O uso e ocupação do espaço na Vila do Abraão, Ilha Grande

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UNIVERSIDADE FEDERAL FLUMINENSE PROGRAMA DE PÓS-GRADUAÇÃO EM ARQUITETURA E URBANISMO MESTRADO EM ARQUITETURA E URBANISMO

ANA FLÁVIA OLIVEIRA PECCATIELLO

O USO E A OCUPAÇÃO DO ESPAÇO NA VILA DO ABRAÃO - ILHA GRANDE, RJ: UMA ABORDAGEM SOBRE O DESENVOLVIMENTO DO TURISMO, A URBANIZAÇÃO E OS INSTRUMENTOS LEGAIS

Niterói 2010


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ANA FLÁVIA OLIVEIRA PECCATIELLO

O USO E A OCUPAÇÃO DO ESPAÇO NA VILA DO ABRAÃO – ILHA GRANDE, RJ: UMA ABORDAGEM SOBRE O DESENVOLVIMENTO DO TURISMO, A URBANIZAÇÃO E OS INSTRUMENTOS LEGAIS

Dissertação apresentada ao Curso de Pós-Graduação em Arquitetura e Urbanismo da Universidade Federal Fluminense, como requisito parcial para a obtenção do Grau de Mestre. Área de concentração: Espaço construído e meio ambiente.

Orientador: Prof. Dr. WERTHER HOLZER

Niterói 2010


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BIBLIOTECA


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ANA FLÁVIA OLIVEIRA PECCATIELLO O USO E A OCUPAÇÃO DO ESPAÇO NA VILA DO ABRAÃO – ILHA GRANDE, RJ: UMA ABORDAGEM SOBRE O DESENVOLVIMENTO DO TURISMO, A URBANIZAÇÃO E OS INSTRUMENTOS LEGAIS

Dissertação apresentada ao Curso de PósGraduação em Arquitetura e Urbanismo da Universidade Federal Fluminense, como requisito parcial para a obtenção do Grau de Mestre. Área de concentração: Espaço construído e meio ambiente.

Aprovada em __________________.

BANCA EXAMINADORA

_____________________________________________________ Prof. Dr. WERTHER HOLZER - Orientador Universidade Federal Fluminense – UFF ____________________________________________________ Prof. Drª. MARIA DE LOURDES PINTO MACHADO COSTA Universidade Federal Fluminense- UFF

Prof. Dr. ROGÉRIO RIBEIRO DE OLIVEIRA Pontifícia Universidade Católica do Rio de Janeiro - PUC

Niterói 2010


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Dedico este trabalho ao meu marido Nelsinho, à minha mãe Cláudia, à minha irmã Ana Cláudia, aos meus afilhados Aninha e Dudu, aos meus avós Affonso e Alice e à minha querida amiga Vanessa (in memorian).


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AGRADECIMENTOS Ao professor orientador Dr. Werther Holzer, pela sua dedicação, empenho e amizade; Ao “Programa de Pós-Graduação em Arquitetura e Urbanismo da Universidade Federal Fluminense” na pessoa da Profª Drª Maria Lais Pereira da Silva; Aos membros da Banca Examinadora, pela disposição em avaliar este trabalho; A todos os professores e colaboradores do “Programa de Pós-Graduação em Arquitetura e Urbanismo”, pela disponibilidade em sanar dúvidas, pelos incansáveis debates e discussões e pela transmissão de conhecimentos preciosos para a conclusão deste trabalho; Aos colegas do mestrado, pelo apoio e companhia durante o curso; Aos entrevistados, pela contribuição essencial ao desenvolvimento deste trabalho, em especial a Cássio Abreu pela disponibilidade, atenção e clareza das informações; A Alexandre Oliveira, pelo apoio, documentos, informações e principalmente, pela amizade germinada e pelo amor à Ilha Grande; Ao meu marido Nelsinho, pela companhia, incentivo, serenidade, pelo exemplo de superação e por sempre me ajudar a encontrar o melhor caminho neste trabalho e na vida; À minha mãe, pela constante confiança, apoio, sacrifícios, choros e risadas; À minha irmã e aos meus afilhados Aninha e Dudu, por trazerem mais alegrias a este período; Ao vô Affonso e vó Alice, por serem, simplesmente, o maior e mais bonito exemplo de amor; Aos meus queridos: Celinha, tio Wallace, Bililico, Ni, Helene, tio Celso, tia Toninha, Tiago e Vitória, pelas conversas sérias e jogadas fora.


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“O desenvolvimento é uma finalidade, mas deve deixar de ser uma finalidade míope ou uma finalidade-término. A finalidade do desenvolvimento submete-se ela própria a outras finalidades. Quais? Viver verdadeiramente. Viver melhor”. EDGARD MORIN


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RESUMO

As atividades produtivas geradas a partir das práticas turísticas têm sido apontadas no mundo inteiro como possibilidades de dinamização das economias nacionais e locais. Embora essa idéia seja bastante difundida e seja comum ouvirmos falar nas potencialidades do turismo para gerar emprego, distribuir renda e melhorar a qualidade de vida das populações locais, em muitos espaços da produção e do consumo turístico verifica-se o contrário: segregação socioespacial, concentração de

renda e outros impactos

socioambientais indesejáveis. A Vila do Abraão, localizada na Ilha Grande/RJ, é o retrato da produção desordenada do espaço turístico, a qual mesmo protegida por leis em âmbito nacional, estadual e municipal que determinam a organização do uso e ocupação do solo, sofre com a especulação imobiliária, desmatamento, lixo, poluição das águas e adensamento urbano. Neste sentido tem-se a hipótese de que os impactos negativos provocados pelo crescimento desordenado do turismo na Vila do Abraão são intensificados pela falta de articulação institucional e de ações coordenadas

da

gestão pública

configurando um cenário de contínua degradação ambiental. Assim, o trabalho tem como objetivo analisar os principais instrumentos legais de gestão urbana e ambiental, propostas pelos gestores municipais e estaduais para a Vila do Abraão no período de 1994 a 2008 e suas influências na intensificação da degradação ambiental local.

Palavras-chaves: Adequação ambiental, impactos do turismo, legislação urbanística e ambiental, organização espacial, Vila do Abraão, Ilha Grande – RJ.


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ABSTRACT

The productive activities generated from the tourist practices have been aimed all over the world as possibilities to growth of the national and local economies. Although that idea be enough diffused out and either common to hear to speak in the potentialities of the tourism to generate job, to distribute income and to improve the quality of life of the local populations, in many spaces of the production and the tourist consumption verifies the opposite: socio spatial segregation, socio environmental concentration of income and other undesirable impacts. The Village of the Abraão, located in the IlhaGrande/RJ, is the portrait of the output disorganized of the tourist space, to which even protected by laws in municipal, state, and national scope that decide to organization of the use and occupation of soil, suffers with the real estate speculation, deforestation, garbage, pollution of waters and urban concentration. In this sense the hypothesis is had that the negative impacts provoked by the disordered growth of the tourism in the Village of the Abraão are intensified by the lack of institutional joint and coordinate actions of the public administration configuring a scene of continuous environmental degradation. Thus, the work has like objective analyze the main lawful instruments of environmental and urban management, proposals for the municipal and state managers for the Village of the Abraão in the period of 1994 to 2008 and its influences in the intensification of the local environmental degradation.

Key-words: Environmental adequacy, impacts of tourism, urban and environmental legislation, spatial organization, Village of the Abraão, Ilha Grande – RJ.


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SUMÁRIO Introdução

16

Objetivos

19

Metodologia

19

1. Bases Teórico-conceituais 1.1 – Crise ambiental e planejamento 1.1.1 – Planejamento ambiental e os paradigmas do dsenvolvimento

27 27 30

1.2 – Turismo e sua influência na organização do espaço

38

1.3 – Políticas públicas ambientais e seus instrumentos

50

1.3.1 – O Sistema Nacional de Unidades de Conservação - SNUC

60

2. Caracterização geral da área

73

2.1 – A Ilha Grande

73

2.1.1 – As unidades de conservação da Ilha Grande

82

2.2 – A Vila do Abraão

87

3. Considerações sobre a Vila do Abraão: análise dos instrumentos legais de organização do uso e ocupação do solo em nível estadual e municipal 3.1 – Aspectos e condicionantes em nível estadual

97

97

3.1.1 – Plano Diretor da Área de Proteção Ambiental de Tamoios

105

3.2 – Aspectos e condicionantes em nível municipal

115

3.2.1 – Área de Especial Interesse, Cultural, Ambiental, Turístico e de Utilização Pública da Vila do Abraão (AECATUP)

121

Conclusões

141

Referências bibliográficas

147


xi

LISTA DE FIGURAS Figura 1: Planta publicada no prospecto de venda do complexo turístico-imobiliário do Meliá

47

Figura 2: Panfleto publicitário apresentando implantação de condomínio residencial

típica

47

Figura 3: Evolução da área acumulada das unidades de conservação por tipo de uso, por quinquênio

70

Figura 4: Vista parcial da Ilha Grande, Vila do Abraão

74

Figura 5: Vista parcial da Ilha Grande, Vila Dois Rios

75

Figura 6: Vista geral da Enseada do Abraão

88

Figura 7: Vista parcial da Enseada do Abraão

88

Figura 8: Pier particular invadindo área de mar e restringindo o uso público

91

Figura 9: Casa construída da área do PEIG

92

Figura 10: Tubulações expostas e edificações constuídas nas margens do curso d’água

93

Figura 11: Caminhão da coleta de lixo da Vila do Abraão estacionado em uma rua em frente ao cais principal, próximo a entulhos

95

Figura 12: Lixo espalhado pela Praia do Abraão, ao lado do cais principal

95

Figura 13: Edificação às margens do Córrego do Bicão e tubulações expostas

134

Figura 14: Construções às margens do Rio da Assembléia e área densamente ocupada

134

Figura 15: Edificações construídas em costões rochosos

135

Figura 16: Construção próxima a costão rochoso e invadindo área de mar

136

Figura 17: Construção ocupando faixa de areia

137

Figura 18: Casa em condições precárias construída em área com declividade acentuada

138

Figura 19: Rua e edificações em área com declividade acentuada

139

Figura 20: Área densamente ocupada

139


xii

LISTA DE MAPAS Mapa 1: Localização da área de estudo

74

Mapa 2: Unidades de conservação da Ilha Grande

83

Mapa 3: Zoneamento da Ilha Grande proposto pelo Plano Diretor da APA de Tamoios

111

Mapa 4: Sub-áreas urbanas da AECATUP da Vila do Abraão – mapa anexo da Lei nº 648, de 29 de dezembro de 1997

124

Mapa 5: Mapa de zoneamento da Ilha Grade – Plano Diretor Municipal de Angra dos Reis

129

Mapa 6: Uso do solo da Enseada do Abraão - 1991

132

Mapa 7: Uso do solo da Enseada do Abraão - 2005

133


xiii

LISTA DE TABELAS Tabela 1: Tipologias e categorias de unidades de conservação previstas pelo Sistema Nacional de Unidades de Conservação (Lei nº 9.985/2000) – SNUC

66

Tabela 2: Unidade de conservação federais criadas entre os anos de 2003 a 2007

70

Tabela 3: Ciclos produtivos da Ilha Grande

81

Tabela 4: Orçamentos anuais do Executivo/RJ (1976 – 2002)

108

Tabela 5: Analogia das terminologias dos zoneamentos dos instrumentos de gestão

128


xiv

LISTA DE SIGLAS E ABREVIATURAS UC APA APP PEIG FEEMA IEF INEA AECATUP PMAR TEBIG RBMA EMBRATUR PNMA SOSP IES CECA ESAG SANERJ ICN DEPOL DECAM REBIO DIVEA SNUC OSCIP DGRNR IPERJ UGI SEMADUR SEA SISNAMA SERLA FECAM CODIG SEMADS ZVS ZCVS ZOC ZIE CONAMA SAPE COMAM

Unidade de conservação Área de Proteção Ambiental Área de Preservação Permanente Parque Estadual da Ilha Grande Fundação Estadual de Engenharia e Meio Ambiente Instituto Estadual de Florestas Instituto Estadual do Ambiente Área Especial de Interesse Cultural, Ambiental, Turístico e de Utilização Pública Prefeitura Municipal de Angra dos Reis Terminal Petrolífero da Ilha Grande Reserva da Biosfera da Mata Atlântica Instituto Brasileiro de Turismo Política Nacional de Meio Ambiente Secretaria de Obras e Serviços Públicos Instituto de Engenharia Sanitária Comissão Estadual de Controle Ambiental Empresa de Saneamento da Guanabara Companhia de Saneamento do Estado do Rio de Janeiro Instituto de Conservação da Natureza Departamento de Poluição Departamento de Conservação Ambiental Reserva Biológica Divisão de Estudos Ambientais Sistema Nacional de Meio Ambiente Organização da Sociedade Civil de Interesse Público Departamento Geral de Recursos Renováveis Instituto da Previdência do Estado do Rio de Janeiro Unidade de Gestão Integrada Secretaria de Estado de Meio Ambiente e Desenvolviment Urbano Secretaria do Ambiente Sistema Nacional de Meio Ambiente Fundação Superintendência Estadual de Rios e Lagos Fundo Estadual de Conservação Ambiental Comitê em defesa da Ilha Grande Secretaria Estadual de Meio Ambiente e Desenvolvimento Sustentável Zona de Vida Silvestre Zona de Conservação da Vida Silvestre Zona de Ocupação Controlada Zona de Influência Ecológica Conselho Nacional de Meio Ambiente Sociedade Angranse de Proteção Ecológica Conselho Municipal das Associações de Moradores


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CPT CUCA CNUMA TAC SOD SUP

Comissão Pastoral da Terra Centro Unificado de Cultural e Arte Conselho Municipal de Meio Ambiente e Urbanismo Termo de Ajustamento de Conduta Sub-área de ocupação diversificada Sub-área de utilização pública


INTRODUÇÃO

O turismo é, incontestavelmente, um fenômeno econômico, político, social, cultural e ambiental dos mais expressivos da sociedade contemporânea. Além de ser considerada uma das atividades com maior índice de geração de riqueza do planeta, é tida também como maior geradora de empregos no mundo, dando oportunidade para um em cada nove trabalhadores. Desta forma, o turismo vem se firmando como instrumento estratégico para auxiliar o desenvolvimento de diversas localidades, contribuindo de forma direta para promover e dinamizar os inúmeros segmentos relacionados ao mesmo e impulsionando o crescimento de novas oportunidades de negócios e investimentos (BARRETO, 1995). O turismo configura-se assim como um importante elemento na produção, transformação e consumo espacial.

O turismo como parte integrante do processo mais geral de implantação e consolidação da economia capitalista apresenta todos os aspectos dos demais setores produtivos, ou seja, possui características predatórias e outras que podem torná-lo um indutor do desenvolvimento sustentável (Dias, 2003, p. 10).

Sendo o turismo essencialmente um fenômeno de caráter socioespacial, é plausível considerar que as reflexões sobre o mesmo, em toda sua


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complexidade, devam priorizar suas expressões no espaço. Segundo SANTOS (1994, p. 111) o espaço pode ser entendido como “um conjunto indissociável, solidário e também contraditório, entre sistemas de objetos e sistemas de ações, não considerados isoladamente, mas como o quadro único no qual a história se dá”. Atualmente o turismo se configura como um importante elemento desses sistemas de objetos e ações, impingindo suas características e consequências nas diversas paisagens e culturas. Nesta perspectiva podemos considerar que o turismo na natureza é um segmento de destaque tanto pelo crescimento da demanda quanto pelos impactos que provoca. Em áreas naturais, as transformações na paisagem e as reformulações da dinâmica sócio-econômica são mais facilmente percebidas pois incidem justamente sobre locais tidos como “paraísos ecológicos”. O turismo na natureza é, portanto uma atividade complexa e multidisciplinar na qual muitos aspectos devem ser levados em conta a fim de que ela se realize de

forma

bem-sucedida

para

todos

os

envolvidos:

consumidores,

administradores, comunidades locais e meio ambiente. Contudo, a realidade do turismo na maior parte das áreas naturais está muito distante do desejável e necessário. “Paraísos tropicais” foram apropriados pelo mercado turístico de forma rápida e intensa, sem o acompanhamento de um planejamento adequado, condizente com as peculiaridades locais. Por ser um mercado capaz de absorver as mais diversas atividades e mão-de-obra – muito ou nada especializadas – o turismo facilmente se estabelece e se fortalece, principalmente em áreas que já contam com atrativos de destaque. Assim, em curto prazo o retorno financeiro desta atividade é facilmente percebido ao passo que os impactos negativos de ordem ambiental, sócio-cultural e até mesmo econômica fazer-se-ão presentes com um pouco mais de tempo. Neste ínterim, a necessidade de planejamento pungente não é suficiente para frear o crescimento do turismo e um quadro caótico acaba por se instalar. A história recente do turismo na Ilha Grande/RJ em muito se aproxima da situação supracitada e revela um debate candente entre moradores, visitantes, grupos de interesse, órgãos públicos e grupos ambientalistas,


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principalmente a partir da década de 1990 após a implosão do Instituto Penal Cândido Mendes (1994) e consequente ascensão da atividade turística. Neste contexto a Vila do Abraão, principal porta de entrada da Ilha, vem sofrendo os reflexos do incremento do turismo, que dia-a-dia imprime notáveis alterações na paisagem local. A Vila abriga a maior parte da infra-estrutura existente na Ilha Grande e é onde se localizam tanto o cais de atracação da barca da Companhia Barcas S.A. (que realiza o transporte de passageiros de Angra dos Reis e Mangaratiba até a Ilha Grande) como um cais de atracação de barcos de passeio turísticos e particulares. O crescimento da visitação e conseqüente aumento da demanda por hospedagem, alimentação e demais infra-estruturas turísticas promove um gradativo avanço das edificações e vias por áreas protegidas por lei, já que a Vila está inserida na Área de Proteção Ambiental de Tamoios e em parte no Parque Estadual da Ilha Grande (PEIG). Desta forma, o rápido crescimento do turismo na Ilha Grande resultou na utilização do aporte físico e natural de forma desordenada e, por conseguinte, na degradação ambiental. O que se verifica, no entanto são ações contraproducentes por parte da administração pública que na Vila do Abraão é realizada tanto pela Prefeitura Municipal de Angra dos Reis como, até 2008, pela Fundação Estadual de Engenharia e Meio Ambiente (FEEMA) e Instituto Estadual de Florestas/RJ (IEF), gestores das unidades de conservação. Nesta miscelânea administrativa que envolve o poder municipal e o estadual verifica-se uma insuficiência de ações que visem compatibilizar os usos de turismo, moradia e preservação, e contemplem os diversos atores. Neste sentido tem-se a hipótese de que os impactos negativos provocados pelo crescimento desordenado do turismo na Vila do Abraão são intensificados pela falta de articulação institucional e de ações coordenadas da gestão pública configurando um cenário de contínua degradação ambiental. São necessários, portanto estudos que identifiquem as incongruências da gestão estabelecida na Vila do Abraão e suas relações com o processo de degradação ambiental, com a finalidade de contribuir para a melhoria das ações de planejamento urbano e ambiental em localidades onde se deve


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compatibilizar

os

pressupostos

de

conservação

ambiental

com

o

desenvolvimento da atividade turística.

OBJETIVOS

Objetivo principal: Analisar os principais instrumentos legais de gestão urbana e ambiental, propostos pelos gestores municipais e estaduais para a Vila do Abraão no período de 1994 a 2008 e suas influências na intensificação da degradação ambiental local. Objetivos específicos: - Verificar as alterações no uso e ocupação do solo entre os anos de 1994 a 2008; - Identificar os gestores públicos envolvidos na administração da Vila do Abraão; - Realizar, para o período proposto, levantamento e análise dos instrumentos legais de organização do uso e ocupação do solo da Vila, classificando as atuações dos gestores públicos e identificando tanto lacunas como superposições; - Verificar, a partir de um levantamento qualitativo entre moradores e usuários, a percepção das alterações relativas à implementação dos instrumentos legais pesquisados.

METODOLOGIA

Para atingir os objetivos estabelecidos para esta pesquisa foi realizado durante todas as fases do trabalho um levantamento bibliográfico no acervo da Universidade Federal Fluminense, da Universidade Estadual do Rio de Janeiro, acervos pessoais de professores, pesquisadores e demais envolvidos na temática analisada, além de sites da internet (bibliotecas virtuais, sites


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institucionais e sites de divulgação de informações sobre a Ilha Grande). Para a obtenção de dados específicos sobre as unidades de conservação, legislação pertinente e aspectos físico-ambientais da Ilha Grande foram visitadas a sede do INEA (Instituto Estadual do Ambiente) na Ilha Grande e em Angra dos Reis e a Prefeitura Municipal de Angra dos Reis, especificamente a Secretaria de Meio Ambiente e Desenvolvimento Urbano. O material obtido foi organizado e analisado tendo em vista além do entendimento e aprofundamento a respeito das temáticas em estudo, a fundamentação da escolha dos instrumentos legais de ordenamento do uso e ocupação do solo em nível municipal e estadual e dos atores públicos e sociais a serem entrevistados. Objetivando melhor avaliar de que forma o planejamento urbano e ambiental vem sendo aplicado à área, a pesquisa envolveu o levantamento das leis ambientais relacionadas à Ilha Grande e, especificamente, à Vila do Abraão no período compreendido entre os anos de 1994 e 2008, recorte temporal

desta

pesquisa.

Entretanto,

optou-se

por

estudar,

mais

profundamente, somente aquelas que criaram e regulamentaram as unidades de conservação onde a Vila do Abraão está integralmente inserida (Área de Proteção Ambiental de Tamoios) e as demais relacionadas ao ordenamento do espaço na Vila (Plano Diretor de Angra dos Reis - Lei Municipal nº162/LO de 12/12/1991; Área Especial de Interesse Cultural, Ambiental, Turístico e de Utilização Pública da Vila do Abraão – Lei nº 648 de 29/12/1997). É importante ficar registrado que há um leque muito extenso de leis ordinárias de competência Federal, Estadual e Municipal que são, ou pelo menos deveriam ser aplicadas à referida Ilha, não sendo, entretanto objetos deste trabalho. Quanto ao material cartográfico/bases digitais obtidos para subsidiar a análise temporal da degradação ambiental em relação ao uso e ocupação do solo na Vila do Abraão optou-se por utilizar prioritariamente os materiais da dissertação de mestrado de Ana Lúcia Castro de Oliveira (2005) 1, pois os 1

OLIVEIRA, Ana Lúcia Castro de. Avaliação de conflitos ambientais na Área de Proteção Ambiental Tamoios (Enseada de Abraão – Ilha Grande/Angra dos Reis) com base na legislação ambiental. Dissertação (Mestrado em Geografia) - Instituto de Geociências, Universidade do Estado do Rio de Janeiro, 2005.


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mesmos foram gerados a partir de dados e técnicas de geoprocessamento mundialmente difundidas e utilizadas, o que demonstra a confiabilidade dos mapas gerados. A autora da dissertação supracitada utilizou para a confecção dos Mapas de Uso do Solo de 1991 e 2005, os seguintes recursos materiais devidamente tratados e adequados à finalidade de sua pesquisa: -

Planta Cadastral de Abraão, confeccionada pela Secretaria de

Desenvolvimento Econômico-Social e Planejamento da Prefeitura de Angra dos Reis, na escala de 1:2.000, contendo dados gerais e de uso do solo referentes ao ano de 1991; -

Imagem do Satélite IKONOS, multiespectral, nas bandas 1(azul)

2(verde) e 3 (vermelho), com 1 metro de resolução espacial (tamanho do pixel), com data de aquisição de dezembro de 2001. A decisão pelo uso de mapas não provenientes de órgãos oficiais de gestão da Vila do Abraão deveu-se ao fato desses órgãos possuírem apenas bases cartográficas com informações genéricas e em sua maior parte não disponíveis em formato digital. Concomitantemente

às

análises

documentais

e

cartográficas

desenvolvidas em gabinete, foram realizadas idas a campo, com o objetivo de verificar as condições ambientais atuais da Vila do Abraão, identificando os principais problemas que repercutem sobre o local, provenientes das atividades incompatíveis com o que a legislação referente à Área de Proteção Ambiental de Tamoios e à AECATUP do Abraão preceitua. Também como trabalho de campo foram realizadas entrevistas semiestruturadas com os gestores dos órgãos da esfera pública municipal e estadual envolvidos na gestão da Vila do Abraão de 1994 a 2008; com agentes representativos do movimento ambientalista na Ilha Grande; e com os moradores locais. No primeiro e segundo casos as entrevistas versaram prioritariamente sobre os aspectos históricos e políticos de construção do Plano Diretor da Área de Proteção Ambiental de Tamoios e da Área de Especial Interesse Cultural, Ambiental, Turístico e de Utilização Pública da Vila do Abraão, com destaque para o entendimento dos processos de gestão


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determinados para a área no decorrer do período supracitado. Já com o terceiro grupo as entrevistas foram conduzidas de forma a levarem ao entendimento sobre a percepção dos entrevistados quanto à degradação ambiental local, ao turismo e quanto ao conhecimento dos mesmos em relação aos instrumentos legais aos quais a Vila do Abraão está subordinada. A partir dos mapas de Uso do Solo de 1991 e 2005, da compilação das informações obtidas com as entrevistas e demais dados obtidos com a pesquisa documental e bibliográfica foi possível realizar uma reflexão e análise acerca das características conjunturais do planejamento estabelecido, identificado o grau de envolvimento dos gestores públicos nos processos de elaboração e/ou implementação dos instrumentos legais. Através da análise comparativa desses instrumentos e suas repercussões e conseqüências em relação à degradação ambiental quanto ao uso e ocupação do solo foi possível estabelecer um panorama da dinâmica das transformações espaciais e consequente degradação ambiental, ponderando sobre a associação desta com a administração da Vila. As grandes dificuldades encontradas durante a elaboração do trabalho foram relacionadas ao acesso, nos órgãos públicos, ao material cartográfico de qualidade em formato digital e às informações desencontradas dadas por esses mesmo órgãos. Felizmente, mesmo com alguns percalços, ainda é possível encontrar nesses órgãos pessoas realmente comprometidas com a gestão da Vila do Abraão, dispostas a contribuir prontamente com as pesquisas acadêmico-científicas. A presente dissertação foi estruturada em três capítulos. No primeiro, “Bases teórico-conceituais”, é conferida a discussão a partir dos conceitos que embasam as análises, com destaque para os seguintes temas: crise ambiental e planejamento, turismo e organização do espaço e políticas públicas ambientais. Em um primeiro momento é contextualizada de forma sucinta a crise ambiental em que se encontra a nossa sociedade e o surgimento do conceito de sustentabilidade dentro do que é defendido por autores como ACSELRAD (1997), SACHS (2002) e LEFF (2006), os quais procuram trazer este conceito para o campo das relações sociais. São também definidos os


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conceitos de qualidade de vida e degradação ambiental, tendo como base HERCULANO (2006) e a Política Nacional de Meio Ambiente, respectivamente. É apresentada também a condição da cidade diante desta crise, como reflexo do modelo de desenvolvimento estabelecido, onde se aglomeram problemas de toda ordem e urge a necessidade de ações de planejamento fundamentadas na interação e integração dos sistemas que compõe o ambiente. Esta perspectiva de planejamento corrobora com os princípios do planejamento ambiental defendido por SANTOS (2004) e FRANCO (2008). As dimensões para a boa forma da cidade propostas por LYNCH (1985) configuram-se como umas das referências primordiais na elaboração do planejamento ambiental para a organização do espaço urbano tendo em vista a sustentabilidade. São também apresentadas, em um segundo momento deste capítulo, as estatísticas de crescimento do turismo no mundo, as causas desse comportamento crescente assim como dados a respeito de sua importância para as economias global e locais, justificando a sua consolidação como uma das principais atividades econômicas do século XXI. Ressalta a influência do turismo, por meio de seus agentes, na transformação do espaço e da paisagem com a construção de novas estruturas, a atribuição de novas funções para velhos usos e a reorganização de localidades para que se tornem atrativas dentro da lógica do mercado. São trabalhadas assim as conseqüências dessa produção de paisagens para o consumo e o lazer – processo de turistificação dos espaços – das quais podemos destacar a emergência de novos quadros socioambientais com o surgimento de novas demandas e conflitos sociais e ocupação intensa e desordenada do solo. São autores relevantes para o entendimento destes aspectos: BERQUE (1998), BOO (2002), CORRÊA (1989), CRUZ (2007), FRATUCCI (2000, 2006), KRIPPENDORF (2001), LIMONAD (1999), LUCHIARI (1998), RONAI (1977) e SAUER (1998). Para finalizar o primeiro capítulo foram utilizados como referências principais BACELAR (2009), LITTLE (2006), VALLEJO (2003) e VIEIRA & BEDARIOL (1998) na busca de uma definição do termo “políticas públicas” que esteja em consonância com as premissas desta pesquisa. É apresentada a


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evolução do conceito a partir de 1980 e a influência desta mudança para o Estado brasileiro, tradicionalmente centralizador. A partir destas constatações o trabalho direciona-se para o entendimento do desenvolvimento tardio da política ambiental brasileira através da caracterização das grandes linhas de evolução deste processo. A periodização proposta por MONOSOWSKI (1989) é utilizada para o período compreendido entre 1930 e 1988; a partir desta data até o ano 2000 outros autores como CORDANI et al. (1997), JACOBI (2003), REZENDE (2003) e SOUZA (2005) são utilizados como referências principais na discussão sobre a posição da política ambiental brasileira frente às novas demandas e esforços internacionais para a proteção do meio ambiente. Tal análise culmina com a contextualização política de criação do SNUC (Sistema Nacional de Unidades de Conservação) em 2000, onde prioriza-se o diálogo realizado por autores como BENSUSAN (2006), MEDEIROS (2004, 2009), MERCADANTE (2001, 2009) e MILARÉ (2001). O segundo capítulo, “Caracterização geral da área” é dedicado a uma abordagem sobre os aspectos geográficos condicionantes, tais como clima, relevo, vegetação e hidrografia da Ilha Grande. São também apresentados aspectos histórico-econômicos com ênfase na ocupação da Ilha e na criação do mosaico de unidades de conservação ali presentes assim como os reflexos dessa conjuntura sobre a organização territorial e desenvolvimento da urbanização, especialmente no que concerne aos contextos que levaram à conformação atual do principal aglomerado populacional da Ilha Grande, a Vila do Abraão. São também abordados os aspectos ambientais da Vila do Abraão, suas principais deficiências no que tange à infraestrutura urbana associada a um aumento desenfreado do número de turistas e, por conseguinte, dos equipamentos turísticos (meios de hospedagem, restaurantes, agências de receptivo, etc) deflagrando a condição de degradação ambiental em que se encontra a Vila atualmente. Este item tem como principais fontes: CODIG (2009), EQUIPE IVT (2004), GAMA et al. (2006), MENDONÇA (2008), OLIVEIRA (2005), OLIVEIRA & FEICHAS (2005), PMAR (2006), PRADO (2003, 2006), WUNDER (2006).


