-La Lys, na Flandres, e, à medida que iam chegando, recebiam instrução, ministrada pelos Britânicos, específica e adaptada à situação que iriam encontrar no front: a guerra de trincheiras, de características estáticas, onde os homens se enfrentavam, praticamente, sem se movimentarem, atolados em lama. O designado “sector português” localizava-se no sul da Flandres, no vale do rio Lys, entre Armentière e La Bassée e de Merville a Béthune, e a sua frente variou de dimensão, conforme o evoluir da campanha e abrangeu, essencialmente, os subsectores de: Fauquissart (norte); Neuve Chapelle/Chapgny (centro) e Ferme du Bois (sul). O sistema geral defensivo, já delimitado anteriormente pelos aliados, era dividido em três grandes zonas, com várias linhas escalonadas em profundidade e agrupadas, situadas 6 - Nuno Severiano Teixeira, Portugal e a Grande Guerra, in Manuel Themudo Barata e Nuno Severiano Teixeira (dir.), Nova História Militar de Portugal, Rio de Mouro, Círculo de Leitores e Autores; vol. 4, 2004, pp. 17-22; Nuno Severiano Teixeira, Portugal na “Grande Guerra” 1914-1918: as razões da entrada e os problemas da conduta, in Nuno Severiano Teixeira (coord.), Portugal e a Guerra. História das intervenções militares portuguesas nos grandes conflitos mundiais (séculos XIX e XX), Lisboa, Edições Colibri/ Instituto de História Contemporânea da Faculdade de Ciências Sociais e Humanas, 1998, pp. 56-62. 7 - António José Telo e Pedro Marquês de Sousa, O CEP – Os Militares Sacrificados Pela Má Política, Porto: Fronteira dos Caos, 2016, p. 478.

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atrás da chamada Terra de Ninguém, uma faixa de terreno que separava as trincheiras dum e de outro lado do conflito. A primeira zona era constituída por três linhas: a linha avançada ou linha A, a linha de apoio ou linha B e a linha de reserva ou linha C. A linha A, encostada à Terra de Ninguém, era composta por uma trincheira contínua de vigilância e combate, e protegida na frente por um sistema de arame farpado e vários postos de guarnição mista, com metralhadoras ligeiras e granadeiros. A linha B, também, uma trincheira contínua e protegida por arame farpado, estava flanqueada por metralhadoras pesadas e morteiros, e era ocupada pelas tropas de reforço. Era a linha de resistência. A linha C era definida por uma linha de trincheiras descontínuas, com vários redutos defensivos. Era nesta linha que estavam os depósitos de munições, de víveres e água, onde se reuniam as forças de apoio imediato das linhas da frente.As comunicações entre as três linhas eram estabelecidas por trincheiras de ligação construídas em ziguezague ou descontínuas. A segunda zona de defesa era formada por duas linhas: a linha das Aldeias ou linha intermédia e a linha do Corpo. A linha das Aldeias era constituída por algumas ruínas de aldeias ou de quintas, preparadas defensivamente com fortificações para morteiros e metralhadoras. A linha do Corpo dispunha de grandes obras de fortificação de campanha organizadas em grupos e ligadas por redes de arame que cobriam as principais vias de comunicação com ligação à retaguarda. A terceira zona, a Zona de Retaguarda, era constituída pela linha do Canal e possuía também várias fortificações e postos de defesa avançados, que defendiam as estradas e nós principais de comunicação.8.

Os Portugueses nas trincheiras Imperial War Museum, Collections online (https://www.iwm.org.uk/collections) © IWM Q 60284

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Trincheiras do sector português Imperial War Museum, Collections online (https://www.iwm.org.uk/collections) © IWM Q 60287

Nas trincheiras as condições de vida eram difíceis e penosas. Espaço contido e sufocante, era local de vivência comum, onde às condições ambientais, com neves de inverno e chuvas de primavera, se juntavam as penosas condições do dia-a-dia: rações frias, botas e uniformes molhados, trincheiras inundadas e enlameadas, alojamentos danificados, pragas de piolhos e ratos, e, ainda, os bombardeamentos, que de modo arbitrário atingiam os soldados. Era uma vida de pesada rotina, só interrompida por disparos, bombardeamentos e raids. Os soldados limpavam, cavavam e cuidavam das comunicações. As sentinelas, no parapeito, vigiavam o inimigo. Nas “trinchas” os dias eram sempre iguais, cumprindo tarefas repetitivas e extenuantes. As noites, onde se distribuía rum, eram longas, vividas em espera, vigilância e sobressalto. O tempo na linha da frente era diferente, com um ritmo alternante de “momento de espera/momentos de combate”, que sujeitava os combatentes a vivências de grande tensão9. Na estreita faixa de terra, que compunha a trincheira, viviase num cenário dantesco, de um local lúgubre, onde coexistiam a sobrevivência, a doença 8 - Miguel Nunes Ramalho, La Lys 1917-1918. Capitães Bento Roma e David Magno – Mitos e Realidade. As Divisões na Instituição Militar Portuguesa, Porto, Fronteira dos Caos, Editores, 2017, pp. 125-126; Maria Clara de Paiva Vide Marques, Cambra no Palco da Grande Guerra, Vale de Cambra, Assembleia Municipal de Vale de Cambra, Vol. I-Artilharia e Cavalaria na Frente Ocidental, pp. 56-57 e Teresa Cruz Tubby, Portugal e a Grande Guerra, A participação dos Oficiais de Oliveira de Azeméis, Seda Publicações, 2018pp. 39-39. 9 - Carlos Jorge Alves Lopes, Os portugueses na Grande Guerra. Uma experiência de combate e de cativeiro, Dissertação de Mestrado em Estudos Portugueses Multidisciplinares, Área de Especialização em História Contemporânea. Lisboa: Universidade Aberta, 2012, consultado em 23 de Março de 2017, disponível em file:///C:/Users/User/Desktop/ ANO%202018/I%20GRANDE%20GUERRA/TRABALHOS%20DIVERSOS/Trabalho_V2_20121018_V12.pdf, p. 41 e segs, [Em linha]; Isabel Pestana Marques, Os Portugueses nas Trincheiras: vivências comportamentais, in Nuno Severino Teixeira (Coord.), Portugal e a Guerra. História das intervenções militares portuguesas nos grandes conflitos mundiais (séculos XIX e XX), Lisboa, Edições Colibri, 1998, pp. 71-87.

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e a morte, com cadáveres espalhados onde tinham caído. E, havia, ainda, a Terra de Ninguém, esse espaço misterioso, lugar temido e de morte, mas também de bravura e heroísmo10.

Infantaria Portuguesa em marcha para as trincheiras The Portuguese Army On The Western Front, 1917-1918, Imperial War Museum, Collections online (https://www.iwm.org.uk/collections) © IWM (Q 5537)

Uma bateria de Artilharia, equipada com bateria de peças de 75 mm, em movimento The Portuguese Army On The Western Front, 1917-1918, Imperial War Museum, Collections online (https://www.iwm.org.uk/collections) © IWM Q 60285 10 - Carlos Jorge Alves Lopes, Os portugueses na Grande Guerra. Uma experiência de combate e de cativeiro, p. 41 e segs, [Em linha]; Jonh Keegan, A Primeira Guerra Mundial, Porto, Porto Editora, 2014, p. 403; Isabel Pestana Marques, Os Portugueses nas Trincheiras: vivências comportamentais, pp. 71-87

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A partir de Maio de 1917, a força portuguesa começou gradualmente o ocupar a sua frente de combate, e em 10 de Junho a 1.ª Divisão do CEP assumiu a responsabilidade plena do sector. A 2ª Divisão concluiu a sua preparação mais tarde, juntando-se à 1ª Divisão em 26 de Novembro, ficando assim o CEP a guarnecer toda a frente que lhe foi atribuída, até Abril de 1918. Em Dezembro de 1917, a manutenção de duas Divisões, na frente de combate, apoiadas num Corpo de Exército desfalcado, tornou-se insustentável, levando a que, no dia 21 do mês seguinte, Portugal e Inglaterra assinassem a “Convenção de Janeiro”, que determinava o fim do emprego do CEP como Corpo de Exército, mas mantinha as suas duas Divisões no terreno: a 2ª Divisão guarneceria a frente e a 1ª ficaria em repouso à retaguarda, para onde retirou em Abril de 1918. Todavia, face à fadiga física e moral das suas tropas e à falta de pessoal e material necessários, para a defesa adequada do seu sector, o comando inglês considerou, também, necessário que a 2ª Divisão fosse prontamente rendida, ficando decidida a rendição para 9 desse mês de Abril, com excepção das unidades de artilharia e de morteiros. Nesse dia, porém, as forças inimigas lançaram a operação Georgette. De madrugada, às 4h e 15m, iniciaram o ataque com um avassalador bombardeamento, sobre as nossas posições de artilharia e postos de comando, prolongando a barragem por várias horas, o que destruiu quase por completo as linhas de comunicação portuguesas e impediu uma acção concertada de defesa.Tinha começado a ”Batalha de La Lys”. Ao início da manhã, a Infantaria Alemã saltou o parapeito das suas trincheiras e avançou pela Terra de Ninguém, protegida por um denso nevoeiro, varrendo as linhas portuguesas, que após o longo e brutal bombardeamento preparatório estavam física e moralmente incapazes de resistir. Nas horas iniciais do ataque, milhares de portugueses foram feitos prisioneiros, feridos ou mortos. O resultado da batalha é conhecido: a destabilização da frente e o recuo das forças aliadas. Em abono da verdade, o avanço alemão não desbaratou apenas as nossas tropas, mas também as britânicas que foram forçadas a recuar. Não se podem nem se devem imputar qualquer tipo de responsabilidades aos portugueses, uma vez que a 2.ª Divisão suportou estoicamente, e no limite das suas possibilidades, o embate dum imponente ataque, bem planeado e melhor executado, cuja finalidade era, escolhendo o elo mais fraco, destruir toda a cadeia defensiva dos Aliados e não só o sector português 11. Todavia, não deixou de ser para Portugal a grande derrota, uma vez que depois de La Lys tudo foi diferente. No plano militar, com as forças que restavam do CEP destroçado, algumas unidades, ainda combateram nas linhas da frente até à assinatura do Armistício, integradas no exército inglês. Todavia, no plano político, as consequências foram pesadas. Na festa da Vitória, Portugal desfilou ao lado dos Aliados. Mas na Conferência de Paz, esteve longe de conquistar os seus objectivos de guerra12.

11 - Nuno Severiano Teixeira, Portugal e a Grande Guerra, pp. 54-55. 12 - Nuno Severiano Teixeira, Portugal na «Grande Guerra» 1914-1918: as razões da entrada e os problemas da conduta, p. 68.

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IN MEMORIAN A tragédia e horror deste conflito podem bem ser demonstrados pelo número de vítimas que causou. Quando por fim as armas se silenciaram, os quatro longos anos de guerra haviam provocado a morte de 8,5 milhões de seres humanos, só nos campos de batalha da Europa, traumatizando um ainda maior número13. Em Portugal, pode dizer-se que o número de vítimas não assumiu proporções catastróficas, mas ainda assim o esforço feito, nas várias frentes de combate, originou inúmeras mortes. No teatro de guerra europeia, e com a ressalva que os números merecem, o total de perdas foi na ordem dos 2.086 mortos, dos quais 1.310 em combate, 70 pelo efeito dos gases, 121 por desastre, 529 por doença e 56 por causa desconhecida14. E, embora não se insira no âmbito deste estudo, não podemos deixar de recordar os que retornaram com inúmeras sequelas, físicas ou psicológicas. Num conflito que atingiu uma tão elevada mortandade, o contingente ido das terras de Estarreja não poderia passar incólume. Marco Pereira, no seu artigo “Os Concelhos de Estarreja e Murtosa na Primeira Grande Guerra (1914-1918)”, indica cerca de 350 militares que participaram no conflito, apontando o número de 56 vítimas da guerra, sem especificar as frentes de batalha15. Todavia, na Frente Ocidental, porque o teatro de guerra que aqui interessa, foram 22, os militares estarrejenses falecidos, dos quais 14 tombaram em combate no campo de batalha, 6 perecem vítimas de doença, 1 por suicídio, 1 um por causas desconhecidas e por fim, 1 outro por acidente, no campo de prisioneiros na Alemanha. Com excepção de Manuel Oliveira Calado, de que se desconhece a causa da morte e o local onde está sepultado, e corporiza o Soldado Desconhecido do concelho - simbolicamente eternizado no Panteão do Mosteiro da Batalha – os corpos dos restantes combatentes estarrejenses repousam no Cemitério Militar Português de Richebourg l’ Avoué. Concebido depois da guerra, nele foram tumulados os corpos de muitos combatentes, exumados de cemitérios próximos das localidades onde pereceram.

13 - John Keegan, A Primeira Guerra Mundial, Porto: Porto Editora, 2014, p. 13. 14 -Alves de Fraga, O Serviço de Saúde no Corpo Expedicionário Português em França.1916-1918, consultado em 23 de Março de 2018, disponível em http://repositorio.ual.pt/ bitstream/11144/523/1/O%20Servi%C3%A7o%20de%20 Sa%C3%BAde%20no%20Corpo%20Expedicion%C3%A1rio%20Portugu%C3%AAs%20em%20Fran%C3%A7a_2.pdf, p. 26. 15 - PEREIRA, Marco – Os Concelhos de Estarreja e Murtosa Na Primeira Grande Guerra (1914-1918). In RODRIGUES, Rosa Maria (dir.) – TERRAS DE ANTUÃ. Histórias e Memórias do Concelho de Estarreja. Estarreja: Câmara Municipal de Estarreja, n.º 11, ano 11, 2017, p. 113.

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Cemitério Militar Português de Richebourg l`Avoué

Fotografias de Teresa Cruz Tubby

ALBERTO PADINHA nasceu na Murtosa, filho de Manuel Maria da Silva Padinha e de Maria José de Miranda. Solteiro, aquando da sua mobilização, deixou os pais como parentes vivos mais próximos, portanto, responsáveis por receberem qualquer notícia sobre a sua vida militar e a pensão a que tinha direito como soldado. [ 201 ]


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Chamado para participar na Grande Guerra em França, na mais dura frente de batalha, foi o soldado da 3.ª companhia do Batalhão de Pontoneiros, e detinha a placa de identidade nº 65066. Cumpriu a sua missão na Companhia de Sapadores de Corpo, no Batalhão de Pontoneiros. Os Sapadores faziam trabalhos de retaguarda nas instalações, trabalhos nas trincheiras, abriam túneis, construíam pontes, etc. As suas tarefas eram difíceis e arriscadas, não só pela própria natureza da missão, como pelo longo tempo de permanência no front. Estas unidades tiveram um papel relevante no conflito. Embarcou no cais de Alcântara, em Lisboa, rumo ao porto de Brest, na Bretanha francesa, em 26 de Setembro de 1917, a bordo de um dos navios britânicos, que asseguravam o transporte dos militares portugueses, aportando em Brest três dias depois. Após o desembarque nesta cidade portuária da Bretanha, foi transportado até Airesur-la-Lys, a zona de concentração do CEP. Durante o demorado trajecto, de três dias de viajem, foi contactando com os cenários de guerra, à medida que se aproximava do seu destino, a cerca de 30 km das trincheiras. De Aire-sur-la-Lys seguiu a pé, carregado com o seu equipamento, para o acantonamento que lhe estava destinado, onde permaneceu algumas semanas em instrução, ministrada pelos britânicos, para aprender as novas tácticas e novo armamento bélico usados no tipo de guerra estática, que iria enfrentar, fazendo, no fim da aprendizagem, o seu tirocínio, integrado em unidades inglesas. Pouco tempo depois da sua chegada, a 3 de Outubro de 1917, sentiu-se doente, dando entrada no Hospital de Base nº 2, situado em Ambleteuse, onde esteve longos meses. Esta unidade hospitalar tratava todo o tipo de doenças, mas tinha especialidades em doenças venéreas e pulmonares. Era desta última, que padecia este expedicionário estarrejense. Sem termos a certeza, podemos alvitrar que Alberto, como em tantos outros casos, poderia ter já contraído a doença em Portugal, tendo-se a mesma agravado com a chegada à Flandres, dados o frio e a humidade, que se faziam sentir no sector português. Seja como for, o seu estado inspirava cuidados e seria grave, pois foi considerado incapaz de todo o serviço e de angariar os meios de subsistência, em sessão de Junta Médica, reunida em 18 de Dezembro de 1917. Cerca de um mês depois, em 22 de Janeiro de 1918, recebeu alta. Todavia, a sua saúde terá continuado precária, pelo que em 3 de Fevereiro, volta a dar entrada no Hospital de Base n.º 2, onde acabou por falecer, a 12 de Fevereiro, vítima de tuberculose pulmonar, doença que causou muitas vítimas entre os nossos militares. Foi sepultado, próximo da unidade hospitalar onde morreu, no cemitério de Ambleteuse, Coval 1016. Posteriormente, os seus restos mortais foram exumados e trasladados para o Cemitério Militar Português de Richebourg l`Avoué, Talhão C, Fila 4, Coval 1317. [ 202 ]


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ALFREDO DA COSTA nasceu na Murtosa, filho de Manuel Pereira da Costa e de Maria José da Silva. Quando foi chamado para servir a Pátria nos campos de guerra da Flandres, já se encontrava casado com Custódia Maria da Silva, que ficou como responsável por receber a pensão que lhe era devida como combatente, bem como qualquer notícia a seu respeito. Mobilizado pela Arma de Infantaria, era o soldado nº 581, da 3.ª Companhia do Batalhão de Infantaria n.º 24, que integrou a 2ª Brigada de Infantaria, da 1.ª Divisão do CEP. Detemos-mos aqui um pouco sobre a Arma de Infantaria do Exército Português, que mais pessoal mobilizou para a Frente Ocidental, 35.631 infantes, e as baixas entre as suas unidades, representaram 80% das baixas mortais do CEP, 1.657 infantes18. O Regimento de Infantaria n.º 24 (Aveiro), ao qual pertenciam a maioria dos militares de Estarreja organizou, no Verão de 1916, um batalhão que participou nos exercícios de Tancos, e foi mobilizado para o CEP, como Batalhão de Infantaria n.º 24, integrado na 2.ª Brigada de Infantaria da 1.ª Divisão. O Regimento deu, ainda, para França, pessoal para o EstadoMaior da 2.ª Brigada. O Batalhão embarcou em Fevereiro de 1917, levando três companhias reunidas no Regimento de Infantaria 24 em Aveiro e uma companhia reunida em Ovar. O combate nas trincheiras era difícil e requeria da parte da Arma de Infantaria uma boa preparação para suportar o cansaço e as carências de todo o tipo, sendo por isso necessário resistência física e psicológica. Na sua obra sobre a Infantaria do Exército Português na Grande Guerra, Pedro Marquês de Sousa, refere: Em França, na frente mais difícil da primeira Grande Guerra, os infantes portugueses conheceram as grandes novidades da primeira guerra de alta intensidade, sofrendo nas trincheiras os fogos da artilharia, dos gases, das metralhadoras e o terrível efeito psicológico causado por estes novos sistemas19.

Refere, ainda, o mesmo autor que na Flandres, apesar das maiores dificuldades serem a intensidade dos combates, “o frio e a lama nas trincheiras também reduzia o potencial de combate” dos Infantes, salientando que as baixas sofridas pelas unidades de Infantaria “refletem as características da sua missão, muito expostas na linha da frente e muito sacrificadas quer pelas ações de combate quer pelo estado psicológico causado pelas exigências da sua missão”20.

16 - Arquivo Histórico Militar (AHM) https://arqhist.exercito.pt-código de referência PT/AHM/DIV/1/35A/2/69/65066. 17 - http://www.memorialvirtual.defesa.pt/Lists/Combatentes/DispFormCombatenteaspx?List=fb2f9ac5%2Dbca8%2 D4 3cd%2D9157%2D615a0b996189&ID=7789. 18 - Pedro Marquês de Sousa, A Nossa Infantaria na Grande Guerra (1914-1918), Casal de Cambra, Caleidoscópio, 2018, p. 15 e pp. 241-242. 19 - Pedro Marquês de Sousa, A Nossa Infantaria na Grande Guerra (1914-1918), p. 15. 20 - Pedro Marquês de Sousa, A Nossa Infantaria na Grande Guerra (1914-1918), p. 241.

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Quanto ao nosso Infante Alfredo, detinha a placa de identidade 11952 e saiu do porto de Alcântara a bordo de um navio inglês no 3.º comboio marítimo, na companhia da maioria dos militares estarrejenses, aportando em Brest, na Bretanha, dias depois, após uma viagem difícil e perigosa. De Brest, depois de um desembarque tumultuoso, foi transportando de comboio para a zona de concentração das tropas portuguesas, Aire-sur-la-Lys, numa penosa viagem de 853 km, que durava três dias, no decurso da qual Alfredo foi contactando com os cenários de guerra, à medida que se aproximava do local onde estava o Quartel-General do CEP. Os homens que iam combater para a Flandres, precisavam de se adaptar à nova guerra de características estáticas, marcada pelo poder do fogo, pelo uso de metralhadoras, granadas, gases tóxicos e outras inovações bélicas, razão pela qual este infante e os seus camaradas vão permanecer na retaguarda a receber instrução com os britânicos, entrando nesta fase no front, inseridos em unidades inglesas. Muito embora a sua ficha de combatente pouco revele da sua participação no conflito, sabemos que Alfredo foi em diligência para a Escola de Sapadores, em 14 de Abril de 1917. Terminada a formação, apresentou-se em 15 de Maio, na sua unidade. Cerca de um mês depois, em 19 de Junho, foi colocado no 1.º Grupo de Companhias de Pioneiros (G.C.P.). Esta unidade foi organizada depois de retirarem a cada Batalhão de Infantaria o seu Pelotão de Sapadores, reunindo-os todos numa só unidade. Estes homens eram sapadores de combate e tiveram um papel relevante na guerra, sendo a sua missão desgastante, penosa e arriscada, com longo tempo de permanência de trincheiras21. Durante o mês de Março de 1918, foram frequentes os ataques dos alemães, sobre as posições portuguesas, com bombardeamentos, que incluíram granadas explosivas e gás, e raids, com assaltos à 1.ª linha, verificando-se muitas baixas entre os nossos militares22. Terá sido no ataque à zona entre Fauquissart e Neuve Chapelle, que Alfredo faleceu, em 12 de Março de 1918, na 1.ª linha, “por ter sido ferido em combate”. Inicialmente, sepultado no cemitério de Vieille Chapelle, talhão 3, coval E 523, o seu corpo foi, posteriormente, trasladado para o Cemitério Militar Português de Richebourg l`Avoué, Talhão A, Fila 10, Coval 19 24.

21 - Um agradecimento ao Tenente-Coronel Doutor Pedro Marquês de Sousa, profundo conhecedor da participação de Portugal na Grande Guerra, pela disponibilidade para responder às nossas questões e pelo apoio prestado. 22 - Pedro Marquês de Sousa, A Nossa Infantaria na Grande Guerra (1914-1918), pp. 181-183. 23 - Arquivo Histórico Militar (AHM) https://arqhist.exercito.pt-código de referência PT/AHM/DIV/1/35A/2/13/11952. 24 - http://www.memorialvirtual.defesa.pt/Lists/Combatentes/DispFormCombatente.aspx?List=fb2f9ac5%2Dbca8% 2D43cd%2D9157%2D615a0b996189&ID=7858.

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AMÉRICO DA SILVA, natural de Pardilhó, era filho de Joaquim António da Silva e Ana Rodrigues. Chamado para a Arma de Infantaria, quando foi mobilizado para servir a Pátria na Grande Guerra, Américo já era casado com Joana Maria Valente, pelo que foi a jovem esposa tendo ficado como responsável para receber notícias sobre a sua vida militar e a pensão a que tinha direito como praça do CEP. Soldado nº 135 da 1ª Companhia, do Batalhão de Infantaria n.º 24, que integrou a 2ª Brigada de Infantaria, da 1.ª Divisão do CEP, e detentor da placa do CEP nº 12352. Embarcou, no cais de Alcântara, a 14 de Março de 1917, numa viagem cheia de desafios. Terá efectivamente partido no dia 16, no comboio marítimo que transportou o Batalhão de Infantaria n.º 3 (Viana do Castelo) e restantes militares das unidades que já haviam partido anteriormente, uma das quais era o Batalhão de Infantaria n.º 2425. Depois de uma viagem perigosa, devido aos prováveis ataques de submarinos alemães, e realizada em condições degradantes, a bordo de navios superlotados, aportou em Brest, na Bretanha. Desta cidade portuária foi transportado de comboio até Aire-sur-la-Lys, onde ficava o local de concentração da força portuguesa, já na zona de guerra. Era uma outra viagem penosa, num trajecto de cerca de cerca de 853 Km, que atravessava o norte de França. Na fase inicial, Américo permaneceu na retaguarda a receber instrução ministrada pelos britânicos, de modo a adaptar-se ao novo tipo de guerra e de armamento. No fim desta fase preparatória fez o seu tirocínio, integrado em unidades inglesas, entrado nas marcantes “trinchas”, onde depois iria decorrer a maior parte do seu percurso como expedicionário. Ao serviço da sua unidade, o nosso Infante foi combater em Nueve Chapelle, a partir de Junho de 1917, quando a 2.ª Brigada de Infantaria da 1.ª Divisão do CEP, entrou em linha, na defesa deste subsector. Mais um soldado português na Flandres, que cumpriu com o seu dever, suportando a dureza e rotina das “trinchas”; em 14 de Setembro de 1917, foi ferido em combate, no ataque alemão ao subsector guarnecido pela sua unidade. Na manhã desse dia, entre as 8h e as 10h e 15m, o inimigo bombardeou algumas posições no subsector de Neuve Chapelle, tendo o Batalhão de Infantaria n.º 24 sofrido baixas, três mortos e seis feridos. Na noite de 14, o inimigo voltou a bombardear o subsector entre as 22h e as 23 e 15m, recomeçando os bombardeamentos no dia 15 de madrugada para preparar o raid sobre o subsector e a cratera de Mauquissart. O ataque foi repelido pelo Batalhão de Infantaria n.º 7 (Leiria) com o apoio do Batalhão de Infantaria n.º 24, provocando um morto e oito feridos na Infantaria 17 e um ferido na Infantaria 2426. Ignorámos a gravidade dos ferimentos de Américo, se deu entrada nalguma unidade hospital, ou mesmo se esteve 25 - António José Telo e Pedro Marquês de Sousa, O CEP – Os Militares Sacrificados Pela Má Política, p. 236. 26 - Pedro Marquês de Sousa, A Nossa Infantaria na Grande Guerra (1914-1918), pp. 167-168.

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internado. A sua ficha é omissa nesse sentido, referindo somente: “Ferido em combate em 14 de Setembro de 1917”. A sua permanência e comportamento em França são praticamente desconhecidos. Sabemos que, em Dezembro de 1917, a 2.ª Brigada, de que fazia parte o seu batalhão, passou a reserva divisionária, onde esteve até 6 de Abril de 1918, quando a 1.ª Divisão retirou para a retaguarda. A sua unidade não esteve, por isso, presente na ofensiva alemã de 9 de Abril de 1918, na qual o CEP sofreu elevadas perdas, com a sua 2.ª Divisão praticamente aniquilada e o CEP deixou de existir como Corpo de Exército. Após esta batalha, algumas unidades das tropas restantes foram empenhadas em combate, mas a maioria foi empregada em trabalhos necessários, como construção de trincheiras, sob as ordens de unidades britânicas, como aconteceu com a 2.ª Brigada, que foi atribuída como reforço à 14.ª Divisão Britânica, constituindo a reserva do seu X Corpo de Exército27. Durante todo este período, nomeadamente nos conturbados tempos finais, nada sabemos sobre Américo, pois não há quaisquer assentamentos na sua ficha individual até 9 de Setembro de 1918, quando cometeu suicídio. A este propósito, deve dizer-se que a longa permanência dos soldados no front, sem rendição, conduziu ao desgaste físico e psicológico. Como nos diz Nuno Severiano Teixeira: Progressivamente, o desgaste físico provocado por longos meses nas trincheiras, o corte de licenças pela falta de transporte, a dureza do Inverno, a crescente intensidade e frequência dos ataques inimigos e a falta de reforças, foram agravando o moral das tropas portuguesas. Começa a grassar a indisciplina, a deserção. (…) Ao crime junta-se a doença e, finalmente, o suicídio: 10 casos registados28.

Américo foi um dos casos. Foi sepultado, como refere a sua ficha do CEP, no Cemitério de Brevy, ignorando-se o n.º do coval29. Posteriormente, os seus restos mortais terão sido identificados, sendo trasladados para o Cemitério Militar Português de Richebourg l’Avoué, Talhão D, Fila 5, Coval 2130 ANTÓNIO DA SILVA, natural de Beduído, era filho de José da Silva e de Maria Marques Couto.

27 - Pedro Marquês de Sousa, A nossa Infantaria na Grande Guerra (1914-1918), p. 201. 28 - Nuno Severiano Teixeira, Portugal na “Grande Guerra” 1914-1918: as razões da entrada e os problemas da conduta, p. 67. 29 - Arquivo Histórico Militar (AHM) https://arqhist.exercito.pt-código de referência PT/AHM/DIV/1/35A/2/14/12352. 30 - http://www.memorialvirtual.defesa.pt/Lists/Combatentes/DispFormCombatente.aspx?List=fb2f9ac5%2Dbca8% 2D43cd%2D9157%2D615a0b996189&ID=7988.

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Ainda solteiro, quando foi incorporado no CEP para servir a Pátria num país distante, deixou a mãe, residente no Outeiro do Coval, como familiar viva mais próxima, cabendo-lhe receber as notícias relativas à sua vida militar, tal como a pensão que lhe era devida pelo CEP. Recebida a ordem de mobilização, António seguiu na companhia de grande parte dos seus camaradas de arma do concelho, para ir lutar no país longínquo, . Era o soldado n.º 373 da 3.ª Companhia de Infantaria n.º 24. Detentor da placa de identidade n.º 12220, este Infante embarcou, no porto de Alcântara rumo ao porto de Brest, na Bretanha francesa, a 23 de Fevereiro e 1917. Desembarcou três dias depois de uma viagem difícil, em navios superlotados e debaixo do perigo de ataques de submarinos alemães. Na cidade de Brest aguardava-o nova viagem, por via-férrea, até Aire-sur-la-Lys, a zona escolhia para a concentração do CEP, a pouco mais de 30 km da linha da frente a ser ocupada pela força portuguesa. Chegado ao destino, antes de avançar para a frente de combate, recebeu formação e treino com os britânicos, para ganhar conhecimento com o armamento e as novas tácticas da guerra de trincheiras, passando pelas primeiras experiências na frente de combate, inserido em unidades britânicas, ainda durante este período de instrução. Em Junho de 1917, a 2.ª brigada de Infantaria, à qual pertencia o batalhão de Infantaria n.º 24, recebeu ordem para guarnecer a defesa do subsector de Neuve Chapelle, onde este praça viveu, no curto período em que esteve nas linhas A e B, sujeito aos bombardeamentos e raids germânicos, que foram uma constante desde a entrada do CEP no designado “sector português”. Sabemos muito pouco acerca da curta passagem de António pelo conflito. A sua ficha individual, apenas informa “que faleceu na 1.ª linha em virtude dos ferimentos recebidos em combate, em 28 de Julho de 1917” 31. De acordo com Pedro Marquês de Sousa, a Artilharia inimiga mostrou-se particularmente activa, no mês de Julho de 1917, com vários bombardeamentos sobre as posições portuguesas nos subsectores de Neuve Chapelle e Ferme du Bois, causando vários mortos e feridos, sendo um deles este Infante32. A sua ficha de expedicionário não contém mais dados, além da referência a que tombou em combate33. Sabemos, contudo, que o seu corpo ficou em França. Jaz no Cemitério Militar Português de Richebourg l’Avoué, Talhão C, Fila 3, Coval 1034.

31 - Arquivo Histórico Militar (AHM) https://arqhist.exercito.pt-código de referência PT/AHM/DIV/1/35A/2/14/12220 32 - Pedro Marquês de Sousa, A Nossa Infantaria na Grande Guerra (1914-1918), pp. 167-168. 33 - Arquivo Histórico Militar (AHM) https://arqhist.exercito.pt-código de referência PT/AHM/DIV/1/35A/2/14/12220. 34 - http://www.memorialvirtual.defesa.pt/Lists/Combatentes/DispFormCombatente.aspx?List=fb2f9ac5%2Dbca8% 2D43cd%2D9157%2D615a0b996189&ID=8253.

