"Três Cores: Sombra" de Evy Jokhova na Galeria Municipal

Page 1

GALERIA MUNICIPAL DE ARTE

17.06.2023 – 21.10.2023

EVY JOKHOVA

TRÊS CORES: SOMBRA

Horário Terça a sábado: 10H–13H / 14:30H–18H Encerra domingos, segundas e feriados

Galeria Municipal de Arte Av. Nuno Álvares Pereira 74 A 2800-177 Almada T. 212 724 724 casadacerca@cma.m-almada.pt


todas as mãos te seguram a tristeza da Primavera não é demasiado tarde mais uma vez eles cairão

vai, cereja, cereja ensina os caminhos dos selvagens e eles voltarão

corpo de polvo A canção da tempestade chega até mim Eu mantenho a minha boca aberta

disseram que era velado uma vez, duas vezes, três vezes, quatro vezes não, não, não, não, não, não

tarde na escuridão a lua cheia não é minha irmã ela, ainda assim, sabe muito bem

agora, a serpente cai no único corpo de água não tem veneno

acordado no nevoeiro palmas suaves dão toques húmidos o meu templo foi-se

confiar nas crianças do sol os seus olhos são brilhantes e sorriem a tristeza do Verão

encontrámo-nos sem nos vermos disseram-nos que era tão errado nós não respondemos

flores na boca como ambrosia dos deuses perdido na tradução

quando a poeira assenta a árvore de bordo diz o seu nome e todas as estrelas caem

prazer prazer, suspiro caminha entre a linha das árvores os amantes vêem-te

debaixo dos lençóis, tu olhos tristes com uma língua de aço e lama não é o meu caminho

documentário Okanawa à beira-mar, filmado até ao templo

brilhante, claro, sem fôlego, ofegante o filme rápido com as ondas passa na TV

orações, orações, orações, orações, orações quando não estão a olhar orações, orações, orações -

dizem que não se pode ter tatuagens num balneário japonês, mas mesmo assim importo-me

cavalga-me baby cavalga segura o meu corpo como uma espada puxa-me querida puxa

durmo com a tua voz perdida nas areias da minha mente a deusa foi-se embora

quebrar o protocolo em nome de todos nós não temos muito tempo

ele não pode ajudar-te ele pode amar-te mas não agora não lhes digas que é verdade

não é uma luta mas os sussurros soam tão alto neste dia de Junho

toda a gente é dura hoje eu vi a verdadeira face de como todos nós morremos

Araki foto Ecstasy de melancia quimono nu

é mais fácil abandonar do que entrar em contacto com a noite

porno-porno-p coisas gráficas que deixámos para trás apanhá-las de novo, agora mesmo


eu carrego a tua corrente isto não é o que eu queria usá-la para te libertar mergulhar na luz da alma demasiadas pérolas para levar para casa as mulheres sabem disso esto é difícil de dizer eu amo-te mas eu amo-me a mim segurando as estradas cruzadas o pó é o meu perfume doce como a minha avó seco como o meu avô bebe o chá verde quente como se fosse a tua última vez a tua última vez para te preocupares brisas do coração lembram-me que sou livre brisas do céu mulher nas dunas com um corpo como a terra as constelações brilham adeus meu amor a noite e o dia fazem-me chorar mas o sol está aqui a cozer como barro quente esta forma forte vai desaparecer por isso lembra-te de mim é melhor deixá-lo ir, deixar-me encontrar a minha liberdade para que eu possa voar. / all the hands hold you spring sadness is not too late again they will fall octopus body Storm song makes its way to me I hold my mouth wide late in the darkness full moon is not my sister

she, still, knows too well awake in the fog soft palms give humid touches my temple is gone we met out of sight they told us it was so wrong we didn!t answer as the dust settles the maple tree says her name and all the stars fall under the sheets, you sad eyes with a tongue of steel and mud this is not my way bright, clear, breathless, gasp the fast movie with the waves plays on the T.V. they say you can!t have tattoos in a Japanese bathhouse, still I care I sleep with your voice lost in the sands of my mind the goddess is gone he cannot help you he may love you but not now don!t tell them it!s true everyone is hard today I saw the real face of how we all die it is easier to drop out than drop in contact with the night go, cherry cherry teach the ways of the wild ones and they will come back they said it was veiled once, two times, three time, four times no, no, no, no, no now, the serpent falls into the one water body it has no poison