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No último capítulo, “Considerações sobre a Vila do Abraão: análise dos instrumentos legais de organização do uso e ocupação do solo em nível estadual e municipal” realizou-se o detalhamento dos instrumentos legais de uso e ocupação do solo em nível municipal e estadual sendo eles: a Área de Especial Interesse Cultural, Ambiental, Turístico e de Utilização Pública da Vila do Abraão (AECATUP – Lei nº 648, de 29 de dezembro de 1997) e o Plano Diretor da APA de Tamoios (Decreto nº 20.172, de 01 de julho de 1994), respectivamente. Foram apresentadas informações sobre os aspectos históricos e políticos de construção desses instrumentos, com destaque para o entendimento tanto dos processos de gestão determinados para a área no decorrer dos anos de 1994 a 2008 como da constituição e atuação dos órgãos públicos envolvidos (Prefeitura Municipal de Angra dos Reis, FEEMA e IEF). Foram primordiais para este capítulo as entrevistas com os seguintes agentes do poder público da esfera municipal e estadual envolvidos na gestão da Vila do Abraão: Cássio Veloso de Abreu (Gerente de Geoprocessamento da Secretaria de Meio Ambiente e Desenvolvimento Urbano; arquiteto do quadro efetivo da Prefeitura de Angra desde 1992) e Mônica Nemer (Chefe da APA de Tamoios desde 2007). Foram também de grande relevância as informações obtidas nas entrevistas com o engenheiro Alexandre Oliveira, presidente do CODIG – Comitê em Defesa da Ilha Grande e com José Rafael Ribeiro, servido público municipal e membro da SAPE – Sociedade Angrense de Proteção Ecológica. Essa etapa gerou um aporte de informações oriundas das pessoas que diretamente sofrem os reflexos das ações administrativas implantadas configurando-se então como importantes fontes de experiências e relatos sobre as conseqüências da implementação dos instrumentos legais, assim como dos processos de elaboração dos mesmos. O item 3.3 foi elaborado a partir do material cartográfico disponível realizando-se uma análise da evolução da degradação ambiental quanto ao uso e ocupação do solo. Foi referência primordial a dissertação de mestrado de Ana Lúcia Castro de Oliveira (2005) a qual confeccionou os mapas de uso e ocupação do solo dos anos de 1991 e 2005 para a Vila do Abraão, material inexistente nos órgãos públicos. Foi feita uma análise comparativa entre os instrumentos legais em estudo, verificando pontos de divergência e


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convergência. Diante às informações compiladas foi possível refletir acerca das características conjunturais da gestão estabelecida, entender como se deu o envolvimento dos gestores públicos nos processos de elaboração e/ou implementação dos instrumentos legais e realizar uma análise comparativa entre estes instrumentos e suas repercussões e conseqüências em relação à degradação ambiental quanto ao uso e ocupação do solo.


1. BASES TEÓRICO-CONCEITUAIS

1.1 – CRISE AMBIENTAL E PLANEJAMENTO

A

crise

ambiental

característica

da

modernidade

deflagrou

a

necessidade de organização sistemática das ações do homem sobre o espaço, induzindo a estruturação de formas de planejamento que minimizem os impactos do insustentável sistema de desenvolvimento implantado. Esta crise, envolta por nuances diversas – economia, demografia, desenvolvimento, ecologia – tornou eminente a globalidade das problemáticas em questão, instaurando o que MORIN & KERN (2005) denominaram “agonia planetária”. Os

limites

do

crescimento

tornaram-se

palpáveis

devido

às

graves

conseqüências do desequilíbrio entre o homem e a natureza em variados contextos e escalas, revelando as disfunções próprias do estilo de desenvolvimento o que reporta à necessidade de se repensar as heranças socioculturais e econômicas que embasam os paradigmas sociais.

A crise ambiental é a crise de nosso tempo. O risco ecológico questiona o conhecimento do mundo. Esta crise apresenta-se a nós como um limite no real, que ressignifica e reorienta o curso da história: limite do crescimento econômico e populacional; limite dos desequilíbrios ecológicos e das capacidades de sustentação da vida; limite da pobreza e da desigualdade social. Mas também crise do pensamento ocidental: da


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„determinação metafísica‟ que, ao pensar o ser como ente, abriu o caminho para a racionalidade científica e instrumental que produziu a modernidade como uma ordem coisificada e fragmentada, como formas de domínio e controle sobre o mundo. Por isso, a crise ambiental é acima de tudo um problema de conhecimento, o que nos leva a repensar o ser do mundo complexo, a entender suas vias de complexificação (a diferença e o enlaçamento entre a complexificação do ser e o pensamento) para, a partir daí, abrir novas pistas para o saber no sentido da reconstrução e da reapropriação do mundo (Leff, 2006, p. 191).

Nesta perspectiva insere-se o discurso da sustentabilidade defendido por autores como ACSELRAD (1997), SACHS (2002) e LEFF (2006), que buscam trazer tal conceito para o campo das relações sociais, de forma a possibilitar a internalização da dimensão ambiental nos paradigmas do conhecimento. O ambiente assim é tido como uma categoria sociológica e não biológica, que se configura em comportamentos, valores, saberes e potenciais produtivos. Não há sentido, portanto em se falar de natureza sem sociedade. Assim, a sustentabilidade não pode ser pensada a partir de uma visão reducionista que prioriza aspectos como o estoque e o fluxo de recursos e capitais; deve, todavia considerar a melhoria da qualidade de vida1 das populações, a diminuição do consumo de recursos e da produção de resíduos além da melhoria da distribuição dos aglomerados urbanos sobre o território. A história humana sobre a Terra é marcada pela exploração dos recursos naturais e a evolução dos processos produtivos associados às constantes necessidades criadas pelo homem são geradores do processo de degradação ambiental2. A forma como a sociedade mundial organiza a

1

Segundo HERCULANO (2006) qualidade de vida é definida como “a soma das condições econômicas, ambientais, científico-culturais e políticas coletivamente construídas e postas à disposição dos indivíduos para que estes possam realizar suas potencialidades: inclui a acessibilidade à produção e ao consumo, aos meios para produzir cultura, ciência e arte, bem como pressupõe a existência de mecanismos de comunicação, de informação, de participação e de influência nos destinos coletivos, através da gestão territorial que assegure água e ar limpos, higidez ambiental, equipamentos coletivos urbanos, alimentos saudáveis e a disponibilidade de espaços naturais amenos urbanos, bem como a preservação de ecossistemas naturais”. 2 O conceito de degradação ambiental adotado neste trabalho é o existente na Lei nº 6.938, de 31/08/81, artigo 3º, inciso II da Política Nacional do Meio Ambiente, onde degradação da qualidade ambiental constitui-se “[...] a alteração adversa das características do meio


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produção de sua vida tem como conseqüência maior a problemática socioambiental caracterizada pelo crescente impacto negativo no ambiente e aumento das desigualdades socioeconômicas, aspectos que colocam em xeque a possibilidade de sobrevivência humana no Planeta dentro do que hoje seguimos como modelo de desenvolvimento. As cidades, nesse processo, apresentam-se como um palco onde estão expostos os mais complexos desafios de organização social, ambiental e econômica, reflexos do processo de apropriação do espaço onde o ambiente natural é alterado artificialmente para atender as necessidades do homem enquanto ser social. Nessa perspectiva, as condições ambientais do sistema urbano têm sido caracterizadas por temperaturas elevadas, adensamento de edificações, poluição por gases lançados por veículos automotores e pelas indústrias, acúmulo de lixo, lançamento de esgotos em cursos d‟água e morte da fauna e flora urbana. A cidade é uma máquina infernal que consome e desperdiça enormes quantidades de energia e matéria-prima, produz montanhas de lixo, expele e derrama venenos. Esta máquina evolui constantemente, enquanto um exército de instituições e incontáveis indivíduos monta e desmonta a máquina, forja ligações e as quebra, resolve problemas individuais e gera uma multidão de novos problemas. O ar, o solo, a água e os organismos vivos da cidade absorvem essa atividade caótica com uma manifesta perturbação na estrutura, na população e nos fluxos dos recursos e energia (Spirn, 1995, p. 12).

LYNCH (1985) acredita que o aglomerado populacional assemelhasse a um ecossistema uma vez que este pode ser considerado como um conjunto de organismos onde cada organismo se relaciona com indivíduos de sua própria espécie, com outras espécies e com as matérias físicas do local. É neste sentido que SPIRN (1995) utiliza o termo ecossistema urbano e preconiza a necessidade de se utilizar o conceito de ecossistema para a compreensão do ambiente urbano, das inter-relações entras as atividades humanas e do ambiente" (BRASIL, 1981). Encontra-se implícito na Lei nº 6.938 o conceito de degradação ambiental como sinônimo da expressão degradação da qualidade ambiental. Salienta-se que a lei federal foi alterada pela Lei nº 7.804, de 18/07/89, que mantém a mesma definição referente ao termo.


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impacto cumulativo que os indivíduos exercem sobre a cidade. Esta autora acredita que um ecossistema é maior do que a soma de suas partes, pois existem ligações que unem as partes e formam uma vasta rede. A identificação da importância destas ligações produz novos discernimentos que podem levar ao uso mais eficiente das atividades, recursos e espaços.

O fluxo e a transformação da energia e da matéria-prima forjam as ligações entre o ar, o solo e a água do ecossistema urbano e os organismos que nele vivem. Estabelecendo os caminhos ao longo dos quais a energia e a matéria fluem através do ecossistema urbano, podem-se também traçar a rotas ao longo das quais os poluentes se disseminam e determinar onde a energia é despendida e armazenada (Spirn, 1995, p. 269).

É plausível, portanto que as soluções para os problemas da cidade sejam coordenadas e tratadas dentro da compreensão do ecossistema total, suas partes e ligações, tornando as conseqüências das ações mais previsíveis. Além disso, é preciso que os cidadãos tenham consciência da situação ambiental em que estão inseridos e se reconheçam como agentes da organização do espaço, já que como afirma ROSSI (1998 apud ARAUJO, 2009) “a cidade é uma coisa humana por excelência, sendo um reflexo da sociedade”.

1.1.1

Planejamento

ambiental

e

os

paradigmas

do

desenvolvimento

A prática do planejamento destinada à organização do espaço sempre foi, desde períodos longínquos a.C., uma premissa para grupos de pessoas que se propunham a se fixarem em uma localidade. SANTOS (2004) aponta que as primeiras informações históricas sobre planejamento do espaço estão relacionadas a aldeias de pescadores e agricultores, e aspectos ambientais como topografia e microclima, eram levados em consideração. Em aldeias da


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Mesopotâmia, cerca de 4000 a.C., autoridades religiosas já realizavam formas de planejamento voltadas para a organização das cidades. Ainda que o entendimento sobre os impactos causados pelo homem nos centros urbanos já fosse evidente entre os gregos, sobretudo com Aristóteles, até final do século XIX poucos eram os que se preocupavam com a construção de cidades aliada ao equilíbrio com os elementos da natureza. O século XX, em especial suas últimas décadas, foi marcado pelo desenvolvimento de diversos tipos de planejamentos setoriais, principalmente nas áreas econômica e de recursos hídricos. Este período caracterizou-se também por uma intensa produção intelectual voltada à crítica, fortemente marxista, ao planejamento urbano, onde se destacaram autores como Castells e Harvey, pioneiros entre os sociólogos e geógrafos urbanos. Estes autores contrapunham-se ao idealismo da sociologia culturalista, ao darwinismo social da Escola de Chicago e à economia urbana neoclássica, por considerarem os primeiros reducionistas em relação aos conflitos sociais e às contradições e lutas de classes, e os últimos por tomarem a sociedade como um agregado de “indivíduosconsumidores”.

Castells e Harvey, na esteira de vigorosas e pertinentes críticas endereçadas ao pensamento conservador nos estudos urbanos (especialmente à Escola de Chicago, que floresceu nas décadas de 20 e 30), promoveram uma espécie de „desnaturalização‟ da análise da produção do espaço urbano. Ambos historicizaram os problemas sociais manifestados na cidade, encarando o espaço urbano como um produto social e os „problemas urbanos‟ como problemas relacionados com a dinâmica das relações de produção e a estrutura de poder na sociedade capitalista (Souza, 2002, p. 25).

Diante a tais críticas e dentre outras que se seguiram como dos conservadores3, o planejamento já não podia mais servir de instrumento a serviço da manutenção do status quo capitalista, baseado em definições 3

De acordo com SOUZA (2002, p. 30) “quanto às críticas conservadoras contra o planejamento, elas começaram a avolumar-se na esteira tanto de uma certa frustração com os resultados da intervenção estatal (...) quanto de um enfraquecimento das bases materiais do planejamento típico do welfare state dos países capitalistas centrais: o crescimento econômico e a capacidade de investimento e regulação do Estado”.


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econômicas e de caráter setorial, seguindo um viés de intervenção e regulação estatal. Já não era mais admitido utilizar desenvolvimento econômico como sinônimo de crescimento econômico uma vez que países subdesenvolvidos que alcançaram um significativo crescimento de seu PIB ainda permaneciam com grande parcela da população sem acesso aos serviços básicos como saúde e educação (SANTOS, 2004). É importante ressaltar que entre as décadas de 1960 e 1980 os padrões de produção e consumo adotados pela sociedade acarretaram visíveis problemas no que diz respeito à deterioração das dimensões ambiental, cultural, social, econômica e ecológica e, por conseguinte, perda na qualidade de vida das populações. Assim, dado ao fracasso do planejamento fundamentado na visão puramente economicista, o planejamento ambiental se apresenta como uma forma de se prever as conseqüências ambientais do desenvolvimento. Apesar de suas bases terem sido delineadas no início do século XIX com pensadores como John Ruskin, Viollet-le-Duc, Henry David Thoureau, Georg Perkins Marsh (FRANCO, 2008), é apenas neste período, principalmente a partir da Eco-92 e da Agenda 21, que este tipo de planejamento ganha forças se firmando como um dos aliados primordiais do desenvolvimento sustentável. No Brasil a produção literária voltada especificamente para o planejamento ambiental é recente, sendo perceptível um aumento das publicações nos últimos 10 anos. Isto de deve em grande parte à deflagração das problemáticas ambientais e ao estabelecimento de políticas públicas que contemplam

a

sustentabilidade

com

vistas

à

melhoria

do

quadro

socioambiental. Um importante aspecto a ser ressaltado é que as políticas públicas que estão sendo implementadas no Brasil apresentam, em geral, uma preocupação

com

os

fatores

geradores

dos

problemas

ambientais,

abrangendo, portanto questões de ordem social e não apenas ambiental. Tal informação é contundente ao observarmos a incorporação do planejamento ambiental aos planos diretores municipais a partir da década de 1990. De acordo com SANTOS (2004) ainda não há uma definição precisa do termo „planejamento ambiental‟, de forma que o mesmo recebe diversas abordagens e definições as quais se mesclam e se fundem. Entretanto é


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factível que o conceito de „ambiente‟ na perspectiva deste planejamento “é interpretado tanto no que se refere às questões humanas, quanto físicas e bióticas” (SANTOS, 2004, p.27). A não delimitação do conceito acarreta assim uma confusão quanto ao emprego do mesmo que acaba por ser usado para a denominação de outras formas de planejamento como o físico, geoecológico, e também como sinônimo de alguns instrumentos do planejamento ambiental como o plano de manejo e o zoneamento ambiental. Além disso, é ainda utilizado como sinônimo de gerenciamento – caracterizado pela aplicação, administração, controle e monitoramento do que foi proposto pelo planejamento – e de gestão ambiental – que deve ser entendida como a integração entre o planejamento, o gerenciamento e a política ambiental. CULLINGWORTH (1997 apud SOUZA, 2002) aponta quatro elementos fundamentais em qualquer atividade de planejamento, as quais são: - Pensamento orientado para o futuro; - Escolha entre alternativas; - Consideração de limites, restrições e potencialidades, assim como de prejuízos; - Possibilidade de diferentes cursos de ação de acordo com as circunstâncias. Este mesmo autor ressalta, porém que ao se tratar de processos de planejamento e gestão onde há uma diversidade de grupos sociais envolvidos, é necessário a adição de mais um elemento: a preocupação com a resolução de conflitos de interesse. O planejamento ambiental por sua vez estabelece-se tendo por base as premissas supracitadas e fundamenta-se na interação e integração dos sistemas que compõem o ambiente. Assim, este planejamento apresenta a peculiaridade de ter que contemplar diversas áreas e interesses, o que o torna um mecanismo complexo que suscita a participação tanto de uma gama de profissionais como de todos os grupos sociais envolvidos, caracterizando-se por um elevado grau de interdisciplinaridade e integração de informações. LANNA (1995, apud MENEGUZZO, 2006) apresenta uma definição que


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evidencia a complexidade das atribuições do planejamento ambiental, o qual consiste em:

[...] um processo organizado de obtenção de informações, reflexão sobre os problemas e potencialidades de uma região, definição de metas e objetivos, definição de estratégias de ação, definição de projetos, atividades e ações, bem como definição do sistema de monitoramento e avaliação que irá retroalimentar o processo. Este processo visa organizar a atividade sócio-econômica no espaço, respeitando suas funções ecológicas, de forma a promover o desenvolvimento sustentável (Lanna, 1995 apud Meneguzzo, 2006, p.14).

Ainda nesta perspectiva, FRANCO (2008) afirma que:

Planejamento Ambiental é todo o planejamento que parte do princípio da valoração e conservação das bases naturais de um dado território como base de autosustentação da vida e das interações que a mantém, ou seja das relações ecossistêmicas [...] O objetivo do Planejamento Ambiental é atingir o Desenvolvimento Sustentável da espécie humana e seus artefatos, ou seja dos agroecossistemas e dos ecossistemas urbanos (as cidades e redes urbanas) minimizando os gastos das fontes de energia que os sustentam e os riscos e impactos ambientais, sem prejudicar ou suprimir outros seres da cadeia ecológica da qual o homem faz parte [...] (Franco, 2008, p. 35).

Ambas as definições explicitam a relação do planejamento ambiental com o desenvolvimento sustentável – dentro de suas dimensões ambientais, socioculturais e econômicas – e a importância do ser enquanto sujeito social em todo o processo. Vão, portanto ao encontro do que LYNCH (1985, p. 111) estabelece como relevante para a qualidade de um local, a qual “se deve ao efeito conjunto do local e da sociedade que o ocupa”. Este mesmo autor apresenta em seu livro “A boa forma da cidade” (1985) as dimensões da execução dessa boa forma, as quais podem contribuir sobremaneira para o trabalho de planejamento ambiental. É importante ressaltar, todavia que, de acordo com LYNCH (1985), nenhuma dessas


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dimensões é única de forma que todas indicam um conjunto de qualidades de base comum, o qual pode por sua vez ser medido em termos comuns. Assim temos como as cinco dimensões básicas para a boa forma da cidade: 1.

Vitalidade: critério antropocêntrico relacionado ao grau em que a

forma do aglomerado populacional suporta as questões ambientais, de saúde e funcionamento biológico do ser humano. Um local para ser adequado à vida deve prover sustentação (abastecimento de alimentos, energia, água e ar, tratamento apropriado de resíduos), segurança (ausência e/ou controle de riscos tóxicos e doenças) e consonância com a estrutura básica do ser humano; 2.

Sentido: o grau em que a cidade pode ser compreendida pela

população e vice-versa, verificável através da interação entre a pessoa e o local. Depende da forma e da qualidade espaciais, da cultura, da experiência e do objetivo do observador, podendo ser entendida como identidade local, ou seja, “o nível em que uma pessoa consegue reconhecer ou recordar um local como sendo distinto de outros locais – como tendo um caráter próprio vívido, único, ou pelo menos particular” (LYNCH, 1985, p. 127); 3.

Adequação: está relacionada com o grau em que o padrão

espacial de uma cidade – sua infraestrutura, canais e equipamentos – corresponde às atividades e comportamentos dos seus habitantes, levando-se em consideração a relação espaço x tempo; 4.

Acesso: relacionado com a capacidade de alcançar pessoas,

serviços e informações, considerando ai a quantidade e diversidade de elementos que podem ser alcançados. Não pode, portanto ser medido apenas em função da quantidade, pois “a mera quantidade perde seu significado assim que é alcançado um nível de satisfação” (LYNCH, 1985, p. 183). O local deve oferecer um fácil acesso a uma variedade de pessoas o que diminuirá o número de pessoas excluídas; 5.

Controlo: o grau em que os espaços e comportamentos no

aglomerado populacional estão regulamentados, de forma certa, responsável e congruente tanto para a população quanto para a estrutura dos problemas


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locais. Diz respeito ao uso, acesso, criação, reparação, modificação e gestão espacial. Perpassa questões relacionadas à formação de pessoas como gestores locais, responsabilidade progressiva pelo local, transferência do controlo, conflito espacial e controlo político. O planejamento ambiental realizado de acordo com as dimensões propostas por LYNCH funciona como uma ferramenta de organização do espaço urbano tendo em vista a sustentabilidade. Neste sentido é necessário compreender também a importância da participação social no processo. SANTOS (1988) compara os acontecimentos políticos e gerenciais da cidade a um jogo de cartas onde os grupos formados pelo governo, pelas empresas e pela população se enfrentam segundo as filiações a que pertencem, de forma que os parceiros se aliam e se separam de acordo com os interesses e circunstâncias. O ideal neste jogo é que os agentes do desenvolvimento urbano estejam cientes das regras que devem seguir assim como das ações que devem aplicar; esta é a condição para que o jogo seja “limpo”.

Em outras palavras: só pode haver jogo limpo quando cada um souber o que são suas cartas, o quanto valem e tiver domínio sobre as próprias jogadas. Só assim os agentes se verão envolvidos, terão desejo de participar e prazer de se sentirem responsáveis (Santos, 1988, p. 50).

No Brasil verifica-se uma grande ausência de participação popular nos processos políticos e de planejamento, decorrente de uma trajetória de exclusão da maioria da população brasileira destes processos. DUCHROW (2004) atribui a responsabilidade por esta deficiência ao senso comum de descrédito político da população e ao padrão de relacionamento predominante entre a população e os representantes eleitos – historicamente determinado por práticas de favorecimentos individualizados e personalizados. No contexto histórico atual, a democracia vem sendo generalizadamente apontada pelos teóricos como um instrumento necessário para garantir o pluralismo presente nas sociedades contemporâneas e atender aos seus


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anseios éticos, políticos e emancipatórios. Neste contexto a participação vem alcançando uma crescente respeitabilidade e legitimação ainda que valores considerados a priori redundem na primazia de formalidades que ocultam a fragilidade da estrutura democrática tradicionalmente concebida onde há um evidente desequilíbrio de forças entre as demandas socioambientais e os desmandos das elites e seus mecanismos de governança nada democráticos (ALCÁNTARA et al, 2006). Diante dessa realidade é plausível considerar que o ponto de partida da prática democrática deve ser a própria sociedade, por uma democracia não meramente representativa e formal, mas sim deliberativa e participativa. Para tanto o Estado deverá ampliar a eficácia de sua governabilidade, através principalmente da democratização de todas as suas instituições e da abertura de canais permanentes de comunicação e participação da sociedade civil nas decisões. Desta forma é possível uma verdadeira descentralização do poder através de espaços-públicos não estatais tendo em vista a democracia contemporânea. Neste ínterim são necessários instrumentos de participação efetiva como: consultas, referendos, plebiscitos e formas de participação paritárias que comportem elementos do poder público e da sociedade civil, como as instituições conselhistas, as quais em muitos casos já vêm sendo buscadas. “Na materialidade dessa proposta, essa democracia cidadã deve ser mais do que um status legal, mas o elemento central de uma cultura política compartilhada” (VIEIRA, 2001 apud ALCÁNTARA et al., 2006, p. 5 ). Sob esse conjunto de premissas pode-se compreender que o planejamento ambiental, assim como os demais tipos de planejamento, se operacionaliza através de fases sequenciais atentando para que se trabalhe o tempo, o espaço e os objetivos a serem atingidos em um processo que não se esgota na implementação, tendo continuidade ao longo do tempo através de avaliações e monitoramentos. A singularidade do planejamento ambiental por sua vez apresenta-se justamente em seu princípio de integração e interação entre os sistemas que compõe o ambiente. Pauta-se assim no potencial e nos limites que o meio apresenta, dentro das dimensões socioculturais, naturais,


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políticas e econômicas, o que o torna um mecanismo essencial para a ordenação da ocupação do espaço, desde que seja realizado de forma multi e interdisciplinar,

descentralizada

e

participativa

e

não

seja

totalmente

corrompido pelas demandas dos grupos hegemônicos e más gestões políticoadministrativas.

1.2 – TURISMO E SUA INFLUÊNCIA NA ORGANIZAÇÃO DO ESPAÇO

O turismo é um fenômeno da sociedade contemporânea que apresenta elevadas taxas de crescimento, fato que o posiciona como uma das atividades econômico-sociais mais marcantes desde o período do pós-guerra. De acordo com a OMT (2000 apud IGNARRA, 2003) entre os anos de 1950 a 1960 a atividade apresentou uma variação de crescimento de 174,2%; de 1975 a 1980, 28,7%; de 1985 a 1990, 40%. No ano de 2000, o volume de turistas internacionais alcançou o número de 697,8 milhões. Em 2006, segundo o documento “Dados Essenciais do Turismo” (OMT, 2007), foram superadas as expectativas com 842 milhões de chegadas de turistas, o que corresponde a um crescimento de 4,5% em relação aos 806 milhões de 2005. As projeções para o setor são muito positivas, principalmente para a América do Sul onde se verifica um crescimento anual de 4,8%, superando a média anual. A expectativa é de que em 2020 ocorram 192 milhões de chegadas na América do Norte, 43 milhões na América do Sul, 40 milhões no Caribe e 8 milhões na América Central (OLIVEIRA, 2005c). No Brasil a importância econômica desta atividade está representada pelo número de turistas internacionais que recebemos ano a ano, pelas divisas geradas e pela capacidade de geração de empregos. Cerca de 10,3 milhões de turistas estrangeiros chegaram ao Brasil entre 2005 e 2006, com gastos médios diários de 81,90 dólares americanos e aprovação de 88% na satisfação ou superação de expectativas. Segundo dados do Boletim de Desenvolvimento Econômico do Turismo (2007), no primeiro trimestre de 2008 em comparação


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ao quarto trimestre de 2007, registrou-se um aumento do quadro de pessoal entre as empresas do setor de turismo como um todo, com destaque para os ramos de transporte aéreo e operadoras turísticas. Muitas são as causas desse comportamento crescente da atividade turística, verificado principalmente a partir de meados do século XX. Entre elas podemos citar o aumento da renda per capita da população dos países desenvolvidos,

principalmente

no

pós-Segunda

Guerra

Mundial.

O

desenvolvimento dos transportes, notadamente o aéreo é outra importante causa desse crescimento; além das inovações nas aeronaves que passaram a ser mais velozes, econômicas e com capacidade em torno de 400 passageiros, o advento dos vôos charters barateou as passagens aéreas tornando possível um maior volume de turistas. Outras causas associadas são: a maior disponibilidade de tempo livre para o lazer, uma melhoria na distribuição de renda para a população e a globalização da economia, além do intenso processo de urbanização perceptível após a segunda grande guerra (IGNARRA, 2003). A urbanização diante ao crescimento do fenômeno turístico pode ser analisada sob diferentes aspectos. Primeiro como indutora do fluxo turístico. O surgimento das grandes conurbações acarretou um modo de vida mais estafante que leva seus moradores a buscar outros ambientes diferentes do cotidiano. Segundo URRY (1996) esse desejo de evasão se consolida pela diferenciação entre a prática cotidiana no mundo do trabalho e a prática, até certo ponto, livre de normas, do lugar do turismo. Em consonância com Urry, KRIPPENDORF (2001) afirma que esta situação pode ser chamada de “ciclo de reconstituição do ser humano” na sociedade industrial, onde a viagem se configura como o momento para reconstituir as forças físicas e mentais. Esta mobilidade frenética por sua vez exige o desenvolvimento de uma rede de serviços turísticos para dar suporte a esta imensa “máquina de restauração de forças” que, segundo KRIPPENDORF (2001) é o turismo. É neste sentido que a urbanização pode ser analisada sobre outro ponto de vista, ou seja, como um processo influenciado pela atividade turística.