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ANTÓNIO MARIA, natural de Canelas, era filho de António Tavares Bracinha e de Maria Rosa de Almeida. Solteiro, quando foi chamado para o CEP, foi o pai, como chefe de família num mundo dominado pela figura masculina, que ficou indicado como responsável para receber qualquer informação relativa à sua vida militar, tal como a pensão que lhe era devida. Soldado com o nº 598, integrou a 1.ª companhia do Batalhão de Infantaria n.º 31. O Regimento de Infantaria n.º 31 mobilizou militares para reforçar os Depósitos de Infantaria, para colmatar a falta de pessoal do CEP35. Detentor da placa de identidade nº 30429, a sua ficha de militar do CEP indica que embarcou em Lisboa, em direcção a Brest, em 12 de Setembro de 1917. Porém, só saiu da barra do Tejo, a 26 de Setembro, num dos navios britânicos que compunha o 14.º comboio marítimo de transporte de tropas lusas, a bordo dos quais seguiram várias unidades, entre as quais o pessoal de reforços do Batalhão de Infantaria n.º 3136. Sendo um dos maiores problemas do CEP, o embarque e transporte das tropas complexo, desorganizado e sujeito à disponibilidade dos navios ingleses, originando atrasos nas partidas, o que obrigava, muitas vezes, os militares a ficarem aquartelados em Lisboa a aguardar o transporte. Depois de uma viagem cheia de desafios, pelas águas do Atlântico, aportou em Brest. Desta cidade portuária, na Bretanha, seguiu por comboio até à zona de concentração do CEP, Aire-sur-la-Lys, numa viagem que, atravessando todo o norte de França, demorava três dias, e para a qual lhe foi distribuída uma ração que consistia em “cerca de 30 biscoitos, 2 latas de carne e uma caixa de geleia, a ser dividida por 3 homens e diariamente café e queijo” 37. Na zona de Aire, já próximo do teatro de guerra, a cerca de 30 km das trincheiras, este Infante esteve nos primeiros tempos, a receber instrução complementar, adaptada à guerra das trincheiras, ministrada por britânicos. A 22 de Novembro de 1917, António foi colocado no Batalhão de Infantaria nº 2 (Lisboa), que integrava a 6.ª Brigada de Infantaria, orgânica da 2.ª Divisão do CEP. O Batalhão de Infantaria n.º 2 entrou nas trincheiras em 26 de Novembro de 1917, na defesa do subsector de Fauquissart. A 21 de Dezembro, com a alteração do dispositivo português, a 6.ª Brigada passou a guarnecer o recém-criado subsector de Chapigny, onde os seus combatentes enfrentaram as duras condições de vida das “trinchas” e os bombardeamentos e raids do inimigo. Nesta realidade viveu este praça, cumprindo o seu dever com dedicação. A 25 de Janeiro de 1918 foi promovido a 1.º Cabo. Este batalhão, cujos passos podem ser seguidos no livro Na Grande Guerra, do capitão Américo Olavo, que integrava esta unidade,

35 - Pedro Marquês de Sousa, A Nossa Infantaria na Grande Guerra (1914-1918), p. 32. 36 - António José Telo e Pedro Marquês de Sousa, O CEP – Os Militares Sacrificados Pela Má Política, p. 244. 37 - Teresa Cruz Tubby, Portugal e a Grande Guerra. A participação dos Oficiais de Oliveira de Azeméis, p. 19.

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teve uma intensa intervenção enquanto permaneceu no front, sendo o mês de Março o mais violento, com bombardeamentos quase diários e assaltos frequentes às trincheiras lusas. A 12 de Março de 1918, os alemães realizaram um violento ataque sobre as posições portuguesas, nos subsectores de Fauquissart, defendido pelos batalhões de Infantaria 3 e 20, e de Chapigny, defendido pelos batalhões de Infantaria 5 e 2. Após o bombardeamento preparatório, o inimigo assaltou a 1.ª linha portuguesa, pelas 5h30m, com um batalhão de tropas especiais de assalto, que provocou 13 mortos e 56 feridos portugueses. A Infantaria alemã entrou nas linhas portuguesas pelas 7h, sendo repelida pelas forças de Infantaria dos batalhões m.º3, n.º 8, n.º 20, n.º 2 e n.º 5 e pela acção da 2.ª Bateria de Artilharia do 6.º Grupo de Baterias de Artilharia (G.B.A.). No total, as baixas destas unidades saldaram-se em 13 mortos, 56 feridos e 3 gaseados38. António foi um dos combatentes que tombou em combate, na 1ª linha, nesse trágico dia. Sepultado no Cemitério de Lavantie, Coval A16,Talhão 439, o seu corpo foi posteriormente trasladado para o Cemitério Militar Português de Richebourg l`Avoué, Talhão A, Fila 2, Coval 1540. ANTÓNIO AUGUSTO GUEDES RUELA VALENTE, nasceu no Bunheiro, filho de João Guedes Ruela Valente e de Custódia Tavares Cirne. Solteiro, quando foi chamado para participar na frente mais difícil da Grande Guerra, deixou como responsável, para receber quaisquer informação relativa à sua vida militar e a sua pensão, o pai, residente no Bunheiro, que surge como chefe de família, uma situação comum, num mundo marcado pela figura masculina. Mobilizado pela Arma de Infantaria, era o soldado nº 289 da 2.ª companhia do Batalhão de Infantaria nº 24. Detentor da placa de identificação nº 34532 do CEP, embarcou para França, no comboio marítimo que deixou o cais de Alcântara, em 23 de Fevereiro de 1917, na companhia da maior parte dos seus conterrâneos. Chegou a Brest, na Bretanha, o porto escolhido para o desembarque da força lusa, depois de uma viagem realizada em condições difíceis, com os navios superlotados e debaixo do perigo de ataques inimigos.

38 - Pedro Marquês de Sousa, A Nossa Infantaria na Grande Guerra (1914-1918), p. 183. 39 -Arquivo Histórico Militar (AHM) https://arqhist.exercito.pt-código de referência PT/AHM/DIV/1/35A/2/38/34532. 40 - www.memorialvirtual.defesa.pt/Lists/Combatentes/DispFormCombatente.aspx?List=fb2f9ac5-bca8-43cd-9157615a0b996189&ID=8683.

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Em Brest, depois de um desembarque tumultuoso, marchou para a estação de comboio desta cidade da Bretanha francesa, onde foi transportado para a zona de concentração das tropas portuguesas, Aire-sur-la-Lys, numa jornada fastidiosa, que durava três dias. Chegado ao destino, a cerca de 30 Km do front, iniciou um processo de instrução junto da força britânica, onde contactou com a nova realidade táctica de guerra de trincheiras, bem como com o novo armamento. Neste período fez o seu tirocínio, entrando no front, inserido em unidades inglesas. A marcha definitiva para as “trinchas” ocorreu em Junho de 1917, quando a 2.ª Brigada da 1.ª Divisão do CEP, à qual pertencia o seu batalhão, assumiu a defesa do sector de Nueve Chapelle, onde o nosso Infante viveu, nas linhas da frente, até Dezembro de 1917, quando a sua Brigada passou a reserva divisionária, onde se manteve até 6 de Abril de 1918. Durante todo este tempo, o seu percurso como combatente foi semelhante ao de tantos outros, cumprindo o seu dever, sem louvores, mas também sem faltas. De acordo com Marco Pereira, no seu estudo sobre os concelhos de Estarreja e da Murtosa na Primeira Grande Guerra, António exerceu na guerra funções de telegrafista41. Pela sua ficha militar sabe-se que baixou à Ambulância nº 3, que se encontrava estacionada em Vieille Chapelle, em 7 de Setembro de 1917, não sendo indicada a causa da sua entrada, nesta unidade de saúde42, nem o dia em que teve alta. Sem qualquer outro assentamento até Novembro de 1918, em 14 desse mês, escassos dias após a capitulação da Alemanha, no dia 11, quando foi assinado o Armistício, baixou à Ambulância nº 51, sofrendo de peritonite, à qual não resistiu, vindo a falecer no dia seguinte. Foi sepultado no cemitério de Tournai, ignorando-se, inicialmente, o número do coval, como diz a sua ficha. Tournai, não muito longe da frente ocidental, foi capturada pelos Alemães em Agosto de 1914. No final de Setembro de 1918, o VI Exército alemão mudou o seu quartel de Lille para Tornai, destruindo pontes e colocando postos de observação. No início de Novembro, o bombardeamento pela 74.ª Divisão americana (Yeomanry) e pela 47.ª Divisão inglesa fez-se sentir e no dia 8 os alemães retiram, ao som de regozijo dos residentes locais. As forças aliadas entram na cidade nesse dia, e a 14, a 51.ª Ambulância inglesa estabeleceu-se, tendo permanecido até 20 de Julho de 1919. No mesmo dia 14, António Ruela Valente foi aí internado. Posteriormente, os seus restos mortais foram trasladados para o Cemitério Militar Português de Richebour l’Avoue, Talhão A, Fila 2, Coval 1243.

41 - Marco Pereira, Os Concelhos de Estarreja e Murtosa Na Primeira Grande Guerra (1914-1918), p.107. 42 - As ambulâncias eram hospitais de campanha, com estruturas ligeiras e móveis, instaladas próximo da zona de combate, que recebiam os doentes e feridos que vinham dos Postos de Socorro das trincheiras. 43 - http://www.memorialvirtual.defesa.pt/Lists/Combatentes/DispFormCombatente.aspx?List=fb2f9ac5-bca8-43cd9157-615a0b996189&ID=8879.

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DOMINGOS LOUREIRO, natural de Avanca, era filho natural de Maria Loureiro. Na altura da sua mobilização Domingos era solteiro, pelo que a mãe, como sua parente viva mais próxima, ficou responsável por receber notícias sobre a sua vida militar e a pensão de praça que lhe era devida. Integrado na Arma de Artilharia, era o soldado com o nº 414 da 8ª Bateria, do Regimento de Artilharia nº 2 (Figueira da Foz), e detinha a placa de identificação nº 72624 do CEP. Partiu rumo a França no contingente que saiu do cais de Alcântara com viagem marcada para 24 de Julho de 1917, mas que só zarpou no dia seguinte, no comboio 11, composto apenas pelos navios ingleses Bellerophon e Inventor44. Dias depois aportava em Brest, na Bretanha, donde seguiu viagem por comboio, numa distância de 853 km, até Aire-sur-la-Lys, na Flandres, a zona de concentração da força portuguesa. De início passou por um período de instrução junto dos britânicos, sendo depois integrado em unidades inglesas, a fim de contactar com o emprego da artilharia, no novo tipo de guerra. A sua ficha pouco refere da vivência deste artilheiro, mas terá sido cumpridor do seu dever, no 4.º Grupo de Baterias de Artilharia (GBA) onde foi colocado. A Artilharia foi, como refere Pedro Marquês de Sousa, “a primeira arma do exército português a participar na guerra e a última a deixar a actividade operacional”45. Do total de efectivos mobilizados, a Arma de Artilharia foi a segunda força do exército português a recrutar pessoal, e em França foi adaptada ao modelo britânico, de que resultou na Artilharia Ligeira a constituição dos Grupos de Baterias de Artilharia (GBA). Em Novembro de 1917, quando se juntou no sector português a 2.ª Divisão, a Artilharia ficou assim constituída: à 1.ª Divisão foram atribuídos os 3.º GBA, 4.º GBA e 5.º GBA, e à da 2.ª Divisão os 1.º GBA, 2.º GBA e 6.º GBA. A 6 de Abril de 1918, a 1.º Divisão retirou-se da linha da frente, ficando a 2.ª Divisão como responsável pela defesa de todo o sector46. Domingos não esteve presente na ofensiva alemã de 9 de Abril de 1918, a Batalha de La Lys, mas participou na “Ofensiva dos cem dias”, cujo sucesso conduziu ao final do conflito. Com efeito, após a batalha, a 2ª Divisão, devido às baixas sofridas e à destruição ou captura do seu material, foi dissolvida, pelo que o CEP ficou muito reduzido, deixando de funcionar como Corpo de Exército. Contudo, na ofensiva final dos aliados, foram ainda empenhados, voltando ao combate na linha da frente, o 3.º GBA e o 4.º GBA, que 44 - António José Telo e Pedro Marquês de Sousa, O CEP – Os Militares Sacrificados Pela Má Política, 240. 45 - Pedro Marquês de Sousa, A nossa Artilharia na Grande Guerra (1914-1918), Casal de Cambra, Caleidoscópio, 2017, p. 99. 46 - Maria Clara de Paiva Vide Marques, Cambra no Palco da Grande Guerra, Vol. I-Artilharia e Cavalaria na Frente Ocidental, pp. 121-122.

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agregados em unidades inglesas, foram as últimas unidades do CEP a combater, na mais difícil frente da Grande Guerra. O 4.º GBA, pertencente à 1ª Divisão, foi mobilizado a 12 de Abril para reforçar unidades inglesas na frente de Marzinganhe-Vermelles47. A 10 de Novembro de 1918, na véspera da capitulação da Alemanha e da assinatura do Armistício – 11 de Novembro de 1918 – Domingos baixou à Ambulância nº 4, que estava em Fauquembergues, sofrendo de uma broncopneumonia gripal, que o vitimou a 4 de Dezembro. Terá tido conhecimento da vitória dos Aliados no primeiro grande conflito mundial, uma dura e longa guerra, que lhe ceifou a vida. Inicialmente sepultado no Cemitério Civil de Lambersart-Cauteleu, Coval 748, o seu corpo foi trasladado para o Cemitério Militar Português de Richebourg l’Avoué, onde jaz no Talhão A, Fila 2, Coval 1249. DOMINGOS MARIA, natural Murtosa, era filho de José Joaquim Fernandes de Oliveira e de Rosária de Oliveira. Rapaz solteiro quando foi chamado para integrar o CEP, e porque seu pai já havia falecido, deixou a mãe como parente vivo mais próximo, a quem cabia receber a sua pensão e quaisquer notícias a seu respeito. Este 1º cabo, nº 543 da 3ª Companhia, de Infantaria nº 24 era detentor da placa de identificação 11905, e deixou o cais de Alcântara, a 23 de Fevereiro de 1917, rumo a Brest, na Bretanha.Viajou na companhia da grande maioria dos seus conterrâneos, tendo aportado dias depois. De Brest foi transportando, de comboio, para a zona de concentração das tropas portuguesas, Aire-sur-la-Lys, na Flandres, numa jornada fastidiosa, que durava três dias. Chegado ao destino, a cerca de 30 Km do Front, recebeu instrução e treino com os britânicos, onde contactou com a nova realidade táctica de guerra de trincheiras, bem como com o novo armamento. Neste período de formação, entrou pela primeira vez no front, inserido em unidades inglesas. Em 19 de Junho de 1917, Domingos foi colocado no 1.º Grupo de Companhias de Pioneiros (G.C.P.). Sapadores de combate, estes militares foram dos mais sacrificados na guerra, quer pela natureza da sua missão, quer pelo longo tempo de permanência nas trincheiras.

47 - Maria Clara de Paiva Vide Marques, Cambra no Palco da Grande Guerra, Vol. I-Artilharia e Cavalaria na Frente Ocidental, p. 124. 48 - Arquivo Histórico Militar (AHM) https://arqhist.exercito.pt-código de referência PT/AHM/ DIV/1/35A/2/76/72624. 49 - http://www.memorialvirtual.defesa.pt/Lists/Combatentes/DispFormCombatente.aspx?List=fb2f9ac5%2Dbca8%2 D43cd%2D9157%2D615a0b996189&ID=9607.

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Da sua participação nos campos de guerra da Flandres, sabemos que foi um militar que suportou a dureza das “trinchas”, cumpridor do seu dever, apesar de apresentar uma punição, uma situação que não era incomum. Em 5 de Março de 1918, Domingos foi castigado pelo Comandante do Grupo, com dias 15 de detenção, por não ter acatado prontamente uma ordem superior, dada pelo Comandante de Companhia. Porém, “atendendo ao seu exemplar comportamento”, bem como ao facto de ser “um dos cabos mais dedicados pelo serviço”, a pena foi reduzida. Talvez venha a propósito referir, que a falta de rendição e as difíceis condições de vida no front, rapidamente se fizeram sentir entre os soldados, reflectindo-se no estado de saúde e no moral das tropas. Como nos diz Carlos Jorge Alves Lopes, a situação tinha-se tornado “tão grave que as praças preferiam o castigo prisional de detenção no Depósito Disciplinar 1, à liberdade na frente de combate”50. A 13 de Março, este infante encontra-se na frente de combate, onde foi ferido com gravidade, dando entrada na Ambulância n.º 3, hospital de campanha em 1.ª linha, estacionado em Vieille Chapelle. Não resistindo aos ferimentos de que foi alvo, faleceu nesse mesmo dia. Como acima dissemos, a propósito do soldado Alfredo, o mês de Março de 1918, foi de intensa actividade bélica, com constantes ataques dos alemães, ao sector defendido pelo CEP, que resultaram em muitas baixas, com um considerável número de feridos e mortos. Um destes ataques, foi um intenso bombardeamento, a 13 e 14, sobre o subsector de Chapigny. Na tarde do dia 13 e na madrugada do dia 14, os alemães iniciaram os fogos sobre a 1.ª linha e zona de arame, com Artilharia, morteiros e metralhadoras. Depois a Infantaria alemã tentou assaltar as primeiras linhas, mas foi repelida51. Domingos foi sepultado no Cemitério de Vieille Chapelle, Coval nº 10, Talhão 352. Posteriormente, o seu corpo foi trasladado para o Cemitério Militar Português de Richebour l’Avoué, Talhão A, Fila 11, Coval 953. FLORIANO GOMES DA LUZ, natural de Salreu, era filho de José Maria Gomes da Luz e de Gracinda Augusta Rodrigues Nóra. Partiu solteiro para a guerra das trincheiras da Flandres, deixando os pais como parentes vivos mais próximos, cabendo-lhes receber notícias suas e a sua pensão militar. Saiu do porto de Alcântara, em 23 de Fevereiro de 1917, na companhia da maioria dos militares estarrejenses, aportando em Brest, dias depois, após uma viagem difícil e perigosa, devido aos possíveis ataques de submarinos alemães e às condições degradantes

50 - Carlos Jorge Alves Lopes, Os portugueses na Grande Guerra. Uma experiência de combate e de cativeiro, p. 76. 51 - Pedro Marquês de Sousa, A Nossa Infantaria na Grande Guerra (1914-1918), pp. 181-183. 52 -Arquivo Histórico Militar (AHM) https://arqhist.exercito.pt-código de referência PT/AHM/DIV/1/35A/2/13/11905. 53 - http://www.memorialvirtual.defesa.pt/Lists/Combatentes/DispFormCombatente.aspx?List=fb2f9ac5%2Dbca8%2 D43cd%2D9157%2D615a0b996189&ID=9611.

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a bordo de navios superlotados. Detentor da placa de identidade nº 11421 do CEP, era o soldado n.º 116, da 2.ª Companhia do Batalhão de Infantaria n.º 24, que incorporou a 2.ª Brigada da 1.ª Divisão da força lusa. Em Brest, depois de um desembarque tumultuoso, foi transportando de comboio para a zona de concentração das tropas portuguesas, Aire-sur-la-Lys, uma jornada que durava três dias. Nos primeiros tempos, Floriano vai receber instrução com os britânicos para se adaptar ao novo armamento e à guerra de trincheiras, sendo ainda durante o treino, em Abril, que contactou com a realidade do front, inserido em unidades inglesas. Em Junho, o seu batalhão, em apoio à 2.ª Brigada, ocupa a primeira linha de trincheiras, assinalando a entrada de Floriano nas “trinchas”. A sua ficha de expedicionário do CEP, nada nos diz acerca do seu percurso, no palco de guerra da Frente Ocidental, mas terá sido igual ao de muitos outros soldados, cumprindo o seu dever, no curto período em que viveu nas linhas A e B, sujeito aos bombardeamentos e raids germânicos, que foram uma constante desde a chegada do CEP, ao seu sector. Floriano tombou em combate, na 1.ª linha, como refere o seu boletim, no dia 14 de Setembro de 1917. Na manhã desse dia, os alemães bombardearam algumas posições no subsector de Neuve Chapelle. No ataque, o Batalhão de Infantaria n.º 24 sofreu baixas, que se saldaram em três mortos e seis feridos54, sendo, um deles, este praça. Inicialmente sepultado no Cemitério de Vieille Chapelle, Coval H.855, o seu corpo foi, mais tarde, trasladado para o Cemitério Militar Português de Richebourg l’Avoué, Talhão A, Fila 12, Coval 856. GONÇALO ANTÓNIO DE PINHO, natural de Veiros, era filho de José Agostinho de Pinho e de Maria Joaquina da Silva. Solteiro e órfão de pais, quando partiu para França, deixou como parente vivo mais próximo José de Paiva, residente na mesma localidade, que ficou responsável por receber qualquer informação relativa à sua vida militar, tal como a pensão que lhe era devida como soldado. Soldado com o n.º 415 da 3.ª Companhia do Batalhão de Infantaria n.º 24, detinha a placa de identidade do CEP n.º 11916. Saiu do cais de Alcântara, a 23 de Fevereiro de 1917, acompanhado por muitos outros camaradas de armas estarrejenses, também, integrados neste batalhão. Depois de uma difícil e perigosa viagem, aportou em Brest, 54 - Pedro Marquês de Sousa, A Nossa Infantaria na Grande Guerra (1914-1918), p. 171. 55 - Arquivo Histórico Militar (AHM) https://arqhist.exercito.pt-código de referência PT/AHM/DIV/1/35A/2/13/11421. 56 - http://www.memorialvirtual.defesa.pt/Lists/Combatentes/DispFormCombatente.aspx?List=fb2f9ac5%2Dbca8% 2D43cd%2D9157%2D615a0b996189&ID=9821.

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na Bretanha francesa, e após um desembarque tumultuoso, marchou sem descanso para a estação de caminho-de-ferro, onde encetou nova viagem, num percurso de cerca de 853 Km, que o deixou em Aire-sur-la-Lys, o local onde se concentrava a força portuguesa, marcando a sua entrada no palco de guerra. Nos primeiros tempos, este Infante permaneceu na retaguarda a receber instrução complementar, administrada de acordo com o modelo britânico, em escolas inglesas e portuguesas, contactado com as tácticas e armamentos do tipo de “guerra de trincheiras” que iria enfrentar, uma guerra “parada”, marcada pelo poder do fogo. Conhece-se muito pouco da sua presença na Flandres. A sua ficha individual apenas dá nota que Gonçalo foi colocado, em 19 de Junho de 1917, no 1.º Grupo de Companhias de Pioneiros (G.C.P.), unidade de sapadores de combate, com tarefas difíceis, perigosas, e também esgotantes, passando muito tempo nas trincheiras. Gonçalo terá tido um percurso normal, cumprindo o seu dever, até Março de 1918, quando pereceu. O mês de Março marcou o princípio da grande ofensiva alemã, que se prolongou até final de Junho, e foi marcado por frequentes e violentos ataques, sobre o sector português, que provocaram muitos feridos e mortos, na força lusa. Como já vimos, a propósito do soldado Domingos Maria, a 13 e 14 de Março, deu-se um bombardeamento intenso sobre o subsector de Chapigny. O nosso Infante, tal como o seu conterrâneo, foi ferido com gravidade, no combate do dia 13, dando, igualmente, entrada na Ambulância n.º 3, onde veio a falecer pouco depois da sua chegada. Gonçalo foi sepultado no Cemitério de Vieille Chapelle, no Talhão 3, Fila 8, Coval 957. Posteriormente, os seus restos mortais foram trasladados para o Cemitério Militar Português de Richebourg l’Avoué, Talhão A, Fila 11, Coval 758. JOÃO AGOSTINHO LOPES DOS SANTOS, natural de Bunheiro, era filho de Joaquim Lírio Lopes dos Santos e de Ana Rosa da Silva. Solteiro quando foi mobilizado, o seu pai, residente em Pardilhó, ficou responsável, como chefe de família, para receber quaisquer notícias a respeito da sua vida militar e a pensão a que teria direito como praça ao serviço do Exército Português em França. Soldado com o n.º 183, foi incorporado na Companhia de Sapadores de Corpo (C.S.C.), Batalhão de Pontoneiros, 4.ª Companhia.

57 - Arquivo Histórico Militar (AHM) https://arqhist.exercito.pt-código de referência PT/AHM/DIV/1/35A/2/13/11916. 58 - www.memorialvirtual.defesa.pt/Lists/Combatentes/DispFormCombatente.aspx?List=fb2f9ac5-bca8-43cd-9157615a0b996189&ID=10153.

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Detentor da placa de identificação nº 55440 do CEP, a sua ficha indica que partiu a 21 de Abril de 1917, mas terá saído do cais de Alcântara rumo a Brest, na Bretanha, em 22 de Abril, a bordo de um dos navios britânicos, que assegurou o 7.º comboio marítimo de transporte dos militares portugueses, no qual seguiu a Companhia de Pontoneiros, entre várias outras unidades59. Dias depois chegou a Brest, após uma viagem perigosa, devido aos prováveis ataques alemães, e em condições degradantes, a bordo de navios sobrelotados, nos quais os homens se misturavam com os víveres, o armamento e os animais. Em Brest, de modo similar aos seus camaradas, apanhou um comboio que o levou, num percurso de 853 km e ao longo de 3 dias, até Aire-sur-la-Lys, a zona onde se concentrava o CEP, e, pouco depois, estava a receber instrução específica e adaptada à nova guerra, junto do exército britânico, passando por uma primeira experiência no dia-a-dia das trincheiras, em unidades inglesas. Pouco conhecemos da sua vivência, mas sabemos que as missões dos Sapadores, onde se incluíam os Pontoneiros, eram arriscadas e difíceis, devido à natureza e ao tempo que passavam nas trincheiras, tendo desempenhado um importante papel na guerra. Em 17 de Setembro foi colocado na 2.ª C. S. C., onde se manteve até ao início de Janeiro de 1918, altura em que foi transferido para a 1.ª C. S. C., no dia 9. Pouco tempo depois, em 15 de Fevereiro, baixou à Ambulância n.º 5, tendo estado internado, nesta unidade médica de campanha dos Aliados, até 5 de Março, quando foi evacuado para o Hospital de Sangue n.º 2, localizado em Saint-Venant, que prestava cuidados aos doentes e feridos, ainda, na linha da frente60. A sua saúde devia inspirar cuidados, pelo que foi transferido no dia seguinte, a 6 de Março, para o Canadian General Hospital n.º 3, em Boulogne, hospital dos Aliados onde foram assistidos muitos dos nossos expedicionários. Cerca de um mês depois, a 9 de Abril de 1918, dia da trágica batalha de La Lys, foi evacuado para um dos hospitais de Base, não sendo indicado qual, nem o motivo dos seus sucessivos internamentos. Dada a gravidade do seu estado foi considerado “incapaz de todo o serviço”, em sessão de Junta Médica de 20 de Abril. Quatro dias depois, a 24, seguiu para o Porto de desembarque de Brest, a fim de regressar a Portugal. Com a saúde muito debilitada, enquanto aguardava o repatriamento, baixou de novo ao hospital. Internado, no dia 24 desse mês de Maio, no Hospital Marítimo de Brest, aí faleceu a 30, de tuberculose pulmonar, sendo sepultado no cemitério de Kerfantras, em Brest, no Talhão 40, Fila 3, Coval 1961.

59 - António José Telo e Pedro Marquês de Sousa, O CEP – Os Militares Sacrificados Pela Má Política, p. 238. 60 - Isabel Pestana Marques, Das Trincheiras com saudade. A vida quotidiana dos militares portugueses na primeira guerra mundial, Lisboa, A Esfera dos Livros, 2008, p. 177. 61 -Arquivo Histórico Militar (AHM) https://arqhist.exercito.pt-Código de referência PT/AHM/DIV/1/35A/2/59/55440; http://www.memorialvirtual.defesa.pt/Lists/Combatentes/DispFormCombatente.aspx?Li st=fb2f9ac5%2Dbca8%2D 43cd%2D9157%2D615a0b996189&ID=10335.

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Esta informação pode indiciar que sofreu ataques do mortífero gás mostrada, vindo a padecer dos chamados efeitos gaseados, em resultados dos quais terá morrido. Diga-se, a propósito, que as doenças pulmonares eram uma das enfermidades clínicas, frequentemente, adquiridas no campo de batalha, devido aos gaseamentos. Através de uma outra fonte, foi possível identificar que o seu corpo jaz no Cemitério Militar Português de Richebourg l’Avoué, no talhão D, fila 17, coval 362. JOAQUIM RODRIGUES PINHO63, natural de Beduído, era filho de José Rodrigues de Pinho e de Ana Marques. Solteiro quando partiu para França, indicou o pai como parente vivo mais próximo, logo, responsável por receber a sua pensão como soldado e quaisquer notícias a seu respeito. Embarcou em Lisboa em 23 de Fevereiro de 1917, para lutar na Frente Ocidental, fazendo parte da 2.ª Companhia do Batalhão de Infantaria n.º 24, que integrava a 2.ª Brigada da 1.ª Divisão do CEP. Era o soldado n.º 467, com a placa de identificação n.º 11563. Chegado a França, Joaquim foi mais um combatente nas trincheiras portuguesas na Flandres, que cumpriu o seu dever. A única indicação, na sua ficha do CEP, diz-nos que foi colocado, em 6 de Abril de 1918, no Batalhão de Infantaria n.º 17 (Beja), da 5.ª Brigada da 2.ª Divisão do CEP, a quem competia a defesa do sector quando, em 9 de Abril, o Império Alemão deu início à operação Georgette com um forte ataque sobre as linhas portuguesas. O Batalhão de Infantaria n.º 17 estava estacionado no sector de Ferme du Bois, na Linha A, pelo que Joaquim estava presente e participou na batalha de La Lys, nesse dia 9, numa zona profundamente afectada. A sua ficha não tem quaisquer referências, mas Joaquim foi um dos muitos desaparecidos em combates que se tornaram prisioneiros de guerra na Alemanha64. Capturado em Nueve Chapelle, foi aprisionado no campo de internamento de Merseburg, onde obrigavam os presos a trabalhos forçados na agricultura e nas minas, e aí faleceu a 25 de Agosto de 1918, por desastre, como indica o livro de registo deste campo65. O website memorialvirtual.defesa.pt, do Arquivo Histórico Militar indica que morreu em combate no dia 26 de Agosto de 191866, como consta na sua ficha do CEP. Todavia, as informações dos arquivos da Cruz Vermelha Internacional permitem aferir que

62 - Relação dos Militares Portugueses sepultados nos Cemitérios de Richebourg l’Avoué, Boulogne s/ Mer e Antuérpia, Lisboa, Ministério da Guerra, 3.ª Direcção Geral, Estado-Maior do Exército, Serviço de Sepulturas de Guerra no Estrangeiro, 1937, ordem 1607. 63 - Veja-se sobre este expedicionário, o artigo de Maria Clara de Paiva Vide Marques e António Cruz Leandro, Os Prisioneiros do Concelho de Estarreja da Primeira Guerra Mundial na Frente Ocidental – 1917-1918, in RODRIGUES, Rosa Maria (dir.) – TERRAS DE ANTUÃ. Histórias e Memórias do Concelho de Estarreja, Estarreja, Câmara Municipal de Estarreja, n.º 12, ano 12, 2018, pp. 181-218. 64 - Arquivo Histórico Militar (AHM) https://arqhist.exercito.pt-Código de referência PT/AHM/DIV/1/35A/2/13/11563 65 -http://grandeguerre.icrc.org/en/File/Search/#/9/2/189/0/Portuguese/Military/Pinho%20Joaquim%20Rodrigues 66 - http://www.memorialvirtual.defesa.pt/Lists/Combatentes/DispFormCombatente.aspx?List=fb2f9ac5-bca8-43c d9157-615a0b996189&ID=11036.

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Joaquim morreu vítima de desastre, em 25 de Agosto, no campo de Merseburg. Atestando esta informação, o seu nome consta de uma relação de prisioneiros de guerra, mortos em cativeiro e enviada por Berlim para Lisboa, transcrita por Maria José Oliveira no seu trabalho sobre os prisioneiros de guerra portugueses, na Frente Ocidental67. Falecido em solo alemão, os seus restos mortais foram trasladados para solo francês. Joaquim encontra-se sepultado no Cemitério Militar Português de Richebourg l’Avoué, no talhão D, fila 9, coval 968. JOAQUIM TAVARES, natural de Beduído, era filho de Caetano Joaquim Tavares e de Joaquina Marques Pires. Solteiro quando foi combater nos campos de guerra da Flandres, deixou o seu pai, chefe de família, indicado para receber notícias a seu respeito e a pensão que lhe era devida como praça do CEP. Soldado com o nº 385, da 2.ª Companhia do Batalhão de Infantaria nº 24, integrou a 2.ª Brigada da 1.ª Divisão do CEP. Partiu do cais de Alcântara, com destino a França, em 23 de Fevereiro de 1917, conjuntamente com a maioria dos militares do concelho. Após uma viagem conturbada, de cerca de três dias, aportou na cidade de Brest, na Bretanha. Depois do desembarque, tão tumultuoso quanto o embarque e a viagem, foi transportado, de Brest, num comboio especial de militares, para a região da Flandres francesa, na zona de Aire-sur-la-Lys, escolhida como local de concentração do CEP. Foi aqui, a cerca de 30 km das trincheiras, que Joaquim esteve nos primeiros tempos, a receber instrução, adaptada às novas técnicas e armamento da “guerra de trincheiras”, ministrada por britânicos. Neste período marchou para o front, integrado em unidades britânicas, tendo tido os primeiros contactos e vivências de combate nas “trinchas”. Do seu curto percurso como combatente pouco se sabe, uma vez que a sua ficha apenas tem como nota o seu envolvimento em combate, onde sucumbiu, três meses depois de ter deixado a sua Pátria. Joaquim foi a primeira vítima mortal estarrejense nos campos da Flandres. As unidades da 1.ª Divisão do CEP, que vinham chegando a França desde Fevereiro, realizaram o seu tirocínio na 49.ª Divisão, do XI Corpo Britânico, e em Maio e Junho principiam a entrar nas trincheiras, sofrendo desde logo bombardeamentos e ataques 67 - Maria José Oliveira, Prisioneiros Portugueses da Primeira Guerra Mundial-Frente Europeia 1917/1918, Porto Salvo, Edições Saída de Emergência, 2017, p. 204. 68 - http://www.memorialvirtual.defesa.pt/Lists/Combatentes/DispFormCombatente.aspx?List=fb2f9ac5-bca8-43cd9 157-615a0b996189&ID=11036.