trust sunshine children their eyes are bright and they smile summertime sadness

dust is my perfume sweet like my grandmother dry like my grandfather

flowers in the mouth as ambrosia from the gods lost in translation

drink the hot green tea as if it is your last time your last time to care

pleasure pleasure, sigh walk out among the tree line the lovers see you

breezes from the heart remind me that I am free breezes from the sky

documentary Okanawa beachfront, shot up to the temple

woman in the dunes with a body like the earth constellations shine

prayers, prayers, prayers, prayers, prayers when they aren!t looking prayer, prayers, prayers —

goodbye my lover the night and day make me cry but the sun is here

ride me baby ride hold my body like a sword pull me baby pull

baking like hot clay this strong form will wash away so remember me

break the protocol on behalf of all of us we don!t have much time

better to let it go, let me find my freedom so that I can fly.

it is not a fight but the whispers sound so loud on this day in June

- Josseline Black

Araki photo Watermelon ecstasy kimono naked porno-porno-p graphic things we left behind pick them up again, right now I carry your chain this is not what I wanted use it to free you diving for the soul light too many pearls to take home the women know this this is hard to say I love you but I love me holding the cross roads


A trilogia das três cores de Krzysztof Kieślowski (Azul, Branco e Vermelho) foram filmes que marcaram a minha juventude. O Azul e o Vermelho, em especial, com duas protagonistas extraordinárias – Irène Jacob e Juliette Binoche - falavam-me de uma melancolia profunda e de uma necessidade de conexão. Kieślowski tem um cuidado especial com a encenação, com o gesto, com a importância da cor como experiência, ou percepção, do mundo. Na exposição “Três cores: Sombra” Evy Johkova faz uma referência direta à trilogia de Kieślowski, transformando o sentido das cores, propondo novas reflexões. Sombra é o segundo momento da trilogia de Johkova, mas que cor é esta? Cientificamente, Sombra não é uma cor, é antes a cor da superfície onde incide apenas mais escura. Em 1704 Newton escreveu Opticks onde explica que a cor é um fenômeno físico que provém da luz. Pouco tempo depois, Goethe propõe a Teoria das Cores, discordando de Newton, e afirmando que a cor é modelada pela percepção, pela luz e pela escuridão. “A cor é um grau de escuridão”, escreveu. Goethe pensa na cor através da experiência que dela fazemos e da emoção que provoca. Assim podemos pensar a sombra como uma cor que se transforma e se adapta, uma espécie de camaleão. Na exposição, a Sombra é a cor da interioridade, da casa, dos segredos e da intimidade. É a cor dos pequenos gestos, dos movimentos lentos, quase imperceptíveis, É a cor que se emprenha nas paredes, a cor da escrita do poema. É a cor do duplo de cada visitante quando passeia pelo espaço. Voltamos à literatura, em 1933 Junichiro Tanizaki escreve um ensaio intitulado “O Elogio das Sombras”, no qual o escritor japonês criticava o excesso de luz do Ocidente, a exuberância das cores, defendendo uma estética oriental do recolhimento, do detalhe, no desvio. Johkova explora essa possibilidade de desvio, de concentração em detalhes ínfimos. Nada é exuberante, nada é excessivo. Todas as obras se detêm em pequenos movimentos. Talvez por isso, a mão é protagonitas dos desenhos. Como nos haikus do poema de Josseline Black. Concentração máxima em cada estrofe. Para além da superficialidade da luz, dentro de casa, na sombra, encontramos uma estética do cuidado, da atenção. Um universo ambíguo, estranho, desconcertante, com alusões sexuais recorrentes. Um universo da cicatriz também, da reparação, das imperfeições que definem a nossa identidade, que nos tornam mais resistentes, que nos ajudam a enfrentar as adversidades. E é nesta sombra que nos sentamos à mesa, que festejamos os nossos corpos diferentes, transformados (pelo o que comemos, mas pelo tempo, pela vida). Nesta mesa que elogia sombras, bebemos chá, meditamos, ouvimos poesia, olhamo-nos nos olhos, assistimos aos movimentos das mãos. Comemos pão, rituais do quotidiano de uma casa, rituais intensificados pela consciência da presença, ou ausência, do outro. “Vivo entre formas luminosas e vagas que não são ainda a escuridão. (...) Esta penumbra é lenta e não dói; flui por um manso declive e parece-se com a eternidade.” O Elogio da Sombra, Jorge Luís Borges Filipa Oliveira