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A urbanização, de acordo com LIMONAD (1999, p. 82), pode ser considerada como “uma forma de estruturação do território, onde o peso dos lugares varia historicamente em função dos condicionantes e processos sociais, econômicos, políticos, e por vezes culturais que tomam corpo”. Nesta perspectiva a urbanização criada pelos agentes da atividade turística representa formas contemporâneas de espacialização social, onde são construídas novas estruturas, são atribuídas novas funções para antigas paisagens e velhos usos, promovendo a articulação entre os lugares e o mundo. Inseridas na lógica do mercado, como produtos, as cidades que vêem o turismo como um forte componente da estrutura econômica, reorganizam-se para tornarem-se lugares atrativos e para produzirem paisagens para o consumo e para o lazer.

As cidades turísticas representam uma nova e extraordinária forma de urbanização, porque elas são organizadas não para a produção, como o foram as cidades industriais, mas para o consumo de bens, serviços e paisagens. Enquanto - desde a Revolução Urbana - as cidades eram construídas para a produção e para as necessidades básicas, estas cidades erguem-se unicamente voltadas para o consumo e para o lazer. Este é um dos motivos que levou alguns autores a considerarem as cidades turísticas como um exemplo expressivo de cidade pós-moderna (Mullins, 1991 apud Luchiari, 1998).

Pode-se considerar que desde o final do século XIX balneários e estâncias hidrominerais foram planejados enquanto locais turísticos no Brasil, beneficiadas pelo desenvolvimento das práticas termais em espaços institucionalizados pela medicina brasileira, como é o caso de Caldas do Cubatão (hoje Caldas da Imperatriz, em Santa Catarina), Caxambu e Poços de Caldas, em Minas Gerais, e já no século XX as cidades de São Lourenço e Araxá, em Minas Gerais e Águas de São Pedro, em São Paulo (MOURÃO, 1997). Embora o desenvolvimento dessas cidades esteja relacionado a um crescimento do fluxo de visitantes, este se deu primeiramente em função de fatores associados à saúde e à ciência a fim de conhecer as fontes minerais existentes em solo brasileiro e desenvolver a hidrologia médica. A atividade


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turística cresceu nos interstícios do apelo à ação medicinal das águas, e se consolidou com o surgimento de estabelecimentos com vocação para práticas lúdicas, como os cassinos (AULICINO, 2001). No entanto em meados do século XX, período de afirmação destas estâncias, não se verificou a disseminação do modelo de desenvolvimento econômico baseado no turismo tal qual podemos observar a partir de 1980 onde até mesmo cidades pouco ou nada atrativas reorganizam-se e estruturam novas paisagens e significados para se inserirem no mercado turístico. Segundo FRATUCCI (2000) o turismo pode ser visto a partir de três formas distintas de incidência territorial, que são: as áreas emissoras, as receptoras e os corredores de deslocamento. Esses três elementos são descontínuos e interligados no espaço de forma que “o lugar (nó) emissor precisa do lugar (nó) receptor para satisfazer as demandas dos turistas e, para informá-los e transportá-los, estabelece linhas que unem esses lugares (nós), formando uma rede complexa” (FRATUCCI, 2000, p. 127). É justamente nesses nós formados pelas áreas receptoras que o turismo se manifesta na íntegra e estabelece o fenômeno da turistificação dos espaços já que, como afirma RONAI (1977), foi durante a estadia que se desenvolveu a arte da viagem e é a estadia que promove “uma imersão de grande duração na paisagem”. De acordo com SAUER (1998) o termo paisagem além de definir o conceito de unidade geográfica caracterizada pela associação peculiarmente geográfica de fatos, não se restringe à idéia de processo puramente físico de modelagem da face terrestre. Ressalta por sua vez as imbricações históricoculturais associadas aos elementos físicos como determinantes na constituição da paisagem a qual “pode ser, portanto, definida como uma área composta por uma associação distinta de formas, ao mesmo tempo físicas e culturais” (SAUER, 1998, p. 23). Este autor também atenta para a existência de elementos de julgamento pessoal que interferem na apreensão do conteúdo e, por conseguinte, a paisagem não se limita a uma cena real vista por um observador. Neste sentido, BERQUE (1998) emprega a idéia de paisagemmarca e paisagem-matriz onde:


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A paisagem é uma marca, pois expressa uma civilização, mas é também uma matriz por que participa de esquemas de percepção, de concepção e de ação – ou seja, da cultura – que canalizam, em um certo sentido, a relação de uma sociedade com o espaço e com a natureza e, portanto, a paisagem do seu ecúmeno (Berque, 1989, p. 84).

A infinidade de paisagens existentes se dá então, pois as configurações geográficas mudam com a história e com a natureza, sendo tão dinâmicas quanto o processo cultural que lhes confere forma (YÁZIGI, 2002). A ação do homem sobre o meio assim como as relações de poder, a interação social e demais aspectos que envolvem o homem em sociedade implicam em consequências na paisagem e nas formas como a mesma é absorvida e interpretada. Desta forma a paisagem quando utilizada pelo turismo como mercadoria onde a matéria-prima é o próprio espaço, se estabelece a lógica do consumo pela valorização estética do espaço, definindo, conforme RONAI (1977), uma paisagedade. Esta se manifesta por meio da turistificação do espaço, processo que insere as localidades no mercado das paisagens naturais e artificiais onde estas decidem a atratividade de um local ou destino. NICOLAS (1989 apud FRATUCCI, 2006) afirma que a turistificação dos espaços determina a substituição da “lógica da produção” (mundo do trabalho) pela “lógica do ócio”. É um processo que gera alterações no ordenamento dos espaços apropriados com graves conseqüências para as localidades, tais como o crescimento urbano caótico, destruição de paisagens naturais e conflitos sociais diversos (população local, agentes do mercado e turistas). Outro aspecto relevante é a influência provocada pelos desejos subjetivos dos turistas na turistificação dos espaços a qual determina a criação de ambientes que denotam familiaridade e satisfação de desejos aos turistas, fato que evoca a materialização de novas representações sociais na construção da paisagem em detrimento da identidade local. Assim, o turista é o criador das representações valorativas de certas paisagens (DEPREST, 1997 apud LUCHIARI, 1998).


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A organização territorial dos lugares turísticos não responde somente à lógica do lugar, do meio, e da população, ela é a reprodução de atributos valorizados nos centros urbanos emissores, sintetizando na materialidade das cidades que se expandem, as novas representações sociais imprimidas ao uso do território. Por isto os lugares não permanecerão „provincianos‟ ou „selvagens‟, porque estes atributos não representam mais a sociedade (Luchiari, 1998, p.8).

O ordenamento territorial deflagrado pela atividade turística, ou seja, a turstificação dos espaços, se dá a partir da (des)organização dos componentes da oferta turística os quais, de acordo com IGNARRA (2003) podem ser classificados em cinco categorias principais: - Recursos naturais: compostos pelo relevo, vegetação, clima, hidrografia, fauna e outros aspectos da paisagem natural; - Recursos culturais: compreendendo o patrimônio arquitetônico, acervos de museus, cultura, tradições

e costumes da população local, eventos,

música, literatura, língua, dentre outros; - Serviços turísticos: aqueles em que a maior parte das receitas advém da demanda turística, tais como: meios de hospedagem, transportes turísticos, locação de veículos e embarcações, receptivo turístico, serviços de alimentos e bebidas, de organização de eventos e de entretenimento, etc; - Infraestrutura: composta pelo conjunto de construções subterrâneas e de superfície, como os sistemas de abastecimento de água e de coleta, tratamento e despejo de esgotos, redes de distribuição de gás, de telefonia, fibras ópticas, energia elétrica e iluminação pública, sistema viário, terminais de transporte e mobiliário urbano; - Serviços urbanos de apoio ao turismo: compostos pelos serviços bancários, de saúde, comunicação, segurança pública, etc. Ao analisar a categorização proposta por IGNARRA (2003) é perceptível que os componentes da oferta turística estão intimamente relacionados à estrutura urbana, de forma que, mesmo em áreas onde os principais


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segmentos explorados tenham como principal atrativo o meio natural, são necessárias infraestrutura e serviços que viabilizem a atividade. Além disso, mesmo que a atividade turística não se desenvolva na área urbana suas principais atividades utilizam as cidades como suporte. A produção do espaço urbano passa então a seguir também a lógica do mercado turístico através da complexa ação de agentes sociais concretos, cujas atuações derivam da dinâmica de acumulação capitalista e levam a um constante processo de reorganização espacial. Entretanto, a cada transformação do espaço urbano, diferentes situações emergem configurando quadros socioambientais diversos, que vão desde alterações na paisagem até o surgimento de novas demandas e conflitos sociais.

A complexidade da ação dos agentes sociais inclui práticas que levam a um constante processo de reorganização espacial que se faz via incorporação de novas áreas ao espaço urbano, densificação do uso do solo, deterioração de certas áreas, renovação urbana, relocação diferenciada da infraestrutura e mudança, coercitiva ou não, do conteúdo social e econômico de determinadas áreas da cidade (Corrêa, 1989, p. 11).

Dentro da perspectiva da dinâmica de ocupação, as zonas costeiras configuram-se historicamente como vetores prioritários da urbanização, industrialização e exploração turística. O povoamento do litoral brasileiro se deu de forma descontínua, num processo iniciado no período colonial para dar suporte ao modelo econômico primário-exportador, quando formaram-se expressivos conjuntos de ocupação como o Recôncavo Baiano, o litoral fluminense e paulista e cidades portuárias como Belém, São Luís, Fortaleza e Vitória. No entanto no início dos anos 1950 é perceptível uma mudança na ocupação da costa brasileira devido à aceleração do processo de industrialização e intensificação no uso dos ecossistemas litorâneos (BORELLI, 2007). Nos interstícios deste processo, devido ao extenso litoral e ao clima tropical, o turismo de “sol e praia” disseminou-se rapidamente no Brasil, na maioria das vezes sem o acompanhamento de um planejamento adequado. De


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acordo com TADINI e MELQUIADES (2009) pode-se considerar que o hábito de banhar-se no mar foi trazido para o Brasil pela corte portuguesa no início do século XIX e provocou grandes transformações na vida e no cotidiano das pessoas da colônia, inicialmente por necessidade e tendência relacionada à saúde devido às propriedades terapêuticas da água do mar e, mais tarde, pela inserção de hábitos de lazer e turismo. Já neste período houve um crescimento de casas de veraneio, também conhecidas como segunda residência, próximas às praias, provocando o início do fenômeno do veranismo no Brasil. Entretanto apenas no século XX as segundas residências de férias e lazer começaram a se popularizar entre as classes mais altas da sociedade no país, com uma concentração das construções principalmente no litoral. Ainda neste período houve uma ampliação considerável da rede hoteleira no país com destaque para hotéis como o Hotel Glória (1922) e Copacabana Palace (1923), ambos localizados na cidade do Rio de Janeiro. É possível utilizar a cidade de Angra dos Reis como um exemplo da influência provocada pelo capital turístico-imobiliário na apropriação do espaço e urbanização das zonas costeiras do Brasil, essencialmente a partir da construção da rodovia BR 101, em 1974. ABREU (2005) afirma que as características de urbanização desta cidade emergiram preferencialmente em função das indústrias ali instaladas e da conseqüente atividade imobiliária gerada. Todavia, a implantação da rodovia Rio-Santos além de estar relacionada à necessidade de interligação entre os distritos industriais localizados entre as cidades do Rio de Janeiro e Santos/SP, foi motivada também

por

interesses

relacionados

à

acessibilidade

aos

recursos

paisagísticos da área, reconhecidos como recursos turísticos inclusive nos relatórios de viabilidade da rodovia. A partir disto verificaram-se na região ações facilitadoras das atividades do capital turístico-imobiliário, como por exemplo, a manutenção de latifúndios sem interesse na produção rural, os quais se tornaram um grande estoque para as atividades imobiliárias.

É certo que os atores sociais vinculados ao capital imobiliário podem ser dissociados das atividades turísticas. Todavia, o aporte do capital imobiliário em Angra dos Reis se justificou através do apelo ao turismo. É portanto, se apropriando das


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amenidades do lugar - reconhecidas nos relatórios de viabilidade da estrada Rio-Santos como recursos turísticos que os promotores imobiliários associados aos proprietários fundiários loteiam, vendem e constroem casas de luxo destinadas a uma demanda solvável de fora, que pode ser definida como turística (Abreu, 2005, p. 49).

Todo esse processo eclodiu em uma reformulação física do espaço de Angra dos Reis onde inicialmente complexos imobiliários de grande porte (hotéis, marinas, condomínios residenciais de alto luxo) se instalaram seguidos por inúmeros empreendimentos de menor porte, todos por sua vez, caracterizados pela apropriação de extensões de terrenos costeiros, muitas vezes com o monopólio de praias e demais recursos naturais. ABREU (2005) atenta para o déficit habitacional criado pela atração de mão de obra pouco qualificada para as construções, o que proporcionou o surgimento de inúmeros núcleos dispersos de moradias, configurando-se como espaços segregados, numa ocupação espontânea carente de serviços urbanos. MACEDO (2004) ao discorrer a respeito das conseqüências e uso restrito dos loteamentos e condomínios fechados que se multiplicam pela zona costeira brasileira, afirma que:

Tais situações urbanas não fazem parte de um todo urbano coeso e podem ser consideradas fragmentos de uma situação alheia à municipalidade em que se situam. Os benefícios diretos à população do município, como empregos e impostos, são limitados por esse caráter específico de segunda residência. Essa forma de ocupação urbana visa basicamente a apropriação de um valor paisagístico significativo intrínseco à região sobre o qual se implanta, e que constituem cenários para a implementação de tais loteamentos, criando o que se pode chamar de subúrbio de férias (Macedo, 2004, p. 44).


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Figura 1: Planta publicada no prospecto de venda do complexo turísticoimobiliário do Meliá.

Fonte: Abreu, 2005.

Figura 2: Foto de panfleto publicitário apresentando típica implantação de condomínio residencial.

Fonte: Abreu, 2005.


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LIMONAD (1999) entende a urbanização enquanto parte do processo de estruturação do território, um processo histórico-espacial com desdobramentos socioeconômicos. Neste sentido, o valor do espaço urbano no caso supracitado vincula-se a idéia do espaço-mercadoria, valorado de acordo com seu potencial de atração turística, de forma que os detentores da propriedade privada são também detentores do direito de seu uso. Na esfera do mercado turístico muitos desses detentores estão ligados ao capital estrangeiro, o que potencializa a segregação espaço-social para garantir a estruturação da produção e do território de acordo com seus interesses. Assim as áreas privilegiadas dentro da lógica do capital turístico-imobiliário serão o foco para a urbanização e as áreas “marginais” formadas, carentes de infraestrutura e serviços básicos, tornam-se impactantes do ponto de vista social e ambiental.

Nesse processo de espraiamento da pobreza pelo espaço urbano e suburbanizado, a ocupação desordenada vai ocorrendo nas áreas de proteção dos mananciais, nas partes dos loteamentos destinados à construção de equipamentos coletivos ou à manutenção de áreas verdes, nos fundos de quintal onde são construídos cômodos de aluguel, promovendo o encurtiçamento nas áreas mais afastadas do centro (Bógus, 1992 apud Borelli, 2007, p. 13).

Mesmo em áreas naturais, legalmente protegidas ou não, onde as feições urbanas são pequenas, caracterizadas por vilas e povoados, é possível observar a grande influência do mercado turístico na apropriação e transformação das paisagens e na reformulação da dinâmica sócio-econômica ao longo do tempo. Nessas áreas as transformações ambientais e seus conseqüentes impactos são mais aparentes que nas cidades, justamente por incidirem sobre locais tidos como “paraísos ecológicos” onde é realizado o turismo de natureza. BOO (2002) utiliza a denominação “benefícios potenciais” para os impactos positivos do turismo – geração de receita, criação de empregos para a comunidade, possibilidade de promoção da educação ambiental e de conscientização sobre a conservação –, e “custos potenciais” para os impactos negativos do turismo – degradação do meio ambiente, injustiças e instabilidade econômica, mudanças socioculturais.


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DIAS (2005) faz um detalhamento sobre estes impactos, dividindo-os em impactos ambientais, sociais, culturais e econômicos. Dentre estes podemos destacar como impactos ambientais negativos: - Prejuízo aos recursos naturais: grande consumo de água potável e outros recursos até mesmo para alimentação; desmatamentos e uso insustentável da terra para permitir as construções; alterações diversas nos ecossistemas causadas pela presença efetiva do turista (pisoteamento do solo, alterações em ecossistemas frágeis, extinção de animais e plantas, etc); - Aumento da poluição: emissões gasosas, sonoras, resíduos sólidos, lançamento de esgotos, poluição visual e arquitetônica. Tais impactos se deflagram diretamente sobre a população local, receptora do fluxo turístico ao mesmo tempo em que dessacralizam o “paraíso”, aflorando consequências visíveis que acabam por desestimular a visitação. WESTERN (2002) corrobora com este aspecto ao afirmar que:

Por seu próprio caráter, o ecoturismo suscita expectativas e provoca o risco do turismo predatório: um número grande de amantes da natureza é atraído a um lugar recentemente descoberto, para depois de um tempo abandoná-lo, já deteriorado (Western, 2002, p. 19).

O turismo por se tratar de uma atividade econômica que produz e consome paisagens e espaços, deve ter sua análise deslocada prioritariamente para o seu potencial de sustentabilidade. RODRIGUES (2004) afirma que a análise da atividade turística permite compreender a paisagem e o ambiente no âmbito do uso fugaz do território exigindo assim que seja considerada a articulação desta atividade com os elementos gerais da produção e do consumo. A produção do turismo, principalmente o ecoturismo, baseia-se, em geral, na motivação dos turistas em consumir lugares exóticos, mas que devem, entretanto se transformar em comercializáveis, ou seja, adequados aos padrões de conforto e qualidade do mundo moderno. A atividade depende


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então de uma busca constante e incessante de paisagens naturais e históricas exóticas, que serão rapidamente transformadas em produtos para consumo. É neste sentido que o ecoturismo que vem sendo difundido ao longo das duas últimas décadas afasta-se sobremaneira das suas premissas que envolvem tanto um sério compromisso com a natureza como a responsabilidade social por parte de seus agentes e também pelos viajantes.

1.3

POLÍTICAS

PÚBLICAS

AMBIENTAIS

E

SEUS

INSTRUMENTOS

O termo políticas públicas possui inúmeras definições que privilegiam aspectos diversificados como ações e não ações, processo decisório, atores políticos, planejamento. Dentre estas definições podemos destacar a de VIANNA JR. apud VALLEJO (2003) que entende política pública como:

[...] uma ação planejada do governo que visa, por meio de diversos processos, atingir alguma finalidade. Esta definição, agregando diferentes ações governamentais introduz a idéia de planejamento, de ações coordenadas. (Vianna Jr. apud Vallejo, 2003, p. 16).

Ao manifestar o propósito de planejamento essa definição suscita a idéia de tomada de decisão ao longo de um período o que, por sua vez, no estado de direito democrático deve estar associado às demandas sociais. No entanto muitas das demandas que se apresentam não possuem importância agregada sendo então incluídas no rol das não ações. Política pública, portanto é tudo o que o governo decide fazer ou não (PAL, 1987; HECLO, 1972 apud VALLEJO, 2005). A partir desta argumentação é plausível constatar a influência dos atores na execução das políticas públicas. Estes, direta ou indiretamente, interferem na formulação, decisão e fiscalização de tais políticas o que demonstra que as características das ações políticas em determinado período de tempo estão


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relacionadas aos interesses de grupos hegemônicos da sociedade. Dentro desta perspectiva, ABREU (1993) apud VIEIRA & BREDARIOL (1998, p. 78) afirma que políticas públicas são mediações “político-instituicionais das interrelações entre os diversos atores presentes no processo histórico-social em suas

múltiplas

dimensões

(economia,

política,

cultura,

etc.)

e

são

implementadas pelos atores políticos através de instituições públicas”. A partir da década de 1980 é possível perceber uma ampliação do conceito de “políticas”, enquadrando então o sentido das normas técnicas e sociais estabelecidas por uma coletividade pública com a finalidade da administração do domínio público. Por sua vez, o conceito de “políticas públicas” também adquiriu um sentido mais amplo e passou a contemplar, segundo LITTLE (2003, p. 18) “o conjunto de decisões inter-relacionadas, definido por atores políticos, que tem como finalidade o ordenamento, a regulação e o controle do bem público”. Portanto o conceito de “público” não se restringe mais ao Estado incorporando e contextualizando a sociedade civil e o setor privado. Entretanto o Estado brasileiro é tradicionalmente centralizador, pouco aberto a negociação dos espaços políticos com a sociedade, o que somente a pouco mais de 10 anos vem se realizando. BACELAR (2009) atribui ao longo período ditatorial vivido no Brasil a responsabilidade pelo caráter autoritário fortemente presente nas políticas públicas, já que neste período não era preciso que o Estado se legitimasse perante grande parcela da sociedade, ficando refém apenas dos grandes atores que comandavam o cenário político-econômico brasileiro.

Assim, a tradição, o ranço da vertente autoritária, tornou-se um traço muito forte nas políticas públicas do país, e as políticas públicas eram muito mais políticas econômicas. Se olharmos a história recente, as políticas sociais e as políticas regionais são meros apêndices, não são o centro das preocupações das políticas públicas. Nelas, o corte era predominantemente compensatório, porque o central era a política econômica, já que a política industrial era hegemônica, porque o projeto central era a industrialização (Bacelar, 2009, p. 2).


52

No caso específico da política ambiental é possível observar as características supracitadas apesar da mesma ter se desenvolvido de forma tardia em relação às outras políticas setoriais brasileiras. A ótica corretiva dessas políticas – segundo MAGRINI (2001 apud SOUSA, 2005) predominante nos anos 1970 – juntamente com a visão governamental de supremacia do desenvolvimento econômico perante a questão ambiental, comprovam tal afirmação. Basicamente, a política ambiental no Brasil se desenvolveu em resposta às exigências do movimento internacional ambientalista iniciado a partir da segunda metade do século XX, durante a década de 1960. Assim, a criação das instituições e legislações designadas especificamente concentra-se nas quatro últimas décadas. Para o entendimento do que hoje temos por política ambiental brasileira é plausível caracterizar as grandes linhas dessa evolução. De acordo com a periodização proposta por MONOSOWSKI (1989) é possível distinguir quatro abordagens estratégicas básicas nas políticas ambientais brasileira até o ano de 1988: a administração dos recursos naturais, o controle da poluição industrial, o planejamento territorial e a gestão integrada de recursos. Essa categorização privilegia os objetivos principais de cada etapa associados à evolução histórica, pois segundo MONOSOWSKI o critério meramente

cronológico

não

abordaria

a

característica

principal

de

„permanência‟ até a atualidade de muitas das estratégias adotadas. A primeira etapa pode ser considerada a partir dos anos 1930, caracterizada pela regulamentação da apropriação de cada recurso natural em âmbito nacional com foco nas necessidades da nascente industrialização e urbanização. Foi criado neste período grande parte dos instrumentos legais que dariam suporte à criação de áreas protegidas no Brasil, já que desde a instituição da República em 1889 esta questão vinha sendo tratada com imobilismo quase total (MEDEIROS, 2006). Destacam-se a criação de dispositivos legais – Código das Águas (1934), Código de Mineração (1934), Código Florestal (1934), Código de Pesca (1938) e Estatuto da Terra (1964); de agências setoriais ao longo da década de 1960 – Ministério das Minas e Energia, Departamento Nacional de Águas e Energia Elétrica, Instituto


53

Brasileiro

de

Desenvolvimento

Florestal

(IBDF),

Superintendência

de

Desenvolvimento da Pesca (SUDEPE) e Instituto Nacional de Colonização e Reforma Agrária (INCRA); e a criação e delimitação de zonas naturais protegidas – Parque Nacional do Itatiaia (1937), Parque Nacional do Iguaçu (1939), Parque Nacional da Serra dos Órgãos (1939), Floresta Nacional de Araripe-Apodi (1946), Parque Nacional do Araguaia (1959), Parque Nacional das Emas (1961), Parque Nacional das Sete Quedas (1961), entre outros. A segunda abordagem baseada no controle da poluição industrial ganhou força a partir de 1970, influenciada principalmente pela Conferência das Nações Unidas sobre Meio Ambiente, realizada em 1972 em Estocolmo. Nesta ocasião o Brasil se posicionou pouco disposto a priorizar o meio ambiente em suas ações governamentais já que essas realizações entrariam em conflito com o objetivo central e imediato de crescimento econômico. A expressão de ordem era “poluição=progresso”, a qual repercutiu negativamente para a imagem internacional do Brasil. Neste ínterim foi criada em 1973 a Secretaria Especial de Meio Ambiente (SEMA) órgão especializado no trato dos assuntos ambientais sob a coordenação do Ministério do Interior. Entretanto esse órgão acabou por priorizar o problema da poluição, as indústrias como seus agentes e o Estado como responsável pelo controle. A SEMA se dedicava ao avanço da legislação e aos assuntos que demandavam negociação em nível nacional sendo que as medidas de Governo se concentravam na agenda de comando e controle, normalmente em resposta a denúncias de poluição industrial e rural.

É compreensível que, nesse contexto, o papel e o alcance das políticas ambientais sejam bastante limitados. As estratégias adotadas nesse momento atacam certos efeitos do modelo de desenvolvimento, sem no entanto questioná-lo: seu objetivo é reduzir as degradações ambientais, que poderiam comprometer, em certas áreas, o bom andamento das atividade produtivas. Essa abordagem procura também responder a uma pressão da opinião pública, sensibilizada pela degradação do ambiente urbano (Monosowski, 1989, p. 19).


54

Considerada como um desdobramento da etapa anterior, a abordagem estratégica de planejamento territorial também se apresentou a partir dos anos 1970. Essa etapa é caracterizada por uma urbanização intensa e por um crescimento acentuado das regiões metropolitanas, de forma que os recursos naturais se tornaram bens escassos gerando uma maior atenção à necessidade de ordenação territorial como um instrumento de uma política preventiva dos impactos sobre o meio ambiente. É perceptível que nesta abordagem as ações de controle voltam-se fundamentalmente para as atividades do setor privado, direcionadas para a definição e delimitação das áreas industriais e para a concentração das atividades poluidoras nas principais regiões metropolitanas. São destaques deste período os trabalhos desenvolvidos pelo Comitê Especial de Estudos Integrados de Bacias Hidrográficas (CEEIBH), assim como as leis metropolitanas de zoneamento industrial e de proteção de mananciais. As estratégias governamentais não são objeto de controle a não ser em determinados setores devido às pressões externas realizadas pelas agências internacionais que resultaram, por exemplo, nas primeiras aplicações da avaliação de impactos ambientais (AIA). É importante ressaltar que as políticas ambientais nesta abordagem continuam urbanas permanecendo o espaço rural “fora de qualquer controle, para que seus recursos se prestem às formas de apropriação mais rentáveis a curto prazo” (MONOSOWSKI, 1989, p. 21). Em 1981 inicia-se a fase denominada gestão integrada de recursos quando foi criada a Política Nacional de Meio Ambiente (lei nº 6.938 de 31/08/81, regulamentada em 1983) e o Ministério de Desenvolvimento Urbano e Meio Ambiente em 1985, o qual tem por funções a definição das políticas e a coordenação das atividades governamentais na área ambiental. As principais inovações da lei nº 6.938/81 são em nível institucional, sendo elas: a criação do Conselho Nacional de Meio Ambiente (CONAMA), órgão consultivo e deliberativo, diretamente vinculado ao Presidente da República, onde, apesar de limitada, a participação pública nas decisões é contemplada; e a criação do Sistema Nacional de Meio Ambiente (SISNAMA) que tem por instância superior o CONAMA e inclui órgãos colegiados e executivos que se ocupam da gestão da qualidade ambiental, integrando os três níveis de governo (federal, estadual


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e municipal). Essa lei configura-se como um elemento inovador também por adotar como estratégia a responsabilização do Estado por suas ações no ambiente, o qual passa a ser obrigado a seguir os princípios da legislação ambiental, assim como as atividades privadas já o eram. Também adota instrumentos para viabilizar sua aplicação, dentre os quais podemos destacar: o zoneamento ambiental, a avaliação de impactos ambientais, o Cadastro Técnico Federal de Atividades e Instrumentos de Defesa Ambiental e as penalidades disciplinares ou compensatórias ao não-cumprimento das medidas necessárias à preservação ou correção da degradação ambiental. É importante ressaltar que a abordagem estratégica proposta na Política Nacional de Meio Ambiente é praticamente a mesma adotada na Constituição de 1988, em seu Capítulo VI – Do Meio Ambiente.