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por parte do inimigo. Envolvido num combate, no subsector esquerdo de Neuve Chapelle, onde se encontrava o seu batalhão, foi ferido e sucumbiu, a 23 de Maio, três meses após ter deixado o cais de Alcântara69. Está sepultado no Cemitério Militar Português de Richebour l’Avoué, Talhão B, Fila 5, Coval 1070. JOSÉ DOS SANTOS, natural de Avanca, era filho de José Maria Dias dos Santos e de Elisa Maria de Jesus. Solteiro quando foi mobilizado para servir a Pátria no teatro de guerra da Frente Europeia, indicou como responsável, para receber quaisquer informação relativa à sua vida militar e a sua pensão, o pai, residente em S. Jerónimo, Lisboa, o chefe de família, uma situação comum num mundo onde imperava a figura masculina. José era o 1.º cabo condutor, com o nº 410 do 5.º Esquadrão de Cavalaria. Detentor da placa de identificação do CEP n.º 6843, foi mobilizado para o 2.º Grupo de Companhias de Administração Militar, Coluna de Transporte de Feridos nº 1 (C.T.F.). Seguiu no 1.º contingente do CEP, estando indicado na sua ficha que embarcou em Lisboa, no dia 19 de Janeiro de 1917, rumo a Brest. Contudo, as múltiplas dificuldades no embarque das tropas retardaram a viagem, pelo que só, em 30 de Janeiro de 1917, saiu o 1.º comboio marítimo, do porto de Alcântara-Mar, ficando o nosso militar, e os seus companheiros, aquartelados em Lisboa, durante o tempo de espera. Depois de uma viagem perigosa, devido aos ataques alemães, e em condições insalubres, onde os homens se misturavam a bordo com os víveres, mantimentos e animais, aportou em 2 de Fevereiro em Brest71. Desta cidade, da Bretanha francesa, foi transportado por via-férrea, num longo percurso de cerca de 853 km, até Air-sur-la-Lys, onde ficava a zona de concentração das tropas do CEP, a cerca de 30 Km da frente de combate que a força lusa ia defender. Conhece-se muito pouco da sua presença na zona de guerra, ao serviço do transporte de feridos, uma tarefa cuja rapidez poderia fazer a diferença entre a vida ou a morte ou impedir a amputação de membros dos feridos em combate. Em França, desde inícios de 1917, nada consta na sua ficha individual até Dezembro de 1917, quando teve alguns dias de punição, como tantos outros soldados do CEP, sendo a indisciplina uma questão relevante no seio da força lusa, onde a maioria dos homens não tinha preparação e disciplina militares. José foi punido, pelo chefe da sua coluna, em 31 de Dezembro de 1917, com 4 dias de detenção, “pelo seu pouco zelo e falta de cuidado, 69 - Arquivo Histórico Militar (AHM) https://arqhist.exercito.pt-código de referência PT/AHM/DIV/1/35A/2/13-11492. 70 - http://www.memorialvirtual.defesa.pt/Lists/Combatentes/DispFormCombatente.aspx?List=fb2f9ac5%2Dbca8%2 D43cd%2D9157%2D615a0b996189&ID=11054. 71 - António José Telo e Pedro Marquês de Sousa, O CEP – Os Militares Sacrificados Pela Má Política, pp. 230-231.

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não tendo mandado proceder à limpeza da cavalariça, a horas convenientes, como lhe competia”. A partir daqui, só voltamos a ter informação sobre o cabo José, depois da capitulação da Alemanha, em 11 de Novembro de 1918. Com efeito, meses depois das armas se terem silenciado, este militar ainda permanecia em solo francês, onde estando doente baixou à Enfermaria, no dia 18 de Fevereiro de 1919, vindo a falecer a 5 de Março de 1919, “victimado por gripe”. Foi sepultado no Cemitério de Les Baroques, em Calais, Sector 8, Linha G, Coval 1072. Posteriormente, o seu corpo foi trasladado para o Cemitério Militar Português de Richebourg l’Avoué, onde jaz no Talhão C, Fila 18, Coval 2173. MANUEL DE OLIVEIRA CALADO, natural de Estarreja, era filho de Manuel Pedro Fernandes de Oliveira e de Maria Emília Valente de Almeida. Solteiro, quando foi recrutado, deixou indicado os pais como parentes vivos mais próximos, que ficaram responsáveis por receber qualquer informação relativa à sua vida militar, tal como a pensão que lhe era devida como militar ao serviço da força expedicionária portuguesa. Soldado nº 356, da 1.ª Companhia de Infantaria nº 24, e detentor do número de identidade 12125-A do CEP, este estarrejense era aprendiz de música. A sua ficha militar indica que deixou o cais de Alcântara a 25 de Fevereiro de 1917. Todavia, terá saído a 26 de Fevereiro, aportando em Brest, na Bretanha, no fim de uma perigosa e fastidiosa viagem de três dias. Após o desembarque, seguiu com os seus camaradas em direcção ao aquartelamento provisório, onde ficou a aguardar a viagem seguinte, por via-férrea até Aire-sur-la-Lys, onde se localizava a zona de concentração do CEP, aproximadamente a 30 km do front. Para a longa jornada de comboio, num percurso de cerca de 853 km, “recebeu uma ração de combate inglesa que consistia em cerca de 30 biscoitos, 2 latas de conserva de carne e 1 lata de marmelada, e diariamente café e queijo”74. Os homens que ia combater para a Flandres, precisavam de se adaptar à nova guerra de características estáticas, marcada pelo poder do fogo, pelo uso de metralhadoras, granadas, gases tóxicos e outras inovações bélicas, razão pela qual Manuel e os seus camaradas vão permanecer nos primeiros tempos, na retaguarda, a receber instrução junto dos britânicos.

72 - Arquivo Histórico Militar (AHM) https://arqhist.exercito.pt-código de referência PT/AHM/DIV/1/35A /2/08/06843. 73 - http://www.memorialvirtual.defesa.pt/Lists/Combatentes/DispFormCombatente.aspx?List=fb2f9ac5-bca8-43cd9157-615a0b996189&ID=11420. 74 - Teresa Cruz Tubby, Portugal e a Grande Guerra. A participação dos Oficiais de Oliveira de Azeméis, Seda Publicações, 2018, p. 19.

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Muito pouco se conhece do seu trajecto e vivências nos campos de guerra da Flandres. A sua ficha de militar não apresenta qualquer anotação até depois da Batalha de La Lys, em 9 de Abril de 1918, quando se deu a ofensiva alemã sobre o sector português, na qual a 2.ª Divisão foi praticamente aniquilada e o CEP deixou de existir como Corpo de Exército, devido à pesada derrota sofrida. Desconhecemos se esteve presente na batalha, mas a indicação de que necessitou de cuidados médicos escassos dias depois da batalha, pode ser um indicador da sua participação. Manuel deu entrada, a 11 de Abril, na Ambulância n.º 4, que se encontrava em Fauquembergues, onde este internado dois dias. Desconhecemos a causa, mas o seu estado devia inspirar cuidados, pelo que foi evacuado para o Hospital de Base n.º 1, unidade hospitalar portuguesa, já na retaguarda, situada em Ambleteuse, no dia 13. Permaneceu nesta unidade hospitalar cinco dias, até ao dia 18 de Abril, quando lhe foi dada alta para o Depósito Misto, onde esteve cerca de um mês. Mais uma vez, a sua ficha nada nos diz sobre o seu estado, mas terá sido ferido com gravidade e/ou gaseado, pois foi presente a uma Junta Médica, que o julgou incapaz “de serviço activo”, a 26 de Maio. Nesse mesmo dia, foi evacuado para o porto de embarque, que era agora Cherbourg, a fim de ser repatriado. Todavia, a 27 de Junho, deu entrada no Hospital de Cherbourg. No seu boletim de expedicionário não há mais nenhum registo75. De acordo com as informações constantes no website Memorial aos Mortos na Grande Guerra (http://www.memorialvirtual.defesa.pt) faleceu, de causa desconhecida, em 18 de Setembro de 1918, desconhecendo-se, também, onde foi sepultado76. MANUEL JOÃO, natural da Murtosa, era filho de Manuel José Vieira e de Maria Augusta da Cunha. Solteiro, quando foi chamado para cumprir o serviço militar na Arma de Infantaria na Frente Ocidental e, porque o seu pai já havia falecido, deixou a mãe como parente vivo mais próximo, portanto, responsável por receber quer a sua pensão de praça do CEP, quer as notícias a seu respeito. Soldado nº 383 da 3ª Companhia do Batalhão de Infantaria nº 24, que integrou a 2.ª Brigada da 1.ª Divisão do CEP. Detentor da placa de identidade n.º 12230, fez parte do CEP como praça de pré. A 23 de Fevereiro zarpou do porto de Alcântara rumo a França, aportando em Brest, depois de uma turbulenta e perigosa viagem. Após o desembarque nesta cidade portuária da Bretanha francesa, marchou com o seu grupo, sem qualquer descanso, até à estação de

75 - Arquivo Histórico Militar (AHM) https://arqhist.exercito.pt-código de referência PT/AHM/DIV/1/35A/2/14/12125. 76 - http://www.memorialvirtual.defesa.pt/Lists/Combatentes/DispFormCombatente.aspx?List=fb2f9ac5%2Dbca8%2 D43cd%2D9157%2D615a0b996189&ID=12460.

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caminho-de-ferro, de onde foi transportado até Aire-sur-la-Lys, a zona de concentração do CEP. Durante o trajecto, de três dias de viajem, num percurso de 853 Km, Manuel ia contactando com os cenários de guerra à medida que se aproximava do seu destino, a cerca de 30 km da linha da frente. Conhece-se muito pouco da sua presença na guerra. Todavia, sabemos que de forma idêntica aos restantes militares do seu batalhão, que integrava a 2.ª Brigada da 1.ª Divisão da força expedicionária portuguesa, chegado à zona de guerra, António foi receber instrução com os britânicos, pois quem ia combater na Flandres necessitava de se preparar bem para o novo tipo de guerra, de características estáticas, onde os homens se entrincheiravam, separados pela estreita faixa de terra, que constituía a Terra de Ninguém. Foi ainda neste período de instrução que teve a sua primeira experiência em combate no front, integrado em unidades inglesas. Em Junho de 1917, entrou nas “trinchas”, onde viveu durante meses, inicialmente no apoio defensivo do sector de Neuve Chapelle, onde o seu Batalhão permaneceu até Dezembro desse ano. Terá tido um percurso normal, cumprindo o seu dever, sem louvores, mas também sem faltas. A sua ficha individual dá nota de que baixou à Ambulância n.º 5, em 20 de Agosto de 1917, tendo recebido alta cinco dias depois, não sendo indicada a causa do internamento. Envolvido num combate, a 7 de Outubro de 1917, este Infante estarrejense foi ferido e transportado para a Ambulância nº 3, hospital de campanha, estacionado em Vieille Chapelle, onde não resistiu aos ferimentos, vindo a falecer nesse mesmo dia. Com efeito, a 7 de Outubro, no subsector de Neuve Chapelle, deu-se um violento ataque, tendo os alemães bombardearam as posições do Batalhão de Infantaria n.º 24, causando dois mortos e um ferido77. Foi sepultado no cemitério da localidade onde pereceu, Vieille Chapelle, no Coval 1078, Mais tarde, o seu corpo foi trasladado para o Cemitério Militar Português de Richebourg l’Avoué, Talhão A, Fila 13, Coval 279. MANUEL MARIA DIAS DA SILVA, natural de Beduído, era filho de José Maria Dias da Silva e de Ana Maria Marques de Azevedo. Quando foi mobilizado para servir o seu País na Flandres, a mais dura frente do conflito, já estava casado com Júlia Fernandes, residente em Figueira de Matos, Vila Nova de Gaia, que ficou indicada como parente vivo mais próximo, logo, responsável por receber 77 - Pedro Marquês de Sousa, A Nossa Infantaria na Grande Guerra (1914-1918), p. 172. 78 - Arquivo Histórico Militar (AHM) https://arqhist.exercito.pt-código de referência PT/AHM/DIV/1/35A/2/14/12230. 79 - http://www.memorialvirtual.defesa.pt/Lists/Combatentes/DispFormCombatente.aspx?List=fb2f9ac5%2Dbca 8%2D43cd%2D9157%2D615a0b996189&ID=12659.

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qualquer informação relativa à sua vida militar, tal como a pensão que lhe era devida como praça de pré ao serviço do CEP. Manuel era o soldado n.º 312 da 4.ª Companhia do Batalhão de Infantaria n.º 35, e detinha a placa de identidade do CEP, n.º 14914. Saiu do cais de Alcântara, rumo à cidade portuária de Brest, na Bretanha, a 16 de Março de 1917, a bordo de um dos navios que asseguraram o 4.º comboio marítimo, onde viajaram os militares do Regimento de Infantaria 3 (Viana do Castelo) e parte das unidades que haviam seguido no comboio 3, nas quais se incluía o Batalhão de Infantaria n.º 35.80 O Regimento de Infantaria n.º 35 (Coimbra) mobilizou para França um batalhão, o Batalhão de Infantaria n.º 35, que integrou a 2.ª Brigada de Infantaria, orgânica da 1.ª Divisão do CEP, e, ainda, pessoal para guarnecer uma bateria de morteiros. Entre o pessoal mobilizado pelo Regimento de Infantaria n.º 35, registaram-se, nesta frente de combate, 48 mortos, 193 feridos e 3 prisioneiros81. Entre as baixas, contava-se este militar estarrejense, sobre quem temos poucos dados enquanto esteve nos campos de guerra da Flandres. Depois de uma penosa e perigosa viagem, de três dias, chegou a Brest, onde foi, transportado de comboio, para a zona de concentração das tropas portuguesas, numa jornada que durava três dias. De Aire-sur-la-Lys, a cerca de 30km do front, seguiu para o acantonamento, também, situado na zona de retaguarda, onde permaneceu em instrução complementar, ministrada pelos britânicos, para se adaptar às novas tácticas e armamento da “guerra das trincheiras”. A formação terminava com uma passagem pela 1.ª linha de combate, junto de unidades britânicas. Só depois estava apto a entrar nas paradigmáticas trincheiras. Na informação retirada da sua ficha de combatente pode ver-se que Manuel foi punido, uma situação que era comum entre a força lusa. Em 28 de Dezembro de 1917, foi castigado com seis dias de detenção, pelo Comandante da 2ª Companhia de Sapadores Mineiros, não sendo indicado o motivo. Todavia, por esta altura, este infante estaria, desde Junho, a viver nas trincheiras, diante do inimigo, sujeito a bombardeamentos e raids, em duras condições que, rapidamente, se fizeram sentir entre as tropas reflectindo-se no estado de saúde e no moral dos militares. A indisciplina começou a espalhar-se, revelando uma resistência, ainda que passiva, à difícil situação destes homens, aos quais faltava, também, uma formação como verdadeiros soldados, capazes de aceitar regras num conflito tão difícil. Sem outras notas, no boletim de expedicionário, até ser dado como desaparecido na Batalha de La Lys, a 9 de Abril de 1918, o facto de ser punido pelo Comandante da 2ª

80 - António José Telo e Pedro Marquês de Sousa, O CEP – Os Militares Sacrificados Pela Má Política, p. 236 81 - Pedro Marquês de Sousa, A Nossa Infantaria na Grande Guerra (1914-1918), p. 172.

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Companhia de Sapadores Mineiros, parecem indiciar que Manuel foi transferido para essa unidade, embora tal não esteja indicado. Esta companhia pertencia ao Grupo de Pioneiros de Campanha, unidade que foi organizada depois de retirarem a cada Batalhão de Infantaria o seu Pelotão de Sapadores, reunindo-os todos numa só unidade. Estes homens eram sapadores de combate, com missões difíceis e permaneceram longo tempo nas trincheiras82. Dado como desaparecido nesse trágico dia 9 de Abril, segundo comunicação de 10 de Abril da 2.ª Companhia Sapadores Mineiros; na ordem de serviço n.º 250 do Batalhão de Infantaria n.º 35, de 11 de Abril, continua dado como desaparecido em 9 de Abril, “ignorando-se o seu paradeiro”. Posteriormente, como consta no seu processo, por declaração de duas testemunhas foi dado como falecido, no dia 9 de Abril de 1918, “por ferimentos em combate”, mas o CEP continuava a ignora o local onde foi sepultado83. Posteriormente, o seu corpo foi identificado. Os seus restos mortais jazem no Cemitério Militar Português de Richebourg l’Avoué, no Talhão C, Fila 22, Coval 884. MANUEL MARIA VIEIRA, natural da Murtosa, era filho de Manuel da Silva Vieira e de Maria Augusta. Chamado para integrar o CEP, era solteiro, tendo ficado a sua mãe, como parente viva mais próxima, responsável por receber notícias suas e a sua pensão de praça de pré. Mobilizado pela Arma de Infantaria, era o soldado nº 542, da 4ª Companhia do Batalhão de Infantaria nº 24, que incorporou a 2ª Brigada de Infantaria, da 1.ª Divisão do CEP. Detentor da placa de identidade n.º 12492, no decorrer da campanha passou a ser identificado com o n.º 11755. Embarcou no porto de Alcântara, a 23 de Fevereiro de 1917, com destino a Brest. Viajou, na companhia da maioria dos seus conterrâneos, num dos navios ingleses alocados para transportar a força lusa, aportando uns dias depois. Após uma viagem efectuada em condições desadequadas e perigosas, foi levado de comboio, num percurso de 853 km e ao longo de três dias, até à região de Aire-sur-la-Lys, onde estava concentrado o CEP. Aqui, a aproximadamente 30 km da frente de combate, viveu os primeiros tempos, sendo-lhe ministrada instrução, pelo exército britânico, para se familiarizar com a guerra de características estáticas que marcou este conflito.

82 - Mais uma vez agradecemos ao Tenente-Coronel Doutor Pedro Marquês de Sousa. 83 - Arquivo Histórico Militar (AHM) https://arqhist.exercito.pt-código de referência PT/AHM/ DIV/1/35A/2/17/14914. 84 - http://www.memorialvirtual.defesa.pt/Lists/Combatentes/DispFormCombatente.aspx?List=fb2f9ac5%2Dbca8%2 D43cd%2D9157%2D615a0b996189&ID=1278.

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No decorrer deste período de instrução, baixou ao Hospital em 1 de Março de 1917, tendo tido alta a 27, não se sabendo a causa de seu internamento, nem a unidade hospitalar onde esteve. Em Maio de 1917, o Batalhão de Infantaria n.º 24 assumiu a defesa do subsector de Ferme du Bois, e Manuel entrou nas trincheiras. A 16 de Junho, a 2.ª Brigada, onde se inseria o seu Batalhão, recebeu a responsabilidade de guarnecer a defesa do subsector de Neuve Chapelle. Nesse mesmo dia 16, este nosso Infante foi ferido em combate, dando entrada no Hospital, também, não identificado, sendo transferido para o Hospital de Calais no dia 19. Foi certamente ferido com gravidade e a sua saúde devia inspirar cuidados, pelo que foi, no dia 25, evacuado para o Stationary Hospital nº 26, uma das unidades médicas aliadas que prestou cuidados aos nossos militares. Teve alta a 2 de Setembro, seguindo para a sua Base. Porém, escassos dias apenas, no dia 7, baixou à Ambulância nº 3, hospital de campanha na linha da frente, estacionado em Vieille Chapelle, de onde foi transferido, no mesmo dia, para o Hospital de Sangue nº 1, hospital de evacuação, criado em Merville, que se destinava ao tratamento de doentes de foro médico85. Aí internado cerca de uma semana, no dia 15 desse mês de Setembro, foi evacuado para o General Hospital nº 54, em Vimereux, outra das unidades hospitalares aliadas onde foram tratados os nossos militares, tendo tido alta a 26. Sensivelmente um mês depois, em sessão de Junta Médica de 22 de Outubro de 1917, “foi julgado incapaz do serviço activo”. Desconhecemos o percurso de Manuel no período que medeia entre ter sido considerado incapaz do serviço activo, em Outubro de 1917 e meados de 1918, já depois de passada a Batalha de La Lys, em 9 de Abril, na qual a 2.ª Divisão foi praticamente aniquilada e o CEP deixou de existir como Corpo de Exército. O elevado número de baixas, bem como o estado físico e moral das tropas tornou difícil a reorganização das forças restantes, que nos primeiros meses a seguir à batalha, por ordem do Alto Comando Britânico, foram utilizadas em trabalhos secundários de manutenção, efetuados ao serviço dos britânicos. Mais tarde, já com o General Garcia Rosado no comando, conseguiu-se, em Outubro de 1918, organizar nove batalhões, concentrando os militares de diversas unidades, as quais inseridas no XI Corpo de Exército britânico participaram na ofensiva final que ditou a vitória dos Aliados. Como consta da ficha do CEP, este Infante foi transferido para um desses batalhões. Colocado na 2.ª Companhia do Batalhão de Infantaria n.º 35 (Coimbra), Manuel participou na libertação da Bélgica. Como nos diz a sua ficha do CEP, em 9 de Novembro 1918, pertenceu ao grupo “que tomou parte na perseguição ao inimigo e na passagem do rio Escalda”, escassos dias antes da assinatura do Armistício, 11 de Novembro, que firmou a derrota da Alemanha. O Batalhão 35, denominado 5.º Batalhão desde a reorganização de

85 - Isabel Pestana Marques, Das Trincheiras com saudade. A vida quotidiana dos militares portugueses na primeira guerra mundial, p. 177.

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Outubro, foi atribuído em 2 de Novembro à 47.ª Divisão britânica, integrado na 142.ª Brigada, com a qual avançou para Lille, progredindo até à Bélgica, percorrendo cerca de 60 km, através de Willems-Templeuve até Pont-à-Chin, junto ao rio Escalda, cuja travessia executaram perseguindo os alemães, ficando a cerca de 60 km de Bruxelas86. Meses depois do final do conflito, em 11 de Novembro de 1918, com a assinatura do Armistício, ainda se encontrava em França, tendo estado nas Escolas do CEP. A sua saúde seria frágil. Em 24 de Março de 1919, Manuel deu entrada no Hospital de Base n.º 1, em Ambleteuse, onde faleceu pouco tempo depois, em 3 de Abril, de broncopneumonia gripal. Foi sepultado no Cemitério de Ambleteuse, Coval 73, caixão 14087. Posteriormente foi trasladado para o Cemitério Militar Português de Richebourg l’Avoué, onde jaz no Talhão D, Fila 21, Coval 188. MANUEL RESENDE, natural de Salreu, era filho de José Resende e de Ana Maria Rodrigues. Chamado para cumprir o serviço militar na Arma de Infantaria, quando seguiu para o teatro de guerra da Frente Ocidental, já se encontrava casado com Maria da Anunciação Marques, que como sua esposa, ficou indicada como parente viva mais próxima, cabendolhe receber notícias suas, bem como a pensão a tinha direito como praça do CEP Soldado n.º 312 da 2ª Companhia do Batalhão de Infantaria n.º 24, detinha a placa de identificação nº 11453 do CEP. A 23 de Fevereiro rumou para França, conjuntamente com a maioria dos militares do seu concelho, aportando em Brest três dias depois, após uma viagem difícil, onde os homens viajam a bordo misturados com armamento, víveres e animais, e perigosa, devido aos prováveis ataques alemães. Porém, tal como o embarque, também o desembarque foi tumultuoso e caótico. Pela indicação na sua ficha de expedicionário, Manuel só chegou ao porto de Brest a 1 de Março, marchando de seguida com a sua unidade pelas ruas da cidade. Aguardava-o nova viagem, desta vez por via-férrea até Aire-sur-la-Lys, na Flandres, a zona de concentração do CEP. Durante o demorado trajecto de 853 km, que demorava três dias de viagem, Manuel ia contactando com os cenários de guerra à medida que se aproximava do seu destino, a cerca de 30 km da linha da frente. Nos primeiros tempos permaneceu nesta zona, a receber instrução complementar junto da força britânica, onde contactou com a nova realidade táctica de guerra de trincheiras, bem como com o novo armamento. 86 - Pedro Marquês de Sousa, A nossa Infantaria na Grande Guerra (1914-1918), pp. 207-208. 87 - Arquivo Histórico Militar (AHM) https://arqhist.exercito.pt-código de referência PT/AHM/DIV/1/35A/2/13/11755. 88 - http://www.memorialvirtual.defesa.pt/Lists/Combatentes/DispFormCombatente.aspx?List=fb2f9ac5%2Dbca8%2 D43cd%2D9157%2D615a0b996189&ID=12795.

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A marcha definitiva para as “trinchas” ocorreu em Junho de 1917, quando a sua unidade, organicamente integrada na 2.ª Brigada da 1.ª Divisão do CEP, assumiu a responsabilidade de defesa do subsector de Nueve Chapelle, onde o nosso Infante terá vivido, nas linhas da frente, até Dezembro de 1917, quando a sua Brigada passou a reserva divisionária, estacionada na Linha C, onde se manteve até 6 de Abril de 1918. Do seu percurso militar muito pouco se sabe, mas terá sido similar ao de tantos outros, cumprindo o seu dever, sem louvores, mas também sem faltas, até ter sucumbido por doença. Conforme regista a sua ficha do CEP, este Infante estarrejense baixou no dia 18 de Janeiro de 1918, à Ambulância nº 3, um dos hospitais de campanha, em 1.ª linha, estacionada em Vieille Chapelle. O seu estado inspiraria cuidados, pelo que foi, nesse mesmo dia, transferido para o Hospital de Sangue nº 2, mais na retaguarda, mas ainda incluído no apoio aos militares empenhados em combate, situado em Saint-Venant, onde veio a falecer no dia seguinte, a 19 de Janeiro, “vitimado por meningite cérebro espinhal”. Sepultado no Cemitério de Saint Venant, Coval 789, os seus restos mortais foram, posteriormente, transladado para o Cemitério Militar Português de Richebourg l’Avoué, Talhão C, Fila 4, Coval 1690. ROBERTO PINTO, natural de Canelas, era filho de Joaquim Dias Pinto e de Maria Rosa Domingues. Órfão de pai, aquando da sua mobilização, foi a sua mãe que ficou responsável por receber notícias suas e a pensão que lhe era devida. Soldado nº 483 da 1ª Companhia do Batalhão de Infantaria n.º 24, incorporado na 2ª Brigada de Infantaria, este infante detinha a placa de identidade nº 12392 do CEP. De acordo com a sua ficha de expedicionário, embarcou do cais de Alcântara, a 23 de Janeiro de 1917. Terá, todavia, rumado a França a 23 de Fevereiro, a bordo de um dos navios ingleses do 3.º comboio marítimo, que transportou, entre outras unidades, o Batalhão de Infantaria n.º 24. Acresce referir, que tendo sido o transporte do CEP uma das dificuldades reais, da nossa participação no teatro de guerra europeu, as primeiras tropas só saíram em 30 de Janeiro do porto de Alcântara. Seja como for, depois de uma viagem de três dias, Roberto aportou em Brest, na Bretanha francesa, de onde foi transportado, por via-férrea, numa jornada de mais três dias, para a zona de Aire-sur-la-Lys, onde se concentrava o CEP. Aí chegado, nos primeiros tempos recebeu, ministrada pelos britânicos, instrução específica e adaptada à situação que iria encontrar na frente: a “guerra de trincheiras”, uma nova guerra de características estáticas. No final da formação, integrado em unidades britânicas, fez o seu baptismo de fogo.

89 - Arquivo Histórico Militar (AHM) https://arqhist.exercito.pt-código de referência PT/AHM/DIV/1/35A/2/13/11453. 90 - http://www.memorialvirtual.defesa.pt/Lists/Combatentes/DispFormCombatente.aspx?List=fb2f9ac5%2Dbca8%2 D43cd%2D9157%2D615a0b996189&ID=12920.

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Em Junho, o seu batalhão, em apoio à 2.ª Brigada, ocupa a primeira linha de trincheiras em Neuve Chapelle, com a responsabilidade de defesa deste subsector, e desde logo este Infante ficou sujeito aos bombardeamentos e raids germânicos, tendo sofrido a ingestão de gases tóxicos num ataque, pouco tempo depois da sua chegada à frente de combate. Na noite de 3 de Julho, sobre Neuve Chapelle, o inimigo atacou com um forte bombardeamento, onde foram lançadas granadas de gás, às posições do Batalhão de Infantaria n.º 24, tendo provocado 1 morto, 2 feridos e 2 gaseados91, sendo um deles Roberto. Ferido por “gazes em 3 de Julho de 1917”, como nos diz a sua ficha individual do CEP, baixou ao General Hospital n.º 51, unidade médica britânica, localizada em Étaples. Internado durante um longo período de tempo, recebeu alta em 4 de Setembro, mas dias depois, a 8, baixava à Ambulância nº 5, onde permaneceu quase um mês, tendo tido alta a 4 de Outubro. O seu estado continuava, porém, a inspirar cuidados, pelo que deu novamente entrada na Ambulância nº 5, no dia 17, sendo evacuado para o Hospital nº 2 em 1 de Novembro. Embora o seu boletim individual não permita identificar a unidade de saúde, deve tratarse do Hospital de Base n.º 2, instalado na retaguarda do CEP, na zona de Ambleteuse, que se destinava a acolher e tratar feridos e doentes que necessitavam de um período de recuperação mais prolongado, e tinha especialidade em doenças pulmonares. Roberto esteve internado perto de um mês, tendo tido alta para o Depósito Misto, no dia 20. Seguiu para a sua unidade, no dia 24 de Novembro, continuando no seu serviço activo no front, até Janeiro de 1918, quando tombou em combate. No mês de Janeiro registaramse vários bombardeamentos da Artilharia e ataques da Infantaria alemã sobre o sector português. Num desses confrontos, a 10 de Janeiro, este Infante foi ferido mortalmente, num combate na 1ª linha. Sepultado no Cemitério de Vielle Chapelle, Coval F.1292, os seus restos mortais foram, posteriormente, trasladados para o Cemitério Militar Português de Richebourg l’Avoué, Talhão A, Fila 15, Coval 193. RODRIGO RODRIGUES MARTINS, natural de Pardilhó, era filho de Manuel Rodrigues Martins e de Ana Maria Valente de Almeida. Solteiro quando foi chamado para integrar o CEP, deixou como responsável, para receber informação a seu respeito e a sua pensão de soldado, o pai, que surge como como chefe de família, uma situação comum num mundo marcado pela figura masculina. Mobilizado pela Arma de Infantaria, foi o soldado n.º 472, da 3ª companhia do Batalhão de Infantaria n.º 24. 91 - Pedro Marquês de Sousa, A Nossa Infantaria na Grande Guerra (1914-1918), p. 165. 92 - Arquivo Histórico Militar (AHM) https://arqhist.exercito.pt-código de referência PT/AHM/DIV/1/35A/2/14/12392. 93 - http://www.memorialvirtual.defesa.pt/Lists/Combatentes/DispFormCombatente.aspx?List=fb2f9ac5%2Dbca8%2 D43cd%2D9157%2D615a0b996189&ID=13442.

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Detentor da placa de identidade nº 34497 do CEP, embarcou no porto de Alcântara a 23 de Fevereiro de 1917, com destino a Brest.Viajou num dos navios ingleses alocados para transportar os militares lusos, aportando em Brest dias depois, de uma perigosa viagem, efectuada em condições degradantes. De Brest seguiu por via-férrea, num trajecto de cerca de 853 km, para Aire-sur-la-Lys, na Flandres francesa, a zona de concentração inicial do CEP. Na zona de Aire, a aproximadamente 30 km do front, permaneceu nos primeiros tempos a receber instrução com os britânicos em várias escolas, um treino complementar necessário ao tipo de guerra que iria enfrentar, a “guerra de trincheiras”. No final da instrução fez o seu tirocínio integrado em unidades inglesas, entrando nas linhas da frente. Do seu percurso como expedicionário pouco se sabe, mas ao serviço da sua unidade entrou nas Trincheiras, em Junho de 1917, quando a 2.º Brigada foi guarnecer a defesa do subsector de Neuve Chapelle. Em Dezembro de 1917, a 2.ª Brigada passou à reserva Divisionária, acantonando na Linha C, onde se manteve até 6 de Abril de 1918, quando a 1.ª Divisão retirou para a retaguarda. Rodrigo não este presente na Batalha de La Lys, em 9 de Abril de 1918, por dia da ofensiva alemã sobre as linhas portuguesas, na qual o CEP deixou de ser uma força de combate, devido à pesada derrota sofrida. Depois de La Lys, a vida dos nossos militares alterou-se profundamente. Nos primeiros meses, após a batalha, as tropas de algumas unidades de Infantaria, entre as quais o Batalhão 24 foram usadas em trabalhos secundários, de construção de trincheiras e organização de terreno, sob as ordens dos britânicos, deixando de participar em missões ofensivas. Nesta fase conturbada, Rodrigo foi mortalmente atingido num bombardeamento aéreo. Como refere a única nota do seu boletim do CEP: “Faleceu em 7 de Agosto de 1918, em virtude de ferimentos recebidos durante um bombardeamento aéreo feito pelo inimigo em Calonne, sendo sepultado no Cemitério Civil de Calonne-Riconart, ignorando-se o número do coval94. Posteriormente, o seu corpo terá sido identificado, sendo trasladado para o Cemitério Militar Português de Richebourg l’Avoué, onde repousa no Talhão C, Fila 9, Coval 995. TÉRCIO RODRIGUES DE ALMEIDA, natural de Salreu, era filho de Manuel Rodrigues de Almeida e de Mariana Marques. Quando foi mobilizado, este militar já se encontrava casado com Anunciação de Amorim, que foi indicada como parente viva mais próxima, ficando responsável por receber notícias suas e a pensão que lhe era devida. 94 - Arquivo Histórico Militar (AHM) https://arqhist.exercito.pt-código de referência PT/AHM/DIV/1/35A/2/38/34497. 95 - http://www.memorialvirtual.defesa.pt/Lists/Combatentes/DispFormCombatente.aspx?List=f2f9ac5%2Dbca8%2 D43cd%2D9157%2D615a0b996189&ID=13453.