Krzysztof Kieślowski's trilogy of the three colors (Blue, White, and Red) were films that marked my youth. Blue and Red, in particular, with two extraordinary protagonists - Irène Jacob and Juliette Binoche - spoke to me of a deep melancholy and a need for connection. Kieślowski takes special care with staging, with gesture, with the importance of color as experience, or perception, of the world. In the exhibition "Three colors: Shadow" Evy Johkova makes a direct reference to Kieślowski's trilogy, transforming the meaning of colors, proposing new reflections. Shadow is the second moment of Johkova's trilogy, but what color is this? Scientifically, Shadow is not a color, it is rather the color of the surface where it incurs only darker. In 1704 Newton wrote Opticks where he explains that color is a physical phenomenon that comes from light. Shortly thereafter, Goethe proposed the Color Theory, disagreeing with Newton, and stating that color is shaped by perception, light, and darkness. "Color is a degree of darkness," he wrote. Goethe thinks of color through our experience of it and the emotion it provokes. Thus we can think of shadow as a color that transforms and adapts, a kind of chameleon. In the exhibition, Shadow is the color of interiority, of home, of secrets and intimacy. It is the color of small gestures, of slow, almost imperceptible movements. It is the color of the double of each visitor as he or she strolls through the space. Back to literature, in 1933 Junichiro Tanizaki wrote an essay entitled "In Praise of Shadows", in which the Japanese writer criticized the excess of light in the West, the exuberance of colors, defending an oriental aesthetic of recollection, of detail, of deviation. Johkova explores this possibility of deviation, of concentration on minute details. Nothing is exuberant, nothing is excessive. All the works dwell on small movements. Perhaps because of this, the hand is the protagonist of the drawings. Like in the haikus of Josseline Black's poem. Maximum concentration in each stanza. Beyond the superficiality of light, indoors, in the shadows, we find an aesthetic of care, of attention. An ambiguous universe, strange, disconcerting, with recurrent sexual allusions. A universe of scarring too, of repair, of the imperfections that define our identity, that make us more resistant, that help us face adversity. And it is in this shadow that we sit at the table, that we celebrate our different bodies, transformed (by what we eat, but by time, by life). At this table that praises shadows, we drink tea, we meditate, we listen to poetry, we look into each other's eyes, we watch the movements of hands. We eat bread, rituals of the daily life of a house, rituals intensified by the awareness of the presence, or absence, of the other. "I live among luminous and vague forms that are not yet darkness (...) This penumbra is slow and does not hurt; it flows down a gentle slope and resembles eternity." In Praise of the Shadow, Jorge Luís Borges Filipa Oliveira