É mantido, portanto o caráter

conservacionista da política ambiental brasileira onde são enfatizados aspectos de restrição ao uso dos recursos e espaços direcionados a amenizar as conseqüências do crescimento econômico, ao invés de priorizar a questão ambiental de forma global enquadrando elementos relacionados à preservação para um real desenvolvimento (MONOSOWSKI, 1989). O final dos anos 1980 é marcado pela preparação da Constituição Federal diante a um quadro urbano-ambiental alarmante, onde a desigualdade de renda e as distorções do crescimento se refletem na condição espacial. As grandes metrópoles brasileiras, Rio de Janeiro e São Paulo, concentram 55% dos pobres do país e apresentam áreas destoantes como espaços nobres dotados de infraestrutura e áreas de favelas (REZENDE, 2003). Assim em 1988 é promulgada a nova Constituição dotada de capítulos sobre política urbana e meio ambiente além de conter aspectos que aumentam a responsabilidade dos municípios em relação à questão urbana, como a obrigatoriedade do plano diretor para cidades com mais de 20.000 habitantes e a exigência de estudo prévio de impacto ambiental para a realização de obra ou atividade potencialmente causadora de poluição (Capítulo II, da Política Urbana, art. 225). Neste mesmo ano foi instituída a Lei de Crimes Ambientais (Lei nº 9.605), contribuindo para o fortalecimento dos instrumentos de direito ambiental.


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De acordo com SOUSA (2005) no ano de 1989, sob o governo do então presidente José Sarney, verificou-se uma reestruturação dos órgãos públicos encarregados da questão ambiental, através da unificação em torno de um único órgão federal: o Instituto Brasileiro de Meio Ambiente e dos Recursos Naturais – IBAMA (Lei nº 7.735 de 22 de fevereiro de 1989) concomitante à extinção da SEMA. Ainda na década de 1980, principalmente a partir de 1985, é notável um gradativo fortalecimento dos órgãos estaduais de meio ambiente resultado da definição da temática ambiental na Constituição de 1988 como competência comum entre estados e União. Tendo em vista os acontecimentos dos anos de 1980 na área da política ambiental brasileira, principalmente quanto ao caráter preventivo das ações que se sucederam e isolado em relação às preocupações globais, VIEIRA & BREDARIOL (1998) afirmam:

Acirra-se a contradição entre uma economia predadora e poderosas pressões de movimentos e interesses nacionais e internacionais. Assim como a economia, o meio ambiente também se globaliza. Redefinem-se os temas da política ambiental. Evidencia-se a necessidade de um novo pacto entre as nações (Vieira & Bredariol, 1989, p. 84).

Os novos movimentos sociais que surgiram no Brasil na década de 1970, fortaleceram-se na década de 1980 e foram fundamentais para o processo de redemocratização da sociedade brasileira depois de duas décadas de governos militares. Apesar de já existirem iniciativas ambientalistas no Brasil desde os anos de 1950, o movimento ambientalista brasileiro passou a ter certa representatividade em meados dos anos 1970 (JACOBI, 2003), desdobrando-se em vertentes múltiplas, as quais LITTLE (2003) agrupa em três principais, que são: conservacionista (focalizada na proteção da biodiversidade),

estatista

(focalizada

no

controle

da

poluição)

e

a

socioambientalista, mais recente com a proposta de efetuar reivindicações políticas e sociais conjugadas às demandas ambientais e territoriais.


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Neste contexto a pauta da política ambiental tanto internacional quanto nacional precisava ser redefinida o que culminou na elaboração, em nível internacional, do Relatório Brutland, mais conhecido como Nosso Futuro Comum, em 1987, através da iniciativa do Programa das Nações Unidas para o Meio Ambiente (PNUMA). A confecção deste documento se deu por meio de foros setoriais, com participação ativa de organizações não-governamentais internacionais e estabeleceu o conceito de desenvolvimento sustentável como meta fundamental para todos os países. REZENDE (2003) atribui ao surgimento da noção de sustentabilidade, lançada a partir do relatório supracitado, o estabelecimento de um possível compromisso entre políticas sociais, de crescimento econômico e proteção ambiental. Em 1992 a discussão sobre a problemática ambiental cresce com a Conferência das Nações Unidas para o Meio Ambiente – UNCED (também conhecida como Cúpula da Terra, Eco-92 e Rio-92), realizada na cidade do Rio de Janeiro onde reuniram-se representantes de 175 países e de organizações não-governamentais.

Configurou-se

como

uma

tentativa

de

reunir

representantes de todos os países do mundo para discutir e divulgar a nova concepção de desenvolvimento sustentável que entrou em voga a partir do Relatório Brutland. O Brasil se preparou para este evento através da Comissão Interministerial de Meio Ambiente (CIMA) com a elaboração de um relatório explicitando o posicionamento brasileiro frente à temática ambiental. A CIMA coordenou representantes de 23 órgãos públicos e foi criada a Secretaria do Meio Ambiente da Presidência da República, transformada mais tarde no Ministério de Meio Ambiente. De acordo com SOUSA (2005, p. 7) “esse evento significou para o Brasil ter que enfrentar a crise ambiental e ao mesmo tempo retomar o desenvolvimento, fortalecendo a democracia e a estabilidade da economia”. A Rio-92 demonstrou um crescimento do interesse mundial pelo futuro do

planeta.

Muitos

países

deixaram

de

ignorar

as

relações

entre

desenvolvimento socioeconômico e modificações no meio ambiente. Entretanto é perceptível que o conceito de desenvolvimento sustentável foi apropriado


58

pela economia neoclássica devido ao peso dos interesses empresariais nas discussões. Nesta Conferência foram assinados importantes acordos ambientais que refletem sua influência até a atualidade, são eles: as Convenções do Clima e da Biodiversidade, a Agenda 21, a Declaração do Rio para o Meio Ambiente e Desenvolvimento e a Declaração de Princípios para as Florestas. Dentre os documentos resultantes a Agenda 21 tem grande destaque e estabelece compromissos e intenções para a preservação e melhoria da qualidade ambiental e dispõe sobre ações sociais e econômicas, conservação e

gestão

dos

recursos

para

o

desenvolvimento,

fortalecimento

das

comunidades e meios de implementação. Todavia há críticas a respeito da posição conservacionista da Agenda 21, à sua abordagem pouco efetiva quanto a questão do consumo e aos vultosos investimentos necessários para sua implantação no mundo (cerca de 600 bilhões de dólares anuais).

A Agenda 21 não passa de um documento que afirma um discurso oficial: assume posição moderada e conservacionista; não critica o padrão de consumo; assume que o consumo insustentável é um problema técnico (Layrargues, 2003 apud Lopes et al, 2009, p. 137).

Contudo é plausível ressaltar que a Agenda 21 apresentou uma gama de programas que podem ser considerados instrumentos fundamentais para a elaboração de políticas públicas em todos os níveis e que privilegiam a iniciativa local. Nestes termos a Agenda 21 brasileira foi lançada em julho de 2002 com uma grande preocupação em efetivar a síntese entre o ambiental e o urbano e para tanto busca orientar as políticas ambientais, transmitindo-as do nível nacional para o estadual e municipal, concretizadas por meio de planos e regulamentos. Este posicionamento da Agenda 21 brasileira estabeleceu-se diante a crise do modelo de política ambiental executado no Brasil ao longo dos anos 1990, a qual evidenciou a necessidade de redefinição das opções de política ambiental e do próprio papel do Estado Brasileiro. Sobre a Agenda 21 brasileira, CORDANI et. al. (1997) afirmam que:


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[...] o principal avanço parece ter sido a incorporação, pelo poder público local em vários municípios e estados da Federação, de novos conceitos de desenvolvimento. Esses conceitos materializam-se em órgãos especialmente constituídos, com a vocação de propor e acompanhar a Agenda 21 local (Cordani et al, 1997, p. 405).

Em setembro de 2002, as Nações Unidas patrocinaram uma nova conferência, a Rio+10, em Johanesburgo, África do Sul tendo como um dos principais objetivos a avaliação dos acordos e convênios ratificados na Rio-92, além de buscar consenso na avaliação das condições ambientais e sociais atuais e nas prioridades para ações futuras. A discussão incidiu sobre as ações voltadas à erradicação da pobreza, à globalização e às questões energéticas, tais como o Mecanismo de Desenvolvimento Limpo (MDL) e o Protocolo de Kyoto, assim como às mudanças climáticas. Os resultados, no entanto não estavam em consonância com o que se esperava e, de acordo com LITTLE (2003, p. 13) “não é um exagero se afirmarmos que os resultados mostrados em Johanesburgo foram mínimos e, em alguns casos, houve retrocesso”. Embora os impactos da Conferência Rio +10 na política ambiental brasileira e mundial ainda não sejam totalmente claros, é possível verificar que em relação à Eco-92 foram conquistados modestos, mas importantes avanços, tais como: a definição de compromissos em relação à ampliação do saneamento básico no mundo e à redução do desmatamento; iniciou-se a restauração dos estoques pesqueiros; a criação de um novo sistema de gerenciamento de produtos químicos; progressos em relação ao combate à pobreza e ao controle de emissão de gases poluentes na atmosfera ainda que sem a adesão dos Estados Unidos ao Protocolo de Kyoto (SOUSA, 2005). A questão ambiental criou força nas últimas três décadas o que se reflete nas ações do poder público, das empresas e da sociedade civil. Mesmo com o desafio permanente de equacionar os problemas ambientais frente ao crescimento econômico e seus agentes, hoje no Brasil a questão ambiental encontra-se incorporada à agenda política e ao planejamento empresarial. A evolução do posicionamento e das ações brasileiras frente às exigências


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mundiais demonstram esses esforços os quais não são de fácil implementação, pois exigem realocação eficaz de recursos escassos e a participação da sociedade e empresas na internalização de custos. O Brasil dispõe de bons instrumentos de política, planejamento e gestão ambiental, contudo a efetivação das ações e metas revela-se ainda bastante problemática, muito aquém do exigido pela dinâmica territorial e populacional vivenciada no país. Mesmo em meio à ineficiência e muitas vezes inoperância dos acordos e determinações legais elaboradas, verifica-se o direcionamento de políticas públicas ambientais com enfoque territorial em uma tentativa de maior espacialização dos projetos e programas desenvolvidos, uma vez que o patrimônio ambiental, e consequentemente, sócio-cultural brasileiro foi por um longo período exaurido por vetores de expansão e exploração inadequados. MORAES (1999, p. 49) afirma que “num país construído na apropriação de espaços, onde „governar é abrir estradas‟, a idéia de natureza como valor em si tem dificuldade em se enraizar nas práticas sociais”. É neste contexto plausível o entendimento do Sistema Nacional de Unidades de Conservação - SNUC, instrumento da política ambiental brasileira gerado a fim de atender às necessidades de conservação das áreas naturais.

1.3.1 – O Sistema Nacional de Unidades de Conservação – SNUC

Conforme analisado no item anterior, a institucionalização política e administrativa da problemática ambiental e mais especificamente da proteção da natureza no Brasil se processou de forma lenta e gradual, iniciando sua consolidação somente na primeira metade do século XX. A estruturação de um ideário protecionista no aparato jurídico-legal e institucional brasileiro favoreceu sobremaneira a criação de áreas protegidas. Esta evolução se deu em decorrência

de

fatores

histórico-sociais

como:

o

fortalecimento

e

aparelhamento do Estado; a participação e influência de diferentes segmentos da sociedade civil e o contexto internacional.


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A criação de instrumentos legais que preconizavam a proteção da natureza com foco na definição de tipologias de áreas a serem especialmente protegidas teve início no Brasil em 1934 com o Código Florestal, o qual declarava de “interesse comum a todos os habitantes do país” o conjunto das florestas existentes e demais formas de vegetação, classificando-as nas seguintes tipologias: protetoras, remanescentes, modelo e de rendimento. Este Código estabeleceu as condições necessárias para a criação em 1937 (Decreto nº 1.713 de 14 de junho de 1937) do Parque Nacional de Itatiaia, o primogênito dos parques nacionais brasileiros. Sucederam-se até 1939 a criação de diversos Parques Nacionais cuja administração e fiscalização estavam submetidas ao Serviço Florestal Federal, Seção de Parques e Florestas Nacionais, órgão vinculado ao Ministério da Agricultura o que demonstra a predominância do caráter preservacionista, reduzindo a floresta a recurso econômico. O Código de Caça e Pesca de 1934 também contribuiu para a criação de áreas protegidas já que seu Capítulo III indicava a destinação de “terras públicas do domínio da União, dos Estados e dos Municípios, a juízo dos respectivos Governos, [para o estabelecimento de] parques de criação e de refúgio”. No entanto o decreto não previa a criação e delimitação de áreas específicas para a proteção dos habitats o que reforça a tradição centrada nas espécies como recursos. A importância desse período se deve à inserção na legislação brasileira dos primeiros elementos direcionados à garantia de proteção e gestão diferenciada das áreas naturais, apesar do número de áreas instituídas não ter sido muito expressivo. Contudo, o modelo de proteção estabelecido baseado em categorização e tipologias permite, ao menos conceitualmente, tanto a preservação quanto a conservação através da utilização controlada dos recursos naturais em áreas específicas, além de se configurar como um modelo que foi cultural e historicamente inserido na tradição brasileira de proteção da natureza (MEDEIROS, 2006).

A tradição brasileira de criação de espaços protegidos seguindo a lógica da categorização em função dos objetivos e finalidades da área criada, estabelecida pelo Código Florestal de 1934, foi uma de suas heranças mais importante. Todos os


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instrumentos legais de proteção posteriores, apesar de criados segundo dinâmicas e contextos específicos, seguiram essa mesma tendência, o que resultou, no país, em quase uma dezena de dispositivos voltados a criação de tipologias distintas de espaços protegidos (Medeiros et al, 2004, p. 85).

No período de ascensão do regime militar a partir do Golpe de Estado de 1964 os instrumentos de criação de áreas protegidas no Brasil foram mantidos e posteriormente aperfeiçoados. Pode-se atribuir tal posicionamento às mudanças na percepção da comunidade internacional quanto aos problemas ambientais, fato que gerou inúmeras mobilizações sociais que incidiram sobre a elaboração dos acordos e protocolos internacionais dos quais o Brasil se tornou signatário. Neste ínterim foi estabelecido um novo Código Florestal em 1965 o qual extinguiu as tipologias de áreas protegidas previstas em 1934 substituindo-as por: Parque Nacional e Floresta Nacional, Área de Preservação Permanente (APP) e Reserva Legal (RL). Com a criação em 1967 do Instituto Brasileiro de Desenvolvimento Florestal (IBDF), novo órgão do governo central vinculado ao Ministério da Agricultura, a administração das áreas protegidas passou a ser atribuição do mesmo, além de ter como competência prioritária fazer cumprir o Código Florestal e toda a legislação pertinente à proteção dos recursos naturais renováveis (BENSUSAN, 2006; MEDEIROS, 2006). É sobretudo na década de 1970 que a criação de novas áreas protegidas toma dimensão internacional, devido em parte ao reconhecimento da rápida destruição das espécies e também à estratégia do governo brasileiro de integrar e desenvolver todas as regiões do país aliada ao controle do território. Mesmo tendo um posicionamento desenvolvimentista na Conferência de Estocolmo em 1972, internamente o Brasil adotou uma postura mais preventiva em relação às questões ambientais, em consonância com a tendência internacional. Isto se verifica no Plano Nacional de Desenvolvimento (1975-79) que tem como um de seus objetivos “atingir o desenvolvimento sem deterioração da qualidade de vida e, em particular, sem devastar o patrimônio nacional de recursos naturais”. A criação da SEMA em 1973 também alia-se a este propósito apesar de na prática este órgão não ter atendido à expectativa


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de gestão das áreas protegidas, ficando o IBDF com a função de órgão fomentador das ações para as florestas.

Contudo, com a criação da SEMA, esperava-se que esta fosse acumular todas as funções de gestão das áreas protegidas, deixando ao IBDF somente a responsabilidade de fomentar o desenvolvimento da economia florestal. Por razões de cunho político isto não ocorreu, uma vez que todo o conjunto de áreas criadas até então havia sido mantido sob gestão do IBDF. Com isso, a SEMA acabou estabelecendo um programa próprio de áreas protegidas que ficariam a ela subordinadas (Mercadante, 2001 apud Medeiros, 2006, p. 53).

As áreas protegidas sob administração da SEMA eram: Estações Ecológicas (ESEC) e Áreas de Proteção Permanente (APP) em 1981, Reserva Ecológicas (RESEC) e Áreas de Relevante Interesse Ecológico (ARIE) em 1984 e Reservas Particulares do Patrimônio Natural (RPPN) em 1996. A situação de duplicidade em que se encontrava a gestão de áreas protegidas no Brasil dividida entre o IBDF e a SEMA apontava para a necessidade de concepção de um sistema mais integrado que promovesse maior ordenação no processo de criação e gestão das áreas protegidas. Além disso, alguns estudos realizados pelo IBDF em meados dos anos 1970 já demonstravam tal necessidade. Os estudos e debates que se sucederam formaram a base para a construção do atual sistema de unidades de conservação brasileiro devido principalmente aos desdobramentos das propostas de 1979 e 1982. Em 1979 o IBDF em conjunto com a Fundação Brasileira para a Conservação da Natureza – FBCN apresentou um estudo denominado “Plano do Sistema de Unidades de Conservação do Brasil” o qual teve sua segunda versão revisada lançada em 1982 e foi o primeiro documento a utilizar a terminologia “unidades de conservação” para designar o conjunto de áreas protegidas que seriam contempladas pelo Sistema (MERCADANTE, 2001; MEDEIROS, 2003). Como esta proposta não foi aceita por motivos políticos o IBDF contratou a Fundação Pró-Natureza (FUNATURA) para redigir um


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anteprojeto de lei dispondo sobre o SNUC (Sistema Nacional de Unidades de Conservação). Após um ano de estudos e discussões com a comunidade conservacionista, em maio de 1992 este anteprojeto foi apresentado pela SEMA ao então presidente Fernando Collor de Mello que o encaminhou ao Congresso Nacional sob a forma do agora Projeto de Lei nº 2.892/92. É importante ressaltar que segundo MILARÉ (2001) este anteprojeto foi discutido internamente na autarquia e aprovado com modificações sugeridas pelo CONAMA. Após um período de tramitação de cerca de oito anos no Congresso Nacional, o projeto de lei foi aprovado em 2000 com alguns vetos presidenciais, instituindo assim a Lei do SNUC – Lei nº 9.985/2000. O longo processo de gestação do SNUC se deu em meio a um grande embate entre as diferentes posições ambientalistas existentes no Brasil, representadas por preservacionistas, conservacionistas, socioambientalistas e ruralistas. As discussões e polêmicas giravam em torno principalmente das temáticas relacionadas às populações tradicionais, a participação popular no processo de criação e gestão das UCs e as indenizações para desapropriação. MERCADANTE (2001) afirma que o SNUC manteve a visão preservacionista mais próxima do projeto original elaborado pela FUNATURA; SANTILLI (2005) por sua vez constata que em grande parte dos conceitos base incorporados pela

Lei

prevalece

a

inspiração

socioambiental

sobre

os

conceitos

preservacionistas clássico ou tradicional. Entretanto é plausível considerar que a divisão das UCs em dois grandes grupos – as de Proteção Integral e as de Uso Sustentável – instituída pelo SNUC acaba por englobar ambas as percepções da sociedade em relação à natureza, privilegiando tanto a intocabilidade dos recursos renováveis como a concepção de inclusão social na gestão das áreas protegidas. Além disso, esta Lei reflete um avanço na política ambiental brasileira ao passo que veio fortalecer a perspectiva de uso sustentável dos recursos naturais, das medidas compensatórias e de uma descentralização mais controlada da política ambiental no Brasil. Nesta perspectiva DERANI (2001) defende a idéia de que o SNUC:

[...] é um sistema no sentido de elaboração racional coordenada. Toma como base de ordenação um conhecimento


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predominantemente científico. Sendo a ciência elaborações racionais a partir das diversas maneiras de se ver o mundo pode-se afirmar que o SNUC é uma racionalização do espaço a partir de conhecimentos revelados pela ciência (Derani, 2001, p. 608).

Estruturalmente em seu texto final o SNUC define a criação de 12 categorias de UCs reunidas nos dois grupos citados anteriormente, as Unidades de Proteção Integral e as Unidades de Uso Sustentável (Tabela 1). As primeiras têm por objetivo “preservar a natureza, sendo admitido apenas o uso indireto dos seus recursos naturais” (art. 7°, §1°); as outras visam “compatibilizar a conservação da natureza com o uso sustentável de parcela dos seus recursos naturais” (art. 7°, §2°).


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VISITAÇÃO

Preservação da natureza e realização de pesquisa científica.

Permitida para pesquisa e educação.

Reserva Biológica

Preservação integral da biota e atributos naturais, sem interferência humana direta, exceto para recuperar áreas degradadas e manter o equilíbrio natural e a diversidade biológica.

Permitida somente para medidas de recuperação e manutenção do equilíbrio natural.

Proibida; dependente de regulamento específico.

Parque Nacional

Públicos

Estação Ecológica

Proibida; permitida para pesquisadores e para fins educacionais, conforme Plano de Manejo ou regulamento específico.

Permitida para pesquisa, educação, recreação, interpretação ambiental e turismo ecológico.

Preservação de ecossistemas naturais de relevância ecológica e beleza cênica.

Monumento Natural

Preservação de sítios naturais raros, singulares ou de grande beleza cênica.

Refúgio da Vida Silvestre

Proteger ambientes naturais onde haja condições para existência ou reprodução de espécies ou comunidades da flora local e da fauna.

Permitida: proprietário, moradores tradicionais, pesquisa, educação, recreação, interpretação ambiental e turismo ecológico. Permitida para proprietário, moradores tradicionais, pesquisa e educação.

Permitida; sujeita a normas e restrições do Plano de Manejo, normas administrativas e regulamento específico

Permitida para pesquisa e educação.

PESQUISA CIENTÍFICA

PRESENÇA HUMANA

Permitida, dependendo de autorização prévia do órgão responsável pela administração da unidade, sujeita a condições e restrições e a regulamentos.

OBJETIVO

Públicos ou privados

PROTEÇÃO INTEGRAL

TIPO DE UC

POSSE E DOMÍNIO

Tabela 1: Tipologias e Categorias de Unidades de Conservação previstas pelo Sistema Nacional de Unidades de Conservação (Lei nº9.985/2000) SNUC, 2000.


Manter ecossistemas naturais de importância regional ou local e regular os usos dessas áreas.

USO SUSTENTÁVEL

Floresta Nacional

Reserva Extrativista

Reserva de Fauna

Uso múltiplo sustentável dos recursos florestais e pesquisa científica com ênfase em métodos para exploração sustentável das florestas nativas.

Proteger os meios de vida e a cultura das populações extrativistas tradicionais e assegurar o uso sustentável dos recursos naturais da unidade.

Estudos técnico-científicos sobre o manejo econômico sustentável de recursos faunísticos.

Públicos ou privados.

Área de Relevante Interesse Ecológico

Públicos.

Área de Proteção Ambiental

Proteger a diversidade biológica, disciplinar o processo de ocupação e garantir a sustentabilidade do uso dos recursos naturais.

Públicos; uso concedido às populações extrativistas tradicionais.

OBJETIVO

Públicos.

TIPO DE UC

POSSE E DOMÍNIO

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OCUPAÇÃO HUMANA

Certo grau.

Pouca ou nenhuma.

PESQUISA E VISITAÇÃO

Restrições e normas estabelecidas, se de posse pública, pelo órgão gestor; se privada, pelo proprietário.

Populações tradicionais habitantes na criação.

Visitação condicionada às normas de manejo da unidade. Pesquisa incentivada com autorização prévia.

Populações extrativistas tradicionais.

Visitação deve ser compatível com os interesses locais e conforme o Plano de Manejo da área; a pesquisa científica é incentivada com autorização prévia.

----

A visitação deve ser compatível com o Plano de Manejo da unidade e de acordo com as normas estabelecidas; a pesquisa é incentivada com autorização prévia.


Reserva Particular do Patrimônio Natural

Conservar a diversidade biológica.

Privados.

Reserva de Desenvolvimento Sustentável

Preservar a natureza assegurando condições e meios necessários para a reprodução e a melhoria dos modos e da qualidade de vida e exploração dos recursos naturais das populações tradicionais; valorizar, conservar e aperfeiçoar o conhecimento e as técnicas de manejo do ambiente, desenvolvidos por estas populações.

Públicos; uso concedido às populações extrativistas tradicionais.

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Populações tradicionais, com existência baseada em sistemas exploratórios sustentáveis dos recursos naturais.

Permitida desde que compatível com os interesses locais e de acordo com o Plano de Manejo da área. Pesquisa científica voltada à conservação da natureza, à melhor relação das populações residentes com seu meio e à educação ambiental, sujeitando-se à prévia autorização, às condições e restrições estabelecidas e às normas previstas em regulamento.

Geralmente pequena.

Visitação com objetivos turísticos, recreativos e educacionais, dependente de normas. Pesquisa científica dependente de autorização do proprietário.

Fonte: Costa, 2009 – adaptado pela autora.

Ao lado das unidades de Uso Sustentável e de Proteção Integral o SNUC incorporou à legislação brasileira a Reserva da Biosfera, dedicando a esta um capítulo específico (Capítulo VI), a qual ganhou o status de categoria especial. Este item vai de encontro à regulamentação no Brasil das ações do Programa “O Homem e a Biosfera”, lançado pela UNESCO em 1970 com o objetivo de estabelecer uma rede mundial coordenada de novas zonas protegidas. De acordo com o art.41 esta categoria de área protegida:


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[...] é um modelo, adotado internacionalmente, de gestão integrada, participativa e sustentável dos recursos naturais, com os objetivos básicos de preservação da diversidade biológica, o desenvolvimento de atividades de pesquisa, o monitoramento ambiental, a educação ambiental, o desenvolvimento sustentável e a melhoria da qualidade de vida das populações (SNUC, 2000).

Existem aproximadamente 440 Reservas da Biosfera em 97 países sendo que seis delas encontram-se em terras brasileiras, uma em cada grande bioma: RB da Mata Atlântica (1993), RB do Cerrado (1993), RB do Pantanal (2000), RB da Caatinga (2001), RB da Amazônia Central (2001) e RB da Serra do Espinhaço (2005). Elas abrangem 1.300.000 km2, cerca de 15% do território brasileiro, sendo mais de metade da soma das áreas das demais RBs da Rede Mundial. Mesmo com os problemas relacionados aos trâmites para a sua elaboração e aprovação, e ainda às dificuldades de implementação das UCs tirando-as do papel, é inegável o avanço proporcionado pela instituição do SNUC na proteção da natureza no Brasil. MEDEIROS et al (2004) afirmam que desde a década de 1930, período de criação da primeira UC federal no Brasil, a instituição destes espaços se tornou uma estratégia contínua e crescente. De acordo com a Figura 3 é possível perceber um grande crescimento das áreas protegidas a partir de 1985 de forma que no ano 2000, ano de oficialização do SNUC, a curva de crescimento apresenta uma forte ascensão, atingindo por volta de 60.500.000 hectares de área protegida. MERCADANTE (2009) apresenta dados que corroboram com a afirmação supracitada. Segundo este autor, em 1985 as UCs federais protegiam 16 milhões de hectares e estes números alcançaram 70 milhões de hectares em 2007, o que representa um aumento de 338% em 22 anos. 70 milhões de hectares correspondem a 8% do território nacional, uma área superior a da França. Ainda nesta perspectiva de crescimento, de 2003 a 2007 o autor afirma que foram criadas 191.934 km² de UCs com destaque para as categorias Estação Ecológica (33.816 km²) e Parque Nacional (40.743 km²) no grupo das UCs de Proteção Integral, e no âmbito das UCs de Uso Sustentável


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as Floresta Nacional (41.287 km²) e Reserva Extrativista (50.500 km²) (Tabela 2).

Figura 3: Evolução da área acumulada das Unidades de Conservação por tipo de uso por quinquênio.

Fonte: Medeiros et al (2004).

Tabela 2: UCs federais criadas entre os anos de 2003 a 2007.

Fonte: Mercadante (2009)


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Os dados supracitados demonstram que o SNUC proporcionou um grande avanço à questão das áreas protegidas no Brasil. Todavia se por um lado ele privilegia o ordenamento e regulamentação de um conjunto de categorias de UCs, por outro aprofunda a divisão existente entre outras tipologias de áreas protegidas as quais não foram incluídas em seu texto, mas que ainda continuam a existir, tais como as Áreas de Preservação Permanente e Reserva Legal, inseridas no Código Florestal de 1965. Assim o SNUC não conseguiu atingir em sua plenitude a pretensão inicial de integrar por meio de um único instrumento a criação e gestão das diversas tipologias existentes no país.

Ao consolidar, mesmo que não intencionalmente, as Unidades de Conservação como tipologia dotada de maior visibilidade e expressão, e dotá-las de instrumentos mais concretos de gestão, as outras tipologias que ainda continuaram a existir mesmo após a criação do SNUC – as APPs, as RLs, as TIs e as ARIs – continuaram relegadas aos mesmos problemas históricos de gestão e, mais grave, não dispondo de instrumentos de integração e articulação com as ações previstas para as Unidades de Conservação (Medeiros, 2006, p. 59).