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Chamado para combater, nos campos de guerra da Flandres, Tércio era o 1º Cabo, com o nº 49, da Companhia de Projectores de Campanha, do Regimento de Sapadores Mineiros. Detentor da placa de identidade nº 69016 do CEP, a sua ficha de expedicionário indica que embarcou para França, a 2 de Julho de 1917. Todavia, só saiu da barra do Tejo, em 14, num dos navios ingleses que asseguraram o 10.º comboio de transporte de tropas do CEP, que levou entre outras unidades a Companhia de Projectores, ficando durante o tempo de espera aquartelado em Lisboa. Chegou ao porto de Brest, na Bretanha, dias depois de uma viagem longa e cheia de desafios, dado o perigo das minas e submarinos inimigos, e feita a bordo de navios sobrelotados, onde se misturavam homens, animais e víveres. Após o desembarque, também desordeiro, foi conduzido de comboio até à Flandres, para o sector português instalado em Aire-sur-la-Lys. Aí chegado, nos primeiros tempos foi receber instrução, com os britânicos, para enfrentar uma guerra que, assentando no poder do fogo e no uso de novas armas, obrigou os homens a entrincheirarem-se e enfrentando-se quase sem se mexerem. No final da aprendizagem, entrou pela primeira vez no front, inserido nas unidades britânicas. São parcos os registos que ficaram da sua passagem pelos campos de guerra da Flandres, mas sabemos que a sua unidade tinha tarefas árduas e arriscadas, e foram eles os militares mais sacrificados na guerra devido à sua missão e ao tempo que passaram nas trincheiras. Na sua ficha apenas consta que deu entrada na Ambulância nº 4, hospital de campanha próximo da zona de combate, estacionada em Fauquembergues, no dia 13 de Novembro de 1918, já depois de firmada a paz, com a assinatura do Armistício em 11 de Novembro de 1918, e de por fim as armas se terem silenciado. Escassos dias depois de ter sido internado, Tércio faleceu na unidade hospital onde se encontrava, no dia 26 ou 27 desse mês96, “vitimado por broncopneumonia gripal”. Foi sepultado no Cemitério Civil de Lamberssart-Canteleu, coval n.º 497. Posteriormente, o seu corpo foi trasladado para o Cemitério Militar Português de Richebourg l’Avoué, onde foi tumulado no Talhão D, Fila 8, Coval 298.

96 - Ambos os dias figuram no seu boletim do CEP, no Memorial de Defesa Virtual é referido o dia 27. 97 -Arquivo Histórico Militar (AHM), https://arqhist.exercito.pt-código de referência PT/AHM/DIV/1/35A/2/73/69016. 98 - http://www.memorialvirtual.defesa.pt/Lists/Combatentes/DispFormCombatente.aspx?List=fb2f9ac5%2Dbca8%2 D43cd%2D9157%2D615a0b996189&ID=13622.

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FONTES E BIBLIOGRAFIA FONTES Arquivo Histórico Militar (AHM) – Boletins Individuais do CEP – https://arqhist.exercito.pt Internacional Committee of the Red Cross – www.icrc.org.pt Ministério da Guerra – Relação dos Militares Portugueses sepultados nos Cemitérios de Richebourg l’Avoué, Boulogne s/ Mer e Antuérpia, Lisboa, Ministério da Guerra, 3.ª Direcção Geral, Estado-Maior do Exército, Serviço de Sepulturas de Guerra no Estrangeiro, 1937. BIBLIOGRAFIA BRUN, André – A Malta das Trincheiras: Migalhas da Grande Guerra 1917-1918. Lisboa, Guimarães e C.ª., 1923. KEEGAN, John – A Primeira Guerra Mundial. Porto: Porto Editora, 2014. MARQUES, Isabel Pestana – Das Trincheiras com saudade. A vida quotidiana dos militares portugueses na primeira guerra mundial. Lisboa: A Esfera dos Livros, 2008. MARQUES, Maria Clara de Paiva Vide – Cambra no Palco da Grande Guerra. Vale de Cambra: Assembleia Municipal de Vale de Cambra, Vol. I-Artilharia e Cavalaria na Frente Ocidental, 2018. MARQUES, Maria Clara de Paiva Vide e LEANDRO, António Cruz – Os Prisioneiros do Concelho de Estarreja da Primeira Guerra Mundial na Frente Ocidental – 1917-1918. In RODRIGUES, Rosa Maria (dir.) – TERRAS DE ANTUÃ. Histórias e Memórias do Concelho de Estarreja. Estarreja: Câmara Municipal de Estarreja, n.º 12, ano 12, 2018, pp. 181-218. OLAVO, Américo – Na Grande Guerra. Lisboa: Guimarães e Cª., 1919 OLIVEIRA, Maria José – Prisioneiros Portugueses da Primeira Guerra Mundial. Porto Salvo: Edições Saída de Emergência, 2017. PEREIRA, Marco – Os Concelhos de Estarreja e Murtosa Na Primeira Grande Guerra (19141918). In RODRIGUES, Rosa Maria (dir.) – TERRAS DE ANTUÃ. Histórias e Memórias do Concelho de Estarreja. Estarreja: Câmara Municipal de Estarreja, n.º 11, ano 11, 2017, pp. 103-121. RAMALHO, Miguel Nunes – La Lys 1917-1918. Capitães Bento Roma e David Magno-Mito e Realidade. As Divisões na Instituição Militar Portuguesa. Porto: Fronteira dos Caos, Editores, 2017. [ 231 ]


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SOUSA, Pedro Marquês de – A Nossa Artilharia na Grande Guerra (1914-1918). Casal de Cambra: Caleidoscópio, 2017. — A Nossa Infantaria na Grande Guerra (1914-1918). Casal de Cambra: Caleidoscópio, 2018. TEIXEIRA, Nuno Severiano – Portugal na “Grande Guerra” 1914-1918: as razões da entrada e os problemas da conduta. In TEIXEIRA, Nuno Severiano (coord.) – Portugal e a Guerra. História das intervenções militares portuguesas nos grandes conflitos mundiais (séculos XIX e XX). Lisboa: Edições Colibri/ Instituto de História Contemporânea da Faculdade de Ciências Sociais e Humanas, 1998, pp. 55-69. — Portugal e a Grande Guerra. In BARATA, Manuel Themudo e TEIXEIRA, Nuno Severiano (dir.) – Nova História Militar de Portugal. Rio de Mouro: Círculo de Leitores e Autores, vol. 4, 2004, pp. 14-55. TELO, António José e SOUSA, Pedro Marquês de – O CEP – Os Militares Sacrificados Pela Má Política. Porto: Fronteira dos Caos, 2016. TUBBY, Teresa Cruz – Portugal e a Grande Guerra. A participação dos Oficiais de Oliveira de Azeméis. Seda Publicações, 2018. SÍTIOS EM LINHA Imperial War Museum, Collections online – The Portuguese Army On The Western Front, 1917-1918 – https://www.iwm.org.uk/collections Memorial aos Mortos na Grande Guerra – www.memorialvirtual.defesa.pt TRABALHOS EM LINHA FRAGA, Alves de – O Serviço de Saúde no Corpo Expedicionário Português em França.1916-1918, consultado em 23 de Março de 2018, disponível em http://repositorio. ual.pt/ bitstream/11144/523/1/O%20Servi%C3%A7o%20de%20Sa%C3%BAde%20 no%20Corpo%20Expedicion%C3%A1rio%20Por tugu%C3%AAs%20em%20 Fran%C3%A7a_2.pdf LOPES, Carlos Jorge Alves – Os portugueses na Grande Guerra. Uma experiência de combate e de cativeiro. Dissertação de Mestrado em Estudos Portugueses Multidisciplinares, Área de Especialização em História Contemporânea. Lisboa: Universidade Aberta, 2012, consultado em 23 de Março de 2017, disponível em file:///C:/Users/User/Desktop/ ANO%202018/I%20GRANDE%20GUERRA/TRABALHOS%20DIVERSOS/ Trabalho_V2_20121018_V12.pdf

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A SOMBRA DO MOSTEIRO DE AROUCA RAIZES LONGAS DE ANTUÃ Norvinda Leite * Carlos Pinho **

Durante séculos, o Mosteiro de Arouca teve um domínio que se prolongou para além dos limites territoriais que hoje conhecemos por Município de Arouca. Não fora no séc. XIII (1217), ali se ter recolhido a Infanta D. Mafalda, filha do Rei D. Sancho, e seria apenas mais um, dos inúmeros mosteiros e conventos espalhados pelo país, onde as ordens religiosas se recolhiam, ao serviço da espiritualidade e às custas da classe social que ao longo da existência humana sempre a teve de sustentar as demais, o Povo. Mas, por este facto, o Mosteiro de Arouca destacou-se dos outros, em prestígio, em poder de influência e em território. A fama de D. Mafalda arrastou para o Mosteiro de Arouca outras damas, de origens nobres, ricas e poderosas, que com elas traziam os seus dotes e direitos. Outros havia que, às portas da morte, e para se redimirem dos erros feitos neste mundo, esperançados em “comprarem” lugar seguro no mundo divino e paz às suas almas, doavam fortunas às ordens religiosas, das quais, o Mosteiro de Arouca foi tão beneficiado. Dedicadas de corpo e alma à fé Cristã, as monjas viviam o seu tempo em ritos e orações, sem, contudo, descurarem a gestão de todos os seus domínios e bens terrenos, que se estendem desde Penafiel a Viseu, de Arouca a Antuã. Durante séculos, com um imenso património, religioso e terreno para gerir, o Mosteiro de Arouca possuía um rigoroso sistema de gestão, e uma imensidão de gente que “Procurava”, cumprir as ordens da Madre Abadessa, que, com as demais serviçais da hierarquia Monástica de Cister, estavam fisicamente confinadas, e protegidas, pelas cercas do imenso e Real Mosteiro. Qual Abelha-Mestra no centro da colmeia, a Abadessa vivia cercada de um sem número de serviçais, que do Mosteiro, e fora dele, faziam cumprir os direito e deveres de todos os seus domínios, arrecadando os recursos para o sustento da complexa e privilegiada vida monástica.

* Arquivista da Câmara Municipal de Arouca. ** Professor. Freelancer em fotografia de eventos históricos e património local.

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Centro aglutinador da debilitada e penuriante economia local, e controlador financeiro e emocional da sociedade de então, que mais não trabalhava para pagamento de foros, dízimos e impostos, a partir do Mosteiro, geria-se uma imensa riqueza patrimonial e valiase à alma de uma sociedade que lhes era submissa. Numa espécie de zapping temporal, regressamos ao tempo em que o Mosteiro de Arouca tinha vida, azafamada e abundante. Uma viagem de evidências documentais e de cenas recriadas que nos permite compreender este vínculo com Antuã, e que perdurou pelos tempos, numa relação familiar e de dependência das mesmas raízes, das mesmas regras, que dificilmente se poderão apagar. Como uma imagem vale por mil palavras, preferimos as primeiras para passar a mensagem que queremos transmitir nesta data tão simbólica para a Terra de Antuã que celebra os 500 anos da atribuição do seu Foral.

1 - O Espaço Físico do Mosteiro de Arouca

Mosteiro de Arouca e a sua Cerca. O domínio terreno da Vila de Arouca – 2019

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Plantas do labiríntico Mosteiro de Arouca

Doc. 1 - Legenda

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2- Evidências de uma relação entrelaçada

Doc. 2 - A Dona Abadeça do Real Mosteiro de Arouca pede pelo seu Mercado. Dom JoãoVI, faço saber que a Dona Abadeça e mais Religiosas do Real Mosteiro de Arouca, Senhoras Donatárias do Concelho de Estarreja, Comarca de Aveiro, me representaram per sua petição que estabelecendo-se há anos hum mercado todos os domingos de manhã na Praça da ditaVilla, introduzido pela necessidade dos mesmos povos…; in Mercê de D. João VI para a Criação do mercado da Praça de Estarreja. 1812 / INATT.

Doc. 3 - “… pelo mesmo Ministro foi proposto o requerimento que a sua Alteza Real fizeram a Dona Abadessa e mais Religiosas do Real Mosteiro de Arouca Senhoras Donatárias deste Concelho, em que pedem a graça de Provisão para a regularidade e firmeza do Mercado que costuma fazer-se nestaVila todos os domingos do mês podendo vender-se toda a qualidade de legumes precisas para o consumo do povo desta Vila e circunvizinhos…”. In: Livro de Registo de Protocolo das Audiências da Câmara de Estarreja – 1812- Arquivo Municipal de Estarreja.

Doc. 4 -…Foral do Lugar e concelho de Antuaã, do Mosteiro de Arouca dado pelas Inquirições. Arquivo Nacional Torre do Tombo | Leitura Nova | Livro 47, Livro dos Forais Novos da Estremadura. FL 243, 243V, 244

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Doc. 5 - “…nesta quinta de Arouca que está nesta villa de Estarreja adonde eu Tavaliam fui prezente logo ahi porante mim Tavaliam e das testemunhas ao diante nomeadas e no fim desta nota asignadas apareceram prezentes partes de huma o Rebrendo Padre Frey Manoel Delgado Monje da Ordem de Cister e Procurador bastante do Real Mosteiro de Arouca…” In: Processo de Aforamento de Santo Amaro 1787, pasta 1, registo 001.Arquivo Municipal de Estarreja.

Doc. 6 - …“16º - Tem aVilla de Estarreja dois Juízes Ordinários com jurisdição de civil e de crime e Câmara a qual se chama pela Abadessa do Real Mosteiro de Arouca, que confirma as justiças por seu Ouvidor que tem na mesmaVilla certa (…. ) delas e aprova as pautas dá-lhes juramento e posse, apresenta às mesmas Donatárias todos os ofícios da terra…” in: Memórias Paroquiais de 1758 - Freguesia de Beduido, Concelho de Estarreja. INATT.

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Doc. 7 - “…Quem tem Consoada da Ordem:… (posição 3) Padre da quinta de Estarreja” Lembranças de bolos que se devem fabricar e distribuir em certos dias de Circunstancia – [181?] 1. in Arquivo do Mosteiro de Santa Maria de Arouca/IANTT.

1 - Para compreendermos um pouco a dimensão de gente relacionada com o Mosteiro de Arouca, transcrevemos do documento a parte onde se refere às pessoas a quem se oferece a Consoada da Ordem. Quem tem Conçuada da Ordem: -A Sra. Abbadeça; A Ospedeira; O Padre da Quinta de Estarreja; O Médico; O Juis Executor; O Juis Ordinario daVila; O Cura daVila; O Cura de Cabreiros; O Cura de Albergaria; O Abbade de Salvador; O Abbade de S. Miguel; O Abbade de Sta. Eulália; O Reitor deVarzea; O Letrado da Caza; O Surgião; O Meirinho; O Escrivão do Cartório; O Procurador da Caza; O Criado do Padre Confessor, O Criado do Padre Capelão; O Criado do Padre Cartorario; O Criado da Feitoria; O Cozinheiro; O Estribeiro; O Azemel; Os Carreiros; O Mateiro; O Boieiro; O Marxante; O Criado do Marxante ; Moleiro; Os Dezimeiros; Os Pumareiros; Os três Sacristãos; A Arrodeira (da Roda); A Mulher que Barre a Igreija; O Carneireiro e a Mulher; A mossa do [Tupeareiro] (Tapeçareiro?); A mossa da Sra. Abbadeça; A mossa que coze as cavacas da Ordem e todas as mossas que ajudão a fazer os doces se lhe dá alguns docinhos.

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Doc. 8 - …“Abadessa Donatária da ditaVila de Arouca e anexa do Burgo e Estarreja e mais coutos…” Termo de como se abriu o cofre e pelouros da Justiça que há-de servir no ano de 1834.- In. Atas da Câmara Municipal de Arouca de 26/12/1833.

Doc. 9 - “… Abadessa Donatária deste Real Mosteiro da ditaVila de Arouca e anexa do Burgo e Estarreja e mais coutos, …” in: Termo de como as Justiças da Vila de Arouca receberam Juramento, Varas e Insígnias Régias para o ano de 1834.- In: Atas da Câmara Municipal de Arouca de 01/01/1834.

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3 - Imagens de Vivências Recriadas2

Ritos de iniciação - a Tonsura, (corte do cabelo) despojar de beleza terrena

Ritos de iniciação ao Compromisso – A Postura do Hábito 2 - As imagens aqui apresentadas foram recolhidas do evento “Arouca, a História de um Mosteiro” que anualmente, no mês de julho, se recria naquele Mosteiro.

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A devoção à Beata e Rainha Mafalda com preces e procissões pelo claustro e interior do Mosteiro

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Cadeiral - Música e oração, a aproximação ao divino

A leitura de escritos religiosos, um privilégio das mulheres do Mosteiro

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Botica, o espaço onde se confecionam as mezinhas para a cura do corpo

Enfermaria - Espaço de cura e repouso do corpo

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O Sustento - Forno grande...

… e mesa farta.

Locutório - O canal de comunicação para o exterior, contacto com familiares das Monjas

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A Casa do despacho ou Casa da Grade - O canal de comunicação com o exterior onde Procuradores e Abadessa trocam informações de gestão dos bens

Hora de Labores

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O Celeiro - Espaço de armazenamento de foros e mantimentos

Obrigações terrenas do dia a dia

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A liderança Monástica na Administração Municipal:

No dia de Santo Estevão, a cerimónia de aberturas dos Cofres das Justiças que hão-de servir o ano seguinte3

No primeiro dia de cada ano, a cerimónia Juramento e entrega das Insígnias Régias e das Varas das Justiças ao Juiz e Vereadores 3 - No concelho de Estarreja o ritual repete-se, mas com o Ouvidor a substituir a Madre Abadessa, por poderes que lhe foram conferidos. Isto até 1834, altura em que se extinguem as ordens religiosas e as câmaras elegem-se pela população mais abastada. Ficando então estabelecido que os conventos ou mosteiros seriam extintos por óbito da última religiosa, sendo os bens da instituição incorporados na Fazenda Nacional. O que aconteceu no Mosteiro de Arouca em 1886.

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Pela Roda dos Expostos recebem os enjeitados e desvalidos

Oferecem as esmolas aos pobres e mendicantes

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Claustro - Espaço que cerca e defende, de diálogo e de recolhimento

Claustro - Outro brilho no escuro

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Capitulo, espaço de reuniões e decisões da ordem. Ao fundo no centro a Madre Abadessa

A Madre Abadessa na sua cadeira de suprema - “Abelha-Mestra da colmeia”. A pequenez da sua estatura contapesa a grandeza do seu poder.

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Túmulo e altar da Beata e Rainha Mafalda Sanches na ala direita da igreja do Mosteiro e Matriz da Paróquia de Arouca4

4 - Beatificada a 27 de junho de 1793 pelo Papa Pio VI.

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Fontes Documentais: -Foral do Lugar e concelho de Antuaã, do Mosteiro de Arouca dado pelas Inquirições.| 1519 |Leitura Nova | Livro 47| Livro dos Forais Novos da Estremadura. FL 243, 243V, 244. Arquivo Nacional Torre do Tombo. - Livro de Registo de Protocolo das Audiências da Câmara de Estarreja – 1812 - Arquivo Municipal de Estarreja. -Processos de Aforamento de Santo Amaro. 1787, pasta 1, registo 001. Arquivo Municipal de Estarreja. -Memorias Paroquiais de 1758 – Paróquia de Beduido, Concelho de Estarreja. Arquivo Nacional da Torre do Tombo. -Mercê de D. João VI para a Criação do mercado da Praça de Estarreja. 1812. Arquivo Nacional da Torre do Tombo| Fundo do Mosteiro de Santa Maria de Arouca. (imagem de diapositivo cedida por Sr. António Augusto Rodrigues). -Lembranças de bolos que se devem fabricar e distribuir em certos dias de Circunstancia – [181?]. Arquivo do Mosteiro de Santa Maria de Arouca. Arquivo Nacional da Torre do Tombo. Fundo do Mosteiro de Santa Maria de Arouca -Termo de como as Justiças da Vila de Arouca receberam Juramento,Varas e Insígnias Régias para o ano de 1834. Atas da Câmara Municipal de Arouca de 01/01/1834. Arquivo Municipal de Arouca. -Termo de como se abriu o cofre e pelouros da Justiça que há-de servir no ano de 1834. Atas da Câmara Municipal de Arouca de 26/12/1833. Arquivo Municipal de Arouca.

- Plantas do Edifício do Mosteiro de Arouca, panfleto promocional do Mosteiro de Arouca. Instituto Português do Património Arquitetónico.s.d. Porto.

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COISAS DE CANTADORES

Sérgio Paulo Silva *

(Prefácio à 2ª edição do livro de João Sarabando “Marques Sardinha e Maria Barbuda Ao Desafio” De 1950 a 1964 a minha família passou sempre as férias de Verão no 1º andar duma casa de larga varanda, sobranceira à Ria, que os meus pais alugavam ao ano, casa que existe ainda, sem alterações, no coração da Torreira. Íamos para lá em Julho, e como era costume, só regressávamos depois do S. Paio, em Setembro. Esse tempo, coincidente com a minha infância e juventude, era muito diferente daquele que hoje se mostra a qualquer pessoa que passe por aquela praia ou pelas festas do S. Paio. Por então não existir estrada para Norte, porque a ponte da Varela tão pouco estava construída e por uma miríade de coisas que, muito embora fosse talvez interessante relembrar, não importam ao momento. Então, as festas do S. Paio, eram o ponto mais alto de quanta festividade, religiosa ou pagã, se faziam no Concelho, ou em todos os Concelhos à volta. Para ali concorriam milhares de pessoas que atravessavam a Ria em barcos moliceiros, mercantéis ou simples bateiras de pesca ou de ervagem. “Na festa de S. Paio, a grande romaria da gente ribeirinha, a Ria coalha-se de barcos que provêm de todas as freguesias marginais. Abundam os moliceiros lindamente embandeirados, com sinais distintos para que os tripulantes os reconheçam quando, encostados uns aos outros, formam, na Torreira, a frota da alegria. …Tocam violas e harmónicas a dar a toada às raparigas que cantam em coro, baladas langorosas e dolentes. Os barcos seguem não longe uns dos outros e quando o vento ajuda, alguns tiram-no com a vela ao que os acompanha, à recaxia, com protestos raras vezes indignados e por vezes com despiques em cantares quando a canção ribeirinha da “Caninha Verde” pede resposta em verso a quem desafia. “ (Prof. Dr. Egas Moniz, A Nossa Casa) A tudo isto eu assistia da varanda ou pela avenida que separa a ria do areal oceânico.

* Autor Estarrejense

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Não havia barco que não trouxesse a alegria da música, com destaque para as concertinas, bandolas, braguesas e instrumentos de sopro ou banais pandeiretas. Aquela gente saltava dos barcos para terra a tocar e a dançar formavam-se rusgas por todo o lado e todos acabavam por se envolver no espírito da romaria. Datam desses anos as minhas primeiras impressões de cantares ao desafio. Naturalmente que quase irreais: eu era uma criança com outras solicitações e outras fantasias. Já só mais tarde, embora ainda em plena juventude, é que assisti a um descante. Foi num lugarejo da Branca (Albergaria-a-Velha) onde tinha que estar presente por ainda não ter quereres. Uma banda arreliadora deu lugar aos cantadores, que se esgrimiram no coreto. Não sei quem eram mas não mais pude esquecer essa noite, nem todo o ambiente que se gerou em torno dos cantadores. De resto eu tinha uma grande simpatia pela cigarra que levava o Verão a cantar e a folgar e abominava a cinzenta escravatura da formiga. A moral depois, sei-o bem, era cruel. Era, mas já não é. As cigarras continuaram com o seu sacrifício, em nome da alegria a temperar de cor a vida e ganham fortunas. As humanas, porque as da fábula permanecem apegadas à sua exuberância sexual e sujeitas à crueldade das invernias. Algumas vezes, porém, se assemelham, se igualam umas às outras. Ouvi falar disto a muita gente à medida que o tempo foi passando. Porque as mudanças nem sempre agradavam aos mais velhos que invariavelmente se valiam da memória para argumentarem e se oporem a modas que se impunham. Assim ouvi falar desta ou daquela “cigarra”, assim as fui conhecendo. Dizia-me meu sogro que dois pipos e uma tábua serviam para o Marques e a Barbuda armarem palanque enquanto, outros rebuscavam quadras na memória. Miguel Torga cedia também ao fascínio desta gente. Do seu “Diário :” Gerez, 25 de Julho (1943): Aqui apresento ao leitor benévolo o João Cantador, ou seja o Nijinski do Minho. Nasceu em Rio Calvo, nunca foi vencido em desafios de cavaquinho e de malhão, funda na Bíblia as suas réplicas, e é de verdade um bailarino extraordinário, único, que só a nossa incultura consente se perca por estas serras a embebedar-se com vinho verde”. O escritor Tomaz de Fonseca havia já anteriormente chamado a atenção do país para um cantador invulgar, cavador de profissão, Manuel Alves, de sua graça, e elaborado um interessante livro com algumas das suas poesias (Versos d’um Cavador, Coimbra 1900), parca amostra, de resto, para quem tanto versejou de terra em terra. Manuel Alves em vida não teve a sorte das cigarras de hoje. Ele próprio o diz com indisfarçada mágoa: Quando o poviléu se junta Em terras em que sou estranho São as honras que eu apanho “Canta bem o filho da puta!” O filólogo Manuel Rodrigues Lapa haveria também de apreciar a poesia do cavador Bairradino que mereceu honras de busto em praça pública. [ 254 ]


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E, por falar nisso: numa tarde de Verão passeando nos jardins onde o Guadiana se acaba, vi dois bustos e fui ver de quem eram. Um, de mulher, estava vestido pelo escultor, de finas e trabalhadas roupas que sugeriam opulência, era de Lutegarda Guimarães de Caires, ao que lá se referia, poetisa. Fiquei de imediato a remorder a minha ignorância. Nunca tinha ouvido falar, nada tinha lido que a senhora tivesse escrito nem jamais a vira sequer referida em quanto livro me tem passado pelas mãos; o outro busto era dum homem, antigo cauteleiro, quase analfabeto, que atravessou a vida resistindo, sabe Deus como, à pobreza e à tuberculose. Também poeta, usando o nome simples de António Aleixo que eu conhecia de muitas rimas, que o país inteiro conhece... Diz-nos Manuel Barros no prefácio ao livro Desde o Pão até ao Sol (Dionísio Gonçalves, C.M. Mértola 1996): “Qualquer tentativa de fixar em livro a produção de um poeta popular deixa de lado um aspecto que lhe é essencial: o ambiente que rodeia a recitação. A literatura oral destinase, por definição, a ser comunicada ao vivo. Não é feita para ser lida. O diálogo que se estabeleceu entre o poeta e o seu público, a entoação e a cadência da fala são insubstituíveis. Foi preciso esperar que o século XX fosse já bastante adiantado para que os nossos poetas populares começassem a fixar por escrito as suas composições. Até então, raramente eram os criadores populares a escrever o que imaginavam, mas sim alguém que os ouvia e dominava as regras da escrita.” Assim foi com aqueles e também com Marques Sardinha e a Maria Barbuda.

Marques Sardinha Cortesia de José Maria Branquinho

Maria Barbuda Fotografia de Artur Diegues

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Com muitos outros também, como são meros exemplos a recolha de Modesto Navarro (Poetas Populares Alentejanos ), os muitos voluminhos suportados pelas Câmaras Municipais ou essa maravilha dos sábados de manhã na Antena 1 que se chama Lugar ao Sul. O precioso trabalho de João Sarabando teve a sua 1ª edição em 1982 tendo-se esgotado em pouco tempo, tamanho foi o carinho e a curiosidade com que foi acolhido. O livro devolveu-me algumas manhãs submersas e impulsionou-me para outras leituras, para além de me ter mostrado o rosto mais real do Prof. Egas Moniz. Também me fez olhar com outros sentimentos essas “cigarras” anónimas, ou quase, que tem momentos como este: “… um latifundiário que, num banquete de convívio com os seus amigos, instado por estes, mandou chamar um seu criado, que sabia fazer versos, “para se rirem um bocado”. Contrariado, mas veio, o poeta popular Jaime da Manta Branca, que improvisou a seguinte quadra: É sempre a mesma canalha Que anda de banquete em banquete. Quem produz e quem trabalha Come açordes com azete. Ou como este outro, de que desconheço o autor por não estar referido: Sómente depois dos trinta devias usar pintura que a uva só se pinta quando vai para madura Entretanto fui-me dando conta que o livro de Sarabando continha algumas falhas e que era muito necessária a sua reedição. Da sua maior divulgação aproveitariam todos os que desconhecem o passado da nossa região e as nossas gentes e talvez, quem sabe?, pudesse motivar outros estudiosos que o viriam enriquecer com novos trabalhos. Nesse sentido escrevi ao autor que me respondeu a carta que reproduzo. Tencionava deslocar-me a Aveiro para falar pessoalmente com João Sarabando mas, por coisas da minha vida, fui adiando a visita que já não se viria a concretizar devido à sua morte. Pensei então que era minha obrigação nada alterar e tentar apenas enriquecê-lo com fotografias ou quadras que porventura tivessem escapado ao seu trabalho de pesquisa. Nesse sentido, publiquei um apelo em todos os jornais de Estarreja transcrevendo uma quadra do velho Marques (das que o prof. Egas Moniz chamaria das vermelhas) para aguçar o apetite dos possíveis destinatários do apelo: [ 256 ]


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Todo o pássaro bebe água só a coruja bebe leite mas a tua passarinha come carne e bebe leite E fiquei à espera de ecos. Mas, que poderia eu esperar duma terra que, na morte de João Sarabando lhe não dedicou, nos seus jornais ou na sua rádio, a mais pequena palavra? Couberam-lhe os mesmos louros que haviam cabido ao cantador Manuel Alves… Apenas uma carta, com um recorte de jornal, me chegou de Guilherme da Silva, emigrante em Ontário, Canadá. Inúmeras cartas que entretanto escrevi, ficaram sem resposta, nalguns telefonemas colhi promessas rapidamente esquecidas. Através dos serviços culturais da C.M. chegou uma carta simpática do Pároco de Válega, José António que nos encaminhava para o Pe Manuel Pires Bastos e para o Pe Aníbal Duarte, pároco de Guilhovai. Aquele com um trabalho interessante sobre a Margarida Rei, que complementa e corrige alguns pontos da obra de João Sarabando, e este com um arquivo sonoro inexplorado de vários cantadores. Com o Pe Aníbal me demorei alguns serões conversando sobre estas coisas, agradáveis serões sobretudo pelo entusiasmo e saber com que ele falava dessa sua paixão pelos cantadores. Deu-me a conhecer melhor a Maria Rocha e o Teixeira (abro parêntesis para chamar a atenção do leitor para o facto de J. Sarabando ter referido como entre os que colaboraram com Marques Sardinha, Rocha Teixeira de Guilhovai, Ovar… ora não era um mas dois: António Vieira Leite, conhecido por Teixeira, nascido em 9/9/1892 e falecido em Julho de 1979 e Maria Olinda dos Santos Silva, conhecida por Maria Rocha, nascida em Macieira, Vila do Conde, a 29/6/1903 e falecida em 28/12/1982 em França, depois de ter vivido em Guilhovai, e Silvalde, Espinho. E tudo começou quando um dia o Teixeira foi cantar com a Deolinda lá para os seus lados, perto de Vila do Conde. Pediram ao cantador vareiro que a deixasse cantar um pouco. Ora, a certa altura o Teixeira, informado que a estreante era já mulher casada, disse-lhe que por isso ela tinha perdido a coisa mais preciosa que tinha. A resposta foi pronta: Eu perdi a virgindade mas não perdi a minha honra eu apenas fiz os ninhos para se agachar a pomba eu casei-me fiz os ninhos reparti a virgindade por todos os meus filhinhos Começava assim a nomeada de Maria Rocha. Quem recordava estes momentos era um filho do Teixeira, já falecido no Brasil, que acrescentava outro episódio. Cantando com o Pinho, que dizia gostar de ter muitas mulheres: [ 257 ]


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És comparado ao chupista com o saco vais p´ró frete tanto aceita esmola de milho como esmola de molete tu és como o Gugunhana que dizem que queria sete É o Pinho de S. João ao pé da Rocha sentado ó meus senhores desculpai o eu ter desmariado mas então o Pinho servia para cobridor do Estado Noutros momentos o Teixeira também tinha que pagar caro: Já vejo neve na serra são os teus cabelos brancos tu agora já não matas nem lavercas nem lavancos a tua arma Teixeira só atira p´rós tamancos A procura do teu fruto Fui á tua sementeira vi lá num pau engalhado uma farpela inteira tinha calças e casaco era a farpela inteira tinha chapéu na cabeça eu disse: ali está o Teixeira Lá na tua barbearia já é muito comentado que a navalha do Teixeira já tem o fio virado Estas pérolas chegaram-me às mãos pela amizade e confiança do P. Aníbal mas, como é natural, é a sua filha Maria Albertina, e o marido, residentes em Espinho, que mais veneram a sua memória. Possuem um arquivo de dezenas de bobines e de cassettes com descantes feitos um pouco por todo o lado, com vários cantadores, material a merecer o devido estudo e ampla divulgação.