Evy Jokhova (Suiça, 1984 – EE/UK/RU) vive e trabalha entre Lisboa, Londres e Viena. Jokhova é uma artista multidisciplinar cuja prática dedica-se aos diálogos e relações entre a antropologia social, a arquitetura, a filosofia e a arte. Através do desenho, escultura, instalação, som, vídeo e performance, procura colmatar as lacunas entre as diversas áreas e as suas estruturas hierárquicas inerentes. Obteve o seu MA Fine Art da Royal College of Art (2011) e MA Political Communications de Goldsmith College (2013). Jokhova recebeu os prémios de Arts Council Individual Grants Award (2018), Royal Academy Schools Fellowship (2016-19), Royal British Society of Sculptors Bursary Award (2017-18), Wien Kultur Förderung (2017) e Amsterdam Fonds voor Kultur (2018). As residências incluem: Yarat Contemporary Art Space (2018), Belvedere Museum Vienna (2017), BijlmAIR Amsterdam (2017), Villa Lena (2017), Nida Art Colony (2017) e Florence Trust (2008-09), entre outras. As exposições individuais incluem: Three Colours: Green, 3+1 Arte Contemporânea, Lisboa (2022); How to live together, CBK Zuidoost (Amesterdão, 2018); How to live together, CBK Zuidoost (Amsterdão, 2018); The Shape of Ritual, projeto encomendado pelo Belvedere Museum (Viena 2017); Towering in the conditions of fragments, Passen-gers (Londres 2017); Staccato, Marcelle Joseph Projects (Londres 2016). As exposições coletivas recentes incluem: Ponto d’Orvalho, comissariada por Joana Horta, Leonor Carrilho e Sergio Hydalgo, (Freixo de Meio, Alentejo 2021); WOTRUBA. Himmelwärts, com curadoria de Gabrielle Stöger-Spevak, Museu Belvedere (Viena, 2021); Art in the Plague Year, com curadoria de Douglas McCulloh, Nikolay Maslov e Rita Souther, UCR California Museum of Photography, (Califórnia, 2021); On Photographic Beings, Museu Nacional da Letônia (Riga 2020); Boundary Layers, Yarat Contemporary Art Space, (Baku 2019); Prevent this Tragedy, Dateagle / Vongoetz Art (Londres 2018); Contemporary Sculpture Fulmer, Better Living: Tenderflix film festival, The Horse Hospital (Londres 2017), entre outros. Desde 2014, a artista dirige Allotment – um projeto de pesquisa colaborativa que explora as relações sociais e as políticas culturais por meio da comida. O trabalho de Jokhova está nas coleções públicas da British Government Art Collection, Reino Unido; Biblioteca do Lafayette College, EUA; Royal College of Art, Reino Unido e Royal Shakespeare Company, Reino Unido. EN Evy Jokhova (Switzerland, 1984 – EE/UK/RU) lives and works between Lisbon, London, and Vienna. Jokhova is a multi-disciplinary artist whose practice engages with dialogue and relationships between social anthropology, architecture, philosophy and art. Working with drawing, sculpture, installation, sound, film and performance, she aims to bridge gaps between these fields and their inherent hierarchical structures. A graduate of MA Fine Art, Royal College of Art (2011) and MA Political Communications, (2013) Goldsmiths College, Jokhova is the recipient of numerous awards including Arts Council Individual Grants Award (2018), Royal Academy Schools Fellowship (2016-19), Royal British Society of Sculptors Bursary Award (2017-18), Wien Kultur Förderung (2017) and Amsterdam Fonds voor Kultur (2018). Residencies include Yarat Contemporary Art Space (2018), Belvedere Museum Vienna (2017), BijlmAIR Amsterdam (2017), Villa Lena (2017), Nida Art Colony (2017) and Florence Trust (2008-09) amongst others. Solo exhibitions include: Three Colours: Green, 3+1 Arte Contemporânea, Lisbon (2022); How to live together, CBK Zuidoost (Amsterdam, 2018); The Shape of Ritual, project commissioned by Belvedere Museum (Vienna 2017); Towering in the conditions of fragments, Passen-gers (London


2017); Staccato, Marcelle Joseph Projects (London 2016). Recent group exhibition include: Ponto d’Orvalho, curated by Joana Horta, Leonor Carrilho & Sergio Hydalgo, (Freixo de Meio, Alentejo 2021); WOTRUBA. Himmelwärts, curated by Gabrielle Stöger-Spevak, Belvedere Museum (Vienna, 2021); Art in the Plague Year, curated by Douglas McCulloh, Nikolay Maslov & Rita Souther, UCR California Museum of Photography, (California, 2021); On Photographic Beings, Latvian National Museum (Riga 2020); Boundary Layers, Yarat Contemporary Art Space, (Baku 2019); Prevent this Tragedy, Dateagle / Vongoetz Art (London 2018); Contemporary Sculpture Fulmer, Better Living: Tenderflix film festival, The Horse Hospital (London 2017) amongst others. Since 2014 the artist has run Allotment – a collaborative research project that explores social relationships and cultural politics through food. Jokhova’s work is held in the public collections of the British Government Art Collection, UK; Lafayette College Library, USA; Royal College of Art, UK and Royal Shakespeare Company, UK.


Issuu converts static files into: digital portfolios, online yearbooks, online catalogs, digital photo albums and more. Sign up and create your flipbook.