O SNUC preconiza a implementação das ações de forma integrada e sistematizada a fim de que se obtenha maior eficiência dos processos, conforme disposto em seu Capítulo IV – Da criação, implantação e gestão das unidades de conservação. No entanto a tradição política brasileira não privilegia o planejamento de longo prazo principalmente no que diz respeito ao aporte de recursos naturais. Desta forma, apenas a existência de instrumentos e instituições responsáveis não garante a efetividade dos dispostos da Lei e seus conseqüentes desdobramentos considerando também a necessidade de maior adequação das áreas protegidas com as diversas escalas de planejamento e gestão do território, manifestas através dos mosaicos e corredores ecológicos. Mesmo possuindo um artigo que explicita a viabilidade de se gerir unidades de conservação justapostas ou sobrepostas por meio de estratégias


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integradas e participativas (art. 264), na prática as experiências e resultados não demonstram efetividade. As diversas categorias de UCs e o processo de criação das mesmas refletem uma gama de interesses políticos, sociais, econômicos e ambientais os quais por sua vez se manifestam em desarticulação na gestão dessas áreas, comprometendo justamente a finalidade de proteção das mesmas. Assim o grande desafio, desde a sua criação até a atualidade, para que a Lei nº 9.9985/2000 possa vir a ser utilizada de forma plena é garantir a articulação e a transversalidade necessárias entre os diferentes níveis governamentais e os diferentes setores e comunidades envolvidas a fim de que não sejam negligenciadas as demandas sociais, ambientais e econômicas de um país em permanente estado de transformação.

4

Art. 26. Quando existir um conjunto de unidades de conservação de categorias diferentes ou não, próximas, justapostas ou sobrepostas, e outras áreas protegidas públicas ou privadas, constituindo um mosaico, a gestão do conjunto deverá ser feita de forma integrada e participativa, considerando-se os seus distintos objetivos de conservação, de forma a compatibilizar a presença da biodiversidade, a valorização da sociodiversidade e o desenvolvimento sustentável no contexto regional.


2 – CARACTERIZAÇÃO GERAL DA ÁREA

2.1 – A ILHA GRANDE

A Ilha Grande está localizada no 3º Distrito de Angra dos Reis, na região sul do estado do Rio de Janeiro e tem como sede distrital a Vila do Abraão. Possui uma superfície de aproximadamente 193 km² e um contorno bastante acidentado, com 34 pontas, 7 enseadas e 106 praias. O ponto mais próximo do continente dista 3 km (PMAR, 2006). É a maior ilha do estado do Rio de Janeiro e a terceira do Brasil e sua cobertura vegetal faz parte do maciço remanescente da Mata Atlântica sendo parte integrante do Patrimônio Nacional (CODIG, 2009).


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Mapa 1: Localização da área de estudo

Fonte: Oliveira, 2005a.

Figura 4: Vista parcial da Ilha Grande, Vila do Abraão

Fonte: www.ilhagrande.com


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Figura 5: Vista parcial da Ilha Grande, Vila Dois Rios

Fonte: www.ilhagrande.com

Apresenta clima tropical litorâneo caracterizado por ser quente e úmido sem secas, com temperatura média anual de 22,5ºC, sendo fevereiro o mês mais quente, com 25,7ºC de média, e julho, o mais ameno, com 19,6,ºC de média. A precipitação média anual gira em torno de 2.242 mm, sendo janeiro o mês mais chuvoso com 293 mm e julho, o menos chuvoso, com 87 mm. Possui topografia bastante montanhosa com a presença de vários picos, sendo os de maior altitude o Pico da Pedra D’água, com 1.031 m, e o Pico do Papagaio com 982 m. É uma ilha continental que faz parte da Serra do Mar onde predomina o relevo muito íngreme, com dissecação extremamente forte, constituído de cristais de topos aguçados, morros, pontões e escarpas. Apresenta planícies e terraços fluviais, flúvio-marinhos em seu entorno. Geologicamente, a Ilha situase nos domínios da Suite Intrusiva Serra dos Órgãos, constituída por rochas de natureza sintectônica e pós-tectônica representada por "granitóides" e pertence ao mesmo grupo geológico do morro do Pão de Açúcar, Pedra da Gávea e Morro do Sumaré (PMAR, 2006; OLIVEIRA, 2005a).


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No tocante à hidrografia a Ilha possui vários cursos d'água, alguns torrenciais, constituídos de saltos e cachoeiras que nascem pelas vertentes das serras existentes e caminham em direções diversas de acordo com a face das serras onde nascem. Seus rios são pequenos, entretanto numerosos, com destaque para os córregos Araçatiba, Enseada das Estrelas e Abraão, os quais vertem para o norte da Ilha, e Itapecerica, Parnaioca, Rezinguera e Andorinha, que vertem pra o sul da Ilha. A bacia do córrego das Andorinhas é a maior da Ilha Grande. Ocorre ainda a formação de algumas lagoas nas partes mais baixas e planas, particularmente na Reserva Biológica da Praia do Sul (DUTRA, 2008; PMAR, 2006; OLIVEIRA, 2005a). Situada no domínio da Floresta Ombrófila Densa, a Ilha Grande é coberta em grande parte por Mata Atlântica e constitui um mosaico com diversificada característica vegetal. De acordo com RIZZINI (1979 apud OLIVEIRA, 2005a) a floresta da Ilha Grande é classificada como floresta pluvial baixo-montana, caracterizada por um estrato arbóreo com 20m-25m e um estrato arbustivo denso. A maior parte de seu território é constituída por grandes extensões de formações secundárias, a maioria em estágio avançado de regeneração (OLIVEIRA, 2002). Cabe ressaltar a existência de formações florísticas associadas com áreas de restingas e manguezais. É perceptível que a parte sul da Ilha, voltada para o Oceano Atlântico, possui ecossistemas mais preservados do que a parte norte (voltada para o continente) devido principalmente a sua condição mais propícia à ocupação humana (PMAR, 2003 apud OLIVEIRA, 2005a). Em relação à flora destacam-se espécies como o Guapuruvu (Schizolobium parahyba), Jacatirão (Tibouchina sp e Miconia sp), os Ipês Roxo, Branco e Amarelo (Vochysia sp, Tabebuia sp e Cybistax sp), a Embaúba (Cecropia sp) e a Sapucaia Vermelha (Lecynthis pinsonis). Nos manguezais podem ser observados o Mangue-vermelho, Mangue-branco, Siriúba e, na transição para a terra firme, Algodão-da-Praia. (IEF, 2004). No que diz respeito à fauna verificam-se espécies raras ou ameaçadas de extinção, como é o caso do Macaco Bugiu (Alouatta fusca), da lontra (Lutra longicaudis) e das libélulas


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Mecistogaster

amalia,

Libellula

herculea

e

Mecistogaster

asticta.

(MPE/FUNBIO, 2002). Com todas as características acima apresentadas, a Ilha Grande constitui-se um local com grande potencial para o estabelecimento de usos diversos, desde a caça e a pesca dos povos primitivos de três mil anos atrás até a infaestrututa turística na atualidade. Este território esteve sujeito a um processo irregular de ocupação e uso do solo, enfrentado uma série de ciclos históricos como a caça-coleta indígena, o cultivo de coivara, uma economia de cultivo intensiva na época colonial, grande aumento da pesca – principalmente da sardinha – no século XX e expansão do turismo. Segundo WUNDER (2006a) os sinais de ocupação na Ilha Grande datam de três mil anos atrás, com uma população de pescadores primitivos e coletores de mariscos, os quais de apossaram de um pequeno morro – hoje denominado Ilhote do Leste – localizado na atual Reserva Biológica Estadual Praia do Sul. Mais tarde esse grupo foi substituído pelos ameríndios tupiguaranis, os quais devido ao uso agrícola da terra, alteraram mais a estrutura da floresta do que os caçadores e coletores o fizeram. Já na época da conquista portuguesa a Ilha era habitada pelos índios goianás e provavelmente pelos tamoios (subgrupo dos tupinambás); estes, de acordo com STADEN (1999 apud WUNDER, 2006a) eram habilidosos caçadores, pescadores e cultivadores de mandioca e tinham o hábito de migrar quando os recursos naturais se esgotavam. Os tupinambás, sendo inimigos dos portugueses, realizavam transações comerciais com os franceses, utilizando pau-brasil, pimenta e mandioca em troca de bens manufaturados como machados e facas. Eram freqüentes os navios que paravam na Ilha para se abastecer de água e comida além de extrair madeira para efetuar consertos nas embarcações. Esta diversificação de interesses sob o território da Ilha Grande, principalmente em relação ao paubrasil e outras madeiras, e a constituição de estruturas portuárias para atender às novas atividades ali estabelecidas pelos europeus, determinaram a degradação das áreas arborizadas mais acessíveis pelo litoral.


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A extração seletiva de pau-brasil (Haematoxylum brasiletto), uma espécie usada para a fabricação de tinta na Europa, mas de nenhum interesse para o autoconsumo indígena, algumas vezes causava degradação e desmatamento, pois amiúde as tribos indígenas especializadas em fornecer tal madeira utilizavam fogo para desobstruir a floresta e facilitar a colheita. Esse comércio também afetou a Ilha Grande, desde a conquista até o século XVIII (Wunder, 2006a, p.110).

O

assentamento

dos

colonizadores

na

Ilha

Grande

iniciou-se

efetivamente apenas ao longo do século XVIII, uma vez que os portugueses proibiram as tentativas de colonização até 1725 a fim de evitar a formação de colônias hostis (contrabandistas e piratas ingleses, franceses e holandeses) em uma área de grande importância do ponto de vista estratégico (VIERIA DE MELLO, 1987 apud WUNDER, 2006a). A partir do século XIX houve um importante avanço da economia de plantation que fez da Ilha Grande um significativo centro agrícola, principalmente de cana-de-açúcar; grandes posses de terras agrícolas foram estabelecidas em diversos locais como Abraão, Dois Rios e Parnaioca. Neste mesmo período, de acordo com DUTRA (2008), a Vila do Abraão foi visitada por D. Pedro II que adquiriu a Fazenda do Holandês – correspondente ao território da Vila do Abraão – e a Fazenda Dois Rios. Entretanto na passagem para o século XX já se verificava a decadência das plantações. WUNDER (2006a) afirma que vários fatores podem explicar tal situação, dentre eles a conversão da antiga Fazenda de Dois Rios em prisão no ano de 1893 e a utilização, a partir de 1886, da fazenda na vizinha Abraão como hospital de quarenta (Lazareto) para os imigrantes recém-chegados da Europa suspeitos de portar doenças infecto-contagiosas. Além disso, a abertura

de

novas

áreas

agrícolas

no

continente

concomitante

ao

desenvolvimento de vias de acesso férreas e rodoviárias, deixou a Ilha Grande em grande desvantagem competitiva.

A abertura de novas e férteis áreas agrícolas no continente, particularmente no estado de São Paulo, ligadas aos mercados urbanos por novas rodovias e ferrovias, exerceu uma pressão declinante nos preços das safras. A Ilha Grande, com sua topografia de declive e seu caro transporte por barcos, não possuía vantagem comparativa, a longo prazo, na manutenção


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da produção de produtos agrícolas com um baixo valor por unidade ou peso, como cereais, bananas e açúcar etc. Embora estrategicamente localizada no período colonial, a ilha gradualmente se tornou marginalizada dos centros de desenvolvimento econômico (Wunder, 2006a, p.114).

A partir do início do século XX, a pesca começa a se destacar como a principal atividade econômica da Ilha. Essa atividade ganha força na década de 30 com a instalação de diversas fábricas de salga de pescado, sendo a década de 50 o seu auge, com mais de 20 fábricas de sardinha (LEAL FILHA, 2005 apud DUTRA, 2008). Contudo a concorrência com a pesca industrial de grande porte, a redução dos mananciais, a criação das unidades de conservação e a expulsão dos caiçaras pela especulação imobiliária, fizeram com que a atividade pesqueira entrasse em decadência a partir da década de 70, levando ao fechamento fábricas de sardinha e, por conseguinte, ao desemprego inúmeros caiçaras (PRADO, 2003). A última fábrica de sardinhas encerrou suas atividades em 1992. Além dos ciclos produtivos supracitados, as instituições carcerárias também desempenharam importante papel na configuração histórica, social e espacial da Ilha Grande. Estas instituições situadas nas vilas do Abraão e Dois Rios favoreciam a presença de um setor de serviços e um fluxo de renda do setor terciário para a Ilha já que os funcionários da prisão recebiam seus salários do estado, fornecendo assim uma renda para muitas famílias locais (WUNDER, 2006). Além disso, estas instituições funcionaram como um obstáculo ao aumento do fluxo de visitantes que já era perceptível a partir da década de 1980, impedindo assim grandes intervenções na natureza e transformações territoriais.

Ao longo de praticamente um século, a presença de instituições carcerárias na Ilha Grande, o policiamento ostensivo e as fugas freqüentes de prisioneiros representaram um controle indireto do fluxo de visitantes e da expansão da população local. A Ilha Grande manteve-se com uma população estável, à margem de grandes intervenções na natureza, da especulação imobiliária e de grandes fluxos de turismo. As práticas cotidianas de antigos moradores foram


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marcadas pela hegemonia de uma instituição estatal forte, o „presídio‟, que propiciava emprego, lazer, educação e assistência médica. Grande parte dos agentes penitenciários e policiais militares era recrutada entre os habitantes da ilha; médicos, enfermeiros e dentistas do presídio atendiam a população local; eram oferecidos ainda salas de cinema e espetáculos beneficentes (Santos, 2005, p. 385).

O Lazareto foi criado entre os anos de 1884 e 1886 na área da antiga Fazenda do Holandês, na Praia do Abraão. A área era propícia devido a grande enseada que favorecia o estabelecimento de um ou mais ancoradouros, permitindo a separação entre navios e núcleos de tratamento; além disso, os ventos favoreciam a renovação do ar e havia área suficiente para a construção de diversos prédios. Em 1889 foi construído um aqueduto para trazer água das montanhas até o Lazareto. Já em 1893 foi autorizada a criação de uma colônia correcional na Ilha Grande, sendo construída então a Colônia Correcional Dois Rios em 1894, a qual foi extinta em 1897 devido às dificuldades econômicas e à falta de pessoal. Contudo era latente a necessidade de um local afastado para onde fossem enviados os indesejáveis da sociedade o que culminou na reativação da Colônia Penal de Dois Rios em 1903. O Lazareto, por sua vez, passou por uma reforma em 1940 sendo modificado para se tornar a Colônia Penal Cândido Mendes a fim de receber os presos comuns da Colônia Penal de Dois Rios, já que essa passaria a abrigar presos políticos da 2ª Guerra Mundial. Paralelamente às reformas das duas colônias penais iniciou-se a construção da estrada que liga Abraão a Dois Rios. O Lazareto abrigou os presos comuns até 1954, quando estes então retornaram ao presídio de Dois Rios, agora funcionando como um presídio de segurança máxima com o nome de Instituto Penal Cândido Mendes. O antigo prédio onde funcionava o Lazareto foi dinamitado em 1964 por ordem do então governador Carlos Lacerda; em 1994, Instituto Penal Cândido Mendes também foi implodido, desta vez por ordem do então governador Leonel Brizola (PEREIRA, 2009; www.ilhagrande.com.br). Atualmente parte das antigas instalações do presídio é administrada pela UERJ que iniciou suas atividades no local e em 1998


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inaugurou no local o Centro de Estudos Ambientais e Desenvolvimento Sustentável (Ceads). A partir da desativação do Instituto Penal Cândido Mendes a Ilha passou a ter um significado turístico e ecológico, superando assim seu papel correcional e punitivo. Vale ressaltar a ocorrência dos grandes investimentos governamentais no município de Angra dos Reis a partir da década de 50, que refletiram em mudanças na Ilha Grande: a construção do estaleiro Verolme em 1959; a abertura (1974) e a pavimentação (1980) da BR-101; o Terminal Petrolífero da Ilha Grande (TEBIG) e na Usina Nuclear Angra I em 1980. Essas intervenções trouxeram melhorias em infraestrutura para Angra dos Reis e região, principalmente redes de acesso, o que facilitou a chegada de turistas de São Paulo e Rio de Janeiro, assim como de investidores em empreendimentos turísticos e loteamentos (VALLEJO, 2005). Atualmente a Ilha Grande como um todo, em especial a Vila do Abraão tem no turismo sua principal atividade econômica. Apesar da extensa legislação ambiental aplicável à área e às unidades de conservação ali estabelecidas, a atividade turística vem se desenvolvendo de forma desorganizada, gerando assim um grande paradoxo, pois ao mesmo tempo em que os recursos naturais são necessários como atrativos turísticos, a utilização dos mesmos provoca impactos negativos que podem levar à descaracterização dos ecossistemas locais, e conseqüentemente ao declínio da atividade turística.

Tabela 3: Ciclos produtivos da Ilha Grande CICLO

PERÍODO

Caçadores e coletores

1000 d.C.

Corte-e-queima tupinambá

Pré-conquista

Extração de pau-brasil

Colonial

Extração de óleo de baleia

Colonial

Proibição de assentamento

Colonial


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Corte-e-queima caiçara

Pós-conquista

Plantação (açúcar, café, etc.)

Séculos XVIII e XIX

“Setor de serviços” (tráfico de escravos, Séculos XIX e XX hospital, presídio) Crescimento da pesca

Cerca de 1940-1980

Crescimento do turismo

1990 até agora

Fonte: Wunder, 2006a, p. 120 – adaptado pela autora.

2.1.1 – As unidades de conservação da Ilha Grande

A criação das unidades de conservação no mundo atual vem se constituindo numa das principais formas de intervenção governamental visando reduzir as perdas da biodiversidade face à degradação ambiental imposta pela sociedade. Na Ilha Grande considerada detentora de um dos maiores patrimônios naturais do estado do Rio de Janeiro e reconhecida como um dos últimos locais preservados de Mata Atlântica no Brasil (MENDONÇA, 2008), a criação de unidades de conservação tem sido uma constante. A combinação de ecossistemas presentes na área e a paisagem ali configurada exercem grande influência neste processo.

A justificativa geral para a proteção na Ilha Grande não parece ser a preservação de espécies-chave endêmicas, embora possam existir exceções para tal posicionamento. A manutenção de áreas protegidas é bastante motivada pela combinação ímpar de elementos no nível da paisagem (Wunder, 2006a, p. 126).

Toda a Ilha Grande é protegida por unidades de conservação. Ela está completamente inserida na Área de Proteção Ambiental de Tamoios e Reserva Biológica da Ilha Grande. Sobrepostas a estas unidades de conservação existem outras três: o Parque Estadual da Ilha Grande, a Reserva Biológica da


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Praia do Sul e o Parque Estadual Marinho do Aventureiro. Além disso faz parte da Reserva da Biosfera da Mata Atlântica (RBMA), categoria de área protegida também contemplada pela legislação brasileira concernente.

Mapa 2: Unidades de Conservação da Ilha Grande (2002)

Fonte: LAGIEF – IEF/RJ, 2002.

A história das unidades de conservação na Ilha Grande iniciou-se com a criação do Parque Estadual da Ilha Grande (PEIG) por meio do Decreto Estadual nº 15.273 (23/06/1971). Foi o terceiro parque criado no território fluminense e teria inicialmente cerca de 15.000 ha. Entretanto, o PEIG somente foi definitivamente demarcado e implementado em 1978, com uma área total de 5.594 ha, bem inferior ao que foi estabelecido em 1971, incluindo todos os terrenos e benfeitorias de propriedade do Estado localizadas na Ilha Grande, menos as áreas da colônia penal. Até 1988 o PEIG era administrado pela Secretaria de Estado de Agricultura e Abastecimento; a partir desta data passou a ser administrado pelo Instituto Estadual de Florestas (VALLEJO,


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2005). Em 2005, por meio da Lei nº 3.058, os limites do PEIG foram aumentados passando a abranger 12.072 ha, ocupando 62,5% da área da Ilha Grande. Segundo a Coordenadora de Manejo e Conservação do INEA (Instituto Estadual do Ambiente), Juliana Correia, ainda não existe um mapa com as atualizações dos limites das unidades de conservação da Ilha Grande. A Reserva Biológica da Praia do Sul foi criada pelo Decreto Estadual nº 4.972, de 02 de dezembro de 1981 com a finalidade de preservar diferentes ecossistemas como mata de encosta, manguezal, restinga, lagunas e costão rochoso. Possui aproximadamente 3.600 ha, está localizada no sudoeste da Ilha e tinha a FEEMA como órgão gestor até 2008. Existe na área desta Reserva sítios arqueológicos (sambaquis) com vestígios de 3.000 anos das tribos Tupinambá e Tamoios, ruínas de fazendas do período áureo da cana-deaçúcar e do café além de remanescentes de mata primária (OLIVEIRA, 2005). Possui, portanto uma variedade de elementos preservados que constituem uma paisagem singular, marcada por uma profusão natural e histórico-cultural. TENÓRIO (2006) acredita que a preservação da área se deve principalmente a dificuldade de acesso a esta parte da Ilha, tanto por oceano quanto por terra. Através do Decreto nº 9.452 de 1986 foi criada a Área de Proteção Ambiental de Tamoios. Está localizada no município de Angra dos Reis e possui duas partes: uma continental, que abrange a faixa marinha (cerca de 33 metros) de praticamente todo o litoral de Angra dos Reis, e uma insular que abrange todas as ilhas que integram o município inclusive a Ilha Grande. OLIVEIRA (2005a) ressalta que apesar da APA possuir 90.000 ha de área bruta, seu tamanho real é de 21.400 ha, já que a categoria Área de Preservação Ambiental abrange apenas a área útil, ou seja, ilhas e a faixa marinha no continente. Devido à grande extensão geográfica da APA verificamse

problemas

de

ordem

prática

relacionados

principalmente

ao

desconhecimento das restrições por parte dos moradores e também a dificuldade de fiscalização e gestão de uma área tão grande. Seu Plano Diretor foi instituído somente em 1994, concomitante à implosão da Colônia Penal Cândido Mendes, fato considerado como marco das transformações espaciais na Ilha Grande motivadas pelo turismo.


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A Reserva Biológica da Ilha Grande foi criada pelo Decreto nº 9.728, de 06 de março de 1987 e abrange todo o território da Ilha Grande, com uma área de 19000 ha. Teoricamente, os ecossistemas protegidos por essa Reserva são os de praia, costão rochoso, manguezais, restingas, floresta ombrófila densa e florestas secundárias. Segundo OLIVEIRA (2005a) de todas as unidades de conservação existentes na Ilha, esta é a que possui mais problemas, visto que sua

implantação

é

praticamente

inviável,

pois

suas

restrições

são

incompatíveis com a realidade da Ilha e com a Área de Proteção Ambiental de Tamoios, também estabelecida em todo o território da Ilha, criada há apenas quatro anos antes da Reserva. WUNDER (2006a, p. 122) coloca que esta situação é um exemplo de como “os mecanismos de administração contidos nos diferentes decretos e na legislação são diretamente antagônicos”. Criado pelo Decreto nº 15.983, de 27 de novembro de 1990, o Parque Estadual Marinho do Aventureiro tem como objetivo resguardar atributos excepcionais da natureza, conciliando a proteção destes com a utilização para objetivos educacionais, recreacionais e científicos. Possuindo uma área estimada de 1.300ha o Parque corresponde à parte marítima adjacente à Reserva Biológica da Praia do Sul. Abrange, portanto todo o volume de mar do espelho d’água desta reentrância natural da Ilha Grande, assim como os componentes físicos e bióticos existentes, desde a superfície até o fundo do mar. A Reserva da Biosfera da Mata Atlântica foi criada em 1993 em consonância com o programa “O Homem e a Biosfera”, lançado pela UNESCO em 1970, sendo a primeira das seis Reservas da Biosfera estabelecidas no Brasil. Inclui todos os tipos de formações florestais e outros ecossistemas terrestres e marinhos que compõem o Domínio Mata Atlântica, bem como os principais remanescentes florestais e a maioria das unidades de conservação da Mata Atlântica, onde está protegida grande parte da biodiversidade brasileira, abrangendo uma área de cerca de 35 milhões de hectares em 15 estados brasileiros, dentre eles o Rio de Janeiro. Neste ínterim a Ilha Grande é


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reconhecida como RBMA. Em relação às funções1 da RBMA as que mais se aplicam

são

demonstrativos,

aquelas

relacionadas

pesquisa

cientifica

ao e

fomento

e

capacitação

apoio em

a

projetos

benefício

do

desenvolvimento sustentável, já que as determinações legais seguidas para estas áreas são em geral aquelas determinadas pela categoria de unidade de conservação em que estão inseridas. Todas as unidades de conservação presentes na Ilha, exceto a RBMA, são de âmbito estadual. Desde o início da criação destas áreas (década de 1970) o governo estadual ficou com o encargo de gerir as distintas categorias de unidades de conservação por meio de dois órgãos: o Instituto Estadual de Florestas – IEF e a Fundação Estadual de Engenharia do Meio Ambiente – FEEMA. A partir de fevereiro de 2007, com a publicação de uma Resolução da Secretaria de Estado de Ambiente, estes dois órgãos passaram a exercer a gestão compartilhada das unidades de conservação do estado (DUTRA, 2008). Em janeiro de 2009 foi criado o INEA – Instituto Estadual do Ambiente, uma junção dos órgãos ambientais estaduais, sendo então o responsável pela gestão das unidades de conservação do Rio de Janeiro. Existem também na Ilha Grande áreas protegidas determinadas por legislações no âmbito municipal através da Prefeitura Municipal de Angra dos Reis – PMAR, dentre elas a Lei 146/81 que declara de preservação permanente as áreas acima de 60m; o Decreto Municipal nº 1.543/98 que enquadra a Ilha Grande como Área de Interesse Ecológico e a Lei de Diretrizes Territoriais para a Ilha Grande (ainda não promulgada) que visa complementar as diretrizes gerais determinadas pela Lei nº 1.754 de 21 de dezembro de 2006 – Plano Diretor de Angra dos Reis. Desta forma verifica-se na Ilha Grande uma superposição de delimitações de áreas protegidas o que implica em diferentes legislações para uma mesma área. Além disso, a administração é multifacetada, caracterizada 1

De acordo com o site oficial da Reserva da Biosfera da Mata Atlântica (www.rbma.org.br) as funções da RBMA são: 1) A conservação da biodiversidade e dos demais atributos naturais da Mata Atlântica incluindo a paisagem e os recursos hídricos; 2) A valorização da sóciodiversidade e do patrimônio étnico e cultural a ela vinculados; 3) O fomento ao desenvolvimento econômico que seja social, cultural e ecologicamente sustentável; 4) O apoio a projetos demonstrativos, à produção e difusão do conhecimento, à educação ambiental e capacitação, à pesquisa científica e o monitoramento nos campos da conservação e do desenvolvimento sustentável.


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por atores e interesses diversos e, muitas vezes, divergentes. Neste sentido Wunder (2006a, p. 122) afirma que “a selva de legislação ambiental na Ilha Grande parece ser mais densa e impenetrável que a exuberante floresta tropical que ela finge proteger”.

2.2 – A VILA DO ABRAÃO

A Ilha Grande, apesar de ser considerada como um todo único na maioria dos discursos que a ela se remetem (ambientalistas, turistas, governantes, empreendedores), possui uma intrincada diferenciação interna, verificável nas comunidades ali estabelecidas. Dentre elas podemos destacar: Vila Dois Rios, Provetá, Aventureiro e Vila do Abraão. A Vila do Abraão, recorte espacial desta pesquisa, está localizada a nordeste da Ilha Grande, na vertente voltada para o continente e não para o Oceano Atlântico (Mapa 1). É a mais populosa (em torno de 2000 habitantes, de acordo com o documento Estudos Socioeconômicos dos Municípios do Estado do Rio de Janeiro, 2008), considerada a “porta de entrada” da Ilha Grande. É nesta Vila que se concentra a infra-estrutura existente na Ilha – principalmente meios de hospedagem e outros estabelecimentos que atendem ao fluxo turístico – e é onde se localizam tanto o cais de atracação da barca da Companhia Barcas S.A. (que realiza o transporte de passageiros de Angra dos Reis e Mangaratiba até a Ilha Grande) como um cais de atracação de barcos de passeios turísticos e particulares. Da porta de entrada da Ilha chegam e partem, diariamente, os barcos de passeios para as demais praias e é também de onde são com maior freqüência iniciadas as caminhadas pelas diversas trilhas existentes na Ilha.


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Figura 6: Vista geral da Enseada do Abra達o

Fonte: Rocha et al, 2004.