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Dos dois cantadores, copiou-me o Pe. Aníbal uma cassette que possuía por obra do acaso, gravada em 25/11/71, numa festa da família F. Ramada, de Ovar. Segundo me contou o Pe. Aníbal, todo o entretenimento foi gravado em 4 cassetes. Perderam-se três, restando uma e, mesmo essa, com a cabeça cortada num lado e os pés cortados no outro. Apesar disso se transcreve apenas como amostra para que os mais novos possam saber como era. Na primeira parte ela, Maria Rocha, é a Pedra e ele, Teixeira, é o Pau; na segunda ela é o Amor e ele o Dinheiro. Vão com ???? as palavras imperceptíveis, seja pela má qualidade da gravação, seja pela má dicção dos cantadores. O restante fala por si. Maria Rocha: De pau é a trave mestra e se pau é a tesoura as terças e os frechais as ripes como o cumo eu ainda posso com mais que pró chapéu se segurar é na força dos meus ombros se não fosse a minha pedra eras ruínas escombros Teixeira:

A obra está pronta De parede e de telhado está a casa completa de parede e de telhado agora tem de ser fechada onde eu tenho o meu cuidado lá se vão preparar as portas e caixilhos nas janelas mas tudo à minha custa eu hei-de-te apertar as costelas

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Não abras tanto as goelas Armado num pau mais forte Não abras tanto as goelas Não abras tanto as goelas Que eu sou segurança das portas Assim como sou das janelas E estas se só são de pau É duplicar a tua cruz Porque buracos tapados, a pau Fica numa casa sem ?????

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Se a casa assoalhada???? Levam linhas de madeira Para pôr debaixo do soalho Que estas linhas de madeira Lá vão as tábuas pregar-se Tudo à custa do Teixeira O pau assoalha a casa E também bota os varredores Já vês que o pau do Teixeira Mostra sempre os meus valores Se de pau é o travejamento Se de pau é o travejamento Que há-de preceder o soalho Que há-de receber o soalho A parede é manto amigo É que lhe faz agasalho Por isso na tua natureza Com a minha força governa O pau apanhando chuva apodrece Como apanhando sol empena Mas ainda há mais A casa é repartida Toda em salas e quartos A casa é dividida Cada repartição tem uma porta Aonde eu dou a vida Nunca vistes portas de pedra É sempre portas de madeira Todas tiradas do pau Que pertence a este Teixeira Todas as dependências da casa Todas as dependências da casa São necessárias????? São necessárias uma porta Mas mesmo estas vão servir Agora p´rá tua derrota P´ra uma dependência ser fechada A chave num é de pau Como não são as fechaduras O tempo está-se a tornar mau


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Eu entrego-te a casa P´ra saberes quem é o Teixeira Entrego-te a casa a ti mesmo P´ra saberes quem é o Teixeira Inda te vou preparar A mesma por via inteira Para pores na tua casa A mesma mobília inteira Vais ver quanta cousas faz Aqui o pau do Teixeira

E tudo deixo ao teu dispor Para mobiliares a casa Tudo deixo ao teu dispor Tudo deixo ao teu dispor Que a onde o pau chegar Precisa do teu amor Há mobiliário moderno Que resiste mais que o teu E tu ainda invejoso Por não alcançares o que é meu

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Na tua sala de visitas Ponho-te uma mesa no cento Feita de pau do Teixeira Ponho-te uma mesa no cento Um sofá e muitas cadeiras Nem que sejam mais dum cento Ponho-te colunas de canto Ponho-te???? Na parede Que é tudo feito do meu pau Que é p´ra eu te caçar na rêde

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É na sala de visitas É na sala de visitas Que é dado o pechinché Que é dado o pechinché Guarnecido a pedra mármore Por todo o que o pau não é E por eu te jogar a carta Teixeira não faças reparo Aonde chega a pedra mármore O móvel é sempre mais carro

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No quarto de dormir Eu vou-te rasgar o segredo No teu quarto de dormir Vou-te rasgar o segredo Pus-te lá porta bem vedada P`ra tu estares lá dentro sem medo E estares à vontade P`ra muita ou pouca demora E cobrires o teu segredo E ninguém o saber cá fora

Eu sou um pouco esquisita E por esta justa razão Não quero que o pau de borne Eu não quero que o pau de borne E muito menos se a porta é feita Teixeira com o pau de borne Que é de natureza mole E o ratos abre buraco P`ra te poder dizer qui Todos os paus são fracos

Mas inda há mais Abre bem os teus sentidos Do que requer o quarto de dormir Abre bem os teus sentidos Requer uma boa mesa E requer um guarda-vestidos Pois é o pau do Teixeira Que te vai pôr à vontade Tudo o que tu lá precisas E o pau tem sempre liberdade É no quarto de vestir Que está o guarda-vestidos Com uma porta de cristal Com uma porta de cristal Que tal móvel só de pau É useiro em Portugal No entanto ai tens mais a prova De que procuras Que além de ser mais caro Faz mais música que figura


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P´ra tu dormires à vontade E estenderes-te toda tesa Na tua cama de noite Estenderes-te toda tesa Não te dei cama de pedra Mas é de pau à moda francesa E é destas camas modernas Que de noite faz chiadeira E quem na há-de fazer chiar É a Rocha a mais o Teixeira MR

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E eu num quero camas de pau E eu num quero cama de pau Nem da de estilo à francesa Mesmo da de estilo à francesa De ordinário as camas de pau São as que cria a bicheza Onde atacam o Teixeira Agora que defender-te num podes Deitar-te na cama que eu durmo Não é para os teus bigodes Até o povo se admira Da grande ingratidão tua Pelo meu oferecimento A grande ingratidão tua Se te eu não desse uma cama de madeira Tinhas de dormir na pedra nua Vê lá bem, Maria Rocha, Se eu não desse a cama de madeira… Havias de me agradecer E beijar os pés ao Teixeira Nada tenho a agradecer E em nada és favorito Nada tenho a agradecer E nada te tenho a agradecer Que vou à Avanca à fábrica Adico Que tem também camas de ferro Para vender Que eu não preciso de ajudá-lo Nem das de luxo tenho desejo Pois são as camas de pau As que criam percevejos [ 263 ]


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Na tua sala de jantar Preparei-te uma mesa comprida Toda feita do meu pau Uma mesa bem comprida Com muitas cadeiras ao lado Eu preparo a tua vida E a um lado um bom louceiro P´ra tu guardares a louça Que foi tirada duma árvore Criada na minha bouça Eu tenho louça de pó de pedra Eu tenho louça de pó de pedra E louça de porcelana E louça de porcelana Sirvo-me com uma ao domingo E com outra à semana Prescindo da mesa de pedra À hora duma refeição Hei-de dar uma pia de pedra Para não dares com o focinho no chão Olha Maria Rocha Se me deres uma pia de pedra Para eu comer o meu alimento Faz assim desta maneira Põe uma separação ao meio Para servir p´ra ti e pró Teixeira A pia dá para dois E tu dás conta do recado É uma alegria p´ra ti Teres o Teixeira ao teu lado Num está a ficar nada jeitosa O teu projecto nada jeitoso Num está a ficar nada jeitoso Num está a ficar nada jeitoso Eu comer na mesma pia do porco Tu és um porco vaidoso Além que não entras com as pedras Porque as pedras são valentes Se o gamelo fosse de pau Até o roías os dentes


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Agora vamos à cozinha Ao cantinho da lareira Que a um canto da cozinha Chama-se o canto da lareira Onde ali se acende o lume Para aquecer a família inteira Mas o lume não se acende Se não for o meu pau Aí tens o valor que eu tenho E vai dizer que eu sou mau O pau arde na fogueira E a pedra recebe o calor Mesmo depois de estar extinguido Mesmo depois de estar extinguido Já nada formas em pau Mais te valia não teres nascido Todo o pau se tornou em cinza É como o Teixeira se explica Tantos paus por ela tem passado Mas a lareira sempre fica Na casa dum lavrador Como Rocha também és Na cozinha dum lavrador Como tu Rocha também és Precisa duns banquinhos ao lume Quando quiseres aquentar os pés Ou seja um banco mais comprido Ou mais pequenino como é costume Pois é à custa do meu pau Que tu apanhas calor do lume De maneira que és pobrezinho Mais uma firma para te mostrar Da maneira que és pobrezinho Da maneira que és pobrezinho Vou-te contar o que aconteceu Há dois meses ao meu vizinho Que sentado num banco alto Caiu partiu uma perna e ficou mal Lá vai o carro da bomba Busca-lo pró hospital [ 265 ]


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Também ali há uma mesa Todos usam dessa moda Haver uma mesa na cozinha Todos usam essa moda P´ra se sentar o chefe da família Com os filhinhos em roda Igualmente a sua esposa Ali se senta a família inteira E todos se consolam de comer Sobre o pau do Teixeira Eu também possuo uma mesa Eu também possuo uma mesa Que destes o pau p´ra ela Que destes o pau p´ra ela Mas eu tive de dar p´ra tua Um prato e uma tigela Um garfo e uma colher Para quando é chegado a maré Mas isso tudo é meu Porque nada do teu pau é

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Na mesma casa do lavrador Que é costume amiúdo Cozer-se pão nessa casa Pois é costume amiúdo Mas é preciso aquentar o forno E é o Teixeira quem faz tudo É o meu pau quem aquenta o forno E quem vai cozer o pão Que o bota p´ra dentro e o tira p´ra fora Olha quantas coisa são

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Tu disseste que eu ouvi Que em casa do lavrador Uma mesa faz adorno Uma mesa faz adorno E que eras o pau que ardias Para aqueceres o forno E vai aquecendo pouco a pouco Quando em???? Para lá vais E vai do pau sucumbido Sai do forno os teus restos mortais

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Na hora da refeição Pode a mesa ter fartura Pode a mesa ter fartura Mas ainda inda é ideia minha Que a comida vale pouco Se lá não tiver uma pinguinha Lá temos nós de ir à adega Ver as pipas com aduelas Feitas todas do menu pau E trazer o que está dentro delas

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Agora chamaste-me à adega E eu tenho lá que te mostrar E eu tenho lá que te mostrar Sou a pedra da espremedeira Sou a pedra do lagar Eu sou a pedra dos sulfatos P’ra se conservar a vinha E se tens as pipas cheias É tudo às custas minhas

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Eu falei no vizinho Mais uma razão pró Teixeira P’ra haver sempre vinho na mesa Mais uma razão pró Teixeira O vinho não s cria nas pedras Mas cria-se na videira Também é pau sim senhor Que é o que nos dá de beber P’ra saberes que eu te tenho valor.

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Tu contra mim estás oposto Na defesa da tua tese Tu contra mim estás oposto Tu contra mim está oposto Mas há pau que tem mazela E que no vinho deixa gosto Porque as pipas ganham sairro E lá vai a pedra de soda Aperfeiçoar o pau Agora fica à tua moda.

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Voz da Rocha: Encontramo-nos aqui os dois, a cantar uma desgarrada, com o meu colega Teixeira, com 68 anos… com 79 anos de idade… no dia 25 de Novembro de mil novecentos e trinta… e noventa e… setenta e um, porra, setenta e um. Precisamente há trinta anos, superior a isso, que cantamos os dois, embora variando ele e eu com outros colegas. E agora vamos formar outra nova desgarrada. Voz do Teixeira: Primeiro eu quero dizer também que há trinta e tantos anos, talvez há trinta e cinco anos ou trinta e seis anos que eu encontrei pela primeira vez esta mulher. E no decorrer dos anos temos tido muitas desgarradas, centos de desgarradas e sempre com boa vontade para mais. E por isso já que nos encontramos hoje aqui vamos a nova desgarrada. Teixeira:

Falai-me à desgarrada E estou pronto ao serviço Fui o primeiro a entrar Estou pronto ao serviço Mas quero-te préguntar Se estás pronta para isso Porque p’rá desgarrada Um só não vale Tem de ser à custa dos dois E o trabalho é igual.

Maria da Rocha: Já nasci p’ra desgarrada Já nasci p’ra desgarrada E a desgarrada não é fado E a desgarrada não é fado São palavras instantâneas Que o caso não pode ser pensado E muito menos corrigido Porque são obras da maré Há muita gente que num dá valor Por não saber o que isto é T

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Fala-se em desgarrada Mas é preciso compreender Este modo de desgarrada Que é preciso compreender Muitas vezes perguntar E muitas vezes responder E é preciso marcar aqui Essa dita desgarrada Vê se marcas Maria Rocha Ou se sou eu que dou a entrada


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Tenho de andar pelo meu lado Tenho de andar pelo meu lado Em cantigas ao desafio Em cantigas ao desafio Da parte que me pertence O lugar não está vazio E quanto ao assunto a seguir Há pouco ouvi do lado Seja o amor e o dinheiro Agora vê se estás preparado

T

Ah a Maria Rocha teve boa lembrance Falar no amor e no dinheiro Teve uma boa lembrança Mas ainda estou sem saber Qual é aqui a tua esperança Se é ficar com o dinheiro Ou se é ficar com o amor Eu aceito o que num queres P’ra mim tudo tem valor

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E eu vim ao mundo p’ra gostar E eu vim ao mundo p’ra gostar Das coisas dentro da linha Das coisas dentro da linha Como foi aqui a marcar A escolha não é minha Embora pelo dito de alguém Mas a escolha não é minha Eu quero que alguém me chame Comadre mãe e madrinha

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Nisso tens razão pois quem marca não escolhe Pois quem marca não escolhe A escolha pertence-me a mim Vou-me apegar ao dinheiro que foi p’ra isso que eu cá vim Não é por eu ser egoísta Mas é assim que o Teixeira quer P’ra poder deixar o amor Pela parte da mulher

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Reservas p’ra mim o amor Reservas p’ra mim o amor Porque o entendeste por bem Porque o entendeste por bem Eu ainda hoje me recordo Dos carinhos da minha mãe E dos sacrifícios do meu pai Que derramou tanto suor Para me criar no mundo Foi uma prova do seu amor

T

Eu escolhi o dinheiro Mas fica a saber a certeza Que eu sou-te desenganado Fica a saber a certeza Lá por eu escolher o dinheiro Nem é por eu amar a riqueza É só para fazer bem É só para te livrar do perigo Porque todo o dinheiro que eu tenho Eu vou-o gastar contigo

MR

Então vai abrindo a carteira E o cofre que tens em casa Tu vai abrindo a carteira Para poderes acudir Às necessidades da cantadeira Mas se tu tens dinheiro junto Pouco ou mais seja quanto for Se o trazes amontoado É porque lhe reservas-te o amor

T

Em primeiro quero-te dizer Que tu não eras ninguém Se eu não fizesse o que fiz Rocha não eras ninguém Que eu com o dinheiro formei um casamento Ao unir o teu pai à tua mãe Eu formei esse lar Fiz-lhe a casa p’ra viver Aí tens o valor do dinheiro E tu ainda mais vais ver

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E espero por ti ó cantador Dizes trazer muito p’ra mostrar Espero por ti cantador Espero por ti cantador Meus pais gastaram dinheiro para casar Foi verdade sim senhor Pagar à igreja e ao estado Foi verdade sim senhor Mas muito antes do casamento Um ao outro juraram amor

T

Nessa casa que eu lhe fiz Havia uma cama p’ra dormir Havia uma cama p’ra dormir E disto não digo nada Mas foi nessa cama Que eles formaram a união sagrada E dessa união dos dois É que a Rocha foi concebida Dentro da casa que eu fiz P’ra te dar princípio de vida

MR

Sei que o dinheiro foi preciso Sei que o dinheiro foi preciso Com razão p’ra se gastar Com razão p’ra se gastar Mas foi o amor de amor de meus pais Que conservaram o lar Quando esperavam por mim Tudo puseram ao meu dispor Para que quando caísse no mundo Já sentir o seu amor

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Passado algum tempo Tua mãe veio ter com teu pai Ela veio ter com teu pai E disse-lhe muito bem Marido prepara a carteira Que brevemente eu vou ser mãe Que já sinto dentro de mim Alguma coisa formada Que era o princípio da Rocha Que hoje num está calada [ 271 ]


SÉRGIO PAULO SILVA

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Calada não posso ficar Em vim aqui p’ra discutir Calada não posso ficar Calada não posso ficar Minha mãe sentiu-se puxada E tratou de se preparar Transmitindo ao meu pai Em breve o nascimento Pois quando nasceu a novidade Nasceu o amor ao mesmo tempo

T

Um dia teu pai e tua mãe Meteram dinheiro p’ra carteira Contando com a vida deles Meteram dinheiro p’rá carteira E p’ra comprar um enxoval Foi à custa do Teixeira Compraram ali muitas coisas P’ra se defender do perigo E tu saberes que ainda num Estavas no mundo E eu já gastei dinheiro contigo

MR

Mas não é a ti que agradeço Mas não é a ti que agradeço Nem também aos teus capitais Nem também aos teus capitais Caí um dia no mundo Embrulhada no amor de meus pais E a partir da minha conceição Principiaram a dar valor À obra que estava formada Quem fez isto foi o amor

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Passaram-se os nove meses Isto não é brincadeira Passaram-se os nove meses Isto não é brincadeira Tua mãe pr’a não dar à luz sozinha Convidou uma boa parteira Uma mulher diplomada Com o nome de parteira Mas não veio trabalhar por amor Quem lhe pagou foi o Teixeira


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Chega à hora da maternidade Chega à hora da maternidade Minha mãe reclama a parteira Minha mãe reclama a parteira Meu pai já estava preparado Com dinheiro na carteira Tu contavas os escudos Meu pai as gotas de suor Que amealhou na carteira Mas quem fez isso foi o amor

T

Mas o teu pai vendo Que a tua mãe sentia grande dor Na hora do dar a luz Sentia uma grande dor Não se ficou na parteira Mandou logo chamar um doutor Que veio ganhar dinheiro Mas veio valer à tua mãe Vê lá inda tu não tinhas nascido E eu já te fazia muito bem

MR

o meu paizinho já parecia A hora surgir funesta E ele logo a correr vai E ele logo a correr vai Para chamar a parteira Arrastado pelo amor de pai Que consagrava ao pequeno E à sua esposa querida Portanto é o amor O maior tesouro da vida

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Logo que nascente Ficaste nos braços da parteira pois logo que nasceste ficaste nos braços da parteira que preparou-te o teu corpinho dez assim dessa maneira trabalhou muito bem e o doutor da mesma maneira mas tudo foi pago por mim com o dinheiro do Teixeira [ 273 ]


SÉRGIO PAULO SILVA

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E eu assim vim crescendo E eu assim vim crescendo Pr’a tudo o que tinha nascido Pr’a tudo o que tinha nascido Meu pai a nada se poupou Com o amor de marido Dedicou o amor de pai Foi verdade ó Teixeira Mas se o dinheiro pagou ao doutor O amor abriu a carteira

T

O teu pai teve canseira De te ir registar no civil De te ir registar no civil E disse desta maneira Sabe que eu sou pobrezinho Não queria pagar a conta inteira Mas o oficial do civil Disse vá embora seu cavalheiro Aqui não se trabalha por amor Só se trabalha por dinheiro

MR

Eu já percebo bem disto Segundo o que tu apresentas Eu agora percebo bem disto Eu agora percebo bem disto Favorecer a humanidade Num é o legado do registo Mas procurando a vara Baptizar-se e casa-se de graça Porque o governo abona O povo da sua raça

T

Passados dias teu pai Viu a tua mãe chorar na cama Pergunta porque ela chorava Que estava a chorar na cama Disse não tenho leite p’rá nossa filhinha Teu pai foi convidar uma ama Lá veio essa mulher atendendo ao teu pai cavalheiro Mas ela não veio dar leite por amor Só dão leite por dinheiro

[ 274 ]


TERRAS DE ANTUÃ | HISTÓRIAS E MEMÓRIAS DO CONCELHO DE ESTARREJA

MR

Minha mãe tinha as veias secas Minha mãe tinha as veias secas Sem leite para me dar Sem leite para me dar Mas meu pai tomou as medidas E vai uma ama procurar Mas p’ra saber se era competente Foi com ela pró doutor Só p’ra não matar a filha Quem manda isto é o amor

T

Teu pai resolveu outra coisa Não quis saber da mulher Não quis saber da mulher E meteu dinheiro na carteira e resolveu comprar uma vaca e lá foi comprá-la à feira também comprou um biberão quando comprou a vaca na feira p’ra ter leitinho à vontade mas tudo à custa do Teixeira

MR

Todo o filho que vem ao mundo Deve favor aos seus pais E muitas delicadezas E muitas delicadezas Assim como o meu pai fez Que não se poupou a despesas Arrancou do bolso p’ra fora Todas as gotas do seu suor E manifestou à minha mãe O pobre do seu amor

T

Mas a Maria Rocha que era muito choradeira Não se contentava com leite Que era muito choradeira A mãe então comprou-lhe uma chupeta Que se chama uma entretideira Eu dei o dinheiro p’ra ela P’ra comprar a entretideira E lá ficou a Rocha a chupar Naquilo que era do Teixeira

[ 275 ]


SÉRGIO PAULO SILVA

MR

A minha mãe não foi peca Desvelada de amor por mim A minha mãe não foi peca A minha mãe não foi peca O meu pai dar-lhe dinheiro Para comprar uma ama-seca Porque uma tal enganadeira Porque é uma ama-seca Diabos leve o Teixeira Com aquilo que comprometa Com aquilo…….

A cassete termina aqui por não possuir mais fita. Pela minha parte, não gostaria de terminar este já longo prefácio sem transcrever uma notícia inserida no jornal O Concelho de Estarreja de 16/09/1922: Festa Interessante O Sr. Dr. Egas Moniz e sua ex.ma esposa, snr.a D. Elvira Egas Moniz, ofereceram ontem na sua Casa do Marinheiro uma excelente soirèe em honra da Srª D. Estefânia Macieira que passou nesse dia o seu aniversário e que decorreu animadíssima. Depois da magnifica ceia que terminou pelas 2 horas da manhã na formosíssima sala de jantar, houve a agradável surpresa de um descante popular ao desafio para o que foi convidada uma excelente cantadeira do Couto, a afamada Deolinda, e o célebre Marques Sardinha que o nosso povo costuma chamar o cantador real por ter, há anos, ido a S. Pedro do Sul, cantar numa festa a que assistiu a Rainha D.Amélia que lhe ofereceu um relógio de oiro, como demonstração do muito que o apreciou. Houveram-se ambos com imensa galhardia tendo também deliciado o auditório o acompanhamento de violas e harmónio que animaram o descante. Os convidados começaram a retirar pelas 5 horas da manhã penhoradíssimos com os donos da Casa que, como é de uso no Marinheiro, os encheram de atenções. Entre a numerosa assistência lembra-nos ter visto as ex.mas Sr.as D. Estefânia de Macedo Dias Macieira, D. Maria José de Bourbon de Abreu Freire, D. Rosália Corte Real, D. Maria Amélia Gama, D. Maria Luiza Veiga de Abreu Freire, D. Maria da Anunciação Marques Hespanha de Rezende, D. Maria Mafalda de Lima e LemosVaz Monteiro, D. Maria Cândida de Azevedo Bourbon de Abreu Freire, D. Maria Matilde Macieira, D. Maria José Maria Freire de Andrade, D. Maria da Conceição de Lima e Lemos, D. Maria Elvira Macieira, D. Adelaide Maria de Azevedo Pereira Couto Brandão, D. Amélia de Abreu Freire, D. Maria Augusta Gama, D. Aldina Silveira Camelo, D. Maria Amélia Gama, D. Maria Luciana da Silveira Camelo, e os srs. Dr. José Maria de Abreu Freire, Dr. António de Abreu Freire, Dr. Manuel de Castro Corte Real, Dr. Armando de Abreu Freire, [ 276 ]


TERRAS DE ANTUÃ | HISTÓRIAS E MEMÓRIAS DO CONCELHO DE ESTARREJA

José Marques Gomes, Dr. José Pereira Barata, Dr.AntónioTavares Afonso e Cunha,António Líbano Correia, Padre António Maria da Costa,Aníbal de Abreu Freire, capitão RicardoVaz Monteiro, Domingos Marques Hespanha de Rezende,Vasco Monteiro da Gama, Padre Manuel Tavares Garrido, JuliãoValente dos Anjos e João Camelo.

Marques Sardinha cantando com Guida Rei - Espólio Casa Museu Egas Moniz

Todos os nomes que o correspondente refere têm agora o odor de lápides. Da Deolinda do Couto, do Marques Sardinha, da Guida Rei ou da Barbuda de todos os outros restam os versos repentistas e a memória da alegria transbordante das suas vidas que arderam sem cuidar que o Inverno tem bem duras leis. Em qualquer sítio os encontramos, ao dobrar de qualquer página, num qualquer programa de rádio, anónimos muitos deles, tornados todos, pelo tempo, pela vida, não só no que somos mas também no que são outros povos. O prof. Manuel Viegas Guerreiro (Artes da fala, compilação das teses do Colóquio de Portel), apelava: “Proscreva-se, definitivamente, a falsa ideia de um povo inculto, porque não andou na escola, ou pouco a frequentou, de artes menores que inspiração, talento e ciência não são exclusivos dos doutores das letras”. João Sarabando tinha também disso consciência e, ao elaborar o seu trabalho, preservou uma identidade que, não sendo mais que na aparência regional, será sempre credora da gratidão dos estarrejenses. Sérgio Paulo Silva, Maio de 1999 [ 277 ]


SÉRGIO PAULO SILVA

Coisas de Cantadores – complemento – nalguns dias andados de Novembro 2013 O livro a que este texto serviu de prefácio esgotou-se e não se vê toca donde saia coelho. Os interessados nestas coisas ainda podem comprar os livros de António Maria Eusébio, o Poeta Calafate, de Setúbal, mas, por aqui, terão que esgaravatar por bibliotecas ou velhos alfarrabistas para encontrar o que os anos ainda não trituraram. Hoje as cigarras trinam de desvairadas maneiras e socorrem-se de colunas de som que ensurdecem o ar. Mas, naqueles outros anos, a cantoria tinha clientela q.b. para animar editores e era procurada pelas feiras e romarias. Quem não tivesse arte e engenho suficientes para versejar, podia na mesma animar os serões, ou as desfolhadas, lendo. Novas Cantorias para serem cantadas ao desafio entre MANOEL E MARIA, vendia-se por 60 Reis no Porto e em Braga...assim um pouco como as cartas de amor em que era só preciso pôr o nome da destinatária... Continuo, pois, a cavar...Mas, se com alguns é cada cavadela, cada minhoca, comigo é um esfolar de mãos para nada. Já depois do livro do J.S. estar inacessível esgotei tudo para conseguir uma foto da Deolinda do Couto. Nem a sobrinha e afilhada, que a assistiu até ao fim, tem memória de alguma vez ter existido... e deram-me a triste notícia de que a Rainha Senhora D. Amélia nada tinha anotado nos seus cadernos da cantoria havida nas termas de S. Pedro do Sul, ela, que anotava tudo... Portanto acho que devo desistir desta empreitada e desejar melhor sorte a quem ousar cavar em semelhante terreno.

[ 278 ]


TERRAS DE ANTUÃ | HISTÓRIAS E MEMÓRIAS DO CONCELHO DE ESTARREJA

EMIGRAÇÃO ESTARREGENSE NO ANO DE 1908 Teresa Cruz Tubby * Valter Santos **

O ano de 1908 viu desembarcar, nos portos brasileiros, 46,127 portugueses e do concelho de Estarreja foram registados 283 passaportes, num total de 326 indivíduos, escolhendo, a maioria, o Pará como destino. Um dos acontecimentos de grande impacto foi a Exposição Universal do Rio de Janeiro, ocorrida entre 11 de Agosto e 15 de Novembro, para comemorar o centenário do Decreto1 da abertura dos portos às Nações Amigas, e que teve Portugal como único país convidado. Para esta exposição contavam com a presença do Rei D. Carlos I que, devido aos nefastos acontecimentos desse ano, viu a sua vida esvair-se a 1 de Fevereiro. Mais de um milhão de pessoas frequentou essa exposição, onde estiveram reunidos 11.286 expositores brasileiros e 671 portugueses. Portugal esteve representado pelo Conde de Selir. A parte industrial foi instalada por Tomás Bordalo Pinheiro e a agrícola por Joaquim Belfort. Dois quadros com rendas portuguesas, confecionados por D.ª Maria Bordalo Pinheiro foram colocados no anexo português, assim como um centro de sala, em louças das Caldas, de Rafael Bordalo Pinheiro. Também quadros e esculturas decoravam o dito anexo, cuja decoração foi de Jorge Colaço. Esta exposição exibiu produtos naturais, industriais, artesanais e artísticos oriundos dos principais estados brasileiros e de Portugal.

* Investigadora, autora das obras Quinta e Casa da Botica, Banda de Música de S. João da Madeira 1860/2005; co-autora da obra A Misericórdia da Vila de Cucujães, 1937 – 2012. ** Investigador e jornalista, autor da obra Cucujães Antigo e Moderno; co-autor da obra A Misericórdia da Vila de Cucujães, 1937-2012 1 - Este Decreto foi dado a 28 de Janeiro de 1808, pelo Rei D. JoãoVI, que fora com sua família para o Brasil, quando se aproximavam as invasões napoleónicas, abrindo os portos brasileiros ao comércio internacional e pondo fim ao monopólio português.

[ 279 ]


TERESA CRUZ TUBBY | VALTER SANTOS

AVANCA Nome e estado civil

Idade

Escolaridade e profissão

Data, destino e nº de passaporte

Filiação

António Augusto da Silva Pires

18

Sabia escrever, lavrador

31-01-1908, Pará, nº 140

José da Silva Pires e Maria Valente de Jesus

António Joaquim Valente de Matos, cº

30

Sabia escrever, lavrador

13-03-1908, Pará, nº 656

Francisco Valente de Matos e Ana de Resende

António Maria de Bastos

29

Sabia escrever, 05-12-1908, empregado no comércio Manaus, nº 1477

António Maria de Oliveira, cº

37

Sabia escrever, negociante

11-05-1908, Pará, nº 1186

Izidoro de Oliveira e Joaquina Caetana Pereira

António Maria Pinto, cº

30

Sabia escrever, alfaiate

22-01-1908, Rio de Janeiro, nº 11

João da Cunha Pinto e Joana Rosa

António Pereira da Rocha

26

Trabalhador

29-07-1908, Rio de Janeiro, nº 206

António Pereira da Rocha e Joana Pereira Moreira

Augusto da Costa Malafaia

12

Sabia escrever, lavrador

3-07-1908, Rio de Janeiro, nº 1484

Albino da Costa Malafaia e Luísa Valente

Horácio Artur da Silva Tavares

12

Sabia escrever

07-03-1908, Pelotas, nº 537

Francisco da Silva Tavares e Ana Valente

João Dias, cº

26

Sabia escrever, alfaiate

22-01-1908, Rio de Janeiro, nº 12

Manuel Dias e Maria Pereira Martins

João Maria

22

Lavrador

21-07-1908, Rio de Janeiro, nº 147

António José Pereira e Maria de Jesus

Joaquim da Silva Fava Júnior, cº

39

Sabia escrever, lavrador

31-01-1908, Rio de Janeiro, nº 141

Joaquim da Silva Fava e Rosa Valente

Joaquim de Oliveira, cº

36

Sabia escrever, lavrador

06-07-1908, Rio de Janeiro, nº 17

Agostinho de Oliveira e Joana Maria de Queiroz

[ 280 ]

Francisco de Bastos Calisto e Maria Marques de Jesus

Notas


TERRAS DE ANTUÃ | HISTÓRIAS E MEMÓRIAS DO CONCELHO DE ESTARREJA

José Maria Dias, cº

46

Lavrador

01-09-1908, Rio de Janeiro, nº 442

António Dias e Ana Maria Pereira

José Maria Marques dos Santos

33

Sabia escrever, lavrador

22-01-1908, Rio de Janeiro, nº 10

António Marques dos Santos e Rosa de Matos

José Maria Soares, cº

26

Lavrador

10-09-1908, Pará, nº 505

Agostinho Soares e Joana dos Santos

Júlio de Assunção da Rocha

20

Carpinteiro

05-11-1908, Rio de Janeiro, nº 1093

Francisco Pereira da Rocha e Maria Joaquina de Aguiar

Júlia Pais Chaves

34

Doméstica

10-03-1908, Pelotas, nº 585

Manuel Pais Chaves e Francisca de Jesus

Júlio Neves

27

Sabia escrever, serralheiro

10-09-1908, Rio de Janeiro, nº 483

António Maria Irmão de Manuel Neves e Joana Maria Augusto Narciso Valente Neves

Manuel Augusto Narciso Neves, cº

23

Sabia escrever

10-09-1908, Rio de Janeiro, nº 485

António Maria Proprietário. Irmão Neves e Joana Maria de Júlio Neves Valente

Manuel da Silva Pires

29

Lavrador

10-09-1908, Pará, nº 495

José da Silva Pires e Maria de Jesus

Manuel Malafaia da Costa, cº

54

Trabalhador

03-07-1908, Rio de Janeiro, nº 1485

José Caetano Malafaia e Joana Maria

Manuel Maria da Rocha, cº

31

Sabe escrever, carpinteiro

05-11-1908, Rio de Janeiro, nº 1094

Manuel Marques Hespanha

44

Sabia escrever, negociante

11-04-1908, Pará, nº 949

José Marques Espanha e Teresa de Oliveira

Manuel Martins Caseiro, cº

20

Sabia escrever, trabalhador

07-03-1908, Rio Grande do Sul, nº 536

Joaquim Martins e Teresa de Jesus

Manuel Valente

23

Lavrador

11-04-1908, Rio de Janeiro, Nº 950

José Valente Beliga e Joana Marques de Oliveira

Manuel Valente de Matos Fonseca

26

Sabia escrever, lavrador

13-03-1908, Pará, nº 659

Matias Valente e Ana da Conceição

Irmão de Manuel Maria da Rocha

Francisco Pereira da Rocha e Maria Irmão de Júlio de Joaquina Pereira de Assunção da Rocha Aguiar

[ 281 ]


TERESA CRUZ TUBBY | VALTER SANTOS

Maria Custódia Pereira, vª Filhos: António Maria da Natividade Arnaldo

24 4 2 1

Sabia escrever, doméstica

19-08-1908, Rio de Janeiro, nº 350

Maria Pereira, sª

BEDUÍDO Nome e estado civil

Idade

Escolaridade e profissão

Data, destino e nº de passaporte

Filiação

António Leite de Azevedo

28

Sabia escrever, carpinteiro

16-11-1908, Pará, nº 1256

Manuel Leite de Azevedo e Maria Marques Couto

António Marques Valente

29

Lavrador

04-12-1908, Pará, nº 1447

Manuel Marques Valente e Maria de Jesus Gomes

António Tavares, cº

39

Lavrador

30-11-1908, Manaus, nº 1428

Francisco Tavares e Joana da Cunha

Francisco Marques de Oliveira, cº

41

Sabia escrever, lavrador

04-04-1908, Pará, nº 900

Filipe Antão de Oliveira e Maria Marques

João Domingues de Melo

24

Moliceiro

17-03-1908, Pará, nº 700

Manuel Domingues de Melo e Luísa Marques

João Marques Pires, cº

65

Joaquim Caetano da Silva, cº

26

Sabia escrever, moliceiro

02-06-1908, Pelotas, nº 1291

Domingos Caetano da Silva e Mariana da Silva

José da Silva Salvador, cº

32

Sabia escrever, serralheiro

20-02-1908, Rio de Janeiro, nº 328

Manuel José da Silva e Maria da Cunha

Manuel Domingues de Melo

27

Lavrador

22-09-1908, Manaus, nº 617

Manuel Domingues de Melo e Luiza Marques

Manuel Maria de Oliveira

23

Sabia escrever, cinzelador

23-12-1908, Pelotas, nº 109

Francisco de Oliveira e Ana Maria de Oliveira

Manuel Simões

26

Lavrador

04-12-1908, Pelotas, nº 1449

José Simões e Maria do Rosário

[ 282 ]

29-07-1908, Rodrigo Marques Rio Grande do Sul, Pires e Ana Marques nº 208

Notas

Lugar de Póvoa de Cima

Proprietário


TERRAS DE ANTUÃ | HISTÓRIAS E MEMÓRIAS DO CONCELHO DE ESTARREJA

Marcelino Marques Pereira, cº

Raul Emídio da Costa Souto, cº

58

32

Sabia escrever, lavrador

07-03-1908, Rio de Janeiro, nº 539

Manuel Marques Pereira e Maria Joaquina

Sabia escrever

05-11-1908, Pará, nº 1086

Dr. António Ferreira Souto Alves e Maria Augusta da Costa Souto

Proprietário e viajante

Notas

BUNHEIRO Nome e estado civil

Idade

Escolaridade e profissão

Data, destino e nº de passaporte

Filiação

Agostinho Nunes Ferreira

15

Sabia escrever, padeiro

11-02-1908, Pará, nº 197

José Nunes Ferreira e Maria Rosa da Silva

António Joaquim de Matos, cº

31

Jornaleiro

14-02-1908, Pará, nº 256

António Joaquim de Matos e Maria Caetana da Silva

António Joaquim da Silva Tavares, cº

45

Sabia escrever, carpinteiro

28-02-1908, Pará, nº 420

António Joaquim da Silva e Maria da Silva

António Joaquim Nunes dos Santos

15

Sabia escrever, caixeiro

12-03-1908, Pará, nº 630

Rodrigo Joaquim Nunes e Maria Joaquina do Santos

Bernardo da Silva Pereira

22

Carpinteiro

09-03-1908, Pará, nº 561

Manuel Joaquim Pereira e Maria António Silva Trona

Domingos Joaquim André Martinho, cº

46

Lavrador

09-03-1908, Pará, nº 558

Manuel Joaquim André e Ana António Pereira

Domingos Lopes

20

Carpinteiro

09-03-1908, Pará, nº 560

Manuel Maria Lopes e Virgínia do Espírito Santo

Firmino da Silva, cº

20

Lavrador

12-03-1908, Pará, nº 620

Pedro da Silva Pataca e Perpétua da Silva Manuel José da Silva Paiva “o Marreco” e Maria Caetana Valente João José Lopes e Joana Maria Pereira

Francisco da Silva Paiva, cº

34

Sabia escrever, pescador

15-05-1908, Rio de Janeiro, nº 1218

Francisco José Lopes de Almeida, cº

49

Sabia escrever

21-08-1908, Ceará, nº 371

[ 283 ]


TERESA CRUZ TUBBY | VALTER SANTOS

Joana Maria da Silva, cª Filhos: Adelino da Silva Caetano da Silva Maria da Silva Felismina da Silva Ascenção da Silva

40 13 10 8 5 3

Doméstica

18-08-1908, Pará, nº 343

Francisco Peres e Maria da Silva

João Agostinho da Silva Arrojado

21

Lavrador

05-08-1908, Pará, nº 256

Manuel Agostinho da Silva e Maria Rosália da Silva

João da Silva Sousa, vº

32

Sabia escrever, lavrador

09-05-1908, Pará, nº 1168

José da Silva e Sousa e Maria Luiza Rodrigues Domingos Manuel Jorge de Oliveira e Raquel Maria Pereira

João Pedro Jorge de Oliveira, cº

33

Carpinteiro

06-03-1908, Pará, nº 517

Joaquim Manuel Afonso Cirne, cº

36

Sabia escrever, trabalhador

28-02-1908, Pará, nº 417

Mateus António Tavares Branco e Ana Maria da Silva

Joaquim Manuel de Oliveira, cº

41

28-02-1908, Pará, nº 421

João José da Silva e Maria Caetana de Oliveira

Joaquim Maria dos Santos Cirne, cº

25

Alfaiate

01-04-1908, Pará, nº 858

Augusto Cesar Rodrigues Cirne Joaquina Rosa dos Santos

José da Silva e Souza, vº

30

Sabia escrever, lavrador

09-05-1908, Pará, nº 1168

José da Silva e Souza e Maria Luiza Rodrigues

21-09-1908, Rio de Janeiro, nº 597

António Joaquim André Martinho e Ana Antónia da Silva e Sousa

José da Silva Martinho

20

Moliceiro

José Maria da Cunha, cº

56

Mercantel

07-12-1908, Pará, nº 1493

José António da Cunha e Domingas Luiza Tavares

José Maria Marques da Silva, cº

30

Jornaleiro

25-01-1908, Pará, nº 83

Albino José Gonçalves e Isabel António da Silva

[ 284 ]

Vivia na Murtosa


TERRAS DE ANTUÃ | HISTÓRIAS E MEMÓRIAS DO CONCELHO DE ESTARREJA

José Maria de Oliveira Esposa: Ludovina Tavares de Souza

37 31

Sabia escrever, carpinteiro

11-11-1908, Pará, nº 1183

José Manuel de Oliveira e Joana Maria Nunes Pereira

Manuel Joaquim Ferreira

28

Sabia escrever, padeiro

24-01-1908, Pará, nº 60

José Nunes Ferreira e Maria Rosa da Silva

Manuel José Mauro dos Santos, cº

36

Sabia escrever, pescador

28-01-1908, Pará, nº 118

Manuel Maria Marques e Maria Rosa Rodrigues

Manuel Maria da Silva Arrojado

38

Sabia escrever, carpinteiro

13-07-1908, Pará, nº 86

André da Silva e Mariana da Silva

Manuel Maria da Silva Arrojado

38

Sabia escrever, carpinteiro

19-11-1908, Pará, nº 1285

André da Silva e de Mariana da Silva

Manuel Maria de Matos, cº

36

Jornaleiro

25-02-1908, Pará, nº 383

António Joaquim de Matos e Maria Caetana da Silva

Manuel Maria Fernandes

26

Lavrador

27-07-1908, Pará, nº 202

Manuel Maria Antão Pereira e Ana Joaquina Pereira

Manuel Maria Marques da Silva, cº

42

Jornaleiro

18-01-1908, Pará, nº 2607

Domingos Marques da Silva e Verónica da Silva

Sabia escrever, pescador

10-06-1908, Pará, nº 1340

Manuel Maria da Costa e Maria do Carmo Tavares Rebimbas

Sebastião da Costa

18

Viajou 2ª vez

CANELAS Nome e estado civil

Idade

Escolaridade e profissão

Data, destino e nº de passaporte

Filiação

António José de Aguiar

23

Trabalhador

22-04-1908, Pará, nº 999

Manuel Dias de Aguiar e Maria Domingues

António Rodrigues da Cruz

26

Trabalhador

22-06-1908, Maranhão, nº 1426

José Rodrigues da Cruz e Ana Baptista

Notas

[ 285 ]


TERESA CRUZ TUBBY | VALTER SANTOS

21

Sabia escrever, lavrador

09-04-1908, Pará, nº 930

Manuel Domingues da Cruz e Ana Domingues de Sá

Gil da Silva Cascais

12

Sabia escrever, estudante

20-10-1908, Pará, nº 913

António da Silva Cascais e Rosa Augusta da Conceição

João Domingues Pinto

26

Lavrador

11-05-1908, Rio de Janeiro, nº 1215

João Domingues Pinto e Ana Rodrigues da Cruz

João Evangelista de Araújo, cº

34

Sabia escrever, negociante

18-11-1908, Pará, nº 1276

Manuel Rodrigues Pinto e Maria Madalena Alves

Sabia escrever, comerciante

22-04-1908, Pará, nº 994

António José de Assunção e Maria Clara

Sabia escrever, lavrador

04-08-1908, Pará, nº 247

José Rodrigues Godinho e Maria Joaquina de Aguiar

Sabia escrever, lavrador

06-03-1908, Pará, nº 505

Manuel da Silva Valente e Maria José José Maria das Neves e Maria Domingues de Andrade e Sá

Carlos Domingues da Cruz

José de Assunção, vº Filhos: António Maria Clara José Rodrigues de Aguiar, cº Luís da Silva Valente Esposa: Maria Pereira de Jesus

36 7 2 41

38 23

Manuel Augusto das Neves

18

Sabia escrever, lavrador

17-03-1908, Pará, nº 703

Manuel Domingues da Silva

40

Sabia escrever, comerciante

02-05-1908, Pará, nº 1116

Manuel Domingues da Silva e Ana Pinto Tavares Valente

Manuel Pisco

15

Sabia escrever, lavrador

21-09-1908, Pará, nº 591

António Pisco e Maria Emília da Silva Godinho

Manuel Pires Aldea

30

Lavrador

26-12-1908, Pará, nº 130

José Pires Aldea e Rosa Pires Baptista

20-10-1908, Pará, nº 910

António da Silva Cascais e Rosa Augusta da Conceição

Olímpio da Silva Cascais

[ 286 ]

Sabia escrever, 21 empregado do comércio

Vivia em Valmaior


TERRAS DE ANTUÃ | HISTÓRIAS E MEMÓRIAS DO CONCELHO DE ESTARREJA

ESTARREJA Nome e estado civil

Idade

Escolaridade e profissão

Data, destino e nº de passaporte

Filiação

António José Valente, cº

57

Trabalhador

12-02-1908, Rio Janeiro, nº 989

Ana, solteira

António Nunes de Abreu, cº

20

Trabalhador

12-05-1908, Rio de Janeiro, nº 1076

Joaquim Nunes de Abreu

António Rodrigues de Oliveira

20

Pescador

Domingos António

21

Trabalhador

18-08-1908, Rio de Janeiro, nº 1047

António Maria Fernandes

Domingos Marques de Matos, cº

59

Alfaiate

28-10-1908, Rio de Janeiro, nº 958

António Marques

Francisco Joaquim Pereira, cº

43

Trabalhador

07-10-1908, Rio de Janeiro, nº 591

Joaquim José Pereira

Francisco Nunes Barbosa Esposa: Clementina Pereira Barbosa Filhos: Rosa Francisca Clementina Amália Manuel José de Matos, cº

Manuel Luís Soares, cº Manuel Valente Esposa: Ana da Silva Filho: Luís

Notas

07-12-1908, José Maria Vaz de Rio Grande do Sul, Oliveira nº 118

36 24 Negociante 8 5 2 5m 34

29

Pescador

Sabia escrever, pescador

21-12-1908, Rio Grande do Sul, nº 738

Domingos Nunes Barbosa

16-03-1908, Rio Janeiro, nº 451

António Joaquim de Matos

28-12-1908, Pará, nº 149

Manuel José Soares “o David” e Mariana da Silva

21-12-1908, Santos, nº 384

João Valente

25 25

Padeiro

2

[ 287 ]


TERESA CRUZ TUBBY | VALTER SANTOS

FERMELÃ Nome e estado civil

Idade

Escolaridade e profissão

Data, destino e nº de passaporte

Filiação

António Augusto Baptista Beirão

22

Sabia escrever, lavrador

08-08-1908, Rio de Janeiro, nº 286

Manuel Baptista Beirão e de Joaquina Maria dos Santos

António de Sousa Miguel

16

Trabalhador

12-10-1908, Pernambuco, nº 823

Francisco de Sousa Miguel e Ana de Jesus

17-03-1908, Pará, nº 702

Manuel Dias Capeleiro e Joana Maria de Sá

António Maria Dias Capeleiro

30

Sabia escrever, lavrador

António Marques Loureiro

19

Sabia escrever, lavrador

25-09-1908, Pará, nº 647

José Marques Loureiro e Isabel de Jesus

António Marques de Oliveira

28

Sabia escrever, lavrador

25-01-1908, Pará, nº 88

Joaquim Marques de Oliveira e Ana Esteves de Sá

Augusto Soares Pereira

41

Sabia escrever, padeiro

10-01-1908, Pará, nº 2527

João Soares Pereira e Maria Pires Beirão

Daniel Gonçalves de Melo

18

Sabia escrever, lavrador

12-02-1908, Pará, nº 219

José Gonçalves de Melo e Luiza Joaquina da Graça José Joaquim de Oliveira e Mariana Alexandrina da Conceição

Diamantino Marques de Oliveira, cº

26

Sabia escrever

20-02-1908, Pará, nº 338

Domingos Rodrigues da Silva, cº

62

Sabia escrever, lavrador

24-09-1908, Pará, nº 636

José Rodrigues da Silva e Maria Alves

16-09-1908, Pará, nº 542

Maria Baptista Ribeiro, solteira

Sabia escrever, lavrador

12-06-1908, Pará, nº 1358

José Dias Laranjeira e Rosa Dias Capeleira

Não pode escrever

12-11-1908, Pernambuco, nº 1218

Elias Baptista Ribeiro, 56 cº Filho: 11 Francisco Baptista Ribeiro Francisco Dias Laranjeira, cº

João Gonçalves de Sousa, vº

[ 288 ]

26

67

Trabalhador Sabia escrever

Manuel Gonçalves de Sousa e Maria Ribeiro de Almeida

Notas

Proprietário


TERRAS DE ANTUÃ | HISTÓRIAS E MEMÓRIAS DO CONCELHO DE ESTARREJA

Joaquim Pires Martins, cº

31

Sabia escrever, lavrador

15-02-1908, Pará, nº 282

José da Silva

22

Lavrador

24-03-1908, Manaus, nº 761

José Dias Sabio

18

Sabia escrever, lavrador

15-10-1908, Pará, nº 859

José Dias Sábio e Ana Lopes de Jesus

José Marques de Oliveira

25

Sabia escrever, lavrador

25-01-1908, Pará, nº 90

Joaquim Marques de Oliveira e Ana Esteves de Sá

José Mateus de Morais Júnior

20

Sabia escrever, lavrador

25-09-1908, Pará, nº 648

Manuel de Mateus de Morais e Ana da Silva Baptista

14

Sabia escrever, trabalhador

17-03-1908, Pará, nº 706

José Rodrigues Onofre e Emília Augusta da Silva Baptista

José Rodrigues Onofre Júnior

Manuel António de 33 Sá Pires Esposa: Alegária Josefina Dias 23 de Toledo Filho: António 5

Sabia escrever, comerciante Sabia escrever

24-09-1908, Pernambuco, nº635

José Pires Martins e Antónia Maria Maria Joaquina da Graça, Vivia em Albergaria solteira

Manuel Esteves de Sá Pires e Ana Dias Capeleiro

Manuel Dias Capeleiro

24

Sabia escrever, lavrador

25-01-1908, Pará, nº 92

António Dias Capeleiro e Ana Esteves de Sá

Manuel Domingues Freire

21

Sabia escrever, lavrador

12-02-1908. Pernambuco, nº 220

Joaquim Domingues Freire e Ana Dias Ribeiro

Manuel Marques de Campos

20

Sabia escrever, lavrador

24-09-1908, Pará, nº 637

José Marques de Campos e Domingas Maria de Jesus

12-11-1908, Pernambuco, nº 1217

João Gonçalves de Sousa e Maria de Oliveira

16-10-1908, Pará, Nº 864

Joaquim Máximo da Cunha e Maria Esteves Loureira

Maria de Oliveira Baptista, vª Filho: Joaquim Gonçalves de Sousa Silvério Máximo da Cunha

46 13

Sabia escrever

17

Sabia escrever, serralheiro

Proprietária,

[ 289 ]


TERESA CRUZ TUBBY | VALTER SANTOS

MURTOSA Nome e estado civil

Idade

Escolaridade e profissão

Data, destino e nº de passaporte

Filiação Miguel José Afonso de Azevedo e Maria Rosália da Silva

Agostinho José Afonso de Azevedo, cº

38

Agostinho José Garete, cº

33

Moliceiro

Alfredo Cascais

13

Sabia escrever

Alfredo Maria Soares Belo

20

Sabia escrever, moliceiro

09-10-1908, Pará, nº 777

Manuel José Soares Belo e Mariana da Silva

Sabia escrever, doméstica

02-12-1908, Pará, nº 1431

Francisco Tomé e Ana Antónia

Moliceiro

10-09-1908, Pará, nº 497

António Rodrigues e Maria Luísa

Amália Tavares, vª Filho: Feliciano António Augusto Rodrigues, cº

30 3 26

Moliceiro

04-05-1908, Pará, nº 1124 10-09-1908, Pará, nº 488

António Rodrigues Garete e Maria Luísa Regateira

17-11-1908, Filipe José da Silva Rio Grande do Sul, Cascais e Ana nº 1260 Joaquina

José Maria Fernandes Rendeiro e Maria Rosa de Oliveira

António Joaquim Fernandes Rendeiro

25

Sabia escrever, mercantel

11-07-1908, Pará, nº 69

António José Lopes Ramos

47

Pescador

21-12-1908, Pará, nº 84

João Lopes Ramos e Maria José de Oliveira

António Manuel Pereira, cº

37

Sabia escreve, pescador

10-09-1908, Pará, nº 492

Domingos Luís Pereira e Maria Luísa

António Maria da Silva, cº

37

Pescador

11-07-1908, Manaus, nº 57

Gonçalo António da Silva e Ana Luísa Vieira

António Maria da Silva

21

Moliceiro

24-08-1908, Manaus, nº 413

António Maria da Silva e Maria Luísa da Silva

António Maria da Silva Laganha

20

Marítimo

04-11-1908, Manaus, nº 1082

Francisco Maria da Silva e Maria de Jesus da Silva

[ 290 ]

Notas


TERRAS DE ANTUÃ | HISTÓRIAS E MEMÓRIAS DO CONCELHO DE ESTARREJA

António Maria da Silva Paiva

20

Sabia escrever, caixeiro

17-01-1908, Pará, nº 2603

Sebastião da Silva Paiva e Maria Emília da Cruz

António Maria da Silva Pitta, cº

37

Pescador

17-12-1908, Pará, nº 67

Daniel da Silva Pitta e Maria Ana

António Maria Lopes

10

Sabia escrever

04-07-1908, Pará, nº 4

João Maria da Silva Silhão e Ana José da Silva

António Maria Lopes

18

Pescador

21-12-1908, Pará, nº 85

Manuel José Lopes e Ana Teresa

António Maria Marques Leite

13

Sabia escrever

11-11-190i8, Pará, nº 1180

Augusto Carlos Leite e Maria Emília Marques Pereira

António Maria Tavares, cº

33 Sabia escrever, marítimo

11-07-1908, Pará, nº 67

António Tavares e Apolónia Maria Rebelo

Sabia escrever, almocreve

01-04-1908, Pará, nº 857

Tomaz Maria Vieira “o Marreco” e Ana Rosa Rebelo

Doméstica

13-02-1908, Pará, nº 246

Altino António da Silva Reverendo e Maria José Barbosa

10-09-1908, Pará, nº 506

Manuel Joaquim de Campos e Mariana Valente

Bártolo José Vieira, cº

29

Carolina de Jesus da Silva Barbosa, cª

22

Domingos Adão de Campos, cº

34

Domingos António Paiva, cº

27

Moliceiro

23-10-1908, Manaus, nº 961

Gonçalo António de Paiva e Francisca Rosa Vaz

Domingos José Fidalgo, cº

36

Sabia escrever, carpinteiro

23-12-1908, Santos, nº 112

Miguel Joaquim Fidalgo e Margarida de Jesus

Domingos Maria Leite

21

Sabia escrever, carpinteiro

Francisco António Pereira

17

Moliceiro

04-08-1908, Pará, nº 245

Manuel Luís Pereira “o Água Lusa” e Maria José

Francisco Caravela

17

Sabia escrever, pescador

25-11-1908, Pará, nº 1364

Gonçalo António Caravela e Maria Francisca Cardoso

Francisco Maria da Silva, cº

31

Moliceiro

23-04-1908, Pará, nº 1018

Manuel José da Silva e Maria Florinda

Proprietário

20-02-1908, Rio de Maria José Nunes Janeiro, nº 336

[ 291 ]


TERESA CRUZ TUBBY | VALTER SANTOS

Francisco Maria Mala

27

Mercantel

09-12-1908, Pará, nº 16

João Bernardo Mala e Maria Luísa da Silva

João Agostinho, cº

27

Sabia escrever, moliceiro

06-03-1908, Manaus, nº 510

António Maria da Silva e Maria Luísa Francisco Joaquim Lopes e Domingas Antónia de Oliveira

João Agostinho Lopes Soares, cº

21

Sabia escrever, alfaiate

11-09-1908, Pará, nº 512

João Agostinho Rodrigues Garete

22

Moliceiro

01-10-1908, Pará, nº 700

José Rodrigues Garete e Maria Rosália da Silva

João Bernardo Rebelo, cº

34

Pescador

01-04-1908, Pará, nº 856

Gonçalo António Rebelo e Ana Rosa da Silva

João Eusébio da Silva, 28 cº

Pescador

23-03-1908, Pará, nº 754

Manuel José da Silva e Maria Augusta Rebela

João José da Silva, cº

27

Sabia escrever, moliceiro

31-01-1908, Pará, nº 139

João José da Silva e Perpétua Maria da Silva

João José de Oliveira, cº

50

Moliceiro

17-07-1908, Pará, nº 110

João José de Oliveira e Perpétua Maria da Silva

João Maria de Pinho

21 Sabia escrever, marítimo

03-09-1908, Pará, nº 681

José Manuel de Pinho e Rosa Francisca

João Maria Pereira, cº

31

Pescador

07-12-1908, Pará, nº 3

Domingos José Pereira e Teresa Maria

João Pedro Vigário, cº

21

Pescador

20-05-1908, Pará, nº 1231

Joaquim Manuel Vigário e Ana Antónia Bandeira Manuel Joaquim Afonso e Maria Rosália de Miranda ou Rosália Miranda

Joaquim Maria Afonso, cº

26

Sabia escrever, lavrador

12-09-1908, Pará, nº 517

Joaquim Maria dos Santos

20

Sabia escrever, empregado do Comércio

19-10-1908, Manaus, nº 891

Manuel Maria dos Santos e Luzia Antónia

José António da Fonseca, cº

41

Pescador

07-12-1908, Pará, nº 2

João José da Fonseca e Isabel Antónia de Miranda

[ 292 ]


TERRAS DE ANTUÃ | HISTÓRIAS E MEMÓRIAS DO CONCELHO DE ESTARREJA

Mateus António da Silva Rodrigues e Maria do Carmo Cândida de Matos

José Augusto da Silva Rodrigues

21

Moliceiro

23-03-1908, Pará, nº 744

José Joaquim Valente, cº

38

Pescador

22-08-1908, Pará, nº 395

José António Rebelo e Ana Teresa

José Joaquim Valente da Silva Magalhães, cº

44

Sabia escrever, pescador

22-07-1908, Pará, nº 156

Manuel Joaquim da Silva e Maria Luísa Valente de Almeida

31

Pescador

José Luís Amador, cº Filho: Manuel José Amador José Manuel Soares Caninha, cº Filho: José Maria José Maria da Cunha

15

Sabia escrever

17-03-1908, Pará, nº 701

41 Mercantel

02-05-1908, Pará, nº 1117

Manuel Joaquim Soares Caninha e Ana Rosa da Silva

07-12-1908, Pará, nº 1498

Manuel Joaquim da Cunha e Maria Rosália

16 32 Sabia escrever, marítimo

José Maria da Silva Caixeiro, cº

32

José Maria Esteves, cº

24

Manuel José Amador e Maria José Rendeiro

17-03-1908, Sabia escrever, alfaiate Rio Grande do Sul, nº 707

Manuel Joaquim da Silva Caixeiro e Maria Rosa de Oliveira

Sabia escrever, moliceiro

02-05-1908, Pará, nº 1118

Manuel José da Silva Esteves e Rosa Maria da Silva

18

Pescador

12-09-1908, Pará, nº 522

Bernardo José Borges e Antónia Joaquina Fernandes Ruela

43

Pescador

12

Sabia escrever

23-10-1908, Pará, nº 962

Mariana Pereira, solteira

José Paulino Branco, cº

30

Sabia escrever, pescador

08-08-1908, Pará, nº 284

João José de Matos Costeira e Ana Rosa da Silva

José Rebelo, cº

30

Marítimo

02-03-1908, Pará, nº 453

Agostinho José Rebelo e Maria Rosa da Silva

Lázaro José Pereira, cº

36

Pescador

30-04-1908, Pará, nº 1088

Gonçalo António Pereira e Rosa Joana

José Maria Jorge José Maria Pereira, cº Filho: João Vicente Pereira

[ 293 ]


TERESA CRUZ TUBBY | VALTER SANTOS

Lázaro José Pereira, Esposa: Maria do Céu Oliveira Luzia Antónia de Matos, cª Filha: Guilhermina dos Santos

29 Pescador 26 42

13-05-1908, Pará, nº 1201

José Maria Pereira e Maria Custódia

19-10-1908, Pará, nº 892

Gaspar José de Matos e Maria José

Costureira

15

Sabia escrever

Manuel Ângelo Rodrigues de Assunção, cº

27

Sabia escrever, mercantel

12-10-1908, Pará, nº 821

Francisco Rodrigues e Maria José Gonçalves Vieira

Manuel António Alípio, cº

38

Pescador

08-10-1908, Pará, nº 775

Manuel Alípio e Rosa de Oliveira

Manuel de Jesus Silva, cº

36

Sabia escrever, pescador

04-08-1908, Pará, nº 246

Mateus António da Silva e Rosa Joana da Silva

Manuel João Fidalgo

43

Sabia escrever

14-03-1908, Pará, nº 674

Manuel Luís Fidalgo e Mariana de Jesus Barbosa

Manuel Joaquim da Silva Campos, cº

33

Negociante

07-11-1908, Pará, nº 1138

Manuel Joaquim da Silva Campos e Mariana Soares

Manuel Joaquim Nata, cº

23

Sabia escrever, pescador

14-09-1908, Pará, nº 531

Domingos Manuel Nata e Maria Luísa

Manuel Joaquim Nunes Pereira, cº

41

Pescador

17-10-1908, Pará, nº 871

Manuel Nunes Pereira e Maria Josefa da Silva

Manuel Joaquim Salgado

21

Pescador

11-07-1908, Manaus, nº 63

António Salgado e Maria Rita de Sousa

Manuel Joaquim Vigário, cº

26

Pescador

13-06-1908, Pará, nº 1353

Joaquim Manuel Vigário e Ana Antónia Rendeira

Manuel José

47

Carpinteiro

06-07-1908, S. Paulo, nº 16

João Pimpão e Maria Rosalina Rebelo

Manuel José

56

Sabia escrever, comerciante

27-08-1908, Rio Grande do Sul, nº 424

Gonçalo Pereira de Pinho e Ana Joaquina Rangel

Manuel José de Matos, cª

39

Marítimo

17-06-1908, Pará, nº 1407

Gaspar José de Matos e Maria José da Silva

[ 294 ]

Proprietário


TERRAS DE ANTUÃ | HISTÓRIAS E MEMÓRIAS DO CONCELHO DE ESTARREJA

Manuel José de Pinho

15

Sabia escrever, caixeiro

10-10-1908, Pará, nº 813

Manuel José Eusébio de Pinho e Maria José

Manuel José Henriques, cº

29

Lavrador

18-03-1908, Pará, nº 710

Manuel José Henriques e Maria Rosa

30

Sabia escrever, pescador

29-02-1908, Santos, nº 449

António Maria Marques e Maria Luísa Vilarinha

Manuel José Pereira, cº

30

Pescador

04-08-1908, Pará, nº 249

Gonçalo António Pereira “o Agua Lusa” e Ana Rosa

Manuel José Rebelo, cº

30

Marítimo

02-03-1908, Pará, nº 453

Agostinho José Rebelo e Maria Rosa da Silva

Manuel José Ruivo

23

Moliceiro

06-03-1908, Manaus, nº 509

António Maria da Silva e Maria Luísa Pereira

Manuel Luís Pereira, cº

22

Sabia escrever, negociante

13-06-1908, Pará, nº 1368

Miguel José Pereira e Ana Felizarda

Manuel Luís Rebelo dos Santos, cº

37

Sabia escrever, comerciante

10-09-1908, Pará, nº 479

Gonçalo António Rebelo dos Santos e Isabel Maria

Manuel Maria de Azevedo, cº

32

Lavrador

06-03-1908, Pará, nº 514

Miguel Afonso de Oliveira e Maria Rosália de Oliveira

Manuel Maria de Matos, cº

56

Trabalhador

29-08-1908, Rio Grande do Sul, nº 428

José de Matos e Maria Rosália

Manuel José Marques

Manuel Joaquim Dias Cascais e Ermelinda Fernandes da Cruz

Manuel Maria Dias Cascais, cº

43

Sabia escrever, comerciante

13-06-1908, Pará, nº 1407

Manuel Maria Lopes Ramos

20

Sabia escrever, pescador

27-03-1908, Pará, nº 818

Jacinto José Lopes Ramos e Ana Rosa Fidalga

Manuel Maria Rebelo 34 Sebolão, cº

Sabia escrever, lavrador

13-02-1908, Pará, nº 242

José António Rebelo Sebolão e Rosa Joana da Silva

Pescador

11-04-1908, Pará, nº 948

José Manuel Soares Seitil e Maria José da Silva

Manuel Maria Soares Seitil, cº

37

Vivia em Ílhavo

[ 295 ]