Figura 7: Vista parcial da Enseada do Abra達o

Fonte: www.ilhagrande.com


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Dois acontecimentos marcam a história recente da Vila do Abraão sendo eles, a criação de unidades de conservação da natureza e a intensificação do fluxo turístico. Estes acontecimentos caracterizam a mudança de função da Ilha: de sede do Instituto Penal Cândido Mendes a “paraíso ecológico” que deve ser preservado e usufruído. A “questão ambiental” e “o turismo” são elementos determinantes da história local os quais intervêm na forma de construção do processo de gestão e planejamento territorial, influenciando o uso e ocupação do solo pela população, empreendedores, turistas e poder público. A vocação turística da Ilha Grande tornou-se perceptível a partir da década de 1970, processo que foi em grande parte beneficiado pela construção da Estrada Rio-Santos proporcionando facilidade de acesso de São Paulo ao Rio de Janeiro. No mesmo período a Embratur (na época Empresa Brasileira de Turismo e atualmente Instituto Brasileiro de Turismo) elaborou o projeto Turis para o planejamento da área, sendo classificada como Zona Prioritária de Interesse Turístico, Classe A, conforme Decreto nº 71791, de 31/01/1973. Entretanto podemos considerar que esta vocação consolidou-se a partir de 1994 com a desativação do Instituto Penal Cândido Mendes. Neste ínterim a Vila do Abraão, com sua vertente voltada para o continente, apresentava-se como uma “porta de entrada”, o local propício para a instalação de infraestrutura turística. A partir de então para atender à demanda crescente e aos

interesses

imediatistas

do

setor

privado,

ergueram-se

inúmeros

equipamentos turísticos, sem que houvesse um planejamento condizente à realidade deflagrada. As principais alternativas de emprego na Vila do Abraão estão ligadas direta ou indiretamente ao serviço público, comércio e turismo. A pesca, que durante muitas décadas foi a base da economia local, hoje faz parte da realidade de poucas famílias. O uso dos barcos voltou-se para o transporte de turistas, na realização de passeios pelas diversas praias da Ilha. MENDONÇA (2008) destaca que apesar dos moradores atribuírem grande importância ao turismo, considerando este até mesmo como a “alma da Ilha Grande”, são constantes as reclamações sobre a ausência de outros meios de trabalho e


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renda. Os moradores também se opõem ao atual modelo de turismo, que além de ser predatório, oferece oportunidades desiguais de inserção da população. De acordo com o diagnóstico desenvolvido pela equipe do Projeto Turismo Inclusivo (LTDS/COPPE/UFRJ, 2004) a Vila do Abraão é a mais populosa da Ilha, com o maior grau de ocupação, é a localidade mais exposta ao turismo, parece um grande comércio “desvairado”, uma agência imobiliária (aluguéis de casas, campings, diárias em pousadas) e um canteiro de obras, com a construção de pousadas. O crescimento da visitação e conseqüente aumento da demanda por hospedagem, alimentação e demais equipamentos turísticos, além do grande fluxo migratório em busca de alternativas de emprego e renda proporcionadas pelo turismo, promovem um gradativo avanço das edificações e vias por áreas protegidas por lei, já que a Vila está inserida na Área de Proteção Ambiental de Tamoios, na Reserva Biológica da Ilha Grande e é contígua ao Parque Estadual da Ilha Grande (PEIG). É possível também verificar muitos problemas relacionados à infraestrutura básica da área, tais como: qualidade e escassez da água para consumo; coleta e destinação do lixo; coleta, tratamento e destinação do esgoto. Segundo MENDONÇA (2008) conforme registrado no documento “Caracterização e Dimensionamento do Setor Turístico no Município de Angra dos Reis – 2007”, no ano de 2007 a Ilha Grande recebeu cerca de 330.000 turistas. Devido às facilidades encontradas na Vila do Abraão, é neste local que a maior parte dos turistas se hospedam o que implica no incremento de inúmeras ações especulativas envolvendo construções irregulares e oferta de vagas de hospedagem residencial. Conforme dados do MPE/FUNBIO (2002), em 2002 a grande maioria (67%) dos quase 3 mil leitos ofertados (67 pousadas, ou seja, 1895 leitos) na Ilha Grande se encontravam na Vila do Abraão além de algumas casas e suítes, registrando um número de 786 leitos. Existem também pousadas, aluguel de suítes e campings “clandestinos”, atuando sem registro de funcionamento. O aumento do número de construções reflete em irregularidades no uso e ocupação do solo uma vez que a Vila do Abraão tem nos lugares mais


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íngremes o seu principal vetor de crescimento urbano, pois a faixa de baixada (localizada entre o mar e a encosta) é estreita. Apesar da legislação do zoneamento urbano proposta pelo Plano Diretor de Angra dos Reis (2006) determinar que não é permitido nenhum tipo de construção a partir da cota de 40 metros – haja vista aquelas estabelecidas antes da criação do Plano Diretor – é possível avistar construções recentes acima dessa cota além do aumento do gabarito de algumas casas, pressionando muitas vezes os eixos de drenagem e intensificando o desmatamento (DUTRA, 2008). Tal situação determina também a criação de caminhos e becos interligando as diversas áreas sem o comprometimento com questões técnicas e estruturais, provocando, assim o aumento de processos erosivos.

Figura 8: Pier particular invadindo área de mar e restringindo o uso público

Fonte: Ana Flávia O. Peccatiello, 2009.


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Figura 9: Casa construída na área do PEIG.

Fonte: Ana Flávia O. Peccatiello, 2009.

Os problemas em relação à água são verificáveis principalmente na alta temporada, quando a demanda é mais elevada. Segundo o MPE/FUNBIO (2002) o abastecimento e o tratamento de água na Vila do Abraão são feitos por redes públicas municipais, sem o uso de filtros. Todavia em períodos chuvosos a população recebe água de baixa qualidade, caracterizada como barrenta, contendo folhas e demais matérias orgânicas. GAMA et al (2006) afirmam que tanto nas pousadas quanto nas residência a água encanada é predominante, havendo um percentual pequeno da população que utiliza água de poço ou retirada diretamente do rio. Apesar disto a falta de água esporádica, principalmente no verão, é uma realidade, pois a demanda por água neste período é estimada em 955 mil litros por dia, sete vezes mais do que a capacidade de armazenamento da Vila.


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Em relação ao esgotamento sanitário, a rede pública atende 90% das residências o que, no entanto não significa ausência de problemas. De acordo com o MPE/FUNBIO (2002) não há fossas em muitos campings como também não há caixas de gordura em alguns estabelecimentos comerciais; a rede pluvial é ligada na rede pública o que provoca uma sobrecarga no sistema de forma que o excedente é lançado diretamente nos córregos.

Figura 10: Tubulações expostas e edificações construídas nas margens do curso d’água

Fonte: Ana Flávia O. Peccatiello, 2009.

Já a coleta de lixo na Vila do Abraão é regular e diária, realizada pela Prefeitura Municipal de Angra dos Reis. O lixão do Aqueduto, próximo ao PEIG, foi desativado em 2001 e a partir de então o lixo passou a ser transportado por uma traineira para o Aterro de Ariró em Angra dos Reis. Quase todos os resíduos são coletados sem separação, por funcionários de empresa terceirizada contratada pela PMAR. A quantidade produzida oscila de acordo


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com os períodos de baixa e alta temporada, sendo a média na primeira situação de três toneladas e na segunda, doze toneladas, variação considerável que implica em dificuldades na operacionalização do sistema. É comum encontrar lixo e entulhos diversos nas margens e leitos dos rios, em áreas de manguezal, nas faixas de areia, nos terrenos localizados em cotas mais altas e no encontro das ruas e becos. (MPE/FUNBIO, 2002; OLIVEIRA & FEICHAS, 2005). De acordo com a PMAR (2006) uma série de falhas podem ser identificadas no sistema de coleta de lixo da Ilha Grande, dentre elas: 1) Faltam locais apropriados para a disposição temporária dos resíduos coletados e acondicionados pelos moradores das comunidades onde a freqüência de coleta não é diária; 2) As embarcações empregadas para o transporte dos resíduos não são adequadas; 3) O local onde é feita a transferência dos resíduos coletados da embarcação para o caminhão compactador não é apropriado; 4) Os contêineres destinados a receber material reciclável que foram colocados nas comunidades para coleta seletiva, não estão sendo empregados adequadamente para separação dos resíduos pela população atendida; 5) Faltam alternativas e abordagens objetivas quanto a questão da coleta

de

bens

recicláveis

em

restaurantes,

campings,

pousadas

e

embarcações que transportam turistas; 6) Falta participação da população atendida e dos demais órgãos envolvidos.


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Figura 11: Caminhão da coleta de lixo da Vila do Abraão estacionado em uma rua em frente ao cais principal, próximo a entulhos

Fonte: Ana Flávia O. Peccatiello, 2009

Figura 12: Lixo espalhado pela Praia do Abraão, ao lado do cais principal

Fonte: Ana Flávia O. Peccatiello, 2009.

Apesar das problemáticas supracitadas, o ecoturismo2 é a bandeira ideológica utilizada na divulgação do turismo da Ilha Grande. O que se vê na 2

No Brasil, a definição mais usual de ecoturismo é dada pelo documento Diretrizes para uma Política Nacional de Ecoturismo, elaborado pela Embratur e pelo Ministério do Meio Ambiente e publicado em 1994 a qual determina: “Ecoturismo é um segmento da atividade turística que utiliza, de forma sustentável, o patrimônio natural e cultural, incentiva sua conservação e busca


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Vila do Abraão vai em direção contrária ao que este tipo de turismo preconiza, estando muito mais associado ao turismo de massa característico do século XX. Neste sentido, URRY (1996) destaca que a relação existente no turismo de massa é de produção e consumo, a qual cria uma ilusão que destrói os próprios lugares visitados. Esta situação paradoxal é hoje a realidade da Vila do Abraão onde a utilização desordenada do aporte físico e natural constituiu um quadro de degradação ambiental que pode comprometer sobremaneira a prática do turismo e a qualidade de vida da população local.

a formação de uma consciência ambientalista por meio da interpretação do ambiente, promovendo o bem-estar das populações”.


3 – CONSIDERAÇÕES SOBRE A VILA DO ABRAÃO: ANÁLISE DOS INSTRUMENTOS LEGAIS DE ORGANIZAÇÃO DO USO E OCUPAÇÃO DO SOLO EM NÍVEL ESTADUAL E MUNICIPAL

3.1 – ASPECTOS E CONDICIONANTES EM NÍVEL ESTADUAL

Pode-se considerar que o desenvolvimento da gestão ambiental do estado Rio de Janeiro foi formalmente iniciada em 1975, concomitante à fusão dos estados da Guanabara e do Rio de Janeiro. Na Constituição do antigo estado do Rio de Janeiro não havia qualquer menção direta e objetiva ao tema meio ambiente; já a Constituição do estado da Guanabara apresentava um conteúdo ambiental simples e pouco específico. É possível verificar que o tema é mais amplamente contemplado apenas na Constituição de 1975 em um capítulo específico contendo dois artigos (Capítulo II, art. 119 e 120). Por sua vez verifica-se uma valorização da temática na Constituição de 1989 a qual em 22 artigos (art. 261 a 282) faz referência à criação de mecanismos de suporte ao controle e proteção ambiental, incluindo diversas questões ambientais, assim como responsabilidades do governo e a implantação e proteção de unidades de conservação. Segundo VALLEJO (2005) de 1975 a 2002 foram promulgadas em nível estadual 152 leis e 126 decretos de interesse ambiental mais direto, de forma


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que os anos compreendidos entre 1999 e 2002 apresentaram um aumento expressivo na criação dessas legislações em relação aos períodos anteriores. Neste ínterim 26% das leis e decretos criados abordavam o tema conservação ambiental e unidades de conservação. O incremento do aparato legal verificado pode ser explicado por uma convergência de fatores dentre os quais podemos destacar: a evolução do ambientalismo no Brasil a partir dos anos 1980, a promulgação da PNMA (Política Nacional de Meio Ambiente), o retorno de intelectuais exilados no exterior, o surgimento de Ongs ambientalistas e a realização de encontros sobre a temática ambiental (VALLEJO, 2005). A gestão do meio ambiente no estado do Rio de Janeiro é marcada pela criação e reformulação dos órgãos especiais para o assunto e em muitos casos verifica-se que as funções dos mesmos, apesar de definidas por leis e decretos, confundem-se, fundem-se e/ou sobrepõem-se. Na década de 1990, na qual ocorreu a implosão do Instituto Penal Cândido Mendes na Ilha Grande e consequentemente houve um o incremento da atividade turística nesta localidade, foram realizadas duas reformulações do Poder Executivo, uma em 1995 (Decreto nº 2.1258/95) e outra em 1999 (Decreto nº 2.5205/99). Nos anos 2000 também ocorreram duas reformulações, em 2003 (Decreto nº 3.2621/03) e em 2008 (Lei nº 5.101/07). Em todas as situações supracitadas assim como em décadas anteriores, houve alteração na nomenclatura das secretarias de meio ambiente e mudanças nos órgãos à elas vinculados. DUTRA (2008) acredita que as constantes mudanças demonstram uma falta de continuidade das políticas públicas propostas pelos sucessivos governos o que caracteriza a falta de comprometimento dos mesmos e dificulta a aproximação e a identificação da sociedade com as instituições. Diante às constantes mudanças e criações na estrutura administrativa de gestão do meio ambiente no estado do Rio de Janeiro, pode-se destacar prioritariamente de acordo com os objetivos desta pesquisa dois órgãos, a FEEMA (Fundação Estadual de Engenharia do Meio Ambiente) e o IEF (Instituto Estadual de Florestas), devido principalmente às suas funções relacionadas à gestão de unidades de conservação estaduais.


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Fundação Estadual de Engenharia do Meio Ambiente – FEEMA

A FEEMA foi criada por meio do Decreto-Lei nº 39 de 24/03/1975 como um órgão integrante da estrutura da SOSP (Secretaria de Obras e Serviços Públicos), tendo inicialmente como objetivo geral conforme seu art. 15 “[...] pesquisa, controle ambiental, estabelecimento de normas e padrões, treinamento de pessoal e prestação de serviços, visando à utilização racional do meio ambiente, além do combate a insetos no território do Estado”. A FEEMA foi criada a partir de órgãos dos antigos estado da Guanabara e Rio de Janeiro1, herdando os bens móveis e imóveis dos mesmos, assim como as características do quadro de profissionais, em sua maioria engenheiros sanitaristas e químicos já que o maior de todos os órgãos era o IES onde prevaleciam tais profissionais. A criação deste órgão é contemporânea de outras agências ambientais como a de São Paulo (1972) o que se justifica pela emergência das discussões sobre a problemática ambiental em nível mundial (Conferência de Estocolmo) e da deflagração da poluição nas grandes cidades. VALLEJO (2005) afirma que a FEEMA tinha suas principais competências direcionadas para o controle da poluição, o combate aos vetores de doenças, o assessoramento a CECA (Comissão Estadual de Controle Ambiental) e a realização de programas de treinamento e educativos. Ao ser criada, a FEEMA servia de modelo e referência no Brasil e na América Latina no campo da gestão ambiental. Oferecia salários generosos sendo assim capaz de atrair e reter profissionais de alta qualidade e realizar diversos projetos e serviços ambientais. Entretanto, conforma MARGULIS & GUSMÃO (1997) sugerem, o desempenho institucional da FEEMA, assim como dos demais órgãos, depende das prioridades estabelecidas pelos sucessivos governos os quais direcionam os recursos financeiros disponíveis, a oferta de incentivos e o status do órgão no contexto da administração. Desta forma, as diversas alternâncias políticas e a não realização de concursos 1

São eles: IES – Instituto de Engenharia Sanitária; Serviço de Combate a Insetos da Divisão de Combate a Insetos da Empresa de Saneamento da Guanabara (ESAG); Serviço de Controle da Poluição da Divisão de Tratamento de Controle da Poluição instituída pela SANERJ (Cia. de Saneamento do Estado do Rio de Janeiro); ICN – Instituto de Conservação da Natureza.


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públicos para a contratação de novos profissionais levaram a profundas modificações na imagem e nas condições de trabalho da FEEMA. Com a perda de pessoal, de recursos e, por conseguinte, de organização, este órgão foi gradativamente abandonando seus projetos.

A necessidade de complementar o orçamento doméstico forçou muitos empregados a diversificarem suas atividades, com prejuízos inevitáveis ora em termos de desatualização no campo profissional, ora em termos de confiabilidade dos controles realizados pela instituição. Desde o início da década de 80 a Feema não repôs o material humano que perdeu. Por outro lado, programas de treinamento e reciclagem deixaram de ser privilegiados já que a motivação básica e o interesse de boa parte da equipe estavam postos em outros alvos. Ao longo desse processo a instituição não teve como manter seu padrão de excelência (Margulis & Gusmão, 1997, p. 5).

A FEEMA foi criada tendo seu ponto forte o Departamento de Poluição – DEPOL (já extinto), centrado nas questões relativas à poluição fato que não limitou a sua atuação por meio de outros departamentos. Neste ínterim pode-se destacar o Departamento de Conservação Ambiental – DECAM, instituído a partir do ICN, o qual absorveu além do quadro de profissionais, a função de criação e gestão de UCs, apesar de na época não existirem áreas sob sua tutela. Segundo VALLEJO (2005) o grupo que assumiu o DECAM já possuía larga experiência em pesquisa nas áreas de Ecologia, Botânica, Zoologia, dentre outras, o que beneficiou o desenvolvimento de estudos que ajudaram na criação de algumas UCs estaduais como a REBIO da Praia do Sul (1981), APA de Maricá (1984), APA do Pau-Brasil (2002), e outras. Este departamento sofreu uma reformulação entre 1991 e 1994, passando a ser uma Coordenação, depois uma Divisão e enfim um Serviço, denominado Serviço de Ecologia Aplicada. Este era vinculado à Divisão de Estudos Ambientais – DIVEA, a qual era responsável pela gestão de 17 UCs, necessitando entretanto de alternativas previstas pelo SNUC, como a co-gestão com ONGs e OSCIPs, devido a insuficiência de pessoal para suprir tal demanda. A maior parte das UCs geridas pela FEEMA eram de uso sustentável e esta tendência foi se


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concretizando ao longo de sua história. Em 2002, das 17 UCs sob responsabilidade da FEEMA, 12 eram Áreas de Proteção Ambiental (APA). Este fato em muito colaborou para a construção da visão que a sociedade tem desta instituição, a qual segundo MARGULIS & GUSMÃO (1997) é encarada como instituição policial que impede e complica a tramitação e realização de projetos nas áreas protegidas por ela geridas uma vez que algumas de suas principais funções são: o licenciamento ambiental de atividades modificadores do meio ambiente e a fiscalização do cumprimento da legislação ambiental. Até o ano de 2008, apesar de terem ocorrido reformulações das estruturas administrativas, as funções e atuações da FEEMA permaneceram praticamente inalteradas. Percebe-se, no entanto que este órgão sofreu um processo de “sucateamento” de forma que setores como o de pesquisa e conservação ambiental foram uns dos mais atingidos (VALLEJO, 2005). Além disso, a imagem que a população tem deste órgão, no caso específico da Ilha Grande, é ainda muito relacionada com sua ação restritiva quanto à construção de novas edificações e da morosidade e ineficiência nos processos, já que são muitas as construções irregulares ali encontradas (MENDONÇA, 2008).

Instituto Estadual de Florestas – IEF

O IEF foi criado em 1986 (Lei nº 1.071 de 18/11/1986) a partir do DGRNR (Departamento Geral de Recursos Naturais Renováveis), órgão da Secretaria de Agricultura do antigo estado da Guanabara. Este órgão possuía um quadro de funcionários restrito, em sua maioria da área de agronomia e produção florestal. Ao ser criado o IEF absorveu bens móveis e imóveis, pessoal, verba e estrutura administrativa do DGRNR e tinha como principal função a administração e fiscalização das áreas naturais estaduais (parques, reservas, jardins botânicos e horto florestais), além do planejamento, monitoramento, recuperação de áreas florestais, educação ambiental e implantação de UCs.


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VALLEJO (2005) afirma que um dos aspectos de cunho político que motivaram a criação do IEF foi a existência de um movimento corporativista de engenheiros agrônomos e florestais que lutavam pela abertura de novos postos de trabalho. Na FEEMA a inserção destes profissionais não era possível devido ao forte domínio exercido pelos engenheiros sanitaristas e civis. Desta forma a criação do IEF foi uma alternativa tanto para a causa dos engenheiros agrônomos e florestais como para a melhoria do sistema de gestão ambiental do Rio de Janeiro, já que o DGRNR era considerado um setor defasado, principalmente quando comparado às realidades dos órgãos florestais de Minas Gerais e São Paulo, tendo sua atuação mais voltada para a produção do que para a conservação ambiental. As funções e objetivos atribuídos ao IEF – voltados em grande parte para a efetivação de uma política florestal no estado do Rio de Janeiro – eram muitos e abrangentes sendo sua criação, à época, considerada uma proposta audaciosa mesmo que prevista a articulação com outros órgãos públicos e privados para a consolidação das funções. Até o ano de 2006 o IEF era o responsável pela gestão de 12 UCs estaduais, todas de proteção integral (8 parques, 3 reservas e 1 estação ecológica). Além da miscelânea de objetivos, outro problema enfrentado pelo IEF desde sua criação envolve a disponibilidade e qualificação dos profissionais, situação que se agravou ao longo do tempo com a redução do quadro de pessoal e a conseqüente necessidade de aumento de funcionários contratados ou cedidos por outros órgãos do governo, uma vez que não foram realizados concursos públicos. Esta alta rotatividade de pessoal dificultou a formação de uma boa equipe, capacitada para as diversas funções e envolvida com as causas e responsabilidades do órgão. Outro aspecto apresentado por VALLEJO (2005) são as questões relacionadas à infraestrutura física e localização do IEF. Segundo este autor, o órgão nunca teve uma sede predial fixa na cidade do Rio de Janeiro, tendo sido transferido de lugar diversas vezes chegando até mesmo a ocupar algumas salas do prédio sede da FEEMA e, em outra ocasião, do prédio sede do Instituto da Previdência do Estado do Rio de Janeiro – IPERJ. Isto dificultou a


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formação de uma identidade do órgão frente à sociedade e a prestação de serviços públicos relativos às consultas ao acervo documental-bibliográfico. No caso específico de gestão das UCs o IEF é visto pelas comunidades locais como um órgão fiscalizador e punitivo. MENDONÇA (2008) ressalta que na Ilha Grande o IEF é tido como sinônimo de proibição e punição e que apesar de alguns moradores acharem que o órgão cumpre seu papel de preservar,

consideram

o

processo

pouco

efetivo

em

informação,

conscientização e envolvimento comunitário. A FEEMA e o IEF foram desde suas respectivas criações os órgãos estaduais responsáveis pela gestão das UCs no Rio de Janeiro. Em muitos casos, a sobreposição de categorias diferentes de unidades de conservação em uma localidade foi acompanhada da sobreposição administrativa, de forma que uma mesma área poderia estar sobre a gestão da FEEMA e do IEF concomitantemente. Neste contexto muitas áreas sofreram com a ingerência, omissão e excessos de competências exercidas pelos órgãos responsáveis, ficando a ocupação dos espaços à mercê dos interesses econômicos de cada período. Diante às problemáticas que se constituíram no âmbito da gestão de UCs foram feitas algumas propostas de fusão da FEEMA e do IEF como a criação de um “Instituto de Parques Fluminense” e o “Instituto de Unidades de Conservação”. O novo órgão teria suas atribuições focadas nas unidades de proteção integral, ficando as de uso sustentável sob a administração de outro setor. No entanto a existência de conflitos dentro do próprio governo e mais especificamente entre departamentos da FEEMA e do IEF dificultou a concretização das propostas. VALLEJO (2005, p. 144) ressalta ainda que “as propostas de unificação estruturais e de funções administrativas não são acompanhadas de confiança suficiente por parte do corpo técnico diretamente envolvido da administração das UCs”. Na Ilha Grande no ano de 1995 foi realizada uma tentativa de aperfeiçoar o diálogo e a cooperação entre os órgãos ambientais responsáveis pela gestão das UCs na localidade com a criação da UGI – Unidade de Gestão Integrada da Ilha Grande. O objetivo da proposta era a melhoria no


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desempenho das UCs mas devido ao caráter localizado da ação, ou seja, sem o envolvimento dos órgãos em si mas apenas daquela parcela dos mesmos responsáveis pela gestão da Ilha Grande, a unificação não gerou os resultados esperados sendo aos poucos abandonada. DUTRA (2008) atenta para o fato de a criação da UGI ter ocorrido pouco tempo após a ECO-92, evento de ordem internacional onde se manifestou a necessidade de maior atenção às questões ambientais. Neste contexto, diante ao reconhecimento em nível mundial da Ilha Grande como um “paraíso ecológico” passível de proteção e uso turístico era necessário apresentar uma proposta que demonstrasse o comprometimento da administração pública com área. Assim, “no mesmo momento em que criavam novas alternativas para a proteção ambiental, iniciava-se uma retórica de mobilização para a atividade turística” (DUTRA, 2008, p. 101). Em 2007 com a extinção da SEMADUR – Secretaria de Estado de Meio Ambiente e Desenvolvimento Urbano e a criação da SEA/RJ – Secretaria do Ambiente, assumida pelo deputado Carlos Minc, foi realizada a proposta de unificação da gestão das UCs estaduais através do IEF a fim de superar as divergências que ocorriam entre as instâncias ambientais do estado. Esta ação ocorreu no mesmo ano de criação do Instituto Chico Mendes de Conservação da Biodiversidade, autarquia vinculada ao Ministério do Meio Ambiente e integrante do SISNAMA cuja principal função é administrar as UCs federais. Isso demonstra uma tendência em nível nacional de organização da gestão das UCs, com o objetivo de superar os entraves administrativos que em muito dificultaram a conservação da biodiversidade no Brasil. No ano de 2008, em meio à gestão do governador Sérgio Cabral, foi sancionada a Lei nº 5.101/07 a qual propõe a criação do INEA – Instituto Estadual do Ambiente. Foi enfim realizada a unificação dos órgãos ambientais estaduais: IEF, FEEMA e SERLA. O INEA passa então a ser o executor das políticas estaduais do meio ambiente e de recursos hídricos, buscando a centralização do processo de gestão, o aperfeiçoamento na agilidade dos projetos e a melhoria no diálogo entre os atores sociais evolvidos.


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3.1.1 – Plano Diretor da Área de Proteção Ambiental de Tamoios

A Área de Proteção Ambiental de Tamoios foi criada através do Decreto Estadual nº 9.452 de 05/12/1986 pelo então governador do estado do Rio de Janeiro, Leonel de Moura Brizola, sendo a FEEMA responsável por seu gerenciamento. Localizada no município de Angra dos Reis possui 90.000 ha de área total e abrange todas as ilhas e faixa de marinha (cerca de 33 metros a partir da linha de costa) do Município. É composta de duas partes: a parte continental que abrange todos os terrenos de marinha e seus acrescidos em conformidade com Decreto-Lei Federal nº 9.760, de 1946; e, uma parte insular que abrange todas as terras emersas da Ilha Grande e de todas demais ilhas que integram o Município de Angra dos Reis, nas baías da Ilha Grande, da Ribeira e da Jacuecanga num total de 91 ilhas, abrangendo uma área de aproximadamente 214 km². A criação da APA de Tamoios se deu em um contexto histórico nacional favorável, em pleno processo de redemocratização do País o qual emergia da ditadura militar, cujos representantes gradativamente perdiam seus postos. Assim, a oposição conquistava novos espaços e, por conseguinte as eleições. A sociedade revia seu papel e tonava-se mais engajada através de movimentos sociais, como no caso das Diretas Já, e também através de uma postura denunciadora. Os movimentos sociais se organizavam e as demandas socioambientais aumentavam exponencialmente e, junto a outros segmentos, os ambientalistas passaram a exigir maior participação nas decisões que diziam respeito ao meio ambiente e nas políticas públicas voltadas para a proteção ambiental. No contexto do estado do Rio de Janeiro durante este período a produção de leis ambientais aumentou, inclusive em qualidade. Mediante a promulgação da Política Nacional de Meio Ambiente no início dos anos 1980 foram criados a FEEMA, o IEF e o FECAM. Além disso, alguns mecanismos


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legais relacionados com a responsabilidade por danos ao meio ambiente ganharam força, como a ação civil pública. No âmbito do município de Angra dos Reis as unidades de conservação criadas nesse período, entre elas a REBIO Praia do Sul (Decreto Estadual nº 4.972 de 02/12/1981), a APA de Tamoios (Decreto Estadual nº 9.452 de 05/12/1986) e a Reserva Biológica da Ilha Grande (Decreto nº 9.728 de 06/03/1987), tiveram sua origem motivada pela conscientização de crescentes camadas da população para o problema da degradação ambiental, por protestos contra a construção das usinas atômicas e pela ameaça de um mega-empreendimento turístico e imobiliário na Ilha Grande. É plausível considerar que essas transformações no quadro da política ambiental e urbana local assim como na postura da sociedade, estão relacionadas com a profunda alteração de um dos paradigmas da Região: a troca do modelo rural pelo da ocupação do território através da especulação imobiliária, base conceitual da nova “vocação turística” da Região, em que o maior símbolo foi a construção da BR-101, a qual alterou profundamente a face litorânea do Rio de Janeiro. O território litorâneo entre o Rio de Janeiro e Santos, ao longo da referida rodovia, foi em grande parte explorado de forma predatória, com graves conseqüências para os nativos, a natureza e parte do patrimônio histórico e artístico. É plausível destacar que no ano de 1987 foi criada através do Decreto nº 9.728 de 06/03/1987, a Reserva Biológica da Ilha Grande para todo o território da Ilha Grande. Tal UC apresenta características mais restritivas que a APA a qual foi criada apenas quatro meses antes. Assim, tal Reserva é ignorada tanto pela população quanto pelas autoridades locais, pois além de sobrepor outras UCs, provoca uma situação contraditória devido ao seu decreto de criação que não permite nenhum tipo de ocupação humana em toda a lha Grande. A discussão a respeito do Plano Diretor da APA de Tamoios teve início no final dos anos de 1980, concomitante ao início do desenvolvimento do Plano Diretor de Angra dos Reis. Alexandre Oliveira, membro do CODIG (Comitê em defesa da Ilha Grande), morador da Ilha desde 1996 e frequentador desde a década de 60, afirmou em entrevista que neste período houve uma união entre Prefeitura e Governo do Estado para se desenvolver o zoneamento do


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município, tendo em vista a organização do uso e ocupação do solo do mesmo, inclusive da Ilha Grande. Ele acredita que tal concordância entre município e estado ocorreu devido à circunstância favorável do governo do PT que acabara de assumir e ascendia de um movimento social muito intenso. Entretanto a colaboração entre as duas esferas de governo não se manteve até o fim do processo, de forma que a prefeitura deu continuidade aos estudos e discussões tendo sido o Plano Diretor de Angra dos Reis instituído em 1991, três anos antes do Plano Diretor da APA de Tamoios. Tal fato se deve às diferenças de propósito perceptíveis no âmbito de cada esfera; a PMAR conforme já apresentado, passava por um momento de renovação que favorecia e exigia a realização de ações em consonância com as demandas vigentes, as quais estavam voltadas especialmente aos aspectos urbanos e ambientais. A instância estadual por sua vez, representada neste processo pela FEEMA como administradora da APA de Tamoios, estava em franca decadência, envolta em uma crise manifesta pela insuficiência de funcionários, baixos salários e indícios de corrupção. Além disso, a partir dos dados da Tabela 4, apresentados por VALLEJO (2005), é possível verificar que os recursos destinados à conservação ambiental nos anos de 1986 à 1989 foram diminutos – com redução marcante no ano de 1989 – principalmente quando comparada à porcentagem do orçamento destinada a Educação e Cultura, Segurança Pública e Saúde e Saneamento.