TERESA CRUZ TUBBY | VALTER SANTOS

Manuel Maria da Silva, cº

24

Moliceiro

22-04-1908, Pará, nº 996

José Joaquim da Silva e Maria da Silva

Manuel Maria Luxo, cº

44

Pescador

07-04-1908, Pará, nº 920

Possidónio Branco e Maria Jacinta

Manuel Maria Neno, cº

33

Marítimo

28-07-1908, Pará, nº 204

Gonçalo António de Oliveira e Isabel Maria

Maria Agostinha da Silva Rendeiro, cª Filhos: Maria Agostinha José

34

Maria de Jesus Fernandes Rendeiro, cª Filhos: Gracinda Manuel Nazaré

37

Maria Joana de Pinho, cª Mariana Henriques da Fonseca, cª Filho: Manuel

Doméstica 7 2

12 7 2 55

Sabia escrever, doméstica

Taberneira

22-07-1908, Pará, nº 155

09-04-1908, Pará, nº 928 06-04-1908, Pará, nº 916

32 Doméstica 10m

03-04-1908, Pará, nº 881

José Fernandes Rendeiro e Maria Rosália da Silva António Joaquim de Oliveira e Maria José Fernandes Rendeiro Manuel Fernandes Ruela e Joana Maria Vivia no Bunheiro de Pinho Manuel José da Silva Valente e Maria Luísa Henriques da Fonseca

Norberto José Fernandes Rendeiro

27

Marítimo

10-09-1908, Pará, nº 498

Lázaro António Fernandes Rendeiro e Maria Agostinho

Pedro José Rebello dos Santos, cº

27

Moliceiro

04-06-1908, Pará, nº 1304

Ventura José Rebelo dos Santos e Mariana Tavares

Pedro José da Silva, cº

25 Sabia escrever, marítimo

21-08-1908, Pará, nº 378

António Joaquim da Silva e Mariana Rosa

Pedro José da Silva, cº

29

11-09-1908, Pará, nº 515

Gonçalo António da Silva “o Ligeiro” e Rosa Francisca

Lavrador

Possidónio Gonçalves Rebelo, cº

25

Pescador

12-03-1908, Manaus, nº 618

Tomaz Maria Belo, cº

63

Sabia escrever, pescador

09-04-1908, Pará, nº 929

[ 296 ]

Possidónio Gonçalves Rebelo e Maria Joana Gonçalves Ruela Miguel José Belo e Apolónia Maria Valente


TERRAS DE ANTUÃ | HISTÓRIAS E MEMÓRIAS DO CONCELHO DE ESTARREJA

Victorino Carlos da Silva Bispo

19 Sabia escrever, marítimo

22-09-1908, Pará, nº 598

José Maria da Silva Bispo e Francisca Antónia

PARDILHÓ Nome e estado civil

Idade

Escolaridade e profissão

Data, destino e nº de passaporte

Filiação

Agostinho da Silva Vigário, vº

34

Lavrador

10-07-1908, Manaus, nº 44

Manuel da Silva e Brígida da Silva

António da Silva Godinho

22

Lavrador

07-01-1908, Pará, nº 2485

José da Silva Godinho e Joana da Silva

António de Oliveira Esposa: Rosa Marques Filhos: João Maria Júlia

Notas

30 27

Carpinteiro

4 3m

22-09-1908, Manaus, nº 614

Francisco António de Oliveira e Ana Rosa Ferreira da Costa

António Joaquim da Silva Tavares

12

Sabia escrever

12-05-1908, Pará, nº1196

José da Silva Pereira Tavares e Maria Esteves

António Joaquim Valente Vigário

21

Sabia escrever, carpinteiro

13-05-1908, Pará, nº 1202

O pai era conhecido Manuel Maria Valente e Maria da por Manuel Valente Sabino Silva Vigária

Sabia escrever, fogueiro

04-08-1908, Santos, nº 242

António Joaquim Vivia em Ribeira de Valente de Almeida Fraguas, concelho de e Ana Joaquina Albergaria-a-Velha Valente de Almeida

02-07-1908, Manaus, nº 1479

António Maria Valente de Almeida, cº

36

António Maria Vaz, cº

40

Lavrador

António Pereira Valente, cº

22

Carpinteiro

António Rodrigues de Matos, cº

38

Carpinteiro

Artur de Almeida Baptista, cº

30

Sabia ler, comerciante

Manuel Vaz e Maria Joana da Silva

Manuel Joaquim 02-07-1908, Pereira Valente e Ana Manaus, nº 1478 Rosa Pereira 22-09-1908, Pará, nº 613

11-07-1908, Pará, nº 49

José Bernardo de Matos e Rosa da Silva Bernardo Maria Valente de Almeida e Maria José Lopes Baptista

[ 297 ]


TERESA CRUZ TUBBY | VALTER SANTOS

Manuel Francisco de Matos e Maria Joaquina Valente

Emídio de Matos, cº

25

Sabia escrever, calafate

13-10-1908, Manaus, nº 825

Firmino Ferreira da Silva

24

Sabia escrever, serralheiro

23-04-1908, Pará, nº 1002

António Joaquim da Silva e Maria Ferreira

Francisco António da Silva Carrelha, cº

42

Sabia escrever, lavrador

24-03-1908, Manaus, nº 766

António José da Silva Carrelha e Ana Valente de Almeida

Francisco da Fonseca

28

14—12-1908, Pará, nº 55

José António da Fonseca e Juliana Marques

Francisco Dias, cº

25

Moliceiro

02-06-1908, Pará, nº1296

António Maria Dias e Maria Dias de Matos

João Maria da Silva de Matos

21

Sabia escrever, carpinteiro

13-05-1908, Pará, nº 1203

José Maria da Silva de Matos e Ludovina Rosa

36

Lavrador

12

Sabia escrever

07-01-1908, Pará, nº 2485

Manuel de Resende e Maria Joaquina da Silva

32

Lavrador

24-03-1908, Manaus, nº 772

Manuel António da Silva e Domingas Marques da Silva

09-01-1908, Pará, nº 2514

Manuel Rodrigues Amador e Maria Caetana Teixeira

Joaquim de Resende, vº Filho: Manuel de Resende Joaquim Rodrigues Salgueirão, cº

José Maria Amador, cº

34

Sabia escrever

José Maria Tavares Catrina

22

Moliceiro

02-07-1908, Manaus, nº 1477

Manuel João Tavares Catrina e Mariana Valente Teixeira

José Nunes Pinto

25

Moliceiro

24-02-1908, Pará, nº 376

Constantino Nunes Pinto e Ana Maria da Silva

Júlio Valente de Pinho

13

Sabia escrever

12-03-1908, Rio de Janeiro, nº 638

Albano da Silva de Pinho e Ana Rosa Valente

Manuel António da Silva Valente, cº

48

Sabia escrever, lavrador

01-08-1908, Rio de Janeiro, nº 216

Victorino António da Silva Valente e Joana Maria Valente de Almeida

Manuel António Tavares, cº

33

Jornaleiro

14-01-1908, Pará, nº 2571

Bernardo Maria e Maria Luísa

[ 298 ]

Proprietário

Proprietário


TERRAS DE ANTUÃ | HISTÓRIAS E MEMÓRIAS DO CONCELHO DE ESTARREJA

Manuel Costa

18

Carpinteiro

24-03-1908, Manaus, nº 771

João António da Silva Amaro e Maria Ferreira da Costa

Manuel de Oliveira Júnior

28

Lavrador

24-03-1908, Manaus, nº 767

Manuel de Oliveira e Maria Luísa Marques

Manuel Ferreira Couto

20

Sabia escrever, carpinteiro

27-03-1908, Manaus, nº 811

Crispim Ferreira Couto e Maria Valente de Almeida

Manuel Ferreira da Costa, cº Esposa: Maria Eulália Valente de Almeida

28 22

Manuel Joaquim 51 Rodrigues Amador, cº

Sabia escrever, marítimo Sabia escrever

24-02-1908, Rio de Janeiro, nº 374

Joaquim Ferreira da Costa e Joana Valente de Almeida

Sabia escrever, lavrador

24-03-1908, Manaus, nº 768

António Valente e Ana da Silva

Manuel Lopes Conde, cº

32

Moliceiro

18-11-1908, Manaus, nº 1285

Geraldo Lopes Conde e Rosa de Pinho

Manuel Maria da Silva Saleiro, cº

34

Cocheiro

24-03-1908, Pará, nº 770

António da Silva Saleiro e Joana Maria da Silva

Manuel Maria Gonçalves, cº

38

Sabia escrever, carpinteiro

07-05-1908, Rio de Janeiro, nº 1142

António Gonçalves e Joana Valente

23

Sabia escrever, serralheiro

02-04-1908, Pará, nº 868

Manuel António Lopes da Silva e Maria Isabel de Resende

47

Lavrador 13-05-1908, Rio de Janeiro, nº 1205

Agostinho Luís da Silva e Joana Maria Valente

Manuel Maria Lopes da Silva Manuel Maria Valente Sabino, também conhecido por Manuel Maria Valente, cº Filho: Albino da Silva Vigário

18

Sabia escrever

Serafim Rodrigues Canas

22

Lavrador

24-03-1908, Manaus, nº 769

Manuel Rodrigues Canas e Madalena Rodrigues Pomba

Severino Nunes da Silva, cº

31

Lavrador

27-03-1908, Manaus, nº 806

Salvador Nunes da Silva e Engrácia Maria dos Santos

[ 299 ]


TERESA CRUZ TUBBY | VALTER SANTOS

SALREU Nome e estado civil

Idade

Escolaridade e profissão

Abel António da Fonseca, cº

28

Sabia escrever

Américo Fernandes

20

Sabia escrever, lavrador

22-07-1908, Rio de Janeiro, nº 158

António Fernandes e Maria Isménia

António da Costa, cº

38

Jornaleiro

29-02-1908, Rio de Janeiro, nº 451

José Marques da Costa e Maria Rodrigues

António da Costa Mortágua, cº

48

António de Almeida, cº

40

Moleiro

António Ferreira, cº

22

Sabia escrever, jornaleiro

29-02-1908, Rio de Janeiro, nº 450

António Joaquim Ferreira e Maria de Almeida

António Rodrigues Bandeira

19

Sabia escrever, empregado do comércio

05-09-1908, Pará, nº 463

Filipe José Bandeira e Rosa Augusta

22

Empregado do comércio

26-12-1908, Pará, nº 133

O pai também Manuel Joaquim era conhecido por Rodrigues Valente, e Manuel Joaquim Ana Figueira Valente Rodrigues

Domingos Valente de Oliveira, cº

35

Sabia escrever, lavrador

29-02-1908, Rio de Janeiro, nº 452

Manuel de Oliveira Valente e Margarida da Silva

Francisco Rodrigues Valente

28

Lavrador

14-11-1908, Pará, nº 1252

José Rodrigues Valente e Maria Gomes da Luz

Joaquim Nunes Salsa

29

Sabia escrever

Joaquim Tavares

33

Sabia escrever, padeiro

José Maria Marques Valente

13

30-10-1908, Maria do Rosário Sabia escrever, lavrador Rio Grande do Sul, Marques nº 1039

António Valente Rodrigues

[ 300 ]

Data, destino e nº de passaporte

Filiação

Notas

04-12-1908, António Luís da Rio Grande do Sul, Fonseca e Maria nº 1443 Generosa Bandeira

04-11-1908, Sabia escrever, lavrador Rio Grande do Sul, nº 1080

João da Costa Mortágua e Ana Tavares

05-12-1908, Caetano de Almeida Rio Grande do Sul, e Margarida de nº 1484 Oliveira

31-12-1908, João Nunes Salsa e Rio Grande do Sul, Maria do Rosário nº 179 Tavares 06-03-1908, Rio Grande do Sul, nº 507

Manuel Tavares e Maria Marques

Proprietário


TERRAS DE ANTUÃ | HISTÓRIAS E MEMÓRIAS DO CONCELHO DE ESTARREJA

Sabia escrever

28-10-1908, Rio Grande do Sul, nº 1011

João Rodrigues Marques Valente e Maria Cândida Valente

41

Sabia escrever, alfaiate

10-09-1908, Rio de Janeiro, nº 480

António Coelho e Antónia Maria

35

Sabia escrever, lavrador

José Rodrigues Marques Valente

22

Manuel Coelho da Silva, cº Manuel da Silva

Manuel da Silva Fontinha, cº

29

Manuel Luís Rebelo dos Santos, cº

37

Maria da Conceição, vª Maria Tavares da Silva Lopes, cª Filha: Helena Criada: Emília da Conceição Gaspar Ricardo dos Anjos, cº Filho: Agostinho dos Anjos

51

Proprietário

30-11-1908, João da Silva e Maria Manaus, nº 1421 Tavares

Sabia escrever, lavrador

03-01-1908, Pará, nº 2448

Manuel da Silva Fontinha e Margarida de Oliveira

Negociante

10-09-1908, Pará, nº 479

Gonçalo António Rebelo dos Santos e Isabel Maria

Lavradeira

22-09-1908, Rio de Janeiro, nº 603

Vivia na freguesia da Manuel Leite e Ana Branca, Albergaria-aMaria -Velha

36 4

Sabia escrever

20-11-1908, Pará, nº 1294

José Tavares da Silva e Margarida Tavares Valente

Proprietária

18 47 Sabia escrever, alfaiate 15

31-08-1908, Rio de Janeiro, nº 437

João Pedro dos Anjos e Ana Maria da Silva

VEIROS Nome e estado civil

Agostinho da Silva Ruivo, cº

Idade

27

Escolaridade e profissão

Data, destino e nº de passaporte

Filiação

Notas

Mateus José da Silva Ruivo, também 09-01-1908, conhecido por Sabia escrever, lavrador América do Norte, Manuel José da nº 2513 Silva Ruivo e Isabel Joaquina da Fonseca

[ 301 ]


TERESA CRUZ TUBBY | VALTER SANTOS

Albina Amália da Silva Barbosa, cª

46

Sabia escrever, doméstica

18-02-1908, Rio de Janeiro, nº 320

Manuel Nunes Guiomar e Teresa Maria da Silva Brandão Manuel Maria Rebelo e Maria Antónia Antão

António Nunes Guiomar

30

Carpinteiro

02-01-1908, Pará, nº 2428

Domingos José Rebelo, vº

29

Mercantel

06-04-1908, Pará, nº 917

Francisco de Oliveira, cº

30

Francisco Joaquim Pereira, cº

38

João Carlos de Assis Pereira de Melo José Henriques de Oliveira

23

26

Manuel Agostinho 46 Tavares da Fonseca, cº

Manuel Maria da Silva Barbosa e Vivia no Bunheiro Maria Josefa da Silva

09-01-1908, António de Oliveira Sabia escrever, casado América do Norte, e Maria Joana de nº 2512 Oliveira Alfaiate

Sabia escrever

13-08-1908, Pará, nº 325

10-06-1908, Rio de Janeiro, nº1338

José António Pereira e Maria José da Fonseca Domingos João Carlos de Assis Pereira de Melo e Maria Generosa de Meneses Correia Gouveia Leite

Sabia escrever, lavrador

04-09-1908, Rio de Janeiro, nº 450

Ildefonso Marcelino Henriques e Ana Joaquina de Oliveira

Sabia escrever, lavrador

15-01-1908, Pará, nº 2579

Mateus António Tavares da Fonseca e Maria Joaquina da Silva

Manuel Joaquim Afonso de Oliveira, cº

37

Sabia escrever, comerciante

10-03-1908, Manaus, nº 584

Francisco Lourenço de Oliveira e Maria Joaquina da Silva

Matias José Pereira de Sousa

24

Barqueiro

04-09-1908, Rio de Janeiro, nº 451

António Joaquim Pereira de Sousa e Maria Rosa Pais

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Vivia na Murtosa

Proprietário


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EGAS MONIZ 70 ANOS DA ATRIBUIÇÃO DO PRÉMIO NOBEL Rosa Maria Rodrigues *

Os Homens passam, as conquistas científicas permanecem ou transformam-se. A história que as arquiva fará a sua crítica. Sinto-me sombra a desvanecer-se nas gerações que se seguem. E agora ao despedir-me, ouso rematar: esforcei-me por bem cumprir o meu dever. Egas Moniz1

Fotografia de Egas Moniz em 1949

* Licenciada em História. Diretora da Casa Museu Egas Moniz. Com investigação e trabalhos publicados na temática Moniziana 1 - Frase com que termina Egas Moniz a sua última lição, a 29 de Novembro de 1944

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SAUDADES | ROSA MARIA RODRIGUES

O I Congresso Internacional de Psicocirurgia que se realizou em Lisboa de 03 a 07 de Agosto de 1948 deveu-se e como relata Egas Moniz2 a uma proposta de Walter Freeman, aplaudida com entusiasmo pelos investigadores dos Estados Unidos da América, alguns países da Europa, Ásia e América, interessados no problema e tratamento das doenças mentais, seus processos e resultados. A escolha de Lisboa para a realização desta importante reunião científica de repercussão mundial, teve na sua origem, o prestar de homenagem a Egas Moniz, pelas suas descobertas no domínio da Angiografia Cerebral e da Leucotomia – Pré-frontal3e consequentes progressos no campo da Neurologia e Psicocirurgia. Na sessão inaugural deste Congresso Walter Freeman, usou da palavra desta forma: Considero-me neste momento o representante dos Congressistas estrangeiros que a Delegação portuguesa tão generosamente tem acolhido e obsequiado. Desejo deste lugar exprimir a admiração de todos nós pelo génio de Egas Moniz. Aqueles que conhecem a sua obra não necessitam que eu recorde as contribuições que trouxe à Neurologia. É preciso notar, todavia que, antes da Leucotomia, concorreu para o avanço desta ciência, com a descoberta fundamental da Angiografia Cerebral…Direi ainda, para conhecimento dos meus colegas estrangeiros neste Congresso, menos versados na história portuguesa dos nossos dias, que Egas Moniz, também manifestou os seus talentos fora da Medicina (…) Ligandose mais de perto ao estudo das doenças psíquicas, procurou e conseguiu melhorar os enfermos mentais por meios cirúrgicos. Devíamos por isso homenageá-lo como uma das nobres inteligências da moderna medicina. É de inteira justiça que o primeiro Congresso Internacional se reúna em Lisboa onde os seus membros têm a vantagem de encontrar pessoalmente o homem ao qual se deve não só a origem, mas a própria designação da Psicocirurgia (…) Presidente! Em nome dos congressistas estrangeiros, agradeço a V. Exa ter-nos dado o privilégio de se reunir em Lisboa esta conferência e aqui podermos tomar as nossas deliberações científicas”4 2 - António Caetano de Abreu Freire Egas Moniz (1874-1955). Clinico, Politico, Investigador, Ensaísta, Professor e Cientista, inventou a Angiografia Cerebral em 1927 e foi galardoado com o Prémio Nobel a 27 de Outubro de 1949, pelos seus trabalhos no domínio da Leucotomia Pré – Frontal. 3 - Segundo Almeida Lima, a leucotomia pré-frontal é uma operação cirúrgica por meio da qual se separam os lobos frontais das outras regiões cerebrais. Como as ligações entre as várias partes do sistema nervoso se fazem através de fibras que passam na chamada substância branca, basta incisar esta, deixando integras as células (substância cinzenta), para isolar umas das outras as várias zonas cerebrais. Daí o nome de leucotomia (corte da substância branca). A designação de pré-frontal indica que a região atingida é a porção do lobo frontal situada para a frente da região motora, isto é, da porção desse lobo onde se encontra representada a motilidade dos membros, da face e do tronco, e cuja lesão determina paralisias na metade oposta do corpo. É dessa região cerebral cuja fisiologia está longe de estar esclarecida que se julga dependerem as funções mais elevadas, isto é, mais complexas do cérebro humano. Os lobos frontais são os órgãos mais caracteristicamente humanos do homem. A observação de doentes cujos lobos frontais foram lesados levam a concluir a importância preponderante dessa região cerebral em muitos fenómenos da esfera afetiva. O esclarecimento das funções do lobo frontal será um dos grandes passos para a solução do problema fundamental enunciado há muitos séculos mas cuja solução está apenas esboçada; a magna questão do homem se conhecer a si próprio. Pela primeira vez na história da medicina, praticou-se uma operação sobre o cérebro para modificar um estado psíquico. O alcance de tal tentativa é incalculável, transcende de muito a prática clínica e as suas consequências estendem-se às esferas psicológica, filosófica, ética e mesmo religiosa. Um corte cirúrgico é capaz de alterar uma personalidade, modificar as reações afetivas de um indivíduo, fazer variar a sua atitude para com as pessoas e as circunstâncias. In Gazeta da FísicaVolume II, Fascículo 02 Janeiro, 1950 4 - EGAS MONIZ, António Caetano de Abreu Freire in Confidências de um Investigador Científico, Edições Ática 1949, pág. 550-551

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Este Congresso, presidido por Egas Moniz teve como presidente do Comité, Walter Freeman e António Flores no Comité Organizador e participaram dezenas de delegados de 27 países (Portugal, Brasil, Inglaterra, França, Estados Unidos da América, Espanha, Checoslováquia, Suécia, Itália, entre outros), sendo a delegação Portuguesa constituída por discípulos e colaboradores de Egas Moniz. A abertura solene realizou-se, na Sala dos Atos Grandes da Faculdade de Medicina de Lisboa, tendo sido presidida pelo Presidente da República, Marechal Carmona, estando também presentes os Subsecretários de Estado da Educação Nacional e da Saúde e Assistência Social, bem como o Reitor da Universidade de Lisboa. Foram apresentadas ao Congresso, 64 comunicações5 a respeito da Leucotomia suas técnicas e resultados.

Presidente da República, Marechal Carmona, à saída da Faculdade de Medicina depois da Sessão Inaugural do I Congresso de Psicocirurgia

Egas Moniz pronunciando a sua comunicação na primeira sessão científica do Congresso. Na mesa Lopez Ibor e Walter Freeman

5 - Egas Moniz apresenta a comunicação: How I came to perform Prefrontal Leucotomy.

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SAUDADES | ROSA MARIA RODRIGUES

O êxito deste foi de tal forma significativo, que a Delegação Brasileira (Pacheco e Silva, P. Longo, Matos Pimenta, Mário Yahn, Aníbal Silveira, Élio Simões e A.C. Barreto) apresentou ao Congresso6, uma moção (aprovada por aclamação por todas as delegações presentes), de proposta de Egas Moniz ao Prémio Nobel. O texto dizia que o prémio era merecido pelos “inestimáveis serviços prestados à Ciência e à Humanidade pelas duas notáveis descobertas (...), arteriografia e leucotomia cerebrais, hoje universalmente consagradas”. A moção foi aprovada por aclamação, após o apoio dos delegados argentinos, franceses e norte-americanos. O “Nobel” 7 estava mais próximo. Egas Moniz, refere na que considero ser a sua autobiografia científica8 que …a proposta brasileira para a recomendação do meu nome para prémio Nobel foi o epílogo inesperado para mim, mas altamente penhorante para o Congresso Internacional de Psicocirurgia.9

Grupo dos congressistas do I Congresso Internacional de Psicocirurgia - Lisboa 3 a 7 de Agosto de 1948

6 - De referir o papel importante do Neurocirurgião Matos Pimenta, ironicamente viria a falecer depois da visita à Casa Museu Egas Moniz, por ocasião das comemorações dos 60 anos da invenção da Angiografia Cerebral. 7 - Egas Moniz foi proposto ao Prémio Nobel em 1928, 1933,1937,1944 e 1948, sendo as três primeiras propostas, pela invenção da Angiografia Cerebral. 8 - Refiro a obra Confidências de um Investigador Científico 9 - EGAS MONIZ, António Caetano de Abreu Freire in Confidências de um Investigador Científico, Edições Ática 1949, pág. 619-621.

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Matos Pimenta na Casa Museu Egas Moniz

Posteriormente esta proposta foi apresentada formalmente à Academia das Ciências da Suécia pela Faculdade de Medicina e Academia das Ciências de Lisboa, que contou com o inequívoco apoio das numerosas Sociedades Cientificas e personalidades de relevo científico de diferentes países. Na quinta-feira de 27 de Outubro de 1949, Egas Moniz recebe o telegrama que lhe confere o Prémio Nobel da Medicina e Fisiologia “Le Collège des Professeurs de l’Institut Carolin a décidé d’attribuer le Prix Nobel de Physiologie et de Médicine en 1949 moitié à vous pour votre découverte de la valeur thérapeutique de la leucotomie préfrontale chez certaines psychoses”. “Logo nesse dia, à sua casa, afluíram os amigos a felicitá-lo. E, ali, entre os seus livros, as suas flores, os seus quadros, as suas aguarelas, as suas estatuetas, as suas obras-primas de cerâmica valiosa e rara, num ambiente de elevado cunho artístico, e austera e tranquila vida, onde passaram as suas inquietações pelo futuro da obra científica, alegrias quando o tempo, confirmava os resultados previstos, o Prof. Doutor Egas Moniz, rodeado pelos amigos, teve o sentimento glorioso de ser o primeiro português a receber tão alta recompensa”10. 10 - Revista Internacional, Dezembro de 1949.

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SAUDADES | ROSA MARIA RODRIGUES

Telegrama a comunicar a atribuição do Prémio Nobel

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Mensagem de Júlio Dantas

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Diploma do PrĂŠmio Nobel


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A atribuição deste Prémio assumiu proporções de facto históricas, pois pela primeira vez um cientista português foi reconhecido com o mais honroso galardão da ciência contemporânea.

Jornal “ Sempre Fixe” - 3 de Novembro de 1949

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British Medical Journal – 6 Novembro de 1949

L’Echo Iilustré – 19 de Novembro de 1949


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Herald Tribune - 28 de Outubro de 1949

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Time Star - 27 Outubro de 1949


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Os prémios Nobel de 194911 foram entregues em Estocolmo, pelo rei Gustavo V, a 10 de dezembro de 1949. Egas Moniz, impedido pela sua debilitada saúde de se deslocar a Estocolmo, celebrou a ocasião com uma receção para 75 convidados na sua residência. Egas Moniz proferiu o seguinte discurso dirigindo-se ao Ministro da Suécia: Excelência: Era hoje que devia estar em Estocolmo para receber o prémio que me foi concedido pelo Colégio Carolino. Infelizmente, devido à falta de saúde – já na minha idade – sinto imenso não pude ter tido a grande honra de aceitar das mãos de Sua Majestade o Rei da Suécia o prémio Nobel. Nestas condições tomei a decisão de arranjar uma compensação, trazendo à minha casa a Suécia, representada por Sua Excelência o Sr. Ministro e MadameWeidel. A sua bondosa aquiescência ao meu convite traz aqui a atmosfera do seu país e das receções realizadas em Estocolmo em honra dos que atingem o apogeu no mundo científico. A distribuição do prémio Nobel em Estocolmo é uma festa única no mundo. O Rei, a Família Real, o governo, a Faculdade de Medicina, a Universidade inteira, acorrem à cerimónia. Na sobriedade daquela notável sessão, é o Chefe de Estado que realça o valor do prémio, dando aos eleitos os seus diplomas. Não se trata, entretanto, duma festa sueca, é uma solenidade internacional de grande repercussão. Aqui, neste pequeno canto de Portugal, onde a grande distinção chegou pela primeira vez, quis mostrar a V. Ex.ª a gratidão dos médicos portugueses, reunindo aqui todos os que trabalham no setor que me levou ao Prémio Nobel. A grande maioria dos que hoje aqui vieram são pessoas que se dedicam à Medicina e entre elas a maior parte é de Neurologistas e Psiquiatras que se ocupam mais ou menos da leucotomia pré-frontal que foi realçada em Estocolmo. O nosso eminente Presidente da Academia das Ciências de Lisboa, o Sr. Dr. Júlio Dantas, quis darme a honra de assistir a este jantar. É, como V. Ex.ª muito bem sabe, um notável escritor, um grande poeta e um dramaturgo de renome mundial. É um brilhante diplomata especializado em assuntos culturais. Mas é também um médico e desse título se orgulha sem que a ele se refira. Os médicos dos hospitais de Santa Marta, Júlio de Matos e Miguel Bombarda estão aqui largamente representados. Seguem todos a escola da angiografia cerebral e da leucotomia pré-frontal. Os atuais chefes desta escola, Professor António Flores, meu sucessor na Cadeira de Neurologia, e o Professor Almeida Lima, no Hospital Santa Marta, o Professor Barahona Fernandes e os seus numerosos e excelentes colaboradores no Hospital Júlio de Matos e o Doutor Almeida Amaral no Hospital Bombarda, com os seus assistentes, seguem a boa orientação de procurar alcançar factos novos a bem da ciência e da humanidade.

11 - O Prémio de 1949 foi partilhado com o cientista Rudolph Hess (1881-1973), premiado pelos estudos que desenvolveu no sistema neurovegetativo. O valor monetário do mesmo foi de 432.023 $50, valor correspondente a metade do Prémio Nobel.

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Há também nos arredores de Lisboa dois grandes asilos particulares dirigidos, um pelos doutores Pedro Polónio e Miller Guerra, outro pelo Doutor Almeida Amaral e Professor Almeida Lima que trabalham igualmente no mesmo sentido, tendo constituído uma população de enfermos que se aproxima de dois mil. A continuação da obra que a Faculdade de Medicina de Estocolmo pronunciou está pois bem assegurada. Excelência! Todos estes neurologistas e psiquiatras estão aqui reunidos para saudar a Suécia, o vosso venerado Rei GustavoV e a vós, Sr. Ministro, e a Madame Weidel. < Daily Mail - 31 de Outubro de 1949

Receção de Egas Moniz a 10 de dezembro de 1949 (Lisboa)

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SAUDADES | ROSA MARIA RODRIGUES

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A entrega formal do Prémio realizou-se em Lisboa, a 3 de Janeiro de 1950 pelo Ministro da Suécia acreditado em Portugal, Sr. Gustaf Weidel.

Entrega do Prémio Nobel – 3 de Janeiro de 1950 (Lisboa)

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Após ter sido galardoado com o Prémio Nobel, o país desdobrou-se em comemorações e por todo o lado pululavam homenagens e palavras amigas ao homem, ao criador e cientista pelo seu trabalho e investigação. Com a concessão do Prémio Nobel, dir-se-ia que para Egas Moniz, chegava ao fim a caminhada de uma vida do modo que ele sempre aspirara, desde que em 1927 obtivera a primeira imagem da circulação cerebral, até à leucotomia pré - frontal12. 12 - Segundo João Lobo Antunes “Após a atribuição do Prémio Nobel, a psicocirurgia continuou a ser praticada pelas figuras mais ilustres da neurocirurgia mundial, até à introdução dos psicofármacos, que começou com a clorpromazia, em 1954. A pouco e pouco, fora surgindo críticas, a maior parte das vezes não substanciadas, quanto ao uso da psicocirurgia em situações de duvidosa indicação ou mesmo por abjetas motivações. A cruzada anti psicocirurgia teve manifestações tão mediáticas como o filme Voando sobre Um Ninho de Cucos, Milos Forman, adaptação de uma peça de Ken Kesey. O livro de Elliot Valenstein Great and Desperate Cures, publicado em 1986, repleto de falsidades e erros, foi muito saudado, pela sua crítica feroz a Egas. Christine Johnson, uma bibliotecária médica, cuja avó terá sido leucotomizada, criou um site, para promover uma campanha para retirar o prémio a Egas Moniz. A iniciativa, no entanto, esmoreceu com o tempo. Julgar duas contribuições científicas de Egas à luz dos preceitos éticos atuais (que, no fundo, começaram em 1947, com o Código Nuremberga) é um exercício espúrio, pela completa descontextualização em relação à época em que os trabalhos de Egas foram desenvolvidos. A verdade, porém é que a psicocirurgia foi certamente uma das áreas que mais suscitou uma reflexão académica, filosófica e moral, no âmbito da chamada neuroética. Depois de ter recolhido a uma quase clandestinidade durante mais de três décadas, a psicocirurgia com renovado entusiasmo e outra maturidade cientifica. O conceito original de Egas, de que uma perturbação de circuitos neuronais estava na génese de certas patologias psiquiátricas, é agora forçado pelas novas técnicas de biologia molecular e das neurociências. Hoje não restam dúvidas de que a intuição de Egas e o seu destemor abriram um novo caminho à cirurgia funcional do sistema nervoso, agora mais precisa nos seus alvos, menos destrutiva no seu método e mais severa na avaliação dos seus resultados” in Médicos e Sociedade – Para uma História da Medicina em Portugal p. 354.

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A CONSAGRAÇÃO E O RECONHECIMENTO

Festa em Avanca - abril de 1950

Carta de Berta Matos, Professora de Pardilhó - 1949

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Homenagem Nacional a Egas Moniz

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SAUDADES | ROSA MARIA RODRIGUES

Homenagem Junta de Freguesia de Avanca

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SAUDADES | ROSA MARIA RODRIGUES

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SAUDADES | ROSA MARIA RODRIGUES

Homenagem no Cine-Teatro de Estarreja na Páscoa de 1950 [ Página anterior ] Ata da reunião da Câmara Municipal de Estarreja de 10 novembro de 1949

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Homenagem em Coimbra - Abril 1950

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SAUDADES | ROSA MARIA RODRIGUES

Homenagem - Queima das Fitas de Coimbra 1950

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Em Janeiro de 1950, em consequência da atribuição do Nobel, é criado por despacho do Secretário do Instituto para a Alta Cultura o Centro de Estudos Egas Moniz, cujo objetivo era “além de estudo da Neurologia e Psiquiatria (...) as investigações no domínio da neurologia iniciadas por aquele professor” O Centro ficou instalado no Hospital Júlio de Matos, tinha orientação e direção técnica da Faculdade de Medicina de Lisboa e estava apenso às cadeiras de Neurologia e Psiquiatria. Egas Moniz era o presidente, Almeida Lima, o vice-presidente, e da direção faziam parte ainda António Flores, Barahona Fernandes e Almeida Amaral. Já depois da morte de Egas Moniz transfere-se,13 para o Hospital Santa Maria e recebe apoio da Fundação Calouste Gulbenkian, criando vários laboratórios, uma biblioteca (que é ainda para muitos considerada a melhor do país na área das neurociências e que integra muitos dos livros do Hospital de Santa Marta e onde constam exemplares que foram propriedade de Egas Moniz) e um pequeno museu, da traça do Arquiteto Sommer Ribeiro, dedicado à vida e à obra do Mestre. Pode visualizar-se a reconstituição física do gabinete de consulta do Mestre no Hospital de Santa Marta, os utensílios desenvolvidos e utilizados nas primeiras angiografias e leucotomias, a seringa de Egas Moniz, a pinça de Martins etc... Um visual é dedicado à descoberta e processo de desenvolvimento do método da Angiografia (1927), com o recurso ao retrato sequencial de imagens radiográficas de diferentes patologias. Este espaço alberga o retrato de Egas Moniz, pintado pelo Mestre Malhoa em 1932.