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Tabela 4: Orçamentos anuais do Executivo/RJ (1976 – 2002)

Fonte: Vallejo, 2005.

É de grande relevância analisar que apenas na década de 90, por meio da Lei nº 1.681 de 19/07/90, foram definidas as condições para a elaboração dos Planos Diretores das áreas de proteção ambiental criadas pelo estado do Rio de Janeiro. Além disso, a APA de Tamoios foi criada através do arcabouço legal da Lei nº 6.902/81 a qual apresentava pouco direcionamento de ações, limitando-se apenas a determinar a possibilidade do Poder Executivo declarar tais áreas de proteção ambiental quando houvesse relevante interesse público e a determinar também alguns limites e proibições de uso; esta mesma Lei dispõe sobre a criação das Estações Ecológicas e apresenta condições e


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determinações

mais

claras

e

completas,

possibilitando

uma

melhor

operacionalização das propostas. No ano de 1994, mesmo ano da implosão da Colônia Penal Cândido Mendes e quando se iniciaram as profundas alterações na paisagem da Vila do Abraão, foi instituído o Plano Diretor da APA de Tamoios pelo Decreto nº 20.172, de 01/07/1994. Assim durante oito anos a gestão da APA de Tamoios foi pautada em seu ato de criação, documento genérico que não define critérios singulares para as diversas áreas abrangidas pela APA. Ou seja, áreas com remanescentes de mata atlântica estavam sob o mesmo amparo legal que áreas urbanas. O Plano Diretor da APA de Tamoios foi instituído tendo como uma de suas principais justificativas a necessidade de definição de diretrizes e normas a serem obedecidas na área a fim de possibilitar a ocupação sem prejuízo à manutenção da dinâmica dos ecossistemas ali presentes. Para cumprir seus objetivos o Plano é baseado na divisão do território em quatro zonas, a saber: I)

Zona de Vida Silvestre – ZVS: destinada à proteção da biota

nativa, dos recursos hídricos, das paisagens e belezas cênicas e dos sítios arqueológicos; II)

Zona de Conservação da Vida Silvestre – ZCVS: admite uso

moderado e auto-sustentado da biota e apresenta potencial para recuperação ou regeneração futura; III)

Zona de Ocupação Controlada – ZOC: áreas favoráveis à

expansão urbana por apresentarem certo nível de degradação ambiental com menores possibilidades de preservação. Está dividida em: - ZOC 1: localizada nas ilhas, em áreas com possibilidade de ocupação; - ZOC 2: localizada na faixa continental da APA, em áreas com possibilidade de ocupação; - ZOC 3: localizada no continente em áreas descaracterizadas pela ocupação ou em acelerado processo de urbanização.


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IV)

Zona de Influência Ecológica – ZIE: constituída pela parte

aquática marinha, parte aquática com influência de água doce e pela parte aflorante devido à maré baixa.


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Mapa 3: Zoneamento da Ilha Grande proposto pelo Plano Diretor da APA de Tamoios

Fonte: FEEMA, 1994.


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De acordo com o Plano Diretor, a Vila do Abraão é considerada uma ZOC1 estando assim sujeita às seguintes determinações: -

O parcelamento do solo não é permitido em terrenos com

declividade igual ou superior a 30% ou 16°42’; em terrenos cujas condições geológicas ou geotécnicas não aconselhem edificação; nos costões rochosos, restingas, manguezais, pontas litorâneas, praias e áreas estuarinas; na faixa de 30m de largura em toda a extensão das praias, contadas a partir de onde termina sua faixa de areia; em áreas situadas acima da cota de 40m; -

Todos os projetos de parcelamento deverão prever servidão de

acesso à praia pelo menos de 100 em 100m; -

Os lotes deverão ter no mínimo 400m² e taxa de ocupação

máxima de 20% e a ocupação em condomínio fica limitada à área máxima de 10.000m²; -

São consideradas áreas não edificantes todas as áreas nas ilhas,

acima da cota 40m; áreas com declividade superior a 45º ou 100%; áreas consideradas de preservação permanente pelo Código Florestal (Lei nº 4.771 de 15/09/1965); os costões, restingas, manguezais, pontas litorâneas, praias e áreas estuarinas; os parcéis e lajes; na faixa de cinco metros de largura em toda a extensão dos costões e afloramentos rochosos; -

Em toda a extensão das praias só serão permitidos equipamentos

urbanos públicos de estrutura básica e de lazer nas faixas, contadas a partir de onde termina a faixa de areia, assim determinadas: a) nas praias com até 50m de extensão, numa faixa de 5m de largura; b) nas praias de 51 a 100m de extensão, numa faixa de 10m de largura; c) nas praias maiores de 101 m de extensão, numa faixa de 15m de largura; -

As edificações devem ter altura máxima de 8m e não podem

ultrapassar a hipsométrica máxima local; -

É vedada a implantação de indústrias de médio e grande porte e a

ampliação das já instaladas; atividade de extração mineral de qualquer natureza;


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-

São proibidos: aterros em espelhos d’água exceto para a

implantação de equipamentos de uso público mediante Estudo de Impacto Ambiental; lançamentos de efluentes líquidos de qualquer natureza sem tratamento (de acordo com Resolução CONAMA nº 20 de 18/06/1986); lançamento de resíduos sólidos de qualquer natureza; vazadouro de lixo e aterros sanitários, a não ser aterro sanitário para disposição apenas de resíduos sólidos orgânicos; construção de cais, piers, atracadouros ou similares que interfiram na circulação das águas; abertura de canais artificiais; construção

de

praias

artificiais

exceto

para

uso

público

em

áreas

comprovadamente degradas. É perceptível que o Plano Diretor em análise utilizou como principal estratégia de planejamento o zoneamento ambiental o qual, de acordo com a Política Nacional de Meio Ambiente (Lei nº 6.938 de 31/08/1981), prevê a preservação, a reabilitação e a recuperação da qualidade ambiental objetivando o desenvolvimento socioeconômico condicionado à manutenção dos recursos naturais e melhoria da qualidade de vida do homem. Segundo SANTOS (2004, p. 133) “o zoneamento é, antes de tudo, um trabalho interdisciplinar predominantemente qualitativo, mas que lança mão do uso de análise quantitativa, dentro de enfoques analítico e sistêmico”. Assim, é necessário que os envolvidos no processo saibam reconhecer a organização do espaço em sua totalidade a fim de realizar uma análise integradora que estabeleça as zonas a partir de atributos que agrupem e expressem as múltiplas interações entre as mesmas. Neste sentido, destaca-se a importância da participação social no processo de planejamento, pois é a partir do conhecimento local que se pode compreender as potencialidades, vocações fragilidades e suscetibilidades de uma área. O processo de elaboração deste Plano Diretor não foi participativo, embasado pelos conhecimentos dos planejadores e da sociedade. Alexandre Oliveira, presidente do CODIG, afirma que o Conselho da APA de Tamoios foi criado apenas em 2006 (Decreto nº 38.737 de 16/01/2006) e ainda assim apenas no papel e não contemplando a real participação da população, tanto que já no ano de 2007 a primeira composição foi dissolvida e outros conselheiros foram empossados, inclusive representantes da sociedade.


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Vale ressaltar que em grandes áreas que envolvem atributos ambientais diversificados e consideráveis conflitos territoriais tal qual a APA de Tamoios, é primordial uma proposta metodológica que englobe a seleção de atributos ambientais mapeáveis associada a medidas quantitativas e análise estatística. Segundo Alexandre Oliveira um dos maiores problemas deste Plano Diretor se deve às imprecisões nos mapeamentos uma vez que as tecnologias disponíveis não eram suficientes para realizar as demarcações necessárias em uma área com contradições singulares – superposição de UCs, históricas disputas territoriais e ocupações irregulares. O professor da PUC-Rio Rodrigo Mascarenhas em entrevista para o site O Eco (2005) a respeito da pesquisa para a elaboração do Programa de Promoção do Turismo Inclusivo na Ilha Grande em 2004 declarou que deparouse com uma situação inusitada na localidade onde encontrou mais proprietários de terras do que ilha: “Se somarmos todos os títulos de propriedade, vamos chegar a umas três Ilhas Grandes”. Tal fato demonstra que o Plano Diretor da APA de Tamoios, instrumento definidor de diretrizes e normas para a ocupação da área, não vem sendo corretamente aplicado e seguido na Ilha Grande. De acordo com o art. 15 do SNUC (2000) a APA é uma categoria de unidade de conservação de uso sustentável que em geral ocupa extensas áreas com elementos naturais e culturais importantes para a qualidade de vida e bem-estar das populações humanas. Caracteriza-se ainda por ser constituída por terras públicas e privadas e por comportar ocupação humana em certo grau, permitindo, portanto o uso sustentável dos recursos. As práticas estabelecidas em seu interior devem, todavia ser supervisionadas pelo órgão gestor o qual deve seguir as condições asseguradas na Lei e ainda compor e presidir um Conselho constituído por representantes dos órgãos públicos, de organizações da sociedade civil e da população residente. As condições determinadas pelo SNUC estão sendo muito lentamente incorporadas à realidade da APA de Tamoios, apesar da urgência da necessidade de mudanças nessa área que durante décadas ficou às margens da administração estadual. Desde a sua criação, a APA de Tamoios ficou sem um responsável direto, tendo a Agência Regional da FEEMA acumulado a


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função. Esta por sua vez, segundo relato de moradores, nunca assumiu a APA como deveria. “Ela era um ente que só servia para dizer não” (Alexandre Cuellar de O. e Silva2). A atuação do IEF, que assumiu a gestão das UCs de uso sustentável no estado do Rio de Janeiro a partir de 2007, também não tinha boa aceitação por parte da população local. Os moradores relatam que além do órgão não ser presente, agia de forma truculenta e impositiva.

3.2 – ASPECTOS E CONDICIONANTES EM NÍVEL MUNICIPAL

O processo de redemocratização política em Angra dos Reis consolidouse no ano de 1985 com a realização de eleições para prefeito. Esta nova configuração política ascendeu carregando marcas da crise do modelo de desenvolvimento nacional da década de 70 (“Milagre Econômico”) que em Angra refletiu-se no término das grandes obras federais e na queda no ritmo das iniciativas ligadas ao setor turístico-imobiliário, e também marcas do período de exceção (1964 – 1985) quando o município foi declarado como Área de Segurança Nacional e o poder central nomeava os representantes do poder local. Tornava-se cada vez mais perceptível a necessidade de se re-planejar o município de Angra dos Reis uma vez que o modelo adotado anteriormente, a partir da abertura da rodovia Rio-Santos e do Projeto Turis3, já apresentava inúmeros problemas atingindo negativamente a população, gerando conflitos no âmbito socioeconômico. O Plano de Desenvolvimento Físico-Territorial – primeira legislação urbana do município, segundo GUIMARÃES (1997) –

2

Alexandre Cuellar de O. e Silva (Dico), 37 anos, guia de turismo, morador da Ilha Grande há 10 anos. Entrevistado dia 24/04/2010. 3 O Projeto Turis (1973-1975) foi elaborado por uma empresa de consultoria italiana, a SCET – Internacional, a pedido da EMBRATUR (hoje Instituto Brasileiro de Turismo), com base na resolução CNTur nº 413 de 13 de fevereiro de 1973 a qual dispunha sobre as Zonas Prioritárias de Interesse Turístico. Tinha como objetivo principal o ordenamento do território do litoral RioSantos com base nos modelos de desenvolvimento turístico realizados na Europa, sendo eles: Côted’Azur, Languedoc-Roussillón e Côte d’Aquitaine. Tratou-se de uma concepção voltada para a atração das camadas mais abastadas da população, com a ocupação das áreas consideradas de categoria A, apresentando forte característica de segregação socioeconômica do espaço.


116

elaborado pelo Executivo municipal em 1981, com o auxílio de técnicos do governo do estado do Rio de Janeiro também colaborou para a intensificação das problemáticas urbanas estabelecidas pois privilegiava o desenvolvimento de atividades ligadas ao setor turístico-imobiliário em detrimento da melhoria das condições de moradia da população e da conservação das áreas naturais.

As novas ocupações de terra para moradia de baixa renda, em áreas pouco valorizadas pelo mercado imobiliário, como morros, mangues, baixadas, entre outras, ocorreram de forma cada vez mais intensa e mais visível. À medida em que eram concluídas as obras de implantação e construção das plantas dos grande projetos (Usina Nuclear, TEBIG e Rio-Santos), o contingente de trabalhadores desempregados contribuiu para intensificar a ocupação irregular do solo, ainda mais agravado pela expulsão dos pequenos produtores rurais e pescadores das ilhas e praias pelos novos empreendimentos imobiliários (Guimarães, 1997, p. 52).

O incremento do turismo e a implantação dos projetos de grande porte durante as décadas de 70 e 80 além de provocarem a ocupação irregular da faixa litorânea, resultaram em um crescimento acentuado da população urbana devido à migração de uma parcela significativa dos moradores da zona rural e de novos moradores vindos de outras cidades. Como conseqüência, houve uma expansão desordenada do centro e de outras zonas urbanas, a ocupação indiscriminada das encostas pela população de baixa renda – determinando um processo de favelização – e o isolamento da região do centro diante às demais localidades do município, levando a desvalorização e degradação desta área, onde se concentram os principais monumentos históricos e arquitetônicos de Angra dos Reis. Pode-se considerar que as últimas administrações municipais dos prefeitos indicados foram catalisadoras de forças políticas para mudanças por terem sido desastrosas, tidas como irresponsáveis e populistas. Neste ínterim foi realizada em 1985 a primeira eleição direta ao governo municipal na qual foi eleito José Luís Reseque, então secretário de obras, apoiado pela maior parte das forças progressistas da cidade. Essa administração caracterizou-se por


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ações pouco transparentes, mantendo as práticas políticas tradicionais, atingindo em quase nada as expectativas da população. Esta por sua vez, apresentando agora uma maior diversidade social, passa a organizar-se em luta pelas questões relacionadas ao uso do solo urbano e rural, usinas nucleares e reivindicações salariais. ABREU (2005) destaca algumas importantes organizações que surgiram na época no município: a Sociedade Angrense de Proteção Ecológica (SAPÊ), o Conselho Municipal das Associações de Moradores (COMAM), a Comissão Pastoral da Terra (CPT), o Centro Unificado de Cultura e Arte (CUCA) e o Partido dos Trabalhadores (PT). Neste contexto foi eleito em 1988 o candidato do PT, Neirobis Nagae, que contava com o apoio de representantes dos movimentos sindical, semterra, cultural, ambientalista e popular. Sua plataforma apresentava como principal proposta a implantação de uma gestão democrática em todos os setores da política local, o que ia de encontro aos anseios das lutas sociais. Entretanto, para os setores dominantes essa eleição significou a perda de um importante espaço de articulação de seus interesses (GUIMARÃES, 1997; ABREU, 2005). O período do governo municipal supracitado (1989-1992) foi definitivo para o município de Angra dos Reis no que tange à gestão democrática das questões urbana e ambiental. Assim, visando dotar o município de uma Política Urbana atualizada perante as demandas emergentes (em consonância com a Constituição Federal promulgada em 1988 e com o movimento pela reforma urbana que vinha ocorrendo em nível nacional desde meados dos anos 1980 4), a Prefeitura formou uma equipe técnica responsável pela elaboração do Plano Diretor, contando com o suporte da COPPE/UFRJ (Instituto Alberto Luís Coimbra de Pós-Graduação e Pesquisa de Engenharia da Universidade Federal do Rio de Janeiro). 4

O capítulo da Constituição Federal de 1988 que trata da Política Urbana é marcado pelas propostas do Movimento Nacional pela Reforma Urbana que surgiu em função das demandas populares dos movimentos sociais. Segundo ABREU (2005, p. 66) “o resultado foi uma disposição constitucional definidora de um tipo de planejamento urbano dinâmico e contínuo, voltado para a garantia do direito à cidadania e à cidade, e que determinou aos municípios de população superior a 20.000 habitantes a elaboração de Planos Diretores acompanhados compulsoriamente de mecanismos que garantissem a participação popular no processo de planejamento”.


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O Plano Diretor Municipal de Angra dos Reis consolidou-se como o principal instrumento da política urbana proporcionando o estabelecimento de regras de uso e ocupação do solo associadas ao desenvolvimento das funções sociais da cidade e da propriedade já que, além dos instrumentos de gestão participativa, este Plano Diretor já incluía as Áreas Especiais de Interesse Social (AEIS), o parcelamento/edificação compulsórios e o IPTU progressivo (ABREU, 2005). É possível destacar que o processo de elaboração deste instrumento de gestão em Angra dos Reis contou com intensa participação popular através das constantes reuniões e debates promovidos pela equipe técnica com a população em geral a fim de informar e identificar mais claramente as demandas latentes. A participação popular também se deu através dos setores mais conservadores da sociedade, constituídos por empreendedores ligados ao mercado imobiliário e ao turismo.

O processo participativo deu ao Plano Diretor uma conformação evidentemente avançada no campo político, dotando-o de alguns instrumentos voltados para uma gestão urbana eficaz, se bem aplicada. O objetivo geral desse Plano - disciplinar a ocupação do solo, conter a especulação de terras e evitar a degradação ambiental - foi reflexo dos interesses confrontados no momento de sua elaboração, em que foram priorizados os setores populares - associações de moradores e grupos ambientalistas e culturais (Abreu, 2005, p. 70).

O Plano Diretor de Angra dos Reis (Lei nº 162/LO de 12/12/1991) foi aprovado pela Câmara de Vereadores em dezembro de 1991, sendo promulgado em 12 de março de 1992.

Essa mesma Lei criou o CMUMA

(Conselho Municipal de Meio Ambiente e Urbanismo) o qual teve sua primeira reunião no mês subseqüente à publicação da Lei do Plano Diretor. Segundo PRADO (2006) no caso específico da Ilha Grande, esse período é marcado por intensos debates a respeito dos grandes e médios empreendimentos ali estabelecidos ou a se estabelecer. Nota-se que apesar de ocorrer o envolvimento da população local nas decisões sobre o destino da Ilha, ocorre também, de diversas maneiras, a desconsideração da visão local.


119

O “Projeto Ilha Grande” evidencia tal situação, pois a PMAR disponibilizou à população local uma “cartilha” que serviria de base às discussões. Ou seja, esta “cartilha” daria o direcionamento aos debates em função das definições privilegiadas

pelo

governo

municipal,

independendo

das

diversas

representações e entendimentos do que podemos considerar visão nativa. Durante os anos 1990 seguiram-se outras duas administrações do PT as quais demonstraram grande tendência em reduzir a participação popular na gestão

urbana.

As

iniciativas

pautaram-se

em

ações

voltadas

ao

empresariamento da cidade, através de um modelo de urbanização condicionado pela lógica de acumulação capitalista, baseado nas parcerias público-privadas. O maior exemple deste período é o Projeto Orla (Projeto de Gestão Integrada da Orla Marítima) que tinha por objetivo o aproveitamento turístico da orla do centro de Angra dos Reis. Apesar de ser uma ação gerada no âmbito do governo federal, sua aplicabilidade é local dependendo diretamente da atuação e investimento dos governos municipais. Em Angra, o Projeto demonstrava claramente a intenção do governo municipal em “requalificar” áreas para a exploração turística de forma que mais uma vez as melhorias realizadas baseavam-se no interesse do capital turísticoimobiliário. A área central, prioritária para as intervenções do Projeto, foi palco durante muitos anos da atividade portuária – a qual entrou em decadência, tornando-se desvalorizada – de forma que o centro histórico e seus monumentos

subutilizados

constituíam-se

em

empecilhos

para

o

desenvolvimento do turismo. Como exemplo de tal situação, ABREU (2005) apresenta o caso de uma área destinada ao uso residencial com aproximadamente 10.000 m² que foi transferida para o parceiro privado como contrapartida de um investimento em urbanização de uma pequena parte do Parque da Praia da Chácara.

Os efeitos da globalização sobre Angra dos Reis foi em parte traduzido pelo Projeto Orla. Houve empresariamento urbano, com âncoras imobiliárias, tendo havido, inclusive, troca de área com empresa à beira do mar, na entrada da cidade (Costa, 2004).


120

Nos anos 2000 o governo PT após três mandatos consecutivos já vinha apresentando sinais de declínio perdendo considerável apoio popular. Alguns fatores importantes que influenciaram esse processo foram: a crise de desemprego, a centralização de decisões característica do último governo petista e a homogeneidade do partido que levou ao isolamento político (COSTA, 2004; ABREU, 2005). Assim, a oposição, na época PDT-PSB-PMDB, se uniu e venceu as eleições de 2000. Neste novo governo as obras urbanas ganham grande destaque consolidando a marca de “governo empresarial”, caracterizado pela captação de recursos extra-orçamentários em prol de tais obras. Confirma-se desta forma a busca pela adaptação e qualificação da cidade para o consumo global, com a construção de marinas, centros comerciais e equipamentos de lazer e entretenimento. Verifica-se ainda neste período ações de grande relevância direcionadas para a Ilha Grande. Pode-se considerar o Termo de Ajustamento de Conduta da Ilha Grande (TAC) como uma dessas ações, apesar de seu caráter judicial, já que necessitava para sua implementação de atuação conjunta entre os órgãos públicos, incluindo ai a PMAR. O TAC da Ilha Grande foi assinado em 20 de dezembro de 2002 entre o Ministério Público e os órgãos públicos e tinha como objetivo principal a adequação da gestão dos resíduos sólidos. Caracterizava-se como uma ação conjunta entre PMAR, Ministério do Meio Ambiente,

SEMADS

(Secretaria

Estadual

de

Meio

Ambiente

e

Desenvolvimento Sustentável) e FEEMA, cada um com suas atribuições cujo cumprimento ou não atingia diretamente a atuação dos outros órgãos envolvidos. De acordo com os resultados de pesquisa realizada, OLIVEIRA & FEICHAS (2005, p. 21) afirmam que o TAC da Ilha Grande “representa um avanço tendo em vista o número de signatários e o caráter dos mesmos, mas não se mostrou suficiente para permitir a implantação das decisões acordadas e buscar resultados negociados com a sociedade”. O ano de 2003 é marcado pela euforia da descoberta de gás e óleo na Bacia de Santos, o que representaria uma retomada de algumas atividades estratégicas para a exploração de gás e petróleo (porto, indústria naval, aeroporto, terminal de petróleo) haja vista a grande infraestrutura industrial já


121

existente. De acordo com ABREU (2005) havia uma expectativa de explosão do crescimento econômico deflagrado pela reabilitação da indústria naval, mas que também influenciaria os setores ligados ao capital imobiliário pela necessidade de adaptação dos critérios para a acumulação da atividade imobiliária. Hoje é possível verificar que a expectativa diante à revigoração econômica em Angra dos Reis mediante múltiplas atividades ainda não se estabeleceu por completo e se mantém a primazia do setor turístico-imobiliário como base econômica. Em 2006 foi apresentada a revisão do Plano Diretor Municipal, através da publicação da Lei nº 1.754 de 21 de dezembro de 2006, fruto de um trabalho iniciado em 2002 em uma conferência que reuniu várias entidades da sociedade civil organizada e o poder público. Esse processo se fez necessário devido à Lei Federal 10.257/2001 – Estatuto das Cidades – que obriga a revisão da lei que institui o Plano Diretor pelo menos, a cada dez anos. Em 2007 a Minuta da Lei de Diretrizes Territoriais para a Ilha Grande a qual visa complementar as diretrizes gerais apresentadas pelo novo Plano Diretor Municipal foi apresentada em audiência pública. Entretanto nenhum desses instrumentos ainda foi promulgado permanecendo em vigor o Plano Diretor Municipal de 1991. Como justificativa para a não vigência destes novos instrumentos, Cássio Veloso de Abreu (Gerente de Geoprocessamento da Secretaria de Meio Ambiente e Desenvolvimento Urbano da PMAR) em entrevista realizada em janeiro de 2010 informou que a revisão da legislação municipal referente à Ilha Grande será feita somente após a revisão do Plano de Manejo da APA Tamoios, que está sendo coordenada pelo INEA pois se entende que a legislação da APA em vigor não atende à realidade atual e o Município não pretende elaborar uma nova norma de uso e ocupação do solo em total discrepância com a norma estadual.

3.2.1 – Área Especial de Interesse Cultural, Ambiental, Turístico e de Utilização Pública da Vila do Abraão (AECATUP)


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O Plano Diretor de Angra dos Reis aprovado em dezembro de 1991 apresenta como um dos instrumentos de política e desenvolvimento municipal e de ordenamento do uso e ocupação do solo as Áreas Especiais. Essas, de acordo com o Art. 97 da referida lei “são áreas que exigem tratamento específico e índices urbanísticos próprios devido as suas características especiais, a serem definidas por Lei”. As principais prerrogativas estabelecidas no Art. 100 para a criação destas Áreas Especiais são: devem ser criadas por iniciativa da Prefeitura, pelos Conselhos ou pelas entidades representativas dos moradores; o CMUMA tem a competência de analisar, propor e deliberar sobre tais áreas; é necessário a participação da comunidade envolvida na criação, localização, planejamento e ações em tais áreas. As Áreas Especiais podem ser as seguintes: -

Área Especial de Interesse Social (AEIS);

-

Área Especial de Desenvolvimento Agrícola (AEDA);

-

Área Especial do Desenvolvimento do Núcleo de Pescadores

(AEDNP); -

Área Especial de Interesse Cultural, Ambiental, Turístico e de

Utilização Pública (AECATUP). Neste ínterim as AECATUP são aquelas que apresentam características relevantes de valor histórico e cultural que devem ser preservadas e recuperadas para

o desenvolvimento

da

cultura

local associada

ao

desenvolvimento turístico. Além disso, o Art. 111 dispõe que nessas áreas:

[...] o Poder Público desenvolverá, em conjunto com a sociedade, planos, projetos e ações que visem a recuperação dos conjuntos arquitetônicos e urbanos de valor histórico e cultural, bem como desenvolverá ações que estimulem a articulação entre a cultura e a atividade turística (Lei 162/LO de 12/12/1991).

É perceptível que a criação de AECATUP está estritamente relacionada à implementação da vocação turística então preconizada para o município de


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Angra dos Reis. Tal fato é também comprovado pelo expresso no Art. 2º quanto a um dos objetivos da AECATUP da Vila do Abraão (Lei nº 648, de 29/12/1997): “I – manutenção das qualidades ambientais do lugar diante do inevitável desenvolvimento do processo de urbanização, tendo em vista a utilização turística”. Foi portanto elaborada a fim de definir os critérios e parâmetros de uso e ocupação do solo da Vila tendo em vista a já existência de uma área urbanizada e a necessidade de se identificar áreas a serem urbanizadas. Outras determinações presentes nesta Lei dizem respeito às diretrizes que reforçam a vocação da localidade, consolidando as atividades existentes e ao fomento da participação contínua das comunidades interessadas. Alexandre Oliveira, afirma que a gestão municipal tinha a intenção de elaborar uma AECATUP para cada enseada da Ilha Grande onde houvesse ocupação humana mas a Prefeitura Municipal não teve estrutura suficiente para dar continuidade a todos os processos. Quando da elaboração do Plano Diretor Municipal, foram definidos no Título X – Das Disposições Finais e Transitórias do documento final alguns critérios que norteariam a gestão do uso e ocupação do solo nas AECATUPs enquanto não fossem definidos seus índices urbanísticos e diretrizes de uso do solo próprios. Os critérios e índices determinados eram: -

estavam vedados os loteamentos e os condomínios para fins

urbanos; -

não eram permitidas quaisquer edificações acima da cota

altimétrica de 40 m; -

o gabarito fixado era de dois pavimentos ou 8 m;

-

o afastamento frontal mínimo fixado era de 1,5 m.

Na AECATUP do Abraão esses critérios foram válidos de 1991 a 1997 e alguns deles foram inseridos em sua lei própria. Tal lei é composta por cinco capítulos e seus objetivos estão relacionados principalmente à adequação e consolidação do aglomerado urbano de baixa volumetria, à disponibilização de infraestrutura e serviços, à manutenção da qualidade ambiental e preservação do patrimônio cultural e arquitetônico local e à articulação inter-institucional


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entre a Prefeitura e demais órgãos estaduais e federais com atuação na Ilha Grande. O alcance desse último objetivo foi embrionariamente prejudicado já que não houve participação da FEEMA – órgão estadual então responsável pela gestão da APA de Tamoios – nas reuniões para discussão dessa lei. O estabelecimento de critérios e diretrizes na AECATUP do Abraão foi baseado na divisão da área em sub-áreas urbanas, sendo elas: I) Sub-área de Ocupação Diversificada – SOD (subdividida em SOD 1, SOD 2 e SOD 3) e II) Sub-área de Utilização Pública – SUP. As SODs são destinadas à ocupação de usos diversos pela iniciativa privada e a SUP é destinada predominantemente aos equipamentos de interesse público.

Mapa 4: Sub-áreas urbanas da AECATUP da Vila do Abraão – mapa anexo da Lei nº 648, de 29 de dezembro de 1887.

Fonte: Prefeitura Municipal de Angra dos Reis, 2009.

Os parâmetros de ocupação do solo para as edificações em geral considerados nesta lei foram: I) Taxa de ocupação; II) Gabarito de altura; III) Afastamentos laterais e de fundos; IV) Recuo ou afastamento frontal. É


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importante ressaltar que esta lei determina que o lote mínimo admissível em toda a área de ocupação urbana é de 250 m²; que entre as cotas altimétricas de 20m e 40m é permitido somente uso habitacional unifamiliar de forma que os elementos construtivos não podem ultrapassar a altura de 5m em relação ao perfil natural do terreno ou dos cortes executados e que os corte ou aterros com altura superior a 3m não são permitidos. Além disso, os terrenos situados numa faixa de 15m ao longo das margens dos cursos d’água e dos manguezais são considerados não edificantes. Entretanto caso não haja mata ciliar a ser preservada, as faixas não edificantes são de 10m nos trechos situados dentro dos limites da SOD. No que tange especificamente à ocupação do solo nas SODs, foram fixadas as seguintes disposições:

“I - para os imóveis lindeiros à Rua da Praia (Orla Marítima) SOD-1: a) taxa de ocupação máxima: 50% (cinqüenta por cento) para edificações com um pavimento e 35% (trinta e cinco por cento) para edificações com dois pavimentos; b) gabarito de altura igual a 2 (dois) pavimentos e com altura máxima da edificação igual a 8m (oito metros), contados desde a cota da soleira até o último elemento construtivo; c) afastamento frontal mínimo de 3m (três metros). II - para a faixa de imóveis situados entre a Rua da Praia, exclusive, e a cota altimétrica de 20 m (vinte metros) -SOD2: a) taxa de ocupação máxima: 50% (cinqüenta por cento); b) gabarito de altura igual a 2 (dois) pavimentos e com altura máxima da edificação igual a 8m (oito metros), contados desde a cota da soleira até o último elemento construtivo; c) afastamento frontal mínimo de 3m (três metros). III - para a faixa de terrenos situados entre as cotas altimétricas de 20m (vinte metros) e 40m (quarenta metros) SOD-3: a) taxa de ocupação máxima: 50% (cinqüenta por cento); b) gabarito de altura igual a (um) pavimento e com altura máxima da edificação igual a 5m (cinco metros), contados desde a cota da soleira até o último elemento construtivo; c) não é exigido afastamento frontal mínimo. Parágrafo 1º - Em caso de terreno acidentado, a altura máxima das edificações será contada a partir do nível médio entre aqueles níveis em que a edificação encontra o solo, conforme disposto no parágrafo 2º do artigo 205 da Lei nº 162/LO de 12/12/91 - Plano Diretor Municipal. Parágrafo 2º - Os afastamentos laterais e de fundos, exigidos somente quando houver abertura de vãos, serão de


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1,5m (um metro e cinqüenta centímetros)” (Lei nº 648, de 29/12/1997).

Já no Capítulo IV – Da Configuração Urbana são apresentadas as disposições para a implantação de vilas ou conjuntos residenciais de pequeno porte com área até 2000m² e para a implantação de condomínios horizontais com área máxima de 10000m², ambos somente nas SODs. Para o primeiro caso o Art. 19 determina como parâmetros de ocupação: I) taxa de ocupação de 70% do lote; II) gabarito de altura (contado desde a cota da soleira até o último elemento construtivo) igual a dois pavimentos e com altura máxima da edificação de 8m; III) afastamento lateral e de fundos de 1,5m, quando houver abertura de vão; IV) 6m de distância mínima entre as fachadas voltadas para as vias internas e V) 3m de largura mínima das vias internas para a circulação de pedestres. O Art. 20 por sua vez, que trata da implantação dos condomínios horizontais estabelece: I) a taxa de ocupação é de 40% da área total do condomínio; II) gabarito de altura (contado desde a cota da soleira até o último elemento construtivo) igual a dois pavimentos e com altura máxima da edificação de 8m e III) 4,5m de largura mínima das vias internas para a circulação de pedestres e veículos públicos. Além disso, de acordo com o Parágrafo 1º deste artigo “o resultado da divisão da área edificante do condomínio pelo número de unidades previstas no projeto não poderá ser inferior ao lote mínimo estabelecido no artigo 7º desta Lei”, ou seja, 250m². O processo de discussão para a elaboração da AECATUP do Abraão foi presidido pelo CMUMA, caracterizando-se como um processo participativo que contou com diversas reuniões algumas delas, segundo declaração de Cássio Abreu em entrevista, foram realizadas na própria Vila do Abrão com a presença de moradores e atores sociais atuantes. Afirma ainda que nas reuniões a presença da esfera estadual se fazia pela atuação do IEF como gestor do PEIG. A principal legislação norteadora da elaboração da AECATUP do Abraão foi o Plano Diretor Municipal devido ao entendimento de que o município detém a competência da gestão do uso e ocupação do solo. Cássio Abreu afirma que


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mesmo assim o Plano Diretor da APA de Tamoios foi em alguns aspectos levado em consideração. Alexandre Oliveira participou das reuniões para elaboração da AECATUP do Abraão como representante do CODIG e disse em entrevista que apesar de interessante, a participação popular neste processo foi relativamente rápida pois o cerne do documento já estava pronto e bem estruturado fato que não permitiu muita discussão. Além disso, Alexandre ainda relatou que a população da Vila do Abraão na época era pequena com apenas uma associação de moradores atuante. Apesar de tal situação considera que o processo foi realmente participativo.

3.3 – PANORAMA DO USO E OCUPAÇÃO DO SOLO ENTRE OS ANOS DE 1994 E 2008 E A DEFLAGRAÇÃO DA DEGRADAÇÃO AMBIENTAL

Conforme apresentando nos subitens anteriores, o ordenamento do uso e ocupação do solo na Vila do Abraão é prioritariamente regido por dois instrumentos legais, um de ordem estadual e outro municipal, os quais foram concebidos em grande parte por corpos técnicos distintos sem a devida comunicação e interação entre os mesmos. Têm-se assim instrumentos legais que, apesar de convergirem em alguns aspectos, apresentam divergências técnicas que se sobressaem. É possível perceber na comparação entre os zoneamentos de cada instrumento que há uma certa analogia entre as terminologias utilizadas. No que tange à Ilha Grande a delimitação física dessas zonas coincide em alguns pontos. Assim temos:


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Tabela 5: Analogia das terminologias do zoneamento dos instrumentos de gestão ZONEAMENTOS PLANO DIRETOR APA DE TAMOIOS

AECATUP DA VILA DO ABRAÃO

Zona de Vida Silvestre – ZVS Zona de Conservação Silvestre – ZCVS

da

Zona de Preservação Permanente – ZPP Vida

Zona de Ocupação Controlada 1 – ZOC 1

Zona de Preservação Congelada – ZPC Áreas Especiais

Fonte: Ana Flávia O. Peccatiello, 2010.

O ponto de maior discrepância nas delimitações das zonas na Ilha Grande encontra-se na área central da Ilha a qual corresponde a parte do PEIG, onde no Plano Diretor da APA de Tamoios é considerada ZVS (Mapa 3) e no Plano Diretor Municipal divide-se em ZPP e ZPC (Mapa 5).


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Mapa 5: Mapa de Zoneamento da Ilha Grande – Plano Diretor Municipal de Angra dos Reis

Fonte: PMAR, 2009.


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Em relação à Vila do Abraão as delimitações são compatíveis em ambos os zoneamentos. Entretanto essa correspondência não se verifica nas determinações estabelecidas; mesmo apresentando um detalhamento maior, a AECATUP do Abraão é menos restritiva que a ZOC 1 do Plano Diretor da APA de Tamoios. Neste sentido é possível destacar os seguintes aspectos dissonantes: -

Lote mínimo e taxa de ocupação: a ZOC 1 estabelece 400m² e 20% e a AECATUP 250m² e 35 ou 50% de acordo com as sub-áreas;

-

A AECATUP estabelece especificações para a construção de “vilas ou conjuntos residenciais”, os quais podem ter área de até 2000m² e taxa de ocupação de 70% do lote; o Plano Diretor da APA de Tamoios não apresenta determinações para esse tipo de construção;

-

Quanto aos condomínios horizontais as duas legislações determinam que a área máxima para esse tipo de construção é de 10000m²; entretanto divergem quanto ao lote mínimo e a taxa de ocupação: a ZOC 1 estabelece 400m² e 20% do lote e a AECATUP, 250m² e 40% da área total do condomínio;

-

A AECATUP determina como não edificantes terrenos acima da cota 40m e que entre as cotas altimétricas de 20m e 40m é permitido apenas uso habitacional unifamiliar; o Plano Diretor da APA de Tamoios por sua vez apenas estabelece que são áreas não edificantes nas ilhas terrenos acima da cota 40m;

-

Em relação à orla, o Plano Diretor da APA de Tamoios somente permite a ocupação a partir do fim da faixa de areia das praias, onde são admitidos apenas equipamentos urbanos públicos de estrutura básica e de lazer. Determina ainda o tamanho das faixas que podem ser ocupadas com estes equipamentos de acordo com a extensão da praia. A AECATUP no entanto não apresenta especificações para estas áreas.

Os aspectos acima apresentados estão relacionados diretamente com a organização do uso e ocupação do solo na Vila do Abraão e refletem a falta de


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articulação institucional da gestão desta localidade. Pode-se perceber, principalmente através das entrevistas com os envolvidos na administração da Vila do Abraão, que a gestão estadual da área passou por um período de “dormência”, não tendo até o ano de 2007 um administrador. Desta forma, ainda que de forma pouco satisfatória, a gestão da Vila do Abraão sempre foi conduzida de fato pela PMAR, incluindo-se ai o período após a criação da APA de Tamoios (1986) e de seu Plano Diretor (1994). Mônica Nemer5 em entrevista afirma que:

[...] nunca houve concomitância efetiva e consistente na gestão da Vila do Abraão, ficando a FEEMA e o IEF sempre e invariavelmente ausentes dessa prática. Quando requerida, se dava de forma conflituosa. Os conflitos se davam em vários campos, tanto legais (os diplomas eram às vezes conflitantes) quanto operacionais, na falta de acordos institucionais mínimos. Como era a prefeitura, com maior presença local, quem dava as cartas, sua política era a mais levada em conta.

Diante a tal situação verifica-se por toda a Vila do Abraão o descumprimento

de

ambas

as

legislações,

deflagrando

assim

a

descaracterização da paisagem e intensa degradação dos atributos naturais locais. É possível constatar através da comparação entre os mapas de uso de ocupação do solo dos anos de 1991 e 2005 que em algumas ruas como a Getúlio Vargas e a da Praia, houve uma densificação das construções; outro aspecto perceptível é que, devido a estreita planície litorânea, as construções tanto de população de baixa renda quanto de meios de hospedagem, avançam pelas encostas íngremes, infringindo os limites legais de cotas e declividade. Vale ressaltar que é de extrema importância a proteção da vegetação em declividades mais elevadas a fim de reduzir os processos erosivos nas encostas (BERTONI & LOMBARDI NETO, 1990).

5

Mônica Nemer é chefe da APA de Tamoios desde 2007. Entrevistada em 26/04/2010.


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Mapa 6: Uso do solo da Enseada de Abraão – 1991

Fonte: Oliveira, 2005.


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Mapa 7: Uso do solo da Enseada de Abraão – 2005

Fonte: Oliveira, 2005.

As ocupações irregulares avolumam-se também ao longo dos cursos d’água, nos principais córregos da Vila – Córrego da Assembléia, do Bicão, da Feiticeira e do Cemitério. Estas são áreas que além de estarem previstas como não edificantes nas legislações estadual e municipal em estudo são consideradas como APPs (Áreas de Preservação Permanente) pelo Código Florestal, o qual determina que mesmo quando degradadas devem ser protegidas para possibilitar a regeneração da mata ciliar. Outro problema decorrente deste tipo de ocupação é disposição de lixo e resíduos diversos diretamente nos cursos d’água, o que pode gerar a contaminação do solo e da água e a proliferação de vetores transmissores de doenças. Este tipo de infração coloca em risco não apenas o equilíbrio ambiental local, mas também a qualidade de vida dos moradores, pois se trata de áreas vulneráveis que podem sofrer inundações nos períodos de chuvas abundantes.


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Figura 13: Edificação às margens do Córrego do Bicão e tubulações expostas

Fonte: Ana Flávia O. Peccatiello, 2009.

Figura 14: Construções às margens do Rio da Assembléia e área densamente ocupada

Fonte: Oliveira, 2005


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Em alguns locais pode-se perceber que os mangues estão sofrendo grande pressão com diferentes usos em seu entorno (casas e campings). Em muitos casos a faixa de 15m nas margens dos manguezais considerada não edificante tanto pela AECATUP do Abraão quanto pelo Plano Diretor da APA de Tamoios não é respeitada, ficando esse ecossistema sujeito a impactos negativos advindos das construções e do uso da área. Os costões rochosos principalmente pela beleza paisagística de que dispõe, também estão sendo ameaçados pelas ocupações irregulares. É perceptível que a maior parte das construções nestas áreas são recentes uma vez que estão presentes apenas no mapa de uso e ocupação do solo de 2005. Grande parte das edificações nestas áreas acabam por cometer outra infração, construindo piers particulares, apropriando-se ilegalmente e restringindo o acesso a áreas públicas.

Figura 15: Edificações construídas em costão rochoso

Fonte: Ana Flávia O. Peccatiello, 2009.


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Figura 16: Construção próxima a costão rochoso e invadindo área de mar

Fonte: Ana Flávia O. Peccatiello, 2009.

O uso e ocupação do solo desordenado na Vila do Abraão levou a descaracterização da sua principal praia, a Praia do Abraão, uma vez que os limites da faixa de areia das praias e os usos permitidos estabelecidos pelo Plano Diretor da APA de Tamoios foram ao longo dos anos sendo cada vez mais descumpridos. As praias são um dos principais componentes do produto turístico da Ilha Grande e são assim atrativas não apenas para os turistas, mas também para os empreendedores do setor hoteleiro que comercializam o contato com a natureza pela proximidade com o mar. Esta praia é o local onde atracam a maior parte dos barcos e balsas que chegam a Ilha Grande o que propiciou a concentração de diversas atividades comerciais, dentre elas agências de receptivo, bares e lojas de souvenir.


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Figura 17: Construções ocupando faixa de areia

Fonte: Ana Flávia O. Peccatiello, 2009.

Devido a intensa especulação imobiliária na estreita planície da Vila do Abraão, grande parte dos moradores vendeu seus terrenos e diante ao alto valor dos imóveis nas áreas mais planas, passou a ocupar as cotas mais altas da localidade, ultrapassando em muitos casos a cota de 40m que é o limite das áreas passíveis de ocupação nas encostas de acordo com as legislações em análise. Neste ínterim essas áreas são também propensas a ocupação pela população de baixa renda o que se comprova pela presença de inúmeras casas em condições precárias nas cotas mais altas. Tal situação está intrinsecamente relacionada à diminuição da vegetação e à invasão das construções em área do PEIG. É importante ressaltar que existem também em algumas encostas edificações de padrão mais alto pois são atrativas devido a vegetação ainda existente. É relevante também analisar a problemática relativa ao adensamento das edificações. Tanto a legislação estadual quanto a municipal apresenta índices para o tamanho mínimo do lote e taxa de ocupação, os quais não são compatíveis conforme já apresentado. A AECATUP – usualmente mais


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considerada devido a maior representatividade da PMAR diante à população da Vila do Abraão – é mais permissiva pois estabelece lotes mínimos menores com taxas de ocupação maiores o que facilita a aglomeração de edificações. Como a falta de fiscalização é factível e a demanda por hospedagem é crescente, muitos moradores optam pela ampliação de suas residências para poderem receber turistas; em muitos casos essas obras são feitas sem as licenças, de forma autônoma, ultrapassando a taxa de ocupação do lote e o gabarito permitidos.

Figura 18: Casa em condições precárias, construída em área com declividade acentuada

Fonte: Ana Flávia O. Peccatiello, 2009.


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Figura 19: Rua e edificações em área com declividade acentuada

Fonte: Ana Flávia O. Peccatiello, 2009.

Figura 20: Área densamente ocupada

Fonte: Oliveira, 2005.


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Diante a estas análises pode-se perceber que há um descumprimento generalizado das legislações pertinentes à Vila do Abraão com consequências diretas na qualidade ambiental local. O processo de ocupação intensificou-se a partir de 1994 com o crescimento do fluxo turístico e as áreas privilegiadas pela beleza cênica como costões rochosos, manguezais e praias vêm sendo tomadas pelos mais diversos equipamentos turístico, em especial por meios de hospedagem. Além disso, é perceptível um adensamento das construções no interior das quadras nas áreas de planície. Há ainda o avanço de construções nas encostas, principalmente pela população de baixa renda, deflagrando um aumento do desmatamento e um processo de favelização em áreas de risco onde faltam serviços de infraestrutura básica. Este processo de crescimento da Vila do Abrão e sua consequente caracterização como área urbana deveria ser regido pelos parâmetros de uso e ocupação do solo delineados pelo Plano Diretor da APA de Tamoios e pela AECATUP

do

Abraão.

Entretanto

além

destes

instrumentos

serem

discrepantes em grande parte de suas determinações, houve uma ausência do poder público estadual na Ilha Grande durante anos o que fez com que todo o ordenamento urbano da Vila do Abraão ficasse de forma mais direta sob a coordenação e fiscalização do poder público municipal, o qual em Angra dos Reis é historicamente percebido como carente de visão estratégica e permeado pelo favorecimento dos detentores do poder econômico em detrimento à lei.


CONCLUSÕES

O presente estudo abordou as questões gerais relacionadas ao turismo e suas implicações na apropriação dos espaços, com ênfase na análise da influência da falta de articulação institucional e de ações coordenadas da gestão pública na degradação ambiental deflagrada a partir do crescimento desordenado do turismo. A pesquisa realizada na Vila do Abraão, Ilha Grande, mostrou que a localidade foi envolvida, principalmente após a implosão do Instituto Penal Cândido Mendes em 1994, na lógica do capital turísticoimobiliário, sofrendo com as mudanças das relações sócio-espaciais e com a especialização do tempo e espaço de produção. Circundada e inserida em áreas naturais, as quais são focos de medidas preservacionistas desde a década de 1970, a Vila do Abraão conta com aparato legal dos níveis federal, estadual e municipal, sendo assim responsabilidade de todos e de ninguém concomitantemente. A construção do trecho da BR-101 que interliga o Rio de Janeiro a Santos foi um marco para o município de Angra dos Reis já que a partir de tal fato sucederam-se profundas transformações econômicas, sociais e políticas. Neste ínterim a produção do espaço urbano foi redefinida pelas novas articulações dos atores sociais. Com a facilidade do acesso e favorecida pela sua exuberante paisagem, manifesta-se uma pretensa vocação turística para a cidade de Angra dos Reis, intensificando a presença do já atuante capital


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imobiliário com o apoio do poder público. Vale ressaltar que, de acordo com grande parte dos entrevistados e com CORRÊA (2008), o desenvolvimento do turismo no município não se deu espontaneamente, sendo resultado de ações intencionais de agentes políticos associados aos imobiliários. Neste sentido, CRUZ (2007) ressalta que na produção do espaço do turismo há uma atuação dinâmica e conflituosa entre os atores envolvidos (Estado, agentes de mercado e sociedade civil), com possibilidades de ação que os caracterizam como agentes hegemônicos e não-hegemônicos. O turismo reproduz-se tão velozmente que não respeita fronteiras ou limites territoriais (FRATUCCI, 2000) e se desdobra de tal forma, pois seus agentes priorizam suas dimensões econômicas e mercadológicas à dimensão da espacialidade. A permissividade do poder público, enquanto agente regulador da ocupação e ordenamento dos territórios, diante ao avanço do turismo é justificada pelos efeitos multiplicadores positivos que essa atividade provoca nas economias, no que tange principalmente à entrada e circulação de capital e geração de empregos, isso em um espaço de tempo menor que em outros setores. Assim, os governos das áreas turísticas realizam articulações e abrem exceções aos promotores imobiliários, incorporadores hoteleiros e demais empreendedores turísticos, resultando em uma expansão geográfica indiscriminada de resorts, hotéis, marinas e condomínios de primeira e segunda residências, que causa impactos tanto aos ecossistemas litorâneos como às comunidades locais e populações tradicionais. Este processo é caracterizado por uma intensa segmentação do espaço e por conflitos oriundos das diferenças de territorialidades principalmente entre residentes e turistas (KNAFOU, 1996 apud FRATUCCI, 2006).

[...] o desenvolvimento de atividades turísticas, de atividades de veraneio e a implantação de condomínios de segunda residência respondem por uma ocupação pulverizada e segmentada, usualmente caracterizada como urbanização extensiva e/ou dispersa. Resulta daí uma ocupação desordenada de aglomerados de caráter urbano dispersos, em que se verifica a multiplicação irregular de edificações residenciais e de serviços sem infraestruturas de saneamento, que além de avançar sobre os mangues, restingas e lagoas, aí lançam esgoto in-natura, queimam a


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mata para limpar as áreas para construir e implantar jardins, o que acarreta uma crescente degradação ambiental com a redução das praias, assoreamento dos rios, contaminação dos lençóis freáticos e redução dos recursos naturais (Limonad, 2007, p. 66).

Em toda a Ilha Grande e especificamente na Vila do Abraão, temos as situações supracitadas em contínuo agravamento. Ao longo da investigação nesta pesquisa, observou-se que a gestão estabelecida para a Vila do Abraão a partir de 1994 além de pautada em instrumentos legais em nível estadual e municipal díspares, não fora efetiva, estando a ocupação do seu território a mercê do mercado turístico-imobiliário. Por quase toda a Ilha Grande é possível verificar edificações já consolidadas e em construção que infligem às leis ambientais e, além de provocarem degradação ambiental, colocam em risco as vidas ali presentes. Cada vez mais, áreas que são atrativas justamente por sua beleza cênica conservada, são apropriadas ilegalmente pelos agentes do mercado, sofrendo então alterações significativas que podem muitas vezes levar à descaracterização da paisagem antes valorizada. Na Vila do Abraão essa contradição lamentavelmente há muito já foi superada prevalecendo a imagem de um local invadido que representa, segundo PRADO (2003), aquilo que as outras comunidades da Ilha Grande na querem tornar-se. Verificou-se que teórica e legalmente a administração da Vila do Abraão está sobre a égide principalmente do poder público estadual – FEEMA e IEF (hoje INEA) – e do municipal – PMAR, respaldada pela existência da Área de Proteção Ambiental de Tamoios e de instrumentos legais de ordenação do uso e ocupação do solo previstos como necessários pela instância federal, a saber o Plano Diretor da APA de Tamoios e o Plano Diretor Municipal de Angra dos Reis. Tais instrumentos por sua vez, assim como os seus órgãos implementadores, são permeados por incoerências e divergências técnicas, constituindo-se como reflexos da histórica inconsistência da estrutura administrativa de gestão do meio ambiente no estado do Rio de Janeiro. Os processos de elaboração dos dois principais instrumentos de organização do uso e ocupação do solo para a Vila do Abraão apesar de terem


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sido iniciados com a cooperação entre as esferas estadual e municipal, findaram-se

separadamente,

em

períodos

distintos,

com

aparentes

discordâncias em suas determinações. Cabe ressaltar que mesmo que de forma não totalmente satisfatória, a criação da AECATUP do Abraão teve um caráter participativo no âmbito do Conselho Municipal de Urbanismo e Meio Ambiente, com a presença em diversas reuniões de moradores e atores sociais atuantes no local, assim como do poder estadual através do IEF, órgão então gestor do PEIG. Nota-se que nas entrevistas não foi mencionada a participação de representantes da APA de Tamoios. Pode-se atribuir esta ausência e também a “nebulosidade” do processo de elaboração do Plano Diretor da APA de Tamoios ao fato de a criação desta UC não ter sido inserida em nenhuma estratégia de governo e de seu órgão gestor, a FEEMA, ter vivido no final dos anos 1980 e início de 1990 uma grave crise de sua estrutura administrativa envolvendo corrupção e insuficiência de funcionários. Através das análises comparativas realizadas entre o Plano Diretor da APA de Tamoios e a AECATUP do Abraão foi possível perceber discordâncias entre pontos primordiais para a organização do uso e ocupação do solo dentre os quais podemos destacar: lote mínimo, taxa de ocupação e áreas não edificantes. Verificou-se que os índices estabelecidos pela AECATUP do Abraão no que tange ao lote mínimo e taxa de ocupação, são menos rigorosos que os previstos no Plano Diretor da APA de Tamoios, permitindo um maior adensamento nas áreas construídas. Com isso, por ter sido a constituição da AECATUP um processo participativo, conclui-se que apesar de a população ter preocupação com a preservação ambiental da Vila do Abraão, entende como necessário e legítimo um uso mais intenso do solo edificável da localidade. Entretanto cabe a ressalva de que em alguns casos os representantes da população local no CMUMA estavam envolvidos ou corrompidos pelos interesses hegemônicos, fazendo parte do quadro de funcionários da PMAR e de empresas do setor turístico-imobiliário. As diferenças entre as legislações perduram até os dias de hoje. No ano de 2006 o Plano Diretor Municipal começou a ser revisado e foi criada a Lei de Diretrizes Territoriais para a Ilha Grande, os quais, entretanto ainda não foram


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promulgados. No que diz respeito à esfera estadual, no ano de 2007 iniciou-se a discussão quanto a reformulação do Plano Diretor da APA de Tamoios no âmbito de seu Conselho Consultivo, o qual apesar de ter sido criado em 2006 começou a funcionar efetivamente apenas em 2007. É importante ressaltar que, de acordo com alguns membros do Conselho Consultivo da APA de Tamoios, nesta reformulação do Plano Diretor da APA estão sendo consideradas e em grande parte absorvidas, as determinações da AECATUP do Abraão justamente por se tratar de uma legislação elaborada com o respaldo da população local. O ano de 2009 e início de 2010, apesar de não fazerem parte do recorte temporal desta pesquisa devem ser relembrados devido aos acontecimentos emblemáticos da ineficácia do que se tem atualmente como gestão do uso e ocupação do solo em Angra dos Reis. Em 19 de junho de 2009 o governador do estado do Rio de Janeiro, Sérgio Cabral, publicou o Decreto nº 41.921, o qual estabelece novos critérios para a construção em toda a área de ZCVS da APA de Tamoios. Tal Decreto apresenta uma série de irregularidades dentre as quais podemos destacar: 1) É inconstitucional, pois a Constituição Federal determina que a desafetação ou redução dos limites de uma UC só pode ser feita mediante lei específica; 2) Não houve participação do Conselho Consultivo da APA de Tamoios em sua elaboração o que se configura como um desrespeito a um dos pilares da Lei Federal nº 9.9985/00, ao desconsiderar a participação colegiada, o que atenta contra o interesse público primário; 3) Favorece a ocupação de extensas áreas valorizadas pelo seu excelente estado e conservação em detrimento aos interesses socioambientais. Contudo, o referido Decreto entrou em vigor apesar das ações movidas por organizações não-governamentais, universidades e políticos, e, no chuvoso réveillon de 2009 para 2010, como uma repulsa da natureza a esses mandos e desmandos, ocorreu um grande deslizamento de terra na Enseada do Bananal que levou à morte mais de 50 pessoas. Foram registrados outros deslizamentos por toda a Ilha Grande, mas que não tiveram vítimas fatais. A Enseada do Bananal, como tantas outras enseadas da Ilha Grande e de outras ilhas da região, tinham sido contempladas como áreas propícias à expansão conforme o Decreto nº 41.921.


146

Após esse acidente, os efeitos do Decreto foram suspensos até que sejam finalizados os estudos de revisão do Plano Diretor da APA de Tamoios. Como conclusão geral desta pesquisa, ficou evidenciado que a existência de aparato legal não determina a condição de preservação das UCs, principalmente em áreas onde é necessário conciliar usos diversos como turismo e moradia, com grande hegemonia do setor turístico-imobiliário. Historicamente há uma grande dificuldade no Brasil em se fazer cumprir as leis; o fato de existirem leis discrepantes regulamentando o uso e ocupação solo em uma área caracterizada por diversos conflitos territoriais torna o processo ainda mais complexo, incluindo ai a fiscalização. Configura-se então um quadro de complacência

entre quem

constrói

e quem

regulamenta e

fiscaliza,

determinando a apropriação inadequada de áreas naturais, públicas e/ou de risco e conseqüente degradação ambiental. A prática de inserção das UCs no processo de desenvolvimento local deve estar condicionada a uma articulação das políticas públicas, tradicionalmente setoriais, e dos níveis de governo envolvidos, num esforço de ordenamento territorial que inclui atores como comunidades

humanas

locais,

organizações

governamentais

e

não

governamentais, usuários, iniciativa privada e comunidades biológicas. O desenvolvimento e organização do turismo, neste sentido, como principal atividade

econômica

da

Vila

do

Abraão,

deve

permear

as

ações

governamentais para que o mesmo possa cumprir o seu papel de dinamizador da economia, de promotor da valorização sócio-cultural e de instrumento para a proteção do meio ambiente.


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