Centro de Estudos Egas Moniz. Hospital de Santa Maria - Lisboa 13 - Conforme estabeleceu o DL n.º 40965, publicado no Diário do Governo, nº1 – I Série de 2 Janeiro de 1957.

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Um apontamento de Hernâni Monteiro. Porto 2 de Fevereiro de 1950

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Em setembro de 1950 é inaugurado na sua terra natal um busto da autoria de David Cristo, onde se lê: AQUI VIU NOVA LUZ A HUMANIDADE

Homenagem em Avanca – setembro de 1950

EM SUMA CONSUBSTANCIAVAM-SE OS INFORTÚNIOS E GLÓRIAS DO HOMEM QUE QUASE TUDO O QUE QUIS, TUDO CONSEGUIU, NUMA CONSAGRAÇÃO TRANQUILA. [ 335 ]



TERRAS DE ANTUÃ | HISTÓRIAS E MEMÓRIAS DO CONCELHO DE ESTARREJA

[ N.º1 | Ano I | 2007 ] SUMÁRIO: HOJE, POR ONTEM, PARA AMANHÃ, José Eduardo de Matos; EDITORIAL, Delfim Bismarck Ferreira; ARTIGOS: EM SALREU, A “CASA DO SANTO” OU “A CASA DO FERRAZ”, Amaro Neves; O PATRIMÓNIO NAVAL NA FREGUESIA DE PARDILHÓ, Andreia Vidal Leite; CARTOFILIA ESTARREJENSE - A 1.ª metade do século XX, António Augusto Silva; DIVAGAÇÕES A PROPÓSITO DE UM VELHO RETRATO - Rostos da Fontinha, António Pedro de Sottomayor; MOINHOS E MOLEIROS DO CONCELHO DE ESTARREJA, Armando Carvalho Ferreira; A INTERVENÇÃO ARQUEOLÓGICA NA CAPELA DE SANTO AMARO, Beduído - Estarreja, Carlos A. Brochado de Almeida e Pedro Brochado de Almeida; OS REGEDORES DAS FREGUESIAS DO CONCELHO DE ESTARREJA, Delfim Bismarck Ferreira; UMA FAMÍLIA DE ESTARREJA - Notas genealógicas sobre o ramo materno da família de D. Frei Caetano Brandão, Bispo do Pará e Arcebispo Primaz de Braga, Francisco M. Ponces de Serpa Brandão; HISTÓRIA DO ENSINO PRIMÁRIO NO CONCELHO DE ESTARREJA, Marco Pereira; O COUTO DE ANTUÃ E AVANCA NO FINAL DA IDADE MÉDIA - O impacto da crise dos séculos XIV e XV segundo três cartas de sentença, Rafael Marques Vigário; A IMPORTÂNCIA DA REDE VIÁRIA NA ESTRUTURAÇÃO DA DIOCESE VISIGÓTICA DE COIMBRA: Antuane como uma das suas paróquias, Sónia Filipe; SAUDADES. [ N.º2 | Ano II | 2008 ] SUMÁRIO: COMO É RICA A NOSSA HISTÓRIA, José Eduardo de Matos; EDITORIAL, Delfim Bismarck Ferreira; ARTIGOS: O BISPO DE COCHIM - Alguns apontamentos para o seu conhecimento, António Augusto Silva; LEITURA DE FEIRA E NÃO SÓ, António de Pinho Nunes; ESTARREJA NA IDADE MÉDIA - Documentação dos séculos X a XIII, Delfim Bismarck Ferreira; O LIVRO DE EXCOMUNGADOS E LEMBRANÇAS DA IGREJA DE SÃO MIGUEL DE FERMELÃ, Hugo Calão; OS MEUS ANTEPASSADOS DE ESTARREJA, José Manuel Nunes Liberato; O ASSOCIATIVISMO AGRÁRIO NA SUB-REGIÃO DE AVEIRO (1854-1923) - Contributo para o seu estudo, Manuel Ferreira Rodrigues; MONARQUIA DO NORTE [ou Traulitânia] - Ocupação monárquica de Estarreja (24.1.1919-11.21919), Marco Pereira; O ESTÁBULO DA IGREJA PAROQUIAL DE BEDUÍDO, Maria Clara Paiva Vide Marques; LIVROS PAROQUIAIS DE AVANCA - Uma fonte por explorar, Maria Palmira da Silva Gomes; BANDA BINGRE CANELENSE: PELA MÚSICA HÁ 140 ANOS, Teresa Bagão; O CONCELHO DE ESTARREJA E OS SEUS EMIGRANTES ENTRE OS ANOS DE 1900 E 1905, Valter Santos; SAUDADES, ADENDAS E CORRECÇÕES: Novos Subsídios para a História da Capela de Santo António, Marco Pereira.

[ N.º3 | Ano III | 2009 ] SUMÁRIO: A AVANTURA CONINUA, José Eduardo de Matos; EDITORIAL, Delfim Bismarck Ferreira; ARTIGOS: JORNAIS E JORNALISTAS NA TERRA DA MADEIRA ATÉ 1925, António Augusto Silva; A CONSTRUÇÃO NAVAL NO NORTE DA RIA DE AVEIRO: DA ÁREA DE INFLUÊNCIA DO CONCELHO DE ESTARREJA AO BICO DA MURTOSA, António Vítor N. de Carvalho; CASA DOS MORGADOS DE SANTO ANTÓNIO DA PRAÇA, EM ESTARREJA, Delfim Bismarck Ferreira; A CHEGADA DA ENERGIA ELÉCTRICA AO CONCELHO DE ESTARREJA: 1925-1930 - BREVES APONTAMENTOS HISTÓRICOS, Diana Cunha & Susana Temudo Silva; EPISÓDIO DA VIDA PLOÍTICA DE HÁ CEM ANOS, José Augusto Tavares Gurgo e Cirne; INVASÕES FRANCESAS NOS CONCELHOS DE ESTARREJA E MURTOSA, Marco Pereira; AS CONVERSAS COM A TIA ROSA, Margarida Castro; RETÁBULO DA CAPELA DE SANTA BÁRBARA EM BEDUÍDO, Maria Clara PaivaVide Marques; MANUEL FIRMINO D’ALMEIDA MAIA (1824-1897), Maria Manuel de Vilhena Barbosa; EGAS MONIZ - O PRÉMIO NOBEL, Rosa Maria Rodrigues; FAMILIARES DO SANTO OFÍCIO RELACIONADOS COM ESTARREJA, Teresa Cruz Tubby; O CONCELHO DE ESTARREJA E OS SEUS EMIGRANTES ENTRE OS ANOS DE 1882 E 1887, Valter Santos; SAUDADES.

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MUNICÍPIO DE ESTARREJA

[ N.º4 | Ano IV | 2010 ] SUMÁRIO: CEM ANOS DA REPÚBLICA E MAIS DE MONARQUIA, José Eduardo de Matos; EDITORIAL, Delfim Bismarck Ferreira; ARTIGOS: ALBERTO FERREIRA VIDAL - Notável Estarrejense, António Augusto Silva; EGAS MONIZ, das origens telúricas à celebração internacional, António Macieira Coelho; “MULTIPLICAR OS PEIXES E POUPÁ-LOS QUANDO SE REPRODUZEM…” - O debute parlamentar de um filho de Estarreja, António Pedro de Sottomayor; O “RESTAURO” DA BANDEIRA DA MONARQUIA - Tratamento de Conservação e Restauro da bandeira da Câmara Municipal de Estarreja, Eva Armindo; OS INVENTÁRIOS DAS IGREJAS E CAPELAS DAS PARÓQUIAS DOS CONCELHOS DE ESTARREJA E MURTOSA, Hugo Calão; OS ÚLTIMOS TEMPOS DA MONARQUIA E A IMPLANTAÇÃO DA REPÚBLICA PORTUGUESA, com as suas consequências em Estarreja, de acordo com as memórias de Francisco de Moura Coutinho de Almeida d’Eça, Luís Augusto Eça de Matos; NOTAS PARA A HISTÓRIA DA PRIMEIRA REPÚBLICA NO DISTRITO DE AVEIRO: Alberto Souto administrador do concelho de Estarreja, Luís Souto de Miranda; DA COBERTURA DE COLMO À TELHA DE FONTELA, Marco Pereira; SÃO MIGUEL ARCANJO - PADROEIRO DE FERMELÃ, Maria Clara PaivaVide Marques; OS CAMINHOS DA CIRES - o seu 50.º aniversário, Maria Elvira Callapez; DOMINGOS JOAQUIM DA SILVA, Visconde de Salreu (1854-1936) - Parte I, Maria de Jesus Sousa de Oliveira e Silva; INTERVENÇÃO DE CONSERVAÇÃO E RESTAURO DA PEDRA DE ARMAS DO BISPO DE COCHIM, Patrícia Mestre Marques de Carvalho; RECUPERAÇÃO DOS MOINHOS DE MEIAS - Quinta do Marinheiro, Casa-Museu Egas Moniz, Ricardo Matos, Luís Loureiro e Nuno Matos; AVANCA - DOS ÚLTIMOS ANOS DA MONARQUIA ATÉ À IMPLEMENTAÇÃO DA REPÚBLICA, Telma Marília Assunção Correia; O CONCELHO DE ESTARREJA E OS SEUS EMIGRANTES (1888-1892), Valter Santos; SAUDADES, ADENDAS E RECTIFICAÇÕES. [ N.º5 | Ano V | 2011 ] SUMÁRIO: NÃO REFORMAMOS A HISTÓRIA!, José Eduardo de Matos; EDITORIAL, Delfim Bismarck Ferreira; ARTIGOS: A SAGA DO NAVIO MARIA DAS FLORES, O Lugre Maria das Flores - o bota-abaixo, Ana Maria Lopes; CAETANO FERREIRA - Notável Estarrejense, jornalista errante e viajante, António Augusto Silva; PASSADO PATRIMÓNIO E FUTURO - Primeiros elementos para uma carta arqueológica do concelho de Estarreja, António Manuel S. P. Silva & Gabriel Rocha Pereira; CASA DO OUTEIRO DE PAREDES EM AVANCA, Delfim Bismarck Ferreira e Maria Palmira da Silva Gomes; A ARQUEOLOGIA NA REDE PRIMÁRIA DE TRANSPORTE DE GÁS: A passagem pelo distrito de Aveiro, João Muralha; O FUNDADOR DE ESTARREJA, Joaquim Lagoeiro; ORIGEM DA CASA DO COUTO, SALREU, ESTARREJA, Jorge Barbosa Montenegro; CONSELHEIRO FRANCISCO LOURENÇO DE ALMEIDA - Participante na transição da Monarquia Absoluta para a Monarquia Liberal, na primeira metade do século XIX, Marco Pereira; OS VALENTES DE ALMEIDA DE PARDILHÓ, Maria HelenaValente Pinto; AS ELITES LOCAIS E SUA INFLUÊNCIA NOS FINS DO SÉCULO XIX E PRIMEIRAS DÉCADAS DO SÉCULO XX - UM EXEMPLO: Domingos Joaquim da Silva,Visconde de Salreu (1854-1936) - Parte II, Maria de Jesus Sousa de Oliveira e Silva; AFORAMENTOS DE SANTO AMARO,TORREIRA E OUTROS (1780 a 1950) - PROCESSOS EM ARQUIVO, Norvinda Leite; O PAPEL DAS MULHERES NAVIDA DE EGAS MONIZ, Rosa Maria Rodrigues; OS CINETRATOS NO DISTRITO DE AVEIRO - Materialização de um programa em Rodrigues Lima, Susana Constantino; O CONCELHO DE ESTARREJA E OS SEUS EMIGRANTES (1893-1894), Valter Santos e Teresa Cruz; SAUDADES; NOTAS SOLTAS: ORDENANÇAS E MILÍCIAS NO CONCELHO DE ESTARREJA (1866); ARQUITECTURA NA FEIRA DE SANTO AMARO; ADENDAS E RECTIFICAÇÕES [N.º6 | Ano VI | 2012 ] SUMÁRIO: A IMPORTÂNCIA DO RITUAL, José Eduardo de Matos; EDITORIAL, Delfim Bismarck Ferreira; ARTIGOS: EMBARCAÇÕES TRADICIONAIS DE CANELAS, Ana Maria Lopes; Dr. TAVARES DA SILVA - Figura incontornável do Desporto Nacional do séc. XX, António Augusto Silva; O PATRIMÓNIO CINÉFILO DO CONCELHO DE ESTARREJA, António Costa Valente; O CASTRO DE SALREU (ESTARREJA): RESULTADOS DA PRIMEIRA CAMPANHA DE ESCAVAÇÕES ARQUEOLÓGICAS, António Manuel S. P. Silva, Gabriel R. Pereira & Paulo A. P. Lemos; ANTÓNIO MOTA GODINHO MADUREIRA - Um esboço biográfico, Delfim Bismarck Ferreira; MIGRAÇÕES ARQUITECTÓNICAS - O popular e o histórico na hora de Francisco Farinhas, Domingos Tavares; O PATRIMÓNIO E O SEU PAPEL CULTURAL NO CONTEXTO LOCAL E REGIONAL, José Mattoso; FÁBRICAS DE LACTICÍNIOS NOS CONCELHOS DE ESTARREJA E MURTOSA, Marco Pereira; SACRÁRIOS DAS IGREJAS PAROQUIAIS DO CONCELHO DE ESTARREJA, Maria Clara Vide Marques; ESTARREJA - Sua origem como topónimo, Maurício António Fernandes; O CONCELHO DE ESTARREJA E OS SEUS EMIGRANTES (1895), Teresa Cruz Tubby e Valter Santos; SAUDADES; NOTAS SOLTAS: ESTARREJA E AS SUAS ACTUAIS FREGUESIAS (1853); CONCELHO DE ESTARREJA (1875); ESTADO ACTUAL DA INDÚSTRIA CERÂMICA (1905); ESTARREJA (1912); ANTUÃ: Paróquia Sueva; 8 DIAS DE “LIBERDADE” … CONDICIONADA; REVISTAS TERRAS DE ANTUÃ.

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TERRAS DE ANTUÃ | HISTÓRIAS E MEMÓRIAS DO CONCELHO DE ESTARREJA

[ N.º7 | Ano VII | 2013 ] SUMÁRIO: EU SOU QUE SEI, José Eduardo de Matos, A HISTÓRIA VAISE FAZENDO, Diamantino Sabina, EDITORIAL, Delfim Bismarck Ferreira, ARTIGOS: HENRIQUE LAVOURA - construtor naval de nomeada, Ana Maria Lucas, CÓNEGO REBELO DOS ANJOS - Capelão de militares e Civis, António Augusto Silva, O CÓNEGO BARBOSA E O DOGMA DA IMACULADA CONCEIÇÃO, António Pedro Sotto Mayor, O VINCULO DA CASA DO COUTO EM SALREU (1755), Delfim Bismarck Ferreira, MEMÓRIAS DO QUOTIDIANO - os Painéis dos Barcos Moliceiros, José Gurgo e Cirne, INVENTÁRIO DO ESPÓLIO DE CONSTRUÇÃO NAVAL DO MESTRE HENRIQUE LAVOURA - PARDILHÓ, Juliana Cunha, REVOLTAS POPULARES EM ESTARREJA E MURTOSA, Marco Pereira, FRANCISCO MARQUES RODRIGUES, Maria Almira de Oliveira Rodrigues Barata e Manuel Oliveira Rodrigues, RETÁBULOS DA IGREJA DE SÃO BARTOLOMEU DE VEIROS, Maria ClaraVide Marques e António Cruz Leandro, OS ELEITOS DA CÂMARA DE ESTARREJA REFERÊNCIAS NAS ATAS DE 1860-1910,Norvinda Leite, NOTA SOBRE A IDENTIFICAÇÃO DE UMA PEÇA ARQUEOLÓGICA DE VALE CASTANHEIRO, SALREU, Paulo Morgado, MEMÓRIAS DA CONSTRUÇÃO NAVAL, Sérgio Paulo Silva, A EMIGRAÇÃO NO CONCELHO DE ESTARREJA (1896), Teresa Cruz eValter Ramos, SAUDADES, REVISTAS “ TERRAS DE ANTUÔ [ N.º8 | Ano VIII | 2014 ] SUMÁRIO. VIAJE COMIGO POR TERRAS DE ANTUÃ, Diamantino Sabina, EDITORIAL, Rosa Maria Rodrigues, ARTIGOS: AS DESCOBERTAS DE EGAS MONIZ E O SEU CONTEXTO HISTÓRICO, Álvaro Macieira Coelho, A CONSTRUÇÃO NAVAL LAGUNAR E A MUSEOLOGIA - Mestre Esteves - Pardilhó Ana Maria Lopes, OS 90 ANOS DOS BOMBEIROS VOLUNTÁRIOS DE ESTARREJA, Andreia Tavares, PATRIMÓNIO MUSICAL DE ESTARREJA - Um contributo, António Augusto Silva, A FAMÍLIA BANDEIRA EM ESTARREJA E SALREU DESDE O SÉCULO XVIII, Delfim Bismarck Ferreira, MEMÓRIAS DO QUOTIDIANO - Os Painéis dos Barcos Moliceiros, José Gurgo e Cirne, CRÓNICAS DE UM PASSADO PRESENTE - Alguns apontamentos para o estudo geral deste Concelho de Estarreja, José Teixeira Valente, OS ACTUAIS CONCELHOS DE ESTARREJA E MURTOSA NO SÉCULO XIII, Marco Pereira, PINTURAS DEVOCIONAIS DOS ALTARES- MORES DO CONCELHO DE ESTARREJA, Maria Clara Paiva Vide Marques e Sylvie Ferreira, FRANCISCO AUGUSTO DA SILVA ROCHA E A CASA DE FRANCISCO MARIA SIMÕES - Um novo padrão de Beleza, Maria João Fernandes, OS ELEITOS DA CÃMARA MUNICIPAL DE ESTARREJA - REFERÊNCIAS NAS ATAS (CONT) - 19102013, Norvinda Leite, DEAMBULANDO PELAS RUAS, Sérgio Paulo Silva, O CONCELHO DE ESTARREJA E OS SEUS EMIGRANTES - ANO DE 1897 TRILHOS DOS AMAZONAS, Teresa Cruz e Valter Santos, SAUDADES - OS 50 ANOS DO MERCADO MUNICIPAL DE ESTARREJA João Alegria REVISTAS “TERRAS DE ANTUÔ [ N.º9 | Ano IX | 2015 ] SUMÁRIO, E VÃO NOVE, Diamantino Sabina, EDITORIAL, Rosa Maria Rodrigues, PINTORES DE EMBARCAÇÕES LAGUNARES, Ana Maria Lopes, 150 ANOS DEDICADOS À MÚSICA, OS EXECUTANTES DA BANDA BINGRE CANELENSE DESDE A SUA FUNDAÇÃO, Ana Paula Almeida, CARNAVAL DE ESTARREJA: DAS COMEMORAÇÕIES POPULARES ÀS BATALHAS DAS FLORES, Andreia Tavares, DR. MANUEL FIGUEIREDO. MÉDICO DE LARGO SENTIDO HUMANO, António Augusto Silva, A OBRARETABULAR DA IGREJA DE SÃO PEDRO DE PARDILHÓ, António Cruz Leandro e Maria Clara de Paiva Vide Marques, PATRIMÓNIO - LUGAR DE MEMÓRIA E DE IDENTIDADE, Carla Ferreira, O DESEMBRAGADOR DR. JOSÉ HOMEM CORRÊA TELES, Delfim Bismarck Ferreira, CONTRIBUTO PARA UM INVENTÁRIO HISTÓRICO DA COLETIVIDADE CONCELHIA” O CENTRO” - CENTRO RECREATIVO DE ESTARREJA CRE NA CELEBERAÇÃO DOS 105ºANIVERSÁRIO, José Fernando Correia, MEMÓRIAS DO QUOTIDIANO. OS PAINÉIS DOS BARCOS MOLICEIROS, José Gurgo e Cirne, A LEITURA PÚBLICA EM ESTARREJA, Juliana Cunha, PRIMEIRA REFERÊNCIA ESCRITA A SALREU (1076/1106), Marco Pereira, FRENTE LAGUNAR DE ESTARREJA E OS SEUS TESOUROS, Norberto Monteiro, JORNAL “ O CONCELHO DE ESTARREJA” 1901-2014 DO SOTÃO PARA O MUNDO DIGITAL, Norvinda Leite, BANDA VISCONDE DE SALREU, 1 DE OUTUBRO DE 1925-1 DE OUTUBRO DE 2015 DO PASSADO AO PRESENTE UM SÓ CAMINHO, A MESMA ENTREGA À MÚSICA E À ARTE DE BEM FAZER, Raquel Maria Rodrigues de Jesus, SANTA CASA DA MISERICÓRDIA DE ESTARREJA 80 ANOS AO SERVIÇO DO CONCELHO DE ESTARREJA, Rosa de Fátima Figueiredo, CASA MUSEU EGAS MONIZ - RECANTOS DO MARINHEIRO, Rosa Maria Rodrigues, ESCOLA SECUNDÁRIA DE ESTARREJA: UM PERCURSO COM MEIO SÉCULO, Teresa Bagão, EMIGRAÇÃO ESTARREJENSE NO ANO DE 1898, Teresa Cruz Tubby e Valter Santos, SAUDADES - CINE TEATRO DE ESTARREJA 65 ANOS DE HISTÓRIAS E MEMÓRIAS, João Carlos Alegria

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MUNICÍPIO DE ESTARREJA

[ N.º10 | Ano X | 2016 ] A NOSSA CASA BRANCA, Diamantino Sabina, EDITORIAL, Rosa Maria Rodrigues, ROTA LAGUNARES, Ana Maria Lopes, CARNAVAL DE ESTARREJA:1930 A 1974, Andreia Tavares, RANCHO FOLCLÓRICO DE VEIROS - AS PRIMEIRAS DANÇAS: 1939-1947, António Augusto Silva, TRABALHOS ARQUEOLÓGICOS EM 2016 NO CRASTO DE SALRE ESTARREJA - BREVE NOTÍCIA António Manuel Silva, Gabriel R. Pereira, Paulo P. Lemos e Sara Almeida e Silva, A PEDRA DE ARMAS DA CASA DA FONTINHA, EM BEDUÍDO, ESTARREJA, Delfim Bismarck Ferreira, CASAS COM TORRE, Domingos Tavares, MEMÓRIAS DO QUOTIDIANO - OS PAINEIS DOS BARCOS MOLICEIROS José Gurgo e Cirne, A BIBLIOTECA PRIVADA DE EGAS MONIZ - CASA DO MARINHEIRO EM AVANCA, Juliana Cunha, O VÍNCULO DA CAPELA DE S. SIMÃO DO BUNHEIRO NO CONCELHO DE ESTARREJA, DISTRITO DE AVEIRO, Luís Miguel Pulido Garcia Cardoso de Menezes, PESOS E MEDIDAS NA HISTÓRIA DE ESTARREJA E MURTOSA, Marco Pereira, PINTURAS DE MILAGRES, HISTÓRIAS E MEMÓRIAS DE ESPERANÇA E FÉ…, Maria Clara de Paiva Vide Marques e António Cruz Leandro, EDIFÍCIO DOS PAÇOS DO CONCELHO DE ESTARREJA - UM PERCURSO PELAS FONTES DE 120 ANOS DE HISTÓRIA, Norvinda Leite, UM OUTRO OLHAR SOBRE O PATRIMÓNIO EDIFICADO DA ANTIGA FREGUESIA DE BEDUÍDO: A TERRA COMO FORMA DE CONSTRUÇÃO Susana Temudo e Diana Cunha Santos EMIGRAÇÃO ESTARREJENSE NO ANO DE 1899, Teresa Cruz Tubby e Valter Santos SAUDADES - NOS 20 ANOS DO FESTIVAL INTERNACIONAL DE CINEMA DE AVANCA, António Costa Valente e Rita Capucho [ N.º11 | Ano XI | 2017 ] “ROSTO EDIFICADO”, Diamantino Sabina, EDITORIAL, Rosa Maria Rodrigues, CARLOS PINTO DE SOUSA - Um autodidacta do crescimento cultural, António Augusto Silva, UMA ALDEIA DE HÁ DOIS MIL ANOS UM SÍTIO ARQUEOLÓGICO E A SUA INVESTIGAÇÃO, António Manuel Silva, Gabriel R. Pereira, Sara Almeida e Silva e Paulo. P. Lemos, A PEDRA DE ARMAS DA “CASA DO COUTO”, EM SALREU, Delfim Bismarck Ferreira, PALACETES EM ESTARREJA, Domingos Tavares, MEMÓRIAS DO QUOTIDIANO - Em busca do tempo perdido, José Gurgo e Cirne, O PATRIMÓNIO BIBLIOGRÁFICO DE ANTÓNIO MADUREIRA - Casa-Museu Marieta Solheiro Madureira em Estarreja, Juliana Cunha, TAVARES RESENDE DA CASA DE S. BERNARDO DA CONGOSTA EM AVANCA - Estarreja, Aveiro, Luís Cardoso Menezes, OS CONCELHOS DE ESTARREJA E MURTOSA NA PRIMEIRA GRANDE GUERRA (1914-1918), Marco Pereira, ESCULTURA DEVOCIONAL NA IGREJA MATRIZ DE AVANCA, Maria Clara de Paiva Vide Marques, António Cruz Leandro e Luís Alberto Casimiro, FORAL DO ANTUÃ: DOCUMENTOS AUTÊNTICOS QUE O TROUXERAM ATÉ HOJE, Norvinda Leite, UMA CARTA, Sérgio Paulo Silva, JOAQUIM MARIA LEITE, Teresa Cruz Tubby, EMIGRAÇÃO ESTARREJENSE NO ANO DE 1906, Teresa Cruz Tubby e Valter Santos, SAUDADES - EGAS MONIZ - UM PERCURSO - 90 Anos da Angiografia Cerebral (1927-2017), Rosa Maria Rodrigues [ N.º12 | Ano XII | 2018 ] MEMÓRIAS, Diamantino Sabina, EDITORIAL, Rosa Maria Rodrigues, MANIFESTO DA COMISSÃO ELEITORAL OPOSICIONISTA DO CONCELHO DE ESTARREJA, Andreia Tavares, UMA SIMPLES CONVERSA E AS PRIMEIRAS PRISÕES POLÍTICAS EM ESTARREJA, António Augusto Silva, TRABALHOS ARQUEOLÓGICOS NO CASTRO DE SALREU BREVE CRÓNICA DA INTREVENÇÃO DE 2018, António Manuel Silva, Gabriel R. Pereira, Sara Almeida e Silva e Paulo A.P. Lemos, AS CASAS DO MATO (SALREU) E DA FONTE CHÃ (BEMPOSTA) NOS OFÍCIOS CONCELHIOS ANTUANOS SUBSÍDIOS PARA A HISTÓRIA DOS REGISTOS DE NOTARIADO NO CONCELHO DE ESTARREJA – 1ª PARTE DE D. JOÃO II A FILIPE II, António Pedro de Sottomayor, OS MOINHOS DE MEIAS, Armando Carvalho Ferreira, A FAMÍLIA QUADROS EM SALREU DESDE O FINAL DO SÉCULO XVIII (PARTE I), Delfim Bismarck Ferreira, CONSTRUÇÃO NAVAL TRADICIONAL NO MUNICIPIO DE ESTARREJA – QUE FUTURO?, Etelvina Resende Almeida, MEMÓRIAS DO QUOTIDIANO – DOS MÉRITOS DO PRIMITIVISMO INGÉNUO José Gurgo e Cirne, CARLOS MARQUES RODRIGUES:O FUNDADOR DA FÁBRICA DE DESCASQUE DE ARROZ – A “HIDRO-ELÉTRICA” DE ESTARREJA, Juliana Cunha, OS BISPOS PORTUGUESES ORIGINÁRIOS DO CONCELHO DE ESTARREJA, DISTRITO DE AVEIRO NO SÉCULO XX, Luís Cardoso Menezes, A PNEUMÓNICA, OU GRIPE ESPANHOLA. EM ESTARREJA (1918-1919)Marco Pereira, PRISIONEIROS DO CONCELHO DE ESTARREJA DA PRIMEIRA GUERRA MUNDIAL NA FRENTE OCIDENTAL – 1917-1918, Maria Clara de Paiva Vide Marques, António Cruz Leandro, UMA OBRA DO PINTOR FRANCISCO PINTO COSTA (1826-1869) NA CASA MUSEU EGAS MONIZ, Susana Moncóvio, EMIGRAÇÃO ESTARREJENSE NO ANO DE 1907, Teresa Cruz Tubby e Valter Santos SAUDADES - 50 ANOS DA CASA MUSEU EGAS MONIZ, Rosa Maria Rodrigues, REVISTAS TERRAS DE ANTUÃ

[ 340 ]



MUNICÍPIO DE ESTARREJA

AUTORES

TA 1

TA 2

TA 3

TA 4

TA 5

TA 6

TA 7

Alvaro Macieira Coelho Amaro Neves

TA 8 X

X

Ana Maria Lopes

X

X

X

X

Ana Paula Almeida Andreia Vidal Leite

X

António Augusto Silva

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X

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X

António Costa Valente

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X

António Cruz Leandro

X

X

X

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X

X

X

X

X

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X

X

X

X

X

António Manuel S. P. Silva

X

António de Pinho Nunes

X

X

X

X X

X

António Vítor N. Carvalho

X

X X

X

Carla Ferreira Carlos A. Brochado de Almeida

X

X X

António Macieira Coelho

Armando Carvalho Ferreira

X X

Andreia Tavares

António Pedro de Sottomayor

TA 9 TA 10 TA 11 TA 12 TA 13

X X

Carlos Pinho Delfim Bismarck Ferreira

X X

X

Diana Cunha

X

X

X

X

X

X

X

X

X

X

X

Domingos Tavares

X

X

X

Edite Martins de Sá

X

Etelvina Resende Almeida

X

Eva Armindo Francisco M. Pontes de S. Brandão

X X X

X

X

X

X

X

João Alegria

X

João Muralha

X

Joaquim Lagoeiro

X

José Fernando Correia

X

X

José Fernando Salvador

X

Jorge Barbosa Montenegro

X

José Gurgo e Cirne José Manuel Nunes Liberato

X

X

X

X

X

X

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X

X

X

X

X

X

José Teixeira Valente

X

Juliana Cunha

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X

X

José Mattoso

Luís Augusto Eça de Matos

X

X

Gabriel Rocha Pereira Hugo Cálão

X

X X


TERRAS DE ANTUÃ | HISTÓRIAS E MEMÓRIAS DO CONCELHO DE ESTARREJA

AUTORES

TA 1

TA 2

TA 3

Luís Loureiro

TA 4

TA 5

TA 6

TA 7

TA 8

TA 9 TA 10 TA 11 TA 12 TA 13

X

Luís Cardoso Menezes Luís Souto de Miranda Manuel Ferreira Rodrigues

X

X

X X

X

Margarida Castro

X

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Maria Almira de Oliveira R. Barata

X

Maria Clara Vide

X

X

Maria Elvira Callpez

X

X

X

X

Maria Helena Valente Pinho

X

Maria de Jesus Sousa de O. e Silva

X

X

Maria João Fernandes

X

Maria Manuel de Vilhena Barbosa

X

Maria Palmira da Silva Gomes

X

X

Maurício Antonino Fernandes

X

Norberto Monteiro

X

Norvinda Leite

X

Nuno Matos

X

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X

X

Paulo Morgado

X

Patrícia Mestre M. Carvalho

X

Pedro Brochado de Almeida

X

Rafael Marques Vigário

X

Raquel Rodrigues de Jesus

X

Ricardo Montes

X

Rita Capucho

X

Rosa Figueiredo

X

Rosa Maria Rodrigues

X

X

X

Sara Almeida e Silva

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Sérgio Paulo Silva

X

Sylvie Ferreira

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X

X X

Susana Moncóvio

X

Susana Temudo Silva

X

Telma Marília Assunção Correia

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X

Teresa Cruz Tubby Valter Santos

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Susana Constantino

Teresa Bagão

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Paulo A. P. Lemos

Sónia Filipe

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Manuel de Oliveira Rodrigues Marco Pereira

X X